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A dinâmica do novo regime monetário-financeiro norte-americano: uma hipótese de interpretação

Resumos

No artigo é apresentada uma hipótese de interpretação sobre a dinâmica atual do sistema monetário e financeiro norte-americano, suas relações com as empresas, com o Federal Reserve, com o Tesouro e com o resto do mundo. Procurou-se mostrar a emergência de um modo de funcionamento específico do capitalismo predominantemente financeiro e rentista, em que prevalecem os mercados de capitais sofisticados e abrangentes, destinados a uma avaliação diária da massa de ativos (cambial, acionário, de títulos e imobiliário). Ademais, essa forma de gestão da riqueza se impôs ao resto do mundo como paradigma: as finanças passaram a operar num espaço mundial, hierarquizado a partir do sistema financeiro norte-americano e viabilizado pela política monetária do Estado hegemônico, imitada pelos demais países industrializados e em desenvolvimento.


The article is an interpretation of the current dynamics of the North American monetary system, and its relations with enterprises, the Federal Reserve system, the Treasury and the rest of the world. The author looked into the emergence of a specific mode of operation of a predominantly financial, unearned income-based type of capitalism, in which sophisticated, encompassing capital markets, forced to perform a daily evaluation of assets (foreign exchange, shares, securities, and property) prevail. Moreover, this way of managing resources has become a paradigm for the rest of the world: financial operations started to occur in a global space, stemming hierarchically from the North American financial system, and being made possible by the monetary policies of the hegemonic nation, and imitated by developed and developing countries.


ECONOMIA

A dinâmica do novo regime monetário-financeiro norte-americano: uma hipótese de interpretação

Marcos Antonio Macedo Cintra

RESUMO

No artigo é apresentada uma hipótese de interpretação sobre a dinâmica atual do sistema monetário e financeiro norte-americano, suas relações com as empresas, com o Federal Reserve, com o Tesouro e com o resto do mundo. Procurou-se mostrar a emergência de um modo de funcionamento específico do capitalismo predominantemente financeiro e rentista, em que prevalecem os mercados de capitais sofisticados e abrangentes, destinados a uma avaliação diária da massa de ativos (cambial, acionário, de títulos e imobiliário). Ademais, essa forma de gestão da riqueza se impôs ao resto do mundo como paradigma: as finanças passaram a operar num espaço mundial, hierarquizado a partir do sistema financeiro norte-americano e viabilizado pela política monetária do Estado hegemônico, imitada pelos demais países industrializados e em desenvolvimento.

ABSTRACT

The article is an interpretation of the current dynamics of the North American monetary system, and its relations with enterprises, the Federal Reserve system, the Treasury and the rest of the world. The author looked into the emergence of a specific mode of operation of a predominantly financial, unearned income-based type of capitalism, in which sophisticated, encompassing capital markets, forced to perform a daily evaluation of assets (foreign exchange, shares, securities, and property) prevail. Moreover, this way of managing resources has become a paradigm for the rest of the world: financial operations started to occur in a global space, stemming hierarchically from the North American financial system, and being made possible by the monetary policies of the hegemonic nation, and imitated by developed and developing countries.

O sistema monetário e financeiro norte-americano montado nos anos 30 era um market oriented financial system, no sentido de que contava com um mercado de capitais e um mercado creditício sem grandes interferências estatais, no que se refere à seletividade e ao direcionamento dos recursos. Era, contudo, regulado para não escapar em direção a uma "indisciplina financeira generalizada". Sua estabilidade dependia de uma taxa de inflação controlada, para que fosse compatível com os tetos de taxas de juros e de uma expansão creditícia baseada nos depósitos à vista (não-remunerados), mas também que os investidores em ações as mantivessem em carteira por longos períodos, evitando os movimentos especulativos que o mercado acionário tende a promover (Braga, 1997b).

Assim, durante o segundo pós-guerra, o sistema bancário norte-americano manteve em seus balanços grande parte dos contratos financeiros: em suas contas ativas estavam os empréstimos; nas passivas, os depósitos à vista e a prazo. As instituições não-bancárias ficavam restritas às parcelas específicas do mercado de crédito e à colocação de ações e títulos de longo prazo no mercado de capitais. No período recente houve modificação do papel tradicional dos bancos e aumento da importância dos intermediários financeiros não-bancários no processo de gestão da riqueza, de criação creditícia e monitoramento dos meios de pagamento na economia norte-americana. Conseqüentemente, ocorreu crescente avanço dos mercados de capitais, à margem da ação direta do Federal Reserve e da regulamentação bancária. A dinâmica dos mercados de capitais associada à intensa utilização de mecanismos que visam essencialmente ao encurtamento do prazo e à cobertura de riscos aproximou-se cada vez mais das características de funcionamento dos mercados monetários (com elevado teor especulativo).

Do nosso ponto de vista, as políticas de desregulamentação monetário-financeira e de liberalização dos fluxos de capitais, a valorização do dólar após 1979, bem como a ampliação da dívida pública nos portfólios privados, criaram as condições para o aperfeiçoamento dessas novas formas de intermediação financeira e o desenvolvimento da chamada globalização financeira.

Este trabalho foi estruturado a partir do específico ao sistema monetário-financeiro norte-americano, para o geral, ou seja, para o padrão global característico do sistema financeiro internacional. Inicialmente, foram evidenciadas as características do sistema financeiro americano, no qual predomina a interação da securitização da dívida pública e privada, da institucionalização da poupança e dos instrumentos derivativos. Pelas necessidades de diversificação dos portfólios dos investidores institucionais e dos principais agentes econômicos, essa forma de gestão espraiou-se pelo resto do mundo após 1982.

Em seguida, tentou-se mostrar o papel das políticas monetária e cambial. Mediante compra e venda dos títulos públicos, a autoridade monetária consegue sensibilizar a oferta de crédito. A política monetária fundada nas operações de open market transformou-se numa política de definição dos preços dos títulos, à medida que os títulos públicos constituem a referência (benchmark) desses mercados.

Analisou-se ainda o corporate governance das empresas com ações em bolsas, dependentes de uma estrutura de propriedade transitória, comandada pelos investidores institucionais que atuam como agentes dos investidores individuais.

Finalmente, salientou-se que a natureza da dinâmica financeira privada prevalecente nos Estados Unidos implica novos problemas de coordenação e regulação à medida que a estabilidade dos mercados de securities depende em grande parte da diversidade de opiniões dos agentes. A crescente concentração dos recursos em fundos de investimento e o desenvolvimento de sistemas informacionais tendem a diminuir a diversidade de expectativas, levando ao que se poderia chamar de risco de convergência de opiniões, eliminando o pressuposto que daria uma certa estabilidade ao mercado.

O novo regime monetário-financeiro norte-americano

Os Estados Unidos dispõem hoje do mais amplo mercado de capitais em relação a qualquer nação e de investidores altamente sofisticados (tabela 1). Essa característica implica crescente predominância quantitativa e qualitativa da forma financeira do capital sobre as demais. Isto é, constitui um modelo em que prevalece a lógica financeira de valorização sobre as demais esferas de circulação do capital. Não no sentido de anulá-las - o que é rigorosamente impossível, pois é inexorável para o capital o cumprimento, em qualquer momento ou etapa, do circuito completo da sua circulação (capital-dinheiro, capital-produtivo e capital-mercadorias) -, mas de subordinar a apropriação privada do lucro e a correspondente acumulação de capital aos critérios e requisitos de valorização próprios do capital financeiro como sua forma mais avançada, por ser mais geral e abstrata (Marx, 1867).

Trata-se da emergência de uma situação em que o movimento da fração capital-dinheiro tende a imprimir sua marca no conjunto das operações do capitalismo contemporâneo. Nesse sentido, o capital-dinheiro tornou-se uma força praticamente incontrolável, pois "ocorreu a reafirmação de uma autonomia do capital-dinheiro perante o capital industrial, cujos limites são estabelecidos apenas através da viabilidade a médio e longo prazo de um regime de acumulação rentista" Chesnais (1996a:7, grifos no original).

A expansão dessa lógica financeira de valorização, característica do mercado de capitais norte-americano, iniciou a montagem de um novo esquema de fluxos financeiros que sintetiza quatro grandes movimentos. Isto é, a desregulamentação e a liberalização promoveram a interligação dos diferentes mercados nacionais, conformando um grande mercado global, a institucionalização da poupança financeira, o processo de securitização das dívidas e os derivativos financeiros (tabelas 2 a 6). Noutras palavras, a liberalização monetária e financeira, seguida pela desregulamentação dos mercados financeiros nacionais, pelo processo de securitização e pelos instrumentos derivativos constituíram um espaço financeiro verdadeiramente global, hierarquizado a partir do sistema financeiro americano (1 1 Estamos sugerindo que o dinamismo da globalização financeira está vinculado às transformações financeiras desencadeadas a partir dos Estados Unidos. Porém, já atingiu uma dinâmica própria. A União Européia, por exemplo, propôs um acordo global de liberalização dos serviços financeiros, sob os auspícios da Organização Mundial de Comércio. O acordo compromete os países envolvidos a abrirem mutuamente seus mercados financeiros, com base em um tratamento de país mais favorecido. Isso significa que as concessões oferecidas a uma nação serão automaticamente estendidas às outras. Esse acordo foi ratificado em dezembro de 1997 (Cintra, 1999). ). Nas palavras de Galbraith (1998), "globalização é um conceito que nós, os americanos, inventamos para dissimular nossa política de avanço econômico em outros países e para tornar respeitáveis movimentos especulativos de capital".

