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Segurança alimentar: reflexões sobre um problema complexo

RESUMO

O combate à má alimentação em todas as suas formas, que também se expressa na epidemia da obesidade, é uma das prioridades da Agenda 2030 e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Este artigo traz elementos sobre insegurança alimentar no Brasil, a partir de temas relativos ao crescimento populacional, mudanças climáticas, biodiversidade e sistemas alimentares tradicionais e regenerativos; trata também do papel dos movimentos sociais para a garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada. O Grupo de Pesquisa em Nutrição e Pobreza, o Saúde Planetária Brasil, e o Centro de Inteligência Artificial (C4AI) - Eixo AgriBio, entendem que a retomada organizada e sistêmica das frentes apontadas neste artigo de posicionamento, pode constituir um caminho para a articulação entre pesquisa, serviço e políticas públicas na direção do combate à fome e às demais manifestações da má alimentação, enquanto problema complexo prioritário para a garantia do bem-estar social.

PALAVRAS-CHAVE:
Insegurança alimentar; Políticas públicas; Direito humano à alimentação adequada; Sistemas alimentares

ABSTRACT

Overcoming malnutrition in all its forms, which is also manifested in the obesity epidemic, is one of the priorities of the 2030 Agenda and the Sustainable Development Goals. This article presents reflections on food insecurity in Brazil, based on topics such as population growth, climate change, biodiversity and traditional and regenerative food systems; it also addresses the role of social initiatives to guarantee the Human Right to Adequate Food. The Nutrition and Poverty Research Group, Planetary Health - Brazil Group, and the Center for Artificial Intelligence (C4AI) - AgriBio Axis, assume that the organized and systemic resumption of the initiatives mentioned out in this position paper can contribute to the articulation between research, public policies and services, to combat all forms of malnutrition, as a complex and priority problem to ensure social welfare.

KEYWORDS:
Food insecurity; Public policy; Human right to adequate food; Food systems

Introdução

A maneira pela qual a sociedade produz e consome alimentos tem profundo impacto na saúde das populações, nas relações sociais e no meio ambiente. A existência da fome no século XXI revela o abismo entre riqueza e conhecimento, de um lado, e desigualdade, de outro. Devemos experimentar, globalmente, um crescimento populacional da ordem de 2 bilhões de pessoas nos próximos 40 anos, o que amplia o desafio em produzir e distribuir melhor os alimentos (Vollset et al., 2020VOLLSET S. E. et al. Fertility, mortality, migration, and population scenarios for 195 countries and territories from 2017 to 2100: a forecasting analysis for the Global Burden of Disease Study. The Lancet, v.396, n.10258, p.1285-1306, 2020. DOI 10.1016/S0140-6736(20)30677-2.
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(20)30...
).

Em meio à epidemia de obesidade e excesso de peso, países em desenvolvimento enfrentam a fome e a desnutrição; a concomitância destas condições caracteriza o que se conhece por múltipla carga de doenças, que afeta especialmente as populações mais pobres (Buoncristiano et al., 2021BUONCRISTIANO, M. et al. Socioeconomic inequalities in overweight and obesity among 6- to 9-year-old children in 24 countries from the World Health Organization European region. Obesity Reviews, v.22, n.S6, p.e13213, 2021. DOI 10.1111/obr.13213.
https://doi.org/10.1111/obr.13213....
).

No Brasil, que deixou o mapa da fome em 2014 ao exibir queda da prevalência de insegurança alimentar de 34,9% das famílias em 2004 para 22,6% em 2013, é alarmante chegar a 2022 com 58,7% nesta condição, ou seja 125,2 milhões de pessoas (Rede Penssan, 2022). Apesar de contraditório, 38% das famílias de agricultores/as e produtores/as rurais de alimentos estão em situação de insegurança alimentar. De acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 (II Vigisan), “a agricultura familiar sofreu o impacto da crise econômica, mas foi especialmente afetada pelo desmonte das políticas públicas voltadas para o pequeno produtor do campo” (Rede Penssan, 2022, p.41).

Diante desses números, muitos são os desafios de desenvolvimento enfrentados no Brasil e no mundo. De fato, o cenário de fome e desnutrição vem sendo discutido em âmbito global há diversas décadas e foi incluído entre as prioridades da Agenda 2030 da ONU por 193 Estados-membros, inclusive o Brasil. Os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), e suas 169 metas globais traduzem aspirações fundamentais para a preservação da vida e para o desenvolvimento humano pleno; nesse sentido, favorecem a tomada de decisão por parte do poder público e da sociedade civil, na direção da defesa do ambiente, da diminuição das desigualdades sociais, da sustentabilidade e do fortalecimento dos mecanismos de proteção social.

Embora a garantia da alimentação adequada e saudável dependa da consecução de muitas destas metas, o ODS 1 - Erradicação da Pobreza, o ODS2 - Fome Zero e Agricultura Sustentável, e o ODS 10 - Redução das Desigualdades, estabelecem clara relação com a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN)1 1 Os autores concordam com definição de SAN adotada pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, em 2004: “Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) é a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis”. Disponível em: <https://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/conferencias/Seguranca_Alimentar_II/textos_referencia_2_conferencia_seguranca_alimentar.pdf>. no Brasil contemporâneo.

Assim, o desenho de uma abordagem resolutiva implica articulação intersetorial que considere os determinantes sociais da fome, e um diagnóstico acerca dos recursos e ações possíveis, para ação imediata, mas também em médio e longo prazos (Burigo Porto, 2021PORTO, R. G. et al. Pollinator-dependent crops in Brazil yield nearly half of nutrients for humans and livestock feed. Global Food Security, v.3, p.100587, 2021. DOI 10.1016/j.gfs.2021.100587.
https://doi.org/10.1016/j.gfs.2021.10058...
) para promover desenvolvimento e distribuição de riqueza, ao lado de promover acesso à alimentação.

Um conjunto de ações no início do século contribuiu para que os compromissos assumidos pelo país, tanto internamente quanto em âmbito internacional, tenham resultado em diminuição da pobreza e da fome; a experiência acumulada na construção destas condições reúne informação e conhecimento, a serviço de um projeto de gestão pública voltado para o bem-estar social.

Este artigo traz elementos que podem contribuir para a análise do cenário atual sobre a insegurança alimentar no Brasil, a partir dos estudos sobre o tema no âmbito dos Grupos de Pesquisa Nutrição e Pobreza, e Saúde Planetária Brasil (ambos do IEA/USP), e do Centro para Inteligência Artificial - Eixo AgriBio (C4AI-AgriBio). Dessa forma, expomos desafios e potencialidades dos movimentos sociais, da agricultura familiar e de sistemas alimentares resilientes, de políticas públicas de apoio à SAN, assim como a ameaça do dominante sistema de produção de alimentos. Trazemos ainda considerações sobre como a tecnologia da informação pode contribuir para o entendimento e o apoio à solução desses desafios, que dependem de dados.

Desafios globais e a fome no Brasil: população e clima

A conectividade internacional dos sistemas de produção e consumo de alimentos tem sido evidenciada recentemente pelos desafios colocados com a pandemia global de Covid-19 e a guerra na Ucrânia. Cadeias globais de produção de alimentos e insumos agrícolas foram afetados, com consequente crescimento da fome e da insegurança alimentar pelo mundo e, especificamente, no Brasil (FAO et al., 2022; Rede Penssan, 2022). Duas outras questões globais tornam ainda mais desafiantes as conexões entre produção e consumo de alimentos no Brasil: a demografia e o clima.

