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A privatização de uma empresa: uma ação econômica enraizada nas relações sociais

The privatization of a company: an economic action rooted in social relationships

La privatisation d'une entreprise: une action économique ancrée dans les relations sociales

Resumos

Nos anos 1990, os funcionários das empresas estatais brasileiras realizaram mudanças organizacionais em suas empresas que resultaram em privatização, reengenharia e downsizing. Considero que as diretrizes adotadas resultaram das interpretações e redefinições das demandas do Estado a chamada reforma neoliberal pelos agentes em interação no campo do poder da empresa luta política como luta cognitiva. Nesse sentido, a partir de dados empíricos entrevistas, questionários, documentos e jornais da empresa o processo de privatização e reestruturação produtiva é analisado considerando os seus determinantes microestruturais as configurações e reconfigurações das relações sociais internas à organização , que produziram um tipo de empresa vendável conforme aos critérios de agentes financeiros.

Sociologia econômica; Privatização; Reestruturação organizacional; Violência simbólica; Luta política


In the 1990s the employees of Brazilian state-owned companies made organizational changes in their companies which led to privatization, reengineering and downsizing. I believe that the guidelines which were adopted were the result of the interpretations and redefinitions of the State's demands the so-called neoliberal reform by the agents of interaction in the company's sphere of power political struggle as cognitive struggle. In this regard, based on empirical data interviews, questionnaires, documents and company newspapers the privatization process and productive restructuring is analyzed by considering its microstructural determinants the configurations and reconfigurations of the organization's internal social relationships , which produced a sellable type of company in conformance with the criteria of the financial agents.

Economic sociology; Privatization; Organizational restructuring; Symbolic violence; Political struggle


Dans les années 1990, les changements organisationnels réalisés par les fonctionnaires des entreprises publiques brésiliennes ont abouti à des privatisations, une réingénierie et une restructuration (downsizing). Nous estimons que les directives adoptées sont le résultat de l'interprétation et de la redéfinition des demandes de l'Etat ladite réforme néolibérale par les agents qui interagissent dans le champ du pouvoir de l'entreprise lutte politique mais aussi cognitive. Ainsi, à partir de données empiriques interviews, questionnaires, documents et journaux d'entreprise le processus de privatisation et de restructuration de la production est analysé en tenant compte de ses déterminants microstructuraux les configurations et reconfigurations des rapports sociaux à l'intérieur de l'organisation-, qui ont produit un type d'entreprise vendable en accord avec les critères des agents financiers.

Sociologie économique; Privatisation; Restructuration organisationnelle; Violence symbolique; Lutte politique


DOSSIÊ

A privatização de uma empresa: uma ação econômica enraizada nas relações sociais1 1 Agradeço à CAPES pelo financiamento da pesquisa; aos colegas do NESEFI pelas discussões sobre a pesquisa e sobre as versões anteriores do texto; aos colegas do grupo de sociologia econômica da Sociedade Brasileira de Sociologia pelos comentários críticos à versão anterior do texto; e aos pareceristas anônimos pelas contribuições precisas e construtivas.

The privatization of a company: an economic action rooted in social relationships

La privatisation d'une entreprise: une action économique ancrée dans les relations sociales

Antonio José Pedroso Neto

Doutor em ciências sociais. Professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade Federal do Tocantins, Av. NS 15, ALCNO 14 (109 Norte), Bl. III Sala 20. Cep: 77001-090. Palmas Tocantins Brasil, ajpedrosoneto@uol.com.br

RESUMO

Nos anos 1990, os funcionários das empresas estatais brasileiras realizaram mudanças organizacionais em suas empresas que resultaram em privatização, reengenharia e downsizing. Considero que as diretrizes adotadas resultaram das interpretações e redefinições das demandas do Estado a chamada reforma neoliberal pelos agentes em interação no campo do poder da empresa luta política como luta cognitiva. Nesse sentido, a partir de dados empíricos entrevistas, questionários, documentos e jornais da empresa o processo de privatização e reestruturação produtiva é analisado considerando os seus determinantes microestruturais as configurações e reconfigurações das relações sociais internas à organização , que produziram um tipo de empresa vendável conforme aos critérios de agentes financeiros.

Palavras-chave: Sociologia econômica. Privatização. Reestruturação organizacional. Violência simbólica. Luta política.

ABSTRACT

In the 1990s the employees of Brazilian state-owned companies made organizational changes in their companies which led to privatization, reengineering and downsizing. I believe that the guidelines which were adopted were the result of the interpretations and redefinitions of the State's demands the so-called neoliberal reform by the agents of interaction in the company's sphere of power political struggle as cognitive struggle. In this regard, based on empirical data interviews, questionnaires, documents and company newspapers the privatization process and productive restructuring is analyzed by considering its microstructural determinants the configurations and reconfigurations of the organization's internal social relationships , which produced a sellable type of company in conformance with the criteria of the financial agents.

Key words: Economic sociology. Privatization. Organizational restructuring. Symbolic violence. Political struggle.

RÉSUMÉ

Dans les années 1990, les changements organisationnels réalisés par les fonctionnaires des entreprises publiques brésiliennes ont abouti à des privatisations, une réingénierie et une restructuration (downsizing). Nous estimons que les directives adoptées sont le résultat de l'interprétation et de la redéfinition des demandes de l'Etat ladite réforme néolibérale par les agents qui interagissent dans le champ du pouvoir de l'entreprise lutte politique mais aussi cognitive. Ainsi, à partir de données empiriques interviews, questionnaires, documents et journaux d'entreprise le processus de privatisation et de restructuration de la production est analysé en tenant compte de ses déterminants microstructuraux les configurations et reconfigurations des rapports sociaux à l'intérieur de l'organisation-, qui ont produit un type d'entreprise vendable en accord avec les critères des agents financiers.

Mots-clés: Sociologie économique. Privatisation. Restructuration organisationnelle. Violence symbolique. Lutte politique.

INTRODUÇÃO

Este texto trata de dois processos recorrentes no mundo das organizações econômicas contemporâneas: um processo de mudanças organizacionais (reestruturação produtiva, reengenharia, downsizing) e um de privatização. Ambos ocorreram intensamente nos anos 1990, mas ainda são recorrentes. A dinâmica desses processos, deflagrada pelos dirigentes e (ou) proprietários das organizações, é um dado que precisa ser descrito e explicado. Por isso, a análise deste texto se baseia em uma observação empírica de um processo de mudanças organizacionais concomitante com um processo de privatização. A démarche sociológica adotada considera que diversos grupos de agentes participam ativamente desses processos agentes da base ao cume da pirâmide organizacional, de dentro e de fora da organização , ou seja, considera que eles são essencialmente políticos.

Na primeira metade dos anos 1990, as empresas estatais brasileiras passaram por um amplo processo de reestruturação societária, patrimonial, organizacional e, finalmente, de privatização. Na segunda metade da década, o processo estendeu-se às empresas do setor elétrico e resultou em privatizações. Por iniciativa do governo do Estado de São Paulo, essa reestruturação foi perseguida nas três empresas que constituíam o Setor Elétrico Paulista (SEP). Antes, durante e após a privatização, essas empresas passaram por diversas ações de mudanças organizacionais. De um modo geral, após a privatização, essas ações continuaram, e algumas ganharam relevância e foram mais impactantes, como é o caso do enxugamento do quadro de funcionários.

Tanto a privatização como as mudanças organizacionais2 2 As empresas cindiram suas atividades por área geração, transmissão e distribuição , reorganizaram, extinguiram e criaram departamentos, divisões, setores, etc. E, ao mesmo tempo, introduziram tecnologias de administração, informação, telecomunicação, equipamentos , redistribuíram e desligaram o pessoal, terceirizaram atividades, etc. Em síntese, passaram de uma "estrutura funcional-unitária" para uma "estrutura multidivisional" (Fligstein, 1993). foram realizadas sob incentivos e constrangimentos institucionais, políticos e econômicos, da esfera estadual e federal. Entretanto, foram realizadas pelos próprios funcionários das empresas. Foram os agentes com longa história nas empresas e imersos em relações sociais locais que mediaram os incentivos e os constrangimentos aludidos e que também contribuíram para criá-los.

A bibliografia sobre os processos de privatização no Brasil (Rosa; Tolmasquim; Pires, 1998; Almeida, 1999; Ferreira, 2000; Tolmasquim; Oliveira; Campos, 2002) deixa uma lacuna quanto à compreensão de como se deu concretamente a dinâmica do pessoal das empresas sindicalistas, gerentes, executivos, engenheiros, administradores, economistas, técnicos, etc. com ou sem ligações com agremiações políticas de ordem sindical, profissional, governamental e partidária para levar a cabo os processos de mudanças e, consequentemente, de privatização.

