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COMPARANDO POLÍTICAS SOCIAIS EM GOVERNOS DE ESQUERDA

COMPARING SOCIAL POLICIES IN LEFT GOVERNMENTS

COMPARAISON DES POLITIQUES SOCIALES DANS LES GOUVERNEMENTS DE GAUCHE

Resumos

Este trabalho compara os governos de esquerda de Uruguai, Chile e Argentina tanto entre eles quanto com os governos anteriores à entrada da esquerda nos executivos nacionais. A análise engloba as políticas de educação, saúde e programas de transferência condicionada de renda. Essas áreas foram escolhidas porque apresentam legados distintos entre si, mas similares nos três países. A metodologia utilizada é a análise comparada cross-case e within-case. Os resultados mostram que as esquerdas do Uruguai e da Argentina se diferenciam das administrações anteriores. Já no Chile, ela não se diferencia dos governos anteriores no mesmo grau que seus vizinhos na saúde e na educação, apesar de também institucionalizar a transferência de renda como forma de enfrentamento da pobreza. Ou seja, os governos de esquerda, de forma geral, apresentam esforços distintos dos seus antecessores, mas diferem entre si nos graus em que isso ocorre refletindo o perfil de cada país de esquerda nos seus respectivos parlamentos e de cada ator envolvido.

Políticas sociais; América Latina; Governos de esquerda; Saúde; Educação; Transferência de renda


This paper compares the leftist governments of Uruguay, Chile, and Argentina, both among themselves and with the administrations before left’s entry into national executives. The analysis encompasses education, health, and conditional cash transfer programs. These areas were selected because they have distinct legacies among themselves, but similar in all three countries. The methodology used is cross-case and within-case comparative analysis. The results show that the Uruguay and Argentina left’s administrations differ from previous administrations. In Chile, however, it does not differ from previous governments to the same extent as its neighbors in health and education, although it also institutionalizes cash transfer as a way of coping with poverty. That is, leftist governments, in general, present distinct efforts from their predecessors, but differ in the degree to which this occurs reflecting the profile of each leftist country in their respective parliaments and of each actor involved.

Social Policies; Latin America; Left governments; Helath; Education; Conditional Cash Transfer


Ce travail compare les gouvernements de gauche d’Uruguay, du Chili et de l’Argentine entre eux mais également avec les gouvernements précédents l’entrée de la gauche dans les cadres éxecutifs nationaux. L’analyse englobe les programmes d’éducation, de santé et de transferts conditionneés de revenus. Ces domaines ont été selectionnés parce qu’ils ont des héritages distincts entre eux, mais similaires dans les trois pays. La méthodologie utilisée est l’analyse comparative «cross-case « et «within-case». Les résultats montrent que les gauches de l’Uruguay et d l’Argentine sont differéntes des administrations précédentes. Au Chili, toutefois, il ne diffère pas des gouvernements précédents dans la même mésure que ses voisins dans les domaines de la santé et de l’éducation, bien qu’il institutionnalise également le transfert de revenus comme une façon de faire face à la pauvreté. C’est à dire, les gouvernements de gauche, en général, présentent des efforts différents de leurs prédécesseurs, mais diffèrent par leurs degrés, reflétant le profil de chaque pays de gauche dans ses parlements respectifs et de chaque acteur impliqué.

Politiques sociales; Amérique Latine; Gouvernements de Gauche; Santé; Éducation; Transfert de revenu


INTRODUÇÃO

Os regimes políticos na América Latina se reconfiguraram a partir dos anos 2000 em função da chamada “onda rosa”1 1 Fenômeno que reflete o resultado das eleições e a permanência de governos de esquerda em pelo menos dois terços dos países da região. . Entretanto, apesar de representarem a ascensão de forças políticas à esquerda, a literatura mostra a variedade dessa “esquerda” latino-americana e a contestação dessa classificação, em alguns casos. No início dessa “onda”, pesquisadores classificaram essa esquerda latino-americana como right ou wrong (Cf. Castañeda, 2006CASTAÑEDA, J. G. Latin America’s left turn. Foreign Aff, [s.l], v. 85, p. 28, 2006.); moderada ou contestatória (Cf. Weyland; Madrid; Hunter, 2010); social democrata e populista (Cf. Lynch, 2007LYNCH, N. What the “left” means in Latin American now. Constellations, [s.l], v. 14, n. 3, p. 373-383, 2007.);e até moderada e radical (Cf. Weyland, 2009WEYLAND, K. The rise of Latin America’s two lefts: Insights from rentier state theory. Comparative Politics, [s.l], v. 41, n. 2, p. 145-164, 2009.). Essas classificações simplificam a realidade e, portanto, são incapazes de dar conta da variedade de orientação desses governos. Nós consideramos que essas esquerdas se diferenciam substantivamente entre si, e isso se reflete no desenvolvimento de suas políticas. Neste texto, partimos da tipologia de Levitsky e Roberts (2011)LEVITSKY, S.; ROBERTS, K. M. Democracy, Development and the left. In: LEVITSKY, S.; ROBERTS, K. M. (Eds.) The resurgence of the Latin American left. Baltimore: John Hopkins University Press, 2011. p. 399-459., que propõem uma classificação baseada em seu nível de institucionalização e do lócus da autoridade política (mais concentrada na pessoa eleita ou mais dispersa institucionalmente), mostrando os tipos distintos de esquerda. Mesmo considerando uma diversidade interna entre o que se classifica como esquerda em cada país, aqui ela faz jus ao adjetivo “rosa” da referida onda, numa clara distinção com a esquerda vermelha revolucionária da década de 70, agora institucionalizada e menos radical em suas propostas. Mas o que chamamos de governos de esquerda aqui deve ser entendido, de forma geral, por governos que priorizam princípios universalistas e redistributivos em função de um viés mais igualitarista, em comparação com os princípios neoliberais que matizaram os governos conservadores da década de 90. Esses governos se elegeram em um cenário de confrontação com os resultados negativos de políticas neoliberais dos anos 90, um ambiente propício para novas e diferentes agendas adotadas por meio de reformas nas políticas sociais. A partir do início do século XXI, os novos governos orientaram-se para a recuperação da intervenção estatal e a promoção ou revisão de reformas setoriais.

Este trabalho analisa o quanto as reformas sociais e os resultados alcançados em políticas sociais por alguns governos de esquerda se diferenciam entre si, ou quando comparadas à ação dos governos conservadores que os precederam em seus próprios países. A pergunta central é simples: o que se pode observar na trajetória de governos de esquerda nesses países que permite diferenciar suas políticas daquelas praticadas pelos governos que as precederam ou de seus países vizinhos? Não é intenção deste artigo realizar uma análise sistemática do redesenho institucional dessas políticas, mas sim uma comparação entre as tendências de gastos sociais dos governos de esquerda de cada país com aqueles das administrações mais conservadoras que os precederam, bem como com os dos governos de seus vizinhos. Para além dos gastos, são analisadas as propostas para cada política nos diferentes governos.

O desenho de pesquisa, portanto, comporta tanto uma análise cross-cases como uma within-case, o que garante maior variação no tempo e no espaço. A análise adota uma perspectiva comparada em sua metodologia e se restringe aos casos de Argentina, Chile e Uruguai. De forma a ter uma visão mais ampla dos sistemas de proteção social, serão analisadas, para cada país, as áreas de educação e saúde bem como os programas de transferência condicionada de renda (PTCR). Essas áreas foram escolhidas pelo fato de apresentarem trajetórias distintas entre si, mas similares nos três países. Ou seja, esses países apresentam características comuns que, por não variarem, ou por variarem pouco, funcionam como controle: podem ser eliminadas como fatores causais das diferenças encontradas. Por exemplo, em todos eles, a esquerda foi oposição à ditadura, ou seja, não tratamos de organizações partidárias recentes advindas de movimentos sociais e políticos novos. Em todos os casos, tratamos de sistemas estabelecidos, com estrutura institucionalizada e com identidade própria e com o eleitorado (Cf. Levitsky; Roberts, 2011LEVITSKY, S.; ROBERTS, K. M. Democracy, Development and the left. In: LEVITSKY, S.; ROBERTS, K. M. (Eds.) The resurgence of the Latin American left. Baltimore: John Hopkins University Press, 2011. p. 399-459.). Os três países também se encontram dentro de sistemas políticos estáveis e com a economia mais desenvolvida do que a média na região, o que elimina também explicações advindas das variações na capacidade fiscal, e isso também faz parte do desenho de pesquisa aqui proposto.

Do ponto de vista teórico, a análise se baseia na teoria de recursos de poder que visa a explicar os diferentes padrões de estado de bem estar social nos países industrializados (Esping-Andersen, 1985ESPING-ANDERSEN, G. Class Alliances in the development of Scandinavian social democracy. In: Politics Against Markets: the social democratic road to power. Princeton, N.J.: Princeton University Press, 1985. p. 71-115., 1991; Korpi, 1983KORPI, W. The democratic class struggle. London: Routledge, 1983.). De acordo com essa teoria, o welfare state não resulta de um “dever ser” em cada país, mas tanto a sua emergência quanto o seu desenvolvimento são pautados pelas condições objetivas das matrizes de poder de cada país e de como a esquerda estava organizada dentro dessa matriz. Assim, é importante analisar não só a capacidade de mobilização da esquerda em cada país, mas como o sistema político permite a ela se organizar dentro do parlamento. Assim, ao compararmos esses países em suas políticas sociais, tendo a noção de governo de esquerda como fator explicativo central, é necessário analisar essa configuração dentro do parlamento e do sistema político, e saber qual o papel dos atores políticos centrais como, por exemplo, os presidentes. As coalizões2 2 A formação de alianças ou coalizões partidárias se constitui como uma estratégia institucional para a aprovação das pautas governamentais, visando a reduzir o número de atores com poder de veto. Esse mecanismo institucional permite alcançar maiorias legislativas, e, assim, mantém-se um governo mais estável e coeso, condição propícia para a maximização da agenda presidencial. governamentais à esquerda propiciam reformas mais redistributivas e universalistas devido às pautas defendidas nos projetos políticos e às mudanças incrementais que já foram realizadas por esses partidos no contexto da América Latina, conforme apontaremos no decorrer deste artigo. A presença de esquerda no governo e no parlamento afeta o tipo de agenda implementada. Isso posto, nos países em que o nível de coalizão interna entre a esquerda é mais débil, as reformas serão menos redistributivas, ou dependerão mais da força do presidente? A Argentina é um país onde o poder do presidente é mais concentrado na figura carismática do líder, diferentemente da cultura política do Chile e do Uruguai, onde a concentração da autoridade é dispersa no arcabouço institucional, não se baseando especificamente no carisma (Cf. Levitsky; Roberts, 2011LEVITSKY, S.; ROBERTS, K. M. Democracy, Development and the left. In: LEVITSKY, S.; ROBERTS, K. M. (Eds.) The resurgence of the Latin American left. Baltimore: John Hopkins University Press, 2011. p. 399-459.). Assim, questiona-se o quanto essa dimensão pode ser importante para explicar as decisões tomadas em relação à orientação das políticas sociais. Como realizamos uma análise longitudinal entre os governos aqui identificados como de esquerda, em uma perspectiva comparada com os seus antecessores, que se encontram mais à direita do espectro ideológico (por isso, denominados de conservadores), não é possível nos furtar à referência da importância teórica do legado. A teoria de recursos de poder também guarda lugar à hipótese de que, o que se faz em momento t - 1 determina o que pode ser feito no momento t (Pierson, 2000PIERSON, P. Increasing returns, path dependence, and study of Politics. American Political Sicence Review, Washington, v. 94, n. 2, 251-267, 2000., 2004PIERSON, P. Politics in time: history, institutions and social analysis. Prince-ton: Princeton University Press, 2004.). Dessa forma, quando o texto se refere ao legado, é a essa idéia que se refere. Argumenta-se que esses fatores não agem isoladamente, mas que se apresentam como configurações causais que permitem explicar diferentes agendas e resultados encontrados.