O circuito financeiro que começa a se delinear é expressivamente mais complexo do que os anteriores, mesmo quando nestes se considerava a atuação dos agentes especuladores. Nesse circuito participa um maior número de agentes. O agente superavitário deposita os recursos nas empresas de administração de fundos (fundos mútuos, fundos de pensão, fundos de investimentos, hedge funds, companhias de seguro etc.). Estes mantêm em suas carteiras de ativos securities diversas (títulos, notas, commercial paper, ações), emitidas pelos tomadores de recursos, mas também moedas, ouro, commodities etc. As emissões de securities pelos tomadores (empresas produtivas, Estados soberanos, bancos internacionais ou de países em desenvolvimento) são realizadas por intermédio das instituições financeiras, que operam como broker (atuam como corretores de títulos e valores mobiliários, geralmente cobrando uma comissão). Os riscos de prazos e de crédito são bancados pelos fundos que compõem suas carteiras de ativos de forma a conseguirem carregar instrumentos de prazos mais longos por meio de depósitos de diferentes prazos.

Além disso, os fundos figuram-se como emprestadores finais de recursos, enquanto os poupadores são os detentores de quotas destes e, assim, os riscos de perda do principal acabam pulverizados na malha de cotistas (pensionistas). A institucionalização dos especuladores termina por bancar o risco de preço (oscilações nas taxas de juros, câmbio, inflação etc.), uma vez que a maioria das securities emitidas em diferentes moedas apresentam como características prazos relativamente longos e taxas de juros fixas. Essa atuação é pautada pela utilização dos derivativos financeiros, pelos quais os especuladores fazem trocas de taxas de juros fixas por flutuantes, ou de uma moedas para outra, entre os fundos e os tomadores de recursos.

As Agendas de Classificação de Risco (Credit Rating Agencies) são outro grupo de agentes que passa a participar ativamente desse circuito. Sua função é montar parâmetros para a classificação de riscos dos diferentes agentes emissores de securities. A remuneração oferecida para cada instrumento lançado nesse mercado é estabelecida a partir dessa classificação (Mendonça, 1994:59-60).

É essa dinâmica financeira predominante na economia norte-americana, característica dos seus mercados de capitais, que se impôs como paradigma ao resto do mundo fornecendo a dinâmica da globalização financeira, ancorada nos títulos do Tesouro, na dimensão e sofisticação dos seus mercados de ativos privados (ações, títulos e moedas), nos portfólios diversificados dos investidores institucionais, nas operações cambiais estruturadas com instrumentos derivativos pelos bancos e na atuação das grandes empresas norte-americanas que se transnacionalizaram, levando suas formas de produção e de gestão (tabelas 7 a 9).

Além disso, a moeda norte-americana prevalece nas operações financeiras internacionais: 82% do valor nacional dos contratos de derivativos de câmbio no mercado de balcão tem o dólar como moeda em uma das pontas da operação, 50% das transações comerciais e 50% das transações no mercado primário e secundário de títulos são efetuadas em dólar (tabelas 10 e 11).

A presença do dólar em pelo menos uma das pontas das operações de derivativos cambiais (swaps, opções e futuro) e de arbitragens nos principais mercados de câmbio e de títulos consolida a posição dominante da moeda norte-americana nos mercados financeiros globalizados. Tal aspecto amplia a influência do dólar como referencial financeiro básico da economia internacional. A atratividade, qualitativamente superior, tanto das possibilidades de aplicação quanto das facilidades de transações do mercado financeiro norte-americano em relação a todos os outros estabeleceu os alicerces de um capitalismo sobrepujado pelas finanças e o lugar ocupado pelos Estados Unidos nesse processo.

Assim, os Estados Unidos, usufruindo seu poder financeiro, impõem a predominância de sua moeda, ao mesmo tempo em que mantêm um déficit elevado e persistente em conta corrente e uma posição devedora externa (tabela 12). Os mercados financeiros parecem dispostos a aceitar, a despeito das flutuações do valor do dólar, que os Estados Unidos exerçam, dentro de limites bastante flexíveis, o privilégio da senhoriagem internacional. Isso significa que a função de reserva, universal de valor, exercida, pelo dólar, decorre fundamentalmente das características do mercado financeiro norte-americano e do papel desempenhado pelo Estado americano, simultaneamente, como devedor e emprestador de última instância.

Nesse sentido, o papel contemporâneo exercido pelo dólar como reserva de valor não se circunscreve aos limites de um padrão monetário clássico (Tavares & Melin, 1997). O valor do dólar decorre da capacidade de os Estados Unidos manterem sua dívida pública como título de segurança do sistema financeiro global. A taxa de juros norte-americana, ao servir de referência para o crescimento das transações financeiras globais, induz a denominação das operações de securitização em geral (e, em particular, dos instrumentos de derivativos cambiais) em dólar. Além disso, as transações comerciais das grandes corporações transnacionais e seus preços praticados mundialmente estão denominados em dólar, qualquer que seja a paridade cambial vigente nos mercados nacionais.

O papel dos derivativos financeiros

Os contratos de derivativos financeiros desempenharam um papel extremamente relevante em todo esse processo. De modo geral, a introdução dos derivativos possibilita um melhor gerenciamento microeconômico da posição credora e devedora das instituições financeiras e não-financeiras, face às oscilações nas taxas de inflação, de juro e de câmbio, nos preços das matérias-primas e dos produtos finais. Os derivativos permitem transformar incertezas financeiras em riscos, na medida em que o hedge constitui uma forma de seguro (2 2 Segundo Vercelli (1991:74, nota 3) a "contraposição entre risco e incerteza é terminológicamente ilógica e deveria ser evitada. Incerteza refere-se a qualquer situação em que não há certeza. Risco usualmente designa o 'custo' de uma decisão errada e se aplica em qualquer tipo de incerteza". Assim, Vercelli (1991:76-77) defende a hipótese de um variável grau de confiança nas projeções para o futuro dos agentes. Propõe, então, que se estabeleça uma distinção entre, num extremo, a incerteza simples ("risco") em que "apenas uma única distribuição de probabilidade é epistemológicamente possível e seu grau de confiança é máximo" e, noutro, uma definição de incerteza no sentido heurístico de Keynes (1936), denominada "incerteza-k", em que "nenhuma distribuição de probabilidades é considerada suficientemente confiável" (o caleidoscópio de Schacke, 1967). Entre esses dois extremos, pode haver um contínuo de acordo com o grau de confiabilidade da distribuição de probabilidades (ou peso do argumento). Essa hipótese permite apreender certos movimentos de preços que ocorrem nos mercado financeiros, pois a despeito da incerteza que predomina sobre a evolução futura de preços, as transações são efetuadas (veja também Dymski, 1998b). ).

Assim, propiciam um aumento da previsibilidade à medida que se opera o futuro no presente. Esses instrumentos, porém, caracterizam-se pela transferência de riscos entre os agentes e esta possui um horizonte de tempo relativamente curto: nos mercados organizados os prazos máximos de negociação cobrem períodos de 12 a 16 meses; embora os vencimentos com liquidez, ou seja, aqueles em que é possível, a qualquer momento, abrir ou encerrar uma posição e que concentram a maioria dos negócios, sejam de prazos mais curtos.

Em princípio, a repactuação periódica das operações de hedge poderia ser suficiente para assegurar a transformação das incertezas em riscos passíveis de serem monitorados por prazos mais longos. Entretanto, "as oscilações da base - diferença entre o preço à vista e o preço do futuro -podem inviabilizar a repactuação do hedge, em condições aceitáveis, pois incluem a taxa de juros vigente associada às expectativas sobre o futuro. Nos mercados de balcão, alguns derivativos - tais como Forward Rate Agreement, Forward Exchange Agreement e os swaps - apresentam maiores possibilidades de alongamento dos prazos, embora o mercado tenha pouca liquidez para operações com maturidade superior a três ou quatro anos. No entanto, são úteis em operações de hedge para reduzir a incerteza financeira de prazos mais longos (inclusive elementos de decisões de investimento) em riscos passíveis de gerenciamento. Por enquanto, tais operações ocorrem em pequena escala, pois o elevado grau de alavancagem desses mercados faz com que um erro de concepção da transação acabe provocando resultados negativos potencializados ao longo de anos" (Farhi, 1997:159).

De qualquer modo, a evolução dos instrumentos derivativos no período recente permite antever, num horizonte não muito remoto, que a realização de hedge de longo prazo poderá reduzir as incertezas financeiras associadas aos processos de investimento produtivo.