A análise que ora apresento procurou preencher essa lacuna da bibliografia, ou seja, procurou abrir a "caixa preta" das mudanças alardeadas e propor uma descrição e uma explicação sobre como os processos foram desdobrados pelos agentes, por quais agentes e sob que condições.3 3 O presente artigo tem como base uma tese de doutorado: Pedroso Neto (2005). As principais fontes de dados foram: jornal da empresa; documentos; 41 entrevistas; 30 questionários; boletins sindicais; RAIS (Relação Anual de Informações Sociais do Ministério do Trabalho); DATA ROM conjunto de dados resultantes de uma bateria de auditorias externas que visavam a produzir dados para determinar o valor pelo qual a empresa iria para o leilão de privatização. Esse é o problema: como? A questão é explicar como a privatização e as mudanças organizacionais ocorreram a partir da análise da dinâmica da microfísica das relações sociais internas à organização. Centrei a análise em uma Empresa-Caso (EC).4 4 Para acessar dados, comprometi-me a não revelar o nome da empresa. Trata-se de uma ocorrência variante de outros casos semelhantes e, assim, de processos mais gerais, seja por ser uma variante dos casos de privatização, seja por ser uma variante de processos de mudanças organizacionais. E, dentro dessa empresa, foquei nos agentes de um "projeto de modernização", na linguagem autóctone.

De fato, uma fração dos funcionários das empresas do SEP interagiu e trabalhou para realizar diversas mudanças em suas empresas, e essas mudanças facilitaram a privatização. Na EC, as mudanças foram mais amplas e prolongadas. Analiticamente, essas mudanças podem ser apresentadas em dois níveis, como segue.

No primeiro nível, temos a modernização. Na empresa, a expressão "modernização da empresa" denotava um conjunto de diretrizes, propostas, projetos, planos e ações concretas de mudanças organizacionais que ocorreram a partir de meados de 1995 e se estenderam por cerca de sete anos. Neste texto a expressão "modernização da empresa" tem o mesmo significado.

No segundo nível, temos os três momentos da modernização. A primeira modernização foi uma iniciativa de funcionários do alto escalão da empresa presidente, diretores, gerentes regionais e os respectivos assessores , auxiliados por funcionários de menor escalão, realizada entre setembro de 1995 a abril de 1996. Em seguida, essa iniciativa ganhou outra dinâmica e, assim, ocorreu a segunda modernização. Ela promoveu uma reengenharia de processos com implantações-piloto e uma mudança na estrutura organizacional. Para isso, envolveu um número bem maior de funcionários, empresas de consultoria e as diferentes forças políticas atuantes na empresa sindicatos, associações profissionais, Conselho de Representantes de Empregados, gerentes e executivos. E, por fim, a terceira modernização ocorreu após a privatização da empresa (1997), quando os novos processos oriundos da reengenharia foram largamente implantados.

É preciso explicar como se deu a dinâmica da modernização em um contexto crítico. Em primeiro lugar, os servidores sabiam que experiências de mudanças organizacionais downsizing, reengenharia, reestruturação produtiva resultariam em desmantelamento do corpo de funcionários. Em segundo, sabiam que tais mudanças ocorreriam com maior probabilidade se a empresa fosse estatal e estivesse "na lista" das que seriam privatizadas, como era o caso das empresas do SEP. Em terceiro, também sabiam que o desmantelamento do corpo de funcionários começaria por aqueles que, como eles, ocupavam cargos conquistados em função da posse de diploma de nível superior, apresentavam uma carreira relativamente longa, premiada com aumentos salariais, com demais benefícios e com reconhecimentos correlatos à senioridade, além de desfrutarem de estabilidade no emprego, firmada em sucessivos acordos coletivos.

Teoricamente apreendi a modernização como um "espaço social" (Bourdieu, 2001, p. 223) onde ocorreram, de forma visível e condensada, os conflitos e as alianças entre os diferentes agentes, e onde foi produzido o impulso de todos os envolvidos na transformação organizacional. Dessa forma, o estudo foi realizado a partir da estrutura desse espaço social e das tomadas de posição dos agentes que nele interagiram.

A mudança organizacional da empresa significou um processo de mobilização de seus agentes para transformá-la no que tange aos processos de trabalho, à introdução de processos tecnológicos, à terceirização de atividades, à mobilização dos agentes para justificar essas transformações, etc. Mas significou, fundamentalmente, uma luta política pela redefinição da empresa.

Uma luta política é uma luta cognitiva (prática e teórica) pelo poder de impor a visão legítima do mundo social, ou melhor, pelo reconhecimento, acumulado sob a forma de um capital simbólico de notoriedade e respeitabilidade, que confere autoridade para impor o conhecimento legítimo do sentido do mundo social, de sua significação atual e da direção na qual ele vai e deve ir (Bourdieu, 2001, p. 226, grifo do autor).

Nas lutas para modificar o mundo modificando a representação do mundo, os agentes assumem posições que dependem da sua posição objetiva no mundo social. Dessa forma, o objetivo dos agentes empenhados em transformar a empresa passa necessariamente pela transformação da representação que eles mesmos e os outros agentes têm de si mesmos, do mundo e da empresa. E a ação desses agentes depende do poder que têm de mudar a representação que um conjunto mais amplo de agentes tem do mundo social. E, por fim, o poder dos agentes para transformar a representação do mundo social depende do "capital simbólico" (Bourdieu, 2001, p. 226) que têm acumulado. Quer dizer, depende da posição deles nesse espaço (honra, crédito, reputação, notoriedade, glória, enfim, reconhecimento), condição essencial para o exercício da "violência simbólica" (Bourdieu, 2001, p. 206-207), que é o poder de impor princípios de visão e divisão do mundo, de mudar a representação do mundo.

Para dar conta das estratégias colocadas em prática pelos funcionários da EC para transformá-la, estudei a "empresa como campo" (Bourdieu, 2000, p. 252-253), como uma unidade relativamente autônoma, determinada também por sua estrutura interna, produto da sua história. Dessa perspectiva, as diretrizes de transformação adotadas pelos agentes dependeram das diretrizes do governo estadual, controlador da empresa. Mas dependeram, fundamentalmente, das providências tomadas dentro da empresa, resultantes da interpretação e redefinição das diretrizes do governo pelos agentes em interação, sob os constrangimentos de um "campo do poder" (Bourdieu, 2000, p. 160) na empresa, que é a própria empresa. Quer dizer, dependeram da estrutura das relações de força entre os diferentes agentes ou grupo de agentes constituintes da empresa, que poderiam perseguir estratégias diferentes, compartilhadas ou antagônicas.

Analiticamente, a modernização é o lócus por excelência onde os princípios de estruturação e as forças em interação na empresa, naquele momento e naquelas circunstâncias, podem ser apreendidos, assim como os móveis da dinâmica dos agentes. Desse modo, é possível revelar os princípios de hierarquização desse espaço, relacionar as posições dos diferentes agentes com as suas práticas realizações, resistências, justificações, condenações, etc. , compreender as condições sociais que propiciaram as mudanças e descrever os mecanismos utilizados pelos agentes para realizá-las.

A ideia de "indivíduos eficientes" (Bourdieu, 2000, p. 160) é um recurso analítico para chegar às propriedades agindo no campo, ou seja, aos capitais dos agentes. Os agentes que fizeram as mudanças organizacionais são os indivíduos que influenciaram efetivamente o processo porque detinham alguma propriedade ativa no campo: controle de informação; conhecimento detalhado dos processos de trabalho, do pessoal, dos equipamentos, das relações entre os funcionários; conhecimentos técnicos e práticos; relações fora da empresa com compradores ou prestadores de serviços, com forças políticas estaduais, locais, etc. Doravante, são os agentes da modernização, os representantes das forças sociais presentes na empresa. Para chegar a uma lista dos agentes da modernização, segui um critério institucional; tomei as 113 pessoas que formalmente participaram da segunda modernização.5 5 Indivíduos em posições de poder: os representantes da SEESP, o presidente e os diretores da EC. Funcionários de carreira: assessores, gerentes, chefes, coordenadores, engenheiros, psicólogos, advogados, etc. Representantes de sindicatos, associações e conselhos.

