Acessibilidade / Reportar erro

TRAJETÓRIA TUPINAMBÁ NA LUTA PELA EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA: o exemplo do Colégio Estadual Indígena Tupinambá Serra do Padeiro (CEITP)

TUPINAMBÁ TRAJECTORY IN THE FIGHT FOR INDIGENOUS SCHOOL EDUCATION: the example of the Colégio Estadual Indígena Tupinambá Serra do Padeiro (CEITSP)

TRAJECTOIRE TUPINAMBA DANS LA LUTTE POUR L’EDUCATION SCOLAIRE AUTOCHTONE: l’exemple du Colégio Estadual Indígena Tupinambá Serra do Padeiro (CEITP)

Resumos

O artigo apresenta o projeto político dos Tupinambá da Serra do Padeiro em relação à educação escolar indígena, que tem requerido reorganização constante, na esteira do esbulho e em conformidade com o objetivo coletivo de proporcionar educação formal às novas gerações como meio de garantia de direitos e melhoria das condições de vida na aldeia. O recorte apresentado aqui contextualiza também a região do sul da Bahia, atentando mais especificamente em momentos chaves da trajetória de luta do povo Tupinambá de Olivença pelo reconhecimento étnico, pelo território e por uma educação diferenciada – com ênfase na comunidade da Serra do Padeiro –, destacando como momentos dessa trajetória se cruzam com o próprio Paulo Freire e a importância do seu trabalho.

Tupinambá; Educação escolar indígena; Paulo Freire; Bahia


The article presents the political project of the Tupinambá of Serra do Padeiro in relation to indigenous school education, which has required constant reorganization, in the wake of dispossession and in accordance with the collective objective of providing formal education to new generations as a means of guaranteeing rights and improvement of living conditions in the village. The period presented here also contextualizes the region of southern Bahia, paying more attention, at key moments in the trajectory of the struggle of the Tupinambá people of Olivença for ethnic recognition, for the territory and for a differentiated education – with emphasis on the Serra do Padeiro community – highlighting how moments of this trajectory intersect with Paulo Freire himself, and the importance of his work.

Tupinambá; Indigenous school education; Paulo Freire; Bahia


L’article présente le projet politique des Tupinambá de Serra do Padeiro par rapport à l’éducation scolaire autochtone, qui a nécessité une réorganisation constante, à la suite de la dépossession et conformément à l’objectif collectif d’offrir une éducation formelle aux nouvelles générations comme moyen de garantir droits et amélioration des conditions de vie dans la communauté. La période présentée ici contextualise également la région du sud de Bahia, en accordant plus d’attention à des moments clés de la trajectoire de la lutte du peuple Tupinambá d’Olivença pour la reconnaissance ethnique, pour le territoire et pour une éducation différenciée – en mettant l’accent sur la communauté de Serra do Padeiro – soulignant comment les moments de cette trajectoire se croisent avec Paulo Freire lui-même et l’importance de son travail.

Tupinambá; Éducation scolaire autochtone; Paulo Freire; Bahia


INTRODUÇÃO

O artigo apresenta o projeto político dos Tupinambá da Serra do Padeiro em relação à educação escolar indígena, o que tem requerido reorganização constante, na esteira do esbulho e em conformidade com o objetivo coletivo de proporcionar educação formal às novas gerações como meio de garantia de direitos e melhoria das condições de vida na aldeia. Além de ser diferenciado em decorrência da sua proposta pedagógica étnica voltada para os interesses indígenas e, especialmente, para os interesses Tupinambá, o Colégio Estadual Indígena Tupinambá Serra do Padeiro (CEITSP) tem a particularidade de acolher também os “outros”, ou seja, estudantes não indígenas. Nesse sentido, será visto de que forma esses estudantes são formados e capacitados à luz da chamada luta indígena, uma vez que estão recebendo uma educação escolar indígena.

O recorte apresentado aqui contextualiza também a região do sul da Bahia, atentando mais especificamente de forma cronológica em momentos chaves da trajetória de luta do povo Tupinambá de Olivença pelo reconhecimento étnico, pelo território e por uma educação diferenciada – com ênfase na comunidade Serra do Padeiro1 1 Uma das cerca de 20 localidades que integram a Terra Indígena Tupinambá de Olivença, que se estende por aproximadamente 47 mil ha, entre os municípios de Buerarema, Ilhéus, Una, São José da Vitória e Olivença no sul do estado da Bahia. –, destacando como momentos dessa trajetória se cruzam com o próprio Paulo Freire e a importância do seu trabalho.

Os depoimentos e transcrições apresentados remetem a entrevistas realizadas entre os anos de 2016 e 2018 como dados da tese de Pavelic (2019)PAVELIC, N. L. B. Aprender e ensinar com os outros: a educação como meio de abertura e de defesa na Aldeia Tupinambá de Serra do Padeiro (Bahia, Brasil). 2019. Tese (Doutorado em Antropologia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2019. , onde o conjunto de depoimentos pode ser acessado.2 2 Disponível em: < https://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/31034> .

RESISTÊNCIA TUPINAMBÁ DIANTE DAS INVASÕES

O final do século XIX é marcado pelo aumento da intrusão de não indígenas nas terras Tupinambá atraídos pela produção de cacau.3 3 Para mais informações sobre a situação dos Tupinambá no final do século XIX, cf. Alarcon (2013, p. 42-44). As terras indígenas foram mercantilizadas ou trocadas, endividando os indígenas que compravam produtos industrializados das vendinhas instaladas no entorno. Se em um primeiro momento os Tupinambá encontraram outras terras, com maior ou menor facilidade, entenderam rapidamente que se encontravam presos entre vários não indígenas recém-chegados, interditados de transitar ou acessar as roças, matas e rios. Alguns indígenas se tornaram empregados daqueles que invadiram suas terras, outros foram compelidos a sair e trabalhar fora e outros ainda resistiram, sendo considerados hoje pelos Tupinambá como os troncos velhos . Embora os Tupinambá nunca tenham deixado de resistir à intrusão e ocupação de suas terras, principalmente contra aqueles que queriam controlar a região, os anos 1930 e 1940 se mostraram particularmente difíceis.

A antropóloga Daniela Alarcon ressalta que o período entre 1937 e 1987, “balizado, de um lado, pela derrota do levante de Marcellino e, de outro, por um dos primeiros eventos da mobilização indígena contemporânea” (Alarcon, 2013, p. 44), carece de dados que teriam sua relevância para entender melhor o contexto do processo de recuperação territorial.

Marcellino José Alves, conhecido como o Caboclo Marcellino, é uma figura muito importante da resistência territorial dos Tupinambá entre as décadas de 1920 e 1930. Nesse período, Marcellino lutou contra o avanço dos não indígenas sobre o território, mobilizando seus parentes, o que o levou a ser perseguido e preso várias vezes. Ele e seus companheiros costumavam encontrar abrigo no interior do território, sendo a Serra do Padeiro o seu último refúgio. Não se sabe o que foi dele a partir de 1937. Durante as perseguições, muitos indígenas foram torturados para que delatassem onde ele e seus companheiros encontravam-se.4 4 Para mais informações, cf. Couto (2003, p , p. 53-63, 70-73), Campos (2006) , Lins (2007) , Brasil (2009) , Magalhães (2010, p , p. 20-21, 62, 73-74, 84-85), Alarcon (2013, p. 27-28, 38-44, 131-135), entre outros. A atuação do cacique Babau chegou a ser comparada àquela do Caboclo Marcellino – ver Couto (2012) . A falta de informações sobre certos períodos históricos acentua a invisibilidade dos Tupinambá que lutaram e resistiram repensando, constantemente, em suas estratégias para poder avançar no contexto de pertinência étnica.

