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Tradução e adaptação cultural da versão portuguesa (Brasil) da escala de dor Behavioural Pain Scale

Resumos

Objetivo:

Realizar tradução e adaptação cultural para português do Brasil da escala de dor Behavioural Pain Scale, e avaliar suas propriedades psicométricas.

Métodos:

Estudo ocorreu em duas fases: versão portuguesa da escala Behavioural Pain Scale para o Brasil e estudo das suas propriedades psicométricas (confiabilidade e utilidade clínica). A amostra foi constituída por 100 pacientes maiores de 18 anos no decorrer do segundo semestre de 2012. Como critério de inclusão, deveriam estar internados em unidades de terapia intensiva, intubados, sob ventilação mecânica, fazendo uso ou não de sedação e analgesia. Foram excluídos pacientes pediátricos e que não estavam intubados. O estudo foi realizado em um hospital privado de grande porte, situado na cidade de São Paulo (SP).

Resultados:

Os resultados mostraram que, em relação à reprodutibilidade, a concordância observada entre os dois avaliadores foi 92,08% para “Adaptação à ventilação mecânica”, 88,1% para “Membros superiores” e 90,1% para “Expressão facial”. O coeficiente de concordância Kappa para “Adaptação à ventilação mecânica” assumiu valor 0,740. Observamos boa concordância entre os avaliadores, com um coeficiente de correlação intraclasse de 0,807 (intervalo de confiança de 95%: 0,727-0,866).

Conclusão:

A escala Behavioural Pain Scale mostrou ser de fácil aplicação e reprodutibilidade, assim como teve adequada consistência interna, sendo satisfatória a adaptação da escala Behavioural Pain Scale para o Brasil para avaliação da dor em pacientes graves.

Medição da dor; Respiração artificial; Tradução; Unidades de terapia intensiva


Objective:

The objective of this study was to translate and culturally adapt the Behavioral Pain Scale to Brazilian Portuguese and to evaluate the psychometric properties of this scale.

Methods:

This study was conducted in two phases: the Behavioral Pain Scale was translated and culturally adapted to Brazilian Portuguese and the psychometric properties of this scale were subsequently assessed (reliability and clinical utility). The study sample consisted of 100 patients who were older than 18 years of age, admitted to an intensive care unit, intubated, mechanically ventilated, and subjected or not to sedation and analgesia from July 2012 to December 2012. Pediatric and non-intubated patients were excluded. The study was conducted at a large private hospital that was situated in the city of São Paulo (SP).

Results:

Regarding reproducibility, the results revealed that the observed agreement between the two evaluators was 92.08% for the pain descriptor “adaptation to mechanical ventilation”, 88.1% for “upper limbs”, and 90.1% for “facial expression”. The kappa coefficient of agreement for “adaptation to mechanical ventilation” assumed a value of 0.740. Good agreement was observed between the evaluators with an intraclass correlation coefficient of 0.807 (95% confidence interval: 0.727-0.866).

Conclusion:

The Behavioral Pain Scale was easy to administer and reproduce. Additionally, this scale had adequate internal consistency. The Behavioral Pain Scale was satisfactorily adapted to Brazilian Portuguese for the assessment of pain in critically ill patients.

Pain measurement; Respiration, artificial; Translating; Intensive care units


INTRODUÇÃO

A dor durante a hospitalização é frequente, devido à gravidade da doença e aos procedimentos necessários ao tratamento, que são quase sempre invasivos e agressivos, principalmente no setor de terapia intensiva.(1Viana DL, Dupas G, Pedreira ML. A avaliação da dor da criança pelas enfermeiras na unidade de terapia intensiva. Pediatria (São Paulo). 2006;28(4):251-61.) A comunicação da experiência dolorosa aos profissionais de saúde é fundamental para compreensão do quadro álgico, implementação de medidas analgésicas e avaliação da eficácia terapêutica. Devido a isso, cada vez mais se notou a necessidade de desenvolver instrumentos de avaliação da dor que retratassem uma linguagem universal sobre a experiência dolorosa.(2Correia LL, Linhares MB. Avaliação do comportamento de crianças em situações de dor: revisão da literatura. J Pediatr (Rio J). 2008;84(6):477-86.)