Para alcançar tais objetivos, o trabalho se divide em quatro partes, incluindo esta introdução. A primeira parte traz uma breve discussão sobre as configurações político-institucionais dos países que podem influenciar os resultados encontrados em relação às políticas, objetivando discutir as distinções entre os países. Segue-se uma análise específica do comportamento de cada arena social de políticas (saúde, educação e transferência de renda), numa perspectiva comparada. Por fim, o artigo faz algumas considerações de uma perspectiva comparada.

COALIZÕES DE GOVERNO E PRESENÇA DA ESQUERDA NO CENÁRIO POLÍTICO

A Argentina, com uma história política recheada de golpes e contragolpes, é o primeiro dos três países a assistir à queda da ditadura militar em 1983. Apesar de ter sido o menor período ditatorial – apenas sete anos –, estima-se ter sido a mais sanguinária da região. No Uruguai, a ditadura vai de 1973 até 1985 e, no Chile, a ditadura militar de direita durou de 1973 até 1990, cinco anos mais que no Uruguai. Ou seja, esses países acumulam, no presente, sete a oito administrações democráticas. A consolidação da democracia favoreceu a competição eleitoral na arena política e o fortalecimento de sistemas partidários.

No Uruguai, o partido Frente Ampla (FA) foi criado em 1971 e estabeleceu-se como oposição à ditadura militar, atuando ativamente na construção de diálogos com os militares para a abertura democrática. Segundo Ponce (2014)PONCE, J. I. Adaptación e inclusión de la Izquierda revolucionaria en las transiciones democráticas de Uruguay, Chile y Argentina. Una mirada desde el desempeño electoral, 1983-2009. Revista Izquierdas, Chile, n. 18, 2014., isso fez com que tal coalizão não fosse excluída do sistema político no processo de democratização. Antes de o FA chegar à presidência, existiram quatro administrações do Partido Colorado (PC) e do Partido Nacional (PN), num quadro que pode ser caracterizado como multipartidário, na medida em que esses três partidos (PC, PN e FA) tinham altos índices de votação para a presidência e para o Legislativo.

Os partidos uruguaios à esquerda foram os primeiros da América Latina a abandonar o discurso marxista em favor de um pragmatismo ideológico que redefiniu, ali, a competição política (Cf. Albala, 2009ALBALA, A. Coaliciones gubernamentales y régimen presidencial: incidencia sobre la estabilidad política, el caso del Cono Sur (1983-2005). Documentos CIDOB. América Latina, n. 29, p. 1, 2009.; Lanzaro, 2004LANZARO, J. L. La reforma educativa en Uruguay (1995-2000): virtudes y problemas de una iniciativa heterodoxa: políticas sociales. Santiago, Chile: CEPAL, 2004. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?hl=pt-BR&lr=&id=QJ5RDuSOUoQC&oi=fnd&pg=PA3&dq=lanzaro+jorge&ots=i4hkJVyeUH&sig=nRRaAQHrV5e_yelhRLb1zTDqqkI>. Acesso em: 16 July 2015.
https://books.google.com.br/books?hl=pt-...
). Nesse processo, foram observadas a saída dos representantes menos à esquerda da coalizão e a entrada dos antigos “Tupamaros” (Cf. Garcé, 2011GARCÉ, A. El Frente Amplio como partido de gobierno. Dossier Uruguay, p. 122, 2011.; Ponce, 2014PONCE, J. I. Adaptación e inclusión de la Izquierda revolucionaria en las transiciones democráticas de Uruguay, Chile y Argentina. Una mirada desde el desempeño electoral, 1983-2009. Revista Izquierdas, Chile, n. 18, 2014.). Esse processo foi reconfigurando o perfil da coalizão, tanto externa quanto internamente. O sistema partidário transformou-se num bipartidarismo com clareza ideológica das propostas. Esse percurso refletiu-se nas urnas e, consequentemente, no número de cadeiras na Câmara Baixa daquele país, até que, em 2004, o FA alcançou maioria absoluta (53,54%) das cadeiras. Segundo Ponce (idem), observa-se, no Uruguai, um crescente desempenho eleitoral e uma forte coalizão entre as coletividades à esquerda do espectro ideológico.

Portanto, ao contrário da força da conjuntura no caso da Argentina, o êxito da eleição de Vásquez, em 2004, e de seu sucessor Mujica, em 2009, não foi algo conjuntural (Cf. Ponce, 2014PONCE, J. I. Adaptación e inclusión de la Izquierda revolucionaria en las transiciones democráticas de Uruguay, Chile y Argentina. Una mirada desde el desempeño electoral, 1983-2009. Revista Izquierdas, Chile, n. 18, 2014.). O FA obrigou colorados e nacionais a se articularem de tal forma, que transformou o sistema partidário em um bipartidarismo (Cf. Albala, 2009ALBALA, A. Coaliciones gubernamentales y régimen presidencial: incidencia sobre la estabilidad política, el caso del Cono Sur (1983-2005). Documentos CIDOB. América Latina, n. 29, p. 1, 2009.; Ponce, 2014PONCE, J. I. Adaptación e inclusión de la Izquierda revolucionaria en las transiciones democráticas de Uruguay, Chile y Argentina. Una mirada desde el desempeño electoral, 1983-2009. Revista Izquierdas, Chile, n. 18, 2014.). Soma-se a isso o fato de que, quando consideramos o lócus do poder presidencial nesse país, ele não está concentrado especificamente na figura do presidente, mas disperso em um arcabouço institucional de poder. Isso reforça um tipo de configuração para a trajetória das políticas uruguaias, que é substantivamente distinta das dos demais.

Essa trajetória contrasta com a da Argentina. Mesmo com o fim da ditadura, houve a continuidade do Partido Justicialista no poder, em seus vários matizes ideológicos. O período democrático iniciou-se com um cenário bipartidário, com a presença da União Cívica Radical (UCR) e do Partido Justicialista (PJ), o que Chasquetti denomina, na Argentina, de multipartidarismo moderado. Houve também quatro administrações federais no regime democrático, antes que um governante classificado como de esquerda chegasse à presidência.

Com a crise de 2001 na Argentina, quem mais capitalizou foi Nestor Kirchner, um justicialista mais à esquerda (Cf. Chasquetti, 2008CHASQUETTI, D. Democracia, presidencialismo y partidos políticos en América Latina: evaluando la” difícil combinación”. [s.l.]: Instituto de Ciencia Política, Facultad de Ciencias Sociales, Universidad de la República, 2008.). Diferentemente do que se observou no Uruguai, nesse percurso, o Partido Comunista se manteve sempre marginal, com uma votação fraca para a presidência e tendo sua representatividade política praticamente eliminada no novo milênio. Ou seja, a esquerda, no cenário político argentino, é menos representativa do que a média dos três países, e é também muito débil o nível de coalizão entre suas coletividades.

De acordo com Albala (2009)ALBALA, A. Coaliciones gubernamentales y régimen presidencial: incidencia sobre la estabilidad política, el caso del Cono Sur (1983-2005). Documentos CIDOB. América Latina, n. 29, p. 1, 2009., a governabilidade na Argentina nunca se deu por meio da criação de consensos e da negociação, mas mediante o conflito e com base numa autoridade personalista. Os partidos se utilizam de estratégias clientelistas, de patronagem e de reforço de figuras políticas proeminentes e carismáticas, o que enfraquece a confiança nos partidos políticos e leva a uma falta de clareza sobre quem é quem no espectro ideológico. Segundo o autor, observam-se, nesses partidos, tanto a defesa clara da intervenção estatal (típica de um keynesianismo) quanto a liberalização da economia e a privatização das grandes companhias (típicas dos postulados neoliberais). Tem-se o exemplo claro do PJ que, no mandato de Menem, defendeu e implementou uma forte liberalização econômica. Em seguida, Néstor Kirchner, do mesmo partido, se elegeu com um discurso de esquerda. Isso explica parcialmente a dificuldade de a Ciência Política latino-americana posicionar o justicialismo argentino no espectro ideológico. Esses dois casos deixam clara a impossibilidade de se tratar da esquerda latino-americana como um fenômeno homogêneo.

O Chile foi o país que mais demorou a iniciar o regime democrático, e a coalizão de governo, a Concertación, opera com uma variação interna entre esquerda e direita mas, pelo tempo no governo, mostra a sua força. A Concertación foi formada muito mais pela necessidade de união de forças contra a ditadura, contra os princípios de um regime autoritário, do que por uma identidade interna de projetos políticos. Internamente, os partidos possuem estruturas e institucionalidades próprias, com vieses ideológicos distintos. Fato é que nenhum partido, desde então, contou com maioria do eleitorado, necessitando sempre da formação de coalizão (Cf. Albala, 2009ALBALA, A. Coaliciones gubernamentales y régimen presidencial: incidencia sobre la estabilidad política, el caso del Cono Sur (1983-2005). Documentos CIDOB. América Latina, n. 29, p. 1, 2009.; Garretón, 2000GARRETÓN, M. A. La cuestión del régimen de gobierno en el Chile de hoy. In: LANZARO, J. L. (Ed.) Tipos de presidencialismo y modos de gobierno en América Latina. Buenos Aires: CLACSO, 2000. p. 189-202.).

A esquerda do Chile procedeu a uma adaptação mais lenta do que no Uruguai, mas foi menos marginal do que na Argentina. Por exemplo, o Partido Comunista, no Chile, se fortaleceu até efetivamente ter votos suficientes para conseguir três cadeiras no parlamento, em 2009, passando a ter algum peso dentro da coligação governamental, inversamente ao que ocorreu na Argentina. No entanto, apesar dessa presença, no Chile não ocorre a força relativa e a independência da figura do presidente, como em seu vizinho.

Por fim, cabe explicitar que, mesmo que o escopo e a proposta deste artigo não abranjam o nível de sindicalização dos trabalhadores, nesses governos importa ressaltar que, até 1995, os sindicatos eram muito fracos no Chile e no Uruguai, com cerca de 13% e 12% dos trabalhadores assalariados sindicalizados, respectivamente. No entanto, é possível observar como a Concertación (Chile) manteve esses atores políticos afastados do Congresso, enquanto o Frente Ampla (Uruguai) se aliou aos sindicatos e criou estratégias claras de fortalecimento do trabalho organizado. A Argentina apresenta um quadro distinto pois, em 2001, tinha 35% de sindicalizados, os quais, mesmo com divisões internas, sempre formaram alianças com o peronismo (Cf. Huber; Stephens, 2012HUBER, E.; STEPHENS, J. D. Democracy and the left: social policy and inequality in Latin America. Chicago: The University of Chicago Press, 2012.). Essas informações, mesmo que concisas, nos dão algumas pistas que podem ajudar a entender melhor as políticas empreendidas em cada país.

Até aqui, não estamos trazendo nada novo. Novo é tentar atribuir capacidade explicativa a tais fatores quando nos referimos às reformas empreendidas nesses países no período analisado.

VARIAÇÕES EM POLÍTICAS DE SAÚDE: PARTINDO DE UM LEGADO PRECÁRIO

Na década de 90, as políticas de saúde, na América Latina, sofreram forte impacto das reformas estruturais neoliberais. As diretrizes dessas reformas propunham a desregulação do setor e sua abertura ao capital privado, nacional e estrangeiro, o que, somado à prévia estrutura corporativista, contribuiu para a conformação ou afirmação do mercado privado de saúde. A recomendação era transferir aos usuários os custos em saúde, ofertar seguros para os principais riscos, utiliza, de forma eficaz, os recursos privados e descentralizar os serviços públicos (Cf. Fidalgo, 2008FIDALGO, M. M. Los procesos de reforma neoliberal en el sector salud enargentina. In:FIDALGO, M. M. Adiós al derecho a la salud. [s.l.]: Espacio, 2008.). Em suma, a redefinição do papel do Estado em favor de lógicas próprias do mercado se refletiram fortemente no setor. Nos governos mais à esquerda que se seguiram a essas reformas (já nos anos 2000), há claramente uma recuperação do papel do Estado no campo da saúde, como será visto na análise a seguir.