Durante o período de trabalho de campo extenso (2017/2018), ao visitar o acervo das escolas do campo da prefeitura de Una, aproveitei para conhecer o Museu de Una e, assim, tentar obter informações sobre o início da educação formal no município. Entretanto, as informações confirmaram a invisibilidade da presença indígena na região. O museu reúne, basicamente, fotos e pertences de Manoel Pereira de Almeida, um dos mais notórios coronéis locais. Como os demais, Almeida facilitou a entrada de migrantes na região de Olivença e arredores, confinando, assim, os Tupinambá. Almeida, por sua vez, foi administrador e prefeito de Una nas décadas de 1920 e 1930.

Se, para alguns, Almeida é considerado um “herói”, entre os indígenas era conhecido como “o dono de Una”, como reporta a antropóloga Daniela Alarcon (2013, p. 114), conhecido pelas violências que praticava ou mandava praticar. Uma placa na entrada do museu informa que é “composto por peças que contam a rica história do município de Una”. Contudo, nessa “rica história” os Tupinambá são invisíveis. Por outro lado, o acervo evidencia sua abertura a culturas estrangeiras, mediante a acolhida de imigrantes – no caso, japoneses – que iriam “contribuir” para o desenvolvimento da região. Entre as fotos expostas, pode ser vista uma “escola de japoneses” do povoado de Colônia, datada de 1950.

Na região da Serra do Padeiro, um dos troncos velhos Tupinambá, seu Arlindo Fulgêncio Barbosa, conhecido como seu Bida, morava em uma terra comprada na década de 1940 por seu pai, João Fulgêncio, com um dinheiro que juntou trabalhando em fazendas. O pai de João Fulgêncio já havia, antes disso, comprado essas terras, mas as perdeu porque fez a negócio “de boca”, ou seja, sem titulação. Seu Bida registrou uma área que denominou de “Fazenda Cachoeira”.

Com o adoecimento de sua família, os deslocamentos até a cidade de Buerarema se tornaram mais frequentes, embora as condições materiais fossem precárias. Na década de 1960, ele resolveu trocar com José Soares – um não indígena morador de Buerarema5 5 Antes de 1943, o município chamava-se Macuco, do ribeirão Macuco. – uma parcela da sua fazenda por uma casa em Buerarema. Apesar da desvantagem da troca, foi a estratégia que a família de seu Bida vislumbrou, na época, para enfrentar a situação. A localidade passou, então, a ser chamada de “Zé Soares”. Ailza, uma das filhas de seu Bida, acompanhada de duas de suas irmãs, comentou o seguinte:

Há 50 e poucos anos atrás o homem mais rico era o homem que morava aqui. Era do meu pai, mas meu pai vendeu. Ele trocou uma casa. Nós ficamos da estrada para lá [em direção ao rio Maruim] e, Zé Soares, da estrada para lá. Ele não tinha filho, depois criou. Botou venda, botou bar, botou açougue, botou um bocado de coisas aqui, uma casa de farinha grandona. E nós morávamos do outro lado. Nós pobrezinhos do outro lado, recuados para lá. […] Uma mulher que morava desse lado [de Zé Soares], falou com um bocado de gente que vinham de Buerarema, gente grande – e eu escutei essa palavra que nunca esqueci, era menina. […] “Aqui é uma rua de um lado só” […] As donas daqui falavam que aqui era uma rua do lado só porque isso daqui era um bar grande, aqui era um casarão, aqui era outra casa, ali era casa de farinha muito grande, […] se achavam.

O comentário da mulher é bem ilustrativo do tipo de convivência desses não indígenas com os indígenas, bem como o preconceito e o propósito de invisibilizá-los para melhor se apropriarem das suas terras.

Inseridos nesse contexto, alguns Tupinambá tiveram o entendimento de que a educação formal poderia servir de ferramenta de luta como forma de recuperar seu território. Junto com os anciões da comunidade da Serra do Padeiro, mas também os adultos e jovens, foram levantadas informações sobre o acesso à educação formal na região a partir, mais ou menos, dos anos 1950, e, embora essas informações não preencham as lacunas existentes, elas trazem alguns elementos que evidenciam a presença e resistência dos Tupinambá na região.

Assim, foram categorizados em um mapa os locais onde tinha alfabetização como: escolas “dentro de casa”, “escolas particulares”, “escolas improvisadas” ou, ainda, “escolas municipais”. “Escola dentro de casa” é aquela caracterizada pela presença de um professor particular para ensinar a domicílio. O professor permanecia geralmente hospedado na casa do aprendiz, durante a semana, devido à falta de estradas e de transporte. Em alguns casos, foram os próprios pais que iniciaram a alfabetização dos filhos. Os anciões se referem a “escolas particulares” quando o professor era contratado pelos pais, mas, em vez de ensinar “dentro de casa”, ensinava em um local específico – fora de casa – onde se reuniam outras crianças da vizinhança. É considerado “escola improvisada” o local onde foram ministradas aulas sem pagamento ao professor, além de lugares improvisados, o que era também o caso muitas vezes das “escolas particulares”. Identificaram-se também, junto com a comunidade, 23 escolas municipais, como se pode ver no Mapa 1 . Sobre algumas delas, há poucas informações, o que dificultou a localização da documentação no acervo das escolas do campo nas prefeituras da região. Para outras, mesmo conhecendo o nome, não foi possível encontrar documentação.

Mapa 1
– Categorias de escolas existentes na região Serra do Padeiro (1950-2015) (fora os colégios estaduais indígenas*) TI Tupinambá de Olivença

Contudo, a identificação feita junto com os anciões indígenas dessas escolas municipais depois de 1930, bem como a partir da documentação disponível sobre as escolas municipais rurais da região, permitiu constatar que muitos indígenas expropriados voltaram a morar nos lugares de origem graças ao processo de recuperação territorial.6 6 Para informações detalhadas sobre o processo de recuperação territorial, ver as publicações da dissertação de mestrado (2019) e da tese de doutorado (2022) da antropóloga Daniela Alarcon. As memórias dos anciões e a documentação encontrada sobre algumas das escolas municipais comprovam que muitos não deixaram sequer de frequentar as terras que lhe foram expropriadas, para não deixarem de ser alfabetizados – em certos casos, até pelos próprios expropriadores. As narrativas revelam também que, apesar de não se tratar de uma prática sistemática, algumas famílias já se mostraram, nas primeiras décadas dos anos 1900, preocupadas com a alfabetização dos filhos mesmo em um contexto de isolamento no qual se encontravam, devido ao avanço dos não indígenas no território.

Tentou-se trazer aqui alguns elementos para entender o contexto da educação formal antes da implantação da educação escolar indígena tal como é entendida hoje e sobre os diversos “arranjos” produzidos pelos anciões para assegurar que os filhos fossem alfabetizados até que surgisse a escola como um projeto político. O esforço feito, com a colaboração da comunidade, para identificar as escolas ou o que se designava como tal teve como propósito também demonstrar o valor atribuído à educação escolar e a relevância dada a assinar o nome, ler e escrever, incipientemente, o que se amplia, de forma gradativa, com escolas mais atrativas e com estudantes e professores mais valorizados. Nesse contexto, como em outros contextos similares, a mobilização indígena funciona como um extraordinário fator impulsionador. Nesse sentido, Paulo Freire afirma que “não é a educação que forma a sociedade de uma determinada maneira, senão que esta, tendo-se formado a si mesma de uma certa forma, estabelece a educação que está de acordo com os valores que guiam essa sociedade” (Freire, 2006, p. 30).