Os instrumentos para a avaliação da dor em adultos baseiam-se, fundamentalmente, no autorrelato, o que dificulta de forma considerável sua avaliação em pacientes com déficits cognitivos e em ventilação mecânica.(3Carneiro AF, Silva LG, Bosco FP. Sedação e Analgesia em Unidade de Terapia Intensiva. Curso de Educação a Distância em Anestesiologia. Sociedade Brasileira de Anestesiologia - Comissão de Educação Continuada. 2010. Retrieved from http://www.clasa-anestesia.org/site/version/docs/SBA.
http://www.clasa-anestesia.org/site/vers...

Gélinas C, Fortier M, Viens C, Fillion L, Puntillo K. Pain assessment and management in critically ill intubated patients: a retrospective study. Am J Crit Care. 2004;13(2):126-35.
-5Ahlers SJ, van Gulik L, van der Veen AM, van Dongen HP, Bruins P, Belitser SV, et al. Comparison of different pain scoring systems in critically ill patients in a general ICU. Crit Care. 2008;12(1):R15.) Um problema comum nas unidades de terapia intensiva (UTI) é a existência de grande número de pacientes graves que se encontram inconscientes e em ventilação mecânica, ou seja, impossibilitados de se expressarem verbalmente de forma efetiva, seja devido à doença de base ou pelo uso de sedativos com ou sem bloqueio neuromuscular.(6Payen JF, Bru O, Bosson JL, Lagrasta A, Novel E, Deschaux I, et al. Assessing pain in critically ill sedated patients by using a behavioral pain scale. Crit Care Med. 2001;29(12):2258-63.) Várias escalas vêm sendo desenvolvidas para avaliar o paciente adulto em UTI sob ventilação mecânica. Dentre elas, podemos destacar as escalas Behavioral Pain Scale (BPS)(7Gélinas C, Harel F, Fillion L, Puntillo KA, Johnston CC. Sensitivity and specificity of the critical-care pain observation tool for the detection of pain in intubated adults after cardiac surgery. J Pain Symptom Manage. 2009;37(1):58-67.) e a Critical-Care Pain Observation Tool (CPOT),(8Li D, Puntillo K, Miaskowski C. A review of objective pain measures for use with critical care adult patients unable to self-report. J Pain. 2008;9(1):2-10.) referindo que são necessários mais estudos para avaliar as suas propriedades psicométricas. Em outra revisão, autores avaliaram as escalas Behavioral Pain Rating Scale (BPRS), Pain Assessment and Intervention Notation Algorithm, Nonverbal Pain Scale (NVPS), Pain Behavior Assessment Tool, BPS e a CPOT, e recomendaram o uso das duas últimas escalas.(9Cade CH. Clinical tools for the assessment of pain in sedated critically ill adults. Nurs Crit Care. 2008;13(6):288-97. Review.) Outro autor analisou as escalas BPS, CPOT e NVPS e recomendou a BPS, argumentando que esta foi testada num grupo mais amplo de doentes e que mostrou validade e fiabilidade em três estudos.(1010 Puntillo K, Pasero C, Li D, Mularski RA, Grap MJ, Erstad BL, Varkey B, et al. Evaluation of pain in ICU patients. Chest. 2009;135(4):1069-74.)

Dentre as escalas desenvolvidas para avaliar a dor em pacientes de UTI sob ventilação mecânica, a BPS parece ser a que reúne mais consenso para ser utilizada na prática clínica.(1111 Chen YY, Lai YH, Shun SC, Chi NH, Tsai PS, Liao YM. The Chinese Behavior Pain Scale for critically ill patients: translation and psychometric testing. Int J Nurs Stud. 2011;48(4):438-48.) Essa escala foi uma das primeiras a ser usada para medir as experiências de dor em doentes incapazes de se comunicar verbalmente, sendo atualmente uma das mais estudadas.(1010 Puntillo K, Pasero C, Li D, Mularski RA, Grap MJ, Erstad BL, Varkey B, et al. Evaluation of pain in ICU patients. Chest. 2009;135(4):1069-74.,1212 Aissaoui Y, Zeggwagh AA, Zekraoui A, Abidi K, Abouqal R. Validation of a behavioral pain scale in critically ill, sedated, and mechanically ventilated patients. Anesth Analg. 2005;101(5):1470-6.)