Assim, empregados como instrumentos de hedge, os derivativos financeiros permitem a redução dos riscos contidos nas posições em seus ativos subjacentes, exercendo uma influência estabilizadora nos mercados desses ativos, melhorando a liquidez e propiciando um ajuste mais rápido dos preços a novas informações. Ademais, "os mercados derivativos financeiros formam um indicador da média das expectativas dos participantes nos mercados sobre a evolução futura dos preços dos mais diversos ativos" (Farhi, 1997:275).

A dimensão informacional dos preços exercida pelos derivativos financeiros representa um papel relevante na coordenação das expectativas dos agentes sobre a evolução futura das variáveis financeiras necessária à realização dos cálculos prospectivos das decisões econômicas (de produção e de investimento). Dessa forma, os mercados de derivativos financeiros podem ser considerados como uma inovação que impede a instabilidade das principais variáveis financeiras (taxas de juro e de câmbio, preço de commodities etc.) de se espalhar por todo o sistema econômico.

No entanto, Aglietta (1995) nos lembra que esse monitoramento das incertezas financeiras tornou-se possível com as funções desempenhadas pelos market makers, que atenuam as variações de fluxos resultantes dos rearranjos de portfólio dos investidores, assegurando a liquidez.

Os derivativos financeiros criados para permitir a redução e o gerenciamento dos riscos decorrentes da volatilidade dos ativos financeiros são, também e contraditoriamente, fonte de riscos mais intensos, tanto no plano microeconômico da gestão das instituições financeiras e não-financeiras que os utilizam, quanto no plano macroeconômico. No que se refere aos aspectos microeconomicos, o elevado grau de alavancagem, que caracteriza a maioria desses instrumentos, faz com que sejam ideais para se tentar obter ganhos extraordinários (especulativos). São inúmeras as estratégias conduzidas pelas tesourarias dos bancos e das corporações, bem como pelos administradores de portfolio para imunizar seus investimentos quanto ao risco e/ou, simultaneamente, para desenvolver ganhos de capital. O problema é que apenas uma transação primária (empréstimo, exportação, investimento etc.) induz uma cadeia de operações.

Se cada um se desembaraça do seu risco, isso não significa que a soma dos riscos incorridos ao longo da cadeia não seja superior ao risco engendrado pela operação original (Bourguinat, 1995:34). Ademais, a complexidade das operações aliada à falta de transparência dos mercados acarreta um aprofundamento do risco, à medida que não se conhecem as posições (especulativas) assumidas por determinada contraparte (3 3 O crescimento dos novos mercados de derivativos pode reduzir a transparência das posições de mercado. Neste caso, os riscos aumentariam devido à redução da capacidade de reguladores e demais agentes de mercado interpretarem os sinais e controlarem os riscos adequadamente (Goodhart, 1994:30). ).

Em termos macroeconômicos, o crescente aperfeiçoamento dos derivativos resultou na institucionalização da atividade especulativa dentro dos sistemas monetários, de crédito e de capitais. Além disso, a utilização dos derivativos, em especial as operações de balcão, engendrou um processo de intensa integração intra e entre mercados financeiros nacionais e off-shore. Os agentes passaram a realizar operações em mercados específicos que se mostram mais atraentes e seguros, uma vez que podem efetuar uma operações de hedge de juros e, sobretudo, de câmbio.

Assim, ao viabilizar uma maior integração dos mercados, o desenvolvimento desses instrumentos contribuiu para a elevação da capacidade de alastramento de disfunções ocorridas neste mercado para outros. Em suma, a multiplicação dos instrumentos de transferência de risco intensifica a interconexão dos vários segmentos do mercado, inclusive de alguns muito limitados, pouco conhecidos e munidos de pequeno número de market makers. A propagação pode advir de um segmento (por exemplo as opções de câmbio ou de swaps de longo vencimento nos mercados de balcão), passando para outros (mercados organizados e mercados de títulos subjacentes aos derivativos), criando turbulências cuja intensidade depende do grau de liquidez dos sucessivos mercados.

Assim, os derivativos podem acentuar a instabilidade que eles não criam, sobretudo naqueles mercados muito alavancados. Nos períodos de turbulência (crash da Bolsa de Nova York em 1987, crise do mercado de bônus em 1994, crise dos países do Sudeste Asiático em 1997), os comportamentos miméticos e as operações por rumores acarretam muitas vezes um distanciamento das cotações com relação aos valores considerados fundamentais, as operações com derivativos seguem a tendência e a reforçam em vez de estabilizá-la. "Afinal de contas, essa projeção das operações virtuais que são os derivativos e que perturba na mesma proporção que ilumina os mercados, é realmente preocupante. O que ocorre com os hedge funds revela sem cessar que os derivativos estão no centro de um dos modos de gestão atuais mais especulativos e mais desmaterializados" (Bourguinat, 1995:36-37).

A existência de diversidade de opiniões entre os agentes é fundamental para o funcionamento dos mercados derivativos. Ou seja, pressupõe-se que haja avaliações distintas por parte dos agentes e que sejam compensadas entre si (bull e bear na linguagem keynesiana). Como se trata de um mercado de soma zero, os mecanismos de prevenção contra riscos de preço (derivativos de juros, câmbio etc.) e de crédito (taxas de juros flutuantes, derivativos de crédito etc.) são simples instrumentos de transferência de risco de um agente para o outro. Não existe de fato uma eliminação do risco.

Ademais, não existe qualquer mecanismo de segurança capaz de cobrir o risco do conjunto do sistema, em face de uma tendência de avaliação de risco que vá numa única direção (baixista). Quando os agentes decidem realizar as mesmas posições ao mesmo tempo, o mercado quebra. Assim, as operações de cobertura de risco - eficazes aos agentes tomados isoladamente - podem, devido à concentração de ordens em momentos de instabilidade, constituir um fator suplementar de desestabilização e de perda de liquidez, já que reforçam a unanimidade. A necessidade de obter recursos monetários para liquidar posições pode transmitir a vulnerabilidade ao resto do sistema (Farhi, 1997:272).

Em resumo, os instrumentos derivativos apresentam aspectos contraditórios. Por um lado, aumentam a previsibilidade dos agentes econômicos, pois possibilitam um processo de transferência de risco de preço e cumprem um papel de estabilização e coordenação das expectativas, reduzindo a incerteza, do ponto de vista microeconômico. Por outro lado, uma vez que operam alavancados, generalizando o espírito especulativo dos agentes, e como estão relacionados com amplas redes de transmissão, possuem um potencial para exacerbar a instabilidade dos mercados, do ponto de vista macroeconômico. Nas palavras de Farhi (1997:297): "nascidos da volatilidade dos preços dos ativos financeiros, os mercados de derivativos alimentam-se dela e podem contribuir para acentuá-la em períodos de instabilidade financeira mais pronunciada. Mas, em que pese o fato de poderem agravar a ameaça potencial das crises sistêmicas, esses instrumentos permitem aos agentes lidar com as incertezas decorrentes dessa volatilidade e os ligam íntima e permanentemente às condições que lhes deram origem".

A função do sistema bancário

Num sistema baseado no mercado de capitais como o norte-americano, a principal função dos bancos é a oferta de crédito às instituições financeiras e aos agentes que atuam nesse mercado, de modo a garantir o funcionamento do mercado à vista, isto é, garantir a liquidez das carteiras. Nesse sentido, o papel dos bancos não é tanto o carregamento dos títulos, mas o suprimento das necessidades de circulação, sendo o carregamento feito pelos poupadores, com destaque para os investidores institucionais. Porém, isso não significa que os bancos se tornaram irrelevantes no processo de intermediação financeira por cinco razões principais. Em primeiro lugar, o crédito bancário ainda possui um peso residual considerável. Em segundo, o sistema de pagamento precisa ser operado pelos sistemas bancários. Vale dizer, a liquidação das operações financeiras dos intermediários não-bancários precisa ser realizada pelo sistema bancário. Em terceiro lugar, o sistema bancário continua sendo o principal criador de liquidez, dada a faculdade emissora de crédito, associada à atuação do banco central. Em quarto, os bancos entraram no jogo da intermediação dos ativos, seja como market makers, seja mediante parcerias ou fusões e aquisições de fundos de pensão, companhias de seguro e fundos de investimento para operarem nos mercados de capitais. Geralmente, essas operações (derivativos, commercial papers etc.) são fora de balanço. Em quinto lugar, os bancos continuam sendo o maior depositário de informações sobre as corporações não-financeiras. Portanto, mantêm um papel relevante na avaliação da qualidade dos projetos de investimento.

Contudo, o crescente envolvimento dos bancos comerciais nos mercados de capitais "significou que muito do dinheiro novo se destina a financiar os mercados de capitais, por meio de empréstimos bancários rotativos e linhas de crédito para investidores institucionais (por exemplo, fundos mútuos, fundos de pensão), corretores, bancos de investimento subscrevendo novas emissões de títulos e os próprios emissores. Ao fornecerem recursos para diferentes agentes do mercado e eles mesmos comprarem mais títulos, os bancos tornaram vários mercados financeiros mais líquidos e, portanto, mais seguros. Sua oferta de recursos também facilitou o financiamento da aquisição de ativos por meio de empréstimos. Essa alavancagem multiplica o ganho potencial das negociações com ativos, ao reduzir a quantidade de capital próprio investido por cada investidor. Finalmente, os bancos comerciais têm sustentado o uso de ativos como garantia para empréstimos para financiar novas aquisições de ativos, prática conhecida como piramidização, que permite aos investidores constituírem fortes posições de negociação com muito pouco capital próprio" (Guttmann, 1996:68).

