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Brasil, ciência, tecnologia: alguns dilemas e desafios

BRASIL: DILEMAS E DESAFIOS III

Brasil, ciência, tecnologia: alguns dilemas e desafios

Hernan Chaimovich

A IMPORTÂNCIA das opções que venham a ser feitas em ciência e tecnologia para o desenvolvimento brasileiro é hoje evidente. A extensão deste artigo impõe a escolha de alguns aspectos num tema tão amplo. Optei por uma descrição quase sumária de alguns dos dilemas organizacionais, ao invés de tratar dos desafios internos à ciência e tecnologia. Um se refere ao equilíbrio entre a liberdade do cientista e a necessidade social do conhecimento, outro à tensão entre o prazer individual da criação e as condições objetivas da estrutura onde o cientista trabalha. Também serão consideradas as alternativas entre a centralização de criação de ciência e tecnologia e os desequilíbrios regionais. Incluo ainda as alternativas entre fontes de financiamento e desafios decorrentes dos conflitos atuais entre o público e o privado. Difícil é pensar neste tema sem analisar, também, a relação atual entre ciência, tecnologia e inovação. Os dilemas éticos da ciência integram capítulo à parte que perpassa todos os anteriores e não serão aqui tratados.

Justamente agora, quando a globalização se apresenta como inevitável sem que se esclareça sequer o(s) seu(s) significado(s), escrever sobre os desafios para ciência e tecnologia no Brasil implica esclarecer as alternativas que podem ser sustentadas pela história recente.

Desde a revolução industrial a evolução da ciência é inseparável da sua aplicação no mundo desenvolvido. A explosão no financiamento de ciência nos Estados Unidos da América (EUA), após o lançamento do Sputnik é um exemplo clássico. A necessidade política determinou, no fim da década de 50, um maciço investimento em ciência que se estendeu desde a escola secundária até os centros de pesquisa, desde as Universidades até as empresas. O poder de compra do Estado, no país mais capitalista da época, fez com que o complexo militar-industrial exercesse uma pressão crescente sobre as organizações de pesquisa, que se expandem em todas as direções do conhecimento. O resultado dessa pressão, financiada pelo Estado, se faz sentir rapidamente e os EUA passam a ser o centro qualitativa e quantitativamente mais importante de produção de conhecimento, tecnologias e produtos, já na década seguinte. O interlúdio japonês, bem como a curta dança dos tigres asiáticos, sem estarem sustentados numa base de conhecimento comparável, são de duração curta e não ameaçam, de verdade, a atual supremacia norte-americana.

Ainda em tempos de globalização é evidente, no mundo todo, que o poder de compra do Estado tem um papel determinante nas áreas nas quais as necessidades sociais são marcadas por intervenções públicas. Saúde, educação e segurança, entre outras, continuam a ser, até no Brasil, áreas onde o setor público é central. A correlação entre o poder de compra do Estado e o desenvolvimento científico-tecnológico é evidente nos países desenvolvidos. Assumir esta relação no Brasil poder-se-ia tornar um fator determinante no futuro do sistema de ciência-tecnologia e inovação e, por decorrência, no desenvolvimento. Transformar o poder de compra do Estado em uma das ferramentas do desenvolvimento científico e tecnológico é uma decisão possível, nada garantida pela pressão de alguns para diminuir a presença do Estado. A natureza reguladora do Estado numa série de áreas não diminui o seu poder de compra, e em outras o poder de compra do Estado determina o tamanho e as relações do mercado. O desenvolvimento tecnológico e a ciência básica relacionada com essas tecnologias poderiam, como já aconteceu alhures, ser determinados por decisão de exercer esse poder de compra.

A sustentação do sistema de produção de ciência em países desenvolvidos se estende da área mais diretamente relacionada com a aplicação até aquela que, aparentemente, não tem relação alguma. O adensamento de áreas de "fronteira", definidas muitas vezes como aquelas que estão mais perto da aplicação, nunca deixou sem expansão, nos países onde a ciência se aplica, toda a extensão da ciência. E as aplicações podem surgir de onde menos se espera. Quem poderia predizer, por exemplo, que a observação das folhas de lotus através do microscópio de varredura poderia vir a produzir tintas que, quando aplicadas, resultam em carros autolimpantes? (1 1 W. Barthlott & C. Neinhuis, Purity of the sacred lotus or escape from contamination in biological interfaces. Planta 202, n. 1, 1997; ver também www.botanik.uni0bonn.de/system/bionics.htm. )

O resultado da pressão por inovação, observada em países desenvolvidos, se estende desde os interesses privados até o poder de compra do Estado. Esta pressão conduz, especialmente em tempos recentes, a uma estrutura de produção de ciência cuja densidade temática varia no tempo mas que, em média, cresce de forma inexorável.

