APRESENTAÇÃO
Tradução, uma nova produção
Alfredo Bosi
Há os que acreditam ser a poesia intraduzível. É o juízo de um dos mais inventivos pensadores da Estética neo-hegeliana, Benedetto Croce, para quem não há versões poéticas perfeitas, mas, a rigor, novos atos criadores.
O paradoxo está armado: o segundo texto será uma bela tradução se for um poema original. Essa rara passagem só se torna possível quando o tradutor é também poeta. Caso a exigência não puder ser cumprida, o filósofo aconselha que a versão se contenha nos limites da paráfrase literária, que respeita a equivalência dos signos, mas abstém-se de transpor para outro idioma a teia de sons imanente ao primeiro, e inseparável das conotações e dos ressôos originais.
Mallarmé, passando para o registro de uma prosa semanticamente lisa os poemas musicalmente complexos de Edgar Allan Poe, terá dado prova de cautela ou de respeito inteligente à matriz. De certo atendia às palavras de Baudelaire: "uma tradução de poesias tão conscientes, tão concentradas, pode ser um sonho acariciante, mas não poderá ser mais do que um sonho".
Se for justa a proposição crociana, de um lado teríamos as belas infiéis, obra de tradutores traidores; de outro, as feias fiéis, limite a que chegaria uma filologia escolar. O que dá no impasse.
No entanto, a prática do tradutor empenhado está sempre enfrentando o dilema e tentando desfazê-lo, de cada vez, pela re-criação que seja fiel não só à verdade do poema original como à sua beleza. Este é o sentido do trabalho crítico e artístico de José Paulo Paes, que já verteu com brilho e precisão Aretino, Kaváfís e os neo-helênicos; e agora nos dá o fruto da sua experiência com a linguagem ora direta, ora sutil, de um dos melhores poetas americanos do século XX: William Carlos Williams.
A tarefa que se propôs José Paulo Paes contou com o apoio do Instituto de Estudos Avançados que o teve, por dois meses, como professor-visitante.
A abertura à praxis da criação foi um começo feliz para um centro universitário que, cherchant son bien où il le trouve, só tem a aprender no convívio com os poetas.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
31 Mar 2006 -
Data do Fascículo
Mar 1988