A BPS é usada para avaliar a dor em pacientes sedados e inconscientes sob ventilação mecânica. Ela consiste na avaliação de três aspectos: expressão facial, movimentos corporais e tolerância à ventilação mecânica. A BPS permite definir a intensidade da dor entre 3 (nenhuma dor) e 12 (a maior intensidade de dor) pontos.(1212 Aissaoui Y, Zeggwagh AA, Zekraoui A, Abidi K, Abouqal R. Validation of a behavioral pain scale in critically ill, sedated, and mechanically ventilated patients. Anesth Analg. 2005;101(5):1470-6.) Cada indicador foi categorizado em quatro descrições do comportamento, indicando ausência de dor (pontuação 1) a um máximo de dor (pontuação 4). A pontuação total varia entre os 3 pontos (sem dor) e os 12 pontos (dor máxima);(1010 Puntillo K, Pasero C, Li D, Mularski RA, Grap MJ, Erstad BL, Varkey B, et al. Evaluation of pain in ICU patients. Chest. 2009;135(4):1069-74.) o tempo estimado para seu preenchimento é de 2 a 5 minutos.(1212 Aissaoui Y, Zeggwagh AA, Zekraoui A, Abidi K, Abouqal R. Validation of a behavioral pain scale in critically ill, sedated, and mechanically ventilated patients. Anesth Analg. 2005;101(5):1470-6.,1313 Young J, Siffleet J, Nikoletti S, Shaw T. Use of a Behavioral Pain Scale to assess pain in ventilated, unconscious and/or sedated patients. Intensive Crit Care Nurs. 2006;22(1):32-9.)

O presente estudo teve como objetivos realizar a tradução e adaptação cultural para o português do Brasil da escala de dor BPS, além de avaliar suas propriedades psicométricas (confiabilidade, concordância interavaliadores e utilidade clínica).

MÉTODOS

Tratou-se de um estudo que ocorreu em duas fases: tradução e adaptação cultural da versão portuguesa da escala BPS para o Brasil (Fase I) e estudo de suas propriedades psicométricas (confiabilidade e utilidade clínica) (Fase II). O estudo foi realizado com 100 pacientes internados em UTI, intubados, sob ventilação mecânica e sedados. Os critérios de inclusão foram pacientes adultos em ventilação mecânica, com e sem analgesia e sedação; não houve nenhum critério de exclusão.

O estudo foi realizado em uma UTI de um hospital privado de grande porte, situado na cidade de São Paulo (SP). Para coleta de dados, foi utilizado um formulário estruturado com os dados de caracterização da amostra e a escala BPS, traduzida e adaptada culturalmente, para ser aplicada aos pacientes elegíveis para esse estudo. A coleta de dados transcorreu no segundo semestre do ano de 2012. O processo de tradução e adaptação cultural seguiu o fluxo descrito abaixo.

Na Fase I, após autorização da autora da escala, foi feita a tradução da mesma por duas tradutoras (Português nativo) de forma independente (T1 e T2). Na etapa 2, com base nestas duas traduções, um painel de sete peritos em cuidados a pacientes em UTI com experiência em avaliação da dor (seis enfermeiros e um fisioterapeuta) validou do ponto de vista semântico e cultural uma versão de consenso (T3). Na etapa 3, esta versão foi posteriormente retrovertida para o inglês, de forma independente, por duas tradutoras (inglês nativo: americano e canadense). Na etapa 4, um novo painel, composto pelos mesmos elementos, definiu uma versão de consenso posteriormente comparada com a versão original para se obter a equivalência (T4). Por último a etapa 5 consistiu em treinamento realizado com os avaliadores e, logo após, um teste piloto. A seguir, a escala para teste (piloto) foi aplicada. Após, finalizamos com pequenos ajustes a versão final (T5). A versão brasileira da escala BPS é mostrada no quadro 1.