Em conclusão, o conjunto de funcionários da modernização é representativo da estrutura das posições de poder dos agentes da empresa no período e na situação que estava dada. Logo, pensada e analisada como uma configuração de posições de poder, ela pode proporcionar "todos os meios de compreender a lógica das lutas nas quais se determinam os fins da empresa" (Bourdieu, 2000. p. 253-254).

As primeiras seções deste artigo tratam das tomadas de posição dos diferentes agentes no processo de modernização governo estadual, "alto clero", "baixo clero", demais funcionários, sindicatos e empresa de consultoria e descrevem as atividades que eles realizaram análise e redesenho de processos, recrutamento, consultoria técnica, mobilizações políticas, etc. As seções subsequentes explicam como, a partir das tomadas de posição iniciais do governo e do "alto clero", o processo tornou-se um campo de forças e, assim, envolveu todos os funcionários da empresa. E, por fim, as seções finais analisam os impactos do processo sobre as organizações dos funcionários sindicatos, associações e conselho e sobre os agentes do "alto clero": enfraquecimento das organizações, por um lado, e perda de cargos e expectativas de futuro, por outro.

MUDANDO O FUTURO

O Secretário Estadual de Energia, desde o início de 1995, expôs suas prioridades para o SEP: a reorganização institucional. Em agosto de 1995, ele divulgou o plano de reestruturação do setor proposto pelo governo. Logo em seguida, os presidentes das empresas do SEP apresentaram seus respectivos "planos de modernização para atuar a partir da reestruturação do setor no Estado" (Modernização..., 1995). E, em setembro de 1995, um plano de modernização, em forma de projeto, foi apresentado formalmente aos funcionários da EC. No entanto, as ações que caracterizavam as diretrizes desse plano já estavam sendo implementadas desde o início de 1995.

Por um lado, a Secretaria Estadual de Energia de São Paulo (SEESP) visava a preparar a empresa para vender, ou modernizar a empresa para valorizá-la (Pedroso Neto, 2005). Suas diretrizes tinham dois eixos principais: primeiro, rearranjar os ativos das empresas ("desmantelamento patrimonial"), separando as atividades de geração, transmissão e distribuição de energia; segundo, reorganizar essas atividades por Unidades de Negócios (Unegs). Assim, após a autorização da Assembleia Legislativa, seriam criadas empresas subsidiárias. Com esse rearranjo, a SEESP objetivava valorizar as empresas que estavam valendo "30% do que está registrado nos livros". Assim, em seguida, o governo poderia vender as ações e (ou) as novas unidades fórmula que geraria recursos para investimentos no setor (Governo..., 1995; Secretário..., 1995).

Por outro lado, os agentes do "alto clero"6 6 Trata-se de um conjunto de funcionários do alto escalão presidente, diretores, gerentes regionais e os respectivos assessores que empreenderam a modernização desde o início, mais o Secretário de Energia do Estado e o Secretário de Energia Adjunto. Eles estavam presentes nos postos de direção e coordenação da primeira modernização e migraram para postos homólogos na segunda modernização. Cerca de 20 a 30 agentes. Uso o termo alto clero apenas para diferenciá-los; seja do conjunto de funcionários do alto escalão, como eles, que não estavam participando e conduzindo a modernização, seja dos funcionários de menor escalão que participaram da modernização executando as tarefas operacionais (nota de rodapé número 8). Os agentes do alto clero tinham poder de comando e coordenação na empresa, naquele momento, que iam além das atribuições estatutárias em nenhum momento da pesquisa empírica me deparei com o termo alto clero. pretendiam e agiam no sentido de preparar ou modernizar a empresa para a privatização. Eles começaram a modernização. A primeira modernização tinha cinco planos: descentralização, "destinado a ampliar a autonomia gerencial"; gerência por resultados, que visava a criar "indicadores de desempenho"; produtividade e lucratividade, com o objetivo de reduzir custos, ampliar as fontes de receitas e priorizar investimentos; atualização de recursos humanos, que objetivava "obter uma melhor relação de produtividade funcional", especialmente "a atualização e a preparação de gerentes empreendedores, com enfoque mais empresarial"; e o de atualização tecnológica, que visava a ampliar a "automação administrativa e operacional" e ao aumento do "uso de recursos de informática" (Grupo...; Plano...; Gestão...; Pat...; Projeto..., 1995).

As ações do "alto clero" tinham empuxos sociais específicos. Em síntese, esses agentes, por conta de suas inserções sociais e políticas maior montante de capital social, organizacional, técnico, escolar e político que os demais funcionários (Pedroso Neto, 2005, 2007) , tinham acesso a informações privilegiadas junto ao governo estratégias e diretrizes formais e informais e rapidamente tomaram como um dado que a EC seria privatizada, dada sua situação vis-à-vis as outras do SEP. Dadas as suas inserções econômicas gerentes e executivos de empresa estatal que, de modo geral, estavam em meio aos funcionários rotulados como "eletrossauros", acomodados, ineficientes partiram para ações de modernização, atualização tecnológica e enxugamento do quadro de funcionários para ter um trunfo de distinção diante dos novos acionistas que, futuramente, comandariam a empresa. Enfim, os agentes do "alto clero" objetivavam realizar um downsizing para se defenderem de um takeover .

Enquanto os agentes do "alto clero" agiam prioritariamente na arena interna à empresa, as Entidades Representativas dos Funcionários (ERF)7 7 Sindicato dos Eletricitários, Sindicato dos Engenheiros, Associação dos Engenheiros e Conselho de Representantes dos Empregados. agiam em uníssono na arena política externa à empresa, em oposição às mudanças institucionais que a SEESP estava propondo. As principais ações das ERF eram centradas na ação político-institucional, junto aos partidos políticos e aos mandatários de cargos políticos executivos ou legislativos. Entre 1995 e meados de 1996, as ERF juntaram forças para agir no âmbito do poder legislativo estadual visando a impedir a aprovação do Programa Estadual de Desestatização e Parcerias com a Iniciativa Privada e a criação da Comissão de Serviços Públicos de Energia.

Em correspondência com suas congêneres das outras empresas do SEP, realizaram passeatas, reuniões com deputados e marcaram presença na Assembleia Legislativa, procurando influenciar as votações. As entidades de representação dos funcionários também estavam presentes no Comitê em Defesa dos Serviços e do Patrimônio Público, que era composto por diversos sindicatos, associações de funcionários de empresas estatais de vários setores e por bancadas de partidos políticos da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, além de outras organizações. Claramente, esse Comitê foi a instituição criada para galvanizar as forças políticas interessadas em se contraporem ao projeto de reestruturação do SEP. Com a colaboração desse Comitê, as ERF lançaram uma proposta para a "reestruturação" do SEP (Reestruturação...; Empresa..., 1996).

Internamente, as ações de mudanças tinham um forte cunho de recuperação de algo perdido, deteriorado: basicamente, a perda de profissionalismo e de eficiência devida à vigência de ingerências políticas no corpo gerencial. A nova direção da empresa, ou seja, aquela empossada pelo governador Mario Covas (de 1995 a 2001) no início de 1995, inaugurou seu mandato e a modernização da empresa com um discurso moralizante em dois sentidos: livrar a empresa dos funcionários "incompetentes", "cabides", "apadrinhados", etc. e das práticas condizentes com o meio moralização das relações externas e auditoria para detectar problemas administrativos; e torná-la eficiente, em muitos aspectos, nos moldes do habitus de engenheiro maior eficácia e produtividade, modernização e inovação tecnológica, qualificação dos profissionais etc. A mesma justificativa de recuperação de algo perdido também constituía o rol de arrazoamentos que a SEESP mobilizava para defender a reestruturação do SEP.

Dessa forma, as iniciativas de modernização, em grande parte, eram passíveis de aprovação pelo conjunto dos funcionários e eram moralmente blindadas das tentativas de desaprovação. Assim, nos momentos das investidas políticas da SEESP e do "alto clero", a principal força sindical não podia negar os sentidos do discurso moralizante e ficava em situação frágil para se contrapor a tais investidas, dado que elas procuravam se firmar também na justificativa de que estavam sendo levadas a cabo para recuperar a empresa.

Nesse contexto, outro dado decisivo era que o "alto clero" tinha que se explicar e justificar sobre o possível enxugamento de cargos que resultaria das mudanças. As respostas giravam em torno de três pontos: ocorreriam desligamentos por meio de aposentadorias; ocorreriam cortes de funcionários "fantasmas", "incompetentes", "apadrinhados" etc.; não ocorreria demissão dos demais funcionários, mas eles teriam à disposição um grande número de cursos de atualização gerencial, técnica, etc. e algumas possibilidades de mudança de cargo, ocupação, setor etc.

