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Uma concepção integrativa de humanidade

RESUMO

Caracterizando a espécie humana por relações fusionais com o ambiente, o autor aplica - em sentido interdisciplinar - a classificação de níveis de coesão social por Marcel Mauss, para confluir dados arqueológicos e demográficos sobre a integração social, respectivamente, na humanidade primitiva e contemporânea. Desse modo, a Ciência - pela confluência entre disciplinas naturais e humanas - pode contribuir para a consciência coletiva (que se tornou eticamente imperativa pelo incremento atual da diversificação de populações) sobre o constante desafio humano pelo qual integra coisas e seres (humanos ou não), integrando a Natureza em ambos os sentidos possíveis e para um desenvolvimento sustentável das sociedades.

PALAVRAS-CHAVE:
Humanidade; Integração; Sociabilidade; Interdisciplinaridade; Mauss

ABSTRACT

Defining the human species by its fusion with the environment, the author applies an interdisciplinary rating of Marcel Mauss’ levels of social cohesion to unite archaeological and demographic data on the social integration of primitive and contemporary societies. In this manner, Science, through the union of natural and human disciplines, can contribute to the collective awareness (which has become an ethical imperative due to the current increase in population diversity) of the constant human challenge whereby it integrates things and organisms (human or otherwise), integrating Nature in both possible ways and for the sustainable development of societies.

KEYWORDS:
Humanity; Integration; Sociability; Interdisciplinarity; Mauss

Todo ser vivo do Planeta é integrante do ambiente, pois depende da exploração de recursos nele encontrados: a vegetação utiliza a energia solar para converter água e gás carbônico em seu próprio tecido, liberando oxigênio excedente para a atmosfera. Animais dependem do mundo vegetal para obter seu alimento e o combinam com o oxigênio, formando água e gás carbônico, essencial para a sobrevivência da vegetação. Organismos morrem por falta temporária de alimentos e/ou água, por aberrações climáticas, pela atividade de predadores ou pela idade avançada: o que a Natureza elimina, também produz novamente, tornando resíduos em material útil para outros organismos, repetindo o ciclo (reciclagem).

Embora seres humanos sejam ingredientes de ambientes como quaisquer outros organismos naturais, a humanidade também é confluente de ambientes porque a vida humana consiste na integração sistemática de coisas e seres (inclusive humanos). Ser humano é ser integrativo e não apenas integrante da Natureza, fundindo-se nela durante o processo, tanto enquanto espécie quanto membro dela. Tudo que é artificial é fusão com o mundo natural, pois até elementos ausentes da Natureza têm em elementos naturais a base de sua geração ou mesmo fundamentos em sua estrutura: trajes, informações, aparatos, instrumentos, arranjos, construções e convenções são fusões de seres humanos a coisas e outros seres (humanos ou não) do ambiente.

Ser integrativo da Natureza (não somente integrante dela) não é exclusividade humana: ninhos de pássaros e cemitérios de elefantes integram coisas e seres a tais animais. Porém, apenas em humanos tal exercício de integração não é pontual, à medida que a vida humana integra seres e coisas em geral, sem exceções ambientais. Nesse sentido, assumindo que relações com a Natureza definam organismos naturais, proponho definir a Humanidade como organismo fusional à Natureza.

Esta é a condição humana: a integração ordinária pela qual estrutura modos de vida (Lopes, 2019_______. O dom cultural: a cultura no desenvolvimento humano. São Paulo, Chiado, 2019., p.58-71) cuja abrangência ambiental caracteriza sua animalidade como espécie: presente em seu suprimento vital, reprodução geracional, formação grupal, exploração recursal, estruturação habitacional e sentido existencial. Tal definição integrativa de Humanidade também é mais propícia a análises interdisciplinares, pois sendo definida pela integração confluente da diversidade ambiental, implicaria confluir os aspectos naturais e sociais da vida humana.

O artigo tem os seguintes objetivos:

  • Contribuir para destacar a autopercepção humana pelas fusões ambientais que exerce, de modo que o aspecto - mais comumente apontado como característico - da criatividade (inclusiva da formulação de significados, em geral) se insira no contexto do exercício humano de sua integração da Natureza;

  • Acentuar enfoques interdisciplinares que confluam especialidades científicas distintas através da Humanidade como objeto comum às mesmas: a Biologia Humana (evolutiva e, especialmente, genética), a Arqueologia, a Demografia, a Geografia Humana, a Paleoantropologia e a Sociologia;

  • Desenvolver o potencial transdisciplinar da noção sociológica de integração social, por Marcel Mauss (1872-1950) - especialmente dos níveis classificados como primevos e modernos - para estabelecer respectivos e especiais nexos arqueológicos e demográficos de seu exercício pela Humanidade.

O artigo se divide em duas seções, nas quais se empregam métodos distintos de análise.

Na primeira seção, relativa à humanidade primitiva - na qual a integração ambiental e social implica a diversidade ancestral de espécies variadas do gênero humano -, foi empregado o método comparativo de análise para correlacionar exercícios integrativos característicos das espécies humanas ancestrais (inclusive nossa), delineando suas magnitudes específicas nos primórdios da evolução humana.

Na segunda seção do artigo - relativa à humanidade contemporânea, na qual as nações consistem em coletividades humanas tão fundamentais quanto desafiadas por níveis mais intensos de integração ambiental e social - foi empregado o método indutivo de análise pela seleção de casos nacionais (Estados Unidos, Alemanha, Portugal e Brasil) como representativos de tendências diversificantes entre populações organizadas em nacionalidades.