Quadro 1
Versão final brasileira da escala Behavioural Pain Scale

O projeto de pesquisa foi encaminhado para o Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital Albert Einstein e após aprovação sob número 113.605 iniciamos a operacionalização do estudo. A coleta de dados contou com a autorização prévia dos familiares dos pacientes por meio do Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE).

A análise descritiva das variáveis categóricas foi feita por meio das frequências absolutas e relativas, e as contínuas, pelas medidas de localização mínimo, máximo, primeiro quartil e terceiro quartil, já que não observamos distribuição normal, de acordo com o teste Kolmogorov-Smirnov.

A concordância entre os dois avaliadores (interavaliadores) foi realizada por meio do coeficiente de Kappa de Cohen para as variáveis ordinais. Os valores entre 0,41 e 0,60 são considerados moderados; entre 0,61 e 0,80, substanciais; e entre 0,81 e 1,0, excelentes.(1414 Landis JR, Koch GG. The measurement of observer agreement for categorical data. Biometrics. 1977;33(1):159-74.) O coeficiente de correlação intraclasse (CCI) foi usado para quantificar a concordância da pontuação total da escala. Admitiu-se uma boa concordância para valores superiores a 0,75.(1515 Kramer MS, Feinstein AR. Clinical biostatistics. LIV. The biostatistics of concordance. Clin Pharmacol Ther. 1981;29(1):111-23. Erratum in Clin Pharmacol Ther. 1989;46(3):309.) O teste Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) foi usado para aferir a adequação da análise fatorial. Para avaliar a relação entre a intensidade da dor e o uso de analgesia ou sedação, utilizamos tabelas de dupla entrada e testes exatos de Fisher. Os dados foram analisados com o uso do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 17.0 para Windows®.

RESULTADOS

Foram selecionados para amostra cem pacientes maiores de 18 anos, que se encontravam intubados em ventilação mecânica, internados em uma UTI geral, durante o segundo semestre de 2012. Observamos que 61% eram do sexo masculino e a idade média foi 63 anos, 75% pacientes tinham nível superior de escolaridade. O tempo de internação variou de 1 dia a 32 meses, com média de 4 meses. Em relação a tipo de sedação e analgesia e o motivo da internação estão detalhados na tabela 1.

Tabela 1
Distribuição das características da amostra em relação a idade, tempo internação, gênero, analgesia e sedação

Dentre os descritores de dor da escala, o único item avaliado e que apresentou classificação 4 (dor forte) foi “Expressão facial”; esse item foi classificado com intensidade 2 em cerca de 25% dos casos. O item “Membros superiores” foi classificado em maioria como 1 (menor dor, 88,1% para o avaliador 1 e 84,2% para o avaliador 2), assim como o item “Adaptação à ventilação mecânica” (96% para os dois avaliadores). Esses resultados indicam que o item que apresentou classificação de dor mais forte foi “Expressão facial” (Tabela 2).

Tabela 2
Descrição dos resultados obtidos pelos dois avaliadores em relação à frequência dos descritores

A média de intensidade de dor avaliada pela escala foi 3,5 (dor leve), tanto para o avaliador 1 quanto para o avaliador 2. A pontuação total observada variou de 3 a 8 (dor leve a moderada) em uma escala de 3 a 12. Cerca de 65% dos pacientes apresentavam intensidade de dor leve (3) e 32% apresentaram intensidade 4 e 5 (moderada); 3% apresentam intensidade 6 ou 8.

Da análise dos componentes principais, apurou-se a presença de um fator com valor próprio superior a 1 (valor próprio=1,532) com uma variância explicada de 51,08%. A “Expressão facial” foi o indicador da escala com maior correlação com o fator (0,748) e a “Adaptação à ventilação mecânica” com a menor correlação (0,039). O teste KMO foi usado para aferir a adequação da análise fatorial, apresentando valor 0,509.

A escala apresentou consistência interna com um alfa de Cronbach de 0,501. O indicador “Membros superiores” foi o que melhor se correlacionou com total da escala (0,498). Em sentido contrário, o item “Adaptação à ventilação mecânica” foi o que menos se correlacionou com o total da escala (0,070).