Do ponto de vista sociológico, dois fatores decorriam dessas iniciativas, ações e justificações, num ambiente progressivamente carregado de incertezas. Por um lado, estava se tornando explícito um conjunto de microconflitos entre os segmentos do corpo de funcionários: partidários, profissionais e, fundamentalmente, geracionais os que poderiam ou estavam perto da aposentadoria versus os que tinham menos tempo de casa (Pedroso Neto, 2011a). Por outro lado, as explanações supracitadas também compunham um quadro de "violências simbólicas" (Bourdieu, 2001, p. 206-207) que nasciam nas relações verticais auxiliadas por consultores e acadêmicos e que eram reproduzidas nas relações horizontais composições com a violência simbólica.

Em conclusão, em alguma medida, vários planos e projetos iniciais da primeira modernização foram realizados. Mas não afirmo que tiveram grandes efeitos sobre a empresa ou seus funcionários. O decisivo é que, em consequência da modernização e com o concurso de outros fatores que exploraremos adiante, as modernizações subsequentes puderam funcionar com maior plenitude. Os grandes efeitos da primeira modernização foram processuais e cumulativos; abriram determinadas possibilidades para o futuro e fecharam outras. O "alto clero", por conta da sua posição objetiva, das suas disposições e do seu capital simbólico, progressivamente, conseguiu mobilizar outros agentes, impor sua representação de empresa e canalizar a energia social em direção a fazê-la acontecer.

UM DINAMISMO AUTOIMPULSIONADO

Em meados de 1996, foi anunciado que a modernização entraria em uma nova fase: a empresa passaria por uma reengenharia de processos e por uma reestruturação organizacional. Esse anúncio e sua divulgação aconteceram em um momento de confluência de alguns acontecimentos decisivos que eram desdobramentos das ações anteriores: (a) a empresa de consultoria Andersen Consulting entrou em cena; (b) o Programa Estadual de Desestatização e Parcerias com a Iniciativa Privada foi aprovado pela Assembleia Legislativa Estadual; (c) foi anunciada a licitação que iria contratar as empresas de consultoria que realizariam os estudos para avaliar o preço mínimo da EC no leilão; (d) foram convocados os funcionários que iriam trabalhar na segunda modernização, o "baixo clero";8 8 Gerentes, engenheiros, administradores, contadores, técnicos, etc. que fizeram parte das equipes de levantamento de dados, de detalhamento e redesenho dos processos durante a modernização (nota de rodapé número 6). (e) e, por fim, teve início a seleção dos funcionários que iriam realizar cursos de administração, finanças, economia, recursos humanos e custos pela Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).

Na sequência da aprovação do Programa Estadual de Desestatização, o presidente da EC reuniu-se com seus diretores, gerentes e assessores e explicou que ela deveria mover-se do "ponto a" para o "ponto b" ("empresa moderna"), pois, caso houvesse autorização para o "ponto c" ("privatização"), ela estaria preparada (PED..., 1996). Desde então, os "cardeais do alto clero", em especial o presidente da empresa, iniciaram a apresentação da segunda modernização para os funcionários em várias palestras, seminários e edições do jornal.

A expressão preparação para a privatização foi amplamente compartilhada pelos funcionários. Desde o início da modernização, a expressão foi veiculada pela direção da empresa como a justificativa primordial para sua realização. No significado da ideia de preparação estava inclusa a participação dos funcionários, tanto na modernização que iria transformar a empresa, como nos cursos que a empresa ofereceria com o intuito de prepará-los para atuar em uma empresa privada.

A segunda modernização é o início de um novo tempo. Desde então, progressivamente, a privatização da EC passou a ser tida como uma questão de tempo. Foi o ponto final das iniciativas que tentavam barrar a privatização da empresa, ou seja, fundamentalmente, aquelas iniciativas que aconteciam na arena política externa à empresa. E foi o início da preocupação com as ações anunciadas pelo alto escalão, pela empresa de consultoria e pelas ERF. O pânico tomou conta dos funcionários.

As novas iniciativas de modernização tornaram-se o centro das atenções, alianças e disputas na empresa. A segunda modernização tornou-se um "campo de forças" (Bourdieu, 2000, p. 160); todas as forças sociais presentes na EC se confrontavam ou se alinhavam em referência a ela.

Enquanto a primeira modernização foi impulsionada por um conjunto restrito de "cardeais do alto clero", sobretudo da sede da empresa, a segunda modernização ganhou novo alento com os acontecimentos decisivos supracitados e passou a ser disputada pelo conjunto dos funcionários. Constatamos vários tipos de resistência dos funcionários à primeira e à segunda modernização. Inclusive, alguns dos funcionários componentes do "alto clero" não eram a favor dela e não estavam empenhados em levar adiante a sua realização.

No entanto, a partir de meados de 1996, os membros das regionais, os da "linha de frente", os "grandes que tinham influência política", (entrevista A) que eram os que não estavam muito interessados na modernização em momentos anteriores, procuraram se alinhar, se envolver e se impor. Dessa forma, em grande medida, as iniciativas do "alto clero" ganharam mais espaço na empresa com as disputas de outros agentes para participar ativamente delas.

DIFERENCIANDO O PASSADO E O FUTURO E PRODUZINDO ENERGIA SOCIAL

Em grande medida, o objetivo das apresentações da segunda modernização, tal como foram realizadas pelos agentes do "alto clero", era convencer os funcionários de que tanto a empresa como eles próprios teriam vantagens e benefícios se ela fosse realizada naquele momento, ou seja, na última gestão pública da empresa. Fundamentalmente, como isso, os funcionários estariam "antecipando" e "disciplinando" o que "viria pela frente", o "enxugamento" (entrevista A).

A figura de contraposição que eles divulgavam, e que lembrava aos funcionários os riscos de não se realizar uma modernização, era a "forma traumática" como tinha "se dado o processo de privatização nas outras empresas do Setor Elétrico"(E agora...1996). O exemplo da experiência de empresas congêneres, como a Escelsa e a Light, além de outras empresas estatais que haviam sido privatizadas, era corrente, especialmente os dados sobre o enxugamento do corpo de funcionários. Frente a isso, e como alternativa, foi apresentada a segunda modernização como uma proposta de modernizar a empresa antes da privatização.

O presidente da empresa afirmava que os funcionários teriam um ano para implantar o "novo modelo de gestão", antes que se concluísse o processo de privatização, e que, assim, seriam menos atingidos por "turbulências"(E agora...1996). Em síntese, com a modernização teriam um trunfo estratégico para condicionar as ações dos novos acionistas e para se adaptarem aos novos processos e procedimentos de trabalho que viriam com eles.

Foi sublinhado que a EC tinha a vantagem de ter uma "consultoria internacional do porte da Andersen" ajudando-a a fazer a "transição para o novo conceito de empresa". Foi explicado que essa consultora estudou a primeira modernização, reconheceu "suas virtudes" e apresentou "redirecionamentos". Em seguida, juntamente com um "grupo grande de funcionários", fizeram um "modelo de gestão" e um "modelo operacional" que, por sua vez, já foram aprovados. As estratégias para alcançar esses modelos eram: o "foco total" na redução de custos (empresa world-class); o atendimento segmentado dos clientes; o abandono do trabalho por funções e a redefinição da estrutura organizacional a partir dos processos de trabalho (E agora...1996).

Foi delineado um programa e um cronograma para implantar a "nova estrutura organizacional" antes da privatização. No segundo semestre de 1996 seria realizado o "detalhamento, processo por processo, do novo modelo a ser implantado". Esse detalhamento seria realizado por células de trabalho compostas por funcionários. E assim "nasceria" a "nova empresa", pois, após o detalhamento, começaria o "processo de migração", ou seja, de "substituição da estrutura velha pela nova" (E agora...1996).

Segundo o cronograma, no início de 1996, as "mudanças mais significativas para os clientes" já estariam "funcionando no lugar dos velhos procedimentos", e, "numa segunda etapa", seriam "resgatados da velha estrutura, atividades, pessoas e sistemas" que seriam "transferidos da estrutura velha para a nova", em meados de 1997. Em seguida, à medida que outros processos de suporte fossem definidos eles seriam implantados, seguindo a mesma sequência metodológica: "detalhamento, migração e implementação do novo modelo". E, enfim, ao cabo do processo, por volta do "final do primeiro semestre de 1997", "boa parte dos processos" estariam implantados (E agora...1996).

