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NEOLIBERALISMO AUTORITÁRIO NO BRASIL

AUTHORITARIAN NEOLIBERALISM IN BRAZIL

NÉOLIBÉRALISME AUTORIRAIRE AU BRÉSIL

Resumos

O artigo define neoliberalismo como a construção política da sociedade de mercado, constituindo o modo de regulação ou o regime de governamentalidade predominante na fase atual do capitalismo. Historicamente, o neoliberalismo sempre esteve associado ao esvaziamento da democracia e a estratégias autoritárias. Após a crise de 2008, o neoliberalismo radicalizou suas medidas ao mesmo tempo em que aprofundou o recurso ao autoritarismo, estabelecendo uma diferença de grau que permite afirmar, seguindo a análise de Nancy Fraser (2017), a passagem de uma fase progressista que mantinha práticas autoritárias para uma fase propriamente autoritária do neoliberalismo. Por fim, o artigo busca compreender tal deslocamento de fase na crise da Nova República, admitindo a singularidade do processo de neoliberalização brasileiro. Esta singularidade se deve ao fato de que o neoliberalismo não substituiu completamente outras racionalidades políticas e projetos de regulação previamente existentes, mas se hibridizou com eles, reconfigurando a nossa constelação histórica específica.

Neoliberalismo; Autoritarismo; Esvaziamento da Democracia; Processo de Neoliberalização Singular Brasileiro; Crise da Nova República


This paper defines neoliberalism as the form of regulation or the regime of governmentality predominant in the current phase of capitalism and shows how it has been historically associated with the emptying of democracy and with authoritarian strategies. Then, based on the most recent literature, we show how, after the 2008 crisis, neoliberalism radicalized its measures while it deepened its recourse to authoritarianism, constituting a difference of degree that allows us to affirm, following the analysis of Nancy Fraser (2017), the passage from a progressive phase that maintained authoritarian practices to a properly authoritarian phase of neoliberalism. Finally, we seek to understand this phase shift in the crisis of the Nova República (New Republic), admitting the singularity of the Brazilian neoliberalization process. This singularity is due to neoliberalism not completely replacing other previously existing political rationalities and regulatory projects but hybridizing with them and reconfiguring our specific historical constellation.

Neoliberalism; Authoritarianism; Emptying of Democracy; Singular Brazilian Neoliberalization Process; Crisis of the Nova República (New Republic)


L’article définit le néolibéralisme comme le mode de régulation ou le régime de gouvernementalité prédominant dans la phase actuelle du capitalisme et montre comment il a été historiquement associé à la limitation de la démocratie et aux stratégies autoritaires. Dans la séquence, en s’appuyant sur la littérature la plus récente, on montre comment, après la crise de 2008, le néolibéralisme a radicalisé ses mesures en même temps qu’il a approfondi son recours à l’autoritarisme, constituant une différence de degré qui permet d’affirmer, en suivant l’analyse de Nancy Fraser (2017), le passage d’une phase progressive qui maintenait des pratiques autoritaires à une phase proprement autoritaire du néolibéralisme. Enfin, nous cherchons à comprendre ce changement de phase dans la crise de la Nova República (République Nouvelle), en admettant la singularité du processus de néolibéralisation brésilien. Cette singularité est due au fait que le néolibéralisme n’a pas complètement remplacé les autres rationalités politiques et projets de régulation existants, mais s’est hybridé avec eux et a reconfiguré notre constellation historique spécifique.

Néolibéralisme; Autoritarisme; Limitation de la Démocratie; Processus Singulier de Néolibéralisation Brésilienne; Crise de la Nova República (République Nouvelle)


INTRODUÇÃO

O neoliberalismo pode ser definido como a construção política da sociedade conforme o modelo de mercado. Ele constitui o modo de regulação ou o regime de governamentalidade que se tornou predominante na fase atual do capitalismo, desdobrando-se em diferentes níveis inter-relacionados (Andrade, 2019a; Boyer, 2009BOYER, R. Teoria da regulação: os fundamentos. São Paulo: Estação Liberdade, 2009.; Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Foucault, 2004FOUCAULT, M. Naissance de la biopolitique: cours au collège de France. 1978-1979. Paris: Seuil, Gallimard, 2004.; Lipietz, 1986LIPIETZ, A. New tendencies in the international division of labor: regimes of accumulation and modes of regulation. In: SCOTT, A.; STORPER, M. (ed.). Production, work, and territory: the geographical anatomy of industrial capitalism. Boston: Allen & Unwin, 1986. p. 16-40.).

Primeiro, em escala global ou transnacional, o neoliberalismo corresponde ao modo de governança que procura salvaguardar o capital por meio da construção de mercados – financeiros e comerciais – insulados da interferência política dos Estados nacionais, impedindo ou dificultando o atendimento de demandas democráticas por justiça social ou por igualdade redistributiva (Bruff, 2014BRUFF, I. The rise of authoritarian neoliberalism. Rethinking Marxism, Abingdon, v. 26, n. 1, p. 113-129, 2014., 2016BRUFF, I. Neoliberalism and authoritarianism. In: SPRINGER, S.; BIRCH, K.; MACLEAVY, J. (ed.). The handbook of neoliberalism. New York: Routledge, 2016. p. 107-117.; Schneider; Sandbeck, 2019SCHNEIDER, E.; SANDBECK, S. Monetary integration in the eurozone and the rise of transnational authoritarian statism. Competition & Change, Thousand Oaks, v. 23, n. 2, p. 138-164, 2019.; Slobodian, 2018SLOBODIAN, Q. Globalists: the end of empire and the birth of neoliberalism. Cambridge: Harvard University Press, 2018.). Mas essa ordenação do espaço econômico do capitalismo mundial por meio do desenho de instituições, organismos e do direito internacional – Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, Organização Mundial do Comércio (OMC), Banco Central Europeu, União Europeia, Tratado Norte-Americano de Livre-Comércio (Nafta) etc. – não esvazia os Estados nacionais, antes os coloca em concorrência entre si e lhes confere um novo papel (Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.; Hirsch, 2010HIRSCH, J. Teoria materialista do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 2010.; Mascaro, 2013MASCARO, A. L. Estado e forma política. São Paulo: Boitempo, 2013.).

Na segunda escala, os Estados corroboram legal e institucionalmente o encapsulamento dos mercados no âmbito nacional, integrando-os à concorrência externa. Com isso, o Estado ajuda a construir a concorrência à qual ele próprio se submete, ganhando um novo objetivo: gerar condições de competitividade de modo a atrair investimentos de capital. Esse novo objetivo transforma o Estado e o mantém muito ativo, justificando a ação pública por meio de termos comutáveis com os do mercado, conforme critérios de custo-benefício e investimento e retorno de suas intervenções (Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.). Em função desse “tribunal econômico permanente” (Foucault, 2004FOUCAULT, M. Naissance de la biopolitique: cours au collège de France. 1978-1979. Paris: Seuil, Gallimard, 2004., p. 253), o mercado opera não como um limite para o Estado, mas como o fundamento de sua legitimidade e como o princípio de racionalidade política que o guia, estendendo a grade de leitura econômica para governar os mais variados fenômenos sociais (Brown, 2003BROWN, W. Les habits neufs de la politique mondiale: néolibéralisme et néo-conservatisme. Paris: Les Prairies Ordinaires, 2003.; Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.; Foucault, 2004FOUCAULT, M. Naissance de la biopolitique: cours au collège de France. 1978-1979. Paris: Seuil, Gallimard, 2004.).

O próprio Estado se reforma com base no modelo de mercado, introduzindo, por meio da reforma gerencialista, a concorrência administrada e a lógica de gestão flexível da empresa privada no âmbito da administração pública (Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.). O desenho das políticas públicas passa a incorporar dispositivos microeconômicos de medição, avaliação e ranqueamento, com os indicadores quantitativos jogando o mesmo papel supostamente transparente e objetivo do sistema de preços (Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.). Por pressupor maior eficiência das empresas, o Estado terceiriza a prestação de diversos serviços, constrói “quase-mercados” e se torna permeável a agentes privados na coprodução de legislações, normas, agendas e formulações de políticas (Crouch, 2013a, 2013b; Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Le Grand, 1991LE GRAND, J. Quasi-markets and social policy. The Economic Journal, [s. l.], v. 101, n. 408, p. 1256-1267, 1991.).

O Estado não abdica da gestão da população no que concerne à educação, à saúde, à seguridade, ao transporte, à habitação ou ao emprego. Mas sua lógica de gestão se desloca da garantia de direitos sociais em nome da dignidade humana, constituindo uma esfera de cidadania resguardada do mercado, para se converter em uma estratégia de investimento em capital humano (Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.). A cidadania é submetida, assim, à lógica econômica, com os gastos sendo racionalizados conforme critérios de eficiência e retorno para o desenvolvimento e competitividade do país, e com as condicionalidades de acesso a direitos disciplinando os beneficiários na lógica empresarial do investimento em si mesmo. Com isso, o valor da dignidade humana é substituído pelo valor econômico da existência humana. Se certas políticas buscam construir uma conciliação entre os dois valores, outras claramente descartam o primeiro em favor do segundo.

Nesse novo registro, o governo da população se dá para e pelo mercado. Para o mercado, buscando converter a população em recursos rentáveis de modo a atrair fluxos de investimento. A estratégia é operar recortes visando integrar uma parte da população via qualificação competitiva e outra via rebaixamento do custo do trabalho, descartando e gerindo violentamente os grupos não aproveitáveis pelos circuitos globais de valorização (Christiaens, 2019CHRISTIAENS, T. Financial neoliberalism and exclusion with and beyond Foucault. Theory, Culture & Society, Thousand Oaks, v. 36, n. 4, p. 95-116, 2019.; Ong, 2006ONG, A. Neoliberalism as exception: mutations in citizenship and sovereignty. Durham: Duke University Press, 2006.; Peck; Theodore; Brenner, 2012; Sassen, 2014SASSEN, S. Expulsions: brutality and complexity in the global economy. Cambridge: Harvard University Press, 2014.; Wacquant, 2012WACQUANT, L. Três etapas para uma antropologia histórica do neoliberalismo realmente existente. Caderno CRH, Salvador, v. 25, n. 66, p. 505-518, 2012.). Pelo modelo de mercado, introduzindo situações de concorrência tanto no mercado de trabalho quanto em esferas da vida fora do mercado com a finalidade de governar as condutas e de construir subjetividades (Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.).

É preciso notar que a reforma neoliberal dos Estados não substitui necessariamente outras racionalidades políticas e projetos de regulação previamente existentes. Antes, a lógica neoliberal passa a compor e a reconfigurar constelações históricas específicas, definindo processos singulares de neoliberalização (Ong, 2006ONG, A. Neoliberalism as exception: mutations in citizenship and sovereignty. Durham: Duke University Press, 2006.; Peck, 2010PECK, J. Constructions of neoliberal reason. Oxford: Oxford University Press, 2010.; Peck; Theodore; Brenner, 2012).

O neoliberalismo se dá, por fim, em uma terceira escala, que é a da vida cotidiana. Seja por meio da construção de mercados, seja por meio da introdução da lógica do mercado em instituições e esferas da vida fora dele, o neoliberalismo se define como um modelo normativo de sociedade e de subjetividade. É, sobretudo, por meio de práticas de gestão pela concorrência, que redefinem as formas de organização e controle do trabalho em empresas e nas mais diversas instituições, que o neoliberalismo se generaliza no mundo social. Os indivíduos, submetidos a situações de concorrência por toda parte e ameaçados pelo desemprego em um mercado de trabalho com vínculos precários, acabam por aderir à lógica gerencial na maneira como lidam com suas próprias vidas. É preciso que cada sujeito realize investimentos em si mesmo, zele pela própria disciplina e faça seu marketing pessoal se quiser sobreviver no jogo. Cada indivíduo acaba, assim, por se tornar empreendedor de si mesmo, estendendo o cálculo econômico para todas as esferas da vida, inclusive para as mais pessoais, que passam a ser lidas como áreas de investimento e de oportunidade de negócios. Nessa lógica empreendedora, a livre iniciativa se converte em obrigação de desempenho, ultrarresponsabilizando o indivíduo por seu destino, enquanto o Estado é parcialmente eximido de garantir direitos sociais (Bourdieu, 1998BOURDIEU, P. Contrafogos: táticas para enfrentar a invasão neoliberal. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.; Brown, 2003BROWN, W. Les habits neufs de la politique mondiale: néolibéralisme et néo-conservatisme. Paris: Les Prairies Ordinaires, 2003.; Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Gorz, 2005GORZ, A. O imaterial: conhecimento, valor e capital. São Paulo: Annablume, 2005.). Constitui-se, assim, uma subjetividade competitiva e uma cultura empreendedora que reduzem a existência quase que exclusivamente à esfera privada, em que todas as respostas devem ser buscadas no âmbito individual, familiar e empresarial. A cultura e a subjetivação neoliberais também se hibridizam com outras culturas, práticas e visões de mundo locais, com arranjos populares singulares que podem incluir, por exemplo, concepções religiosas e práticas de magia que visam conjurar a riqueza (Comaroff, J.; Comaroff, J. L., 2000).

