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Novos atores políticos de esquerda nas redes sociais: o uso do Facebook pelas lideranças do Podemos e do Bloco de Esquerda

New leftist political actors on social networks: the use of Facebook by the leaderships of Podemos and Bloco de Esquerda

RESUMO:

Este artigo tem por objetivo analisar as estratégias de comunicação digital utilizadas pelas lideranças do partido-movimento espanhol Podemos e do partido português Bloco de Esquerda a partir da análise das publicações de páginas das lideranças no Facebook. Com lideranças jovens inseridas na dinâmica das redes, Podemos e Bloco de Esquerda utilizam as redes sociais para transmitir conteúdo político sem a mediação dos canais de imprensa. A partir da análise de 200 mensagens mais engajadas nas páginas, entre julho de 2016 e abril de 2018, identificou-se os principais temas e recursos utilizados. Os resultados indicam que as lideranças do Podemos obtêm maior engajamento e alcance em suas publicações que as representantes portuguesas. O estudo também permitiu identificar estratégias discursivas e formas de apropriação do Facebook na ação política dessas lideranças políticas emergentes.

Palavras-chaves:
Bloco de Esquerda; Comunicação Política; Facebook; Liderança Política; Podemos

ABSTRACT:

This study aims to explore the digital communication strategies used by representatives from Spanish party-movement Podemos and the Portuguese party Bloco de Esquerda through the analysis of messages posted on their official Facebook pages. Led by young people inserted in network dynamics, Podemos and Bloco de Esquerda have used digital social networks to communicate political content without going through mainstream media outlets. The analysis of the 200 most engaged posts published in their official Facebook pages from July 1016 to April 2018 allowed for the identification of the subjects most approached and the resources most used. The results indicate that Podemos leaderships obtained better engagement than the Portuguese representatives. This study also allows for identifying the main discursive strategies and the forms through which these important political actors appropriated this digital social network in their political action.

Keywords:
Bloco de Esquerda; Political Communication; Facebook; Political Leadership; Podemos

Introdução

A onda de protestos de mobilização online teve início na Tunísia, ao final de 2010, onde eclodiu a primeira manifestação que inaugurou um ciclo de protestos que se espalhou por países do norte da África, no movimento chamado Primavera Árabe, para atingir outros países espalhados pelo mundo, como em 2011 na Espanha, em 2012 em Portugal e no Brasil com as Jornadas de Junho de 2013. Todas essas manifestações tiveram em comum o uso das redes sociais de internet para a mobilização dos manifestantes e a formação de redes de indignação e esperança (CASTELLS, 2015CASTELLS, Manuel. Networks of outrage and hope: social movements in the Internet age. Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2015.).

Na Espanha, os protestos iniciados em 15 de maio de 2011 na praça Puerta del Sol em Madri contra políticas de austeridade impostas pelo governo reuniram milhares de espanhóis em acampamentos montados em praças públicas, convocados por movimentos sociais por meio da internet, e ficaram conhecidos como Movimento dos Indignados ou 15M. As manifestações se caracterizam por desenvolverem novas formas de ação coletiva e a participação de cidadãos, principalmente de jovens, com menor envolvimento com o debate político (ANDUIZA; CRISTANCHO; SABUCEDO, 2014ANDUIZA, Eva; CRISTANCHO, Camilo; SABUCEDO, José M. Mobilization through online social networks: the political protest of the indignados in Spain. Information, Communication & Society, v. 17, n. 6, p. 750-764, 2014.).

Em Portugal, o movimento “Que se lixe a Troika - Eu quero minha vida!” nasceu da mobilização nas redes sociais online e chegou às ruas em 15 de setembro de 2012 contra as medidas de austeridade adotadas pelo governo português sobre os ecos das manifestações globais da Primavera Árabe, Occupy Wall Street e os Indignados. Os protestos permitiram a conexão da mobilização online com a ocupação dos espaços públicos para a expressão da insatisfação da população contra as políticas em curso do governo português (BABO; SILVA, 2017BABO, Isabel; SILVA, Célia Taborda. Social networks and civic mobilizations (Portugal, 2012). Academic Journal of Interdisciplinary Studies, v. 6, n. 2, p. 49-58, 2017.).

Estas manifestações iniciaram um processo destituinte de questionamento do modus operandi da política tradicional, de forma que se abriu uma janela de oportunidade para a emergência de forças políticas que propusessem agendas distintas daquelas apresentadas pelos partidos hegemônicos nos sistemas políticos vigentes e, na etapa seguinte, de processo constituinte, emerge na Espanha com a criação do Podemos e em Portugal o ressignificado Bloco de Esquerda, dois partidos-movimentos contemporâneos que surgem na cena política caracterizada pela mobilização online.

Por meio do uso e da interação em plataforma de redes sociais online, os representantes políticos do Podemos e do Bloco de Esquerda podem utilizar esses dispositivos para divulgar seus discursos, projetos, denúncias, mobilizações e outras formas de ação política informacional por meio de suas respectivas estratégias de comunicação, viabilizando a uma nova relação entre os atores políticos e o cidadão comum.

Já existem estudos sobre o uso das redes sociais de internet por lideranças políticas (ERNST et al., 2016; GIBSON, 2015GIBSON, Rachel K.. Party change, social media and the rise of ‘citizen-initiated’ campaigning. Party Politics, v. 21, n. 2, p. 183-197, 2015.; KALSNES, 2016KALSNES, Bente. The social media paradox explained: comparing political parties’ Facebook strategy versus practice. Social Media+Society, v. 2, n. 2, p. 1-11, 2016.; MAGIN et al., 2016MAGIN, Melanie; PODSCHUWEIT, Nicole; HAßLER, Jörg; RUSSMAN, Uta. Campaigning in the fourth age of political communication; A multi-method study on the use of Facebook by German and Austrian parties in the 2013 national election campaigns. Information, Communication & Society, v. 20, n. 11, p. 1698-1719, 2017.; SORENSEN, 2016SØRENSEN, Mads P.. Political conversations on Facebook-the participation of politicians and citizens. Media, culture & society, v. 38, n. 5, p. 664-685, 2016.). No entanto, este trabalho apresenta um estudo comparativo sobre as estratégias de comunicação no Facebook por novas formas de organização política que priorizam o engajamento do eleitorado no meio online.

Dentro deste contexto, este artigo tem por objetivo estudar a estratégia de comunicação política no uso da rede social Facebook pelos principais representantes políticos do partido-movimento espanhol Podemos e do partido português Bloco de Esquerda a partir da análise de publicações postadas nas páginas oficiais das lideranças no Facebook. As características de interatividade da plataforma também proporcionam a observação das publicações que obtiveram maior engajamento (somatória de reações, comentários e compartilhamentos). Neste estudo, a estratégia de comunicação é entendida como a articulação dos elementos recurso, tema e frequência de publicação. Por fim, o estudo busca verificar se as estratégias mais utilizadas pelas lideranças também geram maior interatividade com seus seguidores.

Para a realização do estudo, inicialmente o artigo apresenta uma introdução do contexto social e político em Portugal e Espanha. Em seguida é realizada uma discussão sobre o uso das TICs por atores sociais, partidos e figuras políticas, levando à utilização dessas ferramentas por partidos-movimentos como o Podemos e o Bloco de Esquerda. Na seção seguinte apresenta-se a análise das publicações de duas lideranças selecionadas de ambos partidos em suas respectivas páginas no Facebook para verificar as estratégias de comunicação utilizadas na plataforma a partir da identificação dos temas e recursos que geraram maior engajamento. A quinta seção reúne informações sobre a metodologia de análise e dados sobre as lideranças. Ao final do texto, apresentamos uma avaliação dos resultados alcançados, indicando as formas de comunicação de novos formatos de organização política dentro da rede social Facebook.

