Acessibilidade / Reportar erro

Ventilação mecânica não invasiva na crise de asma aguda grave em crianças: níveis de evidências

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a qualidade das evidências existentes para embasar diretrizes do emprego da ventilação mecânica não invasiva no manejo da crise de asma aguda grave em crianças não responsivas ao tratamento padrão.

Métodos:

Busca, seleção e análise de todos os artigos originais sobre asma e ventilação mecânica não invasiva em crianças, publicados até 1º de setembro de 2014, em todos os idiomas, nas bases de dados eletrônicas PubMed, Web of Science, Cochrane Library, Scopus e SciELO, encontrados por meio de busca pelos descritores "asthma", "status asthmaticus", "noninvasive ventilation", "bronchospasm", "continuous positive airway pressure", "child", "infant", "pediatrics", "hypercapnia", "respiratory failure", e das palavras-chave "BIPAP", "CPAP", "bilevel", "acute asthma" e "near fatal asthma". Os artigos foram qualificados segundo os graus de evidências do Sistema GRADE.

Resultados:

Foram obtidos apenas nove artigos originais. Destes, dois (22%) apresentaram nível de evidência A, um (11%) apresentou nível de evidência B e seis (67%) apresentaram nível de evidência C.

Conclusão:

Sugere-se que o emprego da ventilação mecânica não invasiva na crise de asma aguda grave em crianças não responsivas ao tratamento padrão é aplicável à maioria desses pacientes, mas as evidências não podem ser consideradas conclusivas, uma vez que pesquisa adicional de alta qualidade provavelmente tenha um impacto modificador na estimativa de efeito.

Descritores:
Ventilação não invasiva; Espasmo brônquico; Asma; Estado asmático; Insuficiência respiratória; Hipercapnia; Criança

ABSTRACT

Objective:

To evaluate the quality of available evidence to establish guidelines for the use of noninvasive ventilation for the management of status asthmaticus in children unresponsive to standard treatment.

Methods:

Search, selection and analysis of all original articles on asthma and noninvasive ventilation in children, published until September 1, 2014 in all languages in the electronic databases PubMed, Web of Science, Cochrane Library, Scopus and SciELO, located using the search terms: "asthma", "status asthmaticus", "noninvasive ventilation", "Bronchospasm", "continuous positive airway pressure", "child", "infant", "pediatrics", "hypercapnia", "respiratory failure" and the keywords "BIPAP", "CPAP", "Bilevel", "acute asthma" and "near fatal asthma". The articles were assessed based on the levels of evidence of the GRADE system.

Results:

Only nine original articles were located; two (22%) articles had level of evidence A, one (11%) had level of evidence B and six (67%) had level of evidence C.

Conclusion:

The results suggest that noninvasive ventilation is applicable for the treatment of status asthmaticus in most pediatric patients unresponsive to standard treatment. However, the available evidence cannot be considered as conclusive, as further high-quality research is likely to have an impact on and change the estimate of the effect.

Keywords:
Noninvasive ventilation; Bronchial spasmus; Asthma; Status asmathicus; Respiratory insufficiency; Hypercapnia; Child

INTRODUÇÃO

A ventilação mecânica não invasiva (VNI) foi utilizada pela primeira vez em adultos no final da década de 1980.(11 Marohn K, Panisello JM. Noninvasive ventilation in pediatric intensive care. Curr Opin Pediatr. 2013;25(3):290-6.) Em 1993, ao se realizar uma busca na base de dados PubMed, era possível encontrar apenas 14 publicações com o termo "noninvasive ventilation". Em 2003, esse termo já alcançava 88 trabalhos. Em busca realizada em 2013, foram encontradas 230 publicações científicas por meio do mesmo descritor.(22 Argent AC, Biban P. What's new on NIV in the PICU: does everyone in respiratory failure require endotracheal intubation? Intensive Care Med. 2014;40(6):880-4.)

