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Incidência e principais causas de extubação não planejada em unidade de terapia intensiva neonatal

Resumos

OBJETIVO: Determinar a incidência e as principais causas de extubação não planejada em recém-nascidos nas unidades de terapia intensiva neonatais do Hospital Sofia Feldman, de Belo Horizonte (MG). MÉTODOS: Estudo retrospectivo, realizado durante o período de 1º de julho de 2009 a 30 de abril de 2010. Os eventos de extubação não planejada e as principais causas associadas a estes foram avaliados por meio de uma ficha de eventos adversos. Foram analisadas as seguintes variáveis: gênero, idade gestacional corrigida, peso atual, tempo em ventilação mecânica, horário e motivos/causas do evento no dia da extubação não programada. RESULTADOS: Ocorreram 54 eventos de extubação não planejada, com incidência de 1,0 extubação não planejada/100 dias em ventilação mecânica. Essa taxa foi maior nos recém-nascidos com idade gestacional corrigida entre 30 e 36 semanas e peso < 1.000 g. As principais causas dos eventos de extubação não planejada foram: agitação do recém-nascido; manipulação inadequada do paciente durante execução de procedimentos; fixação inadequada e posicionamento do tubo endotraqueal. CONCLUSÃO: A incidência de extubação não planejada nas unidades de terapia intensiva neonatais pôde ser considerada baixa, de acordo com o período avaliado, quando comparada aos dados relatados na literatura. Contudo, uma avaliação da qualidade dos procedimentos e um acompanhamento contínuo desses recém-nascidos, assim como a monitoração das causas, são necessários para reduzir, ainda mais, tal incidência.

Extubação; Modalidades de fisioterapia; Incidência; Recém-nascido; Unidades de terapia intensiva neonatal


OBJECTIVE: This study established the incidence and primary causes of unplanned extubation in newborns in the neonatal intensive care units of the Hospital Sofia Feldman, Belo Horizonte (Minas Gerais). METHODS: This retrospective study was conducted between July 1, 2009 and April 30, 2010. Unplanned extubations and their primary causes were assessed using an adverse events form. The following variables were assessed: gender, corrected age, present weight, duration of mechanical ventilation time, and motives/causes of the event on the day of the unplanned extubation event. RESULTS: Fifty-four unplanned extubations occurred, which corresponded to an incidence of 1.0 event/100 days of mechanical ventilation. This rate was higher among newborns with a corrected age of 30 to 36 weeks and weight < 1,000 g. The primary causes of unplanned extubations included patient agitation, inappropriate handling of patients during the performance of procedures, and inappropriate fixation and positioning of the endotracheal tube. CONCLUSION: The incidence of unplanned extubation in the investigated neonatal intensive care units was low during the study period compared to previously reported data. Nevertheless, the assessment of the quality of procedures, the continuous follow-up of newborns, and the monitoring of the causes of extubation are required to further reduce this incidence.

Airway extubation; Physical therapy modalities; Incidence; Infant, newborn; Intensive care units, neonatal


ARTIGOS ORIGINAIS - PESQUISA CLÍNICA

Incidência e principais causas de extubação não planejada em unidade de terapia intensiva neonatal

Poliana Cardoso Ribeiro de Oliveira; Laura Alves Cabral; Renata de Carvalho Schettino; Simone Nascimento Santos Ribeiro

Hospital Sofia Feldman - HSF - Belo Horizonte (MG), Brasil

Autor correspondente Autor correspondente: Laura Alves Cabral Hospital Sofia Feldman Rua Antônio Bandeira, 1.060 - Tupi CEP: 31844-130 - Belo Horizonte (MG), Brasil E-mail: lauralacf@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Determinar a incidência e as principais causas de extubação não planejada em recém-nascidos nas unidades de terapia intensiva neonatais do Hospital Sofia Feldman, de Belo Horizonte (MG).

MÉTODOS: Estudo retrospectivo, realizado durante o período de 1º de julho de 2009 a 30 de abril de 2010. Os eventos de extubação não planejada e as principais causas associadas a estes foram avaliados por meio de uma ficha de eventos adversos. Foram analisadas as seguintes variáveis: gênero, idade gestacional corrigida, peso atual, tempo em ventilação mecânica, horário e motivos/causas do evento no dia da extubação não programada.