A conscientização implica, pois, que seja ultrapassada a esfera espontânea de apreensão da realidade para se chegar a uma esfera crítica na qual a realidade se dá como objeto cognoscível e na qual o homem assume uma posição epistemológica ( Freire, 2006FREIRE, P. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. 3. ed. São Paulo: Centauro, 2006. , p. 30). É sabido que Paulo Freire, notadamente por meio do seu método de educação de adultos, teve significativa repercussão, em várias partes do Brasil, violentamente interrompida, porque reprimida, pela ditadura militar implantada no Brasil em 1964. Assim, não é impossível que os anciões tupinambás tenham ouvido falar dele e do seu método antes desse período. Ecos do seu trabalho – que tanto elevou a educação e, especialmente, a alfabetização de adultos e cuja atuação primeira se deu, afinal, no Nordeste – podem ter repercutido entre avós e pais tupinambás, suscitando o interesse em alfabetizar os netos e filhos. O que parecia até então impossível, pode, a partir de Freire, ter se afigurado possível. A repercussão do seu trabalho e sua metodologia se fez presente entre os Tupinambá na década de 1980, como será visto a seguir.

AFIRMAÇÃO ÉTNICA E LUTA PELA EDUCAÇÃO DIFERENCIADA

No final dos anos 1980, os Tupinambá se organizaram para reivindicar o reconhecimento de sua identidade e de seu território tradicional. No que diz respeito ao contexto geral, em 1982, a UNICEF incentivou a Igreja Católica no Brasil a agir para combater a mortalidade infantil. Nesse contexto, foi criado, em 1983, um organismo de ação social conhecido como Pastoral da Criança, com sede no Paraná, vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Sua ação busca a organização comunitária e a capacitação de “líderes voluntários” para atuar com as famílias, em suas comunidades, nos âmbitos da saúde, educação, nutrição e cidadania.7 7 Cf. “Quem Somos” do site da Pastoral da Criança: < https://www.pastoraldacrianca.org.br/missao-2> . A atuação da Pastoral da Criança se expandiu rapidamente em outros estados do Brasil, chegando a atuar na Bahia e na região de Olivença em 1985 ( Viegas, 2007VIEGAS, S. M. Terra calada: os Tupinambá na Mata Atlântica do sul da Bahia. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007. , p. 87) ou 1986 ( Magalhães, 2010MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 45).

A região sul da Bahia passou, durante a década de 1980, por uma forte crise da economia cacaueira, que viu seu valor cair diante de uma maior concorrência mundial, mas também devido a fatores climáticos desfavoráveis e à aparição da praga conhecida como vassoura-de-bruxa. Tal conjuntura fez que os trabalhadores rurais, que já estavam sendo explorados nas grandes fazendas da região, ficassem desempregados. Momentos da trajetória dos Tupinambá estão relacionados com a Pastoral da Criança de Olivença, bem como com a Federação dos Órgãos para a Assistência Social e Educacional (FASE) e o Coletivo de Educadores Populares da Região Cacaueira (CAPOREC).8 8 Ver mais especificamente os trabalhos de Couto (2003, p , p. 67-70), Silva (2004 e 2006), Viegas (2007, p , p. 87, 104) e Magalhães (2010, p , p. 40-50), que analisaram a sociogênese do movimento tupinambá e, então, as articulações com esses setores sociais. Ver também os trabalhos de Marcis (2008, p , p. 8-10), Ferreira (2011, p , p. 71-75), Lara (2012, p , p. 60-64; e 2017, p. 178-179), Ubinger (2012, p , p. 53-54), Alarcon (2013, p. 45), Costa (2013, p , p. 25, 46), Rocha (2014, p , p. 196, 216, 222, 256), J. Santana (2015, p , p. 88, 150) e S. Santana (2015) . As ações dos Tupinambá desenvolvidas junto com a Pastoral da Criança, mediante reuniões e acompanhamento das famílias pelos “líderes comunitários”, contribuíram para criar as condições para ativar uma rede de contatos que, posteriormente, junto com outros atores sociais, possibilitou em parte o encaminhamento de demandas referentes ao reconhecimento étnico das comunidades da zona rural de Olivença. Além disso, pode-se destacar a atuação de mulheres indígenas da região, principalmente de Nivalda Amaral, Pedrísia Damásio, Núbia Batista e Valdelice Amaral.

Durante os primeiros anos de atuação no local, a FASE avaliou que, para poder organizar os trabalhadores rurais atingidos pela crise da economia cacaueira da região, fazia-se necessário que tomassem consciência de sua condição, no intuito de reverter a situação de exploração e transformar, assim, essa realidade mediante um “processo educativo” ( Magalhães, 2010MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 40-43), dentre outras ações. Além de fortes taxas de mortalidade infantil, que vinham sendo combatidas com iniciativas tais como as da Pastoral da Criança, os anos 1980 e 1990 foram marcados também por uma taxa de analfabetismo elevada. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 1991, “73% da população rural da região cacaueira baiana não possuíam o domínio do código da leitura e da escrita” (Santos, 2000, p. 23, apud Magalhães, 2010MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 42, nota de rodapé 12). Diante desse cenário, a FASE passou a auxiliar projetos de educação popular na região com a cooperação de outras instituições, tal como as ações do movimento Fé e Alegria. Em 1990, a FASE, com outras organizações junto com as Comunidades Eclesiais de Base (CEB) e a Fundação Cultural de Coaraci (FUNDAC), possibilitou a criação, no município de Coaraci, do Projeto Piloto de Alfabetização Integral dos Assalariados da Lavoura Cacaueira ( Magalhães, 2010MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 43).

Tais projetos seguiam a filosofia da “pedagogia libertadora” de Paulo Freire, que dá continuidade, de certa maneira, às ideias de Frantz Fanon (1968)FANON, F. Os condenados da terra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968. , uma vez que ambos defendem uma educação capaz de conscientizar e dotar as pessoas – principalmente dos estratos sociais mais pobres e vítimas de desigualdades – de meios para superar sua condição subalterna. O processo educativo proposto deve então se basear na própria realidade do educando, de forma a construir junto com ele uma educação diferenciada, e não um modelo já pronto.

Em abril de 1992, o próprio Paulo Freire participou, em Coaraci, de um encontro organizado pela FASE, CEB, FUNDAC, entidades sindicais e associações de moradores.9 9 Cf. Magalhães (2010, p , p. 44), César (2015, p , p. 69) e Blog do CAPOREC (2011) . A partir desse encontro e mediante o apoio da FASE e de outras instituições, um grupo de educadores, dos quais Núbia Tupinambá fazia parte, fundou, em maio de 1992, o Coletivo de Alfabetizadores Populares da Região Cacaueira (CAPOREC), que atuou como um movimento social de educação popular organizado até setembro de 1996, quando se tornou pessoa jurídica sem fins lucrativos ainda com a infraestrutura da FASE ( Magalhães, 2010MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 43). Em 1996, o CAPOREC obteve recursos de prefeituras municipais para arcar minimamente com as despesas dos educadores ( Magalhães, 2010MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 45), tendo desenvolvido um projeto curricular específico, baseado na realidade das famílias com as quais trabalhavam, diferenciando-se do projeto curricular da própria FASE e do Projeto Piloto de Alfabetização Integral dos Assalariados da Lavoura Cacaueira de Coaraci.

Contudo, diante da necessidade de acessar o financiamento de ONGs nacionais e internacionais, foi preciso se adequar à pedagogia elaborada. Núbia Tupinambá, que atuava, então, como coordenadora pedagógica, aceitou trabalhar a partir das orientações do Programa Movimento Educação de Base Alfabetização em Parceria (PROMAP) voltado para a educação de jovens e adultos, mantendo, mesmo assim, certa autonomia na prática ( Magalhães, 2010MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 46).