A asma aguda grave ou "estado de mal asmático" é a exacerbação de asma mais ou menos rápida, porém grave, que pode não apresentar resposta ao tratamento padrão (oxigênio, broncodilatador e corticoide).(33 Papiris S, Kotanidou A, Malagari K, Roussos C. Clinical review: severe asthma. Crit Care. 2002;6(1):30-44.) Tem como característica a presença de obstrução difusa de vias aéreas inferiores causada por processo inflamatório/edema, além do espasmo da musculatura lisa brônquica e de tampões de secreção, sendo reversível.(44 Mayordomo-Colunga J, Medina A, Rey C, Concha A, Menéndez S, Arcos ML, et al. Non-invasive ventilation in pediatric status asthmaticus: a prospective observational study. Pediatr Pulmonol. 2011;46(10):949-55.) Há limitação ao fluxo aéreo e ao fechamento precoce da via aérea, o que acaba por gerar um aumento do trabalho respiratório. A fase expiratória da respiração passa a ser também ativa, na tentativa de esvaziar os pulmões. O aumento da resistência das vias aéreas e a hiperinsuflação levam à distensão excessiva do parênquima pulmonar e da caixa torácica, tornando mais difícil a próxima inspiração.(44 Mayordomo-Colunga J, Medina A, Rey C, Concha A, Menéndez S, Arcos ML, et al. Non-invasive ventilation in pediatric status asthmaticus: a prospective observational study. Pediatr Pulmonol. 2011;46(10):949-55.) Essa hiperinsuflação é dinâmica, gerando aumento progressivo das constantes de tempo, o que leva a mais aprisionamento de ar e aumento da pressão positiva expiratória final (PEEP) intrínseca.(44 Mayordomo-Colunga J, Medina A, Rey C, Concha A, Menéndez S, Arcos ML, et al. Non-invasive ventilation in pediatric status asthmaticus: a prospective observational study. Pediatr Pulmonol. 2011;46(10):949-55.) São episódios agudos ou subagudos de tosse, "falta de ar", "chiado" e "aperto no peito", ou alguma combinação desses sintomas.(33 Papiris S, Kotanidou A, Malagari K, Roussos C. Clinical review: severe asthma. Crit Care. 2002;6(1):30-44.)

Durante a infância, as taxas de hospitalizações por asma estão perto de 5%, sendo pouco comuns os episódios de falência respiratória nesses pacientes, ocorrendo apenas em 8 a 24% das crianças asmáticas admitidas em unidades de terapia intensiva pediátrica.(55 Diretrizes da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia para o Manejo da Asma - 2012. J Bras de Pneumol. 2012;38(Supl 1):S1-46.)

Atualmente, acredita-se que o uso da VNI em certos grupos de pacientes, como, por exemplo, pacientes com exacerbação de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), tem levado à redução da necessidade de intubação, da mortalidade e dos custos de tratamento, o que tem tornado seu emprego cada vez mais usual.(66 Schettino GP, Reis MA, Galas F, Park M, Franca S, Okamoto V. [Mechanical ventilation noninvasive with positive pressure]. J Bras Pneumol. 2007;33 Suppl 2S:S92-105. Portuguese.)

Tendo em vista que a utilização da VNI na DPOC parece ser eficaz e segura, e a fisiopatologia da disfunção respiratória aguda na asma é, em inúmeros aspectos, semelhante à da DPOC, tem-se pesquisado também o emprego desta nos quadros de crise de asma grave.(33 Papiris S, Kotanidou A, Malagari K, Roussos C. Clinical review: severe asthma. Crit Care. 2002;6(1):30-44.) Apesar disso, as indicações para utilizar a ventilação não invasiva na crise de asma aguda ainda não estão totalmente fundamentadas, e seu uso tem sido questionado,(33 Papiris S, Kotanidou A, Malagari K, Roussos C. Clinical review: severe asthma. Crit Care. 2002;6(1):30-44.) especialmente em crianças.

O mecanismo de funcionamento da VNI na crise de asma parece estar baseado em seu efeito broncodilatador, que leva ao recrutamento alveolar.(77 Carson KV, Usmani ZA, Smith BJ. Noninvasive ventilation in acute severe asthma: current evidence and future perspectives. Curr Opin Pulm Med. 2014;20(1):118-23.) Este ocorre como resultado da PEEP, que compensa o efeito gerado pelo aumento da PEEP intrínseca. Ocorre incremento de fluxo por intermédio dos canais de ventilação colateral, reexpandindo áreas atelectasiadas, melhorando a relação ventilação/perfusão e, consequentemente, diminuindo o trabalho respiratório.(77 Carson KV, Usmani ZA, Smith BJ. Noninvasive ventilation in acute severe asthma: current evidence and future perspectives. Curr Opin Pulm Med. 2014;20(1):118-23.) Quanto utilizada no modo com dois níveis de pressão positiva nas vias aéreas (BIPAP - bilevel positive airway pressure), a pressão inspiratória (IPAP) pode ajudar a musculatura inspiratória a vencer a limitação ao fluxo de ar e a hiperdistensão da caixa torácica, aumentando o volume corrente gerado.(44 Mayordomo-Colunga J, Medina A, Rey C, Concha A, Menéndez S, Arcos ML, et al. Non-invasive ventilation in pediatric status asthmaticus: a prospective observational study. Pediatr Pulmonol. 2011;46(10):949-55.)

