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Transparência e acesso à informação: um estudo da demanda por informações contábeis nas universidades federais brasileiras

Transparency and access to information: A study of demand for accounting information in Brazilian federal universities

Resumo

Com a edição da Lei nº 12.527/11, a Lei de Acesso à Informação, o Brasil vivencia o início da implementação de uma política de acesso às informações públicas, instrumento de uma ampla política nacional com foco na transparência e no controle social dos atos públicos. O processo de convergência das normas contábeis aos padrões internacionais tem o mesmo objetivo, ou seja, de transparência na prestação de contas das informações governamentais, contábeis e financeiras. As universidades federais brasi-leiras, como entidades públicas, estão obrigadas a cumprir as regras de transparência e prestação de contas. Este trabalho apresenta resultados parciais de uma pesquisa de doutorado que, dentre outros objetivos, busca verificar o comportamento da demanda por informações contábeis nas universidades públicas federais após a edição da Lei de Acesso à Informação, compreendendo uma amostra de 59 universidades, nos dois primeiros anos de implementação da lei. Como metodologia, utiliza uma abordagem qualitativa, através de pesquisa bibliográfica e documental com levantamento de informações nos Relatórios Estatísticos disponíveis no portal do Sistema Eletrônico do Serviço de Informações ao Cidadão das universidades federais. Conclui que, nos dois primeiros anos da Lei de Acesso à Informação, em média, 60% das universidades federais apresentaram demanda por informações contábeis, apesar do esforço do Governo Federal em evidenciar os dados públicos nos portais, e que o número total desse tipo de demanda manteve-se praticamente inalterado entre o primeiro e o segundo ano de implementação da Lei em questão.

Palavras-chave:
Acesso à informação; Informação contábil; Informação pública; Transparência; Universidades públicas federais

Abstract

Through Law No 12.527/11, Law on Access to Information, Brazil experiences the beginning of the implementation of a policy on access to public information, which is an instrument of extensive national policy, focusing on transparency and social control of public acts. The International Convergence of Accounting Standards has the same goal, i.e., transparency of the inventory of current state government accounting and reporting practices. The Brazilian federal universities, as public entities, are required to comply with the rules of transparency and inventory accounting. The present study shows the results of a doctoral research that, among other objectives, endeavors to verify the behavior of demand for accounting information in public federal universities, after the implementation of law on access to information. The study included a sample of 59 universities during the first two years of implementation of the law on Access to Information. In this qualitative study, we conducted a bibliographical and documentary research to collect information on the Statistical Reports of the federal universities available on the website Electronic Citizen Service Information Systems. It may be concluded that during the first two years of the law on Access to Information, on average only 61% of the federal universities demanded financial information, despite the efforts of the federal government in disclosing public information on their websites. Furthermore, the total number of demands for information on accounting remained unchanged between the first and second year of implementation of law on Access to Information.

Keywords :
Access to information; Accounting information; Public information; Transparency; Federal public universities

Introdução

A transparência e o acesso às informações públi-cas são alguns dos pilares fundamentais de um governo aberto à participação social. Esse tema tem sido objeto de estudos de organismos internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial, a Orga-nização para a Cooperação e Desenvolvimento Econô-mico (OCDE) e a International Federation of Accountants (IFAC), bem como de organizações internacionais, espe-cialistas em pesquisas de direito à informação, como a Freedom of Information Advocates Network (FOIAnet), a Access Info Europe (AIE) e a Centre for Law and Democracy (CLD).

O Governo Federal brasileiro, na tentativa de tor-nar as contas públicas mais transparentes, tem adotado alguns instrumentos de Políticas Públicas de Informação, mecanismos legais para auxiliar na busca por dados mais transparentes. Recursos como portais de transparência, divulgação de planos, orçamentos, prestações de contas e o respectivo parecer prévio, participação popular e realização de audiências públicas, adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, entre outros, foram adotados por meio da Lei Complementar nº 101/2000 (Brasil, 2000Brasil. Lei Complementar n° 101, de 4 de maio de 2000. Estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 5 maio 2000. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/ lcp101.htm>. Acesso em: 20 jul. 2014.), também conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), além da Lei Comple-mentar nº 131/09 (Brasil, 2009Brasil. Lei Complementar n° 131, de 27 de maio de 2009. Determina a disponibilização, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Diário Oficial da União, Brasília, 28 maio 2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp131.htm> Acesso em: 20 jul. 2014.
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), do Decreto nº 7.185/10 (Brasil, 2010aBrasil. Decreto n° 7.185, de 27 de maio de 2010. Dispõe sobre o padrão mínimo de qualidade do sistema integrado de administração financeira e controle, no âmbito de cada ente da Federação. Diário Oficial da União, Brasília, 27 maio 2010a. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato 2007-2010/2010/decreto/d7185.htm>. Acesso em: 20 jul. 2014.
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) e da Lei n° 12.527/11, a Lei de Acesso à Informação (LAI) (Brasil, 2011bBrasil. Lei n° 12.527, de 18 de novembro de 2011. Regula o acesso a informações. Dispõe sobre os procedimentos a serem observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o acesso a informações. Diário Oficial da União, Brasília, 18 nov. 2011b. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527. htm>. Acesso em: 5 jul. 2014.
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).