A determinação das políticas monetária e cambial

Todo esse processo está progressivamente intricando a administração das taxas de juro de curto prazo e de câmbio pelo Federal Reserve e pelo Tesouro norte-americano. No entanto, isso não implica perda absoluta de controle sobre essas variáveis. Como afirmam Tavares & Melin (1997:12), "o mundo pós-Bretton Woods deixou de operar como um sistema de reservas bancárias e cambiais dos bancos centrais há muito tempo, pois desde que a moeda interbancária se endogeneizou à escala internacional, a questão que se coloca não é mais de padrão monetário, mas se há ou não uma moeda financeira de origem pública capaz de cumprir o papel na securitização. Esta moeda existe e é, naturalmente, o dólar, sob o comando da política monetária e cambial do Federal Reserve (e do Tesouro)".

Os procedimentos de intervenção do Federal Reserve nos mercados monetários evidenciam três tendências (4 4 Para uma discussão mais geral sobre esses pontos, ver Kneeshaw & Van den Bergh (1989). ). Em primeiro lugar, identificamos uma restrição ao recurso do sistema bancário a créditos automáticos, ou um reforço do caráter punitivo das operações de redesconto pela transformação dessa taxa no limite superior do espectro de taxas de curto prazo do mercado monetário. Em segundo, verificamos a diminuição do coeficiente de reservas exigido do sistema bancário e o uso limitado desse coeficiente como instrumento de política monetária. Em terceiro lugar, observamos o emprego crescente de operações de mercado aberto e de outros instrumentos de sintonia fina para administrar a oferta de reservas e minimizar os impactos sobre a liquidez sistêmica. Essas transformações sintetizam a busca de maior flexibilidade na administração da taxa de curto prazo, dotando a política monetária de instrumentos para lidar com choques adversos, volatilidade de expectativas e pressões do mercado cambial.

As operações de mercado aberto são realizadas com o objetivo de manter a taxa interbancária - Federal funds rate - dentro de um intervalo estreito de variação. As mudanças mais significativas na operacionalização da política monetária encontram-se no desenvolvimento de novas técnicas e instrumentos para administrar as reservas bancárias e a taxa de juros de curto prazo. Alguns desses instrumentos são semelhantes aos utilizados pelos mercados financeiros privados. Em alguns casos, pressupõem transações de mercado a preços cotados pelos dealers desses próprios mercados. Em outros, a taxa de juros aplicável pode ser administrada de forma mais flexível pelo Federal Reserve dado que as transações realizadas têm especificidades que as diferenciam das operações regulares de crédito de mercado.

As operações no mercado secundário de títulos públicos são transações de mercado balcão, sendo que os dealers primários, geralmente departamentos especializados dos grandes bancos comerciais e de investimento, controlam um volume significativo das ordens de compra e venda. Esses dealers são chamados a efetuar ofertas para os diversos títulos, com diferentes maturidades. As alocações entre os dealers são realizadas pelo melhor preço de oferta que varia até o volume desejado de títulos ser colocado ou comprado. O contexto institucional dessas operações é distinto das operações de administração da dívida pública, conduzidas pelo Tesouro. A implementação da política monetária consiste essencialmente em compras e vendas no mercado secundário, conduzidas pelo Federal Reserve. Entre os novos instrumentos utilizados pelo banco central norte-americano destacamos as operações de mercado com títulos governamentais, moedas estrangeiras e outros ativos com ou sem cláusulas de recompra, ou as operações reversas.

Nos últimos anos, o Federal Reserve vem fazendo uso crescente das operações reversas para melhor regular seus mercados monetários. As transações de compra reversa (Repurchase Agreement] , que consistem na compra de títulos com cláusula para recompra a um determinado preço em uma data futura preestabelecida, tornaram-se um instrumento fundamental na expansão temporária das reservas bancárias. Ao mesmo tempo, a venda e recompra (Matched Sale Purchase Transaction) servem como veículos de absorção temporária de reservas, sem efeito significativo no preço dos títulos subjacentes.

Esses dois instrumentos podem também ser empregados no mercado cambial. As operações reversas com divisas procuram estabilizar a taxa de câmbio e minimizar o impacto das variações cambiais nas taxas do mercado monetário. As reservas em dólares dos principais bancos centrais são aplicadas em títulos do Tesouro norte-americano ou no euromercado. A medida que variações dessas reservas se refletem nos movimentos de depósitos junto ao Federal Reserve, seus efeitos na disponibilidade de reservas bancárias domésticas são constantemente compensados por meio de operações de mercado aberto, alterando a taxa interbancária. Apesar de as reservas em divisas do Federal Reserve e do Tesouro serem pequenas são suplementadas, sempre que necessário, por swaps de divisas com outros bancos centrais (Miranda, 1997:54-56).

Desde a "diplomacia do dólar forte", um controle rigoroso do Federal Reserve e do Tesouro sobre a taxa de juros e de câmbio, marcou a evolução das políticas de globalização financeira dos Estados Unidos, "praticando abertamente uma política monetária e cambial violentamente intervencionista", independente do estágio no ciclo econômico (Tavares & Melin, 1997). Assim, o principal mecanismo de regulação desse sistema de acumulação financeira que se globalizou é a política monetária norte-americana. Vale dizer, a política monetária dos principais países tem uma tendência a se mover de forma interdependente/interconectada com o Federal Reserve estabelecendo a direção básica.

A interdependência dos sistemas financeiros nacionais num contexto de crescente liberalização dos movimentos de capitais, com portfolios cada vez mais plurimonetários, implica que uma simples tensão nas taxas dos títulos públicos de 30 anos do Tesouro norte-americano pode abalar toda a estrutura das taxas de juros, e não apenas o segmento dos títulos. Por efeito indireto, afeta o segmento das ações e, mediante as exigências de margens, o dos futuros de índices etc. Como afirma a revista Business Week (republicado na Gazeta Mercantil, 7.11.1997:B-20): "afinal o que acontecer no mercados dos Estados Unidos dará o tom ao resto do mundo". Assim, a globalização financeira pode difundir, às vezes de forma devastadora, os impulsos desestabilizadores, produzidos nos pontos nevrálgicos dos mercados.

Na crise das bolsas de valores de outubro de 1997, assistimos a esse fenômeno de contágio de uma forma sem precedentes: o movimento de queda dos valores das ações iniciou-se em Hong Kong, alastrou-se pela Asia, Europa e rebateu nos Estados Unidos, acompanhando a mudança nos fusos horários. Em setembro de 1998, acompanhamos o resgate do fundo de investimento de risco (hedge fund), chamado Long Term Capital Management (LTCM), que poderia ter abalado o mercado de derivativos e "paralisado as finanças globais", se nao fosse a intervenção do Federal Reserve. Com US$ 4 bilhões em capital, tinha ativos de US$ 120 bilhões e girava apostas, com base em empréstimos e utilizando instrumentos derivativos, que ultrapassavam um valor nocional de US$ 1,2 trilhão. Depois dessa operação de resgate, muitos bancos de investimento revelaram detalhes de suas exposições ao LTCM e, em alguns casos, aos fundos de investimento de risco de um modo geral. Essas revelações mostraram que os bancos haviam seguido estratégias semelhantes às adotadas pelo LTCM, mas numa escala muito maior, no agregado. Noutras palavras, enquanto o LTCM tinha exposição de US$ 80 bilhões em arbitragens entre títulos do Tesouro norte-americano, os bancos tinham US$ 3 trilhões comprometidos em apostas semelhantes. Esse foi o motivo fundamental da decisão do Federal Reserve em patrocinar a operação de salvamento do LTCM. Se esse fundo de investimento de risco fosse à falência, e suas posições liquidadas, transformaria as apostas dos bancos em enormes prejuízos. Uma vez que as posições eram reavaliadas diariamente, os bancos teriam se tornado tecnicamente insolvent es (The Economist, 1998).

A dimensão internacional da política

monetária norte-americana

A dimensão internacional da política monetária norte-americana decorre da combinação de vários fatores, entre eles a hierarquização e a heterogeneidade própria da "mundializaçao do capital" e o papel desempenhado pelos Estados Unidos, a interconexão dos mercados de títulos privados, ações e moedas, e o crescimento da participação de não-residentes no financiamento da dívida pública do país.

Os dados para investimentos estrangeiros nos EUA, divulgados pela Securities Industry Association, mostram que em 1996 atingiram o valor sem precedentes de US$ 480 bilhões: a circulação financeira absorveu US$ 384 bilhões, numa combinação de demanda por papéis de renda fixa e por ações, enquanto o investimento direto representou apenas 1/5, US$ 96 bilhões. No final de 1996, o estoque de investimentos estrangeiros em ativos financeiros atingiu US$ 2,9 trilhões (tabela 13).