E o Brasil? Claro que a evolução é diferente. Neste país tropical, cujo nome deriva de uma árvore, a exportação de pau brasil para extrair o corante não foi acompanhada pelo desenvolvimento da compreensão dos corantes ou da conservação das árvores que o produziam.

A produção organizada de ciência no Brasil começa há pouco tempo. É bem verdade que cientistas houve, que algumas descobertas foram feitas, mas como organizar a ciência se a Coroa portuguesa evitou a todo custo a organização de universidades na colônia? Onde os cientistas poderiam conversar se a Academia Brasileira de Ciências foi fundada há menos de 80 anos? Alguns institutos públicos de pesquisa, mais antigos que as Universidades, tiveram picos de criação de ciência e aplicações preciosas acompanhados por longos períodos de crises. A história da profissionalização da ciência no Brasil numa estrutura estável começa na fundação da Universidade de São Paulo, em 1934, e na concepção do regime de tempo integral à docência e à pesquisa. E por aí se espalhou pelo Brasil. O resultado dessa semente, porque "aqui plantando dá", foi talvez uma das iniciativas públicas melhor sucedidas nos últimos 30 anos.

Para analisar a evolução recente da ciência no Brasil tomo como referencial um sistema de organização de informação científica que coleta títulos e resumos daqueles trabalhos publicados em revistas de circulação internacional: o Institute for Scientific Information (isi). O uso desta base de dados já foi suficientemente debatido e não vou me deter a justificá-lo aqui (2 2 L. de Meis & J. Leta, O perfil da ciência brasileira. Rio de Janeiro, Ed. UFRJ, 1996, 104 p., ISBN 85-7108-189-1. ).

As patentes, que constituem um dos indicadores de inovação, apresentam crescentemente na sua página de rosto, referências aos mesmos trabalhos indexados no isi. Nas áreas tecnologicamente mais ativas, o número de publicações científicas indexadas já começa a ser similar às referências a outras patentes. Sem falar que as referências têm um forte desvio nacional, isto é, as patentes de um país costumam citar os cientistas do mesmo país com mais freqüência que os de outros países. Lá se vai um outro mito, o de que países que não produzem ciência podem inovar com a ciência dos outros (3 3 Hamilton Narin e Olivastro, Research Policy, 26, 317, 1997. ). Um dos desafios mais evidentes é um esforço conjunto, entre universidades, empresas e governo, que faça com que a modesta contribuição brasileira para as patentes atinja crescimento comparável à produção de ciência, sem mudar a natureza diferente dos parceiros.

A contribuição brasileira à ciência indexada aumentou de um valor de 0,4% em 1990 para mais de 1,2% em 1999. Este salto decenal da contribuição brasileira reflete decisões claras que têm mais a ver com o financiamento à ciência e à pós-graduação do que com um aumento comparável no PNB por habitante. Poucos países no mundo deram este salto, fruto de decisões e não resultado determinista da mudança do PNB/hab nesta parte do continente. Os dados comparativos de alguns países latino-americanos sugerem que esta afirmação é sustentável (figura 1).


No Brasil, a relação entre as publicações, o produto nacional bruto por habitante e o número de habitantes aumenta significativamente na década, apesar de o aumento do PNB/hab do Brasil ter sido o menor no período. O aumento do PNB/hab no período para Chile, Argentina e Brasil foi de 56, 36 e 8%, respectivamente (Inter-American Development Bank). Usando os mesmos índices, o valor de produção científica para os EUA em 1999 é 5.89, e o PNB/hab é dez vezes maior que o brasileiro.