No neoliberalismo, portanto, o modelo de mercado, baseado na concorrência e na forma-empresa, opera como norma central que organiza politicamente o conjunto da sociedade (Andrade; Ota, 2015ANDRADE, D. P.; OTA, N. K. Uma alternativa ao neoliberalismo: entrevista com Pierre Dardot e Christian Laval. Tempo Social, São Paulo, v. 27, n. 1, p. 275-316, 2015.; Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.). Justamente por se converterem em valores, a concorrência de mercado e o empreendedorismo podem ser idealizados e reafirmados como soluções universais, inclusive para problemas que o seu próprio funcionamento desencadeia. Essa dupla norma molda organismos internacionais, quadros legais, Estados, instituições, políticas públicas, estilos de gestão empresarial e subjetividades, conformando as condutas e as relações do indivíduo consigo próprio e com os outros. É nesse sentido que o neoliberalismo é a “norma de vida” que molda a “forma [social] da nossa existência”, constituindo-se como a “razão do capitalismo contemporâneo” (Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009., p. 5-6).

Definido dessa forma, o neoliberalismo sempre apresentou uma relação de desconfiança em relação à democracia, buscando esvaziá-la de seu conteúdo de soberania popular (Ballestrin, 2019BALLESTRIN, L. M. A. Post-democracy and neoliberalism in contemporary Latin America: the rise of the left turns and the brazilian democratic failure. In: PUZONE, V.; MIGUEL, L. F. (ed.). The brazilian left in the 21st century: conflict and conciliation in peripheral capitalism. New York: Palgrave Macmillan, 2019. p. 259-283.; Brown, 2015BROWN, W. Undoing the demos: neoliberalism’s stealth revolution. New York: Zone Books, 2015., 2019BROWN, W. In the ruins of neoliberalism: the rise of antidemocratic politics in the west. New York: Columbia University Press, 2019.; Dardot et al., 2021DARDOT, P. et al. La choix de la guerre civile: une autre histoire du néolibéralisme. Québec: Lux Éditeur, 2021.; Dardot; Laval, 2016DARDOT, P.; LAVAL, C. Ce cauchemar qui n’en finit pas: comment le néolibéralisme défait la démocratie. Paris: La Découverte, 2016.). As demandas democráticas foram tomadas como ameaças à liberdade de mercado, devendo, pois, ser limitadas jurídica e institucionalmente. O Estado neoliberal, de fato, não se propõe a ser o universal representante do povo, já que a ideia de sociedade é questionada, assim como a de representação. A função do Estado passa a ser a de organizar mercados e a sociedade de mercado, convertendo as empresas nas verdadeiras unidades sociais e criando as condições de possibilidade para a racionalidade e o investimento econômico (Andrade, 2019b; Brown, 2003BROWN, W. Les habits neufs de la politique mondiale: néolibéralisme et néo-conservatisme. Paris: Les Prairies Ordinaires, 2003.). A questão da representatividade é heterogênea à lógica neoliberal. Ela pertence à racionalidade política liberal clássica denominada por Foucault (2004)FOUCAULT, M. Naissance de la biopolitique: cours au collège de France. 1978-1979. Paris: Seuil, Gallimard, 2004. de “jurídico-revolucionária”, sendo a democracia liberal uma extensão dessa tradição. Mas isso não impede o neoliberalismo de afirmar que a democracia, desde que limitada e reduzida à lógica econômica, é o modelo mais adequado à sociedade de mercado. Ou seja, a democracia é convertida em um mercado eleitoral de cidadãos-consumidores para selecionar gestores do Estado-empresa, impedindo, dessa forma, a escolha de outro modelo de sociedade (Mirowski, 2013MIROWSKI, P. Never let a serious crises go to waste: how neoliberalism survived the financial meltdown. London: Verso, 2013.).

Além de esvaziar a democracia, o neoliberalismo sempre recorreu a estratégias autoritárias. As práticas autoritárias foram pensadas como recursos para a implementação, manutenção e aprofundamento do neoliberalismo. Elas foram mobilizadas para fazer a mudança política inicial, adaptar a população ao mercado, rebaixar continuamente os custos do trabalho, desmontar direitos sociais, gerir a desigualdade e a pobreza, reprimir os que se mobilizam politicamente contra o neoliberalismo e lidar com os grupos vistos como excedentes que ameaçam a segurança e a lucratividade da população. O neoliberalismo opera, assim, uma “ violência conservadora da ordem de mercado contra a democracia e a sociedade” em nome de uma visão de civilização “que repousaria principalmente sobre a liberdade e a responsabilidade individual do cidadão-consumidor” (Dardot et al., 2021DARDOT, P. et al. La choix de la guerre civile: une autre histoire du néolibéralisme. Québec: Lux Éditeur, 2021., p. 21-22). A aplicação de práticas autoritárias também pode ocorrer como extensão de estratégias de competitividade por outros meios, seja reativando o nacionalismo em nome de disputas comerciais no mercado global ou mobilizando formas de discriminação, de poder e de controle sobre os concorrentes em mercados locais (Dardot; Laval, 2019DARDOT, P.; LAVAL, C. Anatomía del nuevo neoliberalismo. Viento Sur, [s. l.], n. 164, p. 5-16, 2019..; Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.; Slobodian, 2021). Por isso, o neoliberalismo produz e gere continuamente táticas diferenciadas e múltiplas em nível nacional e local, valendo-se para tanto da força do Estado, da criação de leis criminais e de alianças dos mais diferentes tipos entre coalizões oligárquicas e certos grupos da população, instrumentalizando linhas de clivagem historicamente existentes de maneira a defender os interesses capitalistas (Dardot et al., 2021DARDOT, P. et al. La choix de la guerre civile: une autre histoire du néolibéralisme. Québec: Lux Éditeur, 2021.). Essas práticas autoritárias não necessariamente excluem a democracia, podendo conviver com sua versão esvaziada na constituição do projeto neoliberal.

O neoliberalismo é um tema simultaneamente global e local. Por isso, para pensar a relação histórica do neoliberalismo com o autoritarismo e, mais particularmente, a nova fase do neoliberalismo, que intensificou as estratégias autoritárias depois da crise de 2008, é importante partir de uma bibliografia internacional já consolidada. Em seguida, é preciso observar como a forma social do neoliberalismo autoritário se desenvolveu localmente de maneira tentacular em processos híbridos, singulares e imprevisíveis. Há, de fato, a necessidade de que a investigação se desenvolva de maneira histórica e geograficamente localizada. Eis, então, a proposta deste dossiê de ajustar as lentes analíticas para pensar a realidade brasileira, tendo por mote as transformações recentes que combinam a radicalização neoliberal com uma nova onda autoritária. Esta apresentação é então concluída traçando algumas pistas de como a relação entre neoliberalismo, democracia e autoritarismo se estabeleceu de maneira historicamente singular na Nova República e quais mudanças, deslocamentos e continuidades ocorreram na sua crise recente.

NEOLIBERALISMO, ESVAZIAMENTO DA DEMOCRACIA E AUTORITARISMO

Historicamente, o neoliberalismo desenvolveu tanto práticas autoritárias inerentes à sua lógica, quanto se associou a outras racionalidades políticas igualmente autoritárias (Fabry; Sandbeck, 2019FABRY, A.; SANDBECK, S. Introduction to special issue on ‘authoritarian neoliberalism’. Competition & Change, Thousand Oaks, v. 23, n. 2, p. 109-115, 2019.). Por autoritarismo se deve compreender não apenas o uso da força bruta coercitiva – golpes militares, policiamento de manifestações, retórica política racista etc. –, mas também “a reconfiguração do Estado e do poder institucional numa tentativa de insular certas políticas e práticas institucionais do dissenso político e social” (Bruff, 2014BRUFF, I. The rise of authoritarian neoliberalism. Rethinking Marxism, Abingdon, v. 26, n. 1, p. 113-129, 2014., p. 115). Nesse sentido amplo, são exemplos de neoliberalismo autoritário: a) a reivindicação de um Estado forte e blindado dos interesses de classe feita pelos ordoliberais; b) a difusão do modelo neoliberal por meio de golpes militares e de ditaduras; c) as políticas sociais condicionadas de caráter disciplinador para o mercado ( workfare ); d) a gestão penal da pobreza e dos problemas urbanos e o encarceramento em massa, que frequentemente acompanham as reformas estruturais ( prisonfare ); e) a doutrina do choque, que se vale da desorientação da população gerada por crises profundas e/ou por desastres naturais, de maneira a fazer passar medidas neoliberalizantes como respostas urgentes aos problemas enfrentados; f) a repressão a sindicatos e manifestações populares e a criminalização dos movimentos sociais; g) a construção de inimigos internos, materializados em certas minorias e em grupos oposicionistas, considerados “comunistas” ou “corruptos”; h) a expulsão de grupos excedentes que ameaçam prejudicar a rentabilidade da população; i) o esvaziamento progressivo do poder dos representantes eleitos e a transferência das decisões públicas para gestores e/ou atores de mercado na reforma gerencialista do Estado; j) a definição da “boa governança” estatal por agências de rating privadas e por organismos internacionais, como o FMI e o Banco Mundial; k) o enfraquecimento das instâncias nacionais de participação democrática com a transferência de decisões políticas fundamentais, especialmente no campo econômico, para o âmbito internacional; l) a subordinação antidemocrática do Estado às regras constitucionais e legais apresentadas como necessárias à busca da prosperidade econômica; m) o recurso argumentativo a circunstâncias materiais imediatas como desculpa para o Estado não reverter processos de desigualdade socioeconômica; n) a recalibragem das atividades viáveis e apropriadas para instituições não mercadológicas, como sindicatos, de maneira a diminuir expectativas; o) o ataque à ideia de bem comum como totalitária, o esvaziamento da esfera pública e da noção de justiça social e a redução da cidadania à despolitizadora responsabilidade dos empreendedores de si mesmos (Brown, 2003BROWN, W. Les habits neufs de la politique mondiale: néolibéralisme et néo-conservatisme. Paris: Les Prairies Ordinaires, 2003., 2015BROWN, W. Undoing the demos: neoliberalism’s stealth revolution. New York: Zone Books, 2015., 2019BROWN, W. In the ruins of neoliberalism: the rise of antidemocratic politics in the west. New York: Columbia University Press, 2019.; Bruff, 2014BRUFF, I. The rise of authoritarian neoliberalism. Rethinking Marxism, Abingdon, v. 26, n. 1, p. 113-129, 2014., 2016BRUFF, I. Neoliberalism and authoritarianism. In: SPRINGER, S.; BIRCH, K.; MACLEAVY, J. (ed.). The handbook of neoliberalism. New York: Routledge, 2016. p. 107-117.; Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009., 2016DARDOT, P.; LAVAL, C. Ce cauchemar qui n’en finit pas: comment le néolibéralisme défait la démocratie. Paris: La Découverte, 2016.; Christiaens, 2019CHRISTIAENS, T. Financial neoliberalism and exclusion with and beyond Foucault. Theory, Culture & Society, Thousand Oaks, v. 36, n. 4, p. 95-116, 2019.; Crouch, 2013a, 2013b; Harvey, 2008HARVEY, D. O neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Loyola, 2008.; Hirsch, 2010HIRSCH, J. Teoria materialista do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 2010.; Sassen, 2014SASSEN, S. Expulsions: brutality and complexity in the global economy. Cambridge: Harvard University Press, 2014.; Wacquant, 2012WACQUANT, L. Três etapas para uma antropologia histórica do neoliberalismo realmente existente. Caderno CRH, Salvador, v. 25, n. 66, p. 505-518, 2012.).

A relação entre neoliberalismo e autoritarismo não é, portanto, simples nem recente. O pensamento neoliberal ficou conhecido por criticar o nazi-fascismo, mas ainda antes se constituiu por oposição às experiências democráticas e de regulação social da economia ocorridas na Áustria e na República de Weimar (Dardot et al, 2021; Peck, 2010PECK, J. Constructions of neoliberal reason. Oxford: Oxford University Press, 2010.). Alçando a liberdade econômica à condição de pré-requisito das demais formas de liberdade, os neoliberais acreditavam que a intervenção estatal na economia levaria ao desequilíbrio de mercado, o que demandaria novas intervenções para correções indefinidas que acabariam inevitavelmente no totalitarismo. Mas Hayek (1984)HAYEK, F. The principles of a liberal social order. In: NISHIYAMA, C.; LEUBE, K. (ed.). The essence of Hayek. Stanford: Hoover Institution Press, 1984. p. 363-381. diferenciava o totalitarismo de autoritarismo, admitindo a combinação do neoliberalismo com este último e uma relação contingente com a democracia:

[Neo] Liberalismo e democracia, embora compatíveis, não são a mesma coisa. O primeiro diz respeito à extensão do poder governamental, o segundo a quem dispõe desse poder. A diferença é mais bem percebida se se consideram seus opostos: o oposto do [neo]liberalismo é o totalitarismo, enquanto o oposto da democracia é o autoritarismo. Por consequência, é em última instância possível por princípio que um governo democrático seja totalitário e que um governo autoritário aja de acordo com princípios [neo] liberais (Hayek, 1984HAYEK, F. The principles of a liberal social order. In: NISHIYAMA, C.; LEUBE, K. (ed.). The essence of Hayek. Stanford: Hoover Institution Press, 1984. p. 363-381., p. 364).

