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Terminalidade da vida em terapia intensiva: posicionamento dos familiares sobre ortotanásia

Resumos

OBJETIVOS: O objetivo deste estudo foi avaliar o posicionamento dos familiares sobre a ortotanásia, ao considerar controle dos sintomas, preferência do paciente e influência da satisfação da comunicação do tratamento informado pela equipe médica. MÉTODOS: Foi realizado um estudo descritivo na unidade de terapia intensiva geral adulto do Hospital do Servidor Público Estadual durante o período de um ano. Utilizou-se um questionário estruturado, baseado no Quality of Dying and Death (QODD 22) e entrevista informal prévia. RESULTADOS: Foram avaliados 60 familiares, com 51,7 ± 12,1 anos, sendo 81,7 % do sexo feminino. Os pacientes estavam internados em média por 31 ± 26,9 dias, sendo que 17,0% dos dias na unidade de terapia intensiva. A maioria apresentava doença neurológica. A maioria dos pacientes (53,3%) discutiu o desejo de cuidados de final de vida com a família, mas 76,7% dos pacientes não discutiram com seu médico (p<0,00). Os familiares responderam a favor da ortotanásia em 83,3 %; a maioria (85,0%) gostaria que a equipe médica discutisse claramente o assunto e 65,0% desejavam participar do processo de decisão de qualidade de final de vida. Quanto à satisfação dos familiares em relação às informações médicas: 93,3% consideraram ter adequada freqüência na comunicação do estado clínico; 81,7% conseguiram tirar as dúvidas sobre o estado clínico do paciente; em 83,3% a comunicação foi compreendida e 80,0% consideraram terem recebido as informações com clareza e honestidade. Somente 43,3% dos familiares gostaria de presenciar o momento da morte de seu ente querido. Houve associação significativa do posicionamento dos familiares sobre ortotanásia e participação na decisão de final de vida (p = 0,042). CONCLUSÕES: A maioria dos familiares entrevistada foi a favor da ortotanásia, e gostaria de participar da tomada de decisão de qualidade de final de vida.

Família; Estado terminal; Cuidados intensivos; Atitude frente a morte; Ética; Comunicação


OBJECTIVES: This study aimed to assess family member acceptance of orthotanasia as related to symptom management, patient preference and the influence of the medical team's communication on therapy. METHODS: This was a descriptive one-year study conducted at the adult intensive care unit of the Hospital do Servidor Público Estadual. A structured questionnaire based on the Quality of Dying and Death (QODD 22) instrument and prior informal interviews were used. RESULTS: Sixty family members were assessed; the mean age was 51.7 + 12.1 years, and 81.7% were female. The patients were hospitalized for a mean of 31 + 26.9 days, and 17.0% of these days were spent in the intensive care unit. Most of the patients had neurological conditions. Most of the patients (53.3%) had discussed their end-of-life care wishes with family members; however, 76.7% of them had not discussed this issue with their doctors (p < 0.00). The family members reported being favorable to orthotanasia in 83.3% of the cases. Most (85.0%) desired the medical team to clearly approach the subject, and 65.0% wished to take part in the quality of end-of-life decision making process. The family members were generally satisfied with information they received from the doctors: 93.3% believed they had received appropriately frequent communications about the clinical conditions; 81.7% were able to clarify their doubts regarding the patient's clinical status; the communication was understood by 83.3% of the respondents; and 80.0% believed that clear and honest information had been provided. Only 43.3% of the respondents wished to be present at the time of their loved ones' deaths. A significant association between family member acceptance of orthotanasia and participation in end-of-life decisions (p = 0.042) was observed. CONCLUSIONS: Most of the respondents were favorable to orthotanasia and wished to participate in end-of-life discussions.

Family; Critical illness; Intensive care; Attitude to death; Ethics; Communication


ARTIGO ORIGINAL

Terminalidade da vida em terapia intensiva: posicionamento dos familiares sobre ortotanásia

Maria Fernanda Gonçalves dos Santos; Débora Pastore Bassitt

Programa de Pós Graduação em Ciências da Saúde do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual - IAMSPE - São Paulo (SP), Brasil

Autor correspondente Autor correspondente: Maria Fernanda Gonçalves dos Santos Av. Brigadeiro Luís Antonio, 3333 cj 34 CEP: 01401-001 - São Paulo (SP), Brasil Fone: (11) 9981-1668 E-mail: mfgdsantos@gmail.com

RESUMO

OBJETIVOS: O objetivo deste estudo foi avaliar o posicionamento dos familiares sobre a ortotanásia, ao considerar controle dos sintomas, preferência do paciente e influência da satisfação da comunicação do tratamento informado pela equipe médica.