Assim, corrigindo-se o número de publicações científicas brasileiras pelo aumento da população, ainda que o desempenho econômico na década tenha sido pobre quando medido pela riqueza/habitante, merece destaque o desempenho do pequeno segmento da população que produz ciência. Deve-se repetir que esta constatação destaca a participação das universidades públicas no esforço de desenvolvimento nacional, ainda que o imaginário corrente teime em tentar demonstrar a falência de qualquer serviço público. No Brasil, a produção de ciência é realizada quase na sua totalidade nas universidades públicas, que não têm crescido na graduação e expandido sobretudo a pós-graduação. A expansão do ensino superior, que hoje alcança a mais de dois milhões de estudantes, dá-se especialmente num sistema privado que pouco contribui para a produção nacional de ciência e tecnologia.

Diante disso, a questão central a ser analisada se refere à sustentabilidade e potencial de crescimento deste fenômeno. Por via de conseqüência, decisões devem ser tomadas para garantir a sustentabilidade ou, alternativamente, ter consciência que outras decisões podem, rapidamente, fazer com que este espetacular crescimento se detenha. Estas questões devem ser consideradas à luz da conveniência social e não simplesmente como decorrência de uma dinâmica própria da produção de ciência.

É suficientemente conhecida a constatação dupla de que a ciência e a tecnologia não causam desenvolvimento socialmente justo e de que, sem um sistema adequado de ciência e tecnologia, é impossível, hoje, pensar em desenvolvimento. Assim, ao considerar a necessidade de solidificar o sistema de ciência e tecnologia, não se pode chegar ao limite de pensar que é o sistema que determina o desenvolvimento. Não há futuro sustentável se o sistema de ciência nacional não se relaciona com o sistema nacional de inovação, com a incorporação de valor a produtos de exportação, com a solução dos graves problemas de distribuição de renda e com o acesso à saúde no Brasil.

A fonte de financiamento mais significativa de sistemas de ciência é pública em todo o mundo. A ciência básica é desenvolvida quase inteiramente em universidades e institutos de pesquisa. Apesar de o discurso sobre a importância do financiamento privado para a criação em ciência básica, todos os dados disponíveis no mundo mostram que este subsistema é financiado majoritariamente por fundos públicos. O financiamento para a criação em ciência básica pode ter áreas que são privilegiadas no tempo, mas o sistema depende de um financiamento harmônico, que cubra essencialmente todas as áreas do conhecimento. A decisão política sobre esta linha de financiamento é uma decorrência da compreensão, em nível do Estado, da correlação entre a produção de ciência básica e os outros sistemas que conduzem ao desenvolvimento socialmente justo.

É sabido que ciência não se planeja, mas que investimento em ciência deve ser planejado (4 4 H. Chaimovich, Sobre planejamento e ciência. Jornal da USP, jun 1998. ). O dilema entre a vontade individual do cientista (balcão) e a necessidade de investimento em áreas prioritárias (programa) há muito constitui uma preocupação. A história recente da Fapesp mostra como se resolve este dilema na prática. O recente aumento da importância dos Programas da Fapesp não tem inibido, nem diminuído, o balcão. O julgamento de qualidade é um referencial comum para balcão e programa.

O desafio, então, é a extensão dessa política para o Brasil. Quando surgem bem-vindos Fundos Setoriais, que com novas fontes de recursos públicos vão financiar setores definidos de pesquisa, é essencial manter o financiamento às iniciativas individuais de pesquisadores em todas as áreas de conhecimento. Para todas as agências federais de financiamento vale lembrar ser essencial que o equilíbrio balcão/programa não deve conduzir ao financiamento de balcão apenas para projetos com muita probabilidade de sucesso. Correr-se ia o risco de diminuir o componente central da criação em ciência, que é a procura pelo realmente desconhecido. Nesse sentido, um desafio adicional no planejamento do investimento de ciência é a determinação de áreas da ciência que reconhecidamente, por serem pouco desenvolvidas, constituem um empecilho ao desenvolvimento da própria ciência, hoje crescentemente interdisciplinar. Um exemplo nessa direção é a constatação que a era pós-genômica é inteiramente dependente do desenvolvimento da bioinformática.

Dado que no Brasil a produção de ciência e boa parte da tecnologia se realizam na universidade pública, o acesso ao ensino superior e a manutenção da estrutura de pesquisa constituem, hoje, um desafio especialmente agudo. O número de formados pelo sistema de ensino secundário cresce a uma velocidade muito acima do crescimento das vagas no ensino universitário atual. Faz parte do dilema, então, o desafio de aumentar as vagas no sistema de ensino superior. Uma expansão de vagas nas universidades públicas, sem expansão do quadro docente e da infra-estrutura, pode desestruturar toda a produção de ciência no país.