De uma perspectiva teórica, a desconfiança em relação à democracia de massas e a admissão do autoritarismo como estratégia de implantação ou de manutenção da ordem de mercado estiveram presentes nas diferentes correntes do neoliberalismo. Tal posição fica clara na aceitação de uma “ditadura transicional” por um autor da Escola Austríaca, como Hayek (1978HAYEK, F. Freedom of choice. The Times, London, 3 ago. 1978., 1981HAYEK, F. Friedrich von Hayek: de la servidumbre a la libertad. El Mercurio, Santiago, 19 abr. 1981.). Eis a defesa paradoxal de uma operação “alquímica” do neoliberalismo autoritário, em que uma ditadura violenta como a de Pinochet seria capaz de abrir o caminho para as liberdades individuais (Farrant; McPhail, 2014FARRANT, A.; MCPHAIL, E. Can a dictator turn a constitution into a can-opener? F. A. Hayek and the alchemy of transitional dictatorship in Chile. Review of Political Economy, London, v. 26, n. 3, p. 331-348, 2014.). Mesmo “paleoliberais” como Ludwig Von Mises, mais próximos da visão liberal clássica do laissez-faire e do Estado mínimo, acreditavam que a “liberdade custava um preço”, o que justificava gastos públicos com “um aparato governamental de cortes, policiais, prisões e forças armadas” (Mises, 1963, p. 282). Na equação do ordoliberalismo, a proposta neoliberal era a de uma política de livre mercado e Estado forte, de modo a levar adiante uma guerra pela concorrência e contra a igualdade (Dardot et al., 2021DARDOT, P. et al. La choix de la guerre civile: une autre histoire du néolibéralisme. Québec: Lux Éditeur, 2021.).

Se a democracia limitada foi enunciada como o método mais adequado para a sociedade de mercado por manter a liberdade política, sendo o autoritarismo um recurso extraordinário, mas sempre disponível, é preciso entender como o neoliberalismo definiu instrumentos para impedir a escolha eleitoral de outro modelo político-social (Mirowski, 2013MIROWSKI, P. Never let a serious crises go to waste: how neoliberalism survived the financial meltdown. London: Verso, 2013.). A ideia de uma constituição econômica que entroniza juridicamente a política econômica neoliberal, tal como proposto pelos ordoliberais, ou a limitação do poder de legislar por um direito privado que o Estado impõe a si próprio, como se fosse uma empresa, na visão de Hayek, são duas maneiras de tirar da decisão democrática a opção de sair do modelo de mercado (Andrade, 2019b; Dardot; Laval, 2016DARDOT, P.; LAVAL, C. Ce cauchemar qui n’en finit pas: comment le néolibéralisme défait la démocratie. Paris: La Découverte, 2016.).

No Brasil, os pensadores neoliberais igualmente reconheceram a democracia como a melhor forma de governo, mas a relegaram a uma realidade futura. A concepção demofóbica e aporofóbica de um povo atrasado, desprovido dos valores cristãos e capitalistas, levava a uma grande desconfiança da participação política ampliada. A única maneira de civilizar o povo seria por meio de um governo autoritário ou oligárquico que resistisse às pressões populares e focasse nas questões financeiras e econômicas. Esse governo autoritário seria capaz de promover a escola dura e às vezes cruel da concorrência, o aumento da produtividade e o progresso econômico, cessando, assim, com a imaturidade atribuída ao povo. Daí a defesa neoliberal de uma oligarquia censitária ou da tutela militar como poder moderador, o que explica a defesa e/ou adesão de bastiões do neoliberalismo como Eugênio Gudin e Roberto Campos à Ditadura Militar. A ditadura era vista como um expediente transitório com a função de exorcizar o fantasma do socialismo e de adaptar a democracia à economia de mercado, “civilizando” o país por meio de um choque de capitalismo (Lynch, 2021LYNCH, C. “Nada de novo sob o sol”: teoria e prática do neoliberalismo brasileiro. Insight Inteligência, Rio de Janeiro, n. 91, 2021. Disponível em https://inteligencia.insightnet.com.br/nada-de-novo-sob-o-sol-teoria-e-pratica-do-neoliberalismo-brasileiro/ . Acesso em: 6 out. 2021.
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).

No âmbito de sua instauração prática, as ações repressivas dos Estados foram marcos históricos importantes na disseminação do neoliberalismo. Exemplos importantes foram as derrotas impostas a greves, como a dos controladores de voo, no governo Reagan, em 1981, dos mineiros, no governo Thatcher, entre 1984 e 1985, dos operários da Companhia Siderúrgica Nacional, em 1988, e dos petroleiros, no governo Fernando Henrique Cardoso, em 1995 (Harvey, 2008HARVEY, D. O neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Loyola, 2008.).

Os estudiosos do “neoliberalismo realmente existente” são unânimes em constatar que a retórica do Estado mínimo nunca passou de propaganda ideológica para o público mais amplo (Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.; Harvey, 2008HARVEY, D. O neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Loyola, 2008.; Hirsch, 2010HIRSCH, J. Teoria materialista do Estado. Rio de Janeiro: Renovar, 2010.; Peck, 2010PECK, J. Constructions of neoliberal reason. Oxford: Oxford University Press, 2010.; Peck; Theodore; Brenner, 2012; Mirowski, 2013MIROWSKI, P. Never let a serious crises go to waste: how neoliberalism survived the financial meltdown. London: Verso, 2013.; Wacquant, 2012WACQUANT, L. Três etapas para uma antropologia histórica do neoliberalismo realmente existente. Caderno CRH, Salvador, v. 25, n. 66, p. 505-518, 2012.). A despeito das especificidades históricas de cada formação estatal, os processos de neoliberalização sempre demandaram um Estado forte e ativo na consecução de seus objetivos, como na construção institucional e legal de mercados blindados das demandas democráticas, na promoção da concorrência interna e da competitividade econômica internacional, no impulsionamento de “um bom clima de negócios”, na transferência direta ou indireta de renda para os estratos superiores, na espoliação de bens públicos e comuns e na disseminação da norma da concorrência e da forma-empresa para esferas da vida além do próprio mercado (Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.; Harvey, 2008HARVEY, D. O neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Loyola, 2008.; Peck, 2010PECK, J. Constructions of neoliberal reason. Oxford: Oxford University Press, 2010.; Slobodian, 2018SLOBODIAN, Q. Globalists: the end of empire and the birth of neoliberalism. Cambridge: Harvard University Press, 2018.). No seu papel político fundamental de construção normativa da sociedade em torno do modelo de mercado, o Estado neoliberal igualmente precisou assumir a gestão coercitiva da pobreza e da desigualdade e promover o enfrentamento daqueles que questionam suas medidas, apresentando o constante crescimento do seu braço penal e transformando as políticas sociais em políticas disciplinares (Bruff, 2016BRUFF, I. Neoliberalism and authoritarianism. In: SPRINGER, S.; BIRCH, K.; MACLEAVY, J. (ed.). The handbook of neoliberalism. New York: Routledge, 2016. p. 107-117.; Dardot et al., 2021DARDOT, P. et al. La choix de la guerre civile: une autre histoire du néolibéralisme. Québec: Lux Éditeur, 2021.; Harvey, 2008HARVEY, D. O neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Loyola, 2008.; Wacquant, 2012WACQUANT, L. Três etapas para uma antropologia histórica do neoliberalismo realmente existente. Caderno CRH, Salvador, v. 25, n. 66, p. 505-518, 2012.).

A associação do neoliberalismo com práticas autoritárias e de anulação da soberania popular não são uma especificidade do atual momento histórico (Fabry; Sandbeck, 2019FABRY, A.; SANDBECK, S. Introduction to special issue on ‘authoritarian neoliberalism’. Competition & Change, Thousand Oaks, v. 23, n. 2, p. 109-115, 2019.). A defesa da liberdade, valor tão propalado entre seus adeptos, foi reduzida primordialmente à liberdade econômica de empreender e de consumir, sendo definida de maneira tautológica conforme a própria concepção de mercado (Mirowski, 2013MIROWSKI, P. Never let a serious crises go to waste: how neoliberalism survived the financial meltdown. London: Verso, 2013.). Nesse sentido, o neoliberalismo não apenas substituiu ocasionalmente a democracia pelo autoritarismo, mas também promoveu combinações variadas entre modelo de mercado, democracia esvaziada, liberdade econômica – em especial para o andar de cima – e práticas autoritárias.

NOVA FASE DO NEOLIBERALISMO PÓS-CRISE DE 2008 E A ONDA AUTORITÁRIA

A crise financeira de 2008 abriu um novo capítulo do neoliberalismo. Após o breve período em que governos gastaram vultosos recursos para salvar grandes agentes financeiros, transformando os prejuízos privados em dívida pública, ocorreu o aprofundamento de medidas de austeridade e de reformas estruturais. Para que o peso da dívida recaísse sobre aqueles que não foram os responsáveis por contraí-la, foi preciso intensificar e inovar as estratégias autoritárias de governo. Essa volta adicional no parafuso, comprimindo ainda mais as formas de poder e a condição de vida da população, marcou a passagem para uma nova fase do neoliberalismo. Os diagnósticos da fase autoritária do neoliberalismo partem de duas principais vertentes teóricas. Primeiro, das análises marxistas e regulacionistas inspiradas nos conceitos de “estatismo autoritário” de Poulantzas (1978)POULANTZAS, N. State, power, socialism. London: New Left Books, 1978. e de “populismo autoritário” de Hall (1979)HALL, S. The great moving right show. Marxism Today, London, p. 14-20, 1979., como no caso dos vários trabalhos que vieram na esteira do artigo de Bruff (2014)BRUFF, I. The rise of authoritarian neoliberalism. Rethinking Marxism, Abingdon, v. 26, n. 1, p. 113-129, 2014.. Segundo, das atualizações da análise de Foucault em seu curso Nascimento da biopolítica (2004), em que o autor analisa o neoliberalismo como uma forma histórica de governamentalidade (Brown, 2019BROWN, W. In the ruins of neoliberalism: the rise of antidemocratic politics in the west. New York: Columbia University Press, 2019.; Dardot; Laval, 2019DARDOT, P.; LAVAL, C. Anatomía del nuevo neoliberalismo. Viento Sur, [s. l.], n. 164, p. 5-16, 2019..; Dean, 2019DEAN, M. Rogue neoliberalism, liturgical power, and the search for a left governmentality. The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 325-342, 2019.; Dardot et al., 2021DARDOT, P. et al. La choix de la guerre civile: une autre histoire du néolibéralisme. Québec: Lux Éditeur, 2021.).

No entanto, não há consenso no debate internacional sobre o ganho de se distinguir uma nova fase com base em uma virada autoritária. Os defensores dessa tese, reconhecendo o vínculo pregresso do neoliberalismo com o autoritarismo, argumentam que ainda assim seria possível falar de uma mudança de grau com o neoliberalismo abrindo mão progressivamente de sua imagem liberal ou democrática e com a ascensão eleitoral da extrema-direita (Dardot; Laval, 2019DARDOT, P.; LAVAL, C. Anatomía del nuevo neoliberalismo. Viento Sur, [s. l.], n. 164, p. 5-16, 2019..; Fabry; Sandbeck, 2019FABRY, A.; SANDBECK, S. Introduction to special issue on ‘authoritarian neoliberalism’. Competition & Change, Thousand Oaks, v. 23, n. 2, p. 109-115, 2019.). Segundo Bruff (2016BRUFF, I. Neoliberalism and authoritarianism. In: SPRINGER, S.; BIRCH, K.; MACLEAVY, J. (ed.). The handbook of neoliberalism. New York: Routledge, 2016. p. 107-117., p. 107), “embora o neoliberalismo, juntamente com vertentes de pensamento mais clássicas de ‘livre mercado’, tenha sempre contido tendências autoritárias, elas tornaram-se significativamente mais proeminentes desde a eclosão da crise capitalista global de 2008”. Segundo Peck e Theodore (2019)PECK, J.; THEODORE, N. Still neoliberalism? The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 245-265, 2019., como as reformas e medidas de austeridade pós-crise se deram no contexto de países já reestruturados e neoliberalizados, não em Estados recém-saídos da social-democracia, do keynesianismo ou do desenvolvimentismo, essas transformações não estavam mais em condições de prometer o suposto “paraíso” do livre mercado nem de buscar o consenso democrático. Vincularam-se, assim, às políticas reacionárias e unilaterais que reafirmaram formas de dominação e depositaram o peso das reformas sobre populações já vulnerabilizadas. Foi assim que as medidas pós-crise deram origem a fenômenos que caracterizaram o aprofundamento autoritário.