A Lei de Acesso à Informação também define um número mínimo obrigatório de informações a serem divulgadas, dentre as quais as contábeis, financeiras e orçamentárias como objeto de transparência ativa. Os arts. 7° e 8° da referida lei preveem, dentre outros, dados pertinentes a repasses ou transferências de recursos financeiros, despesas públicas, administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos administrativos, além de informação relativa ao resultado de inspeções, auditorias, prestações e tomadas de contas realizadas pelos órgãos de controle interno e externo do governo. Na prática, os portais de transparência têm disponibilizado, primeiramente, as informações contábeis, pois seu sistema tem a finalidade de coletar os dados, classificá-los e mensurá-los mo-netariamente de forma a sumarizá-los em relatórios contábeis, a base para as auditorias nas instituições pú-blicas para a prestação de contas.

A transparência das contas públicas no Brasil ganhou ainda mais evidência com a reforma da contabi-lidade governamental, que busca informações cada vez mais comparáveis e compreensíveis (Wynne, 2004Wynne, A. Is the move to accrual based accounting a real priority for public sector accounting? London: Association of Chartered Certified Accountants, 2004. Available from: <https://bambangkesit.files.wordpress.com/2011/02/accrual-based-accounting-bab-4.pdf>. Cited: Aug. 21, 2013.
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; Chan, 2010Chan, J.L. As NICSPS e a contabilidade governamental de países em desenvolvimento. Revista de Educação e Pesquisa em Contabilidade, v.4, n.1, p.1-17, 2010.; Van Der Hoek, 2010Van Der Hoek, M.P. Accountability in the public sector: The dutch experience. Economic Sciences, v.3, n.52, 2010. p.341-352. Disponível em: <http://but.unitbv.ro/BU2010/Series%20V/BULETIN%20V%20PDF/341%20Van%20de%20Hoek% 202.pdf>. Acesso em: 21 jul. 2012.
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). Esse processo, o qual teve início com a International Federation of Accountants (IFAC) em 1977, objetivando fortalecer mundialmente a conta-bilidade do setor público, desenvolveu normas contábeis de alta qualidade que já geraram impactos em diversos países (Chan, 2003Chan, J.L. Government accounting: An assessment of theory, purposes and standards. Public Money and Management, v.23, n.1, p.15-19, 2003. Available from: <http://papers.ssrn.com/sol3/ papers.cfm?abstract_id=381674>. Cited: Jan. 10, 2012.
http://papers.ssrn.com/sol3/ papers.cfm?...
; Wynne, 2004Wynne, A. Is the move to accrual based accounting a real priority for public sector accounting? London: Association of Chartered Certified Accountants, 2004. Available from: <https://bambangkesit.files.wordpress.com/2011/02/accrual-based-accounting-bab-4.pdf>. Cited: Aug. 21, 2013.
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; Chan, 2010Chan, J.L. As NICSPS e a contabilidade governamental de países em desenvolvimento. Revista de Educação e Pesquisa em Contabilidade, v.4, n.1, p.1-17, 2010.; Herbest, 2010Herbest, F.G. Regime de competência no setor público: a experiência de implementação em diversos países. 2010. Dissertação (Mestrado em Ciências Contábeis), Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, Fundação Instituto Capixaba de Pesquisa em Contabilidade, Economia e Finanças, Vitória, 2010.). No Brasil, o processo de convergência no setor público teve apoio da Secretaria do Tesouro Nacional e do Conselho Federal de Contabilidade que, em 2008, atualizou as normas da contabilidade governamental com base nos padrões internacionais.

Segundo Vicente et al. (2012Vicente, E.F.R.; Morais, L.M.; Platt Neto, O.A. A reforma na con-tabilidade pública brasileira e o processo de convergência: implicações e perspectivas. Revista de Informação Contábil, v.6, n.2, p.1-20, 2012.), os estudos sobre o processo de reforma da contabilidade aplicada ao setor público brasileiro são relevantes por abordarem um sistema de informação que deve ser capaz de instruir os cidadãos sobre as escolhas realizadas pelos seus repre-sentantes. Assim, todas as instituições do governo, em todas as esferas, veem-se obrigadas a implementar os instrumentos de transparência e acesso às informações públicas, seja por meio de portais de transparência, seja por investimentos em novos sistemas de informação.