A concordância observada entre os dois avaliadores foi 98,0% para “Adaptação à ventilação mecânica”, 88,1% para “Membros superiores” e 90,1% para “Expressão facial”. O coeficiente de concordância Kappa para “Adaptação à ventilação mecânica” assumiu valor 0,740. Para os dois outros itens, não foi possível calcular o coeficiente de concordância Kappa, pois os observadores classificaram diferentes números de categorias. Para a pontuação total da escala, observamos boa concordância entre os avaliadores, com um CCI de 0,807 (intervalo de confiança de 95%-IC95% de 0,727-0,866), conforme destacado na tabela 3.

Tabela 3
Análise da escala Behavioural Pain Scale de acordo com a concordância entre os avaliadores referente aos itens de avaliação

Quanto à pontuação total, observamos 60,4% dos casos classificados como intensidade 3 pelos dois avaliadores, 14,9% dos casos classificados como 4 pelos dois, 5,9% classificados como 5 e 1,0% classificado como 6 ou 8 pelos dois avaliadores, conforme destacado na tabela 4. Isso nos dá uma concordância observada de 82,2% entre os avaliadores, indicando boa conformidade entre eles. Além disso, em complemento ao CCI, calculamos também o coeficiente de concordância Kappa para a pontuação total e obtivemos um coeficiente de 0,731 (IC95%: 0,40-1,00), considerado evidência de boa concordância ou reprodutibilidade (Tabela 4).

Tabela 4
Análise da escala Behavioural Pain Scale de acordo com a concordância entre os avaliadores

DISCUSSÃO

O estudo mostrou que a escala BPS revelou-se com confiabilidade adequada e uma variância total de 51,08% e ainda boa concordância ou reprodutibilidade entre os avaliadores, sendo este resultado similar ao de outros estudos.(6Payen JF, Bru O, Bosson JL, Lagrasta A, Novel E, Deschaux I, et al. Assessing pain in critically ill sedated patients by using a behavioral pain scale. Crit Care Med. 2001;29(12):2258-63.,1212 Aissaoui Y, Zeggwagh AA, Zekraoui A, Abidi K, Abouqal R. Validation of a behavioral pain scale in critically ill, sedated, and mechanically ventilated patients. Anesth Analg. 2005;101(5):1470-6.) O intervalo de coeficiente de concordância Kappa foi de 95%.

Menos de 50% dos profissionais avaliam a dor.(1616 Kumar AB, Brennan TJ. Pain assessment, sedation, and analgesic administration in the intensive care unit. Anesthesiology. 2009;111(6):1187-8.) A avaliação desta e da sedação é particularmente complexa na UTI porque, muitas vezes, os pacientes mostram-se incapazes ou impossibilitados de se comunicarem verbalmente com os profissionais(1717 Calil AM. Avaliação da dor e analgesia no atendimento pré-hospitalar em pacientes de trauma. Rev Gaúch Enferm. 2008;29(2):308-13.,1818 Guinsburg R. Avaliação e tratamento da dor no recém-nascido. J Pediatr (Rio J). 1999;75(3):149-60.) por diversas razões: intubação traqueal, alteração da consciência, sedação e efeito de medicamentos.(1111 Chen YY, Lai YH, Shun SC, Chi NH, Tsai PS, Liao YM. The Chinese Behavior Pain Scale for critically ill patients: translation and psychometric testing. Int J Nurs Stud. 2011;48(4):438-48.) O paciente em ventilação mecânica deve ser avaliado quanto à dor e à sedação para otimizar a dose de medicamentos. Tal avaliação visa reduzir o tempo de necessidade de ventiladores e de permanência em UTI.(1919 Fontes KB, Jaques AE. O papel da enfermagem frente ao monitoramento da dor como 5º sinal vital. Cienc Cuid Saúde. 2007;6(Supl 2):481-7.)