Com relação à proporção do gasto público em saúde como porcentagem do PIB, observa-se, nos três países, um aumento dessa participação durante a vigência dos governos de esquerda. Isso significa uma diminuição na proporção do gasto privado em saúde e sugere uma tendência de inversão, no sentido de maior comprometimento dos governos com políticas universais dirigidas à redução nas desigualdades de acesso e bem-estar. Esse aumento ocorreu de forma mais intensa no Uruguai e na Argentina, não sendo muito significativo no Chile (Tabela 1). O aumento dos gastos com a saúde pública nos dois primeiros é particularmente importante porque, nos governos anteriores à esquerda, observou-se um decréscimo dessa participação. Por outro lado, também é importante o gasto público em saúde, composto pelas fontes fiscais e contribuições para a seguridade social, como proporção do gasto total em saúde. Nos três países houve um incremento desse gasto nos governos de esquerda, superior ao ocorrido nos governos anteriores (Tabela 2).

Tabela 1
– Gasto em saúde como proporção do PIB
Tabela 2
– Gasto público em saúde como proporção do gasto total em saúde

A Argentina se destaca dos demais países não só pelo fato de o gasto público em saúde ser de maior grandeza, mas também porque esse gasto sofrera um decréscimo entre 1995 e 2003, provavelmente em consequência da crise econômica vivida por aquele país, com seu auge entre 2001 e 2003. O aumento no gasto público em saúde implica uma diminuição proporcional no gasto privado em saúde, o que significa aumento do uso dos serviços públicos, independentemente da capacidade de pagamento pelos usuários. O gasto público em saúde, como proporção do gasto total em saúde, é um indicador importante, pois expressa um esforço governamental em relação à política, na medida em que retira toda a participação privada do cálculo. E não restam dúvidas do maior esforço do governo argentino, com um aumento de 17,6 pontos percentuais após os governos de esquerda, enquanto, no Chile, essa melhora foi de 7,1 pontos. O Chile também manteve o gasto público em saúde proporcionalmente menor em relação ao gasto privado. Tanto na Argentina quanto no Uruguai, a estrutura do gasto público em saúde se alterou nos períodos em pauta: na Argentina, passa de 51,7% em 2003 para 69,3 em 2012; no Uruguai, ele sai de 50,5 para alcançar 64,5%3 3 De acordo com Antía (2013), 50,8% da população, em 2005, estava coberta pelo subsistema público; 43,6% por alguma IAMC e 2,1% por diferentes seguros privados. Fuentes (2010) informa que, em 2006, o subsistema público atendia 38,4% da população de Montevidéu, e o subsistema privado, 57,6%. No interior do país, a situação se invertia, com 59,2% das pessoas atendidas pelo subsistema público e 38,3% nas instituições privadas, o que caracteriza as desigualdades existentes, à época, no acesso ao sistema de saúde do país. no mesmo período. Entendemos que o esforço nas políticas de saúde, na Argentina, é superior ao do Chile, devido mais à forte presença de líderes carismáticos do que às coligações e coletividades de esquerda.

Os dados acima sobre desempenho em saúde, analisados com base na participação dos gastos em saúde no PIB, permitem afirmar que os três governos de esquerda, nesses países, se destacaram em relação a seus predecessores. Isso também pode ser observado pelo gasto per capita em saúde, analisado longitudinalmente. Na Argentina, há uma queda substantiva no gasto per capita em saúde na segunda metade da década de 90, já mostrando a crise que se anunciava. No entanto, é inegável o esforço de recuperação dos governos dos Kirchner, saindo de 280 dólares per capita em 2001 para 1.074 em 2010 (com um aumento de cerca de 383%). Esse cenário foi ainda mais intenso no Uruguai, tanto da queda desse gasto no contexto do governo conservador (de 934 a 351 dólares per capita) quanto de uma subida expressiva, de cerca de 400% (351 a 1431 dólares per capita) posteriormente. Em termos absolutos, o aumento desses gastos no Chile também foi importante, embora, em comparação com os dos países vizinhos, foi cerca de 255%, menos expressivo.

Mas, e se pensarmos para além dos gastos? O que havia e o que foi feito? Além da baixa regulação, a segmentação do sistema – característica de sistemas de saúde nos quais o financiamento e a assistência misturam esquemas públicos e privados – se constituiu numa limitação institucional de primeira ordem na formulação de uma política de saúde na Argentina, dado que favoreceu a multiplicação dos atores com capacidade de influenciar qualquer processo de decisão (Cf. Lépore, 2006LÉPORE, S. Salud: la vulnerabilidad social de los sectores pobres del amba y la estructura de oportunidades del sistema conceptos y prácticas para la inclusión social. In: CONGRESO NACIONAL DE POLÍTICAS SOCIALES, 3., 2006, Buenos Aires. Anais... Buenos Aires, 2006. Disponível em: <http://www.uca.edu.ar/uca/common/grupo68/files/La_vulnerabilidad_social_de_los_sectores_pobres_del_AMBA_y_la_estructura_de_oportunidades_del_sistema.pdf>. Acesso em: 4 July 2017
http://www.uca.edu.ar/uca/common/grupo68...
). Nos anos 1970, as reformas nas Obras Sociales (OS)4 4 Seguro público de saúde instituído nos anos 1940 no governo de Perón. São autarquias destinadas à assistência à saúde, financiadas a partir de contribuições de empregados e empregadores sobre a folha de salários. aprofundaram essa segmentação, outorgando seu manejo financeiro aos sindicatos, criando uma institucionalidade destinada aos trabalhadores do mercado formal e, ainda, convertendo-as em financiadoras dos prestadores privados de serviços. Já em 1980, a proibição legal de as OS constituírem infraestrutura própria propiciou às empresas de medicina pré-paga expandirem seus serviços, tornando-se as principais proprietárias de equipamentos de média e alta complexidade. Esse arranjo institucional não sofreu alterações significativas na década de 90.

As administrações Kirchner recuperaram o protagonismo do Estado na política de saúde, em um sistema já segmentado e com problemas de coordenação. Nas OS, entretanto, dada a complexidade institucional e política, continua difícil a introdução de mudanças no sentido de superar a segmentação. Uma das questões mais relevantes tem sido os convênios celebrados com as empresas de medicina pré-paga e a mobilidade conferida aos usuários, o que lhes permite escolher ou não uma OS, ou mudar conforme sua capacidade de pagamento. Isso possibilitou a entrada avassaladora dos seguros privados no sistema de saúde argentino. Os trabalhadores que podiam pagar por um seguro privado hoje o fazem dentro das OS (Cf. Fidalgo, 2012FIDALGO, M. M. Trabajo y salud: el acceso a los servicios de salud de los trabajadores formales en la Argentina. Rev. Ciencias Sociales (Cr), v. 1, n. 135-136, 2012.).

Ao que parece, apesar do expressivo aumento no gasto público e do aumento da cobertura na Argentina, não houve alteração na estrutura da política nacional de saúde. Se podemos afirmar que parte disso se deve à pouca expressividade das coletividades de esquerda no cenário político, também resulta do tipo de estratégia não universalista adotada pelos governos Kirchner. Alonso e Di Costa (2011)ALONSO, G.; DI COSTA, V. Cambios y continuidades en la política social argentina, 2003-2010. In: PONENCIA EN EL VI CONGRESO ARGENTINO DE ADMINISTRACIÓN PÚBLICA. Chaco: Ciudad de Resistencia, juil 2011. Disponível em: <http://aaeap.org.ar/wp-content/uploads/2013/6cong/ALONSO_DI_COSTA.pdf>. Acesso em: 4 Juil 2017
http://aaeap.org.ar/wp-content/uploads/2...
referem-se ao “neocorporativismo segmentado”, que carece de uma política social capaz de reduzir as desigualdades no interior da classe trabalhadora. Os sindicatos podem alcançar os benefícios do crescimento para os trabalhadores, mas isso se limita ao setor formal, cristalizando a divisão entre excluídos e incluídos. Para os autores, a política social de Kirchner reflete a configuração de interesses que articulou sua coalização de governo, na qual os sindicatos tiveram peso relevante.

No Chile, as reformas orientadas ao mercado sob o regime militar (1973 a 1990) introduziram a focalização de ações, a transferência de responsabilidades para o setor privado, a limitação de benefícios, regras rigorosas de elegibilidade, a promoção da descentralização de serviços e uma redução significativa da participação do Estado nas políticas sociais, entre elas a saúde. Paralelamente, o alto custo dos serviços privados de saúde forçou os beneficiários a buscarem assistência no sistema público, sobrecarregando-o. Somou-se a essa condição a diferença na distribuição dos serviços de saúde entre as regiões urbanas e rurais do país.

Com a transição para a democracia no Chile, nos primeiros governos da Concertación ocorreu uma continuidade do modelo orientado para o mercado e a manutenção de um sistema de saúde segmentado. No início dos anos 2000, o subsistema público de saúde se constituía por uma modalidade institucional que variava de acordo com o nível de renda. Indivíduos com renda inferior a um mínimo estabelecido estavam isentos de pagamento para a assistência à saúde nos centros públicos de saúde. O subsistema privado estava constituído pelas Instituciones de Salud PrevisionalISAPRE, criadas em 1981 –, cobrindo cerca de 18% da população. O restante da população se dividia entre as mutuárias, que cobriam atenção à saúde para acidentes de trabalho e doenças profissionais, e pagamentos com os próprios recursos. Ou seja, após oito anos dos governos da Concertación, o sistema de saúde chileno continuava estratificado pelos níveis de renda e riscos, com o setor público se responsabilizando pela população de maior risco e menor renda, e o setor privado provendo segurança em saúde à população de maior renda e com menores riscos.

O governo de Ricardo Lagos (2000-2006) apresentou claras intenções de promover uma reforma no sistema de saúde chileno, materializada na aprovação de quatro leis.5 5 Lei 19.966 do Regimén de Garantias em Salud (Plano AUGE) (2004); Lei 19.937 da Autoridad Sanitaria y Gestión (2004); Lei 20.015 das ISAPRE (2005); e Lei 19.888 do Financiamiento del Gasto Fiscal Representado por el Plan AUGE (2003). O Plan AUGE definiu como garantias explícitas as condições relativas ao acesso, qualidade, proteção financeira e oportunidade, pelas quais a assistência deveria ser prestada a um conjunto prioritário de programas, doenças ou condições de saúde. Essa lei entrou em vigência em julho de 2005 para um conjunto de 25 condições de saúde; em 2006, esse número ampliou-se para 40; em 2007 para 56 e, em 2010, 69 condições foram priorizadas, no governo de Bachelet. As garantias estabelecidas foram iguais para todos os cotizantes do sistema público e das ISAPRE. Para os beneficiários do FONASA, elas foram incorporadas sem adicionais na cotização; os membros das ISAPRE deveriam pagar um prêmio adicional, único e igual para todos de uma mesma ISAPRE, sem discriminação por idade ou sexo.

No governo Bachelet, a iniciativa mais forte foi a introdução de medidas impulsionadas pelo Colégio Médico, como aumento de salários, melhoria das condições de trabalho dos profissionais de saúde, incorporação de incentivos para a aposentaria dos médicos, e a obrigatoriedade do exame médico nacional para chilenos e estrangeiros trabalharem no sistema público de saúde. Ou seja, apesar de um aumento da cobertura, não há uma alteração da institucionalidade: a cobertura privada continua dominante e não existem esforços por parte do governo para mudar esse quadro, a começar pela pouca expressividade do aumento dos gastos em comparação aos dos países vizinhos.

De forma semelhante ao Chile e à Argentina, a matriz de proteção social do Uruguai caracterizou-se, historicamente, por elevados níveis de cobertura de bens e serviços, incluindo a saúde, mas com qualidade e extensão altamente estratificados. Também nesse país, a matriz da proteção social esteve baseada no mercado formal de trabalho e, a partir dos anos 1970, começaram a transparecer os sintomas de debilidade, quando esse mercado deixou de ser o pilar de sustentação da proteção social (Cf. Fuentes, 2010FUENTES, G. El sistema de salud uruguayo en la post dictadura: análisis de la reforma del Frente Amplio y las condiciones que la hicieron posible. Revista Uruguaya de Ciencia Política, Uruguay, v. 19, n. 1, p. 119-142, 2010.). Nos anos 1990, os governos optaram por promover a consolidação dos seguros privados de saúde, principalmente por meio da não regulação do setor. O sistema de saúde uruguaio encontrava-se segmentado, excluindo setores da população, com a rede de serviços concentrada, orientado para práticas curativas e sem regulação estatal (Cf. Fuentes, 2010FUENTES, G. El sistema de salud uruguayo en la post dictadura: análisis de la reforma del Frente Amplio y las condiciones que la hicieron posible. Revista Uruguaya de Ciencia Política, Uruguay, v. 19, n. 1, p. 119-142, 2010.).