MÉTODOS: Foi realizado um estudo descritivo na unidade de terapia intensiva geral adulto do Hospital do Servidor Público Estadual durante o período de um ano. Utilizou-se um questionário estruturado, baseado no Quality of Dying and Death (QODD 22) e entrevista informal prévia.

RESULTADOS: Foram avaliados 60 familiares, com 51,7 ± 12,1 anos, sendo 81,7 % do sexo feminino. Os pacientes estavam internados em média por 31 ± 26,9 dias, sendo que 17,0% dos dias na unidade de terapia intensiva. A maioria apresentava doença neurológica. A maioria dos pacientes (53,3%) discutiu o desejo de cuidados de final de vida com a família, mas 76,7% dos pacientes não discutiram com seu médico (p<0,00). Os familiares responderam a favor da ortotanásia em 83,3 %; a maioria (85,0%) gostaria que a equipe médica discutisse claramente o assunto e 65,0% desejavam participar do processo de decisão de qualidade de final de vida. Quanto à satisfação dos familiares em relação às informações médicas: 93,3% consideraram ter adequada freqüência na comunicação do estado clínico; 81,7% conseguiram tirar as dúvidas sobre o estado clínico do paciente; em 83,3% a comunicação foi compreendida e 80,0% consideraram terem recebido as informações com clareza e honestidade. Somente 43,3% dos familiares gostaria de presenciar o momento da morte de seu ente querido. Houve associação significativa do posicionamento dos familiares sobre ortotanásia e participação na decisão de final de vida (p = 0,042).

CONCLUSÕES: A maioria dos familiares entrevistada foi a favor da ortotanásia, e gostaria de participar da tomada de decisão de qualidade de final de vida.

Descritores: Família; Estado terminal; Cuidados intensivos; Atitude frente a morte; Ética; Comunicação

INTRODUÇÃO

A bioética ressalta que, na unidade de terapia intensiva (UTI), no caso dos pacientes com evolução desfavorável, numa situação onde a manutenção dos sinais vitais se torna apenas o insuportável prolongamento do processo de morte em um quadro clínico grave, irreversível e incurável, é necessário avaliar os limites de suporte de vida (LSV).(1)

Consensos estão sendo desenvolvidos nos últimos anos em todo o mundo com o objetivo de melhorar as práticas no atendimento aos pacientes em situação de terminalidade.(2) Em nosso meio, apesar do aumento das discussões sobre LSV, há dificuldades em definir condutas. Os médicos intensivistas brasileiros têm como preferência a prática de "não reanimar", sendo que no hemisfério norte a conduta da retirada da ventilação mecânica dos pacientes é rotina.(3)

Por outro lado, os cuidados de final de vida em UTI são uma prática já bem estabelecida em outros países, exigindo conhecimento especializado como todas as outras áreas que fazem parte do atendimento ao paciente critico.(4) Nos Estados Unidos e Europa, existem ações bem delineadas de assistência paliativa dentro das UTIs, tais como: estratégias de controle de sintomas, habilidades de comunicação com o paciente/família apoio espiritual para as famílias, apoio emocional para os médicos e educação sobre cuidados paliativos.(5)

A equipe médica deve orientar os familiares sobre a futilidade do tratamento caso sejam mantidos os recursos curativos terapêuticos sem resposta clínica do paciente. A retirada ou limitação do suporte não terá impacto na evolução da doença, sendo necessário oferecer qualidade de final de vida (ortotanásia).(6) Isto possibilita a compreensão da família (substituto legal)na decisão de qualidade de final de vida quando o paciente está impossibilitado de decidir sobre o seu tratamento (novo Código de Ética Médica Brasileiro, em vigor desde abril de 2010, art. 24 e 41).(7)

Várias pesquisas publicadas destacam a importância da participação da família na decisão de LSV.(8) Observou-se que os obstáculos à participação dos familiares na decisão de qualidade de final de vida estão relacionados as falhas na comunicação médico/família e a falta de profundidade nesta relação,(9) principalmente quando não informam adequadamente o prognóstico do paciente.(10)

Estudos recentes mostram que no Brasil a prática de LSV está concentrada na perspectiva médica, com escassa participação da família(11) e de outros integrantes da equipe.(12) Alguns médicos intensivistas ainda tem receio em compartilhar com a família a decisão sobre a qualidade de final de vida.(13) A equipe médica deve estimular a possibilidade da família participar dessa decisão.(14)

O presente estudo teve como objetivo verificar o posicionamento dos familiares sobre a qualidade de fim de vida associados à percepção da gravidade do estado clínico, a influência da satisfação da comunicação do tratamento informado pela equipe médica e a preferência do paciente sobre qualidade de final de vida.