Entre 1997 e 1998, tanto a Pastoral da Criança quanto o CAPOREC atuavam em cerca de dez “comunidades” em terras tupinambá, entre as quais, além de Olivença e Sapucaeira, Acuípe de Baixo e Campo de São Pedro, também na zona rural ( Magalhães, 2010MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 40; Viegas, 2007VIEGAS, S. M. Terra calada: os Tupinambá na Mata Atlântica do sul da Bahia. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007. ,10 10 A antropóloga Susana Viegas estava, durante esse período, realizando trabalho de campo para a elaboração de sua tese de doutorado. p. 87, 104; Marcis, 2008MARCIS, T. Educação escolar indígena diferenciada: regulamentação e implantação no Estado da Bahia – 1999-2007. Vitória da Conquista – Bahia, 2008. , p. 8). As ações desses projetos, especialmente durante a experiência de alfabetização de jovens e adultos, fizeram que histórias de vida fossem compartilhadas e a memória social fosse novamente ativada, ou pelo menos que se encontrasse uma oportunidade para ser compartida. As questões identitárias e étnicas se mostraram mais presentes.

Nas famílias dessas comunidades, alguns já tentavam esclarecer sua identidade recorrendo às memórias dos mais velhos. Contudo, essa preocupação ainda não era compartilhada entre todas as famílias. O processo de alfabetização desenvolvido pelas educadoras permitiu, assim, começar a desfazer as conotações negativas atreladas ao termo “índio” e fazer entender aos jovens e adultos que são mais do que “caboclos”11 11 Muitas vezes utilizado de forma pejorativa pelos não índios, como para negar a identidade indígena e, assim, não reconhecer os direitos dos indígenas. O termo “caboclo” pode, ainda, ter outros empregos, inclusive referir-se a alguns encantados. Para uma análise detalhada sobre os termos “índios” e “caboclos” em diferentes campos semânticos e contextos, cf. Carvalho & Carvalho (2012) , bem como Alarcon (2013, p. 27, nota de rodapé 15). de Olivença – termo usado, de forma pejorativa, para se referir aos moradores da zona rural da região. Nesse contexto, educadores e educandos começaram a assumir, gradativamente, sua identidade indígena ( Couto, 2003COUTO, P. N. A. Os filhos de Jaci: ressurgimento étnico entre os Tupinambá de Olivença, Ilhéus – BA. 2003. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em Antropologia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2003. , p. 68-69; Marcis, 2008MARCIS, T. Educação escolar indígena diferenciada: regulamentação e implantação no Estado da Bahia – 1999-2007. Vitória da Conquista – Bahia, 2008. , p. 10; Magalhães, 2010MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 50; César, 2015CÉSAR, A. L. S. Núcleo Yby Yara. Observatório de educação escolar indígena: fragmentos para uma cartografia da educação escolar indígena. Salvador: Quarteto, 2015. , p 70).

Em 1998, Núbia concluiu uma graduação em pedagogia na Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), continuando vinculada a tal instituição mediante cursos de extensão e de especialização sobre temáticas ligadas à educação, e também à FASE, por conta de suas ações com o CAPOREC. Sua experiência enquanto educadora nas comunidades da zona rural, em diálogo com sua experiência na universidade, permitiu desenvolver, junto com outras educadoras, um projeto curricular que refletisse uma educação ainda mais diferenciada, dessa vez incluindo a identidade indígena. Núbia, Pedrísia e outros educadores formaram, assim, o primeiro grupo de professores indígenas.

Consultando os anciões das comunidades, o grupo começou a se debruçar sobre a elaboração de um projeto curricular que incluísse reflexões sobre a identidade indígena e se interrogasse sobre que tipo de escola desejavam. Em outras comunidades, como na Serra do Padeiro, verbalizou-se também um projeto educativo comunitário. Mesmo com exemplos de experiências de alfabetização datadas das primeiras décadas dos anos 1900, supõe-se que a verbalização de um projeto de educação comunitário entre os Tupinambá da Serra do Padeiro remonta ao final dos anos 1970 e está associado às preocupações dos mais velhos com a educação de seus descendentes e, consequentemente, com o futuro do território.

Destacamos, assim, as recomendações feitas por João Ferreira da Silva – mais conhecido como João de Nô, um rezador muito importante da região e avô do cacique Babau (Rosivaldo Ferreira da Silva) – antes de falecer, em 1981, sobre a importância de seus netos estudarem. Ele chegou a atribuir missões específicas para alguns deles. Enfatizou que seus parentes precisariam dominar o conhecimento do “branco” em sua totalidade para não serem mais prejudicados. Era preciso aprender a ler e escrever, para que não fossem mais enganados com a assinatura de contratos e outros papéis. “É preciso ir ao mundo do branco para aprender, estudar, mas não podemos nos tornar brancos”, teria dito. Para ele, o importante é adquirir o conhecimento e “cuidar dele” para poder enfrentar os conflitos “sem depender de ninguém”. Naquela ocasião, João de Nô teria ainda indicado que eles deveriam “lutar pelo território” e “estar preparados”, uma vez que a perda da terra teria sido decorrente da falta de conhecimento do “mundo do branco”. A partir daí, os pais do cacique Babau, dona Maria e seu Lírio, empenharam-se a cumprir a vontade de João de Nô, escolarizando os filhos apesar de inúmeras dificuldades.

EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA E LUTA PELA TERRA

O reconhecimento oficial do povo Tupinambá por parte do governo foi pronunciado em 2002, mediante uma nota técnica da Coordenação Geral de Estudos e Pesquisas da Funai (CGEP/Funai). Houve, ainda em 2000, a visita de um assessor da presidência da Funai, que ressaltou a necessidade do reconhecimento oficial da comunidade e, em 2001, sendo criado um grupo de trabalho (GT) para levantar as demandas fundiárias (Alarcon, 2015, p. 48-49). No entanto, a portaria declaratória, que permitiria a finalização do processo demarcatório, não foi assinada até hoje. O GT de identificação e delimitação da Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença foi constituído em 2004, sob a coordenação da antropóloga Susana Viegas, cujo relatório foi entregue à Funai em 2005 e aprovado apenas em 2009, sendo finalmente encaminhado para o Ministério da Justiça em 2012.12 12 Para mais informações sobre a luta do povo Tupinambá por seu território, cf. Alarcon (2013; 2019).

De toda forma, com o encaminhamento da elaboração, por parte da Funai, do laudo antropológico que reconhece a demarcação do território, os Tupinambá puderam dar um passo à frente na efetivação dos seus direitos garantidos na Constituição de 1988 e, mais especificamente, no que diz respeito a uma educação escolar indígena diferenciada. A primeira escola com educação escolar indígena na TI foi criada em 2002, com o nome Escola Estadual Indígena Tupinambá de Olivença (EEITO), cuja sede foi inaugurada em 2006, em Sapucaeira. Com a identidade reconhecida oficialmente, uma outra fase era iniciada com a elaboração de um plano político pedagógico passível de ser trabalhado de acordo com conteúdo indígena e convencional. Ao fazer plenamente parte da vida e da organização sociopolítica das comunidades – pelo menos no contexto dos Tupinambá de Olivença –, a escola indígena está sujeita à movimentação interna do povo. Desse modo, as comunidades podem concordar ou não com a maneira de praticar a educação diferenciada e, assim, elaborar estratégias diferentes que possam traduzir-se tanto no trabalhar junto com uma escola sede quanto em desvincular-se dela para trabalhar com outra.