No primeiro governo da FA, iniciado em 2005, a proposta de reforma do sistema de saúde destacou a mudança do modelo assistencial, com as diretrizes da cobertura universal, um pacote assistencial integral e único, um fundo único de financiamento e a criação de organismos para regulação e gestão, dentre outras alterações. O fundo único com contribuições do Estado e da sociedade, por meio de uma alíquota do imposto de renda (importante componente solidário), não foi viabilizado. A ideia de constituir um sistema único também acabou cedendo a um sistema misto (Cf. Fuentes, 2010FUENTES, G. El sistema de salud uruguayo en la post dictadura: análisis de la reforma del Frente Amplio y las condiciones que la hicieron posible. Revista Uruguaya de Ciencia Política, Uruguay, v. 19, n. 1, p. 119-142, 2010.). No entanto, a participação do Estado na política de saúde aumentou substantivamente. A reforma implementada em 2007, no Uruguai, criou o Fondo Nacional de Salud – FONASA – que passou a captar contribuições da seguridade social para o pagamento de uma cota de saúde, associada à idade e ao sexo, e ao prestador de serviços: privado, pelas IAMCs (Instituciones de Asistencia Médica Colectiva); público, pela ASSE (Administración de Servicios de Salud del Estado) e os seguros privados. Foi criado o Sistema Nacional Integrado de Salud (SNIS), financiado pelo FONASA, que passou a ser praticamente o único comprador dos serviços, tanto públicos quanto privados, a partir da escolha do usuário. O acesso é garantido a toda a população, com base nos princípios de cobertura universal, acessibilidade e sustentabilidade dos serviços, equidade, continuidade e oportunidade, orientação preventiva e integral, e qualidade dos serviços. A rede de serviços de saúde presta um pacote de assistência integral, o Plan Integral de Atención a la Salud (PIAS), que, de forma diferente das garantias explícitas, no Chile, não detalha as patologias que devem ser cobertas, mas os serviços necessários para o diagnóstico, tratamento e reabilitação(Cf. Fuentes, 2010FUENTES, G. El sistema de salud uruguayo en la post dictadura: análisis de la reforma del Frente Amplio y las condiciones que la hicieron posible. Revista Uruguaya de Ciencia Política, Uruguay, v. 19, n. 1, p. 119-142, 2010.). Para Fuentes, posterior à implementação do SNIS no Uruguai, o papel das IAMC na prestação de serviços de saúde foi reforçado, enquanto as mudanças no financiamento estiveram orientadas para o aumento das contribuições provenientes das receitas gerais e da seguridade social, em um claro movimento para reduzir o gasto privado em saúde (Cf. Fuentes, 2010). Para o autor, além da redução dos gastos diretos das famílias, foram iniciados esforços de fortalecimento da regulação estatal sobre o sistema.

Como podemos observar, as propostas de reformulação dos sistemas de saúde, nesses três países, não levaram a termo objetivos de universalização e integralidade da atenção à saúde, bem como de redução da segmentação dos sistemas de saúde. O que se deve ressaltar, no entanto, é a diferença relativa à responsabilidade do Estado entre os governos de esquerda, em relação a seus antecessores. Podemos afirmar que houve um aumento da intervenção estatal na área, tanto pelo aumento do gasto público e diminuição da participação do gasto privado, de forma geral, e de recursos próprios, especificamente, como por maior regulamentação e criação de programas de cunho mais inclusivo. Podemos afirmar também que, no Uruguai e na Argentina, esse protagonismo foi muito maior do que no Chile, com mudanças substantivas. A maior presença da esquerda no parlamento, assim como a maior mobilização da classe operária no Uruguai e na Argentina podem ajudar a entender isso.

EDUCAÇÃO: A ARENA ONDE A PRESENÇA DOESTADOJÁ ERA FORTE

Argentina, Chile e Uruguai sempre se destacaram em termos de política de educação quando comparados a seus vizinhos. Durante todo o século XX, esses países apresentaram um sistema educacional público com os maiores níveis de gastos sociais e cobertura da região, sendo que a política de educação foi a primeira a alcançar o status de universalidade, enquanto o restante das políticas sociais estava atrelado ao emprego formal (Cf. Filgueira, 2005FILGUEIRA, F. Welfare and democracy in Latin America: The development, crises and aftermath of universal, dual and exclusionary social States. New York: Prepared for the United Nations Research Institute for Social Development Project on Social Policy and Democratization, 2005.). Dessa forma, o setor de educação, nesses países, apresentou um quadro similar, uma vez que, em todos eles, desde a década de 80, havia mais de 90% de alfabetização, e as matrículas, na escola primária, já eram universalizadas (Tabela 4). Todos eles partem de padrões de oferta bem acima dos praticados na área da saúde.

Tabela 4
– Cobertura da política de educação e proporção de alfabetização, na década de 1980

As Tabelas 5, 6 e 7 revelam que, independentemente do espectro ideológico, os governos analisados se esforçaram, de forma cumulativa, em ampliar os investimentos em educação nas duas últimas décadas. No entanto, o grau de esforço é variável. Na Argentina e no Uruguai, a expansão dos investimentos em educação se deu de forma substantivamente mais acentuada durante os governos de esquerda, em relação às administrações anteriores. O que não aconteceu no Chile, onde a ampliação dos gastos em educação foi mais acentuada durante os governos conservadores. Todos os indicadores analisados ilustram que houve um salto dos gastos nessa área, nesses países, com destaque para a Argentina que alcançou um gasto de 588 dólares per capita e cumpriu o compromisso de ampliar os gastos em educação até o patamar de 6% do PIB. No que se refere à proporção do gasto público em educação, apesar de o Uruguai realizar um esforço maior, o Chile é quem apresenta uma maior proporção do gasto em educação em relação ao gasto total (19%), função do legado recebido. Sendo assim, não se pode dizer que há um padrão de comportamento dos governos de esquerda em relação aos investimentos de educação, nos países analisados, diferentemente do que vimos em saúde.

Tabela 5
– Gasto em educação como proporção do PIB
Tabela 6
– Gasto Público em educação como proporção do gasto público total
Tabela 7
Gasto social per capita em educação (em dólares de 2000)

Do ponto de vista institucional, tanto Argentina como o Uruguai sustentavam um sistema educacional público, ao passo que o Chile instaurou um sistema majoritariamente privado. A privatização do sistema de ensino chileno ocorreu durante a década de 1970, com o advento da ditadura militar, sob o comando de Augusto Pinochet. Além da privatização, o sistema foi descentralizado, ampliando a responsabilidade dos municípios. De acordo com Burton (2012)BURTON, G. Hegemony and frustration education policy making in Chile under the concertación, 1990–2010. Latin American Perspectives, [s.l], v. 39, n. 4, p. 34-52, 2012. o sistema de educação, basicamente, foi divido em três vertentes: (1) sistema público financiado pelos municípios; (2) escolas privadas independentes; e (3) escolas privadas subsidiadas pelo Estado (ainda que movimentada em parte com dinheiro público, elas tinham permissão de realizar teste de seleção para o ingresso de alunos). O corolário disso foi um sistema segmentado, no qual escolas públicas eram ocupadas por estudantes pobres, ao passo que as escolas subsidiadas ou totalmente privadas eram ocupadas por estudantes da classe média e classe média alta. Uma vez que nossa comparação se dá a partir de 1990, cabe atentar, então, que nosso ponto de partida analítico abrange contextos institucionais consideravelmente diferentes entre os países, situando o caso chileno em uma classificação distinta, em matéria de educação.

No Chile, durante o período democrático, a estrutura institucional erigida por Pinochet se manteve essencialmente intacta (Cf. Burton, 2012BURTON, G. Hegemony and frustration education policy making in Chile under the concertación, 1990–2010. Latin American Perspectives, [s.l], v. 39, n. 4, p. 34-52, 2012.). Se, por um lado, percebe-se o aprofundamento da segmentação entre estudantes de classe baixa no sistema público e estudantes de classe média alta no sistema privado, por outro lado, esforços foram realizados para a melhoria da qualidade das escolas por meio da ampliação dos subsídios conferidos às instituições de ensino privadas, com recursos adquiridos por empréstimos junto ao Banco Mundial e a partir de novos impostos vinculados. Isso permitiu a expansão das matrículas na pré-escola e do tempo diário dos alunos na escola, durante o ensino fundamental. Além disso, introduziram-se incentivos para o desempenho dos professores e políticas focalizadas de suporte a alunos de baixa renda das áreas rurais.

As reformas na educação sob governos chilenos de esquerda ocorreram a partir do mandado de Ricardo Lagos (2000-2006). Ele reformou a Constituição, de modo a estabelecer o compromisso do Estado em garantir educação gratuita para o ensino médio. Isso implicou uma extensão do tempo mínimo escolar obrigatório para 12 anos. Além disso, criou-se o programa focalizado “Liceo para todos”, voltado para evitar a evasão escolar entre estudantes de baixa renda, bem como implementaram-se programas de avaliação individual de professores. No governo posterior, durante o primeiro mandato de Michelle Bachelet (2006 – 2010), as reformas incluíram a expansão da pré-escola, das escolas em tempo integral, de programas focalizados para o aprendizado em inglês, matemática e informática. No entanto, de abril a julho de 2006, 1 milhão de pessoas foram para as ruas – entre eles, estudantes, professores e pais de estudantes – em protesto contra o sistema de educação como um todo. A pressão oriunda das ruas suscitou a instauração de um processo deliberativo em torno da política de educação, com a convocação de um comitê presidencial consultivo. O conselho foi ocupado tanto por movimentos sociais ligados à luta pela educação pública quanto por tecnocratas, incluindo professores universitários e economistas. O debate foi tenaz, mas não houve acordo entre as partes. Nessas circunstâncias, o governo encerrou a discussão deliberativa prometendo reforçar um sistema misto de educação público-privado e aumentar o subsídio público per capita por estudante. No entanto, o que se observa é que os esforços na política de educação, durante tal governo, não se diferenciaram muito daqueles realizados na década de 1990 (Cf. Burton, 2012BURTON, G. Hegemony and frustration education policy making in Chile under the concertación, 1990–2010. Latin American Perspectives, [s.l], v. 39, n. 4, p. 34-52, 2012.).

Na Argentina, a reforma educacional foi assumida como prioridade pelo governo liberal de Carlos Menem (1989–1999). Em 1991, ocorreu a descentralização do financiamento do ensino médio, responsabilizando-se, sobretudo, as províncias e os munícipios. Em 1993, uma legislação incumbiu o governo federal de ampliar as transferências para as províncias e municípios, embora a estrutura descentralizada tenha se mantido, em grande medida, intacta. Nesse período, houve ampliação do tempo de obrigatoriedade escolar de 7 para 10 anos e a adoção de novos testes educacionais para mensurar a qualidade do ensino (Cf. Corrales; Roldán; Garchet, 1999). Tal como Menem, Kirchner indicou a política de educação como uma das prioridades de seu governo. Em 2005, foi aprovada uma lei destinada à ampliação do financiamento em educação, a qual previa o aumento progressivo dos gastos na área, tendo por meta atingir o patamar de 6% do PIB até 2009. Em 2006, o governo expressou o interesse de substituir a Lei Federal de Educação de 1993. De acordo com Bentancurt (2008)BENTANCUR, N. La nueva agenda de las políticas educativas en el Cono Sur (Argentina, Chile y Uruguay 2005-2008). Revista Debates, Porto Alegre, v. 2, n. 2, p. 272-298, 2008., as principais mudanças em relação à lei de 1993 foram: o compromisso com a expansão progressiva do papel estatal na política de educação; a padronização do sistema de ensino em âmbito nacional, estabelecendo-se, para cada província, a opção de seis anos para o ensino fundamental e de seis anos para o ensino médio, ou uma estrutura de sete anos para o ensino fundamental e cinco anos para o ensino médio; extensão da obrigatoriedade para o ensino fundamental; horário integral para o ensino fundamental; criação do Conselho Federal de Educação, presidido pelo Ministro da Educação, mas contando com a participação docente, de forma consultiva. Tal reforma não desfez, entretanto, o modelo de descentralização institucional e financeira implementado em 1993, tampouco alterou o modelo de subsídios à educação privada. Na última década, outras mudanças foram realizadas, mas nenhuma que alterasse o quadro institucional da educação naquele país.