Integrações primordiais

A integração ativa de coisas e seres, inclusive e especialmente de outros humanos, caracteriza a humanidade desde os primórdios do próprio gênero (Homo). De fato, a própria cronologia evolucionária das espécies, que o compuseram, evidencia a integração ambiental e coletiva como tendência característica de organismos humanos cada vez mais integrativos.

O exercício integrativo de coisas e seres, por humanos primordiais, teve sentido crescente à medida que se configuravam espécies do gênero Homo e pode ser delineado pelas seguintes atividades: ferramentas industriais, domínio do fogo, migração organizada e adoção estilística. Todas requerentes de uma sociabilidade cuja cumulatividade é indispensável à sua própria realização e superou a encontrada em outros grupos primatas (embora haja estabilidade coletiva em hominídeos como os Australopithecus e monos como os Chimpanzés (Neves, 2006NEVES, W. E no princípio era...o macaco! Estudos Avançados, v.20, n.58, p.249-85, 2006., p.253-4).

Na evolução do gênero Homo, a arqueologia tem detectado - através de fósseis correlatos - a emergência das espécies (em milhões de anos): Homo Habilis (entre 2,0 e 1,7), Homo Rudolfensis (2,3), Homo Ergaster (entre 2,0 e 1,4), Homo erectus (entre 1,8 e 0,03), Homo Heidelbergensis (entre 0,8 e 0,2), Homo Neanderthalensis (entre 0,2 e 0,03) e Homo Sapiens (0,2). Excetuando Neandertais, são de emergência africana, como seus antecessores da família (biológica) hominídea, cuja separação evolutiva dos primatas, em geral, fora há 7,0 milhões de anos (Neves, 2006NEVES, W. E no princípio era...o macaco! Estudos Avançados, v.20, n.58, p.249-85, 2006., p.255-8). Já se encontrou linhagem (Denisovana) derivada de Neandertais na Sibéria (Meyer, 2012MEYER, M. et al. A high-coverage genome sequence from na archaic Denisovan individual. Science, v.338, p.222-26, 2012.) e provável contemporâneo africano (Homo Naledi) de Sapiens (Lopes, 2018LOPES, R. J. Diversidade humana já era enorme desde as origens do Homo Sapiens na África. Folha de S.Paulo, 29 jul. 2018.).

Enquanto a fabricação de ferramentas seja encontrada com o Australopithecus Ghari - hominídeo anterior ao gênero Homo - e chimpanzés, quando (raramente) cacem, também sejam capazes desta atividade (Neves, 2006NEVES, W. E no princípio era...o macaco! Estudos Avançados, v.20, n.58, p.249-85, 2006., p.263), é com o Homo Habilis (primeiro exemplar do gênero) que ela se encontra como sistemática (inclusive mediante transmissão geracional), diferente de comportamento eventual exercido por outros animais. A habilidade que designou este Homo se refere, especificamente, ao fabrico regular de ferramentas (choppers ou chopping-tools) de pedra lascada (Souza, 2011SOUZA, S. M. Dispersão de Homo Sapiens e povoamento dos continentes. In: FERREIRA, L. F.; REINHARD, K. J.; ARAÚJO, A. (Org.) Fundamentos da Paleoparasitologia. S.l.: s.n., 2011. p.69-92., p.74).

Tais ferramentas (enquanto lascas cortantes) eram instrumentos para extração alimentar de carniças primárias como principais fontes energéticas, implicando grupos cooperativos com reciprocidade e inteligência social entre seus membros, já que indivíduos isolados não conseguiriam exploração carniceira competitiva com outros carniceiros (Neves, 2006NEVES, W. E no princípio era...o macaco! Estudos Avançados, v.20, n.58, p.249-85, 2006., p.272). Carcaças de animais também teriam provido Homo Ergaster, os quais extraíam gordura e tutano de carcaças animais (Souza, 2011SOUZA, S. M. Dispersão de Homo Sapiens e povoamento dos continentes. In: FERREIRA, L. F.; REINHARD, K. J.; ARAÚJO, A. (Org.) Fundamentos da Paleoparasitologia. S.l.: s.n., 2011. p.69-92., p.75).

Essa indústria lítica (denominada olduvaiense) teria sido inovada há 1,6 milhão de anos (Neves, 2006NEVES, W. E no princípio era...o macaco! Estudos Avançados, v.20, n.58, p.249-85, 2006., p.263), quando polimento bifacial da pedra passou a produzir lascas mais refinadas e cortantes, propiciando uma indústria (acheulense) cujos instrumentos já denotavam formas preestabelecidas mais eficazes. Tal inovação se deveu aos Homo Ergaster e, principalmente aos Homo Erectus (Neves, 2006, p.264-6), também pioneiros do uso sistemático do fogo, há um milhão de anos - seu emprego pontual seria mais antigo - que potencializou a defesa de predadores e, especialmente, vantagens digestivas do cozimento alimentar (Souza, 2011SOUZA, S. M. Dispersão de Homo Sapiens e povoamento dos continentes. In: FERREIRA, L. F.; REINHARD, K. J.; ARAÚJO, A. (Org.) Fundamentos da Paleoparasitologia. S.l.: s.n., 2011. p.69-92., p.78).

Diversificações industriais ainda são creditadas aos Homo Neanderthalensis, transitando da indústria acheulense à musteriense, cuja cadeia operacional é plenamente ordenada e a busca de matéria-prima é estrategicamente variada (Marciani, 2013MARCIANI, G. O contato entre o homo neandertalensis e o homo sapiens: dados paleoantropológicos, genéticos e arqueológicos. Iniciação Científica, v.11, n.1, 2013., p.199). Onde sapiens não compartilharam mesmos nichos ecológicos com neandertais - ambos foram musterienses enquanto conviveram no Oriente Médio, entre 200 e 40 mil anos atrás - se afirmou a indústria aurinhacense (África e Europa) que empregava, ineditamente (entre 60 e 50 mil anos atrás), dezenas de ferramentas mais que indústrias anteriores e incluindo dentes, ossos e chifres como matéria-prima (Marciani, 2013, p.195-6; Neves, 2006NEVES, W. E no princípio era...o macaco! Estudos Avançados, v.20, n.58, p.249-85, 2006., p.275 e 277).