Em relação às universidades públicas, Gant e Turner-Lee (2011Gant, J.; Turner-Lee, N. Government transparency: Six strategies for more ppen and participatory government. Washington: The Aspen Institute, 2011.) destacam o seu papel primordial no processo dos portais de transparência do governo. Para eles, essas instituições tanto podem incentivar os cida-dãos a se engajarem mais na criação de conteúdos e aplicativos para esses portais, como desempenhar seu papel de líderes para projetar novos processos e fer-ramentas para essas plataformas. Não obstante, muitas vezes, os próprios portais de transparência das universi-dades são falhos em vários pontos, tanto na divulgação de informações obrigatórias pelas leis brasileiras (Platt Neto et al., 2006Platt Neto, O.A.; Cruz, F.; Vieira, A.L. Transparência das contas públicas: um enfoque no uso da Internet como instrumento de publicidade na UFSC. Revista Contemporânea de Conta-bilidade, ano 3, v.1, n.5, p.135-146, 2006.; Lyrio et al., 2008Lyrio, M.V.L. et al. Proposta de um modelo para avaliar o grau de transparência das demonstrações financeiras publicadas por uma instituição pública de ensino superior brasileira: a abordagem da metodologia multicritério de apoio à decisão construtivista: contabilidade, gestão e governança. Revista UnB Contábil, v.11, n.1-2, p.170-186, 2008.; Bezerra et al., 2012Bezerra, R.O.; Borges, L.J.; Valmorbida, S.M.L. Análise das prestações de contas na internet da Universidade do Estado de Santa Catarina. Revista GUAL, v.5, n.1, p.66-82, 2012.; Rodrigues, 2013Rodrigues, G. M. Indicadores de transparência ativa em instituições públicas: análise dos portais de universidades públicas federais. Liinc em Revista, v.9, n.2, p.423-438, 2013. Disponível em: <http://www.ibict.br/liinc>. Acesso em: 3 mar. 2014.
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), quanto na questão do acesso a essas informações (Pereira et al., 2013Pereira, A.S.; Machado, A.M.; Carneiro, T.C. Avaliação da aces-sibilidade dos sítios eletrônicos das instituições de ensino su-perior brasileiras. Informação & Sociedade, v.23, n.3, p.123-142, 2013.).

No contexto governamental, as universidades pú-blicas surgem, comumente, constituídas na forma de autarquias ou fundações.Também são obrigadas pela Constituição Federal a prestar contas do uso de seus re-cursos e dar transparência aos atos públicos eviden-ciando a necessidade de transparência das contas das universidades públicas (Platt Neto et al., 2006Platt Neto, O.A.; Cruz, F.; Vieira, A.L. Transparência das contas públicas: um enfoque no uso da Internet como instrumento de publicidade na UFSC. Revista Contemporânea de Conta-bilidade, ano 3, v.1, n.5, p.135-146, 2006.). Porém, o que ocorre é uma relativa falta de publicidade na divul-gação da prestação de contas dessas instituições na Internet (Bezerra et al., 2012Bezerra, R.O.; Borges, L.J.; Valmorbida, S.M.L. Análise das prestações de contas na internet da Universidade do Estado de Santa Catarina. Revista GUAL, v.5, n.1, p.66-82, 2012.). Os dispositivos de trans-parência ativa previstos no decreto de regulamentação da LAI, por exemplo, não estão integralmente presentes nos portais e, quando estão, nem sempre remetem ao conteúdo respectivo (Rodrigues, 2013Rodrigues, G. M. Indicadores de transparência ativa em instituições públicas: análise dos portais de universidades públicas federais. Liinc em Revista, v.9, n.2, p.423-438, 2013. Disponível em: <http://www.ibict.br/liinc>. Acesso em: 3 mar. 2014.
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).

