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Infecção por Chryseobacterium indologenes: relato de um caso

Resumos

Relatamos um caso de infecção por Chryseobacterium indologenes, presente na cultura de aspirado traqueal em paciente sob ventilação mecânica invasiva, revisando os aspectos epidemiológicos, microbiológicos e o tratamento na unidade de terapia intensiva. Paciente do sexo masculino, 30 anos, internado com quadro de aplasia de medula idiopática e neutropenia febril foi transferido para a unidade de terapia intensiva com quadro de broncopneumonia e sepse grave de origem pulmonar. A maioria dos casos já relatados de pacientes com infecção por Chryseobacterium indologenes apresentavam patologias graves associadas e infecções polimicrobianas que podem dificultar a interpretação da efetividade da terapia antimicrobiana contra este agente.

Chryseobacterium; Infecção hospitalar; Sepse; Neutropenia febril; Relatos de casos


A case of Chryseobacterium indologenes infection is reported, identified in an invasive mechanic ventilation patient's tracheal aspiration material. Epidemiological, microbiological, and intensive care unit therapy aspects are discussed. The patient was a 30 years-old male, admitted with idiopathic medullary aplasia and febrile neutropenia, referred to the intensive care unit with severe bronchopneumonia and sepsis of pulmonary origin. Most of the previously reported Chryseobacterium indologenes infection cases were associated with severe diseases and polymicrobial infections which could make difficult interpreting antimicrobial therapy options against this agent.

Chryseobacterium; Cross infection; Sepsis; Neutropenia; Case reports


RELATO DE CASO

Infecção por Chryseobacterium indologenes: relato de um caso

Renata de Souza FerreiraI; Fabiana Ferreira Barbosa BrandãoII; Suzana Margareth LoboIII

IMédica Residente de Terapia Intensiva da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto – FAMERP – São José do Rio Preto (SP), Brasil

IIMédica Residente de Terapia Intensiva da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto – FAMERP – São José do Rio Preto (SP), Brasil

IIIDoutora, Professora de Medicina Interna da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto – FAMERP – São José do Rio Preto (SP), Brasil

Autor para correspondência Autor para correspondência: Suzana Margareth Lobo Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto Serviço de Terapia Intensiva do Hospital de Base e Laboratório de Sepse Avenida Brigadeiro Faria Lima, 5544 CEP: 15090-000 – São Jose do Rio Preto (SP), Brasil E-mail: suzanalobo@yahoo.com

RESUMO

Relatamos um caso de infecção por Chryseobacterium indologenes, presente na cultura de aspirado traqueal em paciente sob ventilação mecânica invasiva, revisando os aspectos epidemiológicos, microbiológicos e o tratamento na unidade de terapia intensiva. Paciente do sexo masculino, 30 anos, internado com quadro de aplasia de medula idiopática e neutropenia febril foi transferido para a unidade de terapia intensiva com quadro de broncopneumonia e sepse grave de origem pulmonar. A maioria dos casos já relatados de pacientes com infecção por Chryseobacterium indologenes apresentavam patologias graves associadas e infecções polimicrobianas que podem dificultar a interpretação da efetividade da terapia antimicrobiana contra este agente.

Descritores: Chryseobacterium; Infecção hospitalar; Sepse; Neutropenia febril; Relatos de casos

INTRODUÇÃO

O gênero Chryseobacterium compreende seis espécies que foram previamente designadas como Flavobacterium. Estes organismos são bacilos aeróbicos gram-negativos, não fermentadores, oxidase-positivos.(1)

Chryseobacterium indologenes se encontra no solo, plantas, alimentos, água doce, salgada e potável. No ambiente hospitalar estão presentes nos sistemas de água, superfícies de equipo e aparatos médicos úmidos (respiradores, tubos, umidificadores e outros).(2)

Em 1993 foi isolado a primeira cepa de Chryseobacterium indologenes de um aspirado traqueal em um paciente com pneumonia associada à ventilação mecânica, entretanto a patogenicidade de tal bactéria não estava clara. Porém, já é sabido que forma um biofilme e produz uma protease importante na sua patogenicidade.(3) Espécies de Chryseobacterium são uma causa rara de doença em humanos.(4) Contudo, há relatos esparsos de casos em crianças e adultos.(1,4-10) As infecções associadas são de corrente sanguínea, pneumonia, intra-abdominais e de ferida operatória(5,8-10) e, as principais comorbidades são diabetes mellitus e doenças oncológicas.(2, 3)

Este relato é um estudo retrospectivo de um paciente internado na Unidade de Terapia Intensiva do Hospital de Base de São José do Rio Preto da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, no período de janeiro a março de 2009. O termo de consentimento livre e esclarecido não foi solicitado por se tratar de um relato de caso em que o paciente cujos dados aqui trabalhados não será identificado.

RELATO DE CASO

Paciente do sexo masculino, 30 anos, branco, internado em 13 de janeiro de 2009 com hipótese diagnóstica de aplasia de medula idiopática e neutropenia febril. Apresentava quadro de febre alta, sem resolução com antitérmicos, seguido de tontura e dispnéia. Negava tosse, expectoração, alteração no trato gastrointestinal e gênito-urinário. Internado para investigação de foco infeccioso. Ao exame físico apresenta-se descorado, hidratado, consciente, orientado, exame cardiopulmonar e abdominal normais.