Os títulos do Tesouro em poder de investidores estrangeiros chegaram a US$ 1,1 trilhão no final de 1996. Apenas nesse ano houve um crescimento de quase 33%. E o dobro do que os estrangeiros detinham em 1992 (US$ 549,7 bilhões). Eqüivale ainda a 33,2% de todos os papéis do Tesouro norte-americano em mãos privadas. Isso num período em que as taxas de juros nos EUA ficaram estáveis ou caíram.

Em 1997, os investidores estrangeiros continuaram comprando grande volume de títulos públicos, atingindo US$ 1,2 trilhão ou quase 37% do estoque detido pelo setor privado (US$ 3,4 trilhões). Em dezembro de 1998, os maiores detentores de títulos do Tesouro norte-americano eram o Japão e o Reino Unido, combinando ativos de US$ 538,4 bilhões, 52% dos títulos mantidos nas carteiras dos investidores estrangeiros (5 5 Devemos salientar que os dados apresentados pelo U. S. Treasury não refletem necessariamente a nacionalidade do último detentor do título negociado. Muitos investidores - privados ou oficiais - estrangeiros de títulos públicos norte-americanos podem manter seus títulos em contas fora de seus próprios países, a fim de preservar o sigilo nas suas transações. Seguramente, essa decisão contribui para o grande volume de títulos públicos americanos arrolados ao Reino Unido, um grande centro financeiro mundial, bem como para as Antilhas Holandesas, um grande centro financeiro offshore (Sobol, 1998:4). ).

Entre dezembro de 1994 e dezembro de 1998 houve um declínio relativo da participação das instituições financeiras oficiais (bancos centrais, BIS, FMI, BIRD etc.) no estoque de dívida pública norte-americana detida por investidores estrangeiros, de 64,4% para 46,7% e, por conseguinte, ampliando a participação dos investidores privados nas compras líquidas de títulos do Tesouro norte-americano (tabela 14).

Os investidores norte-americanos também procuraram ativos estrangeiros, comprando US$ 57,9 bilhões em ações, o segundo valor mais alto da história. O recorde continua sendo o ano de 1993, quando as compras por eles efetuadas nas bolsas do resto do mundo alcançaram o valor de US$ 62,7 bilhões, dos quais apenas 22%, ou seja, US$ 13 bilhões foram direcionados aos mercados emergentes. A Ásia recebeu cerca de 60% (US$ 8,1 bilhões) e a América Latina ficou com apenas US$ 3,2 bilhões, dos quais US$ 2,5 bilhões vieram para o Brasil.

Esses dados demonstram por que os Estados Unidos se tornaram o epicentro da globalização financeira. Assim, torna-se possível compreender por que as decisões sobre as taxas de juros nos EUA afetam os mercados do mundo todo. A riqueza financeira mundial está extremamente concentrada em títulos denominados na moeda norte-americana e as decisões do Federal Reserve e do Tesouro são decisivas em seus processos de valorização/desvalorização.

Como maior devedor do mundo, os Estados Unidos dependem dos fluxos de financiamento do exterior e, portanto, da necessidade de garantir a confiança dos investidores nos títulos do Tesouro. Isso implica a manutenção de uma taxa de juros real positiva para evitar a fuga de capitais, fundando o que Chesnais (1996b:262) denomina de um regime de taxa de juros real positiva. Inicialmente muito elevadas (entre 12% e 8%, em termos reais, de 1980 a 1984), as taxas de juros foram progressivamente caindo, à medida que o regime de financiamento das demandas públicas e privadas de liquidez nos mercados de capitais foram se estendendo para outros países.

A dinâmica do sistema financeiro norte-americano:

aberto e integrado

Formou-se, então, a partir dos Estados Unidos um sistema financeiro aberto e integrado, que busca a manutenção de um rendimento real positivo. No sistema de crédito característico do pós-guerra, o relevante era a manutenção dos fluxos de financiamento pelos bancos comerciais e pelo Federal Reserve; nos mercados de capitais contemporâneos o relevante é a permanente avaliação dos estoques, pois o ajuste ocorre na variação dos preços dos ativos (6 6 Sobre os processos de ajuste por variações de preços dos ativos, ver Goldstein et al. (1994:2-6), que descreve a crise e os ajustes no mercado de bônus, no início de 1994. ).

De acordo com Belluzzo (1993:15-16): "os mercados de capitais, de maneira geral, tendem a individualizar as perdas, isto é, descarregar sobre os agentes privados o risco da inadimplência ou da iliquidez. Isso significa que essas formas são intrinsecamente deflacionárias. Dito de outra forma: as tensões de iliquidez ou de inadimplemento que surgem em algum ponto do sistema são 'resolvidas' pela queda de preços dos instrumentos financeiros. Essas características contrastam com as tendências 'inflacionárias' implícitas no sistema de crédito em que as situações de iliquidez e possibilidade de 'quebra' eram enfrentadas pelo Banco Central por meio do redesconto ou de ações de last resort. Por isso mesmo, nos novos mercados financeiros a informação elaborada pelas agências de avaliação de crédito torna-se um elemento fundamental na decisão dos investidores".

A gestão dos estoques de ativos fica submetida a uma grande vulnerabilidade das taxas de juros às expectativas de inflação, a fim de manter um retorno real positivo. A taxa de inflação constitui uma ameaça permanente de desvalorização da massa de riqueza financeira. O sistema torna-se intrinsecamente "desinflacionista": a inflação é um tumor que precisa ser eliminado, estabelecendo um viés deflacionário nas políticas macroeconômicas para evitar ataques especulativos contra as moedas (7 7 Na comunidade financeira, no Tesouro e no Federal Reserve Board, generaliza-se a convicção de que a capacidade de crescimento não-inflacionário da economia americana ficou limitada entre 2 e 2,5%, uma taxa de expansão de 4,1% seria perigosamente elevada. Isso porque a inflação decorrente de um crescimento acelerado ameaçaria desvalorizar os estoques de ativos (cambiais, acionários, de títulos, imobiliários etc.). A economia financeira, à qual o Federal Reserve reage, está mais preocupada com a inviolabilidade do mercado de títulos e associa a expansão mais baixa à solidez financeira. Segundo a revista Business Week (15.4.96), "embora o índice dos preços ao consumidor tenha subido a uma taxa de apenas 3% ou menos durante cinco anos consecutivos, os mercados financeiros reagem com sinais de 'inflacionofobia' à primeira elevação de um preço". ).

Uma pronunciada e súbita reversão do ciclo de "inflação de ativos" pode acarretar o aparecimento de desequilíbrios patrimoniais. "Aos primeiros sinais de aquecimento do nível de atividade e diante da percepção de que os ativos estão sobrevalorizados e de que as taxas de juros de longo prazo estão baixas - diante da inflação projetada - os agentes mais ágeis atiram primeiro e precipitam um sett off, provocando uma espiral baixista dos preços dos títulos e, conseqüentemente, as taxas de juros longas se elevam abruptamente. Com isso, o mercado emite sinais para as autoridades monetárias de que considera adequada e, ao mesmo tempo, inquietante a elevação das taxas de juros curtas. Isto explica, aliás, o aumento da volatilidade dos preços (e das taxas longas) durante as etapas de baixa do ciclo financeiro. Parece ser uma peculiaridade destes mercados de riqueza e de sua dinâmica cíclica, a endogeneização dos movimentos da taxa de juros longa e a subordinação do manejo das taxas curtas às expectativas que comandam as alterações no curso das primeiras" (Coutinho & Belluzzo, 1996:133-134).

O impacto na condução da política econômica

A condução da política econômica torna-se sensivelmente mais constrangida pela forma de atuação desses mercados globalizados. A exacerbação dos comportamentos especulativos e os volumes empregados exercem uma verdadeira tirania sobre as políticas econômicas e constrangem as autoridades a não interferir nas suas antecipações. A magnitude dos títulos públicos em poder de investidores estrangeiros, bem como a liberalização dos mercados reforçam consideravelmente o elo entre a política fiscal (sobretudo da dívida pública) e a taxa de câmbio e, por meio dessa relação, também com a política monetária. Qualquer ampliação do gasto público e, por conseguinte, da dívida pública, pode provocar desconfiança nos investidores estrangeiros quanto à viabilidade futura de serem honrados os contratos de dívida.

Essa desconfiança poderia desencadear um movimento de saída de capitais (ataque especulativo a moeda nacional) com profundas conseqüências desestabilizadoras. Então, as políticas nacionais ficam sob uma severa vigilância dos investidores, impondo maior rigidez à política fiscal e à elevação da taxa de juros (dado um maior prêmio de risco).

Em suma, o mercado financeiro global torna-se um censor permanente das políticas econômicas nacionais. Segundo Bourguinat (1995:49): "o campo de possibilidades das escolhas públicas foi ampliado pelas finanças internacionais, mas também claramente restringido, de tal forma que se pode, desde já, perguntar se não estamos indo em direção a uma 'tirania dos mercados financeiros'?".