MÉTODOS

Após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP 004/09), foi realizado estudo descritivo na UTI de um hospital de referência, Hospital do Servidor Público Estadual (HSPE-FMO), com 27 leitos, onde são admitidos pacientes clínicos e cirúrgicos. Foram incluídos os familiares de todos os pacientes admitidos na UTI, para obtenção do conhecimento destes sobre ortotanásia, no período de abril de 2009 a abril de 2010, em que foi feito o diagnóstico de situação de terminalidade do paciente pela equipe médica, com permanência no setor acima de 5 dias. Todos assinaram termo de consentimento com participação voluntária e sigilosa, sem identificação dos familiares e pacientes. Foram excluídos aqueles que, após a entrevista inicial, demonstraram acreditar na melhora clínica, apesar da clareza sobre prognóstico de situação de terminalidade do paciente.

As entrevistas foram realizadas somente por um pesquisador, num espaço isolado com privacidade. Após breve análise da estrutura familiar (pai, mãe, filhos), do conhecimento sobre a história da doença, estado clínico, incluindo a compreensão acerca do prognóstico, foi entregue o questionário.

Utilizou-se um questionário estruturado adaptado do Quality of Dying and Death (QODD 22),(15) que consiste de 22 questões. O questionário foi validado através da aplicação a 10 familiares, verificando-se a compreensão plena das perguntas do mesmo

O questionário foi subdividido em quatro partes. A primeira parte tinha o objetivo de avaliar o conhecimento da família sobre o estado clínico e emocional do paciente, juntamente com a experiência emocional vivenciada por eles em relação a diversos aspectos do tratamento. A segunda parte do questionário avaliou a satisfação da família sobre a informação médica. Na terceira parte foram feitas perguntas sobre o tema qualidade de final de vida, como: se os familiares gostariam de discutir cuidados de final de vida, participar junto com a equipe médica das decisões, p. e. intubação ou não ou se a preferência do paciente foi discutida com o médico ou algum familiar em algum momento. Previamente ao preenchimento da terceira parte, o questionário continha breve explicação sobre o que é ortotanásia para que os familiares pudessem se posicionar a favor ou contra. Ao final, espaço para comentários e relato da experiência emocional com cada um dos itens discutidos. A quarta parte abordava aspectos gerais e as características sócio-demográficas dos familiares.

A análise do trabalho foi feita com o software estatístico SPSS versão 17.0. Foram utilizados os parâmetros da estatística descritiva adotando-se as medidas usuais de tendência central e de dispersão e cálculos de freqüência absoluta e relativas. Foi utilizado nível de confiança de 95% Utilizou-se teste Chi-quadrado para avaliar a associação entre o posicionamento dos familiares sobre ortotanásia e a satisfação com a comunicação das informações médicas dadas aos familiares, dados demográficos, discussão e participação dos cuidados de fim de vida.

RESULTADOS

Durante o estudo, de um universo de 75 pacientes em estado de irreversibilidade, somente 60 familiares aceitaram participar da pesquisa. Os principais diagnósticos dos pacientes foram acidente vascular cerebral (AVC) (31,7%), doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) com dependência de oxigênio suplementar (23,3%), câncer metastático (20,0%), disfunção múltipla de órgãos (13,3%) e parada cardiorrespiratória prolongada (11,7%). Destes pacientes, 53,3% eram do sexo masculino, 70,0% católicos e a média de idade foi de 77,2 ± 12,5 anos. A média da duração da internação na UTI foi de 17,5 ± (11,9) dias (Tabela 1). Todos os pacientes recebiam algum tipo de opióide. A tabela 1 mostra as características demográficas dos familiares que consentiram em participar da pesquisa. A maioria dos familiares era filho ou filha do paciente (65,0%), de religião católica (63,3%) e com escolaridade superior completa (35,0%).