No presente estudo verificamos que do total de pacientes que estavam sob efeito de sedação (55%), 64% não apresentaram dor segundo a escala BPS e ainda 36% tiveram dor de leve intensidade. Estudo realizado em uma unidade de atendimento a pacientes vítimas de trauma observou ausência de instrumentos para a aferição da dor e de protocolos de analgesia, demonstrando que 48% dos pacientes permaneceram sem tratamento analgésico por até 3 horas após sua admissão.(2020 Herr K, Coyne PJ, Key T, Manworren R, McCaffery M, Merkel S, Pelosi-Kelly J, Wild L; American Society for Pain Management Nursing. Pain assessment in the nonverbal patient: position statement with clinical practice recommendations. Pain Manag Nurs. 2006;7(2):44-52.)

A análise da expressão facial fornece informações válidas, sensíveis e específicas a respeito da natureza e da intensidade da dor, permitindo uma comunicação eficaz entre o paciente e as pessoas envolvidas em seus cuidados.(2121 Calil AM, Pimenta CA. Intensidade da dor e adequação de analgesia. Rev Latinoam Enferm. 2005;13(5):692-9.)

A resposta nociva, devida à dor, é considerada desnecessária; seu controle e alívio devem estar na lista de prioridades no atendimento do paciente. Apesar do impacto desfavorável da dor, do sofrimento que esta causa e das suas repercussões, os cuidados destinados ao paciente com dor continuam a ser um grande desafio(2121 Calil AM, Pimenta CA. Intensidade da dor e adequação de analgesia. Rev Latinoam Enferm. 2005;13(5):692-9.) e o desafio do combate à dor se inicia na deficiência de sua percepção. Apesar de algumas iniciativas nacionais demonstrarem preocupação para instituir a dor como quinto sinal vital nas instituições hospitalares, observa-se passividade dos profissionais de saúde no convívio cotidiano com tal tema, levando à subidentificação e à subnotificação.(1717 Calil AM. Avaliação da dor e analgesia no atendimento pré-hospitalar em pacientes de trauma. Rev Gaúch Enferm. 2008;29(2):308-13.) O indicador “Membros superiores” foi o que melhor se correlacionou com total da escala (0,498), como o já constataram outros autores.(6Payen JF, Bru O, Bosson JL, Lagrasta A, Novel E, Deschaux I, et al. Assessing pain in critically ill sedated patients by using a behavioral pain scale. Crit Care Med. 2001;29(12):2258-63.,1919 Fontes KB, Jaques AE. O papel da enfermagem frente ao monitoramento da dor como 5º sinal vital. Cienc Cuid Saúde. 2007;6(Supl 2):481-7.)

O presente estudo apresentou consistência interna de 0,5101, em relação a tradução e à adaptação cultural da BPS e boa concordância na pontuação total da escala (82,2%), estando de acordo com outros estudos.(2020 Herr K, Coyne PJ, Key T, Manworren R, McCaffery M, Merkel S, Pelosi-Kelly J, Wild L; American Society for Pain Management Nursing. Pain assessment in the nonverbal patient: position statement with clinical practice recommendations. Pain Manag Nurs. 2006;7(2):44-52.)

A possibilidade de utilizar um instrumento específico para avaliar a dor desses pacientes pode auxiliar na identificação e no tratamento da dor, proporcionando, à equipe de enfermagem, ferramentas para implantação da dor como o quinto sinal vital e, posteriormente, desenvolvimento de protocolos de analgesia. Por ser uma escala comportamental, no entanto, seu uso requer formação e treinamento da equipe, avaliador dependente; porém, o profissional capacitado percebe que a escala é fácil e rápida de ser aplicada, além de ser útil na prática clínica. Consideramos com limitação do estudo, o fato dos pacientes estarem sob efeitos de sedativos, podendo influenciar no resultado da avaliação da dor.

CONCLUSÃO

A escala Behavioural Pain Scale mostrou ser de fácil aplicação e reprodutibilidade. Foi observada uma adequada consistência interna e, portanto, a adaptação dessa escala para o Brasil, para avaliação da dor em pacientes graves, mostrou-se satisfatória.

Considerando a inexistência de uma escala específica para avaliar dor nessa população, acreditamos que a escala Behavioural Pain Scale deve auxiliar muito na identificação precoce da dor e, assim, no tratamento da dor desses pacientes graves.

  • Editor responsável: Jorge Ibrain Figueira Salluh

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    30 Jan 2014
  • Aceito
    09 Out 2014
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