INTRODUÇÃO
A documentação mais antiga de uma ressuscitação cardiopulmonar (RCP) data do Velho Testamento, que descreve como o profeta Eliseu ressuscitou uma criança aparentemente morta ao soprar ar em sua boca.(11. Guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiac care. Emergency Cardiac Care Committee and Subcommittees, American Heart Association. Part I. Introduction. JAMA. 1992;268(16):2171-83.) A moderna RCP começou em 1960 com o estudo fundamental de Kouwenhoven, Jude e Knickerbocker, que relataram uma combinação de compressão fechada do tórax, respiração boca a boca e desfibrilação externa.(11. Guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiac care. Emergency Cardiac Care Committee and Subcommittees, American Heart Association. Part I. Introduction. JAMA. 1992;268(16):2171-83.) Desde então, a RCP e as técnicas avançadas de suporte cardíaco à vida (ACLS) salvaram muitas vidas, mas também levantaram uma série de dilemas éticos. O consentimento para realização de procedimentos de RCP é universalmente presumido. Contudo, há ocasiões em que o direito do paciente de receber RCP contrasta com a impressão de seus cuidadores de que esse tratamento não é clinicamente indicado. Por outro lado, alguns pacientes recebem ressuscitação que não queriam ter recebido. As decisões referentes à ressuscitação e à duração dos esforços de ressuscitação frequentemente acarretam diversas questões éticas cruciais. Este artigo se focalizará nos dilemas éticos relacionados com a necessidade de tomar decisões críticas em condições emergenciais ou agudas.
Riscos e benefícios dos esforços de ressuscitação
Desde 1900, a doença cardiovascular tem sido uma importante causa de
morte.(22. Merchant RM, Yang L, Becker LB, Berg RA, Nadkarni V, Nichol G, Carr
BG, Mitra N, Bradley SM, Abella BS, Groeneveld PW; American Heart Association Get
With The Guidelines-Resuscitation Investigators. Incidence of treated cardiac arrest
in hospitalized patients in the United States. Crit Care Med.
2011;39(11):2401-6.) A RCP é um
processo intenso e custoso, levado a cabo cerca de 800 mil vezes por ano nos Estados
Unidos.(33. Chan PS, Krumholz HM, Nichol G, Nallamothu BK; American Heart
Association National Registry of Cardiopulmonary Resuscitation Investigators. Delayed
time to defibrillation after in-hospital cardiac arrest. N Engl J Med.
2008;358(1):9-17.) Embora os
relatos de sobrevivência à parada cardíaca, tanto no hospital como fora dele, variem
amplamente,(44. Cummins RO, Chamberlain DA, Abramson NS, Allen M, Baskett PJ, Becker
L, et al. Recommended guidelines for uniform reporting of data from out-of-hospital
cardiac arrest: The Utstein style. A statement for health professionals from a task
force of the American Heart Association, the European Resuscitation Council, the
Heart and Stroke Foundation of Canada, and the Australian Resuscitation Council.
Circulation. 1991;84(2):960-75.
5. Eisenberg MS, Cummins RO, Damon S, Larsen MP, Hearne TR. Survival
rates from out-of-hospital cardiac arrest: recommendations for uniform definitions
and data to report. Ann Emerg Med. 1990;19(11):1249-59.-66. Girotra S, Nallamothu BK, Spertus JA, Li Y, Krumholz HM, Chan PS.
Trends in survival after in-hospital cardiac arrest. Circulation. 2011;
124:A509.) foi identificado que diversos
fatores se associam ao desfecho. O fator mais importante, que determina a
sobrevivência, é o tempo decorrido desde a parada.(33. Chan PS, Krumholz HM, Nichol G, Nallamothu BK; American Heart
Association National Registry of Cardiopulmonary Resuscitation Investigators. Delayed
time to defibrillation after in-hospital cardiac arrest. N Engl J Med.