Em 2004, os Tupinambá da Serra do Padeiro realizaram a primeira retomada, isto é, a recuperação de parcelas de territórios tradicionalmente ocupado. Na primeira retomada, passou também a funcionar o anexo escolar Serra do Padeiro da, então, EEITO. Uma das primeiras medidas tomadas pelos Tupinambá da Serra do Padeiro, sob a liderança do cacique Babau, foi a desvinculação, em 2005, do anexo escolar de Serra do Padeiro para tornar-se uma escola autônoma da EEITO. Assim, obteve-se a segunda escola indígena da TI na época, chamada Escola Estadual Indígena Tupinambá Serra do Padeiro (EEITSP) até 2015, quando tornou-se Colégio Estadual Indígena Tupinambá Serra do Padeiro (CEITSP). Entende-se que a educação ali desenvolvida é duplamente diferenciada por atender estudantes indígenas e estudantes não indígenas como será visto a seguir. O projeto de educação escolar pensado pela comunidade, atende às orientações dos anciões e dos encantados, principais entidades da cosmovisão tupinambá.

Mapa 2
– Colégios Estaduais Indígenas TI Tupinamba de Olivença e seus anexos (ativos e desativados) - 2018

“AQUI É VARIADO, TEM ALUNOS DE TUDO QUE É LUGAR”: uma educação duplamente diferenciada

Em 2018, o corpo discente do CEITSP contava com 350 estudantes, sendo 177 do sexo masculino e 173 do sexo feminino; entre eles, 177 eram não indígenas, ou seja, basicamente a metade. Nesses últimos anos, o número de estudantes matriculados no CEITSP variava em torno de 400.

Além de ser diferenciado em decorrência da sua proposta pedagógica étnica voltada para os interesses indígenas e, especialmente, para os interesses Tupinambá, o CEITSP tem a particularidade de acolher também os “Outros”, ou seja, estudantes não indígenas provenientes de acampamentos e assentamentos de sem-terra, bem como famílias de trabalhadores rurais que vendem sua força de trabalho por “empreita” em fazendas da região. Nesse sentido, estar-se-ia diante de uma proposta de educação escolar interétnica que se propõe a incluir não indígenas em situação social estruturalmente próxima à dos indígenas, um Outro próximo ( Agier; Carvalho, 1994AGIER, M.; CARVALHO, M. R. G. Nation, race, culture: les mouvements noirs et indiens au Brésil. Cahiers de l’Amérique Latine, Paris, n. 17, p. 107-124, 1994. , p. 111). Trata-se de uma proposta que parece contemplar, complementar e relacionar questões relativas aos conceitos de etnicidade e de classe social, e que pode, de forma inovadora, apontar para alternativas de convívio étnico-social mais abrangentes e generosas.

A educação escolar, entre os Tupinambá, similarmente a outros povos indígenas, é considerada um ato político. Os estudantes não indígenas são também formados e capacitados à luz da chamada luta indígena, uma vez que estão recebendo uma educação escolar indígena. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu as bases da educação escolar indígena, ao garantir uma educação escolar específica, diferenciada, intercultural, bilíngue/multilíngue e comunitária. Esse conjunto de instrumentos legais representa um avanço no que diz respeito ao reconhecimento dos direitos dos povos indígenas, particularmente no caso dos Tupinambá, historicamente relegados à invisibilidade. Para o cacique Babau, o povo brasileiro, em geral, sofreu e sofre:

uma lavagem cerebral dentro das escolas “militarizadas”. O Brasil tem uma escola militarizada que ensina a ser obediente e concordar com tudo o que existe no país e não reagir, como se o país não fosse nosso, como se o dinheiro não fosse nosso, que está sendo roubado no país (Cacique Babau).

Contrariamente a esse modelo de escola “militarizada” ou ideologicamente enquadrada, a proposta do projeto político-pedagógico do CEITSP é promover uma educação “diferenciada, de qualidade e pela interação das pessoas, para um ensino de qualidade e respeito mútuo entre as pessoas” ( Escola Estadual Indígena Tupinambá Da Serra Do Padeiro, 2014ESCOLA ESTADUAL INDÍGENA TUPINAMBÁ DA SERRA DO PADEIRO. Projeto Político Pedagógico. 2014. , p. 5) capaz de favorecer o “resgate [d]a cultura, [a] luta pela terra e [os] cuidados ambientas” (2014, p. 9). Nesse sentido, o CEITSP vem trabalhando para manter viva a memória coletiva do povo Tupinambá, fortalecendo sua identidade e, consequentemente, mobilizando politicamente os estudantes, encampando, em simultâneo, o desafio de trabalhar para acolher o “Outro” e contornar os preconceitos.

A violência do Estado brasileiro, ao não demarcar o território tupinambá, viola os direitos dos indígenas, mas também dos não indígenas, principalmente aqueles oriundos de estratos sociais mais pobres. As tensões e conflitos que frequentemente eclodem entre os Tupinambá e segmentos regionais poderiam ter-se estendido para os pequenos produtores, trabalhadores rurais e sem-terra, e se instrumentalizado como mais um pretexto para não demarcar o território indígena. Contudo, conscientes da privação de direitos experimentada por esses não indígenas – estão consideradas aqui as privações territorial e educacional –, e de que eles não são seus inimigos, os Tupinambá acabaram abrindo-lhes as portas da educação escolar indígena, o que requer observar uma série de precauções por parte dos indígenas.

Como disse uma estudante indígena, “aqui é variado, tem alunos de tudo que é lugar, tudo que é tipo”. Percepção compartilhada por outra estudante, para quem “tem gente de toda cultura, de toda religião, de tudo assim… é legal porque é diferenciada a escola, é variada. É como se fosse uma escola fora, só que indígena”. Infere-se pelas suas falas que ambas parecem satisfeitas com a pluralidade. A recepção dos não indígenas se dá mediante a sua introdução às regras do colégio e às peculiaridades da educação escolar indígena.

Selecionar e sistematizar elementos da educação tupinambá para a educação escolar indígena não é tarefa fácil para os professores, muito menos ao ter que tomar em consideração a presença dos estudantes não indígenas no colégio. Previamente à matrícula, os estudantes são avisados de que aquele colégio não é um colégio público “comum”, já que receberão uma educação escolar indígena. A maioria prossegue com os trâmites de matrícula sem saber exatamente o que isso significará na prática, mesmo se a diretora e as secretárias deixarem claro que o currículo será composto por disciplinas diferenciadas e que as demais disciplinas serão trabalhadas a partir das características da comunidade.

Vale dizer que os encantados pediram que, antes de começar a aula, os corpos docente e discente – incluídos os estudantes não indígenas – se reunissem para rezar e cantar. E assim acontece a cada dia, no início dos turnos matutino e vespertino. Não se trata exatamente de um toré ,13 13 Ritual realizado entre os povos indígenas do Nordeste. Há rica literatura etnográfica – inclusive no Nordeste – que analisa o papel da esfera espiritual dos povos indígenas no movimento indígena, com base no toré ( Carvalho, 1994 ; Nascimento, 1994 ; Grünewald, 2005 ; Andrade, 2009) . Foi também examinado o papel político do toré , que, ao ser realizado entre os indígenas do Nordeste, contribui para o fortalecimento da identidade de cada um desses povos ( Oliveira, 2004) . Assim, o toré unifica ao mesmo tempo que distingue os povos indígenas na luta, cada um utilizando pinturas, trajes, cantos específicos. A depender da região do Nordeste e do povo indígena, o toré é também conhecido por porancim, awê, praiá, ouricuri , entre outras denominações. É interessante notar que entre os Tupinambá de Olivença, as designações toré e porancim são utilizadas. Contudo, a comunidade da Serra do Padeiro se refere quase sempre ao toré , enquanto outras comunidades, sobretudo as do litoral, optam por usar porancim . mas de uma reza de abertura para propiciar as atividades escolares, não sendo realizado no turno noturno por este ser mais curto (18h30 às 21h30). Sobre a prática, Magnólia – a diretora do CEITSP – informa a todos, em várias ocasiões, que “o toré é aula”, deixando claro que os ausentes seriam penalizados com faltas. A roda do toré matutina de abertura organiza-se ao redor do fogo, uma grande roda devido ao número maior de estudantes. Já a vespertina organiza-se em duas rodas, dispondo-se as crianças mais novas ao meio. Todos dão as mãos uns aos outros e começam por recitar as orações (três Pai Nossos, três Ave Marias, três Santa Marias), entoando também três cantos para os encantados da escolha dos estudantes ou professores.14 14 Cf. Ferreira (2011, p , p.106) e Reis (2017, p , p. 64-66). Todos se cumprimentam, nutrem-se de forças para bem iniciarem os trabalhos do dia, havendo também espaço para avisos coletivos.