Espanha e Portugal: democracia e crise

Ao mesmo tempo em que passaram a enfrentar uma das piores crises econômicas de suas histórias recentes, Espanha e Portugal assistiram a uma onda de protestos organizados pelas redes sociais de internet e a emergência de novos partidos e lideranças políticas que desestabilizaram as elites políticas dominantes nos países ibéricos, acenando com inovações institucionais dentro de um contexto de crise da representação política tradicional.

Ambos os países, com apenas cerca de quatro décadas de restabelecimento de modelos democráticos após períodos de ditaduras fascistas tiveram seus regimes bipartidários de alternância de poder entre conservadores e sociais democratas, respectivamente PPD/PSD - Partido Social Democrata e PS - Partido Socialista em Portugal e, na Espanha, PP - Partido Popular e PSOE - Partido Socialista Obrero Español.

Em meio a crises políticas e fiscais nos países ibéricos foram organizadas manifestações a partir de redes sociais de internet. As antigas formas de mobilização política, organizadas por partidos políticos e sindicatos passaram a disputar espaço com novas formas de organização de ações coletivas, muitas vezes sem a presença de uma liderança política questionando as estruturas institucionais tradicionais (BABO; SILVA, 2017BABO, Isabel; SILVA, Célia Taborda. Social networks and civic mobilizations (Portugal, 2012). Academic Journal of Interdisciplinary Studies, v. 6, n. 2, p. 49-58, 2017.), inaugurando uma nova lógica de ação conectiva, onde as tecnologias de informação comunicacional atuam como agentes organizacionais e se desenvolve uma comunicação política personalizada que se utiliza das redes pessoais para difusão de informações e mobilização política (BENNETT; SEGERBERG, 2012BENNETT, Lance; SEGERBERG, Alexandra. The logic of connective action. Information, Communication & Society, v. 15, n. 5, p. 739-768, 2012.).

O 15M espanhol diz respeito a um conjunto de protestos realizados em praças públicas convocados por meio digitais e que apelavam para todos os cidadãos espanhóis em uma demanda por democracia. Em Portugal os protestos “Que se Lixe a Troika!” ocorreram em diversas cidades do país e levaram milhares de cidadãos às ruas.

Estas manifestações na Espanha e em Portugal foram reações populares contrárias ao conjunto de políticas de austeridade impostas pela Troika aos seus países e outros da Europa após a crise econômica iniciada em 2008. Estes países sofreram com altas taxas de desemprego, precarização de atividades laborais, degradação de salários, aumento na desigualdade social e a emigração de diversos cidadãos, em sua maioria jovens (IGLESIAS, 2015aIGLESIAS Turrión, Pablo. Entender Podemos. New Left Review [Edição em espanhol], n. 93, p. 6-22, 2015a.).

As redes sociais online, por suas características sociotécnicas de interatividade, possibilitaram que a população, principalmente de jovens atingidos pelo desemprego ou pela precarização de seus trabalhos e principais usuários dessas plataformas, pudessem expressar seu descontentamento com as políticas de austeridade fiscal e a crise da representação política.

Os protestos ibéricos ocorrem em um momento de personalização da política, no qual se identifica o deslocamento de frames de ação coletiva para frames de identidade individual baseados em estilo de vida e interesses pessoais. Bennett (2012)BENNETT, Lance. The personalization of politics: political identity, social media and changing patterns of participation. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science, v. 644, n. 1, p. 20-39, 2012. destaca que os últimos anos demonstraram que cidadãos lutam de forma individualizada por suas causas, mas se tornaram empoderados pelas mídias sociais por conta do compartilhamento de interesses e valores. Esse fenômeno cria uma rede de usuários conectados que não se identificam diretamente com partidos ou personalidades políticas.

O Podemos foi criado em janeiro de 2014, a partir do lançamento do manifesto “Mover Fichas (MANIFESTO MOVER FICHA, 2014Mover ficha: convertir la indignación en cambio político. 2014. Disponível em <Disponível em http://tratarde.org/wp-content/uploads/2014/01/Manifiesto-Mover-Ficha-enero-de-2014.pdf >. Acesso em 08 set. 2019.
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) na internet, cujo qual deveria contar com uma adesão mínima de cinquenta mil entusiastas em um período de semanas, mas que ocorreu em menos de 24 horas (SEGURADO, 2016SEGURADO, Rosemary. Partido Podemos: novas práticas políticas na Espanha. E-legis, v. 9, n. 21, p. 7-22, 2016.). Três meses depois, o partido-movimento conseguiu eleger cinco eurodeputados (GÁLVEZ, 2014GÁLVEZ, J. J. Podemos se convierte en la sorpresa y logra cinco escaños en Estrasburgo. EL PAÍS: Madri, 25 de maio de 2014. Disponível em Disponível em http://politica.elpais.com/politica/2014/05/25/actualidad/1401009854_060215.html . Acesso em 08 set. 2019.
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).

Em maio de 2015, o Podemos obteve grandes vitórias no âmbito municipal, onde conseguiu eleger prefeitas e prefeitos em algumas das principais cidades da Espanha: a ativista de um movimento de luta por moradia Ada Colau tornou-se prefeita de Barcelona; Manuela Carmena, juíza aposentada e defensora dos direitos humanos, foi eleita na capital Madri, reduto histórico do PP; o professor e ativista de movimentos anticapitalistas (autonomistas) José María González Santos, o Kichi, venceu em Cádiz, capital da Andaluzia, região autônoma na qual o PSOE governa desde a primeira eleição democrática pós-franquismo em 1978, além de participar de coalizões vencedoras em Valência, na comunidade autônoma homônima e em Bilbao, capital do país basco. No âmbito nacional, o partido-movimento conta ainda com 71 dos 350 deputados na atual legislatura espanhola.

Os podemistas adotaram o conceito de partido-movimento, entendido como uma estrutura na qual o partido no âmbito institucional representativo estaria fortemente subordinado à sua estrutura na sociedade civil, nos movimentos sociais e nos círculos, sempre em movimento, com debates online e offline que seriam influenciadores diretos da agenda dos representantes. O principal objetivo deste conceito é possibilitar o protagonismo de diversos movimentos sociais identitários/temáticos, outrora tratados como “agendas secundárias” pelos partidos de esquerda tradicionais, nos quais a centralidade da agenda trabalhista era hegemônica e que, consequentemente, deixavam em segundo plano movimentos feministas, LGBT+, ambientalistas e mais recentemente de refugiados e imigrantes (IGLESIAS, 2015aIGLESIAS Turrión, Pablo. Entender Podemos. New Left Review [Edição em espanhol], n. 93, p. 6-22, 2015a.).

A lógica discursiva do Podemos pretende romper com a hegemonia política espanhola e com a retórica de partidos políticos tradicionais, buscando a aproximação com grupos específicos como movimentos sociais, jovens e desempregados. Com forte atuação na internet, o partido busca produzir um discurso transversal e inclusivo que articula demandas de diferentes grupos com o auxílio dos recursos de redes sociais online para dinamizar suas mensagens (PENTEADO et al., 2017PENTEADO, Claudio Luis de Camargo; SOUZA, Paulo Roberto Elias; FIACADORI, Giuliana. Um estudo sobre a campanha eleitoral no Facebook do Unidos Podemos nas eleições gerais espanholas de 2016. 2017. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B4ZGK8qAQTozMmtkcWxoNVNlbVE/view . Acesso em 09 mar. 2019.
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).