2008;358(1):9-17.) Estudos recentes estimam que a mortalidade aumenta
em 3% a cada minuto sem RCP, e 4% para cada minuto sem
desfibrilação.(77. Chan PS, Nallamothu BK. Improving outcomes following in-hospital
cardiac arrest: life after death. JAMA. 2012:9;307(18):1917-8.,88. Peberdy MA, Ornato JP, Larkin GL, Braithwaite RS, Kashner TM, Carey
SM, Meaney PA, Cen L, Nadkarni VM, Praestgaard AH, Berg RA; National Registry of
Cardiopulmonary Resuscitation Investigators. Survival from in-hospital cardiac arrest
during nights and weekends. JAMA. 2008;299(7):785-92.) Esse
problema de saúde pública desencadeou o desenvolvimento dos cuidados cardíacos fora
do hospital nos anos 1960 e seu contínuo crescimento atual.(99. Cummins RO, Ornato JP, Thies WH, Pepe PE. Improving survival from
sudden cardiac arrest: the "chain of survival" concept. A statement for health
professionals from the Advanced Cardiac Life Support Subcommittee and the Emergency
Cardiac Care Committee, American Heart Association. Circulation.
1991;83(5):1832-47.,1010. Curry LA, Spatz E, Cherlin E, Thompson JW, Berg D, Ting HH, et al.
What distinguishes top-performing hospitals in acute myocardial infarction mortality
rates? A qualitative study. Ann Intern Med. 2011;154(6):384-90.) A sobrevivência ajustada pelo risco após parada cardíaca no
hospital melhorou na última década.(77. Chan PS, Nallamothu BK. Improving outcomes following in-hospital
cardiac arrest: life after death. JAMA. 2012:9;307(18):1917-8.) Diversos estudos epidemiológicos identificaram fatores
associados com taxas mais baixas de sobrevivência, inclusive retardos na
desfibrilação, horários não comerciais e paradas sem testemunhas. Mais ainda: existe
uma variação substancial nos desfechos entre diferentes hospitais, sugerindo que
algumas instituições podem ter instituído melhores estratégias para os cuidados de
ressuscitação.(77. Chan PS, Nallamothu BK. Improving outcomes following in-hospital
cardiac arrest: life after death. JAMA. 2012:9;307(18):1917-8.,1111. Becker LB, Aufderheide TP, Geocadin RG, Callaway CW, Lazar RM,
Donnino MW, Nadkarni VM, Abella BS, Adrie C, Berg RA, Merchant RM, O'Connor RE,
Meltzer DO, Holm MB, Longstreth WT, Halperin HR; American Heart Association Emergency
Cardiovascular Care Committee; Council on Cardiopulmonary, Critical Care,
Perioperative and Resuscitation. Primary outcomes for resuscitation science studies:
a consensus statement from the American Heart Association. Circulation.
2011;124(19):2158-77.)