RESULTADOS: Ocorreram 54 eventos de extubação não planejada, com incidência de 1,0 extubação não planejada/100 dias em ventilação mecânica. Essa taxa foi maior nos recém-nascidos com idade gestacional corrigida entre 30 e 36 semanas e peso < 1.000 g. As principais causas dos eventos de extubação não planejada foram: agitação do recém-nascido; manipulação inadequada do paciente durante execução de procedimentos; fixação inadequada e posicionamento do tubo endotraqueal.

CONCLUSÃO: A incidência de extubação não planejada nas unidades de terapia intensiva neonatais pôde ser considerada baixa, de acordo com o período avaliado, quando comparada aos dados relatados na literatura. Contudo, uma avaliação da qualidade dos procedimentos e um acompanhamento contínuo desses recém-nascidos, assim como a monitoração das causas, são necessários para reduzir, ainda mais, tal incidência.

Descritores: Extubação; Modalidades de fisioterapia; Incidência; Recém-nascido; Unidades de terapia intensiva neonatal

INTRODUÇÃO

A intubação traqueal é um procedimento frequente em unidades de terapia intensiva neonatais (UTINs) e, provavelmente, um dos mais dolorosos e maiores causadores de estresse para os recém-nascidos (RNs).(1,2) Muitas vezes, as intubações traqueais são realizadas com emergência, devido ao agravamento de dificuldades respiratórias, como apneia, obstrução do tubo endotraqueal (TET) e extubações acidentais (EA) e/ou extubações não planejadas (ENP).(2,3) A manutenção de pacientes com via aérea artificial é, hoje, uma prática segura, mas não isenta o paciente de complicações.(3-5) EA e/ou ENP são uns dos eventos adversos mais frequentes na UTIN.(6-8)

A definição de ENP, atualmente, é de qualquer extubação inesperada ou realizada em momento não programado, decorrente da agitação do paciente ou do manuseio da equipe.(9,10) Contudo, há divergências na definição desse termo na literatura. Alguns autores(4,6) reportam tal tipo de evento como EA e se referem a uma retirada precoce da cânula intratraqueal durante o cuidado prestado ao paciente, enquanto outros(8,9) se referem à ENP como uma na qual ocorre uma retirada precoce da cânula intratraqueal pela ação do próprio paciente (autoextubação ou extubação espontânea deliberada).

A avaliação da ENP considera alguns sinais físicos e clínicos para identificação do evento, como deslocamento do tubo, vocalização presente, escape de ar súbito e inexplicável, distensão gástrica, cianose ou diminuição de saturação periférica de oxigênio repentina, e ausência de movimentos respiratórios e/ou de entrada de ar nos pulmões.(1,9) O risco de uma ENP em UTIN aumenta em relação à UTI pediátrica, devido à menor idade dos RNs, à redução do uso de sedação, à ausência de restrições físicas, ao aumento do número de procedimentos realizados e ao perfil de manipulação da equipe multiprofissional em UTIN, principalmente no cuidado com RN pré-termo de muito baixo peso.(4,8,11,12)

Os lactentes e os RNs, principalmente os RNs de muito baixo peso, têm maior risco para ENP, em razão do comprimento mais curto da traqueia e da imaturidade cognitiva.(6,8,9) As complicações potenciais da ENP incluem falhas respiratórias, riscos associados à reintubação, aumento da duração da ventilação mecânica (VM) e do tempo de internação, hipóxia, pneumotórax, pneumonia secundária, displasia broncopulmonar, trauma de vias aéreas superiores e atraso do desenvolvimento neuropsicomotor. Contudo, a ENP raramente está associada ao aumento da mortalidade.(5-8)

Estudos têm indicado que a porcentagem de ENP em pacientes pediátricos intubados varia entre 0,6 a 13,3%, o que equivale a uma taxa de 0,11 a 1,26 para cada 100 dias de VM.(3,8,13) Já nos pacientes neonatais, a porcentagem varia entre 11,5 a 19,2%, e a taxa de ENP para cada 100 dias de VM varia de 1,98 a 3,0.(3,8,14) Porém, ainda há poucos estudos na literatura que avaliam a incidência e as principais causas de ENP em UTIN.(3,8,9,13,14)

Segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais,(15) as proporções de nascidos vivos prematuros (idade gestacional < 37 semanas) e de baixo peso ao nascer (< 2.500 g) foram de 7,6% (N = 19.681) e 9,6% (N = 24.986), respectivamente, no Estado de Minas Gerais, em 2008. O Hospital Sofia Feldman (HSF) teve um total 9.559 nascidos vivos, sendo 1.130 (11,8%) de baixo peso ao nascer e 1.010 (10,6%) prematuros em 2008.(15) Esses dados demonstram a importância e o impacto dessa instituição na assistência a gestantes e a bebês de risco no Estado de Minas Gerais.