O cenário médio projetado pela Divisão de População da ONU em 2022 aponta algumas tendências: saltaremos dos quase 8 bilhões de pessoas atualmente para cerca de 9,7 bilhões em 2050, e 10,4 bilhões em 2100, com a maior parte desse crescimento até 2050 sendo concentrado na África Subsaariana; outra tendência relevante mostra que crescerá a percentagem de pessoas com mais de 65 anos (United Nations, 2022). Enquanto o mundo ainda enfrenta desafios para combater a fome e insegurança alimentar, a tendência demográfica global nos impõe ao desafio de aumentar a produção de alimentos para, nos próximos anos, garantir o consumo de mais 2 bilhões de habitantes; boa parte deste crescimento populacional ocorrerá em regiões que têm enfrentado dificuldades históricas para alimentar sua população, o que colocará pressão sobre os sistemas alimentares globais.

Além disso, com o aumento da expectativa de vida global e a diminuição da taxa de crescimento vegetativo, cresce a demanda por recursos para o setor saúde e diminui a parcela de trabalhadores da sociedade, colocando mais pressão sobre a produção, o que é especialmente relevante para o Brasil. A população brasileira, hoje próxima aos 215 milhões, deve crescer até por volta de 2050, chegando aos 231 milhões por volta de 2050 e caindo para 185 milhões em 2100 (IBGE, 2022). Mesmo que a variação populacional brasileira não seja tão grande como a de outros países, a mudança do perfil etário é bastante significativa e trará desafios para o sistema alimentar e produtivo como um todo: atualmente, quase 10% dos brasileiros têm mais de 65 anos, segundo o cenário médio da Divisão de População da ONU, em 2050 serão 21,9% da população total, e em 2100 serão 33,5% (United Nations, 2022).

As mudanças climáticas aumentam ainda mais o desafio da segurança alimentar. Segundo o relatório mais recente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) (Masson-Delmotte et al., 2022), caso a emissão de gases de efeito estufa continue nos níveis atuais, atingiremos antes de 2030 o aumento de temperatura de 1,5 ºC comparado aos níveis pré-industriais, e 2 °C antes de 2050. Esse aumento de temperatura traz consequências indeléveis para a produção de alimentos, afetando produtividade, área cultivada, presença de pragas, preços e oferta, gerando implicações negativas não apenas para a segurança alimentar, mas também para a erradicação da pobreza e da desigualdade, e esses efeitos já vem sendo sentidos, dado que já temos um aumento entre 1,1 e 1,2 °C (Alpino et al., 2022ALPINO, T. D. M. A. et al. Os impactos das mudanças climáticas na Segurança Alimentar e Nutricional: uma revisão da literatura. Ciência & Saúde Coletiva, v.27, p.273-86, 2022. DOI 10.1590/1413-81232022271.05972020.
https://doi.org/10.1590/1413-81232022271...
; Masson-Delmotte et al., 2022; Shukla et al., 2022SHUKLA, P. R. et al. (Ed.) Climate Change 2022: Mitigation of Climate Change. Contribution of Working Group III to the Sixth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change. Cambridge, UK: Cambridge University Press, 2022. DOI 10.1017/9781009157926.001.
https://doi.org/10.1017/9781009157926.00...
). O tema foi objeto de acordo na forma de um plano de quatro anos para agricultura e Segurança Alimentar pactuado no Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas ocorrido na COP 27 em 2022, a fim de garantir as metas previamente estabelecidas pela ONU para 2030. Denominado FAST - Food and Agriculture for Sustainable Transformation Initiative, o pacto tem como objetivo central “implementar ações concretas que possam resultar em melhoria da quantidade e da qualidade das contribuições financeiras voltadas ao clima para transformar a agricultura e os sistemas alimentares até 2030”.2 2 Disponível em: <https://unfccc.int/topics/land-use/workstreams/agriculture# COP-27-November-2022>. Os signatários “reconhecem a prioridade fundamental de garantir a segurança alimentar e eliminar a fome, bem como as vulnerabilidades dos sistemas alimentares às mudanças climáticas”. A mudança na temperatura gera aumento de eventos climáticos extremos como ondas de calor, secas, inundações, entre outros. Há aumento no estresse hídrico das plantas e até mudanças na composição do solo, afetando gravemente a produção de cereais essenciais para a segurança alimentar global, como o trigo, milho e arroz. O calor ainda afeta os ecossistemas marinhos, com a previsão de perda de 1,5 milhões de toneladas de alimentos provenientes do oceano com aumento de 1,5 °C, e de 3 milhões de toneladas com aquecimento de 2 °C (Masson-Delmotte et al., 2022). Para além das questões de disponibilidade de alimentos, a desestabilização de sistemas alimentares causada por mudanças climáticas pode gerar crises econômicas graves que aumentam a insegurança alimentar, cenário para o qual o Brasil é extremamente vulnerável: segundo o Cepea-Esalq/USP toda a cadeia de produção, serviços, indústria e insumos da agricultura e pecuária representou 27,6% do PIB brasileiro em 2021 (CENTRO DE ESTUDOS..., 2022), e sua desestabilização impulsiona desemprego, perda de renda e inflação no preço dos alimentos, aumentando a insegurança alimentar.

Ao mesmo tempo que a produção de alimentos é imensamente afetada pelas mudanças climáticas, é forçoso reconhecer também o caráter fundamental desta como causadora. O Brasil é o quinto maior emissor de gases de efeito estufa do mundo segundo o Observatório do Clima, e entre as emissões de 2020, 27% foram provenientes da agropecuária (sendo 75% desse valor gerados pela produção bovina), e outros 46% por mudanças no uso de terra e florestas, em especial, desmatamento e conversão de áreas naturais em lavouras e pastagens (Potenza et al., 2021POTENZA, R. F. et al. Análise das emissões brasileiras de e suas implicações para as metas climáticas do Brasil 1970 - 2020 gases de efeito estufa. Brasília, DF: SEEG, 2021.). São 60 milhões de hectares de vegetação nativa convertidos em pastagem no Brasil nos últimos 30 anos (Mapbiomas, 2022), resultando em enorme quantidade de gases de efeito estufa liberados na atmosfera, e colocando o sistema de produção de alimentos no Brasil no centro da questão climática nacional e global.

Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), participação social e produção de alimentos

A primeira Conferência Nacional de SAN, ocorrida em 1994, recuperou a propositura do termo “Segurança Alimentar e Nutricional” estabelecida no Plano Nacional de mesmo nome, elaborado em 1985 e não implementado. Resultado de diversas ações nascidas no âmbito das organizações sociais e universidades, a Política Nacional de Alimentação, em 1999, acompanha a Cúpula Mundial de Alimentação, realizada em 1996, e pavimenta o caminho para a promulgação da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional em 2006, e a inclusão do Direito Humano à Alimentação Adequada na Constituição Federal, em 2010.

Movimentos sociais, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), contribuem para a efetivação do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA), por meio da produção e da facilitação de acesso a alimentos saudáveis com baixo impacto ambiental para nossa população, além de promover a resiliência no campo e justiça alimentar.