Há deliberada preocupação em valorizar a oralidade e reforçar a identidade. Para os estudantes não indígenas, trata-se de uma prática totalmente diferente do que tiveram oportunidade de conhecer em outras escolas públicas não indígenas. Alguns deles, mesmo avisados com antecedência, chegam a pedir para não participar devido à religião que professam, pedido em geral formulado pelos evangélicos. A diretora explica, invariavelmente, que não pode acatar tal pedido uma vez que a realização do toré é considerada uma aula e é recomendação dos encantados, a quem o colégio pertence.

Importa compreender a formação desses estudantes sobre seus direitos e os direitos indígenas, com vistas à redução de preconceitos de parte a parte, de modo a permitir que tal formação possa ser ao mesmo tempo um meio de abertura para o outro não indígena, de defesa da comunidade mediante a conquista de novos aliados e de possibilidade, para uns e outros, de melhor convívio interétnico e de promoção social mediante a escolarização.

A diretora Magnólia observa, com propriedade, que geralmente o estudante não indígena que ingressa no colégio está também vinculado a algum movimento: “a gente tem mais pessoas que são da luta mesmo, mesmo não sendo índios, mas eles lutam pelo direito deles, eles têm uma luta parecida”. Sendo assim, ela acrescenta que os professores indígenas, além de ensinar os conteúdos das diferentes disciplinas, capacitam também os não indígenas sobre seus direitos na base da luta indígena: “O que a gente faz? Por que a gente faz? Qual é a lei que ampara? […] Então fala isso para eles, para eles também ter como se defender lá, quando alguém lá falar deles”. Nesse sentido, uma estudante indígena ressalta que:

A questão da luta indígena, da luta pela terra sempre vem à tona, fora da sala ou dentro da sala, sempre vem à tona. […] A luta da terra nunca teve assim uma matéria diretamente, mas sim sempre cai quando a gente está conversando sobre um assunto de história por exemplo, da época medieval, dos senhores feudais que a gente fez uma pequena comparação com os fazendeiros de hoje.

O representante de um assentamento vizinho à aldeia comentou que, antes mesmo de conhecer o cacique Babau pessoalmente, o defendia das pessoas que diziam “esses índios são todos ladrões”. Ao contrário, ele disse: “Eu vejo que é um camarada que luta”. Entende que os indígenas não estão tomando terra de ninguém, mas que estão apenas lutando pelos seus direitos. Segundo ele, quando as pessoas não conhecem a luta, discriminam. Eles também são chamados de “ladrões de terra” por serem do Movimento Sem Terra.

***

Na Serra do Padeiro, a transmissão de saberes, tanto aquela praticada pelos Tupinambá quanto aquela sistematizada no âmbito da educação escolar indígena, é indissociável das ações dos encantados. A reivindicação dos direitos – notadamente o direito à terra – constitui o vetor organizador da educação dentro e fora do colégio, sob o princípio de que os jovens devem ser preparados para se tornar aptos a desenvolver os projetos da comunidade e, consequentemente, avançar no projeto de construção da aldeia, na busca crescente de autonomia, como, por exemplo, poder, entre outras atribuições, definir com quem fazer ou não parceria.

Os Tupinambá entendem que os estudantes devem ser formados para trabalhar para a própria comunidade, e não para encontrar um emprego fora da aldeia ou enriquecer terceiros. Os estudos devem permitir o autodesenvolvimento da pessoa enquanto indivíduo, mas também do coletivo. No entendimento do cacique e das lideranças da comunidade, ter um emprego que não atenda às necessidades da comunidade equivale a uma situação de escravidão, remetendo ao contexto não muito distante de ter que trabalhar para outros, tais como fazendeiros, em situações análogas, por vezes, à escravidão. Nesse sentido, a escola, tal como apresentada por Paulo Freire, deve ser de “libertação” (Freire, 1992, 1994, 2000, 2006, 2014) e aproximar-se da realidade da comunidade.

Pode-se dizer que se trata de um modelo educativo que incomoda na região, produzindo uma ruptura da ordem de dominação. Esse modelo escolar está contribuindo para formar crianças, jovens e adultos sob novas bases, na contramão do que preconizam a lógica governamental e a lógica de mercado. E os Tupinambá estão conscientes disso. O modo de vida tupinambá, de acordo com a variante Serra do Padeiro observada, está gradativamente invertendo as posições no contexto regional: em vez de devedores dos poderes externos, dá-se o contrário, isto é, o modo de produção e reprodução tupinambá colabora, decisivamente, para a produção e reprodução regional, seja por meio da preservação do ambiente (nascentes e matas ciliares); seja mediante a sua cosmologia (espiritualidade); seja, finalmente, por meio do seu projeto de educação interétnica e intercultural que pode ser exportado em outro contexto.

Os jovens e crianças que vivenciaram, e continuam vivenciando, violências contra a comunidade – e que convivem com traumas e outros tipos de sequelas – são os mesmos que têm a missão de assegurar o futuro da aldeia. O contexto de recuperação territorial ainda hoje experimentado pela comunidade, e que só será superado com a demarcação da TI Tupinambá, não tem impedido, graças ao empenho e à força da sua comunidade, que crianças se desenvolvam conforme a cultura tupinambá, sob a égide da qual elas adquirem – tanto no contexto da educação tupinambá quanto na educação escolar tupinambá – as aptidões necessárias para a construção da aldeia. Uma dessas aptidões é também saber lidar com o mundo de “fora”, mediante uma aprendizagem produzida de dentro para fora, uma vez que o CEITSP, ao acolher estudantes não indígenas, se torna um laboratório de convivência interétnica. Nesse sentido, uma parcela significativa do contexto regional é acolhida no contexto indígena, invertendo a tendência dominante de o mundo indígena projetar-se para fora, em situação quase invariavelmente subalterna.