Exames laboratoriais: hemoglobina de 7,2 g/dl, hematócrito = 21%, leucócitos=900, plaquetas=4000, sódio=135 mEq/L, potássio=3,6 mEq/L, proteína C reativa=10,9 mg/dl. Uroculturas negativas e duas hemoculturas com Escherichia coli sensível a cefepime. Exames de imagem, ultrassonografia de abdome, tomografia computadorizada de tórax e ecocardiograma foram realizados e nenhum evidenciou alguma anormalidade. A antibioticoterapia inicial empírica foi com ceftazidima e amicacina.

No terceiro dia de internação na enfermaria foi introduzida a cefepime guiada pelos resultados das hemoculturas e substituindo o esquema antimicrobiano anterior. O paciente ainda permanecia febril e não responsivo ao tratamento inicial. Foram colhidas novas culturas e iniciado uso de imipenem após 21 dias de cefepime. No 34º dia de internação foi iniciado esquema GAL (imunoglobulina anti-linfocítica).

No 40º dia de internação foi transferido para a unidade de terapia intensiva (UTI) devido à piora clínica, com desenvolvimento de insuficiência respiratória e piora radiológica. À admissão na UTI estava em uso de vancomicina, imipenem e anfotericina B. Após três dias de internação na UTI apresentou infiltrado pulmonar no exame radiológico, insuficiência respiratória aguda, necessidade de intubação orotraqueal e ventilação mecânica. Foi colhido aspirado traqueal e houve crescimento de Chryseobacterium indologenes sensível a cefepime, ceftazidima, ciprofloxacina e sulfametoxazol-trimetoprim, sendo reiniciado uso de cefepime. No mesmo período uma hemocultura foi positiva para Candida krusei e foi iniciado tratamento com voriconazol.

Na UTI foi mantido com ventilação mecânica e o desmame progressivo do ventilador foi iniciado, mas no 55º dia de internação hospitalar apresentou um episódio súbito de enterorragia com choque hemorrágico refratário ao tratamento quando evoluiu para óbito.

DISCUSSÃO

A maioria das infecções por Chryseobacterium indologenes está ligada ao uso de dispositivos invasivos durante a permanência no hospital.(1) No paciente aqui relatado trata-se de uma pneumonia adquirida no hospital.

A melhor escolha de agente antimicrobiano para conduzir uma infecção nosocomial por Chryseobacterium indologenes é difícil de determinar e a eficácia clínica da terapia antimicrobiana também é de difícil avaliação por várias razões. Primeiro, o ponto de corte para uma concentração inibitória mínima (MIC) apropriada para definir a sensibilidade ou resistência do Chryseobacterium indologenes isolado a um agente antimicrobiano não foi aprovado pelo National Committee for Clinical Laboratory Standards (NCCLS). Segundo, quase todo espectro estendido de ação das penicilinas, primeira e segunda geração das cefalosporinas e aminoglicosídeos, mostraram pobre atividade in vitro contra Chryseobacterium spp. (incluindo Chryseobacterium indologenes).(1) De acordo com resultados do SENTRY Antimicrobial Surveilance Program, os melhores agentes contra C. indologenes são as quinolonas (gatifloxacina e levofloxacina) e sulfametoxazol-trimetoprim (>95% sensibilidade), seguido pela piperacilina-tazobactam (90% de sensibilidade). Ciprofloxacina, cefepime, ceftazidima, piperacilina e rifampicina mostraram atividade razoável (85% de sensibilidade).(2,5) Terceiro, há discrepâncias relatadas entre o padrão de diluição no teste com agar e o disco de difusão usado rotineiramente como método para testar a sensibilidade do Chryseobacterium spp a vários agentes antimicrobianos prescritos.(1) No presente caso, o agente foi isolado e o método utilizado para a determinação da sensibilidade foi disco de difusão.

Vale ressaltar que, no presente caso, a opção por cefepime foi feita de acordo com o resultado do antibiograma. Além disso, considerou-se que há relatos de sensibilidade a essa droga em mais de 80% dos casos. (2) A resposta terapêutica ao tratamento instituído foi difícil de ser avaliada, pois o paciente não foi extubado, teve piora clínica com infecção fúngica associada e, ao apresentar enterorragia, evoluiu com choque hipovolêmico e morte. A maioria dos casos já relatados de pacientes com infecção por Chryseobacterium indologenes apresentavam patologias graves associadas e infecções polimicrobianas o que pode dificultar a efetividade da terapia antimicrobiana contra um agente específico.

CONCLUSÃO

Deve-se ter atenção ao achado desse agente em culturas de pacientes críticos. Mais estudos apontam para que pesquisas epidemiológicas deste organismo em vários ambientes hospitalares sejam necessárias para esclarecer a provável ligação com infecção nosocomial.

Submetido em 2 de Dezembro de 2009

Aceito em 12 de Março de 2010

Recebido de Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto – FAMERP – São José do Rio Preto (SP), Brasil.

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  • Autor para correspondência:
    Suzana Margareth Lobo
    Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto
    Serviço de Terapia Intensiva do Hospital de Base e Laboratório de Sepse
    Avenida Brigadeiro Faria Lima, 5544
    CEP: 15090-000 – São Jose do Rio Preto (SP), Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Maio 2010
    • Data do Fascículo
      Mar 2010

    Histórico

    • Recebido
      02 Dez 2009
    • Aceito
      12 Mar 2010
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