Dessa maneira, o presente estudo tem o objetivo de avaliar a incidência e as principais causas de eventos de extubação não planejada documentados por uma equipe de fisioterapia, nas UTINs do Hospital Sofia Feldman (HSF), em Belo Horizonte (MG).

MÉTODOS

Trata-se de um estudo retrospectivo e descritivo, realizado nas UTINs do HSF durante o período de 1º de julho de 2009 a 30 de abril de 2010. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do hospital (parecer 15/2010) e executado de acordo com a Declaração de Helsinki (houve isenção da assinatura de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido pelo CEP).

Foram incluídos RN em VM com via de intubação orotraqueal que apresentaram eventos adversos para ENP, internados nas UTINs do HSF; foram excluídos os RN em VM e traqueostomizados que apresentaram eventos adversos de decanulação.

O HSF é referência na assistência materno-infantil de Belo Horizonte e dispõe de 41 leitos de UTIN.

Os eventos de ENP e principais causas associadas a este evento foram avaliados por meio de uma ficha de eventos adversos utilizada de rotina pela equipe de fisioterapia das UTINs do HSF. Essa ficha é composta pelos seguintes dados: gênero, idade gestacional corrigida, peso, tempo em VM, horário e motivos/causas do evento no dia da ENP. A cada ocorrência de ENP, uma ficha de evento adverso é preenchida pela fisioterapeuta de plantão, assim como número de pacientes internados e número de pacientes em VM (intubados e traqueostomizados) diariamente.

A ENP foi definida, neste estudo, como qualquer extubação inesperada ou realizada em momento não programado,(4,6) decorrente da agitação do paciente ou do manuseio da equipe de profissionais das UTINs.

As causas de ENP existentes na ficha de coleta de dados foram: agitação do paciente (movimentos desorganizados de membros superiores e inferiores, associados ou não a choro); manipulação inadequada do paciente por profissionais da equipe durante execução de procedimentos; fixação do TET inadequada (fixação úmida, suja e/ou solta); posicionamento inadequado do TET; RN mal posicionado no leito (RN com cabeça e tronco desalinhados e sem contenção em torno do corpo); circuito de VM posicionado de maneira a tracionar o TET; outros - troca de fixação do TET (procedimento realizado de maneira inadequada), vômitos, sem relato (ENP que foram registradas na ficha, porém sem preenchimento da causa).

Os dados do estudo foram analisados de maneira descritiva, com porcentagens, medidas de tendência central e dispersão (média e desvio-padrão). Os RNs participantes do estudo foram divididos em subgrupos, de acordo com a idade gestacional corrigida e peso. A incidência de ENP também foi estabelecida por meio do número de extubações para cada 100 dias de intubação. Essa taxa foi obtida por meio do seguinte cálculo: número de extubações não planejada x 100/número de dias em ventilação mecânica.(4)

O número de dias de via aérea artificial dos pacientes foi denominado "pacientes-dia com via aérea artificial". Assim, a cada mês, foi analisado o número de eventos de ENP para cada 100 dias de VM/intubação.(4)

As análises estatísticas utilizadas no presente estudo foram realizadas por meio do software Statistical Package For Social Sciences (SPSS, Chicago, IL, USA), versão 13.0.

RESULTADOS

Um total de 13.034 RN foi internado na UTI durante o período de estudo realizado, sendo que 6.729 RN estavam em VM e, destes, 5.389 estavam intubados via orotraqueal.

Um total de 58 fichas foi preenchido no período do estudo. Destas, três foram excluídas por serem eventos de decanulação acidental de RN traqueostomizados. Houve perda de um dado referente à falha no preenchimento de uma ficha de dados de evento de ENP. Assim, 54 fichas foram incluídas para análise.

Ocorreram 54 ENP, com incidência observada de 1,0 ENP para cada 100 dias de intubação, durante o período estudado, sendo o maior índice em janeiro de 2010, com 1,79 ENP para cada 100 dias de VM/intubação, e o menor índice em abril de 2010, com 0,37 ENP para cada 100 dias de VM/intubação.