Em primeiro lugar, ampliou-se a constitucionalização e a legalização da política econômica em nível nacional ou supranacional – por exemplo, pelo Banco Central Europeu –, realizadas sempre em nome da necessidade e da urgência frente à crise. Paralelamente, moralizou-se a crise global, colocando a culpa pela dívida no dispêndio dos Estados e das famílias, e normalizou-se transações financeiras ilícitas ao estilo Panamá Papers. Devido a este novo estado de legalidade (Dardot; Laval, 2019DARDOT, P.; LAVAL, C. Anatomía del nuevo neoliberalismo. Viento Sur, [s. l.], n. 164, p. 5-16, 2019..; Harcourt, 2018HARCOURT, B. E. The counterrevolution: how our government went to war against its own citizens. New York: Basic Books, 2018.), os representantes eleitos são impedidos de alterar as linhas centrais do neoliberalismo. A democracia deixou de ser, assim, uma forma de pactuação social para se reduzir a um mero método de escolha no mercado eleitoral de gestores de um modelo econômico entronizado juridicamente (Bruff, 2014BRUFF, I. The rise of authoritarian neoliberalism. Rethinking Marxism, Abingdon, v. 26, n. 1, p. 113-129, 2014.; Dardot; Laval, 2016DARDOT, P.; LAVAL, C. Ce cauchemar qui n’en finit pas: comment le néolibéralisme défait la démocratie. Paris: La Découverte, 2016.; Fabry; Sandbeck, 2019FABRY, A.; SANDBECK, S. Introduction to special issue on ‘authoritarian neoliberalism’. Competition & Change, Thousand Oaks, v. 23, n. 2, p. 109-115, 2019.; Mirowski, 2013MIROWSKI, P. Never let a serious crises go to waste: how neoliberalism survived the financial meltdown. London: Verso, 2013.; Schneider; Sandbeck, 2019SCHNEIDER, E.; SANDBECK, S. Monetary integration in the eurozone and the rise of transnational authoritarian statism. Competition & Change, Thousand Oaks, v. 23, n. 2, p. 138-164, 2019.). No caso brasileiro, são vários os exemplos desse novo estado de legalidade após o impeachment de Dilma Rousseff, como as importantes emendas constitucionais e leis complementares que foram aprovadas nos governos de Michel Temer e de Jair Bolsonaro: teto dos gastos públicos, reforma trabalhista, liberdade econômica, reforma da previdência, autonomia do Banco Central, entre outras.

Em segundo lugar, a consequente corrosão da representatividade política e o declínio dos partidos de massa abriram caminho para a ascensão de outsiders ligados à extrema-direita com um discurso superficialmente antissistema. Os votos de protesto vieram de uma multidão de perdedores com condições de vida deterioradas e sem pontos de apoio e referência coletivos (Brown, 2019BROWN, W. In the ruins of neoliberalism: the rise of antidemocratic politics in the west. New York: Columbia University Press, 2019.). O populismo reacionário canalizou o ressentimento social gerado pela desigualdade, precariedade, desemprego, endividamento e pobreza para uma violência étnica, racial, cultural, religiosa e de gênero contra o “outro”, visto como não merecedor da indulgência governamental e de qualquer benefício público. Buscou-se, de maneira revanchista, a restauração de privilégios e de valores tradicionais que haviam sido contestados pelos novos movimentos sociais. Paralelamente, criticou-se o Estado como sendo corrupto e capturado por forças progressistas, de modo a bloquear políticas sociais e a acabar com os fóruns de compromisso social (Bruff, 2014BRUFF, I. The rise of authoritarian neoliberalism. Rethinking Marxism, Abingdon, v. 26, n. 1, p. 113-129, 2014.; Dardot; Laval, 2016DARDOT, P.; LAVAL, C. Ce cauchemar qui n’en finit pas: comment le néolibéralisme défait la démocratie. Paris: La Découverte, 2016., 2019DARDOT, P.; LAVAL, C. Anatomía del nuevo neoliberalismo. Viento Sur, [s. l.], n. 164, p. 5-16, 2019..; Peck; Theodore, 2019PECK, J.; THEODORE, N. Still neoliberalism? The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 245-265, 2019.).

No Brasil, a crise política teve início com as manifestações de 2013, foi agravada com a Operação Lava Jato, ganhou contornos conservadores com as manifestações pró-impeachment e com a radicalização do antipetismo, e foi consumada com o golpe parlamentar que resultou na deposição de Dilma Rousseff, em 2016. Depois do impeachment, ao contrário do que as elites políticas previram, a crise permaneceu na forma de baixa popularidade e escândalos de corrupção, afetando a legitimidade do poder Executivo, Legislativo e Judiciário. A crise de representatividade dos partidos tradicionais permitiu a ascensão de forças que estavam fora do espectro democrático da Nova República e a eleição de um radical de extrema-direita, Jair Bolsonaro. Desde então, o governo procurou acabar ou distorcer os conselhos e canais de participação da sociedade civil, aprofundou políticas de austeridade e reformas que ampliaram a desigualdade social e promoveu ataques contra sindicatos e minorias, como indígenas e quilombolas.

Em terceiro lugar, ao serem reduzidas as concessões e métodos de produção de consenso, restou ao Estado o emprego de métodos coercitivos. O neoliberalismo deixou de se associar simbolicamente com a abertura, o progresso, as liberdades individuais e o Estado de direito para se conjugar com o fechamento de fronteiras, a construção de muros, o culto à soberania do Estado e a ofensiva declarada contra os direitos humanos (Dardot; Laval, 2019DARDOT, P.; LAVAL, C. Anatomía del nuevo neoliberalismo. Viento Sur, [s. l.], n. 164, p. 5-16, 2019..). Quem não adere à guerra econômica pela competitividade é visto como um traidor a ser banido do debate público e tratado como um inimigo interno. Com isso, à guerra econômica se vincula uma guerra militar e policial em nome da segurança nacional contra todas as forças de resistência. Esse governo de guerra civil não se volta apenas para o combate ao terrorismo, à delinquência e às drogas, ele adota igualmente estratégias de contrainsurgência que precedem qualquer insurgência real, de forma a afugentar possíveis rebeliões por parte da população (Dardot; Laval, 2019DARDOT, P.; LAVAL, C. Anatomía del nuevo neoliberalismo. Viento Sur, [s. l.], n. 164, p. 5-16, 2019..; Harcourt, 2018HARCOURT, B. E. The counterrevolution: how our government went to war against its own citizens. New York: Basic Books, 2018.). As liberdades e garantias públicas são suspensas, a separação entre os poderes é atacada e se adota a vigilância em massa, o lawfare e a legalização do encarceramento sem julgamento. De fato, como esclarecem Dardot e Laval (2019)DARDOT, P.; LAVAL, C. Anatomía del nuevo neoliberalismo. Viento Sur, [s. l.], n. 164, p. 5-16, 2019.., só é possível canalizar ódios e ressentimentos contra inimigos internos construídos ficticiamente se se promete às massas a ordem e a proteção em troca da sua adesão à política neoliberal autoritária.

No caso brasileiro, essa ofensiva se faz ver desde 2013 na repressão violenta e na infiltração de militares em manifestações, na espionagem virtual, na tentativa de criminalizar militantes de movimentos sociais (Almeida, 2020ALMEIDA, F. “Vândalos”, “trabalhadores” e “cidadãos”: sujeição criminal e legitimidade política na criminalização dos protestos de junho de 2013. Dados, Rio de Janeiro, v. 63, n. 4, p. 1-35, 2020.; Almeida; Monteiro; Smiderle, 2020), na estigmatização de grupos esquerdistas e progressistas como “inimigos internos”, no lawfare da Operação Lava Jato, no controle do Executivo federal sobre setores do judiciário, das polícias e de órgãos de fiscalização, nas ameaças de um novo AI-5 em caso de manifestações de rua, na intimidação militar feita ao Supremo Tribunal Federal (STF), na montagem de dossiês contra movimentos antifascistas ou contra críticos do governo, no vazamento em massa de dados sigilosos dos cidadãos, no aumento da letalidade policial, no projeto de ampliação do excludente de ilicitude, na militarização da administração pública, na reconstrução da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), no assédio institucional a funcionários públicos, na tentativa de ampliação da lei antiterrorismo de modo a incluir movimentos populares e na perseguição judicial a adversários políticos, com uso da Lei de Segurança Nacional.

Em quarto lugar, emergiram novas estratégias de “governo pela verdade” (Foucault, 2012FOUCAULT, M. Du gouvernement des vivants: cours au collège de France, 1979-1980. Paris: Seuil, Gallimard, 2012.) que se combinam e complementam a concepção de “revelação da verdade” pelo mercado (Dean, 2019DEAN, M. Rogue neoliberalism, liturgical power, and the search for a left governmentality. The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 325-342, 2019.; Foucault, 2004FOUCAULT, M. Naissance de la biopolitique: cours au collège de France. 1978-1979. Paris: Seuil, Gallimard, 2004.; Swyngedouw, 2019SWYNGEDOUW, E. The perverse lure of autocratic postdemocracy. The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 267-286, 2019.). Da mesma forma que a verdade revelada pelas autoridades econômicas muitas vezes ignora a realidade e é envelopada por mensagens com apelo afetivo sobre a liberdade individual, sobre o desejo de se tornar um rico investidor e sobre alcançar a felicidade de forma exclusivamente privada, as novas estratégias de governo remetem a regimes de verdade emocionais, que distorcem igualmente os fatos (Swyngedouw, 2019SWYNGEDOUW, E. The perverse lure of autocratic postdemocracy. The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 267-286, 2019.). Emerge, assim, a afirmação do revisionismo histórico e do anticientificismo, remetendo à ideia de verdade como revelação religiosa ou como revelação emocional-subjetiva do líder populista e de seus seguidores (Brown, 2003BROWN, W. Les habits neufs de la politique mondiale: néolibéralisme et néo-conservatisme. Paris: Les Prairies Ordinaires, 2003.; Roque, 2020ROQUE, T. O negacionismo no poder: como fazer frente ao ceticismo que atinge a ciência e a política. Piauí, São Paulo, n. 161, 2020. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/materia/o-negacionismo-no-poder/ . Acesso em: 15 out. 2021.
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). O uso das redes sociais é um dos procedimentos centrais de produção dessa verdade, apoiando-se nas suas estratégias comerciais de gestão das experiências de modo a produzir flutuações do humor público no curto prazo (Andrade, 2015ANDRADE, D. P. Emotional economic man: power and emotion in the corporate world. Critical Sociology, Thousand Oaks, v. 41, n. 4-5, p. 785-805, 2015.; Cesarino, 2019CESARINO, L. Identidade e representação no bolsonarismo. Corpo digital do rei, bivalência conservadorismo-neoliberalismo e pessoa fractal. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 62, n. 3, p. 530-557, 2019.; Dean, 2019DEAN, M. Rogue neoliberalism, liturgical power, and the search for a left governmentality. The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 325-342, 2019.). Tais estratégias de governo pela verdade procuram situá-la nas “invidências” das emoções e dos desejos, baseando-se em convicções voláteis, mas igualmente em “evidências alternativas”, como em casos anedóticos, teorias da conspiração e especialistas marginais no campo científico ou acadêmico. As novas formas de produção da verdade, ao contaminarem o discurso racional argumentativo e o debate baseado em dados ou em valores, acabam por corromper a deliberação democrática com crenças anti-intelectuais associadas à submissão e à fidelidade (Brown, 2003BROWN, W. Les habits neufs de la politique mondiale: néolibéralisme et néo-conservatisme. Paris: Les Prairies Ordinaires, 2003.).

Essa nova modalidade de governo pela verdade foi sistematicamente aplicada no Brasil recentemente. Ao lado das previsões econômicas irrealistas do dream team de Henrique Meirelles e da equipe do “superministro” Paulo Guedes, foi construída e consolidada no país uma ampla rede de divulgação de notícias falsas e sensacionalistas e de teorias da conspiração. Essa rede, financiada por empresários alinhados, foi decisiva na radicalização do antipetismo, na derrubada do governo Dilma, na eleição de Jair Bolsonaro e nos ataques virtuais contra instituições, adversários políticos e jornalistas. A rede internacional de think tanks neoliberais também ampliou seus investimentos em propaganda no Brasil após 2014, de modo a canalizar a insatisfação decorrente da crise contra a esquerda e em favor do livre mercado. Esses institutos financiaram a produção de conteúdo virtual voltado para o público jovem e a formação de grupos políticos e lideranças que tiveram papel decisivo nas manifestações pró-impeachment (Amaral, 2015AMARAL, M. A nova roupa da direita. Pública, São Paulo, 23 jun. 2015. Disponível em: https://apublica.org/2015/06/a-nova-roupa-da-direita/ . Acesso em: 6 out. 2021.
https://apublica.org/2015/06/a-nova-roup...
; Lee, 2017LEE, F. Esfera de influência: como os libertários americanos estão reinventando a política latino-americana. The Intercept Brasil, [s. l.], 11 ago. 2017. Disponível em: https://theintercept.com/2017/08/11/esfera-de-influencia-como-os-libertarios-americanos-estao-reinventando-a-politica-latino-americana/ . Acesso em: 6 out. 2021.
https://theintercept.com/2017/08/11/esfe...
). A disseminação de uma linguagem agressiva e antidemocrática por parte dos grupos da “nova direita”, como o Movimento Brasil Livre (MBL), casou-se com o ideário de Olavo de Carvalho para formar uma “retórica do ódio”, prenunciando a ascensão da extrema-direita (Lee, 2017LEE, F. Esfera de influência: como os libertários americanos estão reinventando a política latino-americana. The Intercept Brasil, [s. l.], 11 ago. 2017. Disponível em: https://theintercept.com/2017/08/11/esfera-de-influencia-como-os-libertarios-americanos-estao-reinventando-a-politica-latino-americana/ . Acesso em: 6 out. 2021.
https://theintercept.com/2017/08/11/esfe...
; Rocha, J., 2021). O Exército desenvolveu um centro de guerra eletrônica que forneceu quadros para o governo Bolsonaro, disponibilizando em seu site centenas de links para páginas da rede bolsonarista. No âmbito do governo, além da propaganda oficial realizada pela Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom), constituiu-se um “gabinete do ódio” dentro do Palácio do Planalto, com a missão de promover a guerra virtual de informações. A desinformação partiu do próprio presidente, de seus ministros e de seus filhos, tanto em suas declarações oficiais quanto nas suas contas nas redes sociais. A pandemia e o meio-ambiente foram alvos privilegiados dessas disputas, com o governo contrariando os órgãos oficiais e as pesquisas científicas de modo a favorecer interesses econômicos de curto prazo e “passar a boiada” na liberalização das leis reguladoras.