Para enfrentar este dilema devemos considerar que nem todo o ensino superior deve ocorrer, necessariamente, em universidades de pesquisa. Sem entrar nos aspectos tecnológicos, que incluem ensino a distância, um olhar no mundo mostra que em todos os países onde mais de 50% de jovens de 17 a 25 anos estão matriculados no ensino superior - no Brasil esta cifra é de 11% - o sistema é muito diferenciado. Nesses países coexistem universidades de pesquisa, universidades que não oferecem doutoramento, estabelecimentos profissionais, escolas que oferecem cursos de dois anos, escolas técnicas pós-secundárias, enfim uma grande variedade de formas e estruturas de ensino.

Uma das características culturais de nosso meio é a reprodução de uma única forma de ensino, as universidades, onde a relação ensino/pesquisa constitui, muito mais do que uma característica organizacional, uma forma de responder a leis que, formalmente, devem ser obedecidas. Dificilmente as universidades públicas vão sobreviver como produtoras de conhecimento se o sistema de ensino superior não se diferenciar, se a matrícula não se expandir e se não houver pesados investimentos em pessoal e infra-estrutura. Como é difícil antever uma capacidade de investimento público dessa magnitude, esse dilema só poderá ser enfrentado com diferenciação do sistema de ensino superior. É claro, também, que compete ao setor público esta iniciativa, desde que a expansão do sistema privado resultou em organizações que repetindo, na forma, as universidades públicas, não tiveram a capacidade, ou o interesse, em oferecer alternativas. É possível, então, que com investimentos compatíveis com a atual situação, a criação de um sistema diferenciado de ensino superior público tenha como resultados a expansão da população de jovens com melhor formação, a consolidação das universidades de pesquisa e, por que não, a entrada do setor privado em formas alternativas de ensino pós-secundário.

Outros dilemas também estão associados à estrutura das universidades públicas de pesquisa e à concentração geográfica da produção de conhecimento no Brasil.

A rápida mudança da sociedade e dos sistemas de produção, a urbanização crescente, a deterioração da malha social brasileira e a crescente concentração de renda e da violência vêm provocando demandas crescentes à universidade pública de pesquisa. A crescente demanda social por conhecimento, por transparência sobre o impacto social do investimento e por alternativas para políticas públicas decorrentes de análises acadêmicas é pouco compatível com a atual estrutura das universidades públicas em nosso país.

As estruturas das universidades de pesquisa em países mais desenvolvidos acompanharam evolutivamente as mudanças das demandas sociais por conhecimento. No Brasil, as mudanças estruturais das universidades públicas não foram determinadas por uma adequação, também estrutural, às mudanças sociais. O desafio, então, é adequar as pressões sociais múltiplas sobre a universidade de pesquisa à manutenção de uma estrutura acadêmica de produção de conhecimento que, tendo como referência o mundo, mantenha o foco no Brasil. Nesta adequação dever-se-á analisar a relação entre conceitos genéricos, como isonomia e poder, e esse foco. Mantendo, como princípio central, a dignidade acadêmica de todos, precisam ser reconhecidos, na prática, os objetivos pessoais e institucionais que atinjam metas pactuadas de impacto social. Este reconhecimento pode dispensar isonomia. O poder e a sua estrutura devem ajustar-se de forma a estimular o desenvolvimento da capacidade acadêmica coletiva, bem como a transferência desse saber.

A dramática disparidade regional na produção de conhecimento constitui um dos desafios centrais para a reflexão sobre ciência e tecnologia no país. Apesar de ser sobejamente conhecida não resisto, por vício de formação, à tentação de apresentar um gráfico que ilustra esta disparidade (figura 2).


De novo, desde que as universidades públicas são responsáveis pela produção de conhecimento que decorre deste investimento, é nessas instituições que a decisão de mudança deve ser considerada. É claro que a análise por região é sobresimplificada, senão enganosa, uma vez que, dentro de cada região, existem centros produtores de conhecimento comparáveis quanto à qualidade com outros de qualquer parte do mundo. Contudo, o quadro de disparidade subsiste. A existência de universidades públicas que façam pesquisa pode, como bem demonstrado no estado de São Paulo, determinar mudanças nas cadeias produtivas e resultar em melhora da qualidade de vida.