A primeira espécie a sair da África (a partir de 1,75 milhão de anos) também fora pioneira no uso do fogo e ferramentas líticas padronizadas, que acompanharam sua expansão asiática (Neves, 2006NEVES, W. E no princípio era...o macaco! Estudos Avançados, v.20, n.58, p.249-85, 2006., p.271): os Homo Erectus (assim designados por seus fósseis serem os mais antigos do gênero cuja bipedia era, anatomicamente, imperativa e não opcional). Dessa diáspora humana, porém, não remanesceram populações. A segunda migração - alcançando também Europa - também foi empreendida por humanos arcaicos (Homo Heidelbergensis) dos quais advieram os Neandertais europeus, há cerca de 250 mil anos atrás (Souza, 2011SOUZA, S. M. Dispersão de Homo Sapiens e povoamento dos continentes. In: FERREIRA, L. F.; REINHARD, K. J.; ARAÚJO, A. (Org.) Fundamentos da Paleoparasitologia. S.l.: s.n., 2011. p.69-92., p.76-78).

A terceira disseminação humana - tão mais recente quanto rápida - foi pelos sapiens (derivados do Homo Heidelbergensis, há 200 mil anos, na África) se espalhando por Ásia, Oceania (há 100 mil anos) e Europa (há 50 mil anos), alcançando, progressivamente, todo o globo. Neandertais também migraram da Europa - na qual surgiram - para Ásia (Marciani, 2013MARCIANI, G. O contato entre o homo neandertalensis e o homo sapiens: dados paleoantropológicos, genéticos e arqueológicos. Iniciação Científica, v.11, n.1, 2013., p.192) e dos quais derivaram os denisovanos (Santos, 2014SANTOS, F. R. A grande árvore genealógica humana. Revista UFMG, v.21, n.1 e 2, p.88-113, 2014., p.107).

Como máximo exercício de significação (atribuição de significados a coisas e seres), a simbolização radicaliza a integração ambiental e humana mediante signos reciprocamente definidos. Sendo símbolos os signos predefinidos pela sociabilidade, em geral (Mauss, 2003MAUSS, M. Relações reais e práticas entre a psicologia e a sociologia. In: ___. Sociologia e Antropologia. São Paulo: Cosac Naify, 2003.), quanto mais simbólica - impregnada deles - ela estiver, mais integrada será a própria coletividade específica, inclusive com seu ambiente (porque significado lhe é conferido).

Enquanto a circulação de signos seja implícita à comunicação social (mesmo quando gestual) que viabilizou produção e migração coletivas em todos os humanos primitivos que as empreenderam, só encontramos formulação de símbolos entre neandertais e sapiens. A simbólica neandertalense teve artistas rupestres (há 66 mil anos) e ornamentos (há 115 mil anos) na Europa (Hoffmann, 2018), onde também enterraram mortos (há 50 mil anos) com cuidado não apenas funcional (Rendu, 2013RENDU et al. Evidence supporting an intentional Neandertal burial at La Chappelle-aux-Saints. PNAS, v.111, p.81-86, 2013.).

Mas é a simbólica dos sapiens que adquire plenitude, formulando sistematicamente símbolos que - há 50 mil anos e nos nichos (africanos, asiáticos e europeus) ecológicos ocupados - permeiam sua sociabilidade, inclusive tecnológica. Cento e cinquenta mil anos após emergir como espécie, os sapiens exerceram uma profusão (que a bibliografia denomina revolução) simbólica - criativa e cognitiva - inédita no gênero Homo: sepultamentos rituais, ornamentos populacionais, artes parietais e musicais, organização territorial, instrumentos (de 20 para 75 ferramentas líticas) estilizados e memória coletiva como identidade social (Neves, 2006NEVES, W. E no princípio era...o macaco! Estudos Avançados, v.20, n.58, p.249-85, 2006., p.275, 277-9; Marciani, 2013MARCIANI, G. O contato entre o homo neandertalensis e o homo sapiens: dados paleoantropológicos, genéticos e arqueológicos. Iniciação Científica, v.11, n.1, 2013., p.201-6).

O Quadro 1 das inovações, ordenadas segundo a cronologia evolutiva do gênero Homo, expõe a integração sistemática de coisas e seres (inclusive humanos) como característica especificamente humana e tendencialmente cumulativa:

Quadro 1
Integrações ambientais arcaicas pelo gênero Homo.

Comparar invenções tecnológicas, ocupações de nichos e formulações significantes entre humanos primitivos nos permite inferir que:

  • a condição humana é sistematicamente integrativa à medida que o exercício sistemático de coisas e seres caracteriza todas as espécies do gênero;

  • uma relação fusional com a Natureza caracteriza o gênero como tecnológico, colonizador e significante: integrando-a (mais que sendo integrado à mesma) através de inventos técnicos, ocupações de nichos variados e atribuições de significados a ambientes;

  • a espécie humana mais integrativa foi a sapiens, com os maiores graus tecnológico, migratório e significante do gênero. A maior integração da Natureza à espécie se evidencia pelas técnicas inventadas, migrações entre ambientes distintos e significados atribuídos à mesma, em níveis superiores às demais do gênero. Nesse sentido, dados atuais de arqueologia genética e demográfica também indicam que a integração ambiental dos sapiens teve por base uma correspondente integração social (ou sociabilidade) mais intensa que a exercida entre outras espécies humanas.