Em relação ao gênero dos RNs participantes do estudo, 31 eram do gênero masculino (57,5%). Em relação à idade gestacional corrigida, os RNs com idade de 30 a 36 semanas apresentaram maior índice de ENP (70,4%), com média de 34 ± 1,03 semanas (Tabela 1). Quanto ao peso atual, os RNs com peso < 1.000 g apresentaram maior índice de ENP (40,7%) (Tabela 1).

É importante ressaltar que houve uma média de 43,4 RN internados por dia, sendo 22,4 RN em VM por dia, 4,4 RN traqueostomizados por dia, 17,9 RN entubados (menos os com traqueostomia) por dia.

O tempo médio de VM que o RN permaneceu antes da ENP foi de 11,2 dias, com variação de 1 a 39 dias em VM, sendo que, nos primeiros 7 dias de VM, ocorreu a maioria das ENP (50%) (Tabela 1).

Os sinais clínicos que levaram à determinação do evento de ENP foram: choro audível, em 22 casos (26,8%); exteriorização do tubo, em 22 casos (26,8%); cianose, em 19 casos (23,2%); piora do padrão respiratório, em 10 casos (12,2%); conteúdo gástrico no TET, em 6 casos (7,3%); e bradicardia, em 3 casos (3,7%). Observou-se uma média de 1,51 sinais clínicos sugestivos de ENP para cada evento.

As principais causas de ENP encontradas no presente estudo e analisadas foram: agitação do paciente em 30,8% dos casos (24); manipulação inadequada do paciente em 17,9% dos casos (14), durante execução de alguns procedimentos (coleta de sangue, troca de curativo, punção lombar, radiografia e ao posicionar o RN no leito); fixação inadequada do TET em 17,9% dos casos (14); posicionamento inadequado do TET em 16,6% dos casos (13); RN mal posicionado no leito em 9% dos casos (7); outros, como troca de fixação do TET e vômitos, em 3,9% dos casos (3); sem relato em 2,6% dos casos (2), e circuito de VM mal posicionado em 1,3% dos casos (1). Houve uma média de 1,44 causas de ENP para cada evento.

A análise dos horários da ocorrência das ENP mostrou que houve maior ocorrência desse evento no período da manhã, o que corresponde a 46,3% (25 casos); à tarde, 22,2% (12 casos); à noite, 31,5% (17 casos).

DISCUSSÃO

A incidência de ENP, observada nas UTINs do HSF, foi de 1,0 ENP para cada 100 dias de VM/intubação. O valor encontrado está abaixo daqueles reportados na literatura,(3,8,14) que descreve a ocorrência ENP entre 1,98 e 3,0 para cada 100 dias de VM/intubação, em neonatos. Isso pode ser atribuído a programas de capacitação de profissionais, que frequentemente ocorrem na instituição, a fim de promover a educação continuada das equipes e a melhora da assistência aos RNs internados nas UTINs. Por outro lado, o preenchimento inadequado ou a ausência deste podem ter contribuído para a subnotificação de alguns casos de ENP e, talvez, esses valores tenham sido subestimados.

Além disso, um fator que pode ter contribuído para essa taxa de ENP foi a implementação do serviço de fisioterapia, na escala, de 24 horas no HSF. Isso favorece a avaliação sistemática do RN, do posicionamento e da fixação do TET pela equipe de fisioterapia, o que evita a ocorrência frequente de ENP. Porém, a incidência de ENP, nessas UTINs, persiste como um desafio a ser reduzido, pois os potenciais iatrogênicos a curto (laringoespasmo, broncoespasmo, edema laríngeo, pneumonia aspirativa, hipotensão, hipóxia e óbito), médio (aumento de tempo em VM e maior incidência de pneumonia associada à VM) e longo prazo (aumento de tempo de internação e complicações associadas às lesões da via aérea) são motivos suficientes para reduzir esse índice.(8,16-18)

Quanto ao período de ocorrência da ENP, a maior incidência foi em janeiro de 2010 e o menor índice, em abril de 2010. Isso pode estar relacionado ao número de RNs em VM por dia internados na UTIN. Além disso, observou-se também que a maior taxa de ENP ocorreu nos primeiros 7 dias de VM. Uma possível hipótese para explicar tal achado é que, nos primeiros dias de vida, os RNs são submetidos a vários procedimentos, como radiografias, coleta de sangue para exames, punção lombar, além da redução no uso de sedação contínua, na instituição, fato que pode favorecer a maior ocorrência de extubação não planejada nesse período.