No Uruguai, durante o governo do Partido Colorado, nos anos 1990, o sistema de ensino foi alvo de reformas pontuais na pré-escola, no ensino fundamental e no ensino médio. Entre elas: a revisão do currículo escolar; extensão de escolas em tempo integral; a redução da idade mínima de inserção das crianças na escola, de 5 para 4 anos; a introdução de programas focalizados nas regiões mais pobres; a formação de professores para lecionar no interior do país; a implementação de novas modalidades de ensino tecnológico e profissional; investimento em biblioteca; materiais didáticos; equipamento informático e infraestrutura. De maneira geral, o sistema educacional se manteve público e de caráter universal (Cf. Lanzaro, 2004LANZARO, J. L. La reforma educativa en Uruguay (1995-2000): virtudes y problemas de una iniciativa heterodoxa: políticas sociales. Santiago, Chile: CEPAL, 2004. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?hl=pt-BR&lr=&id=QJ5RDuSOUoQC&oi=fnd&pg=PA3&dq=lanzaro+jorge&ots=i4hkJVyeUH&sig=nRRaAQHrV5e_yelhRLb1zTDqqkI>. Acesso em: 16 July 2015.
https://books.google.com.br/books?hl=pt-...
).

Com a ascensão da esquerda ao governo, o presidente eleito, Tabaré Vázquez, instaurou, no primeiro de ano de mandato, em 2005, um amplo debate sobre a política de educação. Nessa direção, foi instituída a Comissão Organizadora do Debate Educativo (CODE), composta por vinte membros, com representantes do Ministério da Educação, Ministério do Turismo e Esportes, partidos políticos, instituições de ensino privado e associações docentes e estudantis. Um projeto de lei, fruto desse amplo debate, foi encaminhado e aprovado no congresso, em 2008. Nele, foram mantidos os princípios constitutivos do sistema de educação – obrigatoriedade, gratuidade e universalidade, e se acrescentaram ainda os princípios da participação e da integralidade. Tal como a reforma na Argentina, ficou estipulado que o investimento público em educação não poderia ficar abaixo do patamar de 6% do PIB (Cf. Bentancurt, 2008BENTANCUR, N. La nueva agenda de las políticas educativas en el Cono Sur (Argentina, Chile y Uruguay 2005-2008). Revista Debates, Porto Alegre, v. 2, n. 2, p. 272-298, 2008.). Ainda em 2008, o governo de Vázquez implementou o Plano Ceibal (Conectividad Educativa de Informática Básica para el Aprendizaje en Línea), que previa o fornecimento de um notebook a cada aluno de escola pública, com objetivo de proporcionar-lhes o acesso à internet e a aprendizagem de novas tecnologias.

Como se pode notar, com exceção da reforma de descentralização implementada na Argentina durante a década de 1990, as bases gerais dos sistemas de educação nos três países se mantiveram identificadas com o legado dos governos anteriores. Além disso, a comparação exposta nas tabelas acima revela que, do ponto de vista institucional, não se percebem padrões partidários diferenciais em torno da política de educação. No entanto, observa-se que os governos conservadores foram pioneiros na criação de programas focalizados na área de educação. E, apesar de, nos três países, de maneira geral, não terem se verificado tendências peculiares a governos de esquerda ou conservadores, em termos das tendências de centralização, descentralização ou privatização da educação, é possível afirmar duas diferenças. Primeiramente, há uma distinção no grau de esforço, considerando-se que, na Argentina e no Uruguai, a expansão dos investimentos em educação se deu de forma substantivamente mais acentuada durante os governos de esquerda, em relação a seus antecessores. Isso não aconteceu no Chile, onde a ampliação dos gastos em educação foi maior nos governos conservadores. Nota-se, também, certo padrão partidário no que se refere às iniciativas participativas de controle dessas políticas, que, invariavelmente, foram implementadas por governos de esquerda. Ou seja, quando se parte de um legado já em patamares mais altos, quando comparados aos da saúde, as diferenças diminuem embora haja um esforço maior com o aumento do gasto público voltado para as políticas educacionais.

A UTILIZAÇÃO DOS PTCR PELA ESQUERDA

As políticas neoliberais da década de 90 deixaram um legado social grave, expresso no aumento dos indicadores de pobreza, o que levou à alta impopularidade daqueles governos, que pode ser inferida pela onda de eleições de governos à esquerda com propostas mais inclusivas. Na América Latina, uma das formas de enfrentar os níveis alarmantes de pobreza foram os programas de transferência condicionada de renda (PTCR). Essa estratégia se espalhou pela região independentemente da ideologia governamental, com forte apoio das agências multilaterais. Nessa seção, a análise será diferente das anteriores, na medida em que, nesses países, os gastos relativos aos PTCR são menores, se comparados com as demais políticas em foco, e, além disso, como não existia essa rubrica de gastos para os governos anteriores, nossa análise será restrita à variação entre os três países. O Chile, desde o início, investiu nos PTCR entre 0,10% e 0,11% do PIB e não alterou mais; a Argentina investiu algo em torno de 0,20% de seu PIB nessas transferências; e o Uruguai destinou 0,45% do PIB em 2009 (Cepal, 2013). A análise, aqui, vai considerar mais a implementação e alguns impactos dessas políticas nesses países.

A transferência de renda direta e condicional, na região, intensificou-se a partir dos anos 2000 e foi destinada, prioritariamente, para famílias que se encontravam em situação de vulnerabilidade de renda e que possuíam filhos em idade escolar. Essa realidade fez com que grande parte dos PTCR incorporassem, como condicionalidades, a obrigatoriedade da frequência mínima na escola e o acompanhamento das crianças nos atendimentos básicos de saúde (Cf. Cobo, 2012COBO, B. Sistemas Focalizados de Transferência de Renda: contexto internacional. Políticas focalizadas de transferência de renda: contextos e desafios. Editora Cortez, 2012.). Nos três países, criaram-se secretarias ou ministérios próprios para a gestão e coordenação institucional desses programas pelo território. Em todos os casos, isso ocorreu na vigência dos governos de esquerda. Essas pastas específicas6 6 O Ministerio de Desarrollo Social (MIDES), no Uruguai, foi criado no ano de 2005 por meio da Lei 17866 no primeiro mandato de Tabaré Vázquez e tem como finalidade integrar e coordenar as ações sociais intersetoriais destinadas às pessoas ou famílias em situação de vulnerabilidade social e implementadas pelo governo executivo nacional. foram criadas para articular e coordenar os PTCR em âmbito nacional, adotando estratégias de curto e longo prazo (Cf. Antía et al., 2013; Carro, 2012CARRO, S. M. A Assistência social no universo da proteção social: Brasil, França e Argentina. Revista em Pauta, Rio de Janeiro, n. 25, p. 173-192, 2012.; Farías, 2013FARÍAS, C. R. Sistemas de protección social en América Latina y el Caribe: Chile: Sistemas de protección social en América Latina y el Caribe. Santiago, Chile: CEPAL, 2013. Disponível em: <http://www.equidadparalainfancia.org/wp-content/uploads/2016/03/Sistemas-de-protecci%C3%B3n-social-en-Chile.pdf>. Acesso em: 4 July 2017.
http://www.equidadparalainfancia.org/wp-...
; Midaglia; Antía, 2007MIDAGLIA, C.; ANTÍA, F. La izquierda en el gobierno: Cambio o continuidad en las políticas de bienestar social? Revista Uruguaya de Ciencia Política, Uruguay, v. 16, n. 1, p. 131-157, 2007.; Midaglia; Tereja, 2016MIDAGLIA, C.; TEREJA, R. Uruguay del Pepe Mujica: los câmbios procesados em el campode la asistencia social. In: BENTANCUR, N.; BUSQUETS, J. M. (Eds.) El decenio progresista: las políticas públicas de Vázquez a Mujica. Montevidéo: Fin de Siglo Editorial, 2016.; Potenza Dal Masetto; Repetto, 2012POTENZA DAL MASETTO, F.; REPETTO, F. Sistemas de protección social en América Latina y el. Caribe: Argentina. Digital Repository, 2012. 51 p. (Documentos de Proyectos, 508).; Pribble, 2013a, 2013b).

No que se refere aos PTCR, os três países, apesar de adotarem critérios de focalização e condicionalidades semelhantes, seguiram caminhos diferentes quanto à institucionalização e implementação do benefício ao longo do tempo, especialmente, nos contextos da entrada de políticos de esquerda no governo executivo nacional. O Uruguai apresenta uma matriz de bem-estar social relativamente estável ao longo do tempo, com destaque para políticas nacionais de caráter mais universal. O campo da assistência social se inseriu nessa matriz com uma proposta de focalização distinta da universalização inerente às políticas de saúde e educação, por exemplo, adotando como estratégia ações direcionadas para as famílias mais pobres ou que viviam em situação de extrema pobreza. Na década de 1990, foram criados, em todos os países, distintos programas de combate à pobreza, sob a gestão de diferentes pastas ministeriais ligadas à área social. Não havia, nesse momento, uma articulação institucional, e as ações ocorriam de maneira fragmentada e pontual, dado o caráter emergencial das intervenções (Cf. Antía et al., 2013).

Esse campo sofreu inovações no contexto das gestões da FA, especialmente no governo de Vazquez, com a retomada do Estado frente da coordenação e da gestão das políticas socais nacionais. Sob a gestão e a coordenação do Ministerio de Desarrollo Social (MIDES), foram desenvolvidos o Plan de Atención de la Emergência Social (PANES), por meio da Lei 17.869 de 2005, e o Programa Ingreso Ciudadano, ambos disponibilizados até 2007. O PANES teve como principal objetivo prestar assistência à população em situação de extrema pobreza e indigência, a partir de um conjunto de iniciativas públicas para a superação dos riscos e vulnerabilidades sociais. Já o Programa Ingreso Ciudadano consistia num PTCR para as famílias em situação de indigência. O cadastro dos beneficiários levou à construção de um Índice de Carencias Críticas,7 7 Esse Índice foi desenvolvido pelo Instituto de Economia da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade da República (UDELAR) (Midaglia; Tereja, 2016, p. 55). que consiste em um conjunto de indicadores para medir os fatores que incidiam sobre as situações de pobreza e extrema pobreza. Os técnicos que realizavam o cadastro eram responsáveis por selecionar as variáveis e os pesos relativos para determinar o nível de pobreza (Cf. Midaglia; Tereja, 2016MIDAGLIA, C.; TEREJA, R. Uruguay del Pepe Mujica: los câmbios procesados em el campode la asistencia social. In: BENTANCUR, N.; BUSQUETS, J. M. (Eds.) El decenio progresista: las políticas públicas de Vázquez a Mujica. Montevidéo: Fin de Siglo Editorial, 2016.). O PANES também previa apoio alimentar por meio da Tarjeta Alimentaria, que teve início em 2006. Esse benefício, assim como o Programa Ingreso Ciudadano, consistia numa transferência de renda destinada a famílias que se encontravam em situação de extrema pobreza e que não possuíam condições de suprir suas necessidades alimentícias básicas. Portanto, o PANES, dadas as suas características emergenciais, consistiu numa estratégia de curto prazo, cuja principal finalidade era reduzir as situações de risco e vulnerabilidades sociais, bem como promover a integração social dessa parcela da população no sistema de proteção social nacional (Cf. Antía et al., 2013; Midaglia; Antía, 2007MIDAGLIA, C.; ANTÍA, F. La izquierda en el gobierno: Cambio o continuidad en las políticas de bienestar social? Revista Uruguaya de Ciencia Política, Uruguay, v. 16, n. 1, p. 131-157, 2007.; Midaglia; Tereja, 2016MIDAGLIA, C.; TEREJA, R. Uruguay del Pepe Mujica: los câmbios procesados em el campode la asistencia social. In: BENTANCUR, N.; BUSQUETS, J. M. (Eds.) El decenio progresista: las políticas públicas de Vázquez a Mujica. Montevidéo: Fin de Siglo Editorial, 2016.; Valera; Palma, 2014VALERA, C. M.; PALMA, A. Pactos sociales pra una protección social más inclusiva: Experiencias, obstáculos y posibilidades en América Latina y Europa. La construcción de pactos y consensos en materia de política social: El caso de la reforma previsional en Chile 2005-2008. Seminarios Y Conferencias, v. 76, n. CEPAL, p. 80-87, 2014.)