O MST, criado em 1984 em Cascavel (PR), está presente em 24 estados brasileiros, sendo composto por 450 mil famílias assentadas e cerca de 90 mil famílias acampadas. Essas famílias estão organizadas por meio da agricultura familiar camponesa atuando em 1.900 associações comunitárias, 160 cooperativas e 120 agroindústrias (Motoryn, 2022MOTORYN, P. MST completa 38 anos com arrecadação histórica contra a fome e campanha nas redes sociais. Brasil de Fato, Brasília, DF, 22 jan. 2022. Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2022/01/22/mst-completa-38-anos-com-arrecadacao-historica-contra-a-fome-e-campanha-nas-redes-sociais>. Acesso em: 16 set. 2022.
https://www.brasildefato.com.br/2022/01/...
).

Em seu Congresso Nacional de 2007, o MST fez a opção pela produção agroecológica de alimentos em todos seus assentamentos, em contraponto à agricultura convencional (Movimento dos Trabalhadores... 2007 MST, 2022). A agroecologia pressupõe a produção de alimentos sem o uso de agrotóxicos, proporcionando uma interação entre o ser humano e o meio ambiente pelas vias sustentáveis de produção, além do respeito aos saberes tradicionais. Também são exemplos de aplicação da agroecologia o reflorestamento, a recuperação de nascentes, o cultivo de sementes não transgênicas e a prática de cultivar diversas lavouras em um mesmo terreno, conhecida como policultura, o que possibilita a devolução de nutrientes variados para a terra (Oliveira, 2022OLIVEIRA, C. O que o MST tem feito em contraponto ao agronegócio predatório no Brasil? Brasil de Fato, São Paulo, 4 jun. 2022. Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2022/06/04/o-que-o-mst-tem-feito-em-contraponto-ao-agronegocio-predatorio-no-brasil>. Acesso em: 6 set. 2022.
https://www.brasildefato.com.br/2022/06/...
).

Segundo a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Pnapo), agroecologia, ou produção de base agroecológica, é:

[...] aquela que busca otimizar a integração entre capacidade produtiva, uso e conservação da biodiversidade e dos demais recursos naturais, equilíbrio ecológico, eficiência econômica e justiça social, abrangida ou não pelos mecanismos de controle de que trata a Lei nº 10.831, de 2003, e sua regulamentação. (Brasil, 2012, online)

Desde o início da pandemia por Covid-19, o MST já doou mais de 4,2 mil toneladas de alimentos e cerca de 860 mil marmitas para pessoas em vulnerabilidade social (Motta, 2021MOTTA, C. MST: Comida boa e sem veneno na mesa dos brasileiros. E na cozinha dos chefs. Rede Brasil Atual, 2 maio 2021. Disponível em: <https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2021/05/comida-boa-sem-veneno-mesa-brasileiros-cozinha-chefs/>. Acesso em: 6 set. 2022.
https://www.redebrasilatual.com.br/cidad...
).

De acordo com o Censo Agropecuário 2017, o Brasil conta com 5.073.324 estabelecimentos rurais, que ocupam uma área total de 351.289.816 ha. Em relação à utilização das terras, comparando com o Censo Agropecuário anterior, de 2006, percebe-se uma redução de 34% da área utilizada para lavouras permanentes e um acréscimo de 14% daquela destinada a lavouras temporárias. Houve também redução de 18% da área de pastagens naturais, e crescimento de 10% da área utilizada para pastagens plantadas. O Censo Agropecuário 2017 mostrou, ainda, elevação da quantidade de hectares destinados a matas naturais e plantadas, cujos percentuais foram, respectivamente, de 12% e 83%. Em relação à área, há 4,5 milhões estabelecimentos destinados à produção agropecuária no país com menos de 100 ha, cerca de 89% do total; estes ocupam uma área de 71.804.615 ha, que corresponde a aproximadamente 20% das terras cultivadas (IBGE, 2019).

O Censo de 2017 apontava a existência de 3,9 milhões de unidades de produção da Agricultura Familiar (AF), nas quais a gestão da propriedade é compartilhada pela família e a atividade produtiva agropecuária é a principal fonte geradora de renda. São cerca de 77% do total de estabelecimentos rurais, que correspondem a 23% da área de todos os estabelecimentos agropecuários do país (80,9 milhões de ha). Em termos de valor da produção, este segmento equivale a 23% de toda a produção agropecuária brasileira, cerca de R$ 107 bilhões, empregando 67% do pessoal ocupado no setor, em torno de 10,1 milhões de pessoas (IBGE, 2019).

Quando analisados os dados relativos aos tipos de produção, destaca-se o importante papel da agricultura familiar na produção de alimentos consumidos pelos brasileiros. Se considerarmos as lavouras temporárias, os agricultores familiares produzem, em relação ao total consumido: 67% do abacaxi, 58% da abóbora, 58% da cebola, 42% do feijão preto, 56% do feijão verde e 70% da mandioca. Já nas lavouras permanentes, a agricultura familiar é a grande responsável pela produção de 35% do café arábica, 50% do café conilon, 49% da banana, 66% do caju, 36% do limão, 49% da tangerina, 58% da acerola, 79% do açaí, 73% do maracujá, 31% da uva de mesa e 46% da goiaba, dentre outros (Mitidiero Jr., 2022).

Por outro lado, quando se considera a produção de hortícolas, as pequenas propriedades até 10 ha praticamente dominam a produção, sendo responsáveis por 53% de toda a abobrinha produzida no país, bem como 62% da alface, 32% da batata-doce, 53% da berinjela, 47% do brócolis, 62% da couve-flor, 49% do pimentão, 37% do repolho, 27% do tomate estaqueado (de mesa) e 64% da vagem (ibidem).

O Brasil está entre os dez países com a maior área cultivada do planeta (Miranda, 2018MIRANDA, E. E. Áreas cultivadas no Brasil e no mundo. Agronalysis, Rio de Janeiro, v.38, n.2, p.25-27, 2018. Disponível em: <https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/agroanalysis/article/view/77453>. Acesso em: 29 ago. 2022.
https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/ind...
). Essa extensa área agrícola produz alimentos para grande parte da população mundial, abastecendo diversos mercados no exterior, além do mercado interno brasileiro. Em 2020, o Brasil foi o quarto maior exportador de grãos e o maior exportador de carne bovina do mundo (Embrapa, 2021).

Para atender ao crescimento populacional, da ordem de 3,7 bilhões de pessoas nos anos 1970 para mais de 7 bilhões (United Nations, 2014) a produção mundial de alimentos dobrou (Faostat, 2014). Esse panorama de produção agrícola está associado ao uso da terra e juntos são os principais responsáveis pelo desmatamento e pela perda de biodiversidade.

Esses dados comprovam a importância da agricultura familiar para a produção de alimentos, dado que respondem pela maior parte da produção destinada ao consumo humano interno e empregam a maior massa de trabalhadores, mesmo ocupando um quarto da área atualmente destinada à agropecuária. Paradoxalmente, o financiamento público destinado ao setor distribui recursos de forma desigual: o crédito para médios e grandes produtores, cuja produção é majoritariamente destinada ao mercado de commodities, chega a ser superior em seis vezes àquele destinado ao agricultor familiar, segundo dados de 2017-2020 (Proença et al., 2021PROENÇA, R. P. C. et al. Cenário e perspectivas do sistema alimentar brasileiro frente à pandemia de Covid-19. Demetra, v.16, p.e55953, 2021. DOI 10.12957/demetra.2021.55953.
https://doi.org/10.12957/demetra.2021.55...
). Esses dados revelam uma opção voltada para a exploração dos recursos naturais do país com foco no mercado internacional, e não nas demandas internas por alimento.