Ao investigar a percepção dos familiares sobre o estado geral dos pacientes, 58,3% consideraram a dor sob controle apropriado e 71,7% a dignidade preservada (Tabela 2). A maioria dos pacientes (88%) estava sob ventilação mecânica e 90,0% dos familiares consideraram que eles não respiravam confortavelmente.

Grande parte dos familiares não soube avaliar a manifestação de medo de morrer (55%) ou a sensação de sentir-se em paz dos pacientes durante os últimos dias de internação na UTI (43,3%), provavelmente pelo fato dos mesmos não estarem responsivos, sem controle do que estava acontecendo, como percebeu a maioria dos entrevistados (73,3%).

Em relação à satisfação dos familiares quanto às informações médicas, 93,3% consideraram frequente a comunicação com os médicos, 81,7% conseguiram tirar as dúvidas sobre o estado clínico do paciente, em 83,3% a comunicação foi compreendida e 80,0% consideraram ter recebido a informação com clareza e honestidade. Na terceira parte do questionário correspondente à discussão de qualidade de fim de vida (Tabela 3), 76,7% dos entrevistados referiram que o paciente não discutiu anteriormente com o médico à qualidade de fim de vida, mas 53,3% discutiram com a família, p< 0,001). Quanto à participação da família no processo de decisão sobre qualidade de fim de vida 65% concordaram e 85% gostariam que a equipe médica discutisse claramente este assunto. No total, 83,3% dos familiares entrevistados referem ser a favor da ortotanásia. A maioria apresentou conhecimento sobre o conceito ortotanásia (85%), com 56,3% enfatizando tratar-se do não prolongamento do sofrimento de seu ente querido enquanto 26,7% não fizeram nenhum comentário. Entre os 16,7% de familiares que se posicionaram contra a ortotanásia, 6,7% não comentaram, 5% justificaram por questões religiosas, 5% querem discutir o assunto.

O posicionamento dos familiares a favor ou contra a ortotanásia foi significantemente associado à participação (ter conhecimento e poder opinar) na decisão de fim de vida (p=0,042). Não houve associação significativa do posicionamento dos familiares sobre ortotanásia, considerando sexo (p=0,499), escolaridade (p=0,955) ou religião (p=0,364). Não foi possível identificar nenhuma associação entre a comunicação do estado clínico aos familiares e a freqüência das informações (p=0,343), possibilidade de tirar dúvidas sobre o tratamento (p=0,852), clareza e honestidade (p=0,843) ou compreensão das informações (p=0,887).

DISCUSSÃO

No presente estudo, englobando familiares de pacientes em fase de final de vida internados em uma UTI de referência, podemos constatar que há desejo na participação da limitação de suporte de vida; percepção da gravidade do estado clínico e psíquico e conhecimento da preferência do desejo do paciente sobre qualidade de final de vida. Além disso, a comunicação da equipe médica foi considerada satisfatória.

Apesar de existir poucas pesquisas de investigação do posicionamento da família sobre ortotanásia, este estudo e alguns outros mostram que a maioria dos familiares se posiciona a favor,(16-18) e esse posicionamento está associado significativamente a sua participação na decisão de LSV. Observamos mudanças de comportamento das famílias com relação ao final de vida. Os familiares questionam a manutenção do suporte de vida para pacientes em situação de terminalidade. Conforme verificado nas pesquisas, o envolvimento da família na decisão de LSV é pouco estimulado pela maioria da equipe médica, provavelmente, pela dificuldade em lidar com dilemas de final de vida(19) percebido em nosso meio.

A família percebe que a LSV é uma conduta tomada em benefício do paciente e, por isso, aceitável. Os paradigmas em manter a vida do paciente são questionados ao perceberem o prolongamento do sofrimento em situação de irreversibilidade. A morte é encarada como alívio, descanso que livra da dor, fome, sede e desamparo.(20,21) A satisfação da família em relação à retirada do suporte de vida, além de amenizar o sofrimento, preserva a dignidade do paciente como também ja foi demonstrado em outros estudos.(18,22,23)

Evidencia-se neste estudo que discutir anteriormente a preferência dos cuidados de final de vida com os pacientes pode diminuir o peso destes no posicionamento sobre a tomada de decisão na limitação e suspensão do suporte de vida, fato também mostrado em outro estudo.(22) Por outro lado, mostrou-se aqui uma diferença relevante pois os pacientes não discutiram com os médicos qualidade de final de vida. Uma pesquisa atual feita em alguns hospitais brasileiros mostrou que, no caso de pacientes impossibilitados de participarem da decisão de final de vida pela gravidade do estado clínico, a maioria dos médicos está menos propensa a tomar a decisão, de forma diferente dos enfermeiros e familiares,(24) conclusão que coincide com outro estudo feito em Washington.(25)