Pela classificação1 1 Marcel Mauss (1872-1950) classificou as sociedades em níveis crescentes de integração social: a polissegmentar de grupos distintos entrecruzados; a tribal que sintetiza clãs familiares; o reino cuja integração difusa depende de um poder central extrínseco; a nação cuja integração generalizada prescinde de diferenças internas (Mauss, 2017, p.63-70) dos níveis de integração social, por Mauss, o grau primário de coesão encontrado entre sociedades primitivas é polissegmentar: como articulação direta entre clãs (unidades familiares extensivas de toda a parentela) distintos no mesmo bando, regido por obrigações cruzadas pelos (sub) grupos (Mauss, 2015). Tal nível de sociabilidade é indicado como assumido plenamente (ou em grau maior do que outras espécies humanas) pelos sapiens primitivos, através das evidências genéticas que permitem comparar sua sociabilidade à neandertal - nosso congênere mais convivente em mesmos nichos.

Assim, enquanto neandertais pertenciam a grupos pequenos, separados geograficamente e de endogamia reprodutiva - características evidenciadas pela fixação de anomalias congênitas a populações isoladas - que reduziam sua variabilidade genética (Ríos et al., 2019RÍOS, L. et al. Skeletal anomalies in the neandertal family of El Sidrón (Spain) support a role of inbreeding in neandertal extinction. Scientific Reports, v.9, 1697, 2019.; Rosas et al., 2006ROSAS et al. Paleobiology and comparative morphology of a late Neandertal sample from El Sidrón, Asturias, Spain. PNAS, v.103, n.51, p.19266-71, 2006.), a sociabilidade de sapiens primitivos - desde sua emergência africana, incluindo tanto grupos anteriores à “revolução criativa” do Paleolítico Superior quanto migratórios da África - se estruturava por sucessivas divisões e recomposições entre populações cuja exogamia recorrente lhe conferiu alta variabilidade genética (Scerri et al., 2018SCERRI, E. et al. Did Our Species Evolve in Subdivided Populations across Africa and why does it matters. Trends in Ecology & Evolution, v.33, n.8, p.582-91, 2018.; Tishkoff et al., 2009TISHKOFF, S. et al. The genetic structure and history of africans and african americans. Science, v.324, n.5930, p.1035-44, 2009.).

Tal sociabilidade polissegmentar, em 8 mil gerações por todo o continente (Scerri et al., 2018SCERRI, E. et al. Did Our Species Evolve in Subdivided Populations across Africa and why does it matters. Trends in Ecology & Evolution, v.33, n.8, p.582-91, 2018.), dotou a ancestralidade sapiens de heterogeneidade genética e geográfica (correspondente às tradições linguísticas dos grupos de caça/coleta) superior à das atuais populações fora da África (Tishkoff et al., 2009TISHKOFF, S. et al. The genetic structure and history of africans and african americans. Science, v.324, n.5930, p.1035-44, 2009.). Dado que cérebros primatas se complexificam quanto mais extensos os grupos nos quais se inserem (Neves, 2006NEVES, W. E no princípio era...o macaco! Estudos Avançados, v.20, n.58, p.249-85, 2006.), não surpreende que os polissegmentares sapiens ancestrais já apresentassem técnicas, mobilidades e símbolos - que só confluiriam no Paleolítico Superior - entre 164 e 60 mil anos atrás, do norte ao sul africano e no Oriente Médio (Allan et al., 2015ALLAN, A.; ANDRADE, F.; RANGEL JUNIOR, M. J. Origem e dispersão dos humanos modernos. In: NEVES, W. A.; RANGEL JUNIOR, M. J. MURRIETA, R. S. S. Assim caminhou a humanidade. São Paulo: Palas Athena, 2015., p.274-6). A extensão de cruzamentos populacionais, por sapiens primordiais, alcançou até humanos arcaicos ainda desconhecidos, cuja introgressão genética (2% a 19% do DNA em populações atuais do oeste africano) teria ocorrido há 124 mil anos atrás, no continente (Duvarsala et al., 2020).

Integrações contemporâneas

Ainda sob a premissa da vocação integrativa da humanidade, a integração de coisas também se evidencia pela atualidade da confluência tecnológica como característica acumulativa da evolução técnico-científica, desde a emergência da internet, cuja conexão entre computadores tem, sucessivamente, incluído as várias máquinas, tanto legadas por inventos anteriores, quanto inovadas no bojo da tendência à inteligência artificial (Castells, 1991CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1991.). No mesmo sentido, a integração social atual acarreta níveis de sociabilidade não comportados pelas nações, cujas populações se diferenciam em segmentos correlatos a outros, internos ou não ao âmbito nacional.

De fato, a unidade nacional é uma integração social autocentrada em fatores comuns (moeda, território, ciência e lei) invariáveis às diferenças entre seus membros (inclusive pessoais ou por subgrupos de pertencimento). Enquanto grupos cuja integração coletiva depende da generalização de aspectos comuns, nações não se estruturam através de sua diversificação - qualquer que seja - interna, embora a diversidade seja fundamental entre suas relações (internacionais): a internacionalidade é o meio das sinergias linguística, turística, científica, comercial, artística, diplomática, comunicacional entre nações que se conservam distintas porque dotadas de homogeneidade básica interna, a qual se torna, eventualmente, extrema, durante relações bélicas (guerras) internacionais (Mauss, 2017_______. A Nação. São Paulo: Três Estrelas, 2017., p.79-127).