Em Portugal, nas eleições legislativas de 2015, as coligações encabeçadas por partidos tradicionais, à direita, a coligação do PPD/PSD (36,86% dos votos válidos), e à esquerda, o PS (32,31%), receberam mais votos. No entanto, o Bloco de Esquerda emergiu como o destaque do pleito como o partido que mais cresceu e tornou-se a terceira força política do país (PORTUGAL, 2015PORTUGAL. Ministério da Administração Interna. Resultados Globais. 2015. Disponível em: Disponível em: http://www.eleicoes.mai.gov.pt/legislativas2015/index.html . Acesso em 08 mar. 2019.
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).

O Bloco de Esquerda foi formado em 1999 a partir da articulação entre as forças políticas de orientação marxista tradicional União Democrática Popular, Partido Socialista Revolucionário e Política XXI. As principais lideranças políticas que originaram o partido se desligaram do mesmo ao longo dos anos 2000, no entanto o Bloco continuou recebendo filiações de grupos de interesse constituídos dentro do partido como movimentos de mulheres, LGBT+, sindicalistas e ambientalistas, deixados em segundo plano nos partidos tradicionais, assim como no caso espanhol.

Durante as eleições legislativas de 2015 o Partido Socialista, o Bloco de Esquerda e a Coligação Democrática Unitária, esta última uma coligação formada pelo Partido Comunista Português e pelo Partido Ecologista “Os Verdes”, se articularam para formar o governo. Essa organização previa uma gestão com orientação de esquerda majoritária no Parlamento a fim de evitar que a coligação de direita formasse um novo governo.

Esta articulação resultou no arranjo político que ficou conhecido como “Geringonça”, nome que derivou de um apelido pejorativo, atrelado ao valor depreciativo do termo, por parte dos partidos e líderes da direita, mas que acabou adotado pela própria esquerda. Neste arranjo a coligação passou a governar de modo a recuperar o país das medidas impostas pela Troika (MENA, 2017MENA, Fernanda. Portugal é o único da esquerda a governar à esquerda, diz sociólogo. Folha de São Paulo: São Paulo, 18 de junho de 2017. Disponível em: Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2017/06/1893753-portugal-e-o-unico-da-esquerda-a-governar-a-esquerda-diz-sociologo.shtml . Acesso em 08 set. 2019.
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) por meio de políticas econômicas anticíclicas e retomada do Estado de bem-estar social.

Em ambos partidos, o uso dos dispositivos comunicacionais da internet representa uma importante forma de participação política. Na Espanha, o uso dos canais de comunicação online permite o desenvolvimento de novas formas de participação e ação política que combina espaços de militância com participação online e articulação com uma forte liderança midiática, como destaca Subirats (2015)SUBIRATS, Joan. Todo se mueve. Acción colectiva, acción conectiva. Movimientos, partidos e instituciones. Revista Española de Sociología, v. 24, p. 123-131, 2015., assim como a introdução de inovações nas campanhas digitais (PENTEADO et al., 2017PENTEADO, Claudio Luis de Camargo; SOUZA, Paulo Roberto Elias; FIACADORI, Giuliana. Um estudo sobre a campanha eleitoral no Facebook do Unidos Podemos nas eleições gerais espanholas de 2016. 2017. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B4ZGK8qAQTozMmtkcWxoNVNlbVE/view . Acesso em 09 mar. 2019.
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). Em Portugal, o Bloco de Esquerda também se caracteriza pelo uso dos recursos de internet, em especial o uso da plataforma Esquerda Net (esquerda.net), um portal de informação alternativa que busca a construção de uma crítica de esquerda.

Os diferentes dispositivos de comunicação da internet permitiram a formação de um espaço discursivo ilimitado, com a possibilidade de construções de discursos alternativos e concorrentes, participação e engajamento online, espaço para discussão de questões públicas e oportunidade para que todos os usuários possam expressar suas opiniões (RASMUSSEN, 2013RASMUSSEN, Terje. Internet-based media, Europe and the political public sphere. Media, Culture & Society, v. 35, n. 1, p. 97-104, 2013.). A mudança estrutural do ecossistema de comunicação produz formas de ação política que operam pela circulação e produção de informações políticas, assim como permitem a entrada de novos atores políticos (como o caso do Podemos), e a reconfiguração das práticas políticas de atores já existentes (como o caso do Bloco de Esquerda), inserindo uma nova dinâmica no campo político (PENTEADO, 2011PENTEADO, Claudio Luis de Camargo. Marketing político na era digital: perspectivas e possibilidades. Revista USP, n. 90, p. 6-23, 2011.), no qual a estratégia de comunicação assume um papel central na dinâmica do jogo político contemporâneo.

O uso de mídias digitais por atores sociais, partidos e figuras políticas

Bennett (2012)BENNETT, Lance. The personalization of politics: political identity, social media and changing patterns of participation. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science, v. 644, n. 1, p. 20-39, 2012. argumenta que a internet liga uma vasta rede de nós, conectando atores muito distantes. Essa organização permite a formação de nós eu-centrados, mas também possibilita que esses nós se liguem incansavelmente a outros, facilitando a produção e distribuição de conteúdo multimídia. Nesse contexto a participação política se dá a partir da ação em rede digital recombinada, tanto por atores sociais quanto por representantes políticos presentes nas redes.

Bimber (2017)BIMBER, Bruce. Three prompts for collective action in the context of digital media. Political Communication, v. 34, n. 1, p. 6-20, 2017. indica que analisar o uso ou ausência do uso de mídias sociais em manifestações e ações coletivas não pode se restringir a uma variável individual. Para o autor, a tecnologia deve ser analisada a partir do contexto político em que está inserida. Em um ambiente comunicacional ancorado em mídias digitais as oportunidades para ações coletivas se expandem pela multiplicação de formas de informação e comunicação no sistema. Nesse sentido, Bimber (2017)BIMBER, Bruce. Three prompts for collective action in the context of digital media. Political Communication, v. 34, n. 1, p. 6-20, 2017. argumenta que informação e comunicação são fatores estruturais para construção de identidade, coordenação, persuasão e outros aspectos relativos à ação coletiva.

Para Bimber (2017)BIMBER, Bruce. Three prompts for collective action in the context of digital media. Political Communication, v. 34, n. 1, p. 6-20, 2017. a personalização de frames por movimentos sociais, investigada por Bennett (2012)BENNETT, Lance. The personalization of politics: political identity, social media and changing patterns of participation. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science, v. 644, n. 1, p. 20-39, 2012., é uma das maneiras encontradas por essas organizações para apelar diante de diferentes grupos de indivíduos a partir de múltiplas demandas e interesses. Nesse sentido, a teoria de ação conectiva elaborada por Bennett e Segerberg (2012)BENNETT, Lance; SEGERBERG, Alexandra. The logic of connective action. Information, Communication & Society, v. 15, n. 5, p. 739-768, 2012. seria uma abordagem adequada para os novos rumos da ação coletiva em um ambiente comunicacional híbrido.