O estabelecimento dos preços dos alimentos, regulado exclusivamente pelo mercado, é outro importante aspecto e merece revisão. Especialmente para os itens básicos da cesta de consumo, medidas fiscais e o estabelecimento de estoques reguladores são potentes moduladores de acesso. A produção de alimentos da AF e por parte de movimentos sociais como os aqui mencionados oferece uma oportunidade para a otimização de financiamentos e fortalecimento de cadeias de valor voltadas à SAN.3 3 Importante resgate histórico sobre a AF pode ser encontrado em: Picolotto (2014). Os atores da Construção da Categoria Agricultura Familiar no Brasil. Disponível em: <Perdoe a>.

Consumo de agrotóxicos na produção - também uma questão de Segurança Alimentar e Nutricional

O Brasil é um dos maiores consumidores de agroquímicos e agrotóxicos do planeta. Em 2015, uma pesquisa feita pela ONG Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida em parceria com a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) mostrou que o consumo brasileiro era de 7,6 litros por pessoa (Grigori, 2019GRIGORI, P. Afinal, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxico do mundo? Abrasco [Notícias], 27 jun. 2019. Disponível em: <https://www.abrasco.org.br/site/noticias/opiniao/afinal-o-brasil-e-o-maior-consumidor-de-agrotoxico-do-mundo/41450/>. Acesso em: 30 set. 2022.
https://www.abrasco.org.br/site/noticias...
).

O país encerrou o ano de 2021 com 562 agrotóxicos registrados, um aumento de 14% em relação ao ano anterior, um recorde histórico desde o ano de 2000, quando a série histórica iniciou. Dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) mostram um aumento no número de registros a partir de 2016 e uma intensificação ainda maior nos anos seguintes: em 2015 foram registrados 139 pesticidas, em 2016 foram 277, em 2018 foram registrados 449, 2019 foram 474 e 2020 foram 493 novos registros (Salati, 2022SALATI, P. Após novo recorde, Brasil encerra 2021 com 562 agrotóxicos liberados, sendo 33 inéditos. G1, 18 jan. 2022. Disponível em: <https://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2022/01/18/apos-novo-recorde-brasil-encerra-2021-com-562-agrotoxicos-liberados-sendo-33-ineditos.ghtml>. Acesso em: 14 set. 2022.
https://g1.globo.com/economia/agronegoci...
).

O processo de aprovação de um pesticida para comercialização e uso no Brasil é regulamentado pela Lei n.7.802/1989, conhecida como Lei dos Agrotóxicos (Brasil, 1989), que regulamenta desde a pesquisa até a fiscalização do uso do produto final. A regulamentação é conduzida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

Em fevereiro de 2022, a Câmara Federal aprovou o Projeto de Lei n.6.299/2002 que visa substituir a Lei dos Agrotóxicos (Brasil, 2002), e que foi enviado para apreciação pelo Senado Federal, o que não havia ocorrido até o fechamento deste texto (janeiro de 2023).

Em manifesto contrário a esse Projeto de Lei, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) aponta que ele modifica o sistema de registro de agrotóxicos, retira poder da Anvisa e Ibama, e traça novas regras sobre a pesquisa, experimentação, produção, rotulagem, transporte, armazenamento, comercialização, utilização, importação e exportação, assim como, o destino final dos resíduos e das embalagens de agrotóxicos no Brasil (SBPC, 2022, p.1). E continua dizendo que

[...] entre os aspectos que tornam seu conteúdo altamente preocupante, estão o afrouxamento das exigências e prazos impostos pelos órgãos governamentais competentes na análise do uso destes agrotóxicos. Também suaviza a utilização de nomenclatura que deixa clara à população a reconhecida toxicidade e ecotoxicidade destes compostos. Além disso, centraliza as tarefas de análise, aprovação e fiscalização destes produtos no Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), excluindo o poder decisório dos órgãos governamentais de saúde e meio ambiente, como a Anvisa e o Ibama.

A análise da SBPC sublinha diversos elementos do PL n.6.299/2002 que contribuirão, caso sejam ratificados, para a fragilização dos sistemas alimentares e para o comprometimento da qualidade dos alimentos, tais como:

  • ausência de critérios claros para a aprovação ou proibição de registro de agrotóxicos

  • comprometimento da aceitação dos produtos nacionais no mercado internacional

  • esvazia a participação da sociedade ao privar instituições, como de defesa do consumidor por exemplo, de pedirem impugnação ou cancelamento de registro de produtos com reconhecido risco

  • alteração da denominação “agrotóxico” para “Produto de controle ambiental” quando usado em florestas, ou pesticida

  • possibilidade de uso de agrotóxico não registrado caso o pedido não seja analisado de forma conclusiva em dois anos.

Os integrantes do Grupo de Trabalho (GT) Agrotóxicos e Saúde da Fiocruz afirmam, entre outras coisas, que a proposta trará “prejuízos para o ambiente e à saúde da população” e “danos irreparáveis aos processos de registro, monitoramento e controle de riscos e dos perigos dos agrotóxicos no Brasil” (Sampaio, 2022SAMPAIO, C. “PL do Veneno” causará “danos irreparáveis”, diz Fiocruz em nota enviada aos senadores. Brasil de Fato, Fortaleza, 14 fev. 2022. Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2022/02/14/pl-do-veneno-causara-danos-irreparaveis-diz-fiocruz-em-nota-enviada-aos-senadores>. Acesso em: 27 set. 2022.
https://www.brasildefato.com.br/2022/02/...
).

De acordo com a ONU, os pesticidas são responsáveis ​​por cerca de 200 mil mortes por envenenamento agudo a cada ano, 99% das quais ocorrem em países em desenvolvimento, onde as regulamentações de saúde, segurança e meio ambiente são frágeis e aplicadas com menos rigor. Embora os registros sobre o uso global de pesticidas estejam incompletos, é geralmente aceito que as taxas de aplicação aumentaram dramaticamente nas últimas décadas (United Nations, 2017).

A ocorrência de exposição simultânea dos trabalhadores a diversos princípios ativos, a subnotificação das ocorrências de intoxicação, e o despreparo dos profissionais das unidades de atenção básica em saúde para a realização da notificação, principalmente naquelas localizadas em áreas rurais, ao lado das ocorrências de intoxicação aguda, são frequentes (Brasil, 2018).

A análise da água potável consumida pelos habitantes de mais de 2.300 municípios brasileiros revelou a ocorrência de até 27 diferentes agrotóxicos, sobretudo nos estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Tocantins (Brasil, 2018).

A despeito do diligente trabalho desenvolvido por organizações da sociedade civil, como o Instituto de Defesa do Consumidor, e da academia, como a Fundação Oswaldo Cruz, há uma carência de dados atualizados e falta transparência na sua divulgação por parte do Governo Federal, a despeito da vigência da Lei de Acesso à Informação, Lei n.12.527, de 18 de novembro de 2011.

Investir em sistemas de monitoramento e dar visibilidade às informações relativas a volume e sistemas de produção de alimentos, são medidas que contribuem para a soberania alimentar e para a democratização do acesso à informação.