Relatos precoces de sistemas de tratamento cardíaco de emergência documentaram que as arritmias iniciais mais comuns encontradas em casos de parada cardíaca fora do hospital foram fibrilação ventricular (FV) ou taquicardia ventricular (TV).(1111. Becker LB, Aufderheide TP, Geocadin RG, Callaway CW, Lazar RM, Donnino MW, Nadkarni VM, Abella BS, Adrie C, Berg RA, Merchant RM, O'Connor RE, Meltzer DO, Holm MB, Longstreth WT, Halperin HR; American Heart Association Emergency Cardiovascular Care Committee; Council on Cardiopulmonary, Critical Care, Perioperative and Resuscitation. Primary outcomes for resuscitation science studies: a consensus statement from the American Heart Association. Circulation. 2011;124(19):2158-77.,1212. Eisenberg MS, Horwood BT, Cummins RO, Reynolds-Haertle R, Hearne TR. Cardiac arrest and resuscitation: a tale of 29 cities. Ann Emerg Med. 1990;19(2):179-86.) As taxas de sobrevivência da parada cardíaca fora do hospital vão de 2 a 26%, sendo a ampla variação atribuída às variações nas populações relatadas.(1313. Chan PS, Nichol G, Krumholz HM, Spertus JA, Jones PG, Peterson ED, Rathore SS, Nallamothu BK; American Heart Association National Registry of Cardiopulmonary Resuscitation (NRCPR) Investigators. Racial differences in survival after in-hospital cardiac arrest. JAMA. 2009;302(11):1195-201.) Fibrilação ventricular e TV são arritmias "tratáveis", não sendo imprevista a restauração espontânea da circulação; isso contrasta com os resultados dos esforços de ressuscitação quando são encontradas arritmias não ventriculares. Os desfechos pobres das paradas cardíacas fora do hospital causadas por arritmias não ventriculares levaram tanto a um renovado interesse pelas causas dessas arritmias quanto a uma reavaliação das intervenções terapêuticas.(1414. Viskin S, Belhassen B, Roth A, Reicher M, Averbuch M, Sheps D, et al. Aminophylline for bradyasystolic cardiac arrest refractory to atropine and epinephrine. Ann Intern Med. 1993;118(4):279-81.,1515. Wright D, Bannister J, Ryder M, Mackintosh AF. Resuscitation of patients with cardiac arrest by ambulance staff with extended training in West Yorkshire. BMJ. 1990;301(6752):600-2.) Os desfechos historicamente desanimadores desses pacientes levaram a sugestões de que fossem evitadas as intervenções de ressuscitação em pacientes com parada cardíaca fora do hospital que não tivessem ritmos responsivos à cardioversão ou ao choque.(1616. Winters BD, Pham J, Pronovost PJ. Rapid response teams--walk, don't run. JAMA. 2006;296(13):1645-7.) Contudo, pacientes que tiveram uma parada cardíaca fora do hospital testemunhada e que tinham assistolia ou PEA não tinham um desfecho uniformemente fatal.(1717. Stueven HA, Aufderheide T, Waite EM, Mateer JR. Electromechanical dissociation: six years prehospital experience. Resuscitation. 1989;17(2):173-82.,1818. Pepe PE, Abramson NS, Brown CG. ACLS--does it really work? Ann Emerg Med. 1994;23(5):1037-41.) Em 1998, Stratton apoiou a prática de iniciar esforços de ressuscitação em pacientes com assistolia ou PEA, particularmente se o colapso fosse testemunhado.(1919. Stratton SJ, Niemann JT. Outcome from out-of-hospital cardiac arrest caused by non-ventricular arrhythmias: contribution of successful resuscitation to overall survivorship supports the current practice of initiating out-of-hospital ACLS. Ann Emerg Med. 1998;32(4):448-53.) Foram demonstrados desfechos melhores para paradas testemunhadas, nas quais foram instituídos precocemente protocolos de RCP e ACLS.(2020. Kuisma M, Määttä T, Repo J. Cardiac arrests witnessed by EMS personnel in a multitiered system: epidemiology and outcome. Am J Emerg Med. 1998;16(1):12-6.,2121. Litwin PE, Eisenberg MS, Hallstrom AP, Cummins RO. The location of collapse and its effect on survival from cardiac arrest. Ann Emerg Med. 1987;16(7):787-91.) O local da ocorrência também é um importante fator, em grande parte devido à instituição mais rápida de RCP em paradas cardíacas testemunhadas fora de casa.(2020. Kuisma M, Määttä T, Repo J. Cardiac arrests witnessed by EMS personnel in a multitiered system: epidemiology and outcome. Am J Emerg Med. 1998;16(1):12-6.)