Apesar de ainda ser uma área carente de estudos, uma nova visão da gestão administrativa das universi-dades tem recebido destaque na área acadêmica (Sleutjes & Oliveira, 1998Sleutjes, M.H.S.; Oliviera, F.B. A crise e a busca de autonomia nas universidades federais brasileiras. Revista de Administração Pública, v.32, n.3, p.29-46, 1998.; Façanha, 1999Façanha, L.O. Economia e administração da organização universitária: três modelos de gestão na UFRJ (jul. 1994-jul. 1998). Revista de Administração Pública, v.3, n.33, p.67-98, 1999.; Saraiva & Capelão, 2000Saraiva, L.A.S.; Capelão, L.G.F. A nova administração pública e o foco no cidadão: burocracia X marketing? Revista de Administração Publica, v.32, n.2, p.59-77, 2000.; Vieira, E.F. & Vieira, M.M.F., 2003Vieira, E.F.; Vieira, M.M.F. Estrutura organizacional e gestão do desempenho nas universidades federais brasileiras. Revista de Administração Pública, v.37, n.4, p.899-920, 2003.) e são crescentes os estudos sobre o tema. Recentemente, com o aumento de pesquisas voltadas para o tema "transparência e aces-so às informações públicas", as universidades federais e estaduais oferecem um campo de pesquisa importante, como demonstram os estudos de Lyrio et al. (2008Lyrio, M.V.L. et al. Proposta de um modelo para avaliar o grau de transparência das demonstrações financeiras publicadas por uma instituição pública de ensino superior brasileira: a abordagem da metodologia multicritério de apoio à decisão construtivista: contabilidade, gestão e governança. Revista UnB Contábil, v.11, n.1-2, p.170-186, 2008.); Bezerra et al. (2012)Bezerra, R.O.; Borges, L.J.; Valmorbida, S.M.L. Análise das prestações de contas na internet da Universidade do Estado de Santa Catarina. Revista GUAL, v.5, n.1, p.66-82, 2012.; Rodrigues (2013Rodrigues, G. M. Indicadores de transparência ativa em instituições públicas: análise dos portais de universidades públicas federais. Liinc em Revista, v.9, n.2, p.423-438, 2013. Disponível em: <http://www.ibict.br/liinc>. Acesso em: 3 mar. 2014.
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); Costa et al. (2013Costa, F.R.; Nery, M.M.R.; Pelissari, A.S. A imagem projetada nos portais corporativos: um estudo multicasos das instituições públicas de ensino superior brasileiras. Revista Espacios, v.34, n.11, 2013. Disponível em: <http://www.revistaespacios.com/a13v34n11/in133411.html>. Acesso em: 30 jan. 2014.
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); Pereira et al. (2013Pereira, A.S.; Machado, A.M.; Carneiro, T.C. Avaliação da aces-sibilidade dos sítios eletrônicos das instituições de ensino su-perior brasileiras. Informação & Sociedade, v.23, n.3, p.123-142, 2013.).

Na trilha aberta pelos trabalhos citados acima, a presente pesquisa selecionou, como universo, as uni-versidades públicas federais que, assim como qualquer instituição governamental que compõe a estrutura da Administração Pública brasileira, são obrigadas a atender aos instrumentos de transparência das contas públicas. Buscou-se, assim, responder à seguinte questão: consi-derando que os instrumentos de transparência no Brasil são uma exigência cada vez mais presente na adminis-tração pública, qual seria, nesse contexto, o comporta-mento da demanda por informações contábeis nas universidades federais, após todo o esforço do Governo Federal na busca pela evidenciação e transparência das informações públicas, com a construção de um arca-bouço legal nos últimos anos?

Para tanto, foi utilizada como metodologia uma abordagem qualitativa, que envolve, na primeira etapa, a pesquisa bibliográfica e, na segunda, o levantamento de informações por meio dos relatórios estatísticos e download de dados disponíveis no portal do Sistema Eletrônico do Serviço de Informações ao Cidadão (e-SIC) do Governo Federal <http://www.acessoainformacao. gov.br/sistema>. A partir da análise de uma amostra com-posta por cinquenta e nove universidades públicas fe-derais, este artigo tem como objetivo caracterizar a demanda por informações contábeis dirigidas a essas instituições quanto ao número, proporção dos pedidos e perfil dos demandantes nos dois primeiros anos de implementação da LAI.

Transparência e acesso às informações públicas nas entidades governamentais brasileiras

Entre os diversos instrumentos importantes de transparência e de prestação de contas concebidos, três podem ser considerados marcos na história da Adminis-tração Pública brasileira: a Lei n° 9.755, de 16 de dezembro de 1998 (Brasil, 1998Brasil. Lei n° 9.755, de 16 de dezembro de 1998. Dispõe sobre a criação de homepage na Internet, pelo Tribunal de Contas da União, para divulgação dos dados e informações que especifica, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 17 dez. 1998. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/leis/l9755.htm>. Acesso em: 20 jul. 2014.
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), que criou na Internet o Portal Contas Públicas; a Lei Complementar n° 101, Lei de Responsa-bilidade Fiscal (LRF), de 4 de maio de 2000, que esta-beleceu normas para a gestão fiscal responsável; e o Decreto n° 5.482, de 30 de junho de 2005 (Brasil, 2005Brasil. Decreto n° 5.482, de 30 de junho de 2005. Dispõe sobre a divulgação de dados e informações pelos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, por meio da Rede Mundial de Computadores: Internet. Diário Oficial da União, Brasília, 1 jul. 2005. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_ 03/_Ato2004-2006/2005/Decreto/D5482.htm>. Acesso em: 20 jul. 2014.
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), que criou na Internet o Portal da Transparência (Ferreira et al., 2014Ferreira, C.D et al. Accountability da gestão pública municipal na região sudeste e a adequação à lei complementar 131/2009. In: Congresso USP de Iniciação Científica em Conta-bilidade, 11., São Paulo, 2014. Anais eletrônicos... São Paulo: USP, 2014. Disponível em: <http://congressousp.fipecafi.org/web/artigos142014/497.pdf>. Acesso em: 2 jul. 2014.
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). Porém, ao longo dos últimos anos, outros instrumentos, como novas leis, decretos e portarias, ganharam evidência na tentativa de regulamentar o tema transparência e acesso às informações públicas. O Quadro 1 sintetiza alguns desses instrumentos.