As listas de exemplos aqui apresentadas não se pretendem exaustivas ou explicativas. Elas apenas ilustram que as características da virada autoritária da nova fase do neoliberalismo estão amplamente presentes na realidade brasileira e não é por acaso que se trata de um dos casos mais mencionados pela bibliografia internacional (Dardot et al., 2021DARDOT, P. et al. La choix de la guerre civile: une autre histoire du néolibéralisme. Québec: Lux Éditeur, 2021.; Dardot; Laval, 2019DARDOT, P.; LAVAL, C. Anatomía del nuevo neoliberalismo. Viento Sur, [s. l.], n. 164, p. 5-16, 2019..; Magalhães, 2019MAGALHÃES, F. N. Postdemocracy reset: Brazil’s putschist fix in sociospatial perspective. The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 401-419, 2019.).

EM DEFESA DO MERCADO, EM DEFESA DE SI NA CONCORRÊNCIA DE MERCADO

No neoliberalismo autoritário, trava-se uma guerra “em defesa do mercado”. A estratégia é construir uma equivalência entre sociedade e mercado, convertendo o trabalhador em empresário de si mesmo de modo a situá-lo do mesmo lado político do grande capital. Os “inimigos” são aqueles que desafiam politicamente a lógica do mercado e buscam limitá-la, sendo associados simbolicamente a uma elite corrupta que busca privilégios, ou aqueles que foram derrotados e/ou banidos da competição, sendo vistos como ameaças à rentabilidade e à segurança da população (Cesarino, 2019CESARINO, L. Identidade e representação no bolsonarismo. Corpo digital do rei, bivalência conservadorismo-neoliberalismo e pessoa fractal. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 62, n. 3, p. 530-557, 2019.; Christaens, 2019).

A guerra remete também à defesa parcial dos sujeitos econômicos dentro do mercado, sendo a extensão das estratégias de competitividade por outros meios. Essa continuidade pode se dar em duas escalas do neoliberalismo: na disputa comercial entre Estados no nível global, mobilizando o nacionalismo autoritário, ou no nível dos mercados locais e cotidianos, operacionalizando práticas discriminatórias como forma de gerir a entrada de players no mercado. Uma defesa é indissociável da outra: ao reivindicar de maneira absoluta a lógica da concorrência contra intervenções políticas e demandas de justiça social, a defesa do mercado já se converte automaticamente em uma maneira de bloquear políticas sociais e de ação afirmativa que poderiam alçar grupos subalternizados à condição de competidores. É em nome da liberdade de mercado que se cria, portanto, reservas de mercado.

A liberdade econômica se estende, assim, à liberdade de se valer de formas históricas de preconceito e discriminação como estratégias de competição. A luta contra o “politicamente correto” parece operar neste registro. Não se trata necessariamente da afirmação aberta do discurso de ódio contra as minorias, embora isso também ocorra. Em tantas outras ocasiões, trata-se de traçar uma linha divisória entre a militância dos novos movimentos sociais e os grupos minoritários representados, identificando os primeiros como inimigos e incorporando os segundos à noção conservadora de “povo”, desde que abram mão da reivindicação política e se restrinjam à sua individualidade consumidora/empreendedora privada (Cesarino, 2019CESARINO, L. Identidade e representação no bolsonarismo. Corpo digital do rei, bivalência conservadorismo-neoliberalismo e pessoa fractal. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 62, n. 3, p. 530-557, 2019.). No contexto de competitividade acirrada pós-crise de 2008, o não reconhecimento da injustiça social contra os grupos subalternizados se dá em função de os próprios setores da classe média estarem passando por uma desestabilização e vulnerabilização. Desse modo, em sua mobilização política, essas classes médias enfatizam a deterioração da própria situação em detrimento do reconhecimento de discriminações históricas, atacando a reivindicação de políticas afirmativas como “privilégios” que os afetariam de maneira ainda mais negativa (Cesarino, 2019CESARINO, L. Identidade e representação no bolsonarismo. Corpo digital do rei, bivalência conservadorismo-neoliberalismo e pessoa fractal. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 62, n. 3, p. 530-557, 2019.; Mazzarella, 2019MAZZARELLA, W. The anthropology of populism: beyond the liberal settlement. Annual Review of Anthropology, Stanford, v. 48, p. 45-60, 2019.).

Nesse sentido, a nova fase do neoliberalismo sucede e polariza politicamente com o que Nancy Fraser (2017)FRASER, N. The end of progressive neoliberalism. Dissent, New York, Spring 2017. Disponível em: https://www.dissentmagazine.org/online_articles/progressive-neoliberalism-reactionary-populism-nancy-fraser . Acesso em: 6 out. 2021.
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nomeou como “neoliberalismo progressista”, ou seja, a conjugação do modelo financeiro de distribuição de renda, da precarização do trabalho e da forma de governo pela concorrência com uma política progressista de reconhecimento ligada às pautas dos novos movimentos sociais. O neoliberalismo progressista fomenta o éthos da diversidade e do empoderamento de minorias, além da sustentabilidade ambiental, conferindo, por meio da formação de elites mais diversas, uma aura de emancipação a um sistema altamente desigual e punitivo. Essas transformações, ainda que importantes, tiveram alcance limitado sobre as condições de vida das minorias. Seu efeito principal foi legitimar um “Estado centauro” que “reivindica sacralizar o mercado e abraçar a liberdade, mas, na realidade, reserva o liberalismo e seus benefícios àqueles que estão no topo, enquanto impõe o paternalismo punitivo àqueles que estão na base” (Wacquant, 2012WACQUANT, L. Três etapas para uma antropologia histórica do neoliberalismo realmente existente. Caderno CRH, Salvador, v. 25, n. 66, p. 505-518, 2012., p. 515), tendo como alvo preferencial justamente as mesmas minorias.

A nova fase autoritária do neoliberalismo abandona o éthos da diversidade. Ao invés disso, ela reativa a cesura biopolítica que afirma a existência de um único povo – no sentido populista do termo – identificado com os valores conservadores e de mercado em contraposição aos inimigos internos que ameaçam a ordem, convocando os militares a assumirem o papel de guardiões do modo tradicional de vida (Brown, 2019BROWN, W. In the ruins of neoliberalism: the rise of antidemocratic politics in the west. New York: Columbia University Press, 2019.; Swyngedouw, 2019SWYNGEDOUW, E. The perverse lure of autocratic postdemocracy. The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 267-286, 2019.). A versão autoritária do neoliberalismo descarta progressivamente as práticas inclusivas que garantem, segundo Davies (2014)DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014., um sentido mínimo de igualdade e equidade próximo do ideal liberal de justiça, denunciando-o como sendo uma fraude da competição. O neoliberalismo se dirige agora quase que exclusivamente ao polo oposto que caracteriza a competição, o qual enfatiza a desigualdade como o seu resultado empírico, admitindo o poder, a hierarquia e o controle em nome da liberdade. O neoliberalismo autoritário, entrevendo a competição como violência, enxerga parte dos competidores como inimigos e, assim, busca excluí-los ou cerceá-los do jogo econômico, reativando de uma nova forma a origem histórica comum entre estratégia de negócios e estratégia militar (Davies, 2014DAVIES, W. The limits of neoliberalism: authority, sovereignty and the logic of competition. London: Sage Publications, 2014.). Ademais, o neoliberalismo autoritário confere às minorias um papel estereotipado e subalterno, responsabilizando especialmente as mulheres pelas tarefas domésticas relativas ao cuidado e à manutenção de famílias funcionais que se convertem em substitutos de serviços antes prestados pelo Estado (Biroli, 2017BIROLI, F. O fim da Nova República e o casamento infeliz entre o neoliberalismo e conservadorismo moral. In: BUENO, W. et al. (org.). Tem saída? Ensaios críticos sobre o Brasil. Porto Alegre: Zouk, 2017. p. 17-26.; Brown, 2015BROWN, W. Undoing the demos: neoliberalism’s stealth revolution. New York: Zone Books, 2015.; Cooper, 2017COOPER, M. Family values: between neoliberalism and the new social conservatism. New York: Zone Books, 2017.).

É importante notar que as posições do neoliberalismo progressista não desapareceram com a ascensão do neoliberalismo autoritário. Antes, elas permanecem e polarizam com ele, fazendo com que reivindicações tipicamente de classe por melhores condições de vida se expressem em termos “identitários” progressistas ou conservadores (Dean, 2019DEAN, M. Rogue neoliberalism, liturgical power, and the search for a left governmentality. The South Atlantic Quarterly, Durham, v. 118, n. 2, p. 325-342, 2019.). Essas posições se intercalam eleitoralmente, mas as opções permaneceram, até 2020, dentro dos marcos neoliberais. A vitória de Joe Biden nas eleições presidenciais estadunidenses de 2020 e suas medidas surpreendentemente progressistas renovaram, no entanto, o debate sobre se estaríamos ou não em um processo de saída do neoliberalismo, o que ainda é cedo para saber (Davies; Gane, 2021DAVIES, W.; GANE, N. Post-neoliberalism? An introduction. Theory, Culture & Society, [s. l.], p. 1-26, Sep. 2021.).

A SINGULARIDADE DOS PROCESSOS DE NEOLIBERALIZAÇÃO

Para analisar o neoliberalismo autoritário no Brasil não basta, contudo, traçar as características gerais dessa nova fase e estabelecer uma lista de ocorrências que a exemplificaria. Isso porque, como bem notou Ong (2006)ONG, A. Neoliberalism as exception: mutations in citizenship and sovereignty. Durham: Duke University Press, 2006., o neoliberalismo e suas fases não operam como um tsunami econômico e autoritário que se derrama sobre os Estados como se estes fossem recipientes vazios. As práticas de governo e as medidas regulatórias que se disseminam pelos mercados globais e pelas imposições de organismos internacionais se deparam com formações políticas e sociais previamente existentes, sendo incorporadas seletivamente conforme as conveniências e as resistências locais. O neoliberalismo, desse modo, não necessariamente substitui outras racionalidades políticas já existentes ou que se desenvolveram em paralelo a ele. Antes, ele se articula com elas e altera as constelações históricas ao definir combinações dinâmicas e variadas e dar origem a todo tipo de invenção político-institucional. Esses hibridismos também definem recortes populacionais e espaciais ligados às formas diferenciais de governo dentro de um mesmo país, distribuindo desigualmente a cidadania e a ação do Estado (Ong, 2006ONG, A. Neoliberalism as exception: mutations in citizenship and sovereignty. Durham: Duke University Press, 2006.).

Os processos de neoliberalização são, portanto, singulares e abertos. A ideia promovida por think tanks internacionais de que haveria um processo teleológico cujo ponto de chegada seria o reino do Estado mínimo e do livre mercado não corresponde à realidade. Tampouco o modelo dos países desenvolvidos, especialmente o modelo norte-americano, pode ser considerado como referência para os demais países. Como a visão de uma sociedade baseada no livre mercado autorregulado é inatingível, o neoliberalismo se constitui sempre como uma zona de audaciosa experimentação e de fracasso, impondo o retorno envergonhado de formas estatais de regulação. Desse modo, ainda que se cristalize em certas formações regulatórias, o neoliberalismo se articula apenas em modalidades incompletas, em híbridos impuros com formas previamente existentes que são continuamente retrabalhadas de forma contextualmente específica (Peck; Theodore; Brenner, 2012). Esse aspecto parasitário permite que o neoliberalismo, diante das crises, sempre volte a acusar o Estado e outras racionalidades políticas pelas falhas do seu próprio projeto, propondo-se novamente como solução. As ondas descontínuas de transformações regulatórias orientadas para o mercado se chocam e se combinam com arranjos institucionais e estatais previamente existentes, dando ocasião, assim, às dinâmicas singulares que constituem as camadas cumulativas que serão a base para novas rodadas de reformas.

O processo de neoliberalização não produz, portanto, transformações totalizadoras, sendo uma lógica entre várias outras que competem e se combinam entre si. Partindo dos países liberais avançados, a racionalidade neoliberal viajou para ambientes políticos tão variados quanto estados militares, oligarquias pós-socialistas e realidades pós-coloniais, mas sem substituir suas práticas e racionalidades (Ong, 2006ONG, A. Neoliberalism as exception: mutations in citizenship and sovereignty. Durham: Duke University Press, 2006.). Nesse sentido, as estratégias autoritárias podem ser tanto inerentes ao neoliberalismo quanto pertencentes a outras racionalidades políticas. Essas práticas autoritárias podem ser rearticuladas, deslocadas, intensificadas ou inovadas a cada rodada de neoliberalização. Sendo o neoliberalismo polimórfico, não é possível antecipar a forma que o Estado assumirá, sendo necessário sempre fazer uma referência histórica e geográfica do processo. Por isso, o único modo de compreender o fenômeno é seguir os seus movimentos (Peck, 2010PECK, J. Constructions of neoliberal reason. Oxford: Oxford University Press, 2010.).

