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A relevância da proteção e da transferência dos resultados de pesquisas acadêmicas

EDITORIAL

A relevância da proteção e da transferência dos resultados de pesquisas acadêmicas

Nas três últimas décadas há um crescente esforço global de formulação de políticas públicas, marcos regulatórios, iniciativas e planos que buscam estimular as parcerias público-privadas para potencializar o desenvolvimento econômico e social a partir do uso intensivo do conhecimento, da ciência e da tecnologia.

O conhecimento gerado nas instituições públicas de pesquisa é um insumo importante para a inovação em várias indústrias. Com a maior percepção da necessidade de as empresas diversificarem as suas fontes de inovação, a colaboração entre universidades e empresas tem se tornado um importante mecanismo de negócios e de acesso à tecnologia e a novos mercados, nas mais diferentes partes do mundo. Nesse sentido, parcerias universidade-empresa em pesquisa e desenvolvimento têm sido incentivadas e fortalecidas, uma vez que a cooperação entre esses atores torna-se relevante para a competitividade das empresas e da nação.

As universidades, percebendo sua missão como mais abrangente do que a produção e a disseminação do conhecimento, passam a exercer um papel mais pró-ativo nos sistemas de inovação, buscando formas de se relacionar com o setor produtivo, para promover o desenvolvimento tecnológico nas empresas, sem comprometer os valores acadêmicos. Cada vez mais tem aumentado a percepção de que a inovação também está relacionada com o papel dos docentes na universidade moderna.1

A combinação de excelência acadêmica e competência empreendedora é característica comum a grande parte das instituições de pesquisa exitosas, em vários países. Há vários exemplos de grupos de pesquisa que conseguiram estabelecer melhores interações e fazer contribuições importantes para a sociedade, mantendo a produtividade científica e qualidade acadêmica de seu trabalho.

Um dos focos centrais da universidade do século XXI passa a ser a formação de profissionais que tenham a visão do processo de inovação e que entendam como o conhecimento científico deve contribuir para que as empresas o utilizem de forma a promover o desenvolvimento tecnológico no país. Os alunos serão os futuros agentes do desenvolvimento tecnológico ao utilizarem o conhecimento adquirido durante seus estudos e pesquisas para gerarem inovação nas empresas ou criarem empresas tecnológicas de alto impacto, identificando e buscando responder às demandas sociais de forma inovadora. Nesse sentido, torna-se premente a necessidade de voltar o olhar para a universidade e suas políticas de proteger e transferir os resultados de suas pesquisas seja diretamente para empresas já formadas ou para formar empresas específicas para desenvolver as invenções acadêmicas.

Um estudo elaborado em 2009 pela Biotechnology Industry Organization relata os benefícios gerados pelo licenciamento de patentes de universidades norte-americanas no período de 1996-2007, dentre os quais se destacam os seguintes impactos econômicos: 187 bilhões de dólares no produto interno bruto; 457 bilhões de dólares na produtividade industrial bruta e a geração de 279 mil novos empregos. Mais expressivos ainda são os benefícios sociais gerados por meio da disponibilização no mercado de inovações originárias nos laboratórios de universidades, tais como a vacina contra a hepatite B, diversos medicamentos como Allegra e Taxol, o teste de próstata antígeno-específico, Google, entre vários outros.2,3

A cultura de propriedade intelectual e inovação nas universidades brasileiras e em boa parte das empresas locais ainda é incipiente. O aumento da consciência sobre a necessidade de transferir à sociedade os resultados das pesquisas universitárias implica mostrar à comunidade acadêmica que um bom resultado de pesquisa não é suficiente para ser transformado em inovação. Além disso, em sendo os resultados das pesquisas universitárias públicas um "bem público", devem ser devidamente protegidos e gerenciados visando ao maior benefício da sociedade. Para tal, torna-se fundamental disseminar no país a cultura da propriedade intelectual, com o intuito de orientar os agentes que estão envolvidos na produção do conhecimento e da tecnologia, de forma que o maior benefício social seja alcançado.

Os novos conhecimentos gerados na universidade muitas vezes envolvem riscos e exigem investimentos para que possam se transformar em inovações tecnológicas capazes de aprimorar a qualidade de vida da sociedade. A proteção dessas criações por meio dos direitos de propriedade intelectual será, muitas vezes, a única forma de se conseguir esse resultado. Para tal, sua adequada proteção visando à atratividade de investimentos para a sua conversão em produtos ou processos pela indústria torna-se relevante. A universidade deve ter preocupação constante de construir, ampliar e manter a consciência interna da comunidade sobre a importância da proteção de seu capital intelectual.

Com a evolução da experiência brasileira, constrói-se uma percepção governamental, empresarial e acadêmica mais convergente em relação às novas potencialidades e às dificuldades dessa parceria no âmbito das atuais políticas e marcos regulatórios.

Um grande avanço foi concretizado com a criação de Núcleos de Inovação Tecnológica nas universidades e outras instituições científicas e tecnológicas públicas, conforme determinado na Lei de Inovação brasileira – Lei 10973/2004 – primeira lei que trata do relacionamento universidade-empresa. Esses núcleos têm por missão central cuidar da proteção e negociação da propriedade intelectual decorrente da pesquisa universitária e prover apoio à parceria da universidade com empresas e outras organizações sociais para a geração de inovações.

A importância das parcerias universidade-empresa em inovação e da formação de empresas nascentes de alto impacto baseadas em conhecimento será crescente e indispensável para superar o desafio de radicar no país uma estrutura tecnológica capaz de atender às necessidades de desenvolvimento econômico internacionalmente competitivo, suportado por preceitos de responsabilidade social e ambiental.

Patricia Tavares Magalhães de Toledo

Roberto de Alencar Lotufo

Agência de Inovação Inova Unicamp

  • 1. Altbach, P. G.; Reisberg, L.; Rimbley, L. E.; Trends in Global Higher Education: Tracking an Academic Revolution Executive Summary. A Report Prepared for the UNESCO 2009 World Conference on Higher Education. UNESCO: Paris, 2009.
  • 2. Biotechnology Industry Organizatio - BIO; The Economic Impact of Licensed Commercialized Inventions Originating in University Research, 1996-2007. Final Report to the Biotechnology Industry Organization. BIO: Washington, 2009. Disponível em: http://www.bio.org/ip/techtransfer/BIO_final_report_9_3_09_rev_2.pdf
  • 3. Pradhan, A. S.; Defending the University Tech Transfer System. Business Week, fev. 2009. Disponível em: http://www.businessweek.com/ smallbiz/ content/feb2010/sb20100219_ 307735.htm

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jun 2011
  • Data do Fascículo
    Jun 2011
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