Quadro 1
Instrumentos de políticas públicas de informação no Brasil.

Entre os instrumentos de transparência apresen-tados no Quadro 1 destaca-se a LAI, Lei n° 12.527/11, marco da implementação de uma política de acesso às informações públicas com foco na transparência e no controle social, consagrando e disciplinando o que já estava previsto na Constituição Federal de 1988. Contudo, convém ressaltar que, para alguns autores, como Jardim (2013Jardim, J.M. A implantação da lei de acesso à informação pública e a gestão da informação arquivística governamental. Liinc em Revista, v.9, n.2, p.383-405, 2013. Disponível em: <http:// www.ibict.br/liinc>. Acesso em: 5 out. 2014.
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), o arcabouço legal não é suficiente para se afirmar que há uma política de informações do Estado, apesar do avanço desse aspecto com a LAI. Para ele, as cres-centes demandas sociais por informações públicas exi-gem, também, uma política de gestão de arquivos. O Estado brasileiro, observa Jardim (2013, p.384)Jardim, J.M. A implantação da lei de acesso à informação pública e a gestão da informação arquivística governamental. Liinc em Revista, v.9, n.2, p.383-405, 2013. Disponível em: <http:// www.ibict.br/liinc>. Acesso em: 5 out. 2014.
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, possui um deficit histórico em termos de transparência informa-cional demonstrado, por exemplo, pela "condição peri-férica dos serviços e instituições arquivísticas do Estado" e pela ausência de políticas públicas arquivísticas.

Apesar das pertinentes ressalvas de Jardim (2013Jardim, J.M. A implantação da lei de acesso à informação pública e a gestão da informação arquivística governamental. Liinc em Revista, v.9, n.2, p.383-405, 2013. Disponível em: <http:// www.ibict.br/liinc>. Acesso em: 5 out. 2014.
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) citadas acima, não se pode ignorar que a criação de instrumentos de transparência no Brasil resulta de um movimento de modernização da Administração Pública, mesmo que de natureza tributária ou de diretrizes de organismos internacionais, como já apontado, ou ainda em decorrência do combate à corrupção. Esse processo busca de forma permanente a estruturação de um mo-delo de gestão que possa alcançar objetivos, como melhorar a qualidade da oferta de serviços à população, aperfeiçoar o sistema de controle social da Administração Pública e combater a corrupção (Matias-Pereira, 2012Matias-Pereira, J. Manual de gestão pública contemporânea. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2012.).

A transparência nas prestações de contas, ou a accountability, sinaliza que a Administração Pública está preocupada em assegurar a integridade de seus serviços, colocando-se à frente de situações que contrariam a ética no serviço público (Kanaane et al., 2010Kanaane, R.; Fiel Filho, A.F.; Ferreira, M. Gestão Pública: pla-nejamento, processos, sistemas de informação e pessoas. São Paulo: Atlas, 2010.). A transparência tem-se constituído, de fato, em um instrumento de com-bate à corrupção, "[...] fenômeno que enfraquece a demo-cracia, a confiança do Estado, a legitimidade dos gover-nos e a moral pública" (Matias-Pereira, 2012Matias-Pereira, J. Manual de gestão pública contemporânea. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2012., p.104).

No contexto das universidades federais, as quais são parte do setor público, é preciso considerar o rele-vante papel social dessas instituições. Considerando a sua missão de geração e disseminação do conhecimento e sua vocação como potencial gerador de transforma-ções sociais, tornam-se relevantes as pesquisas nessa temática (Oliveira et al., 2013Oliveira, C.M. et al. Transparência e acesso a informação: os desafios enfrentados na implementação da Lei nº 12.527 na Fundação Universidade Federal de Rondônia. In: Coloquio de Gestión Universitaria en Américas, 13., 2013, Florianópolis, Anais eletrônicos... Florianópolis: UFSC, 2013. Disponível em <https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/114890>. Acesso em: 14 jun. 2014.
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). Mais do que garantir o atendimento das normas legais, as iniciativas de trans-parência nas universidades públicas constituem igual-mente uma política de gestão responsável que favorece o exercício da cidadania pela população. Potencialmen-te, a atitude poderá servir de estímulo aos estudantes, professores e demais servidores, contribuindo para o há-bito de solicitar esclarecimentos às entidades governa-mentais (Platt Neto et al., 2006Platt Neto, O.A.; Cruz, F.; Vieira, A.L. Transparência das contas públicas: um enfoque no uso da Internet como instrumento de publicidade na UFSC. Revista Contemporânea de Conta-bilidade, ano 3, v.1, n.5, p.135-146, 2006.).