NOVA FASE AUTORITÁRIA DO NEOLIBERALISMO BRASILEIRO: MUDANÇAS, DESLOCAMENTOS E CONTINUIDADES NA CRISE DA NOVA REPÚBLICA

A seguir, algumas pistas – certamente incompletas – para se pensar o processo singular de neoliberalização, o esvaziamento da democracia e as práticas autoritárias durante a Nova República, bem como a mudança para a fase do neoliberalismo autoritário na crise atual.

Transição democrática, transição neoliberal e continuidade autoritária

No caso brasileiro, ainda que algumas medidas de construção do arcabouço institucional, de política econômica e de reformas administrativas tenham sido realizadas ainda durante a ditadura militar (Ramírez, 2012RAMÍREZ, H. Confluências e matizes nos programas econômicos das ditaduras brasileira e chilena. Confluenze, Bolonha, v. 4, n. 2, p. 63-81, 2012.), o neoliberalismo efetivamente ingressou na esteira da crise do Estado varguista que levou ao desmonte apenas parcial de sua lógica autoritária e desenvolvimentista (Sallum Jr., 1999). Tal crise desencadeou uma dupla transição: a transição democrática, ocorrida durante a década de 1980 e consolidada com a Constituição de 1988, e a transição neoliberal, realizada na década de 1990 como resposta ao endividamento externo e à hiperinflação e que levou à abertura da economia nacional e do mercado financeiro e às reformas gerenciais nas empresas e no Estado como forma de adaptação à nova realidade globalizada. Os gestores se tornaram, então, objetos e sujeitos difusores da racionalidade neoliberal, disseminando seus dispositivos no cotidiano e estendendo sua grade de leitura gerencial da realidade para várias esferas da vida. Eles introduziram práticas de gestão flexíveis e competitivas que atravessaram as mais diferentes organizações públicas e privadas, bem como as políticas públicas, fomentando o novo éthos empreendedor de condução da vida (Dardot; Laval, 2009DARDOT, P.; LAVAL, C. La nouvelle raison du monde: essai sur la société néolibéral. Paris: La Découverte, 2009.; Grün, 1998GRÜN, R. A classe média no mundo do neoliberalismo. Tempo Social, São Paulo, v. 10, n. 1, p. 143-163, 1998.).

O fato de a redemocratização ter antecipado a transição neoliberal em alguns anos permitiu a constituição em paralelo de uma racionalidade social-democrata. Mas, com o quase imediato advento do neoliberalismo, a construção de um Estado de bem-estar social foi, por um lado, desacelerada e subfinanciada, priorizando os compromissos financeiros do Estado em detrimento dos direitos sociais, e, por outro, foi hibridizada com a forma neoliberal (Bercovici; Massonetto, 2006BERCOVICI, G.; MASSONETTO, L. F. A constituição dirigente invertida: a blindagem da constituição financeira e a agonia da constituição econômica. Boletim de Ciências Económicas, Coimbra, v. 49, p. 57-77, 2006.; Georges; Rizek; Ceballos, 2014). Nesse sentido, o neoliberalismo no Brasil se difundiu tanto contra quanto por meio das políticas sociais. Foi assim que o modelo de gestão da empresa privada foi introduzido, por meio de Organizações Sociais e de Parcerias Público-Privadas, no âmbito de políticas universais, como o Sistema Único de Saúde (SUS). As políticas públicas de saúde, educação e combate à pobreza, derivadas de conquistas da redemocratização, foram ao menos parcialmente reconfiguradas pela lógica do investimento em capital humano, descaracterizando o ideal de cidadania resguardada do mercado da lógica social-democrata. Houve também a criação de “mercados do social”, com o estímulo ao empreendedorismo vindo da terceirização da implementação e da fiscalização das condicionalidades das políticas públicas (Fleury, 2012; Georges; Ceballos, 2014GEORGES, I.; CEBALLOS, M. Bolsa familia y la asistencia social en Brasil: de la lucha política a la mercantilización local. Caderno CRH, Salvador, v. 27, n. 72, p. 513-529, 2014.). Os próprios movimentos sociais da redemocratização se deslocaram da luta coletiva por direitos para uma lógica de captação de recursos no mercado competitivo dos editais públicos, aderindo a uma racionalidade gerencialista (Magalhães, 2011MAGALHÃES, J. As entidades sociais e o surgimento de uma gestão concorrencial do engajamento cívico. In: CABANES, R. et al. (org.). Saídas de emergência. São Paulo: Boitempo, 2011.). A mesma “confluência perversa” ocorreu com os canais de democracia participativa no âmbito do Estado, reduzindo a sociedade civil ao terceiro setor, a participação política ao trabalho voluntário e à responsabilidade social das empresas e a cidadania à integração no mercado (Caldas, 2021CALDAS, C. O. Teoria da derivação do estado e do direito. São Paulo: Contracorrente, 2021.; Dagnino, 2004DAGNINO, E. Construção democrática, neoliberalismo e participação: os dilemas da confluência perversa. Política & Sociedade, Florianópolis, v. 3, n. 5, p. 139-164, 2004.).

Além de jogar forte papel desdemocratizante no país (Ballestrin, 2019BALLESTRIN, L. M. A. Post-democracy and neoliberalism in contemporary Latin America: the rise of the left turns and the brazilian democratic failure. In: PUZONE, V.; MIGUEL, L. F. (ed.). The brazilian left in the 21st century: conflict and conciliation in peripheral capitalism. New York: Palgrave Macmillan, 2019. p. 259-283.), o neoliberalismo também se vinculou à racionalidade política autoritária herdada da ditadura militar, que foi apenas parcialmente desmontada. Com isso, a lógica militar da guerra ao inimigo interno permaneceu e se metamorfoseou na Nova República, voltando-se então para a guerra às drogas e ao crime organizado, criminalizando ainda os movimentos sociais mais combativos da redemocratização. As forças de segurança atuaram de maneira a abrir espaço para a neoliberalização ao conter o avanço das demandas democráticas, ao lidar com os problemas sociais pela via da gestão militarizada da pobreza e ao complementar punitivamente o estrangulamento dos gastos públicos e as políticas sociais focalizadas. O neoliberalismo, desse modo, rearticulava as práticas autoritárias legadas pela ditadura, casando-se com o militarismo inclusive na redefinição dos inimigos internos.

Do mesmo modo, outras práticas autoritárias e violentas, constituídas em tempos mais remotos, permaneceram e foram reconfiguradas no período em questão. A lógica eugênica de embranquecimento que, apesar de derrotada no âmbito das leis, foi vencedora nas práticas institucionais, seguiu atravessando as organizações públicas e privadas no Brasil de modo a distribuir desigualmente garantias, direitos, acessos e oportunidades (Schwarcz, 1993SCHWARCZ, L. O espetáculo das raças: cientistas, instruções e questão racial no Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.). Não é por acaso que o sistema judiciário e penal brasileiro continua tão seletivo nas prisões e no exercício da violência policial (Sinhoretto; Lima, 2015SINHORETTO, J.; LIMA, R. Narrativa autoritária e pressões democráticas na segurança pública e no controle do crime. Contemporânea, São Carlos, v. 5, n. 1, p. 119-141, 2015.). O mesmo vale para práticas normativas e violentas sobre papéis de gênero e sexualidades dissidentes. A década de 1990 fez com que os avanços constitucionais em termos de direitos humanos fossem acompanhados pelo endurecimento da legislação penal e pela sua aplicação seletiva (Camargos, 2021CAMARGOS, P. Neoliberalismo e política criminal no Brasil após 1988: entre a redemocratização e a desdemocratização. Cadernos de Gestão Pública e Cidadania, [s. l.], v. 26, n. 85, p. 1-18, 2021.). Devido às oportunidades e bloqueios criados por esse arranjo entre neoliberalismo, democracia e Estado penal, uma parte dos novos movimentos sociais foram progressivamente aderindo a uma agenda de criminalização de formas de discriminação ao invés de enfatizar políticas públicas inclusivas, restringindo-se, assim, à austera cidadania punitiva (Martins, 2021MARTINS, A. N. Cidadania punitiva desde baixo: a criminalização da LGBTfobia e a democratização neoliberal no Brasil. Cadernos de Gestão Pública e Cidadania, [s. l.], v. 26, n. 85, p. 1-18, 2021.).

Enquanto o neoliberalismo se disseminava por meio da financeirização, de reformas constitucionais e de gestão, transformando especialmente o modo de vida da classe média gerencial, ele destinava os trabalhadores não qualificados à precarização e à informalidade, com trajetórias profissionais erráticas e intermitentes (Telles, 2006). A população pobre se tornou objeto de outras duas formas de governo: a) as políticas sociais focalizadas, de caráter emergencial e pontual, que se voltaram principalmente para a gestão da pobreza e estabeleceram recortes na população conforme perfis de vulnerabilidade e periculosidade; b) a gestão militarizada e penal, que entrevia a população dos bairros pobres como potencialmente perigosa por estes serem redutos do tráfico e do crime organizado, sendo então objeto da violência arbitrária do Estado, do encarceramento em massa e de grupos de extermínio formados por agentes e ex-agentes de segurança pública e privada (Alves, 2020ALVES, J. C. S. Dos barões ao extermínio: uma história da violência na Baixada Fluminense. Rio de Janeiro: Consequência, 2020.; Giorgi, 2006GIORGI, A. A miséria governada pelo sistema penal. São Paulo: Revan, 2006.; Leite et al., 2018LEITE, M. et al. (org.). Militarização no Rio de Janeiro: da pacificação à intervenção. Rio de Janeiro: Mórula, 2018.; Manso, 2020MANSO, B. P. A república das milícias: do esquadrão da morte à era Bolsonaro. São Paulo: Todavia, 2020.; Silva, 2008SILVA, L. A. M. (org.). Vida sob cerco: violência e rotina nas favelas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.).

“Nova classe média” como objeto de poder e saber do neoliberalismo

Na década de 2000, a alta do preço das commodities e o aquecimento do comércio internacional criaram superávits nas contas do governo, permitindo controlar as dívidas externa e interna e ampliar os investimentos em políticas sociais. Políticas de transferência de renda, como o programa Bolsa Família, juntaram-se às políticas econômicas de aumento do salário mínimo, de crédito popular e de criação de empregos formais para dar origem a um deslocamento modesto, mas com importantes consequências, na estrutura social brasileira (Singer, 2012SINGER, A. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.). Surgiu, assim, a chamada “nova classe média”, ou seja, a ascensão de parte da base da pirâmide social brasileira para os estratos médios de renda, também conhecida como “classe C” nas pesquisas de mercado. A partir de 2007, o emergente mercado de baixa renda, formado pela classe trabalhadora pouco ou não qualificada, tornou-se objeto de uma série de novos dispositivos de poder e saber por parte do Estado, de governos locais, empresas, bancos e financeiras. Logo, constituiu-se uma nova rodada de neoliberalização que se voltava para o governo da “nova classe média”, de modo a moldar a sua conduta de consumo, construir novos sujeitos financeiros, induzir a disciplina do trabalho pelo novo espírito do capitalismo, converter a viração em empreendedorismo popular e direcionar as preferências políticas dessa classe.

O acesso ao consumo, conjugado com as políticas afirmativas do período, criou as condições de possibilidade para uma maneira específica de fazer política desses novos sujeitos de mercado. Trata-se de uma lógica política já muito distante da gramática dos direitos que caracterizou os movimentos da redemocratização. A ação destes sujeitos se deu pela autoafirmação individual, pela reivindicação do “direito ao prazer”, pela ostentação insubordinada de símbolos de status e pelo ingresso em shopping centers e outros espaços segregados que, simultaneamente, queriam atrair suas compras, mas recusavam seus corpos periféricos não brancos. A insurgência dos “rolezinhos” foi uma expressão importante dessa juventude ascendente que se dava conta das contradições da inclusão neoliberal na sociedade brasileira (Pinheiro-Machado; Scalco, 2018PINHEIRO-MACHADO, R.; SCALCO, L. Da esperança ao ódio: juventude, política e pobreza do lulismo ao bolsonarismo. Revista IHU On-Line, [s. l.], 4 out. 2018. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/583354-da-esperanca-ao-odio-juventude-politica-e-pobreza-do-lulismo-ao-bolsonarismo . Acesso em: 8 out. 2021.
http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/5...
, 2020PINHEIRO-MACHADO, R.; SCALCO, L. From hope to hate: the rise of conservative subjectivity in Brazil. HAU: Journal of Ethnographic Theory, London, v. 10, n. 1, p. 21-31, 2020.).

Essa classe trabalhadora foi incluída no mercado formal de trabalho, mas em um mercado já reconfigurado por mais de uma década de neoliberalismo. O sonho de integração na sociedade salarial, com direitos e estabilidade, tornou-se assim a sombra de uma promessa do passado. Na prática, a formalização se deu sob condições de baixos salários (até dois salários-mínimos), contratos de trabalho precários e empreendedorismo popular regularizado pela figura jurídica do Microempreendedor Individual (MEI). Por isso, a inclusão, ainda que produzindo avanços sociais, se fez em certa medida dentro do modelo e com as limitações do neoliberalismo. Os ganhos de cidadania chegaram assim pelo e para o mercado, e secundariamente pela construção de um Estado de bem-estar social.