Minha hipótese é a de que a integração nacional remanesce fundamental à Modernidade, mas que ela passou a comportar segmentações cujos vínculos - internos e/ou externos às nações - as vêm tornando unidades entre grupos populacionais tão distintos quanto associados. À medida que se permeabilizam por diferenças populacionais relevantes, nações tendem a se converter em populações transversais entre si, deixando de serem monoliticamente estabelecidas e se recompondo como diversidades associadas.

Nações transversais emergentes: EUA, Portugal, Alemanha e Brasil

Migrações reduziram seu ímpeto, entre 10 e 5 mil anos atrás, com a domesticação de espécies vegetais e animais, embora tenham readquirido magnitude global durante diásporas colonizadoras - inclusive compulsórias, como no tráfico (negreiro) escravista às Américas (Souza, 2011SOUZA, S. M. Dispersão de Homo Sapiens e povoamento dos continentes. In: FERREIRA, L. F.; REINHARD, K. J.; ARAÚJO, A. (Org.) Fundamentos da Paleoparasitologia. S.l.: s.n., 2011. p.69-92.) - mas apenas recentemente, a velocidade de crescimento dos migrantes superou a da expansão populacional mundial: de 221 milhões em 2010 (2,8% da população global), os migrantes internacionais (que se transladam para nação estrangeira à sua residência usual) alcançaram 272 milhões (3,5% da população global) em 2019 (UN, 2019), portanto, 2% em média e 5,1 milhões ao ano.

Sua relevância econômica reside na composição etária por idade laboral (20 a 64 anos) de 69% dos migrantes em 1990 e que se tornaram 74% do contingente migratório internacional, desde 2010, assim permanecendo até 2019 (UN, 2019). Ainda que apenas 5% dos migrantes sejam de nascidos ao Norte que residam no Sul do Planeta, a migração Sul-Sul (entre nações ao Sul do mundo) já é 39% dos migrantes em 2019 - mantendo o sentido migratório de regiões menos desenvolvidas para mais desenvolvidas - e com ritmo maior do que migrações Sul-Norte (35% em 2019), desde 2005 (UN, 2019).

Dado que a densidade populacional, por área do Mundo (UN Population, 2018, p.46), se distribuía, em 2018, pelas regiões africana (43%), asiática (147%), europeia (34%), latino-americana e caribenha (32%), norte-americana/setentrional (20%) e da Oceania (5%), o trânsito migratório tende a povoar o Planeta (59% de povoamento) com maior disseminação territorial: em 2019, mais da metade (140,9 milhões) dos migrantes internacionais residiam em continentes de baixa densidade populacional (Europa e América do Norte), enquanto apenas parte dos densos continentes africano (norte) e asiático (oeste) recebia pouco mais migrantes do que os que partiam - inclusive migrando no âmbito regional -, embora suas populações migrantes sejam as que mais cresceram (4,4% ao ano) de 2010 a 2019 (UN, 2019). O fluxo migratório mundial (também inclusivo de refugiados internacionais) se tornou objeto da primeira ampla regulação internacional - Pacto Global para a Migração - por 164 nações em 10/12/2018 (ONU Brasil, 2018).

Estados Unidos consistem em nação imigratória - aqui designada por seu contingente imigrante atual superar 10% da população nacional - que evoluiu de 4,7% (1970) a 13,6% (2017), tendo mais que quadruplicado desde a adoção (1965) de sistema nacional de cotas imigratórias (Radford, 2019). Situação semelhante aos primórdios da nação - autoproclamada “de imigrantes” (Glazer, 1988GLAZER, N. A Constituição e a diversidade americana. In: KRISTOL, I. et al. (Org.) A ordem constitucional americana. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1988.) - quando 14,8% (1890) eram imigrados (Radford, 2019).

Embora sejam relevantes os imigrantes ilegais - 23% dos imigrados em 2017 (Radford, 2019) - os principais aspectos integrativos da nação com maior contingente (recorde de 44,4 milhões em 2017) imigratório (Radford, 2019) são:

  • dado que estadunidenses se classificam, usualmente, como brancos, asiáticos, latinos (ou hispânicos) e negros (Morris; Treitler, 2019MORRIS, A.; TREITLER, V. B. O estado racial da União: compreendendo raça e desigualdade racial nos Estados Unidos da América. Caderno CRH, v.32, n.85, 2019.), metade da proveniência imigrante (2017) foi da América Latina e Caribe (25% mexicanos, 10% caribenhos, 8% americanos centrais e 7% sul americanos) e 77% de asiáticos (27% de chineses, indianos e filipinos), latino-americanos e caribenhos (Radford, 2019), tende a se alterar a composição dos segmentos populacionais da nação, ampliando sua diversidade segmentar.

  • a imigração é fundamental ao futuro nacional: em 2017, eram imigrados 17% da PEA (população economicamente ativa) e condicionariam a força de trabalho em 2035; o nível médio de educação de todos os grupos imigrantes (especialmente asiáticos no alcance do bacharelado) supera o do resto da população; inclusive na maternidade imigrante (7,5%) sobre os 5,8% por nascidos nos EUA (Radford, 2019). Imigrantes legais são ampla maioria (77%) e 45% se tornaram cidadãos em 2017 (Radford, 2019).

  • a circulação simbólica nacional se torna mais permeada por valores, artes e memórias coletivas de segmentos hispânicos e asiáticos: à medida que a proficiência na língua inglesa mal supera a metade (56%) dos imigrantes, em geral, há 20 ou mais anos nos Estados Unidos, sendo 43% os que falam espanhol em casa (Radford, 2019). Desde 2010, o ingresso asiático ultrapassou o hispânico e ambos os grupos compuseram, respectivamente, 37,4% e 26,6% do contingente imigratório em 2017, enquanto imigrantes brancos e negros são projetados em respectivos 20% e 9% para 2065 (Radford, 2019).