A perda dos agentes polinizadores e o risco para a Segurança Alimentar e Nutricional

A produção de alimentos na agricultura familiar e de plantas cultivadas em larga escala é beneficiada por agentes polinizadores, como abelhas, besouros, borboletas, aves, morcegos e outros grupos de animais (BPBES/REBIPP, 2019). Esses agentes contribuem para a segurança alimentar em todo o planeta, pois mais de três quartos dos principais tipos de culturas alimentares globais dependem, em algum nível, da polinização animal para aumentar o rendimento ou melhorar a qualidade, sendo os responsáveis por impulsionar 35% do volume global de produção agrícola (IPBES, 2016) e 40% do suprimento de nutrientes para a dieta da população mundial (Eilers et al., 2011EILERS, E. J. et al. Contribution of Pollinator-Mediated Crops to Nutrients in the Human Food Supply. PLoS ONE, v.6, n.6, p.e21363, 2011. DOI 10.1371/journal.pone.0021363.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.002...
).

Espécies de plantas dependentes de polinizadores abrangem frutas, verduras, legumes, sementes, nozes e oleaginosas, sendo alimentos contribuintes de macro e micronutrientes essenciais para nutrição humana, além de compostos bioativos (BPBES/REBIPP, 2019). De modo geral, as culturas dependentes de polinização possuem concentrações mais altas de vitamina A, vitamina C, lipídios, potássio, cálcio, flúor e ácido fólico (Eilers et al., 2011EILERS, E. J. et al. Contribution of Pollinator-Mediated Crops to Nutrients in the Human Food Supply. PLoS ONE, v.6, n.6, p.e21363, 2011. DOI 10.1371/journal.pone.0021363.
https://doi.org/10.1371/journal.pone.002...
), enquanto as culturas não dependentes de polinizadores proporcionam maior teor de carboidratos (Porto et al., 2021PORTO, R. G. et al. Pollinator-dependent crops in Brazil yield nearly half of nutrients for humans and livestock feed. Global Food Security, v.3, p.100587, 2021. DOI 10.1016/j.gfs.2021.100587.
https://doi.org/10.1016/j.gfs.2021.10058...
).

A polinização é um recurso natural que garante uma diversidade de alimentos nutritivos, mas também promove a manutenção e a variabilidade genética de plantas nativas que sustentam a biodiversidade e está relacionada ao conhecimento tradicional. Dessa forma, a polinização pode ser considerada como serviço ecossistêmico de provisão, serviço ecossistêmico de regulação e serviço ecossistêmico cultural (BPBES/REBIPP, 2019; Costanza et al., 2017COSTANZA, R. et al. Twenty years of ecosystem services: how far have we come and how far do we still need to go? Ecosystem services, v.28, p.1-16, 2017. DOI 10.1016/j.ecoser.2017.09.008.
https://doi.org/10.1016/j.ecoser.2017.09...
). Atualmente, o serviço de polinização na produção de alimentos em nível global, foi estimado monetariamente entre 235 bilhões e 577 bilhões de dólares para as culturas dependentes (IPBES, 2016). No Brasil, o valor monetário de contribuição dos polinizadores na produção agrícola foi estimado em 12 bilhões de dólares por ano (Giannini et al., 2015GIANNINI, T. C. et al. The Dependence of Crops for Pollinators and the Economic Value of Pollination in Brazil. Journal of Economic Entomology, v.108, n.3, p.849-57, 2015. DOI 10.1093/jee/tov093.
https://doi.org/10.1093/jee/tov093....
). Portanto, a perda destes agentes, além de afetar a segurança alimentar, pode atingir diretamente a economia mundial (Gallai et al., 2009GALLAI, N. et al. Economic valuation of the vulnerability of the world agriculture confronted with pollination decline. Ecological Economics, v.68, p.810-21, 2009. DOI 10.1016/j.ecolecon.2008.06.014.
https://doi.org/10.1016/j.ecolecon.2008....
).

Apesar do importante papel dos polinizadores, esses agentes vêm sofrendo severas ameaças à sua conservação. Entre elas destacam-se a fragmentação e perdas de ambientes naturais com a mudança no uso da terra, o uso indiscriminado de agrotóxicos, a monocultura, as mudanças climáticas, a poluição ambiental e a competição com espécies invasoras (BPBES/REBIPP, 2019; IPBES, 2016). Segundo um histórico de cobertura e uso da terra nos biomas brasileiros entre os anos 1985 e 2021, o bioma Amazônia perdeu 11,5% de sua vegetação nativa; a Caatinga 10,1%; o Cerrado 20,9%; a Mata Atlântica 5,9%; o Pampa 29,5% e o Pantanal teve ganho de vegetação nativa de 2,3%, sendo resultado da perda de superfície de água (Mapbiomas, 2022). O desmatamento de vegetação nativa provoca déficit de recursos para muitas espécies nativas de polinizadores que, consequentemente, desaparecem do ambiente (Campbell et al., 2022CAMPBELL, A. J. et al. High bee functional diversity buffers crop pollination services against Amazon deforestation. Agriculture, Ecosystems & Environment, v.326, 2022. DOI 10.1016/j.agee.2021.107777.
https://doi.org/10.1016/j.agee.2021.1077...
).

A conservação do serviço ecossistêmico de polinização em ambientes agrícolas e urbanos é possível mediante estratégias que proporcionam recursos alimentares, áreas de abrigo e de reprodução, por exemplo: manter áreas naturais livres de distúrbios; plantar cerca viva ao redor dos cultivos agrícolas; implementar corredores ecológicos nas cidades e em áreas agrícolas; promover a intensificação ecológica da paisagem agrícola; recuperar áreas degradadas com espécies nativas atrativas aos polinizadores e plantar espécies de plantas nativas com flores em jardins urbanos e residenciais (Garibaldi et al., 2015GARIBALDI, L. A. et al. Aplicações do protocolo de avaliação socioeconômica de práticas amigáveis aos polinizadores no Brasil. Rio de Janeiro: Funbio, 2015. 71p.; Nascimento et al., 2020NASCIMENTO, V. T. et al. Tropical urban areas support highly diverse plant-pollinator interactions: An assessment from Brazil. Landscape and Urban Planning, v.198, 103801, 2020. DOI 10.1016/j.landurbplan.2020.103801.
https://doi.org/10.1016/j.landurbplan.20...
). As políticas públicas têm um papel significativo na implementação de ações para a conservação dos polinizadores, e o conhecimento científico, indígena e local deve ser um subsídio para os formuladores dessas políticas e tomadores de decisão (BPBES/REBIPP, 2019).

A biodiversidade na alimentação e na conservação, e seus guardiões

O Brasil está entre os países de maior biodiversidade do planeta, abriga seis biomas e a cultura de diversos povos e comunidades tradicionais. Entretanto, o desconhecimento sobre a diversidade e a falta de acesso a alimentos, por grande parte da população, restringe a alimentação atual a uma pequena diversidade de ingredientes mesmo com a crescente demanda por melhores alternativas alimentares.

Paralelo a esse panorama, a expansão agrícola tem se mostrado como um importante motivador da perda da biodiversidade ocasionado especialmente pela forma de produção e consumo atual. Segundo FAO e Unep (2020), a adoção de práticas agroflorestais e de produção agroecológica tem se mostrado como uma estratégia importante para restaurar a produtividade de terras agrícolas degradadas. Além disso, elas podem impulsionar a adoção de dietas mais saudáveis, que valorizem a biodiversidade especialmente no seu uso para conservação tanto das espécies quanto para melhor uso da terra (Hunter et al., 2019HUNTER, D. et al. The potential of neglected and underutilized species for improving diets and nutrition. Planta, v.250, n.3, p.709-29, 2019. DOI 10.1007/s00425-019-03169-4.
https://doi.org/10.1007/s00425-019-03169...
).

