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Editorial - fármacos genéricos: importá-los até quando?

EDITORIAL

Fármacos genéricos: importá-los até quando?

Em 2009, o mercado brasileiro de medicamentos foi estimado em R$ 25 bilhões, o que corresponde à décima posição mundial e a aproximadamente 12% do mercado global. Representa fatia considerável do mercado mundial e é o primeiro da América Latina.

Os medicamentos podem ser classificados em fármacos, biofármacos e genéricos.

De forma geral, estão incluídos entre os primeiros os fitofármacos e outras modalidades, sendo que a principal semelhança entre fármacos (considerados como o princípio ativo de um medicamento) e os biofármacos (originados de processos biotecnológicos) é sua comercialização por concessão de monopólio pelo Estado, através de carta patente concedida à empresa/instituição que o descobriu ou o inventou.

As vendas de genéricos representam cerca de 8% do mercado brasileiro de medicamentos.

São moléculas cuja patente expirou (ca. 20 anos após sua descoberta/invenção) e que, portanto, podem ser produzidas, distribuídas e comercializadas por qualquer laboratório ou empresa farmacêutica pública ou privada, desde que dentro dos marcos regulatórios vigentes determinados pela ANVISA.

A Lei dos Genéricos (9787/99) estabeleceu o comércio de fármacos genéricos no País e determinou que estes tivessem seus preços finais ca. 40% inferior aos dos medicamentos protegidos por patente.

Apesar dos avanços ocorridos em decorrência da Lei nº 9787/99, que facilitou aos brasileiros maior acesso aos medicamentos, as empresas farmacêuticas brasileiras dedicadas a esse segmento do setor de medicamentos limitam-se a formular e a embalar os princípios ativos (farmoquímicos) que importam de mercados produtores distantes (Índia, Coréia ou China, principalmente), sangrando divisas do País e re-editando, em versão moderna, o "Caminho das Índias".

Considerando que os medicamentos genéricos são de origem sintética e que há competência acadêmica em Síntese Orgânica, no País, nos diversos Programas de Pós-Graduação com nível de excelência atribuído pela CAPES, poderemos envolver parte dessa expertise para estudar rotas de síntese conhecidas, descritas na literatura de patentes para fármacos genéricos.

Ademais, poderemos ainda introduzir inovações relevantes nessas rotas ou desenvolver novas, originais e inéditas, a partir de insumos mais atraentes econômica e ambientalmente.

Finalmente, poderemos também antecipar rotas originais para futuros fármacos genéricos que venham a ter sua proteção patentária vencida, nos capacitando a produzi-los localmente e, eventualmente, nos tornarmos um dos grandes fabricantes de farmoquímicos.

O medicamento líder em vendas no mundo, que atingiu, em 2009, a cifra de US$ 13 bilhões, terá sua patente expirada em junho de 2011, o que representa uma grande oportunidade comercial nesse segmento de medicamentos genéricos.

Há severos gargalos a serem superados nessa questão da produção de fármacos, genéricos ou não, no País.

Vale registro a extrema carência, senão ausência completa, de laboratórios de escalonamento primário, certificados e capacitados para adaptarem rotas sintéticas desenvolvidas, com sucesso, em nível de bancada em laboratórios universitários, onde se trabalha, quando muito, em nível de centigramas.

Promover a integração de capacidades, articulando o estudo de rotas sintéticas de medicamentos genéricos ou de novos fármacos, em escala de bancada, em mais de um laboratório acadêmico-universitário, identificados por suas competências específicas em determinadas rotas de síntese, incluindo-se a preparação dos insumos básicos necessários, dependerá, também, da existência desses laboratórios de escalonamento primário que poderão ser inovadores em modelo de gestão.

Esses laboratórios para terem sucesso devem ser geridos através de comitês multi-institucionais, rotativos, e terem a participação de representantes das empresas interessadas em projetos específicos, das agências financiadoras, das instituições de ciência e tecnologia participantes e dos pesquisadores envolvidos.

Das moléculas protegidas por patentes no Brasil, apenas uma é resultado de pesquisas feitas no País. Isso é muito pouco para um mercado consumidor tão importante como o brasileiro.

O investimento na síntese de fármacos genéricos, além de reduzir a dependência de genéricos importados, é um ótimo começo para o desenvolvimento de novos fármacos.

É necessário que ações nesse sentido sejam de fato promovidas, pois somente trilhando esse caminho poderemos inibir a vocação de mero mercado consumidor de medicamentos. Antes tarde do que nunca!

Eliezer Jesus de Lacerda Barreiro - UFRJ

Coordenador do Instituto Nacional de Ciência e

Tecnologia de Fármacos e Medicamentos

(INCT-INOFAR)

Angelo C. Pinto - UFRJ

Editor JBCS

Membro da Comissão de Governança e

Acompanhamento - (INCT-INOFAR)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jul 2010
  • Data do Fascículo
    2010
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