Como nação emigratória - aqui designada por emigrantes superiores a 10% da população total e de remessas estrangeiras maiores que 1% do PIB (produto interno bruto) nacional -, Portugal se destaca:2 2 O viés dominante na bibliografia portuguesa atual (Góis; Marques, 2018) classifica a nação como tão imigratória quanto emigratória, por nela se cruzarem um sistema migratório europeu (basicamente entre migrantes na União Europeia) e um sistema migratório lusófono (entre Portugal e ex-colônias), com respectivas emigrações (europeias) e imigrações (lusófonas) complementares. Como a imigração portuguesa não equivale a 10% da população residente, nem acarreta remessas mínimas de 1% do PIB português - dimensões essenciais à transversalidade entre segmentos populacionais residentes em nações distintas - o fato de ser contínua indica potencial e não uma característica nacional. Na emigração portuguesa de 1960 a 1970, as taxas anuais mais altas - 1,35% e 1,04% da população residente - foram em 1967/8 (Pordata, 2019) em 2017, se computavam cerca de 2,3 milhões de portugueses emigrados pelo Mundo, equivalendo a 21,9% da população residente no território nacional e remessas ingressadas equivalentes (4,8 milhões de dólares) a 2,2% do PIB, sendo mais de 1% as enviadas de 2,4 milhões de dólares naquele ano (Pires, 2019PIRES, R. P. et al. Emigração Portuguesa. Relatório Estatístico. 2019. Lisboa: Observatório da Emigração e Rede Migra, CIES-IUL, ISCTE-IUL., p.30). Estimativas da ONU apontam 2,6 milhões de emigrados portugueses em 2019 (OeM, 2019).

Na emigração portuguesa pós-2000 se consolidam características emigratórias (inclusive ausentes do fluxo emigrante - anterior á integração tecnológica em rede - da segunda metade do século XX): transcorre em todas as regiões e faixas populacionais nacionais (Góis; Marques, 2018GÓIS, P.; MARQUES, J. C. Retrato de um Portugal migrante: a evolução da emigração, da imigração e do seu estudo nos últimos 40 anos. e-cadernos CES, 29/2018. Disponível em: <https://journals.openedition.org/eces/3307>. Acesso em: 30 out. 2019.
https://journals.openedition.org/eces/33...
, p.7), não decresceu pela retomada econômica portuguesa de 2013 (embora inflada na crise recessiva de 2008) e com majoritária qualificação educacional média (58%), sendo 62% ativos com emprego em 2010 e taxa de emigração - 2000 a 2018 - de 13,1% entre dotados de ensino superior (Pires, 2019PIRES, R. P. et al. Emigração Portuguesa. Relatório Estatístico. 2019. Lisboa: Observatório da Emigração e Rede Migra, CIES-IUL, ISCTE-IUL., p.30-2). No período de recuperação econômica portuguesa (2013/2018), o Banco de Portugal registrou remessas crescentes (ano a ano e cada qual mais de 2% do PIB português) tanto de entrada quanto de saída (Pires, 2019, tabela E4), comprovando sólidas redes emigratórias.

A Alemanha atual se caracteriza tanto como nação imigratória quanto emigratória: cada contingente de imigrantes e emigrantes supera 10% da população residente, a qual alcançou seu máximo populacional histórico (83,2 milhões) em 2018 (Destatis Press, 2019/06).

Além de nação dentre as que mais atraem imigrantes, a imigração germânica atual já tornou 25,4% de sua população “impura” na classificação nazista,3 3 “A nacionalidade, ou melhor, a raça, não se encontra apenas na língua, mas, sobretudo, no sangue” (Hitler, 1933, p.428). à medida que seu status migrante, em 2018, revelou 12,1% de estrangeiros e 13,3% de alemães com algum imigrante entre os pais (Destatis Press, 2019). Dos 112.340 naturalizados em 2018, 68.035 provinham de “raças inferiores” na classificação nazista (Hitler, 1933HITLER, A. Mein Kampf. Munich: Franz Eher Nachf, 1933., p.360): gregos, croatas, poloneses, romenos, russos, sérvios, turcos, ucranianos, africanos, asiáticos, afegãos, iraquianos, iranianos e sírios (Destatis, Naturalisation statistics, 2019). Seus repatriados étnicos (retornados alemães de linhagens exclusivamente germânicas) caíram, anualmente, de 221.995 (1991) a 5.769 (2017), com menos de 100 mil (97.331) desde 1998 e de 10 mil (7.113) desde 2006, após 30.779 repatriados étnicos em 2005 (Destatis, Migration Tables, 2019).

Tal como a nação estadunidense, a nação germânica também tende à circulação simbólica permeada, mas não anulada, por outras fontes: a língua alemã predomina em 56% dos lares coletivos nos quais haja alguém descenda de algum pai não nascido em solo germânico e predominam as línguas turca (17%), russa (15%), polonesa (8%) e árabe (7%) em 44% destas habitações em 2017 (Destatis, Press, 2018/09a). Porém, o futuro nacional ainda depende de maior intensidade imigratória, à medida que as projeções populacionais - especialmente das faixas etárias laborais - interrompem seu crescimento (2024), seguido de redução exponencial (pós-2035), devido ao maior envelhecimento e baixa natalidade (Destatis, Press, 2018/09b e 2019/06). No mesmo sentido, a naturalização potencial de imigrados ainda é pífia: em nenhum ano, entre 2000 e 2018, alcançou 5% dos estrangeiros residentes em condições legais (Destatis, Naturalisation statistics, 2019).