Foi proposto explicitamente um novo princípio de enquadramento das disputas internas à empresa e de classificação dos funcionários conforme a postura deles frente àquele momento. Foi exposto o "Pacto da Modernidade": que os funcionários "esquecessem" os "grupos provenientes de gestões diferentes" que "lutaram entre si" e se unissem ("nos unir") levando em conta "um único tipo de divisão"; entre os que queriam permanecer na empresa e os que queriam sair (E agora...1996).

Nesse contexto discursivo, foi apresentado que os funcionários ("nós") tinham duas alternativas para enfrentar as "exigências do processo de transição". A alternativa negativa seria a de "encarar" aquela "etapa da vida da empresa de forma negativa tendo como referência o passado". Segundo as explicações, era recomendado que tal "visão melancólica e pessimista" do momento ("situação atual") fosse deixada para as "pessoas imobilistas", para as pessoas que estão "presas no passado e que têm a tendência de vê-lo sempre como um período melhor do que o presente". Em contraposição, a alternativa positiva seria a de "enfrentar os desafios do presente de forma positiva, tomando todas as iniciativas no sentido de colocar a [EC] em fase com as mudanças do nosso ambiente" (E agora...1996).

Essas propostas e prescrições eram expressas em uma linguagem darwiniana e estavam imbuídas de explicações que naturalizavam as forças que deflagravam as mudanças. Segundo elas, as mudanças estavam acontecendo no "mercado", nas "tecnologias", eram "inexoráveis" e ocorriam independentes da "vontade, desejo, concurso ou contribuição" dos funcionários. Em referência a elas, foi veiculada a relação entre a sobrevivência das organizações e as mudanças no ambiente: "adaptar" ou "perecer" (E agora...1996).

O grande arauto da modernização procurou explicar que a EC era de excelência e, mesmo enxuta, enfrentava o problema que "atingia todas as Empresas do Setor": "o final de uma era". Sendo assim, os funcionários tinham de acompanhar as mudanças que estavam acontecendo "no mundo todo" e no setor elétrico: considerar os custos, a remuneração dos acionistas e o atendimento diferenciado dos clientes (E agora...1996).

Ao mesmo tempo em que apresentava a segunda modernização como uma iniciativa impar, preventiva e inteligente, o discurso presidencial reconhecia que "a ideia de privatização" representava "insegurança e instabilidade" para os funcionários. Entretanto, ele mesmo prescrevia, como contraponto, que ela realizava muitos de seus sonhos ("nossos mais caros sonhos"): o de uma empresa que "possa responder prontamente às necessidades de seus clientes, sem ter que se submeter a processos burocráticos e legais desgastantes e demorados"; o de uma empresa em que o "mérito individual e a competência" sejam "os únicos critérios de crescimento profissional" (E agora...1996).

O recurso a um princípio meritocrático para moralizar as práticas de atribuição de postos de trabalho nas fileiras da empresa, claramente referido às práticas reconhecidas de influência política, apadrinhamento etc., já era corrente desde o início da modernização. Mas, na nova versão, estava associado às prescrições de quais seriam as vantagens para os funcionários. Foi apresentada "outra exigência dos novos tempos": a "necessidade de utilização do critério de competência pessoal para a ocupação dos cargos". E assim, desde então, tanto para a "alavancagem profissional" como para a "ocupação de cargos na nova estrutura", "cada vez mais" teriam "importância na seleção de recursos humanos" os "critérios técnicos e profissionais" e a "competência e mérito profissional" (E agora...1996).

A empresa também apresentou o planejamento das ações voltadas para os funcionários que "decidirem continuar na Empresa privatizada" e para os que "quiserem sair da organização". Nos doze meses seguintes, a empresa iria "fornecer o treinamento e o desenvolvimento profissional" para os funcionários que tivessem "condições de operar o novo Modelo de Gestão". Tratava-se de treinamento em um "amplo programa de desenvolvimento pessoal", cujo carro chefe era "um avançado curso de Formação Gerencial" (com duração de onze meses, "quase um MBA") (entrevista B) para alunos selecionados pela própria Fundação Getúlio Vargas, "sem interferência da empresa". E, para os que quisessem sair ("queiram sair"), seriam contratadas "consultorias universitárias" para treiná-los e auxiliá-los a "montar um negócio próprio" (E agora...1996).

Por fim, foram apresentadas "salvaguardas" que dariam "algumas garantias aos funcionários, aumentando a sua segurança em relação ao futuro": tanto o "Edital de Venda" como o "próximo acordo coletivo" teriam "regras de transição, disciplinando a adequação do quadro de funcionários nos primeiros meses da empresa privatizada". A Fundação CESP teria "continuidade no novo modelo", salvo que "seguramente" ocorreria a "necessidade de uma melhor adequação entre os benefícios e as contribuições da empresa e do empregado" (E agora...1996).

Em síntese, implícita e explicitamente, nesses momentos de ofensiva do "alto clero" na "luta política pela redefinição da empresa" (Bourdieu, 2001, p. 226), veicularam-se princípios de reclassificação e hierarquização da empresa e dos funcionários: fim de uma era versus novos tempos; velha cultura versus nova cultura; velho modelo de gestão versus novo modelo de gestão; velhos procedimentos de trabalho versus novos procedimentos de trabalho; velha estrutura versus nova estrutura; funcionários que queriam sair da empresa versus funcionários que queriam permanecer na empresa; funcionários melancólicos, pessimistas, imobilistas, presos ao passado, versus funcionários com iniciativa, que enfrentam desafios de forma positiva, a favor da modernidade, líderes, sintonizados com o processo de mudança; empresa com processos burocráticos, desgastantes, demorados, versus empresa que responde prontamente aos clientes; etc. E, por fim, empresa em que o mérito e a competência profissional e individual são os critérios de crescimento e alavancagem da carreira versus empresa em que estavam presentes práticas de apadrinhamento, nepotismo, clientelismo, etc.

Como um coroamento dessa ofensiva, foi veiculada a ideia de resgatar e transferir os funcionários de uma empresa para a outra, e seus significados correlatos. A ideia de resgatar, que inclui, no seu núcleo de significação, o sentido de recuperar, foi utilizada em um contexto onde se veiculavam propostas de reclassificação. Dessa forma, tanto a reverberação constante desses pares de princípios de reclassificação e hierarquização da empresa e dos funcionários como seu coroamento com a ideia de resgate, implícita e explicitamente, propunham e promoviam uma diferenciação entre eles. E, assim, produziam a energia social que impulsionava os agentes a buscarem a reconversão para o que fosse definido como novo e moderno e para se realinharem com alto clero e suas propostas.

AS PRÁTICAS DOS FULL TIME E A FORMALIZAÇÃO DO SAVOIR-FAIRE

Na segunda modernização, os agentes realizavam duas grandes tarefas: por um lado, um levantamento dos recursos materiais e humanos da empresa e do modo como eram empregados; por outro, um detalhamento dos processos de trabalho, seguido por um redesenho dos mesmos com base em benchmarks e com o objetivo de aumentar a produtividade e baixar os custos.

Os estudos dos processos de trabalho foram realizados em células. Cada uma tinha pouco mais de dez funcionários do "baixo clero", que eram assessorados pelos consultores da Andersen. Cerca de uma centena de funcionários foram designados para trabalhar cerca de seis meses em um espaço separado na empresa, um prédio à parte dentro da empresa.

Eles realizavam as chamadas imersões. O primeiro passo, em uma imersão, era a estratégia; definir uma meta a ser atingida, com o detalhamento e a reconstituição de um processo. Basicamente, isso significava melhorar a relação custo e (ou) benefício, com a redução de recursos humanos. O segundo passo era detalhar como se realizava o processo em foco e refazê-lo, procurando estabelecer outro, considerando a estratégia traçada. O terceiro passo era analisar as tecnologias que a empresa possuía e as que poderiam ser adquiridas para viabilizar os processos redefinidos e atingir a meta. E o quarto passo era analisar o volume de serviços, os tipos de serviços e a relação com o número de funcionários "volume de serviços dividido pelo número de pessoas" (entrevista C) , procurando aumentar a produtividade e redimensionar os recursos humanos, diminuindo a quantidade e descrevendo os perfis, as capacitações e as habilidades que seriam necessárias para executar os processos redesenhados.