Vários estudosressaltam a importância da comunicação da equipe médica com o paciente/família.(26-29) Pesquisas descrevem programas de treinamento para melhorar esta comunicação.(9,28) As famílias esperam da equipe médica, além de administração adequada dos sintomas dos pacientes, atenção a algumas necessidades específicas da própria família, tais como atenção, informações honestas, conforto, respeito pelas emoções trazidas por esta situação e apoio espiritual, além de ouvi-las e responder sobre suas dúvidas. Esta satisfação com a comunicação da equipe médica contribui na decisão sobre qualidade de final de vida.

Notou-se que nem todos os familiares podem estar prontos para a decisão sobre qualidade de final de vida. Os familiares não participantes da pesquisa comentaram saber da irreversibilidade do estado clínico, com dificuldade de opinar. Um estudo mostra que os familiares com papel passivo na tomada de decisão mantiveram sintomas de ansiedade e depressão.(30)

Podemos dizer que cada família tem uma maneira particular de reagir frente à situação de terminalidade. Estas reações podem ser influenciadas por vários fatores como história de vida, cultura, ideologia, mitos da sociedade relativos ao início e final da vida, assim como a religião e outros. Todos estes fatores podem ajudar a compreender os diferentes pensamentos das famílias sobre as condutas de LSV.

A complexidade da discussão sobre vida e morte, possibilitou a legalização da tomada de decisão LSV. Nos EUA e alguns países da Europa, é possível uma declaração prévia da vontade do paciente terminal sobre a tomada de decisão de final de vida, legalizada pelo âmbito federal.(17) Todavia, no Brasil a legalização sobre as condutas LSV (Resolução nº 1.805/06 do Conselho Federal de Medicina), estabelece como obrigatório o respeito ao desejo do paciente (novo Código de Ética Médica, abril 2009),(5,14) e em casos especiais, a família, como substituto legal, assume este direito. Estudos realizados mostram o aumento da prática de limitação de suporte de vida em várias regiões do território brasileiro, mas sem uma definição de conduta.(2) O Brasil juntamente com outros países latino-americanos discute acerca de recomendações dos passos seguidos para LSV.(3)

Este estudo contribui para uma dessas recomendações seguidas pela equipe médica, que seria incluir as famílias na participação da decisão de final de vida, sendo este o desejo delas. Já que existe amparo legal do ponto de vista ético, a equipe médica não pode justificar o receio em não compartilhar as decisões de final de vida.

O processo de morte e morrer não representam um evento simples como antigamente, em que o próprio moribundo organizava sua própria cerimônia.(31) O prolongamento da vida através do avanço da tecnologia, favorece estas discussões apresentadas neste artigo.

Este artigo tem diversas limitações como o número da amostra, a representação da realidade de uma única população e a falta de instrumentos validados para colher os dados, embora o questionário adaptado (QODD) tenha sido facilmente compreendido pelos familiares. Além disso, pode apresentar um viés na interpretação dos dados por influência da própria pesquisadora, apesar do treinamento da técnica utilizada. Mesmo com esse possível viés da metodologia, os dados apresentam consistência para atingir o objetivo do estudo. Para trabalho futuro seria interessante aprofundar as respostas sobre o posicionamento da ortotanásia e comparar as características próprias de cada família, um estudo multicêntrico e multidisciplinar.

CONCLUSÃO

A maioria dos familiares foi favorável a ortotanásia. Eles expressaram desejo de participar e discutir sobre a tomada de decisão de qualidade de final de vida.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a colaboração do Dr. João Manoel Silva Júnior e da psicóloga Sandra Vieira Cardoso no desenho deste estudo.

Submetido em 5 de Outubro de 2011

Aceito em 28 de Novembro de 2011

Conflitos de interesse: Nenhum.

Trabalho realizado na Unidade de Terapia Intensiva, Hospital Servidor Público Estadual "Francisco Morato de Oliveira" - HSPE-FMO - São Paulo (SP), Brasil.

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  • Autor correspondente:
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Abr 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Recebido
      05 Out 2011
    • Aceito
      28 Nov 2011
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