Concomitantemente, a nação germânica se tornou igualmente emigratória (especialmente para outras nações europeias, como a Suíça): entre 1998 e 2017, mesmo período de crescimento imigratório, houve 15.302.220 emigrados da Alemanha. O total emigrante, de 1998 a 2018, foi de 16.487.220 dos 83,2 milhões da população (recorde) ao fim do período (Destatis, Press, 2019) ou 19,8% dos residentes no ano que emigraram 1.185.000, embora imigrantes ainda os tenham superado em 400 mil indivíduos (Destatis, 2019/06).

Como integração transversal interna ao território nacional pode ser destacada a população brasileira atual, à medida que seus segmentos de proveniência europeia, africana e ameríndia - cuja relação discrimina, negativamente e historicamente, ambos os últimos em todos os níveis de sociabilidade4 4 A notória miscigenação brasileira tem constado como subjugação sexual de não brancos por brancos, sem formar casais (Caulfield, 1996, p.134). Na década de 1990, rastreamento genético de brancos brasileiros revelou que 90% de sua ancestralidade paterna (indicada por cromossomo Y transmitido) era portuguesa e sua ancestralidade materna (DNA mitocondrial transmitido) confirmou a tripla presença europeia (39%), africana (28%) e surpreendentes 33% de ameríndia - apesar de ser população reduzida em mais de 90% pela colonização territorial (Pena, 2000). - formaram, ineditamente, mais de 30% de casais inter-raciais em 2010 (IBGE, 2012), grau cuja magnitude estatística é relevante para qualquer fenômeno. Adotados critérios especializados em cor de pele (autodeclarada), brasileiros são classificados (Petruccelli; Saboia, 2013PETRUCCELLI, J. L.; SABOIA, A.L. (Org.) Características étnico-raciais da população: classificações e identidades. Rio de Janeiro: IBGE, 2013.) em brancos, pretos, amarelos (indicando proveniência sino-asiática), indígenas e pardos (categoria miscigenada entre brancos, pretos e indígenas (Caulfield, 1996CAULFIELD, S. Raça, sexo e casamento: crimes sexuais no Rio de Janeiro, 1918-1940. Afro-Ásia, v.18, p.125-64, 1996., p.138) - uniões (conjugais consensuais) inter-raciais exprimem integração entre tais segmentos constitutivos da população, na qual a discriminação negativa dos majoritários pardos e (especialmente) pretos é ostensiva em mercado de trabalho, representação política, condições sociais e vitimização violenta (IBGE, 2019).

Embora tenha sido detectada discriminação racista em famílias inter-raciais, elas são espaços estratégicos para enfrentamento do racismo abrangente (Poli, 2006POLI, M. Repensando as uniões inter-raciais no Brasil. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v.13, n.4, p.1051-57, 2006.; Schucman, 2015SCHUCMAN, L. V. Racismo e “branquitude” na sociedade brasileira. Entrevistador: José T. A. Entrevista concedida à Agência Fapesp, 2015.). Nesse sentido, o crescimento dos casais inter-raciais (apenas 12% dos casados brasileiros em 1960) é constante, sendo maior de 1980 (20%) a 2000 (29,1%): período de expansão educacional nacional e quando pardos crescem em todas as combinações conjugais (Ribeiro; Silva, 2009RIBEIRO, C. A. C.; SILVA, N. V. Cor, educação e casamento: tendências da seletividade marital no Brasil, 1960 a 2000. DADOS - Revista de Ciências Sociais, v.52, p.7-51, 2009., tabela 2). Assumindo que educação e tamanho relativo dos grupos de cor sejam variáveis relevantes para a miscigenação conjugal (Poli, 2006; Ribeiro; Silva, 2009), seus progressos ininterruptos, apesar de curtos, se coadunam com a pioneira autoclassificação majoritária (55,8%) de pardos e pretos em 2000 (Petruccelli; Saboia, 2013PETRUCCELLI, J. L.; SABOIA, A.L. (Org.) Características étnico-raciais da população: classificações e identidades. Rio de Janeiro: IBGE, 2013.) e a superação da fertilidade branca (1,3 filho por mulher) por pretas e pardas (ambas com 2,1 filhos) em 2010, quando o crescente segmento indígena alcançou 3,88 filhos por mulher e 35% de exogamia conjugal (IBGE, 2012).

Mesmo o pouco crescimento de casais inter-raciais (1,6%) foi maior do que o crescimento populacional (1,17%) na década 2000-2010, período de redução da fertilidade geral (1,9%), ineditamente, abaixo da taxa de reposição (2,1 filhos por mulher) mantida por pardas e pretas, mas superada apenas por indígenas. Pela primeira vez, desde o advento de cotas nas universidades públicas, seu contingente majoritário - malgrado não exprimir toda sua magnitude populacional - se tornou de estudantes pretos e pardos em 2018 (IBGE, 2019).

O Quadro 2 resume os tipos de integração transversal - entre segmentos (externos e internos) de nações - que vêm se sobrepondo à moderna integração nacional:

Quadro 2
Nações etnicamente transversais atuais.

A diversificação nacional - tornando nações em grupos onde cada membro tende a integrar vários segmentos distintos entre si - é um processo de integração social emergente durante o período no qual avançou (duas últimas décadas do século XX e duas primeiras décadas do século XXI) a atual convergência tecnológica, na qual:

  • características nacionais tradicionais (gênese imigrante dos Estados Unidos, migrações alemã e portuguesa de meados do século XX, miscigenação constitutiva da brasilidade) são retomadas e atualizadas em redes sociais migratórias e conjugais inéditas;

  • políticas públicas para a inclusão efetiva, de contingentes populacionais indispensáveis à própria reprodução social geral, se tornaram imperativas: capacitando imigrantes nos Estados Unidos e Alemanha, estabelecendo fluxo imigratório constante em Portugal, consolidando a educação da maioria parda/preta e do segmento indígena (único que ainda cresce) no Brasil.