Os funcionários do "baixo clero" que trabalhavam exclusivamente na segunda modernização eram chamados de full time. Eles faziam várias imersões e apresentavam os resultados aos "cardeais do alto clero" e aos consultores. Os estudos tinham como referências as benchmarks trazidas do exterior pela Andersen, e só terminavam quando chegavam a um formato aceito e ou validado pelos "cardeais" e consultores. Só então, passava-se para a implantação dos novos processos. Mas, ao mesmo tempo em que as implantações ocorriam, outros processos eram redesenhados e assim sucessivamente.

Com uma digressão, esclareço que a Andersen foi uma força social chamada a intervir na dinâmica dos grupos internos à empresa. Ela forneceu unificação cognitiva e legitimidade para as ações do "alto clero" (Pedroso Neto, 2011b). Por um lado, esse grupo estava longe de ser coeso e ter objetivos consensuais e unívocos. No entanto, muitas de suas ambiguidades, de suas disputas e muitos de seus dilemas foram resolvidos diante dos modelos de empresa e de trabalho apresentados pelos consultores. Por outro lado, a Andersen reiterou as justificativas e os objetivos já colocados pelo "alto clero": realizar uma reengenharia e um downsizing. Mas ela o fez "ampliando o circuito de legitimidade" (Bourdieu, 1989, p. 550) de suas ações frente ao "baixo clero", aos demais funcionários e às associações e sindicatos dos funcionários. Isso também quer dizer que, além de sua função técnica explícita, a consultoria exerceu uma função política implícita. Ela "tratou da demanda implícita" (Villette, 2003, p. 57), ou seja, realizou o modelo de consultoria "dinâmico ou maiêutico" (Villette, 2003, p. 75); uma forma de intervenção do consultor mais centrada no fornecimento de ajuda e de suporte de autolegitimação aos clientes vis-à-vis às suas pretensões, muitas vezes sujeitas às hostilidades e plenas de objetivos e resultados não aceitos socialmente.

Um dos desdobramentos dos estudos dos full time foi que a empresa tinha o que demonstrar para os possíveis compradores: o que estava realizando no momento e o que poderia realizar no futuro. Os dados dos estudos foram apresentados aos possíveis compradores que foram visitar a empresa e aos que foram visitados no Brasil e no exterior pelo "alto clero" da empresa. Nessas visitas, foram apresentados "os resultados esperados". Em síntese, foi mostrado que a empresa estava realizando uma "nova estrutura organizacional", com "reengenharia de processos" e "redução vertical e horizontal". Foi apresentado um cronograma: em 1997, seria o "início da implantação"; em 1998, seria a implantação dos "novos sistemas"; e, em 1999, a "consolidação". Cumprindo o cronograma, a empresa apresentaria: "53% menos cargos gerenciais"; "quadro de pessoal 31% menor"; "57% de melhoria do índice de consumidor por empregado"; e "incremento na taxa de remuneração".9 9 DATA ROM. Trata-se de um conjunto de dados sobre a empresa, financeiros e contábeis principalmente, resultantes de uma bateria de auditorias externas. Tais dados estavam organizados em um CD-ROM e foram produzidos para determinar o valor pelo qual a empresa iria para o leilão de privatização e para que os possíveis compradores os consultassem e, assim, conhecessem a empresa.

O trabalho de análise e redesenho dos processos de trabalho significou a produção dos meios de se realizar um potencial. Com ele, a direção da empresa obteve dados descritivos e detalhados sobre as tarefas, as técnicas, as metodologias e as práticas dos funcionários na execução das mais diferentes atividades. Assim, um dos resultados da reengenharia foi que os funcionários transformaram o savoir-faire e os conhecimentos sobre a empresa, acumulados ao longo da carreira, em dados informatizados, em normas de procedimento, em números codificados, integrados. Eles realizaram um verdadeiro processo de descrição de tempos e movimentos ao modo de Taylor (1985).

Ocorreu uma autonomização dos procedimentos de trabalho vis-à-vis a memória dos funcionários. E isso significou a possibilidade de poder trabalhá-los como um dado impessoal, abstrato. Dessa forma, os dirigentes da empresa, assim como os futuros controladores, poderiam calcular e promover os ganhos de eficiência e produtividade dos equipamentos e da força de trabalho de modo mais independente de algum tipo de negociação política com os funcionários.

Enfim, dado que todo esse trabalho foi realizado por uma consultoria de renome internacional, pode-se dizer que as realizações da reengenharia contribuíram fortemente com os objetivos e interesses do governo do Estado de valorizar a empresa e realizar sua privatização.

AS RAZÕES DAS AÇÕES DOS AGENTES EXECUTORES DA MODERNIZAÇÃO

Como os agentes do "alto clero" mobilizaram os agentes do "baixo clero" e os demais funcionários da empresa também convocados ao sabor das suas necessidades? Quando mobilizaram o "baixo clero", eles já tinham avaliado e aprovado o projeto apresentado pela Andersen e, em decorrência disso, já sabiam dos impactos que a modernização teria sobre o quadro de funcionários: um "enxugamento brutal" e uma reorganização por "processos integrados" para os futuros acionistas poderem enxugar e equalizar os salários e benefícios do mercado de trabalho interno à EC aos níveis do mercado de trabalho externo ela "levar a folha a mercado" (entrevista D).

No início, o "baixo clero" desconhecia o trabalho que iria realizar. Havia assimetria de informações entre os agentes do "alto clero" e os do "baixo clero". Esses últimos foram convidados para trabalhar na modernização, mas não sabiam quais eram seus objetivos, não sabiam o que iriam fazer na prática e nem durante quanto tempo. Após serem convidados, foram chamados e reunidos na sede da empresa para treinamentos específicos e para iniciar os trabalhos. Então, eles realizaram cursos e reuniões com os consultores, com os dirigentes da empresa e passaram a conhecer o que iriam fazer objetivamente.

Eles consideraram a convocação para ser full time como um ato de reconhecimento de capacidade profissional e, na sequência, como fator de competitividade individual. Em um contexto de transformações, com a ideia corrente e imponente de passagem de uma empresa para outra, isso significou muito. Significou uma diferenciação e uma salvaguarda contra as representações correntes que colocavam os funcionários de uma empresa estatal em uma vala comum, carregada de significados negativos. Significou também o elã para a recepção, o descobrimento e a invenção e reinvenção de representações diferenciadas: sobre eles mesmos, como pessoas e profissionais, sobre suas possibilidades para o futuro, sobre a segunda modernização, a empresa de consultoria e as mudanças prescritas relativas à empresa e ao contexto tecnológico, econômico e institucional.

Eles construíram as representações sobre o convite como algo positivo, listando um conjunto de benesses referidas ao reconhecimento individual e às possibilidades individuais relacionadas à maior competitividade futura: o reconhecimento por algum superior de ascendência moral e estatutária, no limite, o presidente da empresa; o convite para um projeto tido como relevante para a empresa; o convite para trabalhar com uma das maiores e melhores empresas de consultoria do mundo; o convite para trabalhar com os melhores profissionais da EC. Além dessas benesses, eram arroladas outras que constituíam o desencadeamento subsequente: oportunidade de crescimento profissional, de desenhar, conviver e crescer com o novo, com os novos processos, enfim, de saber, antes dos outros funcionários, como a nova empresa iria ser; e, como coroamento, de acreditar que estavam se preparando e teriam mais chances na nova empresa modernizada.

Enfim, o ato de convocação, as palestras, reuniões e cursos exclusivos para eles e o desconhecimento inicial que tinham do projeto, em grande medida, produziram um fascínio inicial, produziram uma expectativa positiva de futuro, uma valorização pessoal e uma particularização e distinção frente ao restante dos funcionários. Esse contexto e os discursos nele presentes explicam, em grande parte, por que a modernização exercia uma atração sobre os funcionários e por que os funcionários do "baixo clero" estavam instigados para a ação. Em síntese, acreditavam estar diante de um "passaporte para ficar" (entrevista E).

É importante notar e frisar que a reprodução do apregoado pelos "cardeais do alto clero" e pelos consultores não é o resultado das possibilidades intrínsecas e dos significados e valores da segunda modernização. Em grande parte, tal reprodução resulta do fato de que é, ao mesmo tempo, a introdução e a construção e ou difusão dos princípios de concorrência, competitividade e empregabilidade naquele contexto. Essas são as condições sociais de recepção das prescrições dos arautos da modernização. Dessa forma, as prescrições dos planos e projetos da modernização contavam com um forte impulso, com uma energia social para mobilizar os agentes e tornar-se realidade.