Em outra perspectiva, Kavada (2015KAVADA, Anastasia. Creating the collective: social media, the Occupy Movement and its constitution as a collective actor. Information, Communication & Society, v. 18, n. 8, p. 872-886, 2015.) analisa como os participantes do Occupy vieram a constituir um ator coletivo e o papel de mídias sociais nesse processo a partir da coleta de material produzido em redes sociais online vinculadas ao movimento e entrevistas com participantes dos protestos. Seguindo a perspectiva da tendência CCO - Comunicação é Constitutiva de Organização, Kavada reforça a importância da comunicação na teoria da ação conectiva de Bennett e Segerberg (2012)BENNETT, Lance; SEGERBERG, Alexandra. The logic of connective action. Information, Communication & Society, v. 15, n. 5, p. 739-768, 2012., essencial na estrutura de uma ação coletiva suportada por mídias digitais. Parte fundamental da identidade coletiva é a criação de textos e códigos característicos do grupo, referente a valores, práticas, demandas, entre outros elementos. Os textos e códigos são responsáveis por diferenciar identidades e reivindicações e também compõem a maneira de comunicar e informar do grupo. Kavada conclui que, no caso do Occupy, assim como elaborado em Bennett e Segerberg (2012)BENNETT, Lance; SEGERBERG, Alexandra. The logic of connective action. Information, Communication & Society, v. 15, n. 5, p. 739-768, 2012., mídias digitais podem atuar como agentes de organização em formas de ação coletiva (ou conectiva), mas ainda é identificada a necessidade de se constituir uma identidade coletiva entre os participantes.

Contribuindo com os estudos da ação coletiva baseada no ambiente online, Dolata e Schrape (2016)DOLATA, Ulrich; SCHRAPE, Jan-Felix. Masses, crowds, communities, movements: Collective action in the internet age. Social Movement Studies, v. 15, n. 1, p. 1-18, 2016. investigam como coletivos sociais formados na internet podem ser classificados e distinguidos, e qual a influência das infraestruturas tecnológicas - sob as quais operam - em sua formação, estrutura e atividades. Os autores dividem coletivos sociais digitais em dois grupos: coletivos não organizados que agregam fracamente comportamento coletivo e atores coletivos com capacidade estratégica e identidade definida. Nesse sentido, tecnologias digitais agem como agentes organizadores (BENNETT; SEGERBERG, 2012BENNETT, Lance; SEGERBERG, Alexandra. The logic of connective action. Information, Communication & Society, v. 15, n. 5, p. 739-768, 2012.) ou, no mínimo, servem como incentivos para conectar pessoas (BIMBER, 2017BIMBER, Bruce. Three prompts for collective action in the context of digital media. Political Communication, v. 34, n. 1, p. 6-20, 2017.).

De acordo com Dolata e Schrape (2016)DOLATA, Ulrich; SCHRAPE, Jan-Felix. Masses, crowds, communities, movements: Collective action in the internet age. Social Movement Studies, v. 15, n. 1, p. 1-18, 2016., coletivos não organizados têm maior facilidade de se desenvolver no meio online, pois a internet possui características permissivas para explorar informações e formas de comunicação; características de coordenação e regulação aptas para estruturar atores coletivos; e apresenta um novo meio de controle social. Nesse sentido, o suporte de mídias digitais permite a organização do comportamento de coletivos não organizados para que se tornem atores coletivos, em consonância com o trabalho de Bennett e Segerberg (2012)BENNETT, Lance; SEGERBERG, Alexandra. The logic of connective action. Information, Communication & Society, v. 15, n. 5, p. 739-768, 2012. sobre a lógica da ação conectiva.

Na perspectiva política institucional, o debate sobre as estratégias de comunicação digital empregadas por partidos e figuras políticas em redes sociais online se estende aos anos 90 e articula diferentes métodos de análise e objetos, reforçado pelo desenvolvimento de plataformas como o Twitter e o Facebook. Segundo Gibson (2015)GIBSON, Rachel K.. Party change, social media and the rise of ‘citizen-initiated’ campaigning. Party Politics, v. 21, n. 2, p. 183-197, 2015., a adoção de mídias digitais por partidos políticos em sua estratégia de comunicação está associada à delegação de tarefas fundamentais de campanha para indivíduos que não são membros do partido. Gibson (2015)GIBSON, Rachel K.. Party change, social media and the rise of ‘citizen-initiated’ campaigning. Party Politics, v. 21, n. 2, p. 183-197, 2015. argumenta que mídias digitais possibilitam a articulação de novas formas de campanha baseadas na organização de cidadãos. A prática teria sido definida durante a campanha presidencial de Barack Obama em 2008 e adotada nas eleições britânicas de 2010, desafiando o modelo de campanha instaurado após a Segunda Guerra. Gibson (2015)GIBSON, Rachel K.. Party change, social media and the rise of ‘citizen-initiated’ campaigning. Party Politics, v. 21, n. 2, p. 183-197, 2015. ainda aponta que essa nova forma de campanha foi praticada fora dos EUA e está ligada tanto a grandes partidos quanto a partidos políticos com restrições de recursos.

Por sua vez, Kalsnes (2016)KALSNES, Bente. The social media paradox explained: comparing political parties’ Facebook strategy versus practice. Social Media+Society, v. 2, n. 2, p. 1-11, 2016. comparou a estratégia e a utilização da plataforma Facebook por partidos políticos noruegueses durante a campanha eleitoral de 2013. O autor notou que partidos e políticos exprimem sua vontade de utilizar mídias digitais como uma forma de interagir com seus eleitores, no entanto, sua estratégia online indica que essas plataformas são utilizadas apenas como um meio de broadcasting. Segundo Kalsnes (2016)KALSNES, Bente. The social media paradox explained: comparing political parties’ Facebook strategy versus practice. Social Media+Society, v. 2, n. 2, p. 1-11, 2016., muitos partidos políticos hesitam em utilizar mídias digitais por restrições de tempo e recursos e pela possível perda de controle do espaço por conta do comportamento ofensivo de alguns usuários e da publicação autônoma de conteúdo por parte de candidatos. O estudo de Magin et al. (2016)MAGIN, Melanie; PODSCHUWEIT, Nicole; HAßLER, Jörg; RUSSMAN, Uta. Campaigning in the fourth age of political communication; A multi-method study on the use of Facebook by German and Austrian parties in the 2013 national election campaigns. Information, Communication & Society, v. 20, n. 11, p. 1698-1719, 2017. corrobora com essa verificação em sua análise de campanhas políticas alemãs e austríacas a partir do uso de páginas partidárias no Facebook durante as eleições de 2013. A resistência em explorar o potencial interativo de plataformas como o Facebook também é notada por Sørensen (2016)SØRENSEN, Mads P.. Political conversations on Facebook-the participation of politicians and citizens. Media, culture & society, v. 38, n. 5, p. 664-685, 2016., o qual analisa a conversação política desenvolvida em publicações do Facebook de membros do parlamento dinamarquês fora do período eleitoral.

A emergência de novas lideranças de características populistas também tem gerado estudos sobre o uso das redes sociais de internet. O estudo de Ernst et al. (2017)ERNST, Nicole; ENGESSER, Sven; BÜCHEL, Florin; BLASSNIG, Sina; ESSER, Frank. Extreme parties and populism: an analysis of Facebook and Twitter across six countries. Information, Communication & Society, v. 20, n. 9, p. 1347-1364, 2017. indicou que o caráter populista do conteúdo produzido se manifesta, preferencialmente no Facebook, de forma fragmentada tanto na extrema direita quanto na extrema esquerda e por partidos da oposição. Segundo Ernst et al. (2017)ERNST, Nicole; ENGESSER, Sven; BÜCHEL, Florin; BLASSNIG, Sina; ESSER, Frank. Extreme parties and populism: an analysis of Facebook and Twitter across six countries. Information, Communication & Society, v. 20, n. 9, p. 1347-1364, 2017. a comunicação populista foi identificada em maior escala em publicações do Facebook que em publicações do Twitter, considerando que a primeira plataforma permite o estabelecimento de relações mais próximas entre representante e representado (seguidores, amigos e curtidas) e possibilita uma forma de comunicação altamente personalizada.