REFERÊNCIAS

  • AGIER, M.; CARVALHO, M. R. G. Nation, race, culture: les mouvements noirs et indiens au Brésil. Cahiers de l’Amérique Latine, Paris, n. 17, p. 107-124, 1994.
  • ALARCON, D. F. O retorno da terra: as retomadas na aldeia Tupinambá da Serra do Padeiro, sul da Bahia. Brasília. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Universidade de Brasília, Brasília, 2013.
  • ALARCON, D. F. O retorno da terra: as retomadas na aldeia Tupinambá da Serra do Padeiro, sul da Bahia. São Paulo: Elefante, 2019.
  • ALARCON, D. F. O retorno dos parentes: mobilização e recuperação territorial entre os Tupinambá da Serra do Padeiro, sul da Bahia. Rio de Janeiro: E-papers, 2022.
  • ANDRADE, U. M. Memória e diferença: os Tumbalalá e as redes de trocas no submédio São Francisco. São Paulo: Humanitas, 2009.
  • BLOG DO CAPOREC. História do CAPOREC – parte 1. 2011. Disponível em: <http://blogdocaporec.blogspot.com/2011/07/informacoes-sobre-o-caporec.html> Acesso em: 6 mar. 2023.
    » http://blogdocaporec.blogspot.com/2011/07/informacoes-sobre-o-caporec.html>
  • BRASIL. Relatório final circunstanciado de identificação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença. Diário Oficial da União. Brasília, 20 abr. 2009. Seção 1, edição n. 74, p. 52-57.
  • CAMPOS, J. S. Crônica da capitania de São Jorge dos Ilhéus. Ilhéus: Editus, 2006.
  • CARVALHO, M. R. De índios “misturados” a Índios “regimados”. Comunicação apresentada na 19. Reunião da ABA, 1994, Niterói. p. 1-16.
  • CARVALHO, M. R.; CARVALHO, A. M. (org.). Índios e caboclos: a história recontada. Salvador: Edufba, 2012.
  • CÉSAR, A. L. S. Núcleo Yby Yara. Observatório de educação escolar indígena: fragmentos para uma cartografia da educação escolar indígena. Salvador: Quarteto, 2015.
  • COUTO, P. N. A. Os filhos de Jaci: ressurgimento étnico entre os Tupinambá de Olivença, Ilhéus – BA. 2003. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em Antropologia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2003.
  • COUTO, P. N. A. Do caboclo Marcelino ao cacique Babau: resistência e criminalização dos Tupinambá de Olivença (comunicação oral). 28ª Reunião Brasileira de Antropologia (Grupo de trabalho “Ativismo indígena, etnicidade e política: mutações na configuração do indigenismo contemporâneo”). São Paulo: ABA, 2012.
  • COSTA, F. V. F. da. Revitalização e ensino de língua indígena: interação entre sociedade e gramática. 2013. Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Araraquara, 2013.
  • ESCOLA ESTADUAL INDÍGENA TUPINAMBÁ DA SERRA DO PADEIRO. Projeto Político Pedagógico. 2014.
  • FANON, F. Os condenados da terra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
  • FERREIRA, S. M. M. ‘A luta de um povo a partir da educação’: Escola Estadual Indígena Tupinambá da Serra do Padeiro. 2011. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2011.
  • FREIRE, P. Alfabetizar é preciso. Palestra proferida por Paulo Freire durante encontro de alfabetizadores populares, em Coaraci (BA), em 12 abr. 1992. Coaraci: Editora FASE, 1992.
  • FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994.
  • FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000.
  • FREIRE, P. Conscientização: teoria e prática da libertação: uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. 3. ed. São Paulo: Centauro, 2006.
  • FREIRE, P. Pedagogia da tolerância. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2014.
  • GRÜNEWALD, R. A. (org.). Toré: regime encantando do índio do Nordeste. Massangana, 2005.
  • LARA, A. E, M. Estar na cultura: os Tupinambá de Olivença e o desafio de uma definição de indianidade no sul da Bahia. 2012. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012.
  • LARA, A. E, M. Contra-invenções indígenas: antropologias, políticas e culturas em comparação desde os movimentos Nahua (Jalisco, México) e Tupinambá (Bahia, Brasil). 2017. Tese (Doutorado em Antropologia Social) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2017.
  • LINS, M. S. Os vermelhos nas terras do cacau: a presença comunista no sul da Bahia (1935-1936). 2007. Dissertação (Mestrado em História social) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2007.
  • MAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010.
  • MARCIS, T. Educação escolar indígena diferenciada: regulamentação e implantação no Estado da Bahia – 1999-2007. Vitória da Conquista – Bahia, 2008.
  • NASCIMENTO, M. T. S. O tronco da Jurema: ritual e etnicidade entre os povos indígenas do Nordeste – o caso Kiriri. Dissertação (Mestrado em Socio1ogia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador. 1994
  • OLIVEIRA, J. P. (org.). A viagem da volta: etnicidade, políticas e reelaboração cultural no Nordeste Indígena. 2. ed. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2004.
  • PAVELIC, N. L. B. Aprender e ensinar com os outros: a educação como meio de abertura e de defesa na Aldeia Tupinambá de Serra do Padeiro (Bahia, Brasil). 2019. Tese (Doutorado em Antropologia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2019.
  • REIS, E. A. A produção da Escola Tupinambá na Aldeia Indígena Serra do Padeiro. 2017. Dissertação (Mestrado em Relações Étnicas e Contemporaneidade) – Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Jequié. 2017.
  • ROCHA, C. C. “Bora vê quem pode mais”: uma etnografia sobre o fazer política entre os Tupinambá de Olivença (Ilhéus, Bahia). 2014. Tese (Doutorado em Antropologia social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2014.
  • SANTANA, J. V. J. “A letra é a mesma, mas a cultura é diferente”: a escola dos Tupinambá de Olivença. São Carlos. 2015. Tese (Doutorado em Antropologia social) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2015.
  • SANTANA, S. S. O papel das mulheres na definição e demarcação das terras indígenas dos Tupinambá de Olivença-BA. 2015. Tese (Doutorado em Ciências Sociais-Antropologia) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2015.
  • SILVA, N. B. Registro da memória da ação do CAPOREC e da afirmação da identidade étnica do povo Tupinambá de Olivença. FASE/Itabuna, 2004.
  • SILVA, N. B. Educação de jovens e adultos e a afirmação da identidade étnica do povo Tupinambá de Olivença – 1996 a 2004. 2006. Trabalho de conclusão de curso (Especialização em Educação de Jovens e Adultos) – Universidade Estadual de Santa Cruz, Ilhéus, 2006.
  • UBINGER, H. C. Os Tupinambá da Serra do Padeiro: religiosidade e territorialidade na luta pela terra indígena. 2012. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2012.
  • VIEGAS, S. M. Terra calada: os Tupinambá na Mata Atlântica do sul da Bahia. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007.
  • 1
    Uma das cerca de 20 localidades que integram a Terra Indígena Tupinambá de Olivença, que se estende por aproximadamente 47 mil ha, entre os municípios de Buerarema, Ilhéus, Una, São José da Vitória e Olivença no sul do estado da Bahia.
  • 2
  • 3
    Para mais informações sobre a situação dos Tupinambá no final do século XIX, cf. Alarcon (2013, p. 42-44).
  • 4
    Para mais informações, cf. Couto (2003, pCOUTO, P. N. A. Os filhos de Jaci: ressurgimento étnico entre os Tupinambá de Olivença, Ilhéus – BA. 2003. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em Antropologia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2003. , p. 53-63, 70-73), Campos (2006)CAMPOS, J. S. Crônica da capitania de São Jorge dos Ilhéus. Ilhéus: Editus, 2006. , Lins (2007)LINS, M. S. Os vermelhos nas terras do cacau: a presença comunista no sul da Bahia (1935-1936). 2007. Dissertação (Mestrado em História social) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2007. , Brasil (2009)BRASIL. Relatório final circunstanciado de identificação da Terra Indígena Tupinambá de Olivença. Diário Oficial da União. Brasília, 20 abr. 2009. Seção 1, edição n. 74, p. 52-57. , Magalhães (2010, pMAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 20-21, 62, 73-74, 84-85), Alarcon (2013, p. 27-28, 38-44, 131-135), entre outros. A atuação do cacique Babau chegou a ser comparada àquela do Caboclo Marcellino – ver Couto (2012)COUTO, P. N. A. Do caboclo Marcelino ao cacique Babau: resistência e criminalização dos Tupinambá de Olivença (comunicação oral). 28ª Reunião Brasileira de Antropologia (Grupo de trabalho “Ativismo indígena, etnicidade e política: mutações na configuração do indigenismo contemporâneo”). São Paulo: ABA, 2012. .