Procedimentos metodológicos

O presente estudo foi elaborado em duas etapas. Na primeira, foi realizada uma pesquisa bibliográfica relacionada ao tema, além do levantamento e sistema-tização de leis, decretos e portarias governamentais, com o intuito de entender os instrumentos de transparência e acesso à informação pública no Brasil. Na segunda, realizou-se um levantamento de informações por meio do portal do e-SIC, nos itens de relatórios estatísticos e download de dados disponíveis no sítio <http://www. acessoainformacao.gov.br/sistema>, para verificar as demandas por informações financeiras e contábeis e, também, os pedidos registrados no canal de Serviços de Informação ao Cidadão.

Para a análise dos resultados, as informações fo-ram separadas em: categorias gerais e categorias espe-cíficas de informações contábeis. As primeiras abrangem todas as demandas por dados registrados no e-SIC, independentemente de seu conteúdo. Essas categorias estão separadas da seguinte forma: Agricultura, extra-tivismo e pecuária; Comércio, serviço e turismo; Ciência, informação e comunicação; Cultura, lazer e esporte; Defesa e segurança; Educação; Economia e finanças; Governo e política; Habitação; Saneamento e urbanismo; Indústria; Justiça e legislação; Meio ambiente; Pessoa, família e sociedade; Relações internacionais; Saúde; Trabalho; Transporte e trânsito.

Já as informações contábeis governamentais seguem as Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (NBCASP), editadas em 2008 pelo Conselho Federal de Contabilidade, como resultado da reforma da contabilidade governamental. Portanto, as demandas de informações específicas contábeis sele-cionadas neste artigo abrangem todos os quatro subsis-temas de informação da Contabilidade Governamental estabelecidos nas NBCASP, ou seja, informações orça-mentárias, patrimoniais, de custos e de compensação.

O universo da pesquisa corresponde a todas as universidades federais brasileiras, no total de 633. A amostra trabalhada abrange as 59 instituições cadas-tradas no sistema e-SIC da Controladoria Geral da União (CGU). Os dados sobre as universidades federais foram coletados no dia 22 de junho de 2014 e cada uma delas foi analisada individualmente. Foram averiguadas as demandas por perguntas registradas. Os resultados também são apresentados separadamente bem como as demandas das dez universidades que mais registraram perguntas no e-SIC. Os dois anos foram explorados tendo como marco temporal o ano de implementação da LAI e separados da seguinte forma: primeiro ano de imple-mentação, de 15 de maio de 2012 a 14 de maio de 2013; e segundo ano, de 15 de maio de 2013 a 14 de maio de 2014.

A seleção das categorias "Economia e finanças" e "Governo e política" como representantes das informa-ções financeiras e contábeis foi realizada por meio de busca no Vocabulário Controlado do Governo Eletrônico (VCGE)4, visando identificar a categoria que enquadraria os termos financeiros e contábeis. Foram utilizadas: (1) Categoria Economia e Finanças - i. Subcategoria Admi-nistração Financeira, ii. Subcategoria Encargos Financeiros e iii. Subcategoria Finanças; e (2) Categoria Governo e Política - i. Subcategoria Administração Pública.

Foi analisado, ainda, o perfil dos solicitantes das informações no sistema e-SIC quanto aos seguintes aspectos: pessoa física (PF) e pessoa jurídica (PJ). Foram selecionados para análise, na categoria PF, estudantes e professores, e na PJ, institutos de ensino e pesquisa, sindicatos, órgãos públicos federais e organizações não governamentais.

Resultados e Discussão

A participação da sociedade no processo de bus-ca pela informação no âmbito das universidades federais pode ser constatada nos resultados apresentados nesta seção. Ressalta-se, inicialmente, o número total de per-guntas registradas no sistema e-SIC, com mais de dez mil perguntas direcionadas a essas instituições, quanti-dade que se manteve nos dois primeiros anos de imple-mentação da LAI, apresentando variação positiva de quase 6% no segundo ano. Entre os solicitantes uma pe-quena parcela, menos de 30%, corresponde a estudantes e professores, sugerindo o interesse da sociedade em geral. Os resultados foram separados por: (i) Categorias gerais; (ii) Perfil dos solicitantes; e (iii) Categorias espe-cíficas das informações contábeis. Conforme destacado a seguir, a análise das categorias previamente definidas permitiu conclusões interessantes.

As universidades federais brasileiras e a demanda por informações nas categorias gerais

Os resultados mostram que, no primeiro ano de implementação da LAI 2012-2013, as perguntas nas categorias gerais direcionadas a apenas dez univer-sidades representam mais de 40% do total dos pedidos registrados. Já no segundo ano 2013-2014, esse valor caiu para 32%. O número de perguntas registradas por essas universidades é apresentado na Tabela 1.

Tabela 1
Número de perguntas registradas nas categorias gerais por período.

É possível verificar, ainda, que 60% das univer-sidades federais que detinham o maior número de per-guntas registradas no e-SIC no primeiro ano de imple-mentação da LAI permaneceram, no segundo ano, entre as dez mais demandadas. São elas: Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) e Univer-sidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR).