No mesmo sentido, Belluzzo (1995:19) afirma: "a nova finança e sua lógica tornaram-se decisivas por sua capacidade de impor vetos às políticas macroeconômicas. Esse poder de veto dos mercados financeiros se impõe a todas as economias, ainda que de forma diferenciada. Os Estados Unidos, por exemplo, emissores e gestores da moeda-reserva internacional, dispõem de maior raio de manobra para executar políticas fiscais e monetárias expansionistas, desde que aceitem o risco permanente de ataques especulativos contra o dólar e administrem adequadamente as tensões que se manifestam através da elevação imediata das taxas de juros de longo prazo, quando o crescimento é julgado 'excessivo' pelos mercados".

As transformações no corporate governance

Finalmente, nesse mercado de capitais globalizado o financiamento da acumulação produtiva torna-se mais seletivo, amplificando a heterogeneidade: as empresas que não dispõem de uma boa classificação de risco são excluídas ou devem pagar taxas de risco muito elevadas (8 8 São as grandes corporações que têm acesso aos mercados organizados de novos títulos financeiros: "colocação de títulos e financiamento internacional ainda são alternativas acessíveis somente a poucas empresas muito grandes, competitivas e em expansão. Tamanho, reputação e credenciais são condições essenciais para levantar fundos nos mercados financeiros internacionais. Estimativas recentes sugerem que aproximadamente cem empresas européias e algumas centenas de americanas e japonesas cumprem tais requisitos" (OECD, 1987:167). ). "Os mercados de capitais são mais sensíveis à avaliação do risco, o que determina uma maior seletividade na escolha dos papéis oferecidos à consideração dos gestores de carteira" (Belluzzo, 1995:18), a despeito da natureza globalizada dos mercados que permite às grandes empresas amplo acesso aos mecanismos de hedge e de precaução contra oscilações nas taxas de câmbio e nas condições de crédito nos diversos países onde atuam.

Além disso, no contexto da globalização financeira, os rendimentos das corporações são constantemente monitorados pelos investidores institucionais (fundos mútuos, fundos de pensão e companhias de seguro etc.), detentores de grandes carteiras de ações, que têm a possibilidade de comparar tal rendimento aos demais ativos financeiros. Assim, os grupos empresariais precisam ser eminentemente rentáveis. Essa rentabilidade não pode mais ser ancorada unicamente na produção e comercialização do grupo e de suas filiais, mas deve incluir operações ativas nos mercados financeiros mundializados, inclusive no mercado de câmbio.

O crescimento dos investidores institucionais determina alterações importantes, nem de longe concluídas, nas formas de entrelaçamento entre as finanças e a indústria (tabela 15). Parte significativa de seus ativos financeiros está sob a forma de pacotes de ações, de maior ou menor vulto, porém suficientes para ditar as estratégias dos grupos industriais. Dessa forma, os investidores institucionais influem no comportamento do investimento ou acentuam suas características, fortalecendo a propensão as fusões e aquisições, priorizando investimentos de reestruturação e racionalização, pressionando por reduções de custos, inclusive de pessoal e automatizando de forma acelerada etc. Trata-se de condicionar as decisões de produção e de investimento diante do objetivo dos investidores de portfólio, mediante transformações no regime de corporate governance, exacerbando a busca de um rendimento financeiro mínimo de curto prazo, ancorado num lucro patrimonial (ganhos de capital na gestão dos estoques).

Os diversos administradores de dinheiro buscam a maior rentabilidade possível dos ativos e, portanto, procuram uma taxa de juros elevada (high-expected-return) com liquidez a curto prazo, o que contrasta com as necessidades de financiamento das empresas (taxa de juro inferior à taxa de retorno esperada dos investimentos). Isso faz com que o financiamento da inovação tecnológica fique mais complexo dado o maior risco, resultando em redução na taxa de crescimento do investimento.

Segundo Minsky (1994:20): "tendências recentes indicam que os fundos mútuos tornaram-se o principal investimento das famílias e a precípua fonte de financiamento das empresas. O passivo dos fundos é administrado na forma de portfólios, que são continuamente avaliados pelos mercados. As técnicas de investimento dos fundos mútuos utilizam principalmente os instrumentos que podem ser negociados a partir de informações gerais disponíveis, ao contrário das informações privadas presentes num processo de contratação de um empréstimo bancário". Noutras palavras, o sistema de financiamento da economia norte-americana está fundado num passivo incerto, continuamente avaliado pelo mercado, bem como num sistema de pagamento baseado numa carteira de ativos públicos e privados, geridos sob a forma de investimento de portfólio pelos investidores institucionais, o que constitui um padrão profundamente instável de gestão da riqueza. No entanto, a globalização dessa forma de gestão da riqueza está induzindo um progressivo alinhamento de todos os sistemas econômicos com o norte-americano (9 9 Apesar de as diferenças que ainda persistem entre os principais países, o modelo de gestão da riqueza norte-americano (e por semelhança o inglês) se estabelece como eixo do processo, com a notável reafirmação da posição central dos Estados Unidos na dominação capitalista mundial, após 1982. Nas palavras mais prosaicas de Thomas L. Fredman (New Tork Times, apud Ricupero & Gall, 1997:4): "esse fenômeno que chamamos 'globalização' - integração de mercados, comércio, finanças, informação e propriedade de empresas em todo o globo - é atualmente um fenômeno muito americano: usa orelhas de Mickey Mouse, come Big Macs, bebe Coca-Cola, fala em celulares Motorola e rastreia seus investimentos com a Merrill Lynch usando Windows 95. Em outras palavras, os países ligados na globalização estão na realidade se conectando a um alto grau de americanização". ).

Os riscos potenciais da dinâmica financeira global

Vários problemas podem surgir dessa nova dinâmica financeira globalizada. O principal é o recrudescimento dos processos especulativos e o aumento da instabilidade financeira através da maior volatilidade no preço dos ativos (cambial, acionário, de títulos e imobiliário) (10 10 A título de exemplo, as cotações das principais moedas podem mudar 20 vezes no espaço de um minuto, com a taxa dólar-marco alemão mudando até 18 mil vezes num único dia. Nos períodos mais agitados, um único dealer chega a efetuar uma operação a cada 2-4 minutos. ). Se o desenvolvimento dos instrumentos derivativos viabiliza maior flexibilidade e proteção ao risco individual, também introduz novos riscos, sobretudo em nível agregado, uma vez que aumenta a opacidade dos sistemas financeiros, com profundos riscos de ruptura.

Dada a crescente interpenetração, o risco sistêmico assume amplitude planetária. Por risco sistêmico entendemos o risco de instabilidade global que resulta da propagação dos movimentos especulativos nos mercados, quando a interação dos comportamentos individuais, longe de desembocar em ajustes corretivos, agrava os desequilíbrios. A crise sistêmica está ligada ao funcionamento do próprio sistema e não basta uma melhor repartição dos riscos individuais através da diversificação dos portfólios. Ela só pode ser resolvida por uma regulação de origem externa (extra-mercado), efetuada pelas autoridades monetárias (Aglietta, 1995:72).

Alguns autores (Barber & Ghilarducci, 1993:289; Guttmann, 1994:293; Kurz, 1996; Tavares & Melin, 1997:9) referem-se a esse regime de finanças mundializado como "capitalismo-cassino". Uma referência a Keynes (1936:116, grifos no original): "Num dos maiores mercados de investimento do mundo, a saber, o de New York, a influência da especulação é enorme. Mesmo fora do campo das finanças, a tendência dos americanos é atribuir um interesse excessivo na descoberta do que a opinião julga ser a opinião média e esse pender nacional encontra seu castigo na Bolsa de Valores. (...) Os especuladores podem não causar dano quando são apenas bolhas num fluxo constante de empreendimento, mas a situação torna-se séria quando o empreendimento se converte em bolhas no turbilhão especulativo. Quando o desenvolvimento do capital em um país se converte em subproduto das atividades de um cassino, o trabalho tende a ser malfeito".

Não há dúvida de que esse comportamento foi levado ao paroxismo com a globalização financeira - "the global casino of high finance" (Strange, 1986:1) -, que trouxe consigo uma nova regulação financeira mundial marcada pela lógica dos investidores de portfólios, procurando "otimizar" globalmente os rendimentos financeiros líquidos, através de operações que visam antecipar as variações dos preços dos ativos nos diferentes mercados e, assim, obter ganhos de capital, inclusive utilizando os instrumentos derivativos. Bourguinat (1995:11) chamou esse processo de "economia internacional de especulação".