A integração subalterna nos mercados não deixou de se fazer acompanhar por formas de governo autoritárias. A política de guerra às drogas e ao crime organizado, com ocupações militares em favelas e periferias, gerou constante violação de direitos, o aumento da violência e das mortes ligadas à ação policial e um crescente encarceramento em massa, impulsionado pela nova lei de drogas e pela punição de crimes contra o patrimônio (Feltran, 2011FELTRAN, G. S. Fronteiras de tensão: política e violência nas periferias de São Paulo. São Paulo: Editora Unesp, 2011., 2014FELTRAN, G. S. Valor dos pobres: a aposta no dinheiro como mediação para o conflito social contemporâneo. Caderno CRH, Salvador, v. 27, n. 72, p. 495-512, 2014.). A lógica da “pacificação” na segurança pública permitiu que empresas e bancos adentrassem o espaço urbano do mercado de baixa renda, propiciando, ainda, remoções e especulação imobiliária no contexto de megaeventos como a Copa das Confederações, a Copa do Mundo e as Olimpíadas (Miagusko, 2012MIAGUSKO, E. Antes da copa, depois do pan: o Rio de Janeiro na era dos megaeventos esportivos. Civitas, Porto Alegre, v. 12, n. 2, p. 395-408, 2012.). As incursões das forças de segurança se faziam acompanhar, por vezes, do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e de agências governamentais locais, de modo a forçar a formalização do empreendedorismo popular e dos serviços obtidos até então de maneira clandestina – água, luz, TV a cabo etc. Com isso, o governo local aumentava a arrecadação de impostos de modo a financiar o custo da própria política de segurança. Empresários e investidores privados participaram, em conjunto com o poder público, na definição da agenda de segurança pública a fim de definir novos circuitos de valorização do capital enquanto os fóruns de participação popular foram esvaziados politicamente (Ost; Fleury, 2013OST, S.; FLEURY, S. O mercado sobe o morro: a cidadania desce? Efeitos socioeconômicos da pacificação no morro Santa Marta. Dados, Rio de Janeiro, v. 56, n. 3, p. 635-671, 2013.). O empreendedorismo emergiu, então, como um imaginário capaz de disputar os jovens pobres e periféricos com o crime organizado, operando como um novo modelo disciplinar. Juntamente com a formalização dos mercados de baixa renda, a expansão do empreendedorismo popular compôs o modelo de ordem social neoliberal produzido pelas políticas de pacificação (Birman; Leite, 2018BIRMAN, P.; LEITE, M. P. Rio e São Paulo: categorias emaranhadas e relativização dos seus sentidos nos estudos sobre (as chamadas) periferias. In: BARROS, J.; COSTA, A. D.; RIZEK, C. (org.). Os limites da acumulação, movimentos e resistência nos territórios. São Carlos: Instituto de Arquitetura e Urbanismo USP São Carlos, 2018. p. 27-40.).

No contexto dos governos petistas, o governo das classes populares foi marcado por essa triangulação entre políticas sociais, neoliberalismo e lógica militar de guerra ao inimigo interno. Eis então uma experiência complexa das classes trabalhadoras ascendentes, dada pelo acesso ao consumo e à internet, pelo emprego formal mal remunerado e precário, pelo empreendedorismo popular, pela bancarização, acesso ao crédito, endividamento e educação financeira, pela expansão das religiões neopentecostais e sua teologia da prosperidade, pelas políticas sociais e o crescimento do mercado do social e pela violência policial (Côrtes, 2017CÔRTES, M. Diabo e fluoxetina: pentecostalismo e psiquiatria na gestão da diferença. Curitiba: Appris, 2017.; Cunha, 2015CUNHA, C. V. Oração de traficante: uma etnografia. Rio de Janeiro: Garamond, 2015.; Machado, 2018MACHADO, C. B. Evangélicos, mídias e periferias urbanas: questões para um diálogo sobre religião, cidade, nação e sociedade civil no Brasil contemporâneo. Debates do NER, Porto Alegre, v. 19, n. 33, p. 58-80, 2018., 2020MACHADO, C. B. Fazendo política em outros congressos: tramas religiosas, práticas midiáticas e a estética da política nas periferias urbanas do Rio de Janeiro. Debates do NER, Porto Alegre, v. 20, n. 38, p. 19-59, 2020.; Teixeira, 2016TEIXEIRA, J. M. A mulher universal: corpo, gênero e pedagogia da prosperidade. Rio de Janeiro: Mar de Ideias, 2016.).

A crise da fase do neoliberalismo inclusivo da Nova República

No mesmo período, o modelo de gestão neoliberal começou a afetar as profissões da classe média tradicional, submetendo-as à crescente desestabilização, precarização, concorrência acirrada, intensificação e extensão das jornadas de trabalho. Além disso, o modelo de gestão pela concorrência, ao impor aos trabalhadores uma relativa autonomia na tomada de decisão ligada à obrigação de desempenho, tornou parcialmente dispensável a função gerencial clássica de comando e controle. Por isso, entre 2007 e 2017, mais de um milhão de postos de gerência e supervisão foram fechados em função de reengenharias, horizontalização das empresas e de fusões e aquisições (Andrade, 2019c). Os gestores acabaram, assim, afetados pelas consequências da própria lógica de gestão concorrencial que disseminaram, dando ocasião a um colapso cognitivo entre aqueles que são os portadores por excelência do éthos empreendedor competitivo do neoliberalismo.

Essa mesma classe média gerencial viu seu custo de vida aumentar com a inflação dos serviços, o aumento do salário mínimo, a formalização dos empregos, a extensão de direitos trabalhistas às empregadas domésticas e a indisposição de trabalhadores não qualificados para fazer serviços mal remunerados em um contexto de pleno emprego e políticas de transferência de renda. Os estratos médios viram seus mecanismos pessoais de mando na esfera da reprodução da vida parcialmente ameaçados, além de terem testemunhado a entrada de minorias em empresas e universidades e de representantes da classe trabalhadora e de movimentos sociais em cargos eletivos e de livre provimento no Estado (Cavalcante, 2020CAVALCANTE, S. Classe média e ameaça neofascista no Brasil de Bolsonaro. Crítica Marxista, Campinas, n. 50, p. 121-130, 2020.; Santos, 2020SANTOS, J. V. Os limites de uma classe média arraigada ao conservadorismo liberal. Entrevista especial com Sávio Cavalcante. Instituto Humanistas Unisinos, São Leopoldo, 2 jul. 2020. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/159-noticias/entrevistas/600525-os-limites-de-uma-classe-media-arraigada-ao-conservadorismo-liberal-entrevista-especial-com-savio-cavalcante . Acesso em: 6 out. 2021.
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).

Some-se, ainda, a sensação de empobrecimento relativo que a classe média tradicional experimentou quando seus espaços exclusivos de lazer, consumo e formação passaram a ser frequentados pelas classes trabalhadoras ascendentes e seu habitus de classe. Por fim, a crise econômica acelerou as demissões de gestores e aumentou o endividamento, as falências e os pedidos de recuperação judicial de pequenas e médias empresas.

Esse contexto jogou grande parcela das classes médias para uma oposição conservadora ao governo petista. Ela passou a considerar que era às suas custas que o governo promovia políticas sociais, a ascensão da classe trabalhadora e esquemas de corrupção, sendo ele então o suposto responsável por distorcer a distribuição meritocrática de recompensas na concorrência de mercado. Como parte considerável das classes médias utilizam apenas residualmente os serviços públicos, recorrendo às escolas, aos planos de saúde, ao transporte e até à segurança privada, passaram a defender a agenda ultraliberal do Estado mínimo. Tal defesa ganhou impulso com o forte financiamento, por parte da rede de think tanks neoliberais, da propaganda do livre mercado, valendo-se especialmente das redes sociais e da formação política de um novo público jovem de direita (Casimiro, 2018CASIMIRO, F. A nova direita: aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo: Expressão Popular, 2018.; Faria; Chaia, 2020FARIA, A. L.; CHAIA, V. Os institutos liberais e a consolidação da hegemonia neoliberal na América Latina e no Brasil. Cadernos Metrópole, São Paulo, v. 22, n. 49, p. 1059-1080, 2020.; Rocha, C., 2021). Foi assim que parte da classe média aderiu às manifestações de 2013, às manifestações pelo impeachment e à agenda radicalizada de reformas neoliberais.

Por sua vez, as forças de segurança, que sempre foram reticentes às posições de esquerda e ao processo de redemocratização, ganharam novos estímulos para retornar ao palco político com um projeto corporativista de poder. A politização das Forças Armadas, especialmente do Exército, deu-se como uma reação a quatro medidas democratizantes da instituição propostas durante os governos petistas: a possibilidade de revisão da Lei da Anistia, a tentativa de transferência do controle das promoções dos militares para os civis do Ministério da Defesa, a Comissão Nacional da Verdade e a sugestão de incluir conteúdos progressistas nos cursos de formação (Traumann, 2019TRAUMANN, T. O divórcio dos militares com o PT não tem volta, sentencia Traumann. Poder360, Brasília, DF, 10 dez. 2019. Disponível em https://www.poder360.com.br/opiniao/partidos-politicos/o-divorcio-dos-militares-com-o-pt-nao-tem-volta-sentencia-traumann/ . Acesso em: 8 out. 2021.
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). Diante do risco de perda de sua autonomia e da percepção de dano à sua imagem, as Forças Armadas se tornaram críticas ferrenhas do então governo, rompendo com o silêncio político mantido durante a Nova República. Aderiram discretamente ao impeachment de Dilma Rousseff e se converteram em atores políticos centrais no período posterior. Desse modo, ainda que a lógica militar da guerra ao inimigo interno tenha atravessado toda a Nova República, suas práticas autoritárias efetivadas nas pontas do Estado retornaram ao centro do palco político, caracterizando nesse sentido preciso o que pode ser chamado de “virada autoritária brasileira” (Andrade, 2021ANDRADE, D. P. Neoliberalismo e guerra ao inimigo interno: da Nova República à virada autoritária no Brasil. Caderno CRH, v.31, 2021.).

Houve igualmente forte reação conservadora de policiais militares, de religiosos e das camadas médias às políticas progressistas propostas pelo Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH), especialmente em sua terceira versão lançada entre 2009 e 2010 (Adorno, 2010ADORNO, S. História e desventura: o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos. Novos Estudos CEBRAP, São Paulo, n. 86, p. 5-20, 2010.; Kalil, 2019KALIL, I. As origens do bolsonarismo. Época, Rio de Janeiro, 13 dez. 2019. Disponível em: https://epoca.globo.com/isabela-kalil/as-origens-do-bolsonarismo-1-24134678 . Acesso em: 6 out. 2021.
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). Nas palavras de Kalil (2019)KALIL, I. As origens do bolsonarismo. Época, Rio de Janeiro, 13 dez. 2019. Disponível em: https://epoca.globo.com/isabela-kalil/as-origens-do-bolsonarismo-1-24134678 . Acesso em: 6 out. 2021.
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as versões anteriores do PNDH (em 1996 e 2002) já propunham mudanças como a transferência da competência da Justiça Militar para a Justiça Comum para julgar policiais militares, a tipificação do crime de tortura e a criminalização do porte ilegal de armas. Ou ainda direitos de livre orientação sexual e identidade de gênero e o combate à violência doméstica. […] pela primeira vez o Estado brasileiro reconhece a existência do racismo e aponta iniciativas para políticas compensatórias. Em continuidade às versões anteriores, o PNDH-3 amplia seu escopo e propõe a criação da Comissão Nacional da Verdade, a descriminalização do aborto, o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo, maior regulação da mídia e impõe limites para a presença religiosa no Estado.

A classe trabalhadora ascendente, que poderia ser um contraponto político, também acabou por aderir parcialmente à oposição. Com a chegada da cidadania pelo mercado e com as políticas públicas condicionadas, que faziam os direitos serem “conquistados”, tal classe acabou sendo formada por uma visão meritocrática, segundo a qual a melhora de vida depende exclusivamente da iniciativa individual e da bênção divina. Além disso, as políticas sociais e habitacionais do lulismo desencadearam uma série de contradições no espaço das grandes cidades, que gerou, inadvertidamente, especulação imobiliária, gentrificação, deslocamento das moradias para regiões distantes, superlotação do transporte público e congestionamentos, resultando em revoltas urbanas. Com a crise econômica de 2015, a promessa de melhores condições de vida logo encontrou o seu limite, ainda mais porque, no modelo neoliberal, a precarização do trabalho e os baixos salários são inerentes à intensificação da concorrência. Fechava-se, assim, a brecha da ascensão social, eclipsando as expectativas de uma integração crescente aos mercados de consumo. Entre os jovens homens de periferia, isso ocorreu em meio à violência urbana e à perda de protagonismo nas ocupações secundaristas, lideradas por meninas adolescentes e por coletivos LGBT e feministas, fatos que, somados, desencadearam a busca conservadora por figuras de masculinidade hegemônica (Campos; Medeiros; Ribeiro, 2016; Pinheiro-Machado; Scalco, 2018PINHEIRO-MACHADO, R.; SCALCO, L. Da esperança ao ódio: juventude, política e pobreza do lulismo ao bolsonarismo. Revista IHU On-Line, [s. l.], 4 out. 2018. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/583354-da-esperanca-ao-odio-juventude-politica-e-pobreza-do-lulismo-ao-bolsonarismo . Acesso em: 8 out. 2021.
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, 2020PINHEIRO-MACHADO, R.; SCALCO, L. From hope to hate: the rise of conservative subjectivity in Brazil. HAU: Journal of Ethnographic Theory, London, v. 10, n. 1, p. 21-31, 2020.). Parte dos trabalhadores, vendo-se na posição de empreendedor, de informal ou de autônomo, encarou com maus olhos a formalização de seus negócios e os consequentes procedimentos burocráticos e encargos pagos ao Estado. A precariedade dos serviços públicos, a violência arbitrária das polícias e a corrupção acabaram por gerar uma visão de que o Estado mais prejudicava do que ajudava. A frustração que adveio com o refugo da ascensão social acabou sendo canalizada pelos setores conservadores do neopentecostalismo, somando-se, assim, ao “neoliberalismo de oposição” da classe média gerencial (Cavalcante, 2020CAVALCANTE, S. Classe média e ameaça neofascista no Brasil de Bolsonaro. Crítica Marxista, Campinas, n. 50, p. 121-130, 2020.; Santos, 2020SANTOS, J. V. Os limites de uma classe média arraigada ao conservadorismo liberal. Entrevista especial com Sávio Cavalcante. Instituto Humanistas Unisinos, São Leopoldo, 2 jul. 2020. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/159-noticias/entrevistas/600525-os-limites-de-uma-classe-media-arraigada-ao-conservadorismo-liberal-entrevista-especial-com-savio-cavalcante . Acesso em: 6 out. 2021.
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).