Creio não existir outra alternativa que não seja diminuir disparidades regionais, respeitando-se as vocações locais. Claro que este desafio passa por uma adequação da estrutura da universidade pública, mas também há de se considerar os motivos que determinaram o fracasso de muitas iniciativas que tentaram diminuir as diferenças regionais. Um dos fatores determinantes da frustração de iniciativas passadas foi a desconsideração de regras básicas que mostram ser a qualidade acadêmica essencial para permitir a absorção de investimentos. É preciso também salientar que, sem a participação dos cientistas na gerência das prioridades, os investimentos raramente obtêm qualquer sucesso. A existência de áreas do conhecimento competitivas numa região de baixa densidade de criação científica, demonstra a correlação entre a participação da academia nas decisões e o sucesso da mudança. Ao escolher a física e a química da Universidade Federal de Pernambuco como exemplo, deixo de fora muitos outros, mas lá qualquer análise demonstra esta tese. O desafio é compatibilizar esta constatação com estruturas de poder e carreira nas universidades federais que muitas vezes alijam a academia das decisões substantivas. O sucesso dos investimentos, já garantidos na região pelos novos fundos setoriais do mct, em muito depende do detalhamento deste tipo de reflexão.

Hoje, a distância entre ciência básica, tecnologia e inovação depende do produto de uma forma única. Se é aceito que inovação é um fenômeno que acontece na empresa, o desenvolvimento tecnológico prévio pode, ou não, ocorrer na empresa, dependendo do produto. Como este capítulo é diversificado, limito-me a colocar um exemplo. A seqüência de determinados genes, assunto de ciência básica, pode conduzir, quase de imediato, ao lançamento de métodos de diagnóstico. A passagem do dado de ciência básica (seqüência) ao produto (o kit de diagnóstico) requer a incorporação de tecnologias conhecidas de formulação do produto, operação da produção, estratégias de marketing e distribuição. Para a introdução de um medicamento, por outro lado, o caminho que relaciona a descoberta (básica) à invenção (medicamento utilizável) é longo, demanda criação de nova tecnologia e requer vultosos investimentos. É a cadeia produtiva, e não o conhecimento, que determina a opção de investimento público em tecnologia e inovação. Os limites do investimento público em pesquisa nas universidades - e, portanto, a separação do conhecimento (público) da inovação - impõem desafios que, por dependerem da cadeia produtiva, necessitam ser pactuados com a forte participação da universidade na definição de políticas de investimento.

Enquanto a produção de ciência e tecnologia na Universidade cumpria os papéis de resistência cultural e de ferramenta para a formação de pessoal, a estrutura da universidade podia ter pouca relação com as necessidades dos grupos que desenvolviam esta produção. Mas os desafios múltiplos de hoje, que incluem, entre outras pressões salutares, o uso social do conhecimento, o aumento de vagas, as relações múltiplas com os sistemas produtivos e a desconcentração da produção do conhecimento, requerem adaptações da estrutura, em especial das universidades de pesquisa, para responder as demandas e atingir relações estruturais compatíveis com missões explícitas. No Brasil, o financiamento necessário para que o sistema de produção de ciência e tecnologia das universidades públicas atinja um papel mais central no desenvolvimento socialmente justo deve considerar a academia como setor privilegiado nas decisões sobre planejamento.

Notas

Hernan Chaimovich é professor-titular do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP) e pró-reitor de Pesquisa da USP.

  • 1
    W. Barthlott & C. Neinhuis, Purity of the sacred lotus or escape from contamination in biological interfaces.
    Planta 202, n. 1, 1997; ver também
  • 2
    L. de Meis & J. Leta,
    O perfil da ciência brasileira. Rio de Janeiro, Ed. UFRJ, 1996, 104 p., ISBN 85-7108-189-1.
  • 3
    Hamilton Narin e Olivastro,
    Research Policy, 26, 317, 1997.
  • 4
    H. Chaimovich, Sobre planejamento e ciência.
    Jornal da USP, jun 1998.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Abr 2005
    • Data do Fascículo
      Dez 2000
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