Temos, assim, uma via de recrutamento para trabalhar na modernização que pode ser chamada de via doce. Ela se estendeu também ao restante dos funcionários. Desde o momento da definição do corpo de agentes da segunda modernização, firmou-se uma fronteira entre os que participavam da modernização e os que não participavam, uma linha simbólica de separação entre os full time e o restante dos funcionários. Essa linha produziu efeitos reais e foi inventada e reinventada de diversas formas. Ela se transformou em um princípio de divisão, distinção e hierarquização que perpassou todo o corpo de funcionários, independentemente das posições na hierarquia e nas relações sociais internas e externas à empresa.

A existência de um conjunto de funcionários distintos, que trabalhavam full time na modernização, teve efeitos semelhantes aos de consagração dos rituais sociais. Dentre eles, estão as vantagens e as obrigações dos consagrados e, principalmente, as expectativas que se criam em relação a eles e as que eles criam em relação a si mesmos (Bourdieu, 1996). Um dos efeitos da consagração do conjunto dos full time foi o realinhamento com "alto clero". Esse realinhamento, essa fronteira demarcatória e suas práticas subsequentes espraiaram seus efeitos instigantes.

Mas, além da via doce de se conseguir o engajamento ativo e instigante, havia a via amarga. O engajamento se deu também por constrangimentos, especialmente por meio da "violência simbólica" (Bourdieu, 2001) marcante, que imputava aos possíveis resistentes os rótulos de "eletrossauros" e "acomodados", (entrevista F) e lembrava-lhes outras variantes do conjunto de estigmas objetivos a que estavam expostos por serem funcionários de uma empresa pública. No limite, a via amarga era apresentada por um argumento simbolicamente violento e à disposição do alto clero: "Que opção você tem?" (entrevista G).

Enfim, essa linha demarcatória e, principalmente, os pares de significados opostos que ela criou e separou, teve o efeito de produzir uma quebra das continuidades e das redes de relações sociais implícitas ou explícitas até então prevalecentes progressão na carreira, lealdades a associações, sindicatos, grupos político-partidários, colegas de geração, de local de trabalho, etc. e de abrir um novo mundo do possível, com os lugares ainda não definidos. Nesse contexto, as representações que os funcionários tinham da empresa e de si mesmos como profissionais também foram contrapostas a outras que começaram a ser veiculadas na empresa desde o início da modernização. Dessa forma, por conta do elã inicial de participação, dos efeitos da linha demarcatória e do imperativo de concorrência e competitividade, essas novas representações tenderam a ser aceitas, na medida em que fossem decifráveis. Enfim, criaram-se e difundiram-se representações de um tipo ideal de empresa e de funcionários a partir do leque de conceitos, tipos, ideias, etc. que irradiavam dos "cardeais do alto clero" e dos consultores.

O IMPACTO SOBRE AS ENTIDADES REPRESENTATIVAS DOS FUNCIONÁRIOS

Aprovado o Programa Estadual de Desesta-tização, a luta externa contra a privatização malogrou. Então, as ERF voltaram-se para a empresa, para o a segunda modernização e para outras formas de participar da preparação para a privatização. De modo geral, realizaram um misto de resistências, ambivalências e composições (Pedroso Neto, 2011a).

O Conselho de Representantes do Funcionário (CRE) participou da segunda modernização, basicamente, indicando membros para compor as células de trabalho, divulgando informações sobre os desdobramentos dos trabalhos e negociando direitos e benefícios nos momentos de planejamento e de desligamento. A participação foi uma estratégia explícita, pensada e conquistada pelo CRE. No entanto, ela foi pensada e realizada dentro de limites, isto é, não interferindo no que teria mais impacto no futuro da empresa e dos funcionários: a análise e redesenho dos processos, a formalização do savoir-faire, das técnicas de trabalho, dos dados sobre os processos, e o redimensionamento do quadro de funcionários.

Entretanto, a participação foi pensada como alternativa viável dentro de um cenário de constrangimentos e perda de alternativas medo, divisão e desengajamento dos funcionários internamente e uma situação externa de desemprego incontornável (Rodrigues; Martins 2000; Rodrigues, 2002; Pedroso Neto, 2011a) , mas com possibilidade de algumas conquistas, dado que o desespero dos funcionários teria de ser e estava sendo contornado por meio de algumas medidas de reciprocidade. Grande parte da força do CRE veio do fato de ter como substrato o Sindicato dos Eletricitários.

O Sindicato dos Eletricitários se fez presente na modernização via o CRE. Filiado à Central Única dos Trabalhadores (CUT), esse sindicato era a mais importante organização dos funcionários, a mais representativa, pois contava com 87% dos funcionários sindicalizados (89% dos funcionários em 1997). Ainda assim, ele procurou ampliar sua presença em espaços institucionais de poder e influência e, nesse sentido, enraizou sua presença no CRE, ocupando postos eletivos da base à presidência. Em grande medida, o CRE era o Sindicato dos Eletricitários.

A participação do Sindicato dos Engenheiros nas etapas de concepção e implantação da segunda modernização não ocorreu. Ele não indicou membros para atuar nas células de redesenho dos processos, não teve voz, não teve acesso a informações e não pôde decidir sobre os rumos dos redenhos dos processos. O Sindicato dos Engenheiros ficou duplamente desarmado e enfraquecido: por conta da deficiência de informação devida ao alinhamento dos seus filiados com o "alto clero" e por conta da desfiliação de membros importantes. Desde então, tornou-se incompatível a posição na hierarquia sindical com a posição no alto escalão da empresa fato corrente até o momento e, notadamente, na modernização. Com a nova incompatibilidade, esse sindicato perdeu uma poderosa fonte de informação. Progressivamente, no mesmo compasso que a modernização, ocorreu uma espécie de troca de cadeiras desfavorável ao sindicato. Alguns funcionários full time e (ou) do "alto clero" preteriram o sindicato, e outros que não se enquadravam em nenhum desses agrupamentos investiram em postos sindicais a fim de preservar o emprego. A Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, o CRE e outros sindicatos também foram usados para o mesmo fim. A Associação dos Engenheiros sofreu o mesmo tipo de baixa e de perda de fonte de informações. Ela não teve voz ativa na modernização e restou participando como agente colaborador com o programa de treinamento dos funcionários.

Enfim, a privatização, muito mais iminente e incontestável a partir de meados de 1996, e o início da segunda modernização, com sua força de diferenciação e hierarquização e com seu poder de gravitação, implicaram no enfraquecimento das "defesas do mundo do trabalho" (Boltanski; Chiapello, 1999, p. 344-419) perda de poder de mobilização e de acesso a informações. Em grande medida, as organizações sindicais substituíram uma posição combativa com mobilização dos trabalhadores e greves objetivando reposição salarial e conquista de direitos e benefícios por uma tomada de posição semelhante à dos operários do ABC em situação parecida; de "cooperação conflitiva" e de "realismo defensivo" (Rodrigues, 2000, p. 154-155), ou seja, de negociações visando à manutenção de conquistas anteriores.

IMPACTO SOBRE O "ALTO CLERO"

Em um momento mais avançado da segunda modernização, seus agentes perceberam que tinham desenhado uma morfologia futura da empresa. Então, perceberam que toda a indefinição em relação ao futuro aplicava-se a eles também. Se, até aquele momento, ser um full time representava um grande trunfo de competitividade, após os primeiros contornos da morfologia da nova empresa, o feitiço, que parecia se dirigir aos "incompetentes", "apadrinhados", "acomodados", etc., virou-se contra os feiticeiros. Após a reengenharia, os números não os diferenciavam positivamente do restante dos funcionários. Ao contrário, quando o salário individual versus a contribuição individual à margem de lucro, conforme se acreditava, fosse fazer a diferença na rentabilidade da empresa, eles seriam os que teriam menores vantagens relativas.

Naquele momento, o redesenho dos processos significou muito mais do que a melhora da produtividade e da eficiência financeira, econômica e técnica da empresa. Significou que foi desfeito um arranjo institucional que os sustentava, ou seja, alguns dos elementos do mundo dos engenheiros que foram instituídos desde os anos 70: a predominância das diretrizes técnicas sobre as diretrizes comerciais e financeiras, como forma de perceber e orientar a alocação dos recursos; o desenvolvimento da estrutura organizacional em função da internalização de diversas atividades construção, manutenção, atendimento aos consumidores, treinamento dos funcionários, ampliação das atividades e dos serviços , a ordem e a autoridade hierárquica, o que também significava a existência de regras para a previsibilidade, a continuidade e progressão na carreira e nos salários e benefícios correlatos; a quebra das solidariedades que constituíam agrupamentos internos profissionais, sindicais e políticos ; além de um mercado de trabalho interno institucionalizado.