A idade gestacional que se relacionou a maior taxa de ENP foi entre 30 e 36 semanas (6/7) e o peso relacionado à maior ocorrência de ENP foi aquele < 1.000 g. Isso pode ter ocorrido devido ao menor comprimento da traqueia desses RNs, associado à manipulação desses pacientes para alguns procedimentos, como flexão da coluna vertebral para punção lombar, ou alteração do posicionamento realizado pelo próprio RN, como hiperextensão da coluna vertebral em supino.(6,8,19,20)

Todres et al.(21) observaram variação de 7 a 28 mm de movimento do TET, em RN pré-termo, o que pode explicar também um maior índice de ENP nessa população. Outros fatores associados a esse evento, em RN, podem ser exemplificados por dados da literatura, como o uso de TET sem balonetes, a imaturidade cognitiva e a ausência de restrições físicas.(8,14,22)

Segundo alguns estudos,(8,13) dispositivos eletrônicos são de extrema importância no diagnóstico de ENP, tais como oximetria de pulso e alarmes do respirador (volume corrente, ventilação minuto e picos de pressão). Porém, neste estudo e em outros, como o de Piva(4) e o de Carvalho et al.,(9) os diagnósticos foram determinados por meio de sinais clínicos, principalmente choro audível, exteriorização do TET e diminuição da saturação periférica de oxigênio (cianose), respectivamente. Dessa maneira, deve-se destacar a importância de um acompanhamento adequado quanto à monitoração e de um treinamento constante da equipe multiprofissional das UTINs para a detecção de eventos de ENP, pois monitores de sinais vitais podem emitir sinais tardios, não disparar ou, até mesmo, realizar leituras "falsas", devido à baixa sensibilidade.(4,13)

A literatura aponta que a idade, a quantidade de secreções, a agitação, o tempo de intubação, o movimento e a fixação do TET, assim como a via de intubação, são os principais fatores que geram mais impacto para o aumento do risco de ENP, principalmente em neonatologia.(4,11,12,23) Dessa forma, os resultados observados na amostra desse trabalho corroboram os achados da literatura, pois encontraram-se evidências de que as principais causas de ENP estão relacionadas à agitação do paciente e à manipulação e fixação inadequadas. Esta causa pode estar associada a outros eventos, como posicionamento inadequado do circuito de VM, agitação e vômitos, entre outros.

A via de intubação utilizada nas UTINs do HSF é a orotraqueal, e a fixação de TET utilizada é a de fio modificada, descrita originalmente por Gregory.(4,13,24) Após o procedimento de intubação e fixação do TET, a porção externa deste, ou porção proximal, tem sua marca registrada pela fisioterapeuta no prontuário do paciente. Além disso, a fixação do TET é realizada e trocada exclusivamente pelo fisioterapeuta de plantão, quando se apresenta frouxa, úmida e/ou suja, segundo protocolo estabelecido na instituição.(25)

Como uma parcela considerável das causas de ENP foi associada à fixação inadequada e ao posicionamento do TET, e estas podem ser evitadas, os procedimentos de realização de troca da fixação e posicionamento do TET realizados pelo fisioterapeuta de plantão devem ser reavaliados, e também deve ser implementado um treinamento periódico da equipe de fisioterapia da instituição.

O período no qual ocorreu o maior índice de ENP foi o da manhã. Tal causa pode ser explicada pelo fato de as manipulações dos RNs, nas UTINs, serem realizadas, em maior número, no período da manhã, durante a avaliação dos profissionais, coleta de sangue, banhos, radiografias, mudança de incubadoras e de decúbito, entre outros. Esses procedimentos são realizados, em sua maioria, pela equipe de enfermagem. Em relação à mudança de decúbito, os RNs internados nas UTINs do HSF são reposicionados no leito, em sua maioria, pela técnica de enfermagem de plantão, usualmente a cada 3 horas. O posicionamento é realizado com o uso de lençóis em formato de "ninho", em torno do RN, e com um apoio cervical, sendo que os membros não ficam restritos. Assim, toda a equipe multiprofissional, em especial a de enfermagem, deve estar atenta à frequência e à execução desses manuseios, sendo orientada e preparada para prevenir a ocorrência de ENP associadas aos mesmos.