A condição clínica de base do paciente é outro importante fator que afeta o desfecho.(2222. Bedell SE, Delbanco TL, Cook EF, Epstein FH. Survival after cardiopulmonary resuscitation in the hospital. N Engl J Med. 1983;309(10):569-76.,2323. Myerburg RJ, Kessler KM, Zaman L, Conde CA, Castellanos A. Survivors of prehospital cardiac arrest. JAMA. 1982;247(10):1485-90.)
Com base nesses dados, diversos autores sugeriram evitar os esforços de ressuscitação
em pacientes com certas condições, com baixa probabilidade de ressuscitação
bem-sucedida (isto é, apneia sem pulso por mais de 10 minutos antes da chegada do
resgate, falta de resposta ao ACLS, assistolia ou atividade elétrica sem pulso,
ausência de reação pupilar e existência prévia de doença terminal). O conhecimento
dos dados referentes aos desfechos da ressuscitação em diferentes cenários clínicos é
crucial quando se tomam decisões baseadas em evidência, com relação aos riscos e aos
benefícios de tentar RCP e ACLS.(2222. Bedell SE, Delbanco TL, Cook EF, Epstein FH. Survival after
cardiopulmonary resuscitation in the hospital. N Engl J Med.
1983;309(10):569-76.
23. Myerburg RJ, Kessler KM, Zaman L, Conde CA, Castellanos A. Survivors
of prehospital cardiac arrest. JAMA. 1982;247(10):1485-90.
24. Chan PS, Nichol G, Krumholz HM, Spertus JA, Nallamothu BK; American
Heart Association National Registry of Cardiopulmonary Resuscitation (NRCPR)
Investigators. Hospital variation in time to defibrillation after in-hospital cardiac
arrest. Arch Intern Med. 2009;169(14):1265-73.
25. Callaham M, Madsen CD. Relationship of timeliness of paramedic
advanced life support interventions to outcome in out-of-hospital cardiac arrest
treated by first responders with defibrillators. Ann Emerg Med.
1996;27(5):638-48.-2626. Dull SM, Graves JR, Larsen MP, Cummins RO. Expected death and
unwanted resuscitation in the prehospital setting. Ann Emerg Med.
1994;23(5):997-1002.)
Ética e ressuscitação cardiopulmonar
A RCP foi desenvolvida para doenças agudas, como trauma ou infarto do miocárdio. Na
verdade a RCP é universal em termos de aplicação, independentemente da causa de base
da parada cardiorrespiratória. Há uma crescente preocupação de que uma parcela
desproporcional de orçamento de saúde seja gasto com RCP e ACLS, particularmente
quando os resultados são vistos à luz do envelhecimento populacional e da alta
percentagem de óbitos nas unidades de terapia intensiva. Adicionalmente, diversos
autores demonstraram que os médicos não conseguem prever as preferências dos
pacientes com relação às decisões terapêuticas.(2727. Greenberg LW, Ochsenschlager D, Cohen GJ, Einhorn AH, O'Donnell R.
Counseling parents of a child dead on arrival: a survey of emergency departments. Am
J Emerg Med. 1993;11(3):225-9.
28. Kellerman AL, Hackman BB, Somes G. Predicting the outcome of
unsuccessful prehospital advanced cardiac life support. JAMA.
1993;270(12):1433-6.-2929. Lewis LM, Ruoff B, Rush C, Stothert JC Jr. Is emergency department
resuscitation of out-of-hospital cardiac arrest victims who arrive pulseless
worthwhile? Am J Emerg Med. 1990;8(2):118-20. Erratum in Am J Emerg Med.
1990;8(4):371.) Em razão das dificuldades inerentes em se conhecerem as
preferências de um dado paciente individual, medidas de ressuscitação são tomadas
para a maioria dos pacientes com parada cardíaca, a menos que existam instruções
prévias documentadas.(2828. Kellerman AL, Hackman BB, Somes G. Predicting the outcome of
unsuccessful prehospital advanced cardiac life support. JAMA.