Rohlinger e Bunnage (2017)ROHLINGER, Deana A.; BUNNAGE, Leslie. Did the Tea Party movement fuel the Trump-train? The role of social media in activist persistence and political change in the 21st century. Social Media+ Society, v. 3, n. 2, p. 1-11, 2017. consideram que o movimento mais relevante na ascensão de Trump à presidência foi o Tea Party, levando em conta a semelhança no discurso populista de ambos. Os cidadãos envolvidos no movimento que apoiou Trump se organizaram a partir de mídias sociais e atribuem seu sucesso a esse meio de comunicação, além da possibilidade de compartilhar conteúdo, se conectar com outros entusiastas do Tea Party e debater ideias políticas em um espaço democrático não partidário. Entretanto, para os ativistas entrevistados por Rohlinger e Brunnage (2017)ROHLINGER, Deana A.; BUNNAGE, Leslie. Did the Tea Party movement fuel the Trump-train? The role of social media in activist persistence and political change in the 21st century. Social Media+ Society, v. 3, n. 2, p. 1-11, 2017. o Partido Republicano se utilizou dessa estrutura baseada em rede para orientar o movimento de acordo com seus propósitos.

Para a compreensão da atuação online das lideranças do Podemos e do Bloco de Esquerda no Facebook é importante ter um quadro da penetração da plataforma em Portugal e na Espanha. Em termos de conectividade, de acordo com a base de dados do Banco Mundial (2019)BANCO MUNDIAL. Individuals using the Internet (% of population). 2019. Disponível em: Disponível em: http://data.worldbank.org/indicator/IT.NET.USER.ZS?locations=PT . Acesso em 08 set. 2019.
http://data.worldbank.org/indicator/IT.N...
, atualmente mais de 7,5 milhões de portugueses possuem acesso à internet. Dados enviados pelo Facebook à mídia de notícias “Observador” revelaram que 6 milhões dos cidadãos portugueses conectados utilizam a plataforma (MACHADO, 2018MACHADO, Manuel Pestana. Há seis milhões de portugueses no Facebook. Smartphones dominam acessos. Observador: Lisboa, 7 de maio de 2018. Disponível em: Disponível em: https://observador.pt/2018/05/07/ha-seis-milhoes-de-portugueses-no-facebook-smartphones-dominam-acessos/ . Acesso em 08 set. 2019.
https://observador.pt/2018/05/07/ha-seis...
).

O uso de redes sociais online na comunicação política espanhola se popularizou com os protestos do 15M e a partir desse momento a importância da tecnologia na disputa política se elevou. Atualmente 38 milhões de espanhóis estão conectados, e dessa população, 24 milhões acessam a rede social Facebook (STATISTA RESEARCH DEPARTMENT, 2019STATISTA RESEARCH DEPARTMENT. La red social Facebook en España - Datos estadísticos. 2019. Disponível em: Disponível em: https://es.statista.com/temas/4162/facebook-en-espana/ . Acesso em 08 set. 2019.
https://es.statista.com/temas/4162/faceb...
).

Dada a mudança na lógica de comunicação política nos últimos anos, representantes políticos buscam formular estratégias híbridas combinando meios de comunicação para obter visibilidade e projeção nacional (BENNETT, 2012BENNETT, Lance. The personalization of politics: political identity, social media and changing patterns of participation. The ANNALS of the American Academy of Political and Social Science, v. 644, n. 1, p. 20-39, 2012.). Tanto o Bloco de Esquerda quanto o Podemos possuem páginas no Facebook para divulgar suas agendas e propostas, assim como questionar e cobrar posicionamentos de seus governos frente a questões políticas, sociais e econômicas.

TICs e partidos-movimentos

O uso das TICs no Podemos é uma realidade desde o lançamento do manifesto mobilizador de 2014, conforme exposto anteriormente. Em seu processo estruturante, a organização do partido em círculos contou principalmente com a possibilidade de realizar adesão, debate e participação em pautas e desenvolvimento de agendas por meio da internet. Foi deste modo que se desenvolveram os grupos de discussão desde o espaço regional, de bairros até o nível nacional, passando por grupos identitários, de educação e trabalhista (IGLESIAS, 2015aIGLESIAS Turrión, Pablo. Entender Podemos. New Left Review [Edição em espanhol], n. 93, p. 6-22, 2015a.; SEGURADO, 2016SEGURADO, Rosemary. Partido Podemos: novas práticas políticas na Espanha. E-legis, v. 9, n. 21, p. 7-22, 2016.).

Desde o processo de construção de confluências em torno do estabelecimento de candidaturas municipais com movimentos sociais até as gestões participativas, especialmente em Barcelona por meio da plataforma “Decidim Barcelona” e na capital espanhola por meio da “Decide Madrid”, onde é possível para qualquer cidadão se cadastrar e propor, debater, revisar, avaliar e votar projetos de âmbitos locais (bairros) e municipais, utilizar as redes é uma estratégia e modus operandi especial para o partido espanhol em sua intenção de criar e ampliar espaços de participação política e incentivar o aprofundamento da democracia (CASERO-RIPOLLÉS et al., 2016CASERO-RIPOLLÉS, Andreu; FEENSTRA, Ramón A.; TORMEY, Simon. Old and new media logics in an electoral campaign: the case of Podemos and the two-way sreet mediatization of politics. The International Journal of Press/Politics, v. 21, n. 3, p. 378-397, 2016.).

O partido espanhol mantém um site oficial (podemos.info) que concentra as principais informações acerca do partido (história, estatuto, programa político, transparência, resultado dos congressos nacionais), links para os canais de participação online, para as redes sociais do partido no Facebook, Twitter, YouTube, dentre outros recursos.

O Podemos ainda possui canais de comunicação abertos na rede de mensagens diretas Telegram, na qual as principais lideranças políticas do partido mantêm seus meios de informação direta com os interessados, além do canal geral do partido e outros canais temáticos/identitários.

Ademais, há ainda o caso particular do secretário-geral do Podemos Pablo Iglesias Turrión que utiliza a internet para veicular programas de debates de política em geral, como “La Tuerka”, e de entrevistas com acadêmicos, políticos e outras personalidades, em “Otra Vuelta de Tuerka”, que contribuem desde a emergência do partido para difundir a imagem, as referências e os posicionamentos de Iglesias e de outras lideranças políticas do Podemos em outros espaços que não somente os dos meios de comunicação tradicionais espanhóis (Iglesias, 2015aIGLESIAS Turrión, Pablo. Entender Podemos. New Left Review [Edição em espanhol], n. 93, p. 6-22, 2015a.; 2015b_______________________. España en la encrucijada. New Left Review [Edição em espanhol], n. 93, p. 23-42, 2015b.). Iglesias entrevistou diversos intelectuais que referenciaram a ele e a outras lideranças do partido em suas trajetórias acadêmicas e políticas, dentre eles Antonio Negri, Chantal Mouffe, Tariq Ali, Perry Anderson e Manuel Castells (LA TUERKA, 2019LA TUERKA. 2019. Disponível em: Disponível em: http://www.latuerka.net/ . Acesso em 08/09/2019.
http://www.latuerka.net/...
).