Todos os RNs que tiveram ENP não estavam com os membros restritos, e a maioria deles não estava com sedação contínua. Eles receberam bolus de fentanil e/ou midazolan a critério médico. Essas condições podem ter favorecido o movimento dos membros superiores dos RNs em direção ao TET e provocado alguns eventos de ENP. Porém, o uso e os efeitos de restrições químicas e físicas na prevenção de ENP ainda são controversos.(4,8,26) Assim, pode-se pensar que a equipe multiprofissional desse serviço deve discutir melhor a questão da analgesia e sedação, bem como os critérios de desmame e extubação precoce dos RNs em VM, para que estes não fiquem acordados e em VM de maneira desnecessária, com possibilidade de ocorrência de ENP e complicações associadas a esse evento.

De maneira geral, para que a incidência de ENP seja reduzida, é preciso melhorar ainda mais a avaliação e a qualidade da assistência contínua dos RNs internados nessas UTINs, principalmente por meio da vigilância dos sinais clínicos de possível evento de ENP e da adoção de medidas para diminuir as causas desse evento.(6,16,17) Estudos recentes(26,27) têm apontado que programas de melhoria contínua da qualidade do atendimento podem ser medidas importantes para redução da incidência de ENP, e tais programas devem ser integrados com todas as equipes, não sendo realizados de maneira isolada, pois, como mostrado nos resultados deste estudo, cada evento de ENP teve, no mínimo, uma causa associada a procedimentos de todas as equipes.

Este trabalho apresenta relevância clínica, pois contribui para a discussão contida na literatura a respeito de ENP, no contexto neonatal, visto que há escassez de dados acerca deste evento em tal população, assim como controvérsias na literatura, principalmente nas definições e discussões de ENP e EA.(8,9,13) Além disso, este estudo fornece informações para indicar uma melhora na organização da execução e da frequência dos procedimentos realizados por toda a equipe multiprofissional das UTINs do HSF, em especial da fisioterapia. Contribui também para aprimorar os registros das ENP, de maneira que todos os eventos e o registro diário sistematizado do número de pacientes internados por dia nas UTINs sejam documentados, objetivando-se distinguir o número de pacientes intubados e traqueostomizados em VM. Isso facilita o cálculo para a determinação de ENP e a realização de novas pesquisas.

Pode-se apontar, como limitação deste estudo, a perda, na coleta de dados, ou a ausência de preenchimento de informações relacionadas à necessidade de uma reintubação após o evento de ENP e à existência de submissão anterior do paciente a programa de extubação. Isso aponta a necessidade de adequado preenchimento e registro desse evento na instituição na qual foi realizado este estudo. Uma observação importante é que em nenhum caso de ENP foi constatado óbito relacionado diretamente a esse evento.

Sabendo-se que RN em fase de desmame de VM (menor sedação e maior agitação) constitui um grupo de risco para ENP; este é mais um motivo para que os dados citados anteriormente sejam bem registrados. Outra limitação do estudo foi o fato de os fatores de risco para ENP, nas UTINs do HSF, não terem sido estabelecidos, pois os dados dos RNs em VM (via orotraqueal) por dia, no período de coleta de dados, e que não tiveram ENP não são registrados pela equipe de fisioterapia. Isso aponta a necessidade de registrar tais informações e de realizar estudos posteriores, a fim de identificar os fatores de risco de ENP.

CONCLUSÃO

A incidência de ENP do HSF apresentou um valor inferior ao descrito na literatura, porém há necessidade de rever os programas de melhoria da qualidade da assistência e de educação continuada da equipe multiprofissional, a fim de reduzir ainda mais esses eventos e possíveis complicações, mesmo se sabendo que muitos RNs podem ficar estáveis clinicamente após sua ocorrência

AGRADECIMENTOS

Agradecemos o Programa de Fortalecimento Técnico Científico Interinstitucional "Incubadora da Integralidade" do HSF, pelo apoio.

Submetido em 27 de Fevereiro de 2012

Aceito em 15 de Agosto de 2012

Conflitos de interesse: Nenhum.

Estudo realizado na unidade de terapia intensiva neonatal do Hospital Sofia Feldman - HSF - Belo Horizonte (MG), Brasil.

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  • Autor correspondente:

    Laura Alves Cabral
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2012

    Histórico

    • Recebido
      27 Fev 2012
    • Aceito
      15 Ago 2012
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