Para substituir o PANES, foi criado o Plan de Equidad, que se configurou como uma estratégia de longo prazo. Com caráter mais abrangente, engloba tanto a pobreza como outras situações de vulnerabilidades sociais, tais como as variáveis de gênero, geracionais e étnico-raciais. Apesar da aprendizagem institucional advinda do PANES, essa nova proposta de intervenção agregou, em sua estrutura, um novo pilar de assistência não contributiva, conhecido como Asignaciones Familiares Plan de Equidad (AFAM-PE), reguladas pela Lei Nº. 18227 de 2008, amplamente apoiada por parlamentares pró-governo e pela oposição (Cf. Midaglia; Antía, 2007MIDAGLIA, C.; ANTÍA, F. La izquierda en el gobierno: Cambio o continuidad en las políticas de bienestar social? Revista Uruguaya de Ciencia Política, Uruguay, v. 16, n. 1, p. 131-157, 2007.; Midaglia; Tereja, 2016MIDAGLIA, C.; TEREJA, R. Uruguay del Pepe Mujica: los câmbios procesados em el campode la asistencia social. In: BENTANCUR, N.; BUSQUETS, J. M. (Eds.) El decenio progresista: las políticas públicas de Vázquez a Mujica. Montevidéo: Fin de Siglo Editorial, 2016.). Essa Lei define as Asignaciones Familiares como uma prestação monetária, concedida mensalmente pelo Banco de Previsión Social (BPS), destinada a crianças e adolescentes que residem no país e que se encontram em situação de vulnerabilidade socioeconômica ou se encontram em tempo integral no Instituto del Niño y Adolescente del Uruguay, ou em outras instituições conveniados a ele (Ley N.18.227 de 2008; artigo 1o).

O governo de Mujica (2010-2015) deu sequência ao Plan de Equidad, concentrando maior atenção à população em situação de extrema pobreza. Inovou ao lançar a proposta de expansão progressiva das ações sociais para outros setores, que não apenas aqueles que se encontravam marginalizados. Além do fortalecimento das condições de oferta no nível local, foram criados outros PTCR que são complementares e se articulam si no plano nacional de combate à pobreza, a saber: Tarjeta Uruguay Social (TUS), Uruguay Cresce Contigo (UCU) e Jóvenes en Red (Cf. Midaglia; Antía, 2007MIDAGLIA, C.; ANTÍA, F. La izquierda en el gobierno: Cambio o continuidad en las políticas de bienestar social? Revista Uruguaya de Ciencia Política, Uruguay, v. 16, n. 1, p. 131-157, 2007.; Midaglia; Tereja, 2016MIDAGLIA, C.; TEREJA, R. Uruguay del Pepe Mujica: los câmbios procesados em el campode la asistencia social. In: BENTANCUR, N.; BUSQUETS, J. M. (Eds.) El decenio progresista: las políticas públicas de Vázquez a Mujica. Montevidéo: Fin de Siglo Editorial, 2016.). O governo Vázquez se propôs a ordenar, agrupar e articular as principais ações do campo da assistência social, especialmente os PTCR, no intuito de maior integração social. Já o governo de Mujica se propôs a expandir as ações já desenvolvidas no governo anterior (Cf. Midaglia; Tereja, 2016MIDAGLIA, C.; TEREJA, R. Uruguay del Pepe Mujica: los câmbios procesados em el campode la asistencia social. In: BENTANCUR, N.; BUSQUETS, J. M. (Eds.) El decenio progresista: las políticas públicas de Vázquez a Mujica. Montevidéo: Fin de Siglo Editorial, 2016.).

Assim como no Uruguai, os PTCR, na Argentina, se constituíram como uma das principais estratégias para inclusão social e redução do nível de pobreza e de indigência. Mas, diferentemente da matriz de desenvolvimento social uruguaia, que se desenvolveu direcionada para o setor não contributivo, a matriz da Argentina se desenvolveu aliada ao mercado formal de trabalho, utilizando tanto o setor contributivo como o não contributivo ao longo do tempo. Os PTCR foram implementados no país desde meados da década de 1990, com destaque para o Programa Trabajar, desenvolvido pelo Ministerio del Trabajo, Empleo y Seguridad Social. Esse programa era direcionado àquelas pessoas que possuíam vínculo com o mercado formal de trabalho e se encontravam em situação de vulnerabilidade ou estavam desempregadas. Nesse sentido, os benefícios assistenciais estavam inseridos nos pagamentos do Seguro Desemprego, ou eram realizados sob a forma de indenizações. Em 2003, já na gestão de Néstor Kirchner, foi aprimorado o Programa Jefes e Jefas de Hogar Desocupadas (PJJHD), cujo objetivo era a transferência de renda a mulheres chefes de família que estavam desempregadas e viviam com os filhos menores de 18 anos. Para ter acesso ao benefício, para além do enquadramento nos critérios e condições descritas anteriormente, as beneficiárias deveriam destinar quatro horas do dia à participação em uma das atividades ofertadas pelo programa, ou se inserirem em atividades de educação. Para melhor integração e racionalização da proposta, esse programa passou a assumir, em 2005, maior articulação com o Plan Familias por la Inclusión Social, gerido pelo Ministerio de Desarrollo Social (MDS) e com o Seguro de Capacitación y Empleo (SCyE) gerido pelo Ministerio do Trabajo(Cf. Potenza Dal Masetto; Repetto, 2012POTENZA DAL MASETTO, F.; REPETTO, F. Sistemas de protección social en América Latina y el. Caribe: Argentina. Digital Repository, 2012. 51 p. (Documentos de Proyectos, 508).; Rofman; Oliveri, 2011ROFMAN, R.; OLIVERI, M. L. Las políticas de protección social y su impacto en la distribución del ingreso en Argentina. Banco Mundial, 2011. 47 p. (Serie de Documentos de Trabajo sobre Políticas Sociales, n. 6).). Em 2009, o PJJHD foi definitivamente absorvido pelo Plan Familias por la Inclusión Social, dando origem a outro programa de transferência de renda – o Familias para a la Inclusión Social, gerido pelo MDS, passando a ser a ação prioritária de combate à pobreza e outras vulnerabilidades. Esse programa possuía, como condicionalidades, a inserção dos filhos das beneficiárias na rede de saúde e educação básica. O SCyE, para além da capacitação e articulação com o mercado formal de trabalho, também destinava transferência de renda aos participantes, por um período máximo de dois anos.

Ainda seguindo a lógica de prestação assistencial ligada ao mercado de trabalho, foram desenvolvidos outros PTCR, ampliando o acesso dos jovens nessa rede de proteção. Em 2008, foi criado o Programa Jóvenes com Más e Mejor Trabalho, sob a gestão do Ministerio de Trabajo Empleo y Seguridad Social, que previa a transferência de recursos para os jovens que se encontrassem entre os grupos de maior vulnerabilidade social. As principais ações contidas no Programa consistiam em capacitação, profissionalização e conclusão da escolarização. Com objetivo similar e complementar ao que era executado por esse Programa, foi implementado e gerido pelo MDS, em 2010, o Programa Ingreso Social con Trabajo, o Argentina Trabaja, com a finalidade de promover o desenvolvimento econômico, mediante a criação de novos empregos e inclusão social. Esse programa destina-se a pessoas em situação de vulnerabilidade social e uma de suas estratégias consiste em sua inclusão nas cooperativas de trabalho ligadas às atividades econômicas do país (Cf. Fernández, 2012FERNÁNDEZ, J. P. La implementación del Programa Ingreso Social con Trabajo “Argentina Trabaja” en ámbitos subnacionales. Documento de Trabajo, Sevilha, v. 96, 2012.; Rofman; Oliveri, 2011ROFMAN, R.; OLIVERI, M. L. Las políticas de protección social y su impacto en la distribución del ingreso en Argentina. Banco Mundial, 2011. 47 p. (Serie de Documentos de Trabajo sobre Políticas Sociales, n. 6).).

Atualmente, o principal PTCR no país é o Asignación Universal por Hijo para Protección Social (AUHPS), um programa que consiste num benefício direcionado às crianças e aos adolescentes com idade inferior a 18 anos, nativas ou naturalizadas, com residência legal no país há, pelo menos, três anos. Para ter acesso a esse benefício, essas crianças e adolescentes devem ser pertencentes a famílias com pais desempregados, sem auxílio do Seguro Desemprego, ou que exerçam atividades domésticas ou em economias informais, cuja renda não exceda o salário mínimo vigente. Com essa nova proposta, o governo de Cristina Kirchner conseguiu ampliar a cobertura dos beneficiários, incorporando o mercado formal de trabalho (sistema contributivo) e a proteção social fora desse mercado (sistema não contributivo) (Cf. Marques, 2013MARQUES, R. Políticas de transferência de renda no Brasil e na Argentina. Revista de Economia Política, São Paulo, v. 33, n. 2, 2013.).

O Chile, diferentemente do que o ocorreu na Argentina e no Uruguai, estruturou os seus PTCR na década de 1990 e início dos anos 2000 associados a uma série de iniciativas de privatização dos serviços sociais, especialmente os de Saúde e de Educação, conforme já foi mencionado nas subseções anteriores. Os governos de Aylwin e Eduardo Frey priorizaram intervenções voltadas para políticas de proteção infanto-materna. (Cf. Raczynski; Serrano, 2005RACZYNSKI, D.; SERRANO, C. Las políticas y estrategias de desarrollo social: aportes de los años 90 y desafíos futuros. Santiago: Asesorias para el Desarrollo, 2005.). No entanto, essa matriz de desenvolvimento social sofreu alterações quando da assunção ao governo de Ricardo Lagos Escobar, representante do Partido Socialista do Chile (partido que faz parte da Concertación de Partidos por la Democracia) no governo nacional, em 2000. Nesse momento, houve uma ampliação do público-alvo dos PTCR, incorporando a população indígena, que se encontrava na linha da pobreza em áreas urbanas e rurais, mulheres, camponeses, pessoas com deficiência e jovens, e o Ministerio de Planificación Nacional (MIDEPLAN) se tornou a instância responsável por desenhar, coordenar e gerir as políticas, planos e programas para a área de desenvolvimento social, tanto em âmbito nacional quanto regional (Cf. Aguirre Briones, 2009AGUIRRE BRIONES, A. Política social e indicadores distributivos: elementos para una caracterización de la política social en Chile. Polis, Santiago, v. 8, n. 22, p. 231-248, 2009.; Raczynski; Serrano, 2005RACZYNSKI, D.; SERRANO, C. Las políticas y estrategias de desarrollo social: aportes de los años 90 y desafíos futuros. Santiago: Asesorias para el Desarrollo, 2005.).