1993;270(12):1433-6.,2929. Lewis LM, Ruoff B, Rush C, Stothert JC Jr. Is emergency department
resuscitation of out-of-hospital cardiac arrest victims who arrive pulseless
worthwhile? Am J Emerg Med. 1990;8(2):118-20. Erratum in Am J Emerg Med.
1990;8(4):371.) A
preocupação de que a RCP deve ser dada mais apropriadamente a um número selecionado
de pacientes, que certamente se beneficiariam, é uma questão fundamental para a
prática diária do médico emergencista. Existe uma crença disseminada de que pessoas
com Qualidade de Vida comprometida por doenças crônicas não desejam tratamentos
agressivos de suporte à vida, mesmo em condições de emergência.(3030. Varon J, Fromm RE Jr. In-hospital resuscitation among the elderly:
substantial survival to hospital discharge. Am J Emerg Med.
1996;14(2):130-2.
31. Bonnin MJ, Pepe PE, Kimball KT, Clark PS Jr. Distinct criteria for
termination of resuscitation in the out-of-hospital setting. JAMA.
1993;270(12):1457-62.
32. Frank M. Should we terminate futile resuscitations in the field? Can
we afford not to? Ann Emerg Med. 1989;18(5):594-6.-3333. Kellerman AL, Hackman BB. Terminating unsuccessful advanced cardiac
life support in the field. Am J Emerg Med. 1987;5(6):548-9.) Por definição, o ato de restaurar a vida é uma decisão que
deve ser tomada rapidamente por médicos em situação de emergência e, infelizmente, é
frequentemente baseada em quantidade insuficiente de informações disponíveis. Em
alguns países, pacientes capazes têm o direito de recusar RCP no hospital, utilizando
um código, e fora do hospital, utilizando sinais específicos, como pulseiras.
A capacidade de prover tratamentos de suporte à vida, inclusive RCP, foi acompanhada
por diversas questões a respeito de como tomar decisões com relação ao seu uso e como
lidar com seus custos.(3131. Bonnin MJ, Pepe PE, Kimball KT, Clark PS Jr. Distinct criteria for
termination of resuscitation in the out-of-hospital setting. JAMA.
1993;270(12):1457-62.
32. Frank M. Should we terminate futile resuscitations in the field? Can
we afford not to? Ann Emerg Med. 1989;18(5):594-6.
33. Kellerman AL, Hackman BB. Terminating unsuccessful advanced cardiac
life support in the field. Am J Emerg Med. 1987;5(6):548-9.-3434. Marco CA, Bessman ES, Schoenfeld CN, Kelen GD. Ethical issues of
cardiopulmonary resuscitation: current practice among emergency physicians. Acad
Emerg Med. 1997;4(9):898-904.) Os
comportamentos dos médicos emergencistas são frequentemente ligados a seu temor de
litígio ou crítica.(3434. Marco CA, Bessman ES, Schoenfeld CN, Kelen GD. Ethical issues of
cardiopulmonary resuscitation: current practice among emergency physicians. Acad
Emerg Med. 1997;4(9):898-904.,3535. Van Hoeyweghen R, Mullie A, Bossaert L. Decision making to cease or
to continue cardiopulmonary resuscitation (CPR). The Cerebral Resuscitation Study
Group. Resuscitation. 1989;17 Suppl:S137-47; discussion S199-206.) Sobre
os tratamentos clínicos sem benefício demonstrável, diversos autores assumem que os
médicos não têm obrigação de proporcioná-los, e pacientes e familiares não têm
qualquer direito de exigi-los.(3636. Fischer GS, Tulsky JA, Rose MR, Siminoff LA, Arnold RM. Patient
knowledge and physician predictions of treatment preferences after discussion of
advance directives. J Gen Intern Med. 1998;13(7):447-54.
37. Ebell MH, Doukas DJ, Smith MA. The do-not-resuscitate order: a
comparison of physician and patient preferences and decision-making. Am J Med.