Já o perfil dos solicitantes das seis instituições que se mantiveram entre as dez mais demandadas, em ambos os períodos analisados, apresenta uma média de 98% de solicitantes na categoria PF e somente 2% na PJ. Entre os PF que registraram suas demandas no e-SIC, encontram-se, em média, 20% de estudantes e 7% de professores. Já entre os PJ, destacam-se: institutos de en-sino e pesquisa, sindicatos, órgãos públicos federais e organizações não governamentais. Ressalta-se que a UnB foi a única universidade federal que apresentou registro de sindicatos entre as pessoas jurídicas. O perfil dos solicitantes, por instituição, é apresentado na Tabela 2.

Tabela 2
Perfil de solicitantes registrados no e-SIC por universidade federal.

As universidades federais brasileiras e a demanda por informações contábeis

Um número considerável de informações contá-beis integra as exigências de transparência ativa nos ins-trumentos desse tipo vigentes no Brasil, dentre eles a LAI. Entretanto, os dados levantados na pesquisa sugerem que essas informações não estão disponíveis nos sites das universidades pesquisadas, isto é, essas instituições parecem não atender, ainda, às exigências de transpa-rência ativa. Essa constatação pode, por outro lado, refletir a dificuldade de localização de informações já dispo-nibilizadas pelo Estado nos portais de transparência, ou mesmo uma necessidade por dados adicionais não abrangidos por esses instrumentos.

Nesse contexto, verificou-se que, no primeiro ano de implementação da LAI, 38 do total das 59 univer-sidades federais pesquisadas apresentaram demandas nas categorias "Informações contábeis", ou seja, 64% indicaram algum pedido de informações financeiras e contábeis. Já no segundo ano, esse número representava 59% das instituições pesquisadas. Assim, em média, nos primeiros dois anos de implementação da LAI, 61% das universidades federais estudadas apresentaram alguma demanda por informações financeiras e contábeis, apesar do número relevante de instrumentos de transparência que obriga a transparência ativa no Brasil.

No primeiro ano de implementação da LAI, veri-ficou-se, também, que as dez universidades mais men-cionadas no e-SIC representam 75% da demanda total por informações contábeis de todo o conjunto das 59 instituições. Já na análise do segundo, essa represen-tatividade aumentou para 80%. A mais significativa quanto à demanda contábil foi a Universidade Tecnoló-gica Federal do Paraná (UTFPR), com 200 perguntas re-gistradas, tanto no Ano 1 quanto no Ano 2 de implemen-tação da LAI. O resultado é apresentado na Tabela 3.

Tabela 3
Total da demanda por informação contábil nas dez universidades federais mais representativas.

Portanto, o número total de demandas por informação contábil de todas as universidades federais manteve-se, praticamente não sofrendo alteração do primeiro para o segundo ano de implementação da LAI. No primeiro ano, o total de solicitações por informações contábeis registradas no e-SIC era de 964 perguntas; no segundo, 946. Ou seja, uma redução de somente 2%. Quanto a esse resultado, deve-se ressaltar que existem variáveis não examinadas no presente artigo, que podem incidir no processo de solicitação e atendimento das demandas. O Artigo 19 (2011), por exemplo, aponta, den-tre elas, as limitações dos sistemas de informação gover-namentais que podem não conseguir ainda otimizar e integrar, de forma adequada, os seus sistemas. Além disso, os solicitantes tendem a emitir pedidos de informação excessivamente amplos temendo que os administra-dores interpretem as perguntas de forma muito restrita (Artigo 19, 2011Artigo 19: Leis de acesso à informação: dilemas da imple-mentação. São Paulo, jul. 2011. Disponível em: <http:// artigo19.org/doc/Estudos%20em%20Liberdade%20de% 20Informa%C3%A7%C3%A3o%201%20(web).pdf>. Acesso em: 2 jan. 2015.
http://artigo19.org/doc/Estudos%20em%20L...
).

Existem também variáveis de natureza tecno-lógica e de recursos humanos que são observadas por pesquisadores do tema (Damatta, 2011Damatta, R. (Coord.). Sumário executivo: pesquisa diagnóstico sobre valores, conhecimento e cultura de acesso à informação pública no Poder Executivo Federal Brasileiro. Brasília: Controladoria Geral da União, 2011. Disponível em: <http://www.acessoainformacao.gov.br/central-de-conteudo/publicacoes/arquivos/pesquisadiagnostico.pdf>. Acesso em: 2 maio 2013.
http://www.acessoainformacao.gov.br/cent...
; Garrido, 2012Garrido, E.P.L. Lei de acesso às informações públicas. Revista Jurídica CNM. Brasília: Confederação Nacional de Municípios, 2012. Disponível em: <http://www.leideacesso.cnm.org.br/leideacesso/pdf/Artigo_LeideAcessoInformacao.pdf>. Acesso em: 6 out. 2014.
http://www.leideacesso.cnm.org.br/leidea...
; Jardim, 2013Jardim, J.M. A implantação da lei de acesso à informação pública e a gestão da informação arquivística governamental. Liinc em Revista, v.9, n.2, p.383-405, 2013. Disponível em: <http:// www.ibict.br/liinc>. Acesso em: 5 out. 2014.
http:// www.ibict.br/liinc...
). Assim, na política de acesso à informação a falta de tecnologia, de preparação e treinamento dos servidores, de escolas de formação para as práticas básicas de gestão pública, além da falta de uma gestão de informação no setor público, são alguns dos proble-mas que, apesar da LAI, podem interferir no processo.