Em poucas palavras, trata-se de um processo de distinção e superação dos partidos políticos tradicionais em sua forma, estrutura, dinâmica e galáxia comunicativa para além dos meios de comunicação tradicionais, tendo as TICs como seu principal meio e espaço social (CALLE, 2015CALLE, Colado Ángel. Podemos y el auge municipalista: sobre partidos-ciudadanías y vieja política. EMPIRIA: Revista de metodología de Ciencias Sociales, n. 32, p. 169-190, 2015.). As estratégias de comunicação do Podemos o tornam um partido transmidiático, que tem a comunicação como princípio estruturante e diferencial entre outros partidos de esquerda.

No caso português, desde 2006 o Bloco de Esquerda mantém um site oficial do partido (bloco.org) e um site de notícias ligado ao mesmo (esquerda.net). O portal do Bloco de Esquerda disponibiliza informações gerais sobre o partido, propostas e políticas, documentos como resoluções e manifestos, notícias e informações sobre grupos especiais de filiados como jovens universitários e idosos com mais de 60 anos; a atualização da página é diária com veiculação de notícias e comunicados sobre as autarquias e sobre as esferas nacional e internacional.

O portal jornalístico “Esquerda Net” busca transmitir notícias de forma rápida, mas também produz dossiês e matérias mais aprofundadas em certos temas. O site reproduz a opinião de diversas personalidades do partido e de pessoas fora do Bloco, tanto cidadãos portugueses quanto estrangeiros. Além de matérias em texto, o Esquerda Net apresenta conteúdo em vídeos, transmissões ao vivo e fotos, com foco na interação com o usuário.

O Bloco também está presente em redes sociais online como Facebook, YouTube, Twitter e Instagram, com produção diária de conteúdo. No entanto, o partido utiliza perfis e páginas vinculados à sua mídia de notícias para se comunicar com o público português por meio dessas plataformas. Em todos os portais que o partido utiliza há a possibilidade de comunicação com o usuário.

O conteúdo publicado nas redes sociais de internet durante a campanha para as eleições legislativas portuguesas de 2015 foi elaborado em conjunto entre a coordenação política e os jovens filiados ao partido a fim de produzir conteúdo que dialogasse com esse grupo. O material publicado nessas redes era condensado pela direção de campanha para que se tornasse facilmente compartilhável e com linguagem adequada às redes. Um exemplo deste material é a conversão das principais propostas do programa eleitoral em curtos vídeos para o Instagram e para o Twitter, e em vídeos mais longos para o Facebook (CORTÊS, 2017CORTÊS, Emmanuel de Oliveira. Estratégias de Comunicação Política nos média das juventudes partidárias em Portugal, para as eleições legislativas de 2015: um estudo de caso com as juventudes partidárias dos partidos políticos representados na XIII legislatura portuguesa. Dissertação (Mestrado em Comunicação, Cultura e Tecnologias da Informação). Lisboa: Instituto Universitário de Lisboa, 2017.).

Entre os temas abordados pelas publicações, destaca-se a prioridade de temas ligados à precariedade e ao emprego, problemas que afetam milhares de jovens portugueses. Ademais, o Bloco publicou mensagens ligadas às áreas de educação, migração e habitação (idem).

Em um estudo sobre comunicação partidária online, Silva (2012)SILVA, Catarina Isabel Pereira e. A comunicação partidária online: os websites num contexto não eleitoral. Dissertação (Mestrado em Ciência Política). Aveiro: Universidade de Aveiro, 2012. identificou que o Bloco de Esquerda está entre os partidos que mais utilizam novas tecnologias em Portugal. A partir da análise de conteúdos publicados por meio de redes sociais online, a autora notou que o Bloco concentra suas maiores porcentagens no eleitorado jovem, com menos de 35 anos, em residentes de centros urbanos, no eleitorado com formação superior e em eleitores com rendimentos razoáveis, características de cidadãos que apresentam maior proximidade com o uso de TICs.

Além dos meios de comunicação oficiais do partido, seus representantes também mantêm perfis e páginas em redes sociais online. A coordenadora do Bloco, Catarina Martins, e a deputada Marisa Matias utilizam principalmente o Facebook e o Instagram como meios de comunicaçãoMATIAS, Marisa. Sobre [S. I.]. Disponível em: Disponível em: https://www.facebook.com/pg/MATIAS.Marisa/about/?ref=page_internal . Acesso em 08 set. 2019.
https://www.facebook.com/pg/MATIAS.Maris...
. Nessas redes as representantes do Bloco de Esquerda publicam fotos, textos e vídeos que reproduzem conteúdo de suas vidas pessoais como também de sua atuação política em Portugal. Nesse sentido, tem-se a pergunta: quais as estratégias de comunicação mobilizadas por essas lideranças políticas no Facebook e quais delas recebem maior engajamento por parte de seus seguidores?

Metodologia

A seleção das páginas dos representantes políticos foi realizada a partir da verificação de lideranças com o maior número de seguidores. Assim, do Podemos foram selecionadas as páginas oficiais do secretário-geral Pablo Iglesias (702.264 seguidores) e do secretário de análise estratégica Íñigo Errejón (392.328 seguidores), ambos deputados pelo partido. Do português Bloco de Esquerda foram selecionadas as páginas oficiais de Catarina Martins, a coordenadora do partido, com 73.227 seguidores, e de Marisa Matias, deputada que foi candidata à presidência em 2015, com 79.448 seguidores.

Para a extração de dados da rede social online, as páginas foram submetidas a uma busca de publicações por meio da ferramenta “Facepager”. Foram coletadas publicações postadas no período de 1º de julho de 2016 a 30 de abril de 2018 (22 meses), período considerado suficiente para abranger campanhas eleitorais e períodos não-eleitorais, e a coleta total permitida pela ferramenta no momento. O total de postagens por liderança está representado no quadro 01.

Quadro 01.
Total de publicações coletadas

A análise dos dados foi dividida em três etapas: a primeira trabalhou com a totalidade dos dados coletados. Por meio da análise dos metadados das publicações, fornecidos pela API do Facebook, foram analisados o engajamento das postagens e o tipo de publicação (type).

A segunda etapa trabalhou com a análise de conteúdo das publicações com maior engajamento. Foi selecionada uma amostragem com os 50 posts mais engajados de cada liderança estudada, totalizando 200 publicações. Essa amostra foi categorizada de acordo os principais temas discutidos e os recursos utilizados, categorias desenvolvidas e aplicadas em outras pesquisas (BACHINI et al., 2015BACHINI, Natasha; PENTEADO, Claudio Luis de Camargo; MARTINHO, Silvana; AVANZI, Clarice. Curtiu? O uso do Facebook nas eleições municipais de São Paulo em 2012. In: ALDÉ, A.; MARQUES, J. (Org.). Internet e poder local. Salvador: UFBA, 2015, p. 141-176.; PENTEADO et al., 2017PENTEADO, Claudio Luis de Camargo; SOUZA, Paulo Roberto Elias; FIACADORI, Giuliana. Um estudo sobre a campanha eleitoral no Facebook do Unidos Podemos nas eleições gerais espanholas de 2016. 2017. Disponível em: Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B4ZGK8qAQTozMmtkcWxoNVNlbVE/view . Acesso em 09 mar. 2019.
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).