1991;91(3):255-60.-3838. Swing L, Cooke M, Osmond D, Luce JA, Brody RV, Bird C, et al.
Physician responses to a hospital policy allowing them to not offer cardiopulmonary
resuscitation. J Am Geriatr Soc. 1996;44(10):1215-9.) O
respeito à autonomia do paciente não exige que o médico inicie procedimentos que são
clinicamente fúteis ou não apropriados.(3737. Ebell MH, Doukas DJ, Smith MA. The do-not-resuscitate order: a
comparison of physician and patient preferences and decision-making. Am J Med.
1991;91(3):255-60.) Até que tenham sido desenvolvidas pelas organizações
governamentais políticas formais para a medicina de emergência, os médicos
emergencistas devem fazer as escolhas que julgarem mais apropriadas na situação
crítica específica encontrada. Mais ainda, existe uma concordância mundial sobre a
necessidade de realizar ressuscitações mais selecionadas e apropriadas por causa dos
substanciais recursos que são investidos antes e após a RCP.(3838. Swing L, Cooke M, Osmond D, Luce JA, Brody RV, Bird C, et al.
Physician responses to a hospital policy allowing them to not offer cardiopulmonary
resuscitation. J Am Geriatr Soc. 1996;44(10):1215-9.,3939. Marco CA. Ethical issues of resuscitation. Emerg Med Clin North Am.
1999;17(2):528-38, xiii-xiv.) A Comissão Europeia determinou que o paciente tem o direito
de autodeterminação, inclusive de recusar tratamentos não desejados. Contudo, não
especifica a necessidade de usar instruções prévias ou um substituto para obter esse
objetivo em pacientes incapazes. Se os médicos na Europa utilizarão os desfechos do
paciente ou a Qualidade de Vida em seu processo de decisão a respeito de realizar ou
não RCP, é importante ter uma compreensão adequada da terminologia. Qualidade de Vida
é, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma parte da definição da palavra
"saúde". Segundo Curtis, é "uma avaliação holística, autodeterminada de satisfação
com questões importantes para o indivíduo". Todos os pesquisadores confirmam que ela
é influenciada por muitos fatores e, consequentemente, muitos autores utilizam o
sentido mais restrito de "qualidade de vida relacionada à saúde". Pacientes com uma
baixa qualidade de vida atual desejam menos terapias de suporte à vida. Além do mais,
todos os pacientes que recebem RCP, mesmo que sua Qualidade de Vida prévia não
estivesse comprometida, assumem o risco de que, se sua circulação for restaurada,
resulte uma significativa lesão isquêmica cerebral.
Cuidado apropriado
O conceito de "futilidade clínica" se tornou popular com o crescimento da ciência médica de alta tecnologia, que criou a preocupação de que essa tecnologia simplesmente retardaria a morte por curtos períodos, em vez de restaurar a saúde do paciente. O conceito de futilidade não era conhecido antes de 1987. Em 1995, foram publicados 134 artigos a respeito do tópico, e, em 1999, uma busca no MedLine utilizando a palavra chave "futility" encontrou 31 novos itens.(3939. Marco CA. Ethical issues of resuscitation. Emerg Med Clin North Am. 1999;17(2):528-38, xiii-xiv.,4040. Hackler JC, Hiller FC. Family consent to orders not to resuscitate. Reconsidering hospital policy. JAMA. 1990;264(10):1281-3.) O termo "futilidade" é pleno de dificuldades em sua definição e interpretação. Não há, na verdade, um consenso entre os médicos a respeito da definição de futilidade.(4141. Helft PR, Siegler M, Lantos J. The rise and fall of the futility movement. New England J Med. 2000;343(4):293-6.) Existe, de fato, uma variedade de definições, que incluem futilidade fisiológica (falha em produzir uma resposta fisiológica), futilidade quantitativa (a probabilidade de benefício do paciente cai abaixo de um limite mínimo) e futilidade centrada no paciente (falha em produzir efeitos de que o paciente possa usufruir).