A especulação definida como uma operação que não tem nenhuma finalidade além do lucro que pode gerar. Tais operações desejadas por si mesmas, e que se baseiam na antecipação da variação dos preços dos ativos para realizar um lucro a partir de uma tomada de posição, atingiram uma proporção sem precedentes. Ou seja, o motivo especulação (Keynes, 1936) penetrou profundamente nas finanças contemporâneas (11 11 Na verdade, com os instrumentos derivativos a especulação passa a determinar o comportamento de todos os agentes (financeiros e não-financeiros). ). A multiplicação dos ativos dos investidores institucionais, inclusive dos hedge funds, e a possibilidade crescente de uma gestão multimercados abriram caminho para operações até então confinadas a um grupo muito restrito de operadores especializados. A diversificação internacional torna-se cada vez mais um imperativo, o que tende a aumentar a parcela dos ativos estrangeiros nos portfólios.

As compras (vendas) dos ativos estrangeiros se fazem de acordo com considerações relativas às taxas de câmbio e aos diferenciais de rendimentos esperados. Isso se torna verdadeiramente uma obsessão das diferentes tesourarias e, assim, a linha divisória entre uma gestão prudente e uma especulação fica cada vez mais tênue. Utilizando os derivativos financeiros, que causaram "uma profunda desmaterialização das finanças", os investidores procuram gerenciar os riscos das taxas de juro e de câmbio, mas também explorar as oportunidades de um mercado que se ampliou extraordinariamente ao se globalizar (Bourguinart, 1995:22).

Farhi (1997:163-164) levanta a hipótese de que o crescimento e o aprofundamento dos mercados derivativos financeiros implicaram alterações no próprio conceito de especulação financeira. Atualmente, especula em ativos financeiros aquele que detém uma posição no mercado à vista ou de derivativos sem uma posição oposta no outro. Vale dizer, "consideramos como especulação as posições líquidas, compradas ou vendidas, num mercado de ativos financeiros (à vista ou de derivativos) sem cobertura por uma posição oposta no mercado, com outra temporalidade no mesmo ativo ou num ativo efetivamente correlato. Essa definição permite estabelecer a distinção entre as posições especulativas, de hedge e de arbitragem. Posições líquidas compradas ou vendidas num mercado de ativos financeiros são, evidentemente, mantidas para tirar benefício de um esperado movimento de preços. Mas, após a criação dos mercados de derivativos financeiros e a sua difusão à maioria dos ativos, é o fato de as posições serem mantidas líquidas, sem cobertura por uma posição oposta em outra temporalidade e no mesmo ativo, ou num ativo correlato, que as caracteriza como especulativas, e nao o fato de serem resultantes de uma expectativa concernente aos preços, já que esta permeia todos os tipos de operações realizadas nos mercados".

Assim, devemos considerar que embora a possibilidade de uma crise financeira privada seja remota, devido à ação de lender of last resort do Federal Reserve associada às redes de proteção privadas (linhas de crédito garantidas entre os grandes bancos privados, sistemas de controle de risco etc.), o crescimento dos mercados monetários e de capitais privados impõe novos riscos.

Esses riscos estão relacionados, em primeiro lugar, às dificuldades de se estabelecer um controle efetivo sobre as instituições e as novas operações, sobretudo os derivativos financeiros e as transações com moedas, no interbancário internacional. Em segundo lugar, a desregulamentação, com liberação de taxas de captação e aplicação, juntamente com o acirramento do processo de concorrência entre as instituições financeiras diminuíram os spreads cobrados e as margens de segurança. Em terceiro lugar, grandes posições assumidas nos mercados de capitais foram alavancadas pela expansão do crédito bancário, que forneceu o call money na linguagem dos brokers de Wall Street. Em quarto lugar, aparece o problema do comportamento do mercado de títulos. Como as instituições financeiras concentraram suas operações em títulos, uma queda generalizada nos seus preços pode colocar em risco toda a solvabilidade do sistema. Atualmente, o risco de quebra do sistema financeiro está mais relacionado ao comportamento do preço de seus ativos do que a corridas bancárias. Estas foram praticamente eliminadas pela introdução dos seguros de depósitos. E no comportamento e na dinâmica dos mercados de títulos em si que residem os problemas (Baer et al. 1994).

A estabilidade dos mercados de títulos depende em grande parte da diversidade de opiniões dos agentes. A crescente concentração dos recursos em fundos de investimento e o desenvolvimento de sistemas informacionais tendem a diminuir a diversidade de expectativas, levando ao que se poderia chamar de risco de convergência de opiniões, eliminando o pressuposto que daria uma certa estabilidade ao mercado. "As decisões de investimento estão crescentemente concentradas nos administradores profissionais de fundos. Simultaneamente, conforme se expandem tecnologias de informações sofisticadas, as 'notícias' relevantes para a tomada de decisões financeiras estão chegando cada vez mais no mesmo instante. Assim, durante aqueles períodos em que os administradores dos fundos compartilham percepções homogêneas sobre a evolução das variáveis financeiras e sobre os impactos das notícias, existe o potencial para que novas informações produzam compras/vendas maciças e grandes movimentos nos preços" (Goldstein et al, 1993:2).

Nesse sentido, a queda de 508 pontos no índice Dow Jones em 19 de outubro de 1987 foi um colapso, cuja responsabilidade recaiu sobre um fenômeno da era da informática conhecido como "operações administradas por programas de computação" (program trading) (12 12 Program trading - trata-se de programas de negociação por computador, isto é, compra ou venda de ativos (ações, bônus, moedas etc.) realizadas por intermédio de computador por especialista em arbitragem de índices ou investidores institucionais. A palavra programa refere-se aos programas de computador que monitoram constantemente os mercados de ações, futuros e opções, emitindo sinais de compra e venda quando há oportunidade de lucros com arbitragem e quando as condições de mercado garantem acúmulo em carteira ou operações de liquidação. ). Em 1988, foi introduzido o sistema chamado circuit breaker', para interromper temporariamente as operações com ações, índices futuros de ações, preços de securities, opções, etc. quando o mercado recuasse até um determinado ponto, em um período específico (13 13 Em 1990, a Bolsa de Valores de Nova York (NYSE) adotou também as travas (tick rule). Esses mecanismos são acionados quando o índice Dow Jones de 30 ações industriais varia mais de 50 pontos acima ou abaixo dos níveis de abertura. Além disso, estabeleceu-se a Regra da Venda a Descoberto ( short-sale rule) também conhecida por uptick rule. Trata-se de uma regra da Securities and Exchange Commission determinando que as vendas a descoberto só podem ser executadas quando o valor da negociação for superior ao da transação anterior do mesmo título. Ou seja, só podem ser realizadas em um mercado em alta. ). Esse mecanismo foi aperfeiçoado após outra queda brusca do mercado, ocorrida em outubro de 1989. O objetivo desses sistemas é evitar a queda livre do mercado e permitir uma reavaliação das ordens de compra e venda programadas de forma automática nos sistemas de computação.

Conseqüentemente, há um grande potencial de volatilidade no comportamento dos preços dos ativos. Com a convergência de opiniões, os preços podem sofrer bruscas modificações, o que aumenta a possibilidade de crises financeiras quando ocorrem desvalorizações acentuadas no valor dos ativos das instituições. Com a internacionalização dos mercados, essas crises tendem a se propagar entre os diferentes sistemas financeiros e cambiais.

Enfim, o espetáculo dos mercados financeiros contemporâneos, com o aprofundamento da dinâmica comandada pelos mercados de capitais globalizados, parece indicar que a era keynesiana - os chamados "anos dourados" do crescimento capitalista liderado pelos Estados Unidos - foi sucedida por turbulências e instabilidades, a despeito de imperar no mundo a idéia de que os mercados são perfeitos e, portanto, tendem ao equilíbrio. Esperamos ter mostrado que os mercados operam num desequilíbrio dinâmico globalizado, em que os agentes econômicos, buscando livremente seus interesses, não geram uma prosperidade global, como propaga a ideologia dominante. Impõe-se a necessidade de se construírem instâncias públicas de decisão capazes de coordenar e ordenar as finanças globalizadas, bem como de disciplinar os megapoderes privados. Isso porque o mercado sozinho não pode construir uma nova organização monetária internacional, pois instituir novas regras e novas estruturas nao é um processo meramente econômico, mas um ato de soberania.

Considerações finais

Procuramos demonstrar que a dinâmica das "finanças diretas globalizadas", a partir do sistema financeiro norte-americano está ancorada nos seguintes elementos:

  • na expansão dos investidores institucionais (fundos de pensão, fundos mútuos, companhias de seguro);

  • no processo de securitização das dívidas públicas e privadas;

  • nos derivativos financeiros, procurando reduzir a incerteza financeira, proveniente das flutuações nas taxas de câmbio, juros, preços de

    commodities etc.;

  • num regime de taxa de juros positiva, a fim de gerir os estoque de ativos;

  • na predominância de uma política monetária deflacionista, sendo que a sensibilidade à inflação e a aversão à iliquidez, que se exprimem mediante as reações das taxas de juros de longo prazo, funcionam como freio automáticos, cuja função é conter o crescimento da economia real, antes que ele se revele

    inconveniente para os detentores da riqueza financeira;

  • nas políticas de intervenção do

    Federal Reserpe e do Tesouro norte-americano mantendo o dólar como a moeda financeira internacional;

  • no domínio da política monetária norte-americana, de acordo com a revista

    The Economist (November 24,1997): "em um mundo onde a predominância da economia americana não tem rivais - e possivelmente excede até mesmo a posição que detinha nos anos 50 - nenhum país terá como conduzir uma política monetária independente do Federal Reserve Bank";

  • num

    corporate governance em que os investidores institucionais ditam as estratégias de investimento das empresas, impondo uma busca por retornos de curto prazo, problematizando a introdução das inovações produtivas.