O governo de Lagos lançou, em 2002, o Programa Chile Solidario, com o objetivo de melhorar as condições de vida das famílias que se encontravam em situação de extrema pobreza. O Programa tinha como principais ações o apoio psicossocial às famílias assistidas e a disponibilização de serviços e benefícios sociais da rede socioassistencial de base territorial. No mesmo ano, também foi criado o Programa Orígenes, cujo objetivo principal consistia na promoção de melhores condições de vida, no âmbito social, cultural, ambiental e cultural, destinado à população indígena rural (Cf. Farías, 2013FARÍAS, C. R. Sistemas de protección social en América Latina y el Caribe: Chile: Sistemas de protección social en América Latina y el Caribe. Santiago, Chile: CEPAL, 2013. Disponível em: <http://www.equidadparalainfancia.org/wp-content/uploads/2016/03/Sistemas-de-protecci%C3%B3n-social-en-Chile.pdf>. Acesso em: 4 July 2017.
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; Pribble, 2013a; Raczynski; Serrano, 2005RACZYNSKI, D.; SERRANO, C. Las políticas y estrategias de desarrollo social: aportes de los años 90 y desafíos futuros. Santiago: Asesorias para el Desarrollo, 2005.), e o Programa Puente, implementado pelo Fundo de Solidariedade e Investimento Social (FOSIS), à época vinculado ao Ministério de Planejamento, que objetivava integrar os indivíduos e grupos sociais em situação de extrema pobreza aos programas e políticas sociais existentes, com base no princípio de reconhecimento dos direitos da cidadania. Por meio dessa concepção, um dos componentes básicos da intervenção foi o núcleo familiar. O projeto direcionado às famílias foi chamado de Apoio Familiar (Bono Apoyo a la Familia), com acompanhamento e assistência aos membros, bem como monitoramento de saúde, inserção das crianças na escola, acesso ao mercado formal de trabalho, condições de moradia e dinâmica familiar. As Unidades de Intervenção Familiar, geridas pelos governos locais, foram responsáveis pela organização e estruturação de atores e instituições públicas e privadas envolvidas na execução das ações de combate à pobreza (Cf. Farías, 2013FARÍAS, C. R. Sistemas de protección social en América Latina y el Caribe: Chile: Sistemas de protección social en América Latina y el Caribe. Santiago, Chile: CEPAL, 2013. Disponível em: <http://www.equidadparalainfancia.org/wp-content/uploads/2016/03/Sistemas-de-protecci%C3%B3n-social-en-Chile.pdf>. Acesso em: 4 July 2017.
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).

Em 2009, já no governo de Michelle Bachelet, houve uma importante mudança institucional no que se refere à execução do Chile Solidário, que foi incorporado ao Sistema Intersectorial de Protección Social, reconfigurando-se como o Subsistema Chile Solidario e atuando conjuntamente com o Subsistema de Protección a la Infancia Chile Crece Contigo e o Subsistema Seguridades y Oportunidades.8 8 Gobierno de Chile. Ministerio de Desarrollo Social (2013). http://www.ministeriodesarrollosocial.gob.cl/ Houve, portanto, o desenvolvimento de um sistema integrado de proteção, com a incorporação de assistentes sociais, a transferência condicionada de renda e a interlocução com outros programas estatais já existentes, como o subsídio às famílias à margem do mercado de trabalho (SUF) e o PASIS (renda destinada às pessoas acima de 65 anos ou pessoas com deficiência em situação de pobreza). As famílias beneficiárias do Programa Chile Solidário possuem entrada preferencial para alguns programas sociais, como a inclusão de crianças na pré-escola, a participação em programas de emprego e acesso a serviços de reabilitação de drogas e álcool. Todavia as famílias beneficiárias, como contrapartida, devem cumprir algumas condicionalidades, como o acompanhamento regular na rede de saúde, a manutenção dos filhos na escola e o acompanhamento familiar (Cf. Pribble, 2013a). A última grande mudança na primeira gestão de Bachelet foi a criação, em 2011, do Ministerio de Desarrollo Social (MDS), em substituição ao antigo MIDEPLAN. A criação de um novo ministério representou avanços na gestão e na coordenação das políticas destinadas à redução da pobreza e à promoção do desenvolvimento social. No mesmo ano, também foi implementado o novo programa de transferência de renda, o Apoyo a la Familia.

Sabemos, então, que os governos de esquerda aqui analisados herdaram índices muito altos de pobreza, na região. Mas o quadro seguiu se agravando. A crise econômica do início dos anos 2000, vivenciada pelo continente sul-americano, assolou os três países em análise: a Argentina em 2001; o Chile em 2002; e o Uruguai em 2003. De maneira geral, essas crises recessivas contribuíram para aumentar os índices de pobreza e extrema pobreza. Na Argentina, esses números foram os mais impressionantes: entre 1998 a 2002, a porcentagem da população em extrema pobreza passou de 2,10% a 4,95%. O Chile e o Uruguai foram mais resistentes à crise, apresentando oscilações menores: o Uruguai saiu de 0,16 para 0,29% de pessoas que viviam em extrema pobreza, entre 2002 e 2005, e, no Chile, observamos uma diminuição desse indicador. No Uruguai, o nível de pobreza aumentou de 9,4%, em 1999, para 15,5% em 2002. Após esse período, esse indicador foi decrescendo ao longo do tempo, alcançando a taxa de 6,7% em 2011. Apesar da crise econômica de 2002, o Chile registrou queda constante no índice de pobreza. Em 1999, o índice era de 38,6%; em 2002, era de 20,2%; e sofreu novas quedas nos anos subsequentes, baixando a 11,5%, em 2009. Essas informações estão baseadas em dados disponibilizados pela Cepal e também apresentados em Farías (2007)FARÍAS, C. A. P. Uma genealogia das teorias e dos modelos de estado de bem-estar social. In: DELGADO, M. G.; PORTO, L. V. (Eds.) Estado de bem-estar social no século XXI. São Paulo: LTr, 2007.. A principal forma de lidar com a pobreza, na região, foi a aplicação de políticas focalizadas de transferência de renda, ao invés da ênfase em políticas universais. Nos três países analisados, a aplicação de programas de transferência de renda condicionadas foi uma inovação que alterou as condições de provimento de assistência praticada pelos seus antecessores.

No entanto, alguns pesquisadores argumentam que os indicadores de pobreza podem diminuir mediante políticas de estabilidade fiscal e econômica. Assim, a redução das taxas de pobreza pode não se relacionar diretamente com a adoção das políticas sociais empreendidas pelos governos de esquerda. Entretanto, esse raciocínio não procede em relação à distribuição de renda, que precisa de mecanismos redistributivos para se alterar. Dado o conjunto das ações implementadas por esses governos, consideramos seu efeito na distribuição de renda como um resultado passível de ser analisado em análise longitudinal. É sabido que as transferências sociais têm gerado resultado redistributivo, não só impedindo o aumento da desigualdade proveniente da crise econômica vivenciada pelos países, mas, efetivamente, diminuindo-a (Cf. Sátyro; Soares, 2009SÁTYRO, N.; SOARES, S. Análise do impacto do Programa Bolsa Família e do benefício de prestação continuada na redução da desigualdade nos estados brasileiros: 2004 a 2006. [s.l.]: Texto para Discussão, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), 2009. Disponível em: <https://www.econstor.eu/handle/10419/91453>. Acesso em: 4 jul. 2017.
https://www.econstor.eu/handle/10419/914...
; Soares et al., 2009)

O coeficiente de Gini da Argentina, na década de 1990, aumentou substantivamente, como pode ser visto na tabela, chegando a 0,578 em 2002, num período pós-crise. Entretanto observa-se uma queda desse indicador pós-entrada da esquerda, alcançando, em 2009, um Índice de 0,510. Nos demais países, observa-se a mesma tendência de queda do Índice de Gini, ou seja, um aumento durante os governos conservadores e uma diminuição progressiva após a entrada dos governos de esquerda. Expressando essa tendência, o Chile apresenta reduções menores, ou seja, as ações ali implementadas tiveram menor poder redistributivo. Ainda assim é importante observar que, se a diminuição da pobreza no Chile já vinha ocorrendo desde os governos anteriores, nos governos de esquerda, houve uma mudança na tendência redistributiva, distinta do padrão nos governos da década de 90. Por fim, o Uruguai sempre se destacou, na América Latina, por apresentar, historicamente, um dos menores Índices de Gini, como pode ser visto na Tabela 8.

Tabela 8
– Índice de Gini em perspectiva comparada para governos de esquerda e de direita

Como podemos verificar, houve um esforço redistributivo em cada um desses países. Sabemos que os PTCR não foram os únicos fatores responsáveis por redistribuição de renda, mas, com certeza, são as ações que encarnam mais fielmente políticas redistributivas. Para isso, precisamos falar de cobertura e de focalização nos extremamente pobres em cada um desses casos.

Os governos da FA, no Uruguai, partiram de um aprendizado institucional e organizacional advindo de gestões anteriores. Nesse sentido, foi mantida a estrutura clássica de transferência de renda existente, destinando a assistência monetária às famílias em situação de pobreza, com filhos menores de 18 anos. Todavia, por meio das AFAM-PE, houve a ampliação da cobertura para os setores mais pobres, com o estabelecimento de novos critérios de acesso, de modo a cobrir todas as famílias vulneráveis. Antes da reforma, o programa abrangia somente crianças em famílias com trabalhadores do setor formal. Com a reforma, o governo abrangeu todas as crianças do país inseridas em domicílios com rendimentos mensais não superiores a seis vezes o valor definido por “Bases de Prestaciones y Contribuciones” (BPC). Há, portanto, uma hiperfocalização na pobreza, mas com princípios de universalização de acesso para todas as famílias que necessitarem desse benefício. Os principais beneficiários são mulheres que vivem sozinhas ou que são chefes de família. Cerca de 141 mil domicílios receberam Renda Cidadã até 2015 (MIDES, Observatório Social de Programas e Indicadores, 2019).

Já na Argentina, o desenho das Asignaciones Familiares, particularmente a AUH, de maneira similar ao caso uruguaio, restringiu-se a crianças de até 18 anos, exceto em caso de pessoas com deficiência. Mas, diferentemente do AFAM-PE, não possui o caráter de universalização do acesso, optando-se, pois, pela focalização entre os mais pobres. Até 2015, o programa cobria cerca de 80% das crianças que se encontravam nessas condições. Ainda, cabe salientar que a Argentina, em termos de definição das ações de combate à pobreza e de redistribuição de renda, se constitui como um caso que se difere dos outros dois, visto que o Uruguai e o Chile construíram PTCR tendo como base uma política nacional, e a Argentina não possui esse padrão. As administrações Kirchner elencaram um conjunto de iniciativas no âmbito nacional, mas elas variam de acordo com os projetos políticos dos governos provinciais, que podem acatar ou incluir pautas redistributivas de acordo com suas visões sobre essa agenda (Cf. Cunha; Cunha; Silva, 2017; Oliveira, 2015OLIVEIRA, E. C. de. Os Programas de Transferência Condicionada de Renda e a Proteção Social: os casos do Brasil, Argentina e Chile. Revista Argumentum, Vitória (ES), v. 7, n. 2, p. 128-142, 2015.).

Finalmente, dentre os três países analisados, o Chile apresenta o menor esforço redistributivo. O principal PTCR, o Chile Solidario, possuía uma cobertura que alcançava cerca de 9% dos domicílios e 11% da população em 2015 (Cf. Oliveira, 2015OLIVEIRA, E. C. de. Os Programas de Transferência Condicionada de Renda e a Proteção Social: os casos do Brasil, Argentina e Chile. Revista Argumentum, Vitória (ES), v. 7, n. 2, p. 128-142, 2015.). As famílias beneficiárias possuem entrada preferencial para alguns programas sociais, como a inclusão de crianças na pré-escola, a participação em programas de emprego e acesso a serviços de reabilitação de drogas e álcool. O Chile Solidário não se pretendeu universal, mas focalizou-se nos extremamente pobres e contribuiu para a evolução da proteção social no país. Esse programa foi desenvolvido concomitantemente com a reforma nos cuidados de saúde, por meio do Plano AUGE (Cf. Pribble, 2013a).

Os dados permitem afirmar que as ações desses governos de esquerda foram substantivamente distintas das dos seus antecessores, mudando a trajetória do principal indicador de desigualdade de renda e diminuindo a pobreza e a extrema pobreza de maneira sensível. Pode-se afirmar, também, que a melhoria desses indicadores foi mais forte na Argentina e no Uruguai do que no Chile, apesar de esse país também apresentar bons resultados na região. Ou seja, aqui, como nas políticas anteriores, o conjunto de fatores analisados mostra que a investida à esquerda, nas reformas de todos os governos analisados, foi contrastante com a de seus antecessores, mas, entre eles, o Chile apresenta menor escala.