A virada autoritária do neoliberalismo brasileiro

A constituição dessas forças sociais de oposição pavimentou o caminho para as elites políticas e econômicas realizarem o impeachment de Dilma Rousseff e para a ascensão do bolsonarismo, dois marcos da passagem da fase do neoliberalismo progressista para o neoliberalismo autoritário no Brasil (Fraser, 2017FRASER, N. The end of progressive neoliberalism. Dissent, New York, Spring 2017. Disponível em: https://www.dissentmagazine.org/online_articles/progressive-neoliberalism-reactionary-populism-nancy-fraser . Acesso em: 6 out. 2021.
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). Duas importantes armas mobilizadas nesta virada foram o uso estratégico das redes sociais pela nova direita e o lawfare da Operação Lava Jato, que estendeu as medidas de exceção no direito para a perseguição de políticos e do partido titular do governo (Zanin; Martins; Valim, 2019). As redes sociais foram utilizadas como suporte para a divulgação do negacionismo como uma forma de governo decisiva em um contexto de crise de legitimidade das instituições democráticas e de crise crônica do modelo neoliberal, mas colocando o esgotamento de tal modelo debaixo do tapete (Roque, 2020ROQUE, T. O negacionismo no poder: como fazer frente ao ceticismo que atinge a ciência e a política. Piauí, São Paulo, n. 161, 2020. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/materia/o-negacionismo-no-poder/ . Acesso em: 15 out. 2021.
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). Com isso, o neoliberalismo pôde novamente ser oferecido como solução, mobilizando o mote conservador de que “os direitos da Constituição de 1988 não caberiam no PIB”. Viabilizou-se, assim, a radicalização e o aprofundamento das reformas neoliberais e a consolidação jurídica de sua política econômica.

Essa terceira onda de reformas neoliberalizantes foi acompanhada da uberização do trabalho (Abílio, 2017ABÍLIO, L. C. Uberização do trabalho: subsunção real da viração. Passapalavra, [s. l.], 19 fev. 2017. Disponível em: https://passapalavra.info/2017/02/110685/ . Acesso em: 6 out. 2021.
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, 2020ABÍLIO, L. C. Uberização: a era do trabalhador just-in-time? Estudos Avançados, São Paulo, v. 34, n. 98, p. 111-126, 2020.). Trata-se de um novo modelo de negócio em que grandes corporações monopolizam ou oligopolizam o acesso de prestadores de serviços e de provedores de bens aos clientes, intermediando a relação por meio de plataformas digitais. A uberização é uma espécie de neoliberalismo de segundo grau, já que a construção e regulação dos mercados passam a ser em larga medida realizadas pelas próprias empresas, embora não deixem de se combinar com e de alterar a regulação estatal e seus arcabouços legais e institucionais. Após a crise de 2008, esse modelo de autoemprego e empreendedorismo de si se tornou a principal alternativa para a massa de desempregados advindos das classes médias e trabalhadoras. Apesar da ausência de vínculos formais, as empresas-aplicativo mantêm o gerenciamento do trabalho, a avaliação dos clientes sobre os trabalhadores, a concorrência administrada e, eventualmente, até a dispensa dos trabalhadores. A uberização reconfigurou tanto os mercados formais, colocando a precarização e a informalidade como seu horizonte de realização, quanto os mercados informais, introduzindo formas de gerenciamento e controle do trabalho antes inexistentes.

A radicalização neoliberal foi consolidada no governo Bolsonaro com a combinação das reformas neoliberais de Paulo Guedes e a militarização da administração pública, além da presença importante de neopentecostais e militantes virtuais ligados ao movimento neoconservador internacional (Andrade, 2021ANDRADE, D. P. Neoliberalismo e guerra ao inimigo interno: da Nova República à virada autoritária no Brasil. Caderno CRH, v.31, 2021.; Cesarino, 2019CESARINO, L. Identidade e representação no bolsonarismo. Corpo digital do rei, bivalência conservadorismo-neoliberalismo e pessoa fractal. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 62, n. 3, p. 530-557, 2019.; Leirner, 2020LEIRNER, P. C. O Brasil no espectro de uma guerra híbrida: militares, operações psicológicas e política em uma perspectiva etnográfica. Rio de Janeiro: Alameda, 2020.; Martins Filho, 2021; Rocha, J., 2021). Desde então, as práticas autoritárias se intensificaram no assédio aos funcionários públicos, na relação com manifestantes e adversários políticos e na política de segurança pública, que recrudesceu a violência policial nos bairros pobres como forma de gerir a desigualdade e a pobreza crescentes (Almeida, 2020ALMEIDA, F. “Vândalos”, “trabalhadores” e “cidadãos”: sujeição criminal e legitimidade política na criminalização dos protestos de junho de 2013. Dados, Rio de Janeiro, v. 63, n. 4, p. 1-35, 2020.; Magalhães, 2021MAGALHÃES, A. A guerra como modo de governo em favelas do Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 36, n. 106, p. 1-20, 2021.).

Neoliberalismo autoritário a partir das margens

A eleição da extrema-direita representada por Bolsonaro, depois de décadas de polarização entre Partido dos Trabalhadores (PT) e Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB), pareceu, para muitos, resultado de um acidente histórico ou de uma histeria coletiva de repulsa ao petismo, fomentada pela enxurrada de fake news. Mas é preciso reconhecer que a compreensão da fase autoritária do neoliberalismo brasileiro passa pela relação entre o Estado e as margens da população. Ao invés de encarar a vitória da extrema-direita como uma espécie de anomalia histórica, é urgente entender como uma alternativa política que propôs o recrudescimento da violência do Estado, que ofereceu um programa econômico ultraliberal e que se posicionou declaradamente contra os direitos humanos e as conquistas das minorias obteve apoio da maioria dos eleitores. De fato, a gramática política, econômica e moral do bolsonarismo encontrou uma ressonância simbólica em uma parte dos mais pobres.

O discurso beligerante da extrema-direita não fez sua aparição de forma súbita. Ele se sedimentou insidiosamente na experiência cotidiana dos mais pobres durante as três décadas do período democrático e neoliberal. A vitória de Bolsonaro só pode ser pensada a partir dos experimentos biopolíticos e necropolíticos que o precederam e que, de alguma maneira, o criaram (Foucault, 2002FOUCAULT, M. Em defesa da sociedade. São Paulo: Martins Fontes, 2002.; Mbembe, 2018MBEMBE, A. Necropolítica. 3. ed. São Paulo: N-1, 2018., 2021MBEMBE, A. Políticas da inimizade. São Paulo: N-1, 2021.). Os esforços dos movimentos sociais de luta pela cidadania e de fabricação de um projeto democrático durante os anos 1970 e 1980, que resultaram na promulgação da Constituição de 1988, foram pegos a contrapelo com a introdução, na década de 1990, de políticas neoliberais. A neoliberalização produziu uma mudança na paisagem brasileira: a precarização do trabalho, o agravamento da violência criminal e a disseminação das igrejas pentecostais/neopentecostais. Nesse período, foram testados variados experimentos bio e necropolíticos do Estado com as margens: a militarização dos territórios urbanos, o assassinato, a tortura e o encarceramento massivo dos pobres e negros e a segregação socioespacial dos marginais. A racionalidade governamental do Estado fomentou um governo seletivo que recortou a população em cesuras segundo critérios de vulnerabilidade e perigo.

Partindo desses recortes, os sujeitos habitantes das margens criaram os seus próprios dispositivos de governo das condutas: o dispositivo pentecostal, o dispositivo do “mundo do crime”, o dispositivo das milícias e outros. Os dispositivos dos sujeitos periféricos, por sua vez, também passaram a operar segundo a lógica autoritária da guerra. A eliminação da alteridade se tornou uma gramática que passou a atravessar “regimes normativos” (Feltran, 2014FELTRAN, G. S. Valor dos pobres: a aposta no dinheiro como mediação para o conflito social contemporâneo. Caderno CRH, Salvador, v. 27, n. 72, p. 495-512, 2014.) distintos: o deus beligerante do pentecostalismo/neopentecostalismo, que trava uma luta incansável entre o bem e o mal por meio de uma máquina perpétua de demonização do outro; o “mundo do crime”, marcado por uma “sociabilidade violenta” (Silva, 2008SILVA, L. A. M. (org.). Vida sob cerco: violência e rotina nas favelas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.) fundada em uma disposição guerreira de extinção do inimigo; as milícias que dominam territórios marginais por meio do assassinato, da chantagem e da ameaça (Manso, 2020MANSO, B. P. A república das milícias: do esquadrão da morte à era Bolsonaro. São Paulo: Todavia, 2020.).

Todos esses dispositivos são, de alguma forma, atravessados por uma retórica da guerra econômica que estimula todos a se tornar empreendedores de si mesmos para sobreviverem no mercado, ainda que na figura inaudita de um empreendedorismo da ralé que opera nas franjas entre o formal e o informal, o lícito e o ilícito, o legal e o ilegal. Nos pontos de fricção entre o Estado e suas margens, produziu-se uma cogestão da questão social brasileira. O ódio destilado pela boca de Bolsonaro e de seu séquito de militantes nas redes sociais não é um ódio novo. Sua fala violenta encontra ressonância porque ecoa nas metáforas da guerra, cuidadosamente sedimentadas nas três décadas de experimentos biopolíticos e necropolíticos da Nova República. A campanha eleitoral da extrema-direita foi exitosa não simplesmente porque manipulou incautos, mas também porque foi capaz de traduzir uma violência silenciosamente experimentada na sociedade brasileira.

Esse neoliberalismo autoritário constituído de “baixo para cima” que marca o bolsonarismo tem um caráter insurgente nem sempre bem percebido pelas pesquisas. Há um elemento anti-hierárquico no fenômeno da nova direita que desconcerta os analistas, pois ele captura a potência de não identificação com o status quo que pertencia originalmente à esquerda. Bolsonaro e a maior parte dos quadros importantes na hierarquia do atual poder Executivo, como ministros e secretários, antes de assumir seus cargos, ocupavam posições subalternas e heterodoxas nos seus respectivos campos de atuação, marcados com algum sinal ambivalente de suspeição e infâmia. Ao se investirem das novas posições institucionais, estes sujeitos subverteram as regras do jogo político, bagunçaram as hierarquias e quebraram os protocolos. O próprio Bolsonaro construiu sua carreira política a partir de uma iconoclastia dos signos de respeitabilidade, dos códigos de civilidade e das liturgias do cargo. O bolsonarismo age como se o esforço de reconstrução da democracia brasileira nos últimos trinta anos precisasse ser passado a limpo, em nome de uma opção ousada o suficiente para fazer o que era supostamente preciso: desestruturar as instituições democráticas em nome de uma catarse purgatória – “ir contra tudo isso que está aí”, como não cansa de repetir o mandatário. A potência da revolta foi apropriada pela direita e mobilizada em defesa do mercado. Dessa forma, a direita se apossa, de forma criativa, do discurso da crítica social, esvaziando a narrativa emancipatória da esquerda, que se vê obrigada a fazer a defesa do status quo democrático.

O objetivo deste dossiê é justamente analisar a virada autoritária no Brasil quando as práticas autoritárias presentes nas franjas do Estado e nas margens da sociedade ganharam o centro do palco político. A ideia é atentar para a singularidade do processo brasileiro e observar, sob uma perspectiva histórica, como as estratégias autoritárias se compuseram com o neoliberalismo de maneira dinâmica e variada ao longo de toda a Nova República. Assim, buscou-se entender o que surgiu de novo, se transformou, se radicalizou ou se deslocou depois da crise econômica de 2015, do impeachment de Dilma Rousseff e da emergência do bolsonarismo, de modo a justificar a afirmação de que o neoliberalismo entrou em uma nova fase em nosso país.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2021
  • Aceito
    23 Set 2021
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