(4242. Brody BA, Halevy A. Is futile a futile concept? J Med Philos. 1995;20(2):123-44.) Ausência de benefício ou a baixa probabilidade de sucesso são os conceitos mais utilizados nas discussões sobre futilidade. Cuidado apropriado é o que os estudiosos da ética buscam, e ele foi identificado por especialistas no que se refere ao tratamento provido na UTI.(4343. Piers RD, Azoulay E, Ricou D, Dekeyser Ganz F, Decruyenaere J, Max A, Michalsen A, Maia PA, Owczuk R, Rubulotta F, Depuydt P, Meert AP, Reyners AK, Aquilina A, Bekaert M, Van den Noortgate NJ, Schrauwen WJ, Benoit DD; APPROPRICUS Study Group of the Ethics Section of the ESICM. Perceptions of appropriateness of care among European and Israeli intensive care unit nurses and physicians. JAMA. 2011;306(24):2694-703) Um tratamento que não melhora o prognóstico, conforto, bem-estar ou estado geral de saúde do paciente, deve ser considerado fútil, ou melhor, impróprio. Os profissionais de saúde podem interpretar como intervenções impróprias aquelas com impossibilidade absoluta de acarretar um desfecho favorável, ou uma baixa probabilidade de sucesso ou sobrevivência, ou uma baixa probabilidade de restaurar uma Qualidade de Vida significativa. Schneiderman definiu futilidade como "um esforço para obter um resultado possível, mas que a razão ou experiência sugerem ser altamente improvável e que não pode ser sistematicamente produzido".(4444. Schneiderman LJ, Jecker NS, Jonsen AR. Medical futility: its meaning and ethical implications. Ann Int Med. 1990;112(12):949-54.) As questões ao redor da RCP têm sido estimulantes primários para discussões sobre a propriedade clínica das medidas. Entre um grupo de médicos de unidades de terapia intensiva da Europa e Israel, percepções de cuidado impróprio foram frequentemente relatadas e inversamente associadas com fatores que indicam um bom trabalho de equipe.(4343. Piers RD, Azoulay E, Ricou D, Dekeyser Ganz F, Decruyenaere J, Max A, Michalsen A, Maia PA, Owczuk R, Rubulotta F, Depuydt P, Meert AP, Reyners AK, Aquilina A, Bekaert M, Van den Noortgate NJ, Schrauwen WJ, Benoit DD; APPROPRICUS Study Group of the Ethics Section of the ESICM. Perceptions of appropriateness of care among European and Israeli intensive care unit nurses and physicians. JAMA. 2011;306(24):2694-703) Os médicos não têm qualquer obrigação ética de oferecer intervenções desproporcionais ou impróprias a seus pacientes porque podem exercer seu tirocínio profissional ao avaliar se um tratamento solicitado é apropriado para obter um objetivo terapêutico. Se as solicitações não forem razoáveis, o médico não deve sentir-se obrigado a proporcionar os tratamentos;(4545. Veatch RM, Spicer CM. Medically futile care: the role of the physician in setting limits. Am J Low Med. 1992;18(1-2):15-36. Review. ) além do mais, considerando-se os limitados recursos, é eticamente justificável limitar o acesso a tratamentos dispendiosos e oferecer o benefício mínimo.(4646. Solomon MZ. How physicians talk about futility: making words mean too many things. J Law Med Ethics. 1993;21(2):231-7.) Decisões a respeito da propriedade dos tratamentos envolvem julgamentos morais a respeito do direito ou dos bons cuidados.(4747. Truog RD, Brock DW, Cook DJ, Danis M, Luce JM, Rubenfeld GD, Levy MM; Task Force on Values, Ethics, and Rationing in Critical Care (VERICC). Rationing in the intensive care unit. Crit Care Med. 2006;34(4):958-63; quiz 971.)