  • 5
    Antes de 1943, o município chamava-se Macuco, do ribeirão Macuco.
  • 6
    Para informações detalhadas sobre o processo de recuperação territorial, ver as publicações da dissertação de mestrado (2019) e da tese de doutorado (2022) da antropóloga Daniela Alarcon.
  • 7
    Cf. “Quem Somos” do site da Pastoral da Criança: < https://www.pastoraldacrianca.org.br/missao-2> .
  • 8
    Ver mais especificamente os trabalhos de Couto (2003, pCOUTO, P. N. A. Os filhos de Jaci: ressurgimento étnico entre os Tupinambá de Olivença, Ilhéus – BA. 2003. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado em Antropologia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2003. , p. 67-70), Silva (2004SILVA, N. B. Registro da memória da ação do CAPOREC e da afirmação da identidade étnica do povo Tupinambá de Olivença. FASE/Itabuna, 2004. e 2006), Viegas (2007, pVIEGAS, S. M. Terra calada: os Tupinambá na Mata Atlântica do sul da Bahia. Rio de Janeiro: 7Letras, 2007. , p. 87, 104) e Magalhães (2010, pMAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 40-50), que analisaram a sociogênese do movimento tupinambá e, então, as articulações com esses setores sociais. Ver também os trabalhos de Marcis (2008, pMARCIS, T. Educação escolar indígena diferenciada: regulamentação e implantação no Estado da Bahia – 1999-2007. Vitória da Conquista – Bahia, 2008. , p. 8-10), Ferreira (2011, pFERREIRA, S. M. M. ‘A luta de um povo a partir da educação’: Escola Estadual Indígena Tupinambá da Serra do Padeiro. 2011. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2011. , p. 71-75), Lara (2012, pLARA, A. E, M. Estar na cultura: os Tupinambá de Olivença e o desafio de uma definição de indianidade no sul da Bahia. 2012. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2012. , p. 60-64; e 2017, p. 178-179), Ubinger (2012, pUBINGER, H. C. Os Tupinambá da Serra do Padeiro: religiosidade e territorialidade na luta pela terra indígena. 2012. Dissertação (Mestrado em Antropologia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2012. , p. 53-54), Alarcon (2013, p. 45), Costa (2013, pCOSTA, F. V. F. da. Revitalização e ensino de língua indígena: interação entre sociedade e gramática. 2013. Tese (Doutorado em Linguística) – Universidade Estadual Paulista Julio de Mesquita Filho, Araraquara, 2013. , p. 25, 46), Rocha (2014, pROCHA, C. C. “Bora vê quem pode mais”: uma etnografia sobre o fazer política entre os Tupinambá de Olivença (Ilhéus, Bahia). 2014. Tese (Doutorado em Antropologia social) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2014. , p. 196, 216, 222, 256), J. Santana (2015, pSANTANA, J. V. J. “A letra é a mesma, mas a cultura é diferente”: a escola dos Tupinambá de Olivença. São Carlos. 2015. Tese (Doutorado em Antropologia social) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2015. , p. 88, 150) e S. Santana (2015)SANTANA, J. V. J. “A letra é a mesma, mas a cultura é diferente”: a escola dos Tupinambá de Olivença. São Carlos. 2015. Tese (Doutorado em Antropologia social) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2015. .
  • 9
    Cf. Magalhães (2010, pMAGALHÃES, A. M. A luta pela terra como “oração”: sociogênese, trajetórias e narrativas do “movimento” Tupinambá. 2010. Dissertação (Mestrado em Antropologia social) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2010. , p. 44), César (2015, pCÉSAR, A. L. S. Núcleo Yby Yara. Observatório de educação escolar indígena: fragmentos para uma cartografia da educação escolar indígena. Salvador: Quarteto, 2015. , p. 69) e Blog do CAPOREC (2011)BLOG DO CAPOREC. História do CAPOREC – parte 1. 2011. Disponível em: <http://blogdocaporec.blogspot.com/2011/07/informacoes-sobre-o-caporec.html>. Acesso em: 6 mar. 2023.
    http://blogdocaporec.blogspot.com/2011/0...
    .
  • 10
    A antropóloga Susana Viegas estava, durante esse período, realizando trabalho de campo para a elaboração de sua tese de doutorado.
  • 11
    Muitas vezes utilizado de forma pejorativa pelos não índios, como para negar a identidade indígena e, assim, não reconhecer os direitos dos indígenas. O termo “caboclo” pode, ainda, ter outros empregos, inclusive referir-se a alguns encantados. Para uma análise detalhada sobre os termos “índios” e “caboclos” em diferentes campos semânticos e contextos, cf. Carvalho & Carvalho (2012)CARVALHO, M. R.; CARVALHO, A. M. (org.). Índios e caboclos: a história recontada. Salvador: Edufba, 2012. , bem como Alarcon (2013, p. 27, nota de rodapé 15).
  • 12
    Para mais informações sobre a luta do povo Tupinambá por seu território, cf. Alarcon (2013; 2019).
  • 13
    Ritual realizado entre os povos indígenas do Nordeste. Há rica literatura etnográfica – inclusive no Nordeste – que analisa o papel da esfera espiritual dos povos indígenas no movimento indígena, com base no toré ( Carvalho, 1994CARVALHO, M. R. De índios “misturados” a Índios “regimados”. Comunicação apresentada na 19. Reunião da ABA, 1994, Niterói. p. 1-16. ; Nascimento, 1994NASCIMENTO, M. T. S. O tronco da Jurema: ritual e etnicidade entre os povos indígenas do Nordeste – o caso Kiriri. Dissertação (Mestrado em Socio1ogia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador. 1994 ; Grünewald, 2005GRÜNEWALD, R. A. (org.). Toré: regime encantando do índio do Nordeste. Massangana, 2005. ; Andrade, 2009)ANDRADE, U. M. Memória e diferença: os Tumbalalá e as redes de trocas no submédio São Francisco. São Paulo: Humanitas, 2009. . Foi também examinado o papel político do toré , que, ao ser realizado entre os indígenas do Nordeste, contribui para o fortalecimento da identidade de cada um desses povos ( Oliveira, 2004)OLIVEIRA, J. P. (org.). A viagem da volta: etnicidade, políticas e reelaboração cultural no Nordeste Indígena. 2. ed. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2004. . Assim, o toré unifica ao mesmo tempo que distingue os povos indígenas na luta, cada um utilizando pinturas, trajes, cantos específicos. A depender da região do Nordeste e do povo indígena, o toré é também conhecido por porancim, awê, praiá, ouricuri , entre outras denominações. É interessante notar que entre os Tupinambá de Olivença, as designações toré e porancim são utilizadas. Contudo, a comunidade da Serra do Padeiro se refere quase sempre ao toré , enquanto outras comunidades, sobretudo as do litoral, optam por usar porancim .
  • 14
    Cf. Ferreira (2011, pFERREIRA, S. M. M. ‘A luta de um povo a partir da educação’: Escola Estadual Indígena Tupinambá da Serra do Padeiro. 2011. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2011. , p.106) e Reis (2017, pREIS, E. A. A produção da Escola Tupinambá na Aldeia Indígena Serra do Padeiro. 2017. Dissertação (Mestrado em Relações Étnicas e Contemporaneidade) – Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Jequié. 2017. , p. 64-66).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    22 Dez 2022
  • Aceito
    27 Fev 2023
Universidade Federal da Bahia - Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas - Centro de Recursos Humanos Estrada de São Lázaro, 197 - Federação, 40.210-730 Salvador, Bahia Brasil, Tel.: (55 71) 3283-5857, Fax: (55 71) 3283-5851 - Salvador - BA - Brazil
E-mail: revcrh@ufba.br