CONCLUSÕES

Podemos afirmar que as políticas aqui analisadas tiveram um caráter mais inclusivo no Uruguai, foram um pouco menos abrangentes na Argentina e, de forma geral, tiveram menor alcance no Chile. Apesar da debilidade da esquerda argentina, em função das características discutidas do peronismo, a concentração de poderes na figura do presidente constitui um fator preponderante para se entender sua trajetória nessas políticas. Soma-se a isso a força dos trabalhadores organizados e sindicalizados, muito mais forte do que no Chile, além da proximidade da ação parlamentar, fatores que não são observados no Chile, ou seja, com alta capacidade de mobilização política como herança histórica do peronismo. Assim, observando-se algumas características e tendências das trajetórias políticas específicas nesses países, pode-se entender o porquê de maior estabilidade e governabilidade à esquerda no Uruguai, quando comparadas às do contexto dos países vizinhos, o que permitiu a implementação de uma agenda mais redistributiva e universalista naquele país. A esquerda uruguaia mudou as prioridades relativas à cobertura de proteção social, apresentando uma agenda muito mais redistributiva do que aquela do Chile, por exemplo.

A relação com os sindicatos e os movimentos organizados levou a fortalecê-los, enquanto, no Chile, observamos a minimização da força política desses atores no parlamento. No Chile, apesar da crescente participação das esquerdas dentro da Concertación, a agenda desse governo não mostrou inflexões da mesma métrica que os demais países, a não ser quanto à inovação no uso dos PTCR no combate à pobreza. Para entender isso, é preciso lembrar que a Concertación não foi criada como uma coalizão “de esquerda”, diferentemente da FA no Uruguai, mas foi uma coalizão contra a ditadura. Outro aspecto importante também é o fato de que a formalidade do veto da direita, através dos senadores designados, por exemplo, só foi retirada na reforma constitucional, em 2005 (Cf. Huber; Stephens, 2012HUBER, E.; STEPHENS, J. D. Democracy and the left: social policy and inequality in Latin America. Chicago: The University of Chicago Press, 2012.), mostrando um cenário democrático ainda enviesado no Chile. Essas características ajudam a entender o contexto dessas mudanças segundo as arenas sociais consideradas.

Analisar o conjunto das três políticas traz uma limitação ao trabalho, na medida em que pode levar à uma superficialidade dos temas, que podem ser contemplados por estudos mais aprofundados quando tratados individualmente ou em uma única arena. No entanto, permite refletir no que a esquerda representou nesses casos considerando-se diferentes legados políticos. Os resultados mostram a heterogeneidade desses países, que se diferenciam, mas também o quanto eles apresentam de diferenças nos indicadores sociais quando se estabelecem relações desses governos com seus governos anteriores, mais conservadores.

No caso da educação, os três países partiram de legados muito diferentes em comparação ao desempenho na saúde. Os patamares de investimentos históricos em educação foram altos nos três casos, com boa cobertura, situação oposta ao que ocorreu na saúde. Apesar de, institucionalmente, a presença da esquerda não ter apresentado padrões significativamente distintos dos governos anteriores, no caso da Argentina e do Uruguai pode-se observar que a proporção do gasto público em educação aumentou substantivamente, implicando uma presença maior do Estado, em termos relativos, subsidiando a educação. Nesses dois países, há uma inversão de gasto em educação que não foi a mesma observada no Chile. O legado do Chile era de uma educação predominantemente privada, em contraste com os sistemas públicos universais da Argentina e do Uruguai. Numa visão mais radical do que se entende por governo de esquerda, seria esperada uma mudança desse quadro chileno.

Na área da saúde, o que se observa é que Argentina e o Uruguai apresentaram padrões substantivamente distintos em relação aos governos anteriores, mais conservadores, e mais altos do que no desempenho chileno nessa área. Diferentemente da educação, no âmbito da saúde, parte-se de coberturas e de patamares de investimento muito baixos, herdados dos governos anteriores. Assim, é possível observar uma diferença substantiva dos três países no que se refere ao gasto social em saúde em relação aos respectivos governos antecessores, mesmo no caso do Chile. Entretanto, em todos os casos, o sistema se caracterizava por um modelo fragmentado e segmentado de prestação à saúde e, apesar de haver um esforço superior nesses governos, no Chile, a esquerda se mostra claramente mais tímida em seus esforços do que nos demais países analisados. Novamente, o esforço do Chile é inferior ao dos demais vizinhos. O incremento no gasto per capita é substantivamente maior no Uruguai, que é considerado pela literatura o país mais à esquerda dos três analisados.

Por fim, a esquerda se diferencia fortemente dos governos antecessores em todos os países, especialmente quanto à implementação de programas de transferência condicionada de renda, focalizados na população mais vulnerável, como ação prioritária. Ao invés de programas universais, houve uma estratégia de enfrentamento da pobreza e da desigualdade que produziu efeitos nos três países tanto na queda da pobreza e da extrema pobreza, mas, principalmente, na redução da desigualdade de renda, por seu caráter progressivo, apesar de sabermos que essa também foi uma estratégia de governos conservadores latino-americanos no mesmo período em análise. No Chile, a pobreza e a extrema pobreza mostraram queda, considerando-se o desempenho nos governos anteriores, e a tendência mais redistributiva só foi observada a partir da entrada de governos mais à esquerda, dentro da Concertación. É possível se observar também um maior poder redistributivo das políticas empreendidas na Argentina e no Uruguai.

De forma geral, pode-se afirmar que a esquerda, no Uruguai, alcançou os melhores indicadores. Aí se trata de um governo de esquerda sustentado por um partido de coalizão, que foi se fortalecendo interpartidariamente com uma agenda redistributiva, e que obteve maioria das cadeiras na Câmara Baixa, sendo, portanto, majoritário, o que garantia sua governabilidade. Portanto, há pressão real dentro do sistema político para uma agenda mais redistributiva da esquerda, dada a capacidade mobilização de recursos do poder político dentro daquela arena (Cf. Esping-Andersen, 1985ESPING-ANDERSEN, G. Class Alliances in the development of Scandinavian social democracy. In: Politics Against Markets: the social democratic road to power. Princeton, N.J.: Princeton University Press, 1985. p. 71-115.; Korpi, 1983KORPI, W. The democratic class struggle. London: Routledge, 1983.).

Na Argentina, apesar de haver dificuldade de a literatura classificar ideologicamente o peronismo, parece que a política é matizada em função da força carismática dos presidentes. A classificação ideológica aqui se dá mais pelo representante do partido na presidência do que pela força dos movimentos e partidos de esquerda. Por exemplo, vimos que há muita diferença na condução das políticas na era Menem em relação ao período dos mandatos de Kirchner. A trajetória histórica da política assentada no carisma do presidente, na Argentina, com a concentração do poder em sua figura, facilita a adoção de uma agenda que não é possível no Chile, mesmo com uma coalizão à esquerda eleitoralmente mais forte. Nem a consolidação de partidos à esquerda, tampouco a eleição de Lagos e de Bachelet pelo Partido Socialista, puderam garantir o poder de ação deles, na mesma proporção que a dos Kirchner ou do sistema institucionalizado de poder do Uruguai. Isso poderia ser entendido também pelo fato de que, como dito, a Concertación, em seu nascedouro e também em sua trajetória, diferia substantivamente da Frente Amplia, que nasce e se fortalece pela sua bandeira de esquerda.

De qualquer forma, é importante ressaltar como o legado, distinto em cada arena social, permitiu, na área de saúde, mais margem de manobra para a esquerda se diferenciar dos governos anteriores, o que acontece também nos PTCR. A análise sugere também que somente o partido do presidente (de esquerda) não funcionaria como uma variável explicativa do conjunto das mudanças, pois é necessário entender o perfil da esquerda e como ela se localiza dentro do arcabouço político institucional, ou seja, sua trajetória, seu perfil mais claramente de esquerda ou de uma coalizão contra uma ditadura militar de direita. Sugere também que a presença de sindicatos e mobilizações sem respaldo, dentro do parlamento, pode até levar a comissões deliberativas, mas sem efeitos reais na política, como foi o caso da educação no Chile. Esse caso difere substantivamente da força apresentada pelos sindicatos na Argentina, mesmo com um partido que apresenta um perfil duvidoso dentro de espectro ideológico. Dessa forma, é possível concluir que nenhum fator isoladamente, mas somente a conjunção causal deles nos permite um entendimento melhor das reformas empreendidas.

Quadro 1
– Presidentes e Partidos no Uruguai democrático
Quadro 2
– Presidentes e Partidos na Argentina democrática
Quadro 3
– Presidentes e Partidos no Chile democrático
Tabela 3
– Gasto per capita em saúde (em dólares - preço constante de 2005)

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  • 1
    Fenômeno que reflete o resultado das eleições e a permanência de governos de esquerda em pelo menos dois terços dos países da região.
  • 2
    A formação de alianças ou coalizões partidárias se constitui como uma estratégia institucional para a aprovação das pautas governamentais, visando a reduzir o número de atores com poder de veto. Esse mecanismo institucional permite alcançar maiorias legislativas, e, assim, mantém-se um governo mais estável e coeso, condição propícia para a maximização da agenda presidencial.
  • 3
    De acordo com Antía (2013)ANTÍA, F. et al. La renovación del sistema de protección uruguayo: el desafío de superar la dualización. Revista Uruguaya de Ciencia Política, v. 22, n. SPE, p. 153-174, 2013., 50,8% da população, em 2005, estava coberta pelo subsistema público; 43,6% por alguma IAMC e 2,1% por diferentes seguros privados. Fuentes (2010)FUENTES, G. El sistema de salud uruguayo en la post dictadura: análisis de la reforma del Frente Amplio y las condiciones que la hicieron posible. Revista Uruguaya de Ciencia Política, Uruguay, v. 19, n. 1, p. 119-142, 2010. informa que, em 2006, o subsistema público atendia 38,4% da população de Montevidéu, e o subsistema privado, 57,6%. No interior do país, a situação se invertia, com 59,2% das pessoas atendidas pelo subsistema público e 38,3% nas instituições privadas, o que caracteriza as desigualdades existentes, à época, no acesso ao sistema de saúde do país.
  • 4
    Seguro público de saúde instituído nos anos 1940 no governo de Perón. São autarquias destinadas à assistência à saúde, financiadas a partir de contribuições de empregados e empregadores sobre a folha de salários.
  • 5
    Lei 19.966 do Regimén de Garantias em Salud (Plano AUGE) (2004); Lei 19.937 da Autoridad Sanitaria y Gestión (2004); Lei 20.015 das ISAPRE (2005); e Lei 19.888 do Financiamiento del Gasto Fiscal Representado por el Plan AUGE (2003).
  • 6
    O Ministerio de Desarrollo Social (MIDES), no Uruguai, foi criado no ano de 2005 por meio da Lei 17866 no primeiro mandato de Tabaré Vázquez e tem como finalidade integrar e coordenar as ações sociais intersetoriais destinadas às pessoas ou famílias em situação de vulnerabilidade social e implementadas pelo governo executivo nacional.
  • Na Argentina, a Secretaria de Desarrollo Social foi criada em meados dos anos 1990 e, no final dessa década, se converteu em Ministério, ficando conhecido como Ministerio de Desarrollo Social (MDS) em 2003. Esse Ministério passou a articular, a partir de então, as ações de assistência social no país, inclusive com a gestão nacional das novas PTCR.
  • 7
    Esse Índice foi desenvolvido pelo Instituto de Economia da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade da República (UDELAR) (Midaglia; Tereja, 2016MIDAGLIA, C.; TEREJA, R. Uruguay del Pepe Mujica: los câmbios procesados em el campode la asistencia social. In: BENTANCUR, N.; BUSQUETS, J. M. (Eds.) El decenio progresista: las políticas públicas de Vázquez a Mujica. Montevidéo: Fin de Siglo Editorial, 2016., p. 55).
  • 8
    Gobierno de Chile. Ministerio de Desarrollo Social (2013). http://www.ministeriodesarrollosocial.gob.cl/

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jun 2019
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2019

Histórico

  • Recebido
    16 Out 2017
  • Aceito
    29 Mar 2019
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