A falta de conhecimento sobre ética e sobre leis provavelmente exerce uma influência
cautelar e cria preocupações exageradas sobre a ética e a responsabilidade legal. Em
1996, médicos da Califórnia ofereciam RCP a todos os pacientes, independentemente dos
benefícios obtidos e apesar de a política do hospital permitir que não realizassem
RCP em todos os pacientes. A maioria dos 69 intensivistas entrevistados acreditava
que a RCP devia ser oferecida a todos os pacientes. Entretanto, os estudiosos da
ética argumentam que a RCP não deve ser administrada a pacientes sem chance de se
beneficiar.(4343. Piers RD, Azoulay E, Ricou D, Dekeyser Ganz F, Decruyenaere J, Max
A, Michalsen A, Maia PA, Owczuk R, Rubulotta F, Depuydt P, Meert AP, Reyners AK,
Aquilina A, Bekaert M, Van den Noortgate NJ, Schrauwen WJ, Benoit DD; APPROPRICUS
Study Group of the Ethics Section of the ESICM. Perceptions of appropriateness of
care among European and Israeli intensive care unit nurses and physicians. JAMA.
2011;306(24):2694-703) Os
médicos experimentam considerável incerteza a respeito do o que é ou não ética e
legalmente permissível.(4343. Piers RD, Azoulay E, Ricou D, Dekeyser Ganz F, Decruyenaere J, Max
A, Michalsen A, Maia PA, Owczuk R, Rubulotta F, Depuydt P, Meert AP, Reyners AK,
Aquilina A, Bekaert M, Van den Noortgate NJ, Schrauwen WJ, Benoit DD; APPROPRICUS
Study Group of the Ethics Section of the ESICM. Perceptions of appropriateness of
care among European and Israeli intensive care unit nurses and physicians. JAMA.
2011;306(24):2694-703
44. Schneiderman LJ, Jecker NS, Jonsen AR. Medical futility: its meaning
and ethical implications. Ann Int Med. 1990;112(12):949-54.
45. Veatch RM, Spicer CM. Medically futile care: the role of the
physician in setting limits. Am J Low Med. 1992;18(1-2):15-36. Review.
46. Solomon MZ. How physicians talk about futility: making words mean
too many things. J Law Med Ethics. 1993;21(2):231-7.-4747. Truog RD, Brock DW, Cook DJ, Danis M, Luce JM, Rubenfeld GD, Levy
MM; Task Force on Values, Ethics, and Rationing in Critical Care (VERICC). Rationing
in the intensive care unit. Crit Care Med. 2006;34(4):958-63; quiz
971.) Uma
razão legal válida para não proporcionar medidas de RCP e ACLS, claramente
especificada em diretrizes, refere-se a respeitar o desejo do paciente ou a
determinação do médico primário de que a ressuscitação não é desejada nem apropriada.
Infelizmente, este não é o padrão de prática na Europa, especialmente nos países do
sul do continente.
CONCLUSÃO
Decisões referentes à ressuscitação e à duração dos esforços de ressuscitação são aspectos comumente encontrados na medicina de emergência, e frequentemente acarretam diversas questões éticas cruciais. As consequências positivas e negativas devem ser cuidadosamente consideradas ao se tomarem tais decisões. São necessários mais estudos a respeito dos efeitos e dos benefícios da ressuscitação cardiopulmonar. A contenção de custos é necessária, e o uso apropriado de recursos médicos é um objetivo da medicina de emergência. Deve ser dada atenção particular ao bem-estar dos sobreviventes.
REFERÊNCIAS
-
1Guidelines for cardiopulmonary resuscitation and emergency cardiac care. Emergency Cardiac Care Committee and Subcommittees, American Heart Association. Part I. Introduction. JAMA. 1992;268(16):2171-83.
-
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Oct-Dec 2013
Histórico
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Recebido
26 Nov 2013 -
Aceito
10 Dez 2013