Dentre as espécies de importância econômica e nutricional, muitas remontam a milhares de anos antes da domesticação e das origens das culturas atuais. Ao longo da história, povos indígenas e comunidades locais e tradicionais têm sido os responsáveis por administrar diversos ecossistemas e culturas sendo ainda guardiões de alimentos e recursos genéticos. As suas formas de produção favorecem sistemas alimentares que promovem dietas saudáveis e resilientes, além do baixo impacto ambiental. A cultura de subsistência, extrativismo e criação de animais costumam ser os principais meios de vida destes grupos e são conduzidos de modo a manter a diversidade e formas de utilização que agregam o conhecimento associado a formas de cultivos que consideram os ecossistemas locais.

Dada a importância do conhecimento tradicional de povos indígenas e comunidades quilombolas, o seu reconhecimento como guardiões da biodiversidade e administradores de territórios pode contribuir para superar os desafios combinados de mudança climática, segurança alimentar, conservação da biodiversidade e combate ao mau uso da terra e água (Hunter; Borelli; Gee, 2020HUNTER, D.; BORELLI, T.; GEE, E. Biodiversity, food and nutrition: a new agenda for sustainable food systems. New York: Routledge, 2020. 296p. Disponível em: <http://www.b4fn.org/fileadmin/templates/b4fn.org/upload/documents/The_Books/BFN_full_2020_compressed.pdf>. Acesso em: 26 out. 2022.
http://www.b4fn.org/fileadmin/templates/...
).

Políticas públicas de Segurança Alimentar e Nutricional

Algumas políticas públicas corroboram diretamente e indiretamente com a SAN. Um importante e recente marco para a garantia da SAN da população brasileira foi a revisão e atualização do Guia Alimentar para a População Brasileira, que integra uma das estratégias da diretriz de promoção e alimentação adequada e saudável, consolidada na Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN) (Brasil, 2013). Esse é um documento oficial, publicado pelo Ministério da Saúde, com o propósito de promover a alimentação adequada e saudável em todos os espaços, com diretrizes para gestores, profissionais de saúde, e para todos os cidadãos. Esse documento tem sido considerado como referência internacional, especialmente por considerar a alimentação saudável em seu contexto mais amplo, o que remete também aos impactos socioculturais e ambientais das escolhas alimentares (Monteiro et al., 2015MONTEIRO, C. A. et al. Dietary guidelines to nourish humanity and the planet in the twenty-first century. A blueprint from Brazil. Public Health Nutrition, v.18, n.13, p.2311-22, Sept. 2015. DOI 10.1017/S1368980015002165.
https://doi.org/10.1017/S136898001500216...
).

Uma das mais reconhecidas políticas públicas de alimentação no mundo é o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). O programa oferece alimentação escolar diariamente a aproximadamente 40 milhões de estudantes da educação básica pública por meio de repasses financeiros de caráter suplementar enviados aos estados e municípios.

O PNAE pode ser considerado como uma das principais ações de combate à fome no Brasil, não somente por sua abrangência e por beneficiar as crianças em uma fase especialmente crítica do seu desenvolvimento, mas também porque contribui como fonte de renda para a agricultura familiar visto que, do valor dos repasses como disposto na lei que regulamenta o PNAE, se prevê:

[...] mínimo 30% (trinta por cento) devem ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e/ou do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e comunidades quilombolas. (Brasil, 2009, art. 14)

Outra ação governamental inserida nas políticas públicas de segurança alimentar e nutricional e que incentiva a aquisição de alimentos pela agricultura familiar é o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA). As compras governamentais de alimentos por meio de órgãos públicos destinam-se a unidades de educação, assistência social, segurança, justiça, saúde e organizações não governamentais. Dessa maneira, contribuem com a geração de renda para esses agricultores e, de forma complementar, melhorias nas condições de alimentação de pessoas que se encontram em situação de vulnerabilidade social e/ou insegurança alimentar (Salgado et al., 2022SALGADO, R. J. S. F.; SOUZA, W. J.; FERREIRA, M. A. M. Compra institucional de produtos da agricultura familiar: avaliando a execução do Programa de Aquisição de Alimentos pelas universidades federais. Revista de Economia e Sociologia Rural, v. 60, número especial, p. e248030, 2022. DOI 10.1590/1806-9479.2021.248030.
https://doi.org/10.1590/1806-9479.2021.2...
).

Por sua vez, o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) também foi outra estratégia do governo para promoção da SAN, instituída pelo Estado em 1976, e atualmente regulamentado pelo Decreto n.10.854, de 10 de novembro de 2021 (Brasil, 2021), com o objetivo de atender prioritariamente os trabalhadores de baixa renda com subsídio financeiro às empresas que oferecem alimentação aos seus trabalhadores. Esse Programa atendeu, em 2018, aproximadamente 18 milhões de trabalhadores, contudo sofre com limitações decorrentes de sua formulação e implementação; apesar da expressiva cobertura, são escassos os resultados quanto à qualidade das refeições servidas (Costa-Souza et al., 2018). Além disso, a atual regulamentação do PAT retrocedeu ao revogar decretos que garantiam a oferta de alimentação adequada através de parâmetros nutricionais e responsabilidade técnica do PAT pelo profissional nutricionista, colocando em risco o objetivo do programa.

Políticas e tomada de decisão baseada em dados: desafios e oportunidades com o apoio da Inteligência Artificial

A complexidade dos sistemas alimentares e da SAN se reflete na abrangência das áreas do conhecimento e dos fatores envolvidos. Disso decorre que as políticas públicas e a tomada de decisão em qualquer nível requerem a consideração de muitas variáveis e de dados relativos a elas. Porém, a realidade é que esses dados não são facilmente disponíveis, acessíveis e processáveis pelos atores que os demandam. Isso ocorre por vários motivos, entre os quais: os dados não estão digitalizados, pois foram coletados em formato analógico; os dados não estão atualizados (exemplo: o Censo 2020 que só ocorreu em 2022); os dados já digitalizados não estão acessíveis, ainda que sejam públicos e que a Lei de Acesso à Informação, já citada, assim o estipule; os diversos conjuntos de dados estão disponíveis em resoluções espaciais e/ou temporais diferentes; os dados não seguem padrões, de modo que podem não ter compatibilidade sintática e/ou semântica imediata. Essas questões oferecem campo para a atuação dos profissionais da computação, que valendo-se de diversas técnicas e procedimentos, e juntamente com os especialistas nos problemas (por exemplo, SAN), podem atuar para resolvê-los ou contorná-los. Iniciativas mais estruturantes podem auxiliar nesse processo, como as de padronização de dados, e as de dados abertos.

Nesse contexto se insere a parceria com o Centro de Inteligência Artificial4 4 Disponível em: <https://c4ai.inova.usp.br>. em seu eixoAgriBio (C4AI-AgriBio), por meio da qual têm sido desenvolvidas métodos e ferramentas de apoio ao entendimento e solução dos problemas relativos à SAN. Seguindo uma metodologia baseada em ciclo de vida dos dados, as atividades são voltadas para aquisição, padronização e processamento de dados oriundos de fontes distintas e heterogêneas, que representam e capturam a complexidade dos sistemas envolvidos e a multidisciplinaridade inerente à SAN. Tem-se trabalhado também na construção de uma infraestrutura para abrigar os dados coletados de sistemas públicos e/ou de parceiros, e na construção de ferramentas de análise e apoio à tomada de decisão. Com apoio de pesquisadores de vários setores, trabalha-se para buscar uma representação visual e amigável de cenários complexos de informação. Isso é fundamental para uma tomada de decisão colaborativa entre atores da sociedade.