À guisa de conclusão

A autopercepção humana como organismo fusional com a Natureza abrangente forneceria um paradigma (integrativo da Natureza) mais adequado à adoção do desenvolvimento sustentável (Bruntland, 1988BRUNTLAND, G. Nosso futuro comum. Rio de Janeiro: FGV, 1988.) do que os paradigmas atualmente concorrentes.

No paradigma antropocêntrico, ainda predominante mesmo no reconhecimento da crise ambiental (Harari, 2016HARARI, Y. Homo Deus: uma breve história do amanhã. Trad. Paulo Geiger. Rio de Janeiro: Cia. das Letras, 2016.), a crença na superioridade humana sobre a Natureza interpreta, equivocadamente, o que prefiro compreender como relação fusional com a Natureza. Sua tradição ocidental (antes de moderna e inclusive) confere à humanidade status superior à Natureza entregue aos humanos pelas divindades aos quais são semelhantes, em ambas suas fontes judaico-cristã e greco-romana (Gênesis, 1966; Hesíodo, 2007). Por ser o paradigma no qual radica a degradação ecológica pela humanidade (McCormick, 1992), limitaria a sustentabilidade a medidas de compensação predatória (Lopes, 1994LOPES, J. A. V. Meio ambiente e política: tradição regulatória e aspectos redistributivos emergentes. Rio de Janeiro: Iuperj, 1994. Série Estudos, n.90., p.4-8).

No paradigma conservacionista oposto, pelo qual a humanidade se assume como integrante da Natureza (McCormick, 1992) e resgatando tradições orientais (indianas, islâmicas, chinesas e japonesas) de viés cosmocêntrico (Jullien, 2008JULLIEN, F. O diálogo entre as culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 2008., cap. 8), a sustentabilidade também não alcança todo seu potencial. Negligenciada como possibilidade de desenvolvimento econômico e social, tende a se limitar à autocontenção predatória (McCormick, 1992; Lopes, 1994LOPES, J. A. V. Meio ambiente e política: tradição regulatória e aspectos redistributivos emergentes. Rio de Janeiro: Iuperj, 1994. Série Estudos, n.90., p.9-11).

Por sua vez, a adoção de processos de desenvolvimento sustentável não depende, somente, da Humanidade dissolver o dominante paradigma antropocêntrico e ultrapassar o paradigma conservacionista concorrente: seu curso implica sedimentar uma cultura cívica correspondente pela qual se formulem, implantem, consolidem ou ampliem comportamentos integrativos - especialmente mediante políticas públicas de responsabilização social - que não ou menos desintegrem seres humanos e outros. Nesse sentido, as Ciências em geral também são vias que propiciam o reconhecimento urgente da condição humana como vocação integrativa que acarreta, ordinariamente, novos e crescentes riscos por desafiadores níveis de integração da própria espécie.

Ao conceber a Humanidade como espécie integrativa, e sua relação com a Natureza como fusional, importa escolher sempre modo e grau de suas fusões ambientais (inclusivas de sua própria integração social), à medida que ambos se tornam intrínsecos em seu destino. O que destacaria, ainda mais, o desenvolvimento sustentável como única opção condizente de inserção humana dotada de futuro sem pobreza, obsolescência, guerras ou pandemias. Viver ou morrer em rede (Lopes, 2017_______. Viver em rede: as formas emergentes da dádiva. Rio de Janeiro: 7 Letras/FCRB, 2017.) sempre foi e continua sendo nossa fundamental questão.

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Notas

  • 1
    Marcel Mauss (1872-1950) classificou as sociedades em níveis crescentes de integração social: a polissegmentar de grupos distintos entrecruzados; a tribal que sintetiza clãs familiares; o reino cuja integração difusa depende de um poder central extrínseco; a nação cuja integração generalizada prescinde de diferenças internas (Mauss, 2017, p.63-70)
  • 2
    O viés dominante na bibliografia portuguesa atual (Góis; Marques, 2018) classifica a nação como tão imigratória quanto emigratória, por nela se cruzarem um sistema migratório europeu (basicamente entre migrantes na União Europeia) e um sistema migratório lusófono (entre Portugal e ex-colônias), com respectivas emigrações (europeias) e imigrações (lusófonas) complementares. Como a imigração portuguesa não equivale a 10% da população residente, nem acarreta remessas mínimas de 1% do PIB português - dimensões essenciais à transversalidade entre segmentos populacionais residentes em nações distintas - o fato de ser contínua indica potencial e não uma característica nacional. Na emigração portuguesa de 1960 a 1970, as taxas anuais mais altas - 1,35% e 1,04% da população residente - foram em 1967/8 (Pordata, 2019)
  • 3
    “A nacionalidade, ou melhor, a raça, não se encontra apenas na língua, mas, sobretudo, no sangue” (Hitler, 1933, p.428).
  • 4
    A notória miscigenação brasileira tem constado como subjugação sexual de não brancos por brancos, sem formar casais (Caulfield, 1996, p.134). Na década de 1990, rastreamento genético de brancos brasileiros revelou que 90% de sua ancestralidade paterna (indicada por cromossomo Y transmitido) era portuguesa e sua ancestralidade materna (DNA mitocondrial transmitido) confirmou a tripla presença europeia (39%), africana (28%) e surpreendentes 33% de ameríndia - apesar de ser população reduzida em mais de 90% pela colonização territorial (Pena, 2000).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2023

Histórico

  • Recebido
    03 Abr 2020
  • Aceito
    12 Maio 2020
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