Mesmo considerando que essas variáveis são importantes e devem ser examinadas posteriormente, esta pesquisa limitou-se a analisar os dados quantitativos disponibilizados pelo sistema e-SIC com o objetivo de apresentar uma reflexão sobre a aplicabilidade da LAI no Brasil. Deve-se, por outro lado, ressaltar que a própria existência desses dados, acessíveis publicamente para pesquisa acadêmica, é, por si só, um avanço.

Conclusão

Pode-se, então, afirmar que a transparência dos atos públicos evidenciada particularmente pela possibi-lidade de acesso às informações públicas, é ferramenta fundamental para maior controle social. No que diz res-peito a determinados tipos de informação, como as de natureza contábil, o processo de convergência das nor-mas contábeis aos padrões internacionais no setor públi-co tornou mais evidente essa necessidade por dados mais transparentes e comparáveis.

O acesso à informação referente às contas públi-cas, dentre elas, a contábil-financeira e orçamentária, per-mite à sociedade acompanhar os gestores na aplicação dos recursos públicos. Por isso, as informações contábeis possuem destaque em muitos instrumentos de trans-parência. Não é casual que, entre os dados objeto da transparência ativa, encontrem-se, em grande parte, os contábeis. Nos art. 7° e 8° da LAI estão, dentre outras, a obrigatoriedade de divulgação de informação perti-nente a repasses ou transferências de recursos financeiros, despesas públicas, administração do patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação etc.

Como indicado, constatou-se uma regularidade no número da demanda de informações dirigidas às dez universidades mais solicitadas na amostra de 59 insti-tuições. A proporção de estudantes e professores (res-pectivamente 21% e 7%) no total de demandantes suge-re grande interesse da sociedade em geral, que registrou o maior número de pedidos. Essa constatação reforça o pressuposto defendido por alguns dos autores citados neste artigo, segundo o qual as universidades também estão implicadas nesse processo de transpa-rência e prestação de contas.

A demanda por informações mais específicas, como as de natureza contábil-financeira e orçamentária, no primeiro e segundo ano de vigência da LAI, embora em proporção decrescente (64% e 59%, respecti-vamente) sinaliza para três considerações. A primeira é que do primeiro para o segundo ano a diferença da de-manda, em termos proporcionais, foi muito pequena, indicando que as universidades pesquisadas ainda não se ajustaram ao que preconiza a LAI. Outra constatação é que a existência de instrumentos que obrigam a trans-parência ativa não é garantia de sua implementação em curto prazo, o que nos leva a sugerir a continuidade da pesquisa em médio e longo prazos. Finalmente, o grande número de demanda dirigida às universidades parece refletir o entusiasmo da sociedade com o início de uma política mais clara de direito à informação no Brasil bem como a necessidade de informações adi-cionais, não disponíveis nos portais de transparência.

A título de reflexão final, talvez uma análise apro-fundada sobre o conteúdo das solicitações de informa-ções contábeis pudesse nos esclarecer se se trata das demandas de informações já retratadas no rol mínimo de informações obrigatórias dos instrumentos de trans-parência ou, ainda, se as solicitações se referem a informa-ções diferentes. Nesse último caso, faz-se importante a verificação desses instrumentos os quais, provavelmen-te, precisem ser revisados e atualizados conforme as de-mandas registradas.

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  • 3
    Das 63 Universidades Federais cadastradas no Ministério da Educação, 60 também se encontram no e-SIC, sendo que a Universidade Federal do Cariri (UFCA) foi inserida no sistema somente no terceiro ano de implementação da LAI. As outras três universidades (Universidade Federal do Oeste da Bahia (UFOB), Universidade Federal do Sul da Bahia (UFESBA) e Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA)), ainda não se encontram no sistema e-SIC.
  • 4
    O Vocabulário Controlado do Governo Eletrônico (VCGE) é uma lista de temas do governo que auxilia os usuários a encontrar informações, independente do assunto que o órgão é responsável. O objetivo da árvore é ser intuitiva para a busca de conteúdos de interesse na larga faixa de informações do setor público.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    15 Ago 2014
  • Revisado
    24 Abr 2015
  • Aceito
    20 Maio 2015
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