Um exemplo de trabalho fruto dessa parceria são os estudos referentes à alimentação escolar a partir de dados de despesas do PNAE, coletados do website do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Eles são tratados com algoritmos de aprendizagem estatística para se obter uma base de dados robusta que permita fazer diversas análises relativas à disponibilidade de alimentos, à origem/destino das compras, avaliar a dependência de polinizadores nos itens dessa dieta, entre outros. Como se trata de um programa nacional, obter os dados de todo o país é um grande desafio, seja do ponto de vista da interface de acesso aos dados, seja do ponto de vista da falta de padronização no preenchimento das informações das notas fiscais das compras. Ainda assim, constitui-se em uma fonte valiosa para se analisar o PNAE sob diversos pontos de vista. Esse trabalho é um bom exemplo da aplicação de Inteligência Artificial, pelo uso de meios automáticos para extração, transformação e carregamento de dados (processo conhecido como ETL), garantindo a integridade e uso dos dados.

Outro trabalho importante que avança comitantemente é o estudo do uso de técnicas de otimização e modelos de aprendizagem não supervisionada, para melhorar a identificação de variáveis relevantes em bancos de dados com variáveis pertencentes a múltiplas dimensões. No caso específico da fome em megacidades, este trabalho está auxiliando a identificar as áreas de maior e menor risco de ocorrência de fome, considerando variáveis econômicas, ambientais e sociais. Ademais, também estão sendo desenvolvidas ferramentas web a serem disponibilizadas gratuitamente a pesquisadores e tomadores de decisão para permitir a realização de análises estatísticas e espaciais da ocorrência de fome em cidades de diferentes portes sem a necessidade de conhecimento dos modelos de otimização ou de programação.

O C4AI-AgriBio tem atuado também em iniciativas internacionais e nacionais relativas a dados abertos (open data), dentro do conceito de ciência aberta (open science), que são demandas transversais a múltiplas áreas, incluindo aquelas de interesse ao tema da SAN. Um exemplo é a Rede GO-FAIR, uma iniciativa internacional que teve origem em 2018 na Europa e atualmente está presente em diversos países, que visa implementar os princípios FAIR (acrônimo do inglês Findable, Accessible, Interoperable, Reusable), tornando os dados localizáveis, acessíveis, interoperáveis e reutilizáveis. A Rede GO FAIR Agro Brasil é uma rede de implementação regional e temática que visa estimular a adoção dos princípios FAIR no âmbito dos sistemas produtivos agropecuários e também aqueles oriundos de pesquisas em ciências agrárias (Drucker et al. 2021DRUCKER, D. P. et al. Implantação da Rede Temática GO-FAIR Agro Brasil: primeiros passos. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE AGROINFORMÁTICA, 13., 2021, Bagé. Anais .... Bagé: Unipampa, 2021. p.164-71. 2177-9724 Organizado por Ana Paula Lüdtke Ferreira.). Dentre seus objetivos, há aspectos técnicos, voltados à implementação de padrões de dados e metadados e repositórios de dados confiáveis, e aspectos relacionados à capacitação de pessoas e mudança cultural. A Rede está sendo construída coletivamente e estruturada em grupos de trabalho que estão trabalhando para tornar os dados agropecuários passíveis de reutilização, contribuindo com o avanço da ciência e com a tomada de decisão no setor.

Em outro âmbito, a Parceria para Governo Aberto, ou Open Government Partnership (OGP) envolve parcerias governamentais mundiais e consiste em estabelecer compromissos entre estado e sociedade civil voltados à transparência de governos e, portanto, de dados. No Brasil ela é liderada pela Controladoria Geral da União (CGU).5 5 Disponível em: <https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp>. O 5º Plano de Governo Aberto do Brasil estabeleceu o Compromisso 5: “Cadeias Agropecuárias e Dados Abertos” para a abertura e integração de bases de dados de cadeia agropecuária, elencando riscos, impactos e viabilidade. Em especial, a colaboração consiste em estabelecer metodologias e protocolos de metadados e uso de vocabulários controlados, para garantia de interoperabilidade, integração e transparência dos dados.

Assim, a ciência de dados e a inteligência artificial podem contribuir sobremaneira para superar os desafios da SAN, atuando ao longo de todo o processo, desde a obtenção de dados, até o provimento de ferramentas para apoio à tomada de decisão. A grande quantidade de variáveis, a grande quantidade de dados (big data) ou as vezes a falta de dados (small data) requerem o uso de técnicas adequadas para a manipulação dos dados. A automatização de processamentos pode poupar tempo e recursos além de permitir identificar tendências e comportamentos nos dados que podem promover insights importantes sobre as questões em análise.

Perspectivas para a promoção da Segurança Alimentar e Nutricional no cenário atual

Para o The Global Panel on Agriculture and Food Systems for Nutrition (2016), uma alimentação saudável é aquela que elimina a fome, é segura, reduz desnutrição e deficiências nutricionais, promove a saúde e é produzida de forma sustentável, ou seja, por meio de sistemas alimentares regenerativos que garantam alimentação de qualidade também para as gerações futuras.

A coordenação de todos os elementos constitutivos de um sistema alimentar (ambiente, pessoas, processos, infraestrutura, instituições, dentre outros) e as atividades que sustentam as etapas de produção, processamento, distribuição, preparação e consumo de alimentos, podem, ou não, promover soberania em uma nação. Em um estado soberano, para além da boa alimentação, os cidadãos são partícipes dos resultados socioeconômicos e ambientais (FAO, 2018). Sistemas de produção de alimentos regenerativos e resilientes incluem ecossistemas, sistemas humanos, sistemas de energia, sistemas econômicos e sistemas de saúde, que fornecem insumos essenciais para o sistema alimentar

Essa visão de sistemas alimentares sustentáveis fundamenta-se no reconhecimento de que a alimentação é um direito humano fundamental e inseparável da justiça social (HLPE, 2017), a considerar que tanto a subnutrição quanto a obesidade são manifestações generalizadas da insegurança alimentar e nutricional. É importante reconhecer que o agente primordial da segurança/insegurança alimentar é o sistema alimentar, que é um dos impulsionadores tanto da saúde quanto da degradação ambiental (Hammond; Dubé, 2012HAMMOND, R. A.; DUBÉ, L. A systems science perspective and transdisciplinary models for food and nutrition security. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, v.109, n.31, p.12356-63, 2012. DOI 10.1073/pnas.0913003109.
https://doi.org/10.1073/pnas.0913003109....
; Tilma; Clark, 2014; Willet et al., 2019). A centralidade dos sistemas alimentares do ponto de vista da saúde planetária foi destacada na Declaração de São Paulo sobre Saúde Planetária. O texto ressalta o potencial para atender as necessidades alimentares globais, atingir a justiça social e diminuir o impacto nos sistemas naturais. Ressalta ainda que o futuro da saúde planetária - incluindo a saúde e bem-estar humanos, será determinado pelo modo como esse setor avançar em termos das práticas agrícolas e das opções de alimentos (Myers; Pivor; Saraiva, 2021MYERS S. S.; PIVOR J. I.; SARAIVA, A. M. The São Paulo Declaration on Planetary Health. The Lancet, v.398, n.10308, p.1299, 2021. DOI 10.1016/S0140-6736(21)02181-4.
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(21)02...
).