Esses elementos evidenciam a especificidade das transformações contemporâneas dentro do movimento permanente de internacionalização do capital. A marca distintiva do atual movimento de internacionalização capitalista é a forma em que se deu a globalização das finanças, viabilizada pelas políticas de desregulamentaçao dos mercados, iniciada pelos Estados Unidos, e alavancada pelo sistema de taxas de câmbio flutuante. As finanças passaram a operar num espaço mundial, hierarquizado a partir do sistema financeiro norte-americano e viabilizado pela política monetária do Estado hegemônico, imitada, de imediato, pelos demais países industrializados.

Notas

___________. A 'new view' of the role of banking firms in keynesian monetary theory Knoxville, M.E. Sharpe, Inc. Journal of Post Keynesian Economics., v. 14, n. 3, p. 311-320, Spring 1992.

Marcos Antonio Macedo Cintra, doutor pelo Instituto de Economia da Unicamp, é pesquisador da Diretoria de Economia do Setor Público da Fundap. Publicou, entre outros trabalhos, Uma visão crítica da teoria da repressão financeira, Editora da Unicamp/Fapesp, 1999; organizou, com Maria Cristina Penido de Freitas, o livro As transformações institucionais dos sistemas financeiros: um estudo comparado (Diesp/Fundap/Fapesp, 1998).

O texto é uma versão modificada do capítulo conclusivo da tese de doutoramento do autor (Cintra, 1997), que é grato às observações do professor José Carlos de Souza Braga (orientador), bem como de Júlio Sérgio Gomes de Almeida, Maria Cristina Penido de Freitas e Carlos Eduardo Carvalho.

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  • VERCELLI, A. Methodological foundations of macroeconomics: Keynes and Lucas. Cambridge, Cambridge University Press, 1991.
  • 1
    Estamos sugerindo que o dinamismo da globalização financeira está vinculado às transformações financeiras desencadeadas a partir dos Estados Unidos. Porém, já atingiu uma dinâmica própria. A União Européia, por exemplo, propôs um acordo global de liberalização dos serviços financeiros, sob os auspícios da Organização Mundial de Comércio. O acordo compromete os países envolvidos a abrirem mutuamente seus mercados financeiros, com base em um tratamento de país mais favorecido. Isso significa que as concessões oferecidas a uma nação serão automaticamente estendidas às outras. Esse acordo foi ratificado em dezembro de 1997 (Cintra, 1999).
  • 2
    Segundo Vercelli (1991:74, nota 3) a "contraposição entre risco e incerteza é terminológicamente ilógica e deveria ser evitada. Incerteza refere-se a qualquer situação em que não há certeza. Risco usualmente designa o 'custo' de uma decisão errada e se aplica em qualquer tipo de incerteza". Assim, Vercelli (1991:76-77) defende a hipótese de um variável grau de confiança nas projeções para o futuro dos agentes. Propõe, então, que se estabeleça uma distinção entre, num extremo, a incerteza simples ("risco") em que "apenas uma única distribuição de probabilidade é epistemológicamente possível e seu grau de confiança é máximo" e, noutro, uma definição de incerteza no sentido heurístico de Keynes (1936), denominada "incerteza-k", em que "nenhuma distribuição de probabilidades é considerada suficientemente confiável" (o caleidoscópio de Schacke, 1967). Entre esses dois extremos, pode haver um contínuo de acordo com o grau de confiabilidade da distribuição de probabilidades (ou peso do argumento). Essa hipótese permite apreender certos movimentos de preços que ocorrem nos mercado financeiros, pois a despeito da incerteza que predomina sobre a evolução futura de preços, as transações são efetuadas (veja também Dymski, 1998b).
  • 3
    O crescimento dos novos mercados de derivativos pode reduzir a transparência das posições de mercado. Neste caso, os riscos aumentariam devido à redução da capacidade de reguladores e demais agentes de mercado interpretarem os sinais e controlarem os riscos adequadamente (Goodhart, 1994:30).
  • 4
    Para uma discussão mais geral sobre esses pontos, ver Kneeshaw & Van den Bergh (1989).
  • 5
    Devemos salientar que os dados apresentados pelo
    U. S. Treasury não refletem necessariamente a nacionalidade do último detentor do título negociado. Muitos investidores - privados ou oficiais - estrangeiros de títulos públicos norte-americanos podem manter seus títulos em contas fora de seus próprios países, a fim de preservar o sigilo nas suas transações. Seguramente, essa decisão contribui para o grande volume de títulos públicos americanos arrolados ao Reino Unido, um grande centro financeiro mundial, bem como para as Antilhas Holandesas, um grande centro financeiro
    offshore (Sobol, 1998:4).
  • 6
    Sobre os processos de ajuste por variações de preços dos ativos, ver Goldstein
    et al. (1994:2-6), que descreve a crise e os ajustes no mercado de bônus, no início de 1994.
  • 7
    Na comunidade financeira, no Tesouro e no
    Federal Reserve Board, generaliza-se a convicção de que a capacidade de crescimento não-inflacionário da economia americana ficou limitada entre 2 e 2,5%, uma taxa de expansão de 4,1% seria perigosamente elevada. Isso porque a inflação decorrente de um crescimento acelerado ameaçaria desvalorizar os estoques de ativos (cambiais, acionários, de títulos, imobiliários etc.). A economia financeira, à qual o
    Federal Reserve reage, está mais preocupada com a inviolabilidade do mercado de títulos e associa a expansão mais baixa à solidez financeira. Segundo a revista
    Business Week (15.4.96), "embora o índice dos preços ao consumidor tenha subido a uma taxa de apenas 3% ou menos durante cinco anos consecutivos, os mercados financeiros reagem com sinais de 'inflacionofobia' à primeira elevação de um preço".
  • 8
    São as grandes corporações que têm acesso aos mercados organizados de novos títulos financeiros: "colocação de títulos e financiamento internacional ainda são alternativas acessíveis somente a poucas empresas muito grandes, competitivas e em expansão. Tamanho, reputação e credenciais são condições essenciais para levantar fundos nos mercados financeiros internacionais. Estimativas recentes sugerem que aproximadamente cem empresas européias e algumas centenas de americanas e japonesas cumprem tais requisitos" (OECD, 1987:167).
  • 9
    Apesar de as diferenças que ainda persistem entre os principais países, o modelo de gestão da riqueza norte-americano (e por semelhança o inglês) se estabelece como eixo do processo, com a notável reafirmação da posição central dos Estados Unidos na dominação capitalista mundial, após 1982. Nas palavras mais prosaicas de Thomas L. Fredman
    (New Tork Times, apud Ricupero & Gall, 1997:4): "esse fenômeno que chamamos 'globalização' - integração de mercados, comércio, finanças, informação e propriedade de empresas em todo o globo - é atualmente um fenômeno muito americano: usa orelhas de Mickey Mouse, come Big Macs, bebe Coca-Cola, fala em celulares Motorola e rastreia seus investimentos com a Merrill Lynch usando Windows 95. Em outras palavras, os países ligados na globalização estão na realidade se conectando a um alto grau de americanização".
  • 10
    A título de exemplo, as cotações das principais moedas podem mudar 20 vezes no espaço de um minuto, com a taxa dólar-marco alemão mudando até 18 mil vezes num único dia. Nos períodos mais agitados, um único
    dealer chega a efetuar uma operação a cada 2-4 minutos.
  • 11
    Na verdade, com os instrumentos derivativos a especulação passa a determinar o comportamento de todos os agentes (financeiros e não-financeiros).
  • 12
    Program trading - trata-se de programas de negociação por computador, isto é, compra ou venda de ativos (ações, bônus, moedas etc.) realizadas por intermédio de computador por especialista em arbitragem de índices ou investidores institucionais. A palavra
    programa refere-se aos programas de computador que monitoram constantemente os mercados de ações, futuros e opções, emitindo sinais de compra e venda quando há oportunidade de lucros com arbitragem e quando as condições de mercado garantem acúmulo em carteira ou operações de liquidação.
  • 13
    Em 1990, a Bolsa de Valores de Nova York (NYSE) adotou também as travas
    (tick rule). Esses mecanismos são acionados quando o índice Dow Jones de 30 ações industriais varia mais de 50 pontos acima ou abaixo dos níveis de abertura. Além disso, estabeleceu-se a Regra da Venda a Descoberto (
    short-sale rule) também conhecida por
    uptick rule. Trata-se de uma regra da
    Securities and Exchange Commission determinando que as vendas a descoberto só podem ser executadas quando o valor da negociação for superior ao da transação anterior do mesmo título. Ou seja, só podem ser realizadas em um mercado em alta.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Abr 2005
    • Data do Fascículo
      Ago 2000
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