Do ponto de vista prático, perceberam que, daquele momento em diante, quase nada era possível: não era mais possível agarrar-se a um político influente; não era mais possível agarrar-se às reciprocidades e lealdades de algum grupo interno à empresa político, profissional, sindical, etc. ; não era mais possível agarrar-se às regras explícitas ou implícitas de ascensão na hierarquia da empresa; não era mais possível contar com oportunidades de melhores cargos e salários em um mercado de trabalho interno; não era mais possível agarrar-se aos trunfos que, desde então, estavam sendo desvalorizados e se apresentavam com ares de que pertenciam ao passado senioridade, saber técnico acumulado internamente, conhecimento de processos, áreas e órgãos da estrutura organizacional que não existiriam mais, etc.

Naquele momento, os agentes da modernização já tinham detalhado e redesenhado muitos processos e tinham em vista um modelo de estrutura organizacional já experimentado e legitimado internacionalmente, segundo acreditavam. Eles se deram conta de que, pelos dados dos estudos, pelo dimensionamento das equipes, estavam ao léu dos desdobramentos de seus trabalhos, que não podiam controlar ou mesmo prever. Os full time perceberam que a reengenharia e o downsizing que desenharam atingiriam a todos, especialmente eles, os "maiores salários" (entrevista H). Mas já era tarde. O gênio já estava fora da lâmpada. O processo já tinha sido deflagrado. Em grande medida, já tinham formalizado o savoir-faire acumulado ao longo da carreira. E tudo estava à disposição dos futuros acionistas e seus consultores.

CONCLUSÃO

Objetivamente, os arautos da modernização não tinham o poder e os meios para realizar as mudanças: não tinham as informações de dentro da empresa e os modelos norteadores que vinham de fora da empresa, ambos impreteríveis para a análise e o redesenho dos processos; por eles mesmos, não compunham a força de trabalho necessária para isso; e tinham de enfrentar as resistências dos sindicatos e das associações dos funcionários. No entanto, com a composição de um grupo de funcionários trabalhando exclusivamente na modernização, eles transcenderam seus limites políticos e operacionais. Em grande medida, a dinâmica dos funcionários em torno da modernização instituiu, à surdina, o imperativo do princípio de competição entre eles.

Desse modo, os arautos da modernização incorporaram e repreenderam as resistências, privaram os sindicatos e as associações dos funcionários de informações e de quadros. E assim, dado que todo o trabalho foi realizado conjuntamente com uma empresa de consultoria de renome internacional, pode-se dizer que, em alguma medida, as realizações da reengenharia contribuíram harmoniosamente com os objetivos e interesses do governo do Estado de valorizar e privatizar a empresa.

Os resultados da mudança organizacional deflagrada produziram consequências imprevistas, e muitas vezes não-desejadas nem mesmo pelos arautos da modernização. Algumas ideias, algumas práticas e seus desdobramentos adquiriram força e independência dos seus criadores. Em grande medida, eles deixaram de herança para os futuros controladores da empresa a formalização e a deslegitimação de seus savoir-faire; deixaram os dados, os estudos e as propostas de como seria viável técnica e economicamente a reorganização dos processos e a montagem de uma nova estrutura organizacional. E, muito mais importante, deixaram em ebulição as condições sociais e políticas que viabilizavam um grande leque de mudanças que estivessem sob o rótulo de modernização: os funcionários em um clima de rivalidade e disputa interna sem precedente e o enfraquecimento das "defesas do mundo do trabalho" (Boltanski; Chiapello, 1999, p. 344-419).

Enfim, a partir do estudo de um caso que é uma variante dos casos semelhantes, procurei compreender e revelar o que está em jogo em processos apresentados simplesmente como operações de privatização, de mudanças e reorganizações técnicas, econômicas, organizacionais, etc., mas que, sociologicamente, são processos contínuos de relações de força ou de "reestruturação social" (Pialoux, 1996, p. 19).

Recebido para publicação em 15 de janeiro de 2012

Aceito em 07 de março de 2012

Antonio José Pedroso Neto - Doutor em ciências sociais. Professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional da Universidade Federal do Tocantins . Pesquisador do CNPq (Bolsa de Produtividade em Pesquisa). Pesquisador do NESEFI (Núcleo de Sociologia Econômica e das Finanças). Tem experiência de pesquisa em sociologia das organizações e da economia. Dessa experiência resultaram publicações sobre marketing de rede, privatização, mudanças organizacionais, consultorias e sindicalismo. Dentre elas, destaca-se o artigo sobre a construção do mercado em rede. A dinâmica do marketing de rede: relações sociais e expectativas de um novo estilo de vida. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, 2010. Atualmente, desenvolve uma pesquisa sobre o jornalismo econômico brasileiro, projeto da bolsa de produtividade, e coordena uma pesquisa sobre os fatores sociais, políticos e culturais que regem o mercado imobiliário em Palmas, TO.

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  • ZILBOVICIUS, Mauro. Modelos para a produção, produção de modelos: gêneses, lógica e difusão do modelo japonês da produção. São Paulo: Fapesp, 1999.
  • 1
    Agradeço à CAPES pelo financiamento da pesquisa; aos colegas do NESEFI pelas discussões sobre a pesquisa e sobre as versões anteriores do texto; aos colegas do grupo de sociologia econômica da Sociedade Brasileira de Sociologia pelos comentários críticos à versão anterior do texto; e aos pareceristas anônimos pelas contribuições precisas e construtivas.
  • 2
    As empresas cindiram suas atividades por área geração, transmissão e distribuição , reorganizaram, extinguiram e criaram departamentos, divisões, setores, etc. E, ao mesmo tempo, introduziram tecnologias de administração, informação, telecomunicação, equipamentos , redistribuíram e desligaram o pessoal, terceirizaram atividades, etc. Em síntese, passaram de uma "estrutura funcional-unitária" para uma "estrutura multidivisional" (Fligstein, 1993).
  • 3
    O presente artigo tem como base uma tese de doutorado: Pedroso Neto (2005). As principais fontes de dados foram: jornal da empresa; documentos; 41 entrevistas; 30 questionários; boletins sindicais; RAIS (Relação Anual de Informações Sociais do Ministério do Trabalho); DATA ROM conjunto de dados resultantes de uma bateria de auditorias externas que visavam a produzir dados para determinar o valor pelo qual a empresa iria para o leilão de privatização.
  • 4
    Para acessar dados, comprometi-me a não revelar o nome da empresa.
  • 5
    Indivíduos em posições de poder: os representantes da SEESP, o presidente e os diretores da EC. Funcionários de carreira: assessores, gerentes, chefes, coordenadores, engenheiros, psicólogos, advogados, etc. Representantes de sindicatos, associações e conselhos.
  • 6
    Trata-se de um conjunto de funcionários do alto escalão presidente, diretores, gerentes regionais e os respectivos assessores que empreenderam a modernização desde o início, mais o Secretário de Energia do Estado e o Secretário de Energia Adjunto. Eles estavam presentes nos postos de direção e coordenação da primeira modernização e migraram para postos homólogos na segunda modernização. Cerca de 20 a 30 agentes. Uso o termo alto clero apenas para diferenciá-los; seja do conjunto de funcionários do alto escalão, como eles, que não estavam participando e conduzindo a modernização, seja dos funcionários de menor escalão que participaram da modernização executando as tarefas operacionais (nota de rodapé número 8). Os agentes do alto clero tinham poder de comando e coordenação na empresa, naquele momento, que iam além das atribuições estatutárias em nenhum momento da pesquisa empírica me deparei com o termo alto clero.
  • 7
    Sindicato dos Eletricitários, Sindicato dos Engenheiros, Associação dos Engenheiros e Conselho de Representantes dos Empregados.
  • 8
    Gerentes, engenheiros, administradores, contadores, técnicos, etc. que fizeram parte das equipes de levantamento de dados, de detalhamento e redesenho dos processos durante a modernização (nota de rodapé número 6).
  • 9
    DATA ROM. Trata-se de um conjunto de dados sobre a empresa, financeiros e contábeis principalmente, resultantes de uma bateria de auditorias externas. Tais dados estavam organizados em um CD-ROM e foram produzidos para determinar o valor pelo qual a empresa iria para o leilão de privatização e para que os possíveis compradores os consultassem e, assim, conhecessem a empresa.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Fev 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      15 Jan 2012
    • Aceito
      07 Mar 2012
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