Por fim, foi construída a rede de curtidas de cada ator político em estudo com o objetivo de identificar suas redes de relações e conexões. Essa construção foi realizada por meio do software Gephi, para identificar os rastros digitais e a formação de coletivos sociotécnicos (BRUNO, 2012BRUNO, Fernanda. Rastros digitais sob a perspectiva da teoria ator-rede. Revista FAMECOS: mídia, cultura e tecnologia, v. 19, n. 3, p. 681-704, 2012.) de interação das lideranças em estudo.

Resultados

A partir da análise dos metadados da totalidade dos dados coletados foi possível identificar o engajamento que cada liderança conseguiu mobilizar nos 22 meses (julho de 2016 a abril de 2018) analisados, conforme ilustra o quadro 2.

Quadro 02.
Engajamento das Lideranças

A partir do quadro 2 é possível identificar que as lideranças do Podemos conseguem produzir maior engajamento que as representantes do Bloco de Esquerda. Também é possível observar que os podemistas conseguem produzir um grande número de compartilhamentos, em especial Errejón, o que permite ampliar o alcance orgânico de suas publicações para além de seus seguidores. No caso das representantes do Bloco de Esquerda vale destacar que, mesmo tendo o menor número de engajamento, os comentários de suas postagens (em torno de 10% do engajamento) indicam uma maior interatividade em suas publicações.

Gráfico 1.
Liderança x tipo de publicação

Os dados do gráfico 1 permitem visualizar que os representantes do Podemos utilizam prioritariamente vídeos como estratégias de comunicação, especialmente Errejón. Dois terços do tipo de publicação dos podemistas juntos são vídeos, enquanto as lideranças portuguesas optam pelo uso de fotos (cerca de metade da publicação de ambas somadas), e no caso particular de Catarina Martins, o uso de links em suas postagens.

A seguir, no terceiro quadro apresentam-se os dados de análise de conteúdo da amostra de 50 publicações com maior engajamento de cada liderança:

Quadro 03.
Recursos utilizados pelas lideranças

Com base nos dados do quadro 3 identifica-se que os recursos com maior incidência das publicações mais engajadas de Pablo Iglesias são Vídeo + Texto (60%) e somente Texto (12%). Metade das publicações de Íñigo Errejón apresentam vídeos com texto (50%) e 28% das mensagens utilizam vídeo, link e texto. Catarina Martins utilizou a combinação de Foto e Texto em metade das publicações analisadas e compartilhou mensagens postadas por outras páginas como Esquerda Net e a página de Marisa MatiasMATIAS, Marisa. Sobre [S. I.]. Disponível em: Disponível em: https://www.facebook.com/pg/MATIAS.Marisa/about/?ref=page_internal . Acesso em 08 set. 2019.
https://www.facebook.com/pg/MATIAS.Maris...
, o que configura 26% de suas publicações (Link). Em 36% de suas publicações Marisa Matias apresentou a combinação entre Foto e Texto, seguido por 18% em publicações com apenas Foto e apenas Texto.

Quadro 04.
Temas abordados pelas lideranças

De acordo com o quadro 4, os temas mais abordados nas publicações de maior engajamento de Pablo Iglesias são ataques a políticos, partidos ou governos, tanto espanhóis quanto estrangeiros, o que representa 24 publicações. O segundo tema mais popular nas publicações de Iglesias se divide entre economia, presente em 4 posts, a partir da publicação de vídeos explicativos sobre questões da área, e corrupção, posts direcionados a casos de corrupção na esfera política espanhola. Os ataques a outros políticos, partidos ou governos também compõem os temas mais abordados por Íñigo Errejón, seguido por publicações que abordam sexismo. Ambos os representantes do Podemos apresentam 8% de publicações no tema de corrupção, nas quais criticam especialmente a corrupção no governo espanhol. Em uma publicação de 2018 Errejón faz menção à recuperação econômica desenvolvida em Portugal com o novo governo a partir de um vídeo produzido pela mídia Play Ground.

A página de Catarina Martins alcançou engajamento em diversas mensagens de conteúdo pessoal, em sua maioria fotos de seu cotidiano, compondo 22% dos dados analisados. Publicações sobre os incêndios em algumas regiões de Portugal em 2017, ataques a outros políticos, partidos ou governos e mensagens com outros temas foram abordados na mesma medida pela coordenadora do Bloco (12%). Assim como Catarina Martins, a maioria das publicações com maior engajamento de Marisa Matias eram mensagens de conteúdo pessoal (22%). A deputada bloquista ainda abordou vitórias de atletas e homenagens a personalidades portuguesas, além de confrontar o sexismo e a violência contra mulheres em 10% de suas publicações.

Quadro 05.
Temas com maior interação por parte das lideranças

A deputada Marisa Matias apresentou interação com usuários em 17 das 50 publicações analisadas de sua página. Matias respondeu comentários de seguidores, rebateu críticas, apresentou propostas, explicou seu posicionamento em alguns assuntos, agradeceu elogios, recebeu e comentou material jornalístico enviado por seguidores, entre outras ações.

O quadro 05 apresenta os temas das publicações nas quais Matias respondeu seus seguidores. De acordo com o quadro, a deputada teve maior interação em publicações de conteúdo pessoal. Esse comportamento é condizente com a declaração na seção “Sobre” da página da deputada, na qual explica que busca responder mensagens e comentários, pois “A troca de impressões distintas, o choque de ideias antagônicas fazem parte da cultura democrática - e ainda bem que assim é.” (MATIAS, sd). O podemista Íñigo Errejón interagiu com usuários na seção de comentários por três vezes: para agradecer desejos de feliz aniversário, para expressar vergonha diante da corrupção do PP e para replicar a uma observação feita por um seguidor.

Quadro 06.
Tipo de publicação x engajamento

O quadro 6 apresenta os tipos de publicação que receberam maior engajamento em cada campo (reações, comentários e compartilhamentos) por parte dos seguidores das lideranças. A publicação mais comentada de Pablo Iglesias diz respeito a um texto de outubro de 2017 em que faz uma objeção a uma medida tomada pelo Rei da Espanha; sua publicação com mais reações também é um texto, explicando que não participará das homenagens a uma falecida senadora espanhola envolvida em casos de corrupção; por fim, o post mais compartilhado de Iglesias é um vídeo sobre sexismo.

Em relação às publicações de Errejón, o post mais comentado é uma foto do podemista no dia de seu aniversário; a publicação com mais reações é um trecho retirado de uma série americana sobre a questão dos EUA serem o melhor país do mundo; e a publicação mais compartilhada é um vídeo de uma deputada do Podemos realizando um protesto contra o Ministro da Saúde.

A publicação mais comentada de Catarina Martins se refere a uma foto sobre os incêndios ocorridos em Portugal no ano de 2017; seu post com mais reações também é uma foto, uma homenagem à Revolução dos Cravos de 25 de abril de 1974; finalmente, sua publicação mais compartilhada é um vídeo de seu discurso sobre a prisão do ex-presidente brasileiro Lula. Já a deputada pelo Bloco de Esquerda apresenta a mesma publicação como a mais compartilhada, comentada e com mais reações, um vídeo sobre sua intervenção em uma sessão no Parlamento Europeu em que questiona o presidente francês Emmanuel Macron em diversas questões.

Com a finalidade de identificar as redes de relação das lideranças dentro do Facebook, abaixo apresentamos os grafos com as redes de curtidas dos representantes políticos.