Nesse contexto se inserem as três graves ameaças globais à saúde e à sobrevivência humana: as pandemias de subnutrição e de obesidade - que incluem sua relação com o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) - e as mudanças climáticas. Elas estão interligadas, e juntas constituem uma sindemia global (Swinburn et al., 2019SWINBURN, B. A. et al. The global syndemic of obesity, undernutrition, and climate change: The Lancet Commission report. The Lancet, v.393, p. 791-846, 2019. DOI 10.1016/S0140-6736(18)32822-8.
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).

Mudanças na produção e nas dietas atuais para dietas sustentáveis são uma das respostas para minimizar os impactos deletérios dos padrões de consumo alimentar atuais sobre o meio ambiente e a nutrição, e, consequentemente, na saúde das populações e do planeta.

De acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização Mundial da Saúde (OMS), dietas saudáveis sustentáveis são “padrões alimentares que promovem todas as dimensões da saúde e bem-estar dos indivíduos; têm baixa pressão e impacto ambiental; são acessíveis, acessíveis, seguros e equitativos; e são culturalmente aceitáveis” (FAO, 2018). Em relação a isso, a revista científica Lancet comissionou cientistas (Comissão EAT-Lancet6 6 Disponível em: <https://eatforum.org/eat-lancet-commission/>. Acesso em: 28 out. 2022. ), que propuseram um modelo de dieta saudável e sustentável que visa proporcionar saúde à população e ao planeta, denominada “Dieta de Saúde Planetária”. Essas recomendações baseiam-se no consumo predominante de legumes, verduras, frutas e grãos integrais e no consumo reduzido de carnes, peixes, ovos, cereais refinados e tubérculos (Willett et al., 2019WILLETT, W. et al. Food in the Anthropocene: the EAT-Lancet Commission on healthy diets from sustainable food systems. The Lancet, v.393, p.447-92, 2019. DOI 10.1016/S0140-6736(18)31788-4, 2019.
https://doi.org/10.1016/S0140-6736(18)31...
). Para avaliar a adesão às recomendações de alimentação saudável e sustentável propostas pela Comissão EAT-Lancet, foi desenvolvido um indicador (Cacau et al., 2021CACAU, L. et al. Development and Validation of an Index Based on EAT-Lancet Recommendations: The Planetary Health Diet Index. Nutrients, v.13, n.5, p.1698, 2021. DOI 10.3390/nu13051698.
https://doi.org/10.3390/nu13051698....
), que foi utilizado em um estudo nacional de base populacional realizado no Brasil. O escore total médio do Planetary Health Diet Index (PHDI) na população brasileira foi de 45,9 pontos (IC 95% 45,6:46,1) em um escore total que pode variar de 0 a 150 pontos. A adesão à dieta EAT-Lancet foi baixa em todas as regiões brasileiras. No entanto, a dieta planetária tem sofrido críticas, em particular por propor uma dieta universal, sem considerar as particularidades culturais e cenários epidemiológicos distintos dos povos.

Para Willett et al. (2019WILLETT, W. et al. Food in the Anthropocene: the EAT-Lancet Commission on healthy diets from sustainable food systems. The Lancet, v.393, p.447-92, 2019. DOI 10.1016/S0140-6736(18)31788-4, 2019.
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), a dieta deveria ter uma diversidade de alimentos de origem vegetal; pequenas quantidades de alimentos de origem animal; gorduras insaturadas ao invés de saturadas e pequenas quantidades de grãos refinados, alimentos ultraprocessados e açúcares adicionados. Além disso, seria necessário reduzir o desperdício de alimentos em 50% e não aumentar a quantidade de terras para produção de alimentos.

No contexto brasileiro, o Guia Alimentar para População Brasileira já assumiu uma abordagem de sistema alimentar, levando em conta aspectos como os impactos ambientais provocados pela alimentação, bem como as influências do ambiente alimentar e dos modos de vida no padrão alimentar das populações (Gabe et al., 2019GABE, K.; JAIME, P. C.; REIS, L. C. Guias alimentares e a classificação de alimentos NOVA. In: MARCHIONI, D. M.; GORGULHO, B. M.; STELUTI, J. (Org.) Consumo alimentar: guia para avaliação. Barueri: Manole, 2019.). O Guia considera formas de produção e distribuição dos alimentos e privilegia os sistemas alimentares social e ambientalmente sustentáveis, se constituindo como uma importante estratégia para implementação da diretriz de promoção da alimentação adequada e saudável que integra a Política Nacional de Alimentação e Nutrição.

Nesse cenário, o Grupo de pesquisa Nutrição e Pobreza, o Saúde Planetária Brasil, e o C4AI-AgriBio, entendem que a retomada organizada e sistêmica das frentes apresentadas neste artigo de posicionamento, entre outras ações que certamente devem ser somadas, aponta um caminho para a articulação entre pesquisa, serviço e políticas públicas para o combate à fome e às demais manifestações da má alimentação. O uso da Inteligência Artificial ao lado do conhecimento acumulado sobre sistemas alimentares sustentáveis e políticas públicas, oferece uma oportunidade para a organização, sistematização e aproveitamento de dados de forma a gerar simulações e cenários que contribuam para o enfrentamento do grave - e inaceitável - cenário de fome do Brasil atual.

Referências

  • AGÊNCIA CÂMARA DE NOTÍCIAS. Para Fiocruz, falta transparência na divulgação de informações sobre agrotóxicos. Brasília, DF, 11 maio 2022. Disponível em: <https://www.camara.leg.br/noticias/874613-para-fiocruz-falta-transparencia-na-divulgacao-de-informacoes-sobre-agrotoxicos/>. Acesso em: 27 set. 2022.
    » https://www.camara.leg.br/noticias/874613-para-fiocruz-falta-transparencia-na-divulgacao-de-informacoes-sobre-agrotoxicos
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  • WORLD FOOD PROGRAMME. Estado da Alimentação Escolar no Mundo 2020. Roma: Programa Mundial de Alimentos, 2021.

Notas

  • 1
    Os autores concordam com definição de SAN adotada pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, em 2004: “Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) é a realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam social, econômica e ambientalmente sustentáveis”. Disponível em: <https://www.ipea.gov.br/participacao/images/pdfs/conferencias/Seguranca_Alimentar_II/textos_referencia_2_conferencia_seguranca_alimentar.pdf>.
  • 2
    Disponível em: <https://unfccc.int/topics/land-use/workstreams/agriculture# COP-27-November-2022>.
  • 3
    Importante resgate histórico sobre a AF pode ser encontrado em: Picolotto (2014). Os atores da Construção da Categoria Agricultura Familiar no Brasil. Disponível em: <Perdoe a>.
  • 4
    Disponível em: <https://c4ai.inova.usp.br>.
  • 5
    Disponível em: <https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp>.
  • 6
    Disponível em: <https://eatforum.org/eat-lancet-commission/>. Acesso em: 28 out. 2022.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2023

Histórico

  • Recebido
    28 Out 2022
  • Aceito
    30 Jan 2023
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