Imagem 1.
Grafo da rede de curtidas de Catarina Martins

A imagem 1 apresenta a rede de curtidas da página de Catarina Martins em nível 2, ou seja, retrata a rede formada pela página da coordenadora do Bloco, pelas páginas curtidas por ela e pelas páginas curtidas por essa segunda camada de nós. É possível identificar três nós: a página de Catarina Martins, a página do Esquerda Net e a página Portugal Left News. Nota-se que Catarina Martins curte apenas a página do Esquerda Net, enquanto o Esquerda Net curte e é curtido por Portugal Left News, página que reproduz as notícias do Esquerda Net em língua inglesa.

Imagem 2.
Grafo da rede de curtidas de Marisa Matias

No nível 2 a rede de Marisa Matias se apresenta tal como a rede de Catarina Martins: a página apresenta apenas uma ligação, a página do Esquerda Net, e se relaciona com a página Portugal Left News em segundo grau.

Imagem 3.
Grafo da rede de curtidas de Pablo Iglesias

A rede de curtidas de Pablo Iglesias apresenta um comportamento diferente ao das lideranças portuguesas. A partir da Imagem 3 é possível identificar a formação de 4 clusters (rosa, verde, laranja e azul) na rede de curtidas da página de Pablo Iglesias. O cluster laranja é centrado nas páginas de Iglesias e de Irene Montero, deputada pelo Podemos, e liga as páginas de outras figuras do partido como Rafael Mayoral, Ramón Espinar e Alberto Rodríguez, e páginas relacionadas à pauta das mulheres na política como a página “Podemos Unidas” e a página da política podemista Noelia Vera. O cluster verde se desenvolve a partir das páginas do Podemos, de Pablo Echenique, deputado pelo partido, e de Íñigo Errejón, e articula páginas regionais podemistas.

O cluster rosa se situa em torno de diversas páginas, como a de Ada Colau, prefeita de Barcelona pelo Podemos, e liga páginas relacionadas à política da Catalunha, como as páginas “En Común Podem” e Elisenda Alamany. Neste cluster também é possível identificar páginas que pautam a defesa do meio ambiente como “Greenpeace España” e “Ecologistes en Acció”.

O cluster azul distribui as conexões a partir da página do partido “Catalunya en Comú”. Nota-se que o cluster azul possui diversas conexões com o cluster rosa. Este cluster apresenta a menor quantidade de nós na rede e liga páginas como “Al Rojo Vivo”, um programa televisivo, “GEPEC en Xarxa”, um grupo de estudos catalão e páginas de outras mídias catalãs.

Os dados extraídos do perfil de Errejón indicaram que sua página não interage com outras páginas, não sendo possível apresentar o grafo de relações, e ao mesmo tempo indica que o podemista não atua dentro de uma lógica de redes em sua página no Facebook.

Considerações finais

Os resultados deste trabalho permitem notar como os partidos Podemos e Bloco de Esquerda têm as TICs como meio e espaço de se fazer política e que, consequentemente, é possível perceber esta dinâmica por meio da atuação das principais lideranças destes emergentes partidos-movimentos na internet.

Assim, é possível afirmar que as redes sociais online como o Facebook se tornaram uma nova plataforma para a divulgação de informações e comunicação direta com a população. Cada liderança faz um uso específico do Facebook para interação com seus seguidores. Em relação à intensidade de uso da plataforma, entre as lideranças analisadas neste trabalho, é a deputada Catarina Martins do Bloco de Esquerda quem se destaca em relação aos outros perfis, com a maior quantidade de publicações durante o período analisado.

Os espanhóis Iglesias e Errejón conseguem atingir um número muito superior de engajamento que as portuguesas. De certa forma, essa forte interação mostra a maior popularidade e força política do Podemos em relação ao Bloco de Esquerda, ao mesmo tempo em que é necessário ponderar esta força, uma vez que a população portuguesa que possui um perfil no Facebook corresponde a menos de um terço da população espanhola com perfil na rede. Foi possível também identificar que as publicações das lideranças espanholas conseguem provocar um maior número de compartilhamentos, principalmente o podemista Errejón. Já Catarina Martins se destaca por alcançar um número significativo de comentários em suas publicações em geral. Na análise qualitativa dos comentários foi possível identificar que a liderança portuguesa usa o canal para interagir diretamente com seu público, com respostas a alguns comentários, conforme destacado anteriormente.

Em relação à estratégia de comunicação, alvo de estudo deste trabalho, pode-se observar que cada liderança prioriza um tipo diferente de publicação: os podemistas utilizam mais vídeos, enquanto as políticas portuguesas usam mais publicações com fotos (Marisa Matias) e links (Catarina Martins). Na análise dos posts com maior engajamento foi possível verificar que essa estratégia se mostrou adequada, pois esses formatos conseguiram produzir maior engajamento em geral.

Também em relação ao tema das publicações com maior engajamento, verifica-se que cada liderança tem um perfil diferente: Pablo Iglesias destaca-se com ataques aos políticos (principalmente do PP), Errejón por abordar uma maior variedade de temas e Catarina Martins e Marisa Matias com a divulgação de conteúdos pessoais. Apesar de se apresentar com maior ou menor incidência a depender da liderança, os ataques a políticos, partidos e governos estavam presentes nas publicações das quatro lideranças e configuram entre os temas mais engajados. Os resultados ilustram a representação dessas lideranças e a forma como interagem com seus seguidores.

Os grafos construídos a partir da rede de curtidas mostram que - com exceção de Pablo Iglesias, o qual tem uma forte rede de relações - as outras lideranças não interagem com outras páginas e perfis. No caso das representantes do Bloco de Esquerda é possível verificar que elas adotam uma estratégia de comunicação restrita às próprias fontes de informação do Bloco, funcionando como uma rede de broadcast. As portuguesas estruturam sua estratégia na publicação de conteúdo pessoal e no compartilhamento de informações por links, muitas vezes do Esquerda Net e não utilizam o poder de comutação de redes (CASTELLS, 2015CASTELLS, Manuel. Networks of outrage and hope: social movements in the Internet age. Nova Jersey: John Wiley & Sons, 2015.) possibilitado pela plataforma. Por outro lado, Iglesias é uma liderança que utiliza o Facebook como uma estrutura de comunicação para promover sua ação conectiva (BENNETT; SEGERBERG, 2012BENNETT, Lance; SEGERBERG, Alexandra. The logic of connective action. Information, Communication & Society, v. 15, n. 5, p. 739-768, 2012.), conectando com outros clusters, ampliando seu alcance orgânico e mostrando grande capacidade de comutação com outras redes (CASTELLS, 2007_________________ . Communication power and counter-power in the network society. International Journal of Communication, v. 1, n. 1, p. 238-266, 2007.).

As plataformas de redes sociais são importantes ferramentas para a prática política contemporânea e criam condições para a ação política de novos modelos de partidos políticos, como o Podemos e o Bloco de Esquerda. No caso do Facebook, pode-se observar que Pablo Iglesias e Catarina Martins optam por usar a rede social online como espaço para a comunicação direta com seus seguidores, sem ter a preocupação de estabelecer canais de diálogo com os usuários. Somente Pablo Iglesias cria uma interação com outras lideranças e nós que atuam na plataforma. Esses resultados sugerem verificar em futuras investigações se este comportamento está presente em outras mídias sociais e para verificar se essa estratégia também se replica em outras plataformas da web 2.0.

Referências Bibliográficas

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    14 Mar 2019
  • Aceito
    21 Jan 2020
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