Na VNI, interface entre o paciente e o respirador pode ser uma máscara mantida no lugar por uma touca(88 Pons Odena M, Cambra Lasaosa FJ; Sociedad Española de Cuidados Intensivos Pediátricos. [Mechanical ventilation in pediatrics (III). Weaning, complications and other types of ventilation. Noninvasive ventilation]. An Pediatr (Barc). 2003;59(2):165-72. Spanish.) ou uma pronga nasal, ou seja, sem intubação traqueal, reduzindo as complicações da ventilação mecânica invasiva e aparecendo como uma alternativa para os pacientes pouco responsivos ao tratamento padrão para crise de asma. Apesar disso, deve-se atentar para as contraindicações gerais do uso da VNI, como de alteração do nível de consciência, instabilidade hemodinâmica, alterações gastrintestinais (que possam levar à náusea e ao vômito), trauma facial, mais de dois órgãos em falência aguda, entre outros.(99 James MM, Beilman GJ. Mechanical ventilation. Surg Clin North Am. 2012;92(6):1463-74.)

Esse suporte ventilatório é, em geral, ofertado por meio de um nível de pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP) ou, então, por dois níveis (BIPAP).(1010 Carroll CL, Schramm CM. Noninvasive positive pressure ventilation for the treatment of status asthmaticus in children. Ann Allergy Asthma Immunol. 2006;96(3):454-9.)

O objetivo deste estudo foi avaliar a qualidade das evidências existentes para embasar diretrizes do emprego da VNI no manejo da crise de asma aguda grave em crianças não responsivas ao tratamento padrão.

MÉTODOS

Busca, seleção e análise de todos os artigos originais sobre asma e VNI em crianças (até 18 anos), publicados até 1º de setembro de 2014, em todos os idiomas, nas bases de dados eletrônicas PubMed, Web of Science, Cochrane Library, Scopus e SciELO, encontrados por meio de busca pelos descritores (registrados no Descritores de Ciências da Saúde - DeCs) "asthma", "status asthmaticus", "noninvasiveventilation", "bronchospasm", "continuouspositive airway pressure", "child", "infant", "pediatrics", "hypercapnia", "respiratory failure", e das palavras-chave "BIPAP", "CPAP", "bilevel", "acute asthma" e "near fatal asthma".

Os artigos gerados pela busca foram inicialmente selecionados mediante as informações contidas em seus títulos e resumos, sendo excluídos aqueles que apresentassem em sua amostra indivíduos com outros diagnósticos de doenças pulmonares além de asma. Após, foi realizada a leitura destes na íntegra, e analisadas as referências presentes nos mesmos, na busca de eventuais trabalhos que pudessem também preencher os critérios de inclusão do estudo, e que, porventura, não tivessem sido encontrados na busca inicial. Em virtude do pequeno número de artigos gerados pela busca dentro dos critérios de inclusão, todos foram incluídos na revisão sistemática mediante avaliação de sua metodologia.

Para a avaliação da qualidade metodológica dos artigos encontrados, optou-se pela utilização do sistema Grading of Recommendations Assessment, Development and Evaluation (GRADE) de qualificação da evidência científica, que é um sistema claro e explícito, que leva em consideração o delineamento do estudo, sua execução, consistência e direção linear no julgamento da qualidade da evidência para cada resultado/consequência importante.(1111 Guyatt GH, Oxman AD, Kunz R, Falck-Ytter Y, Vist GE, Liberati A, Schünemann HJ; GRADE Working Group. Going from evidence to recommendations. BMJ. 2008;336(7652):1049-51.

12 Guyatt GH, Oxman AD, Kunz R, Jaeschke R, Helfand M, Liberati A, Vist GE, Schünemann HJ; GRADE Working Group. Incorporating considerations of resources use into grading recommendations. BMJ. 2008;336(7654):1170-3.

13 Guyatt GH, Oxman AD, Vist GE, Kunz R, Falck-Ytter Y, Alonso-Coello P, Schünemann HJ; GRADE Working Group. GRADE: an emerging consensus on rating quality of evidence and strength of recommendations. BMJ. 2008;336(7650):924-6.

14 Atkins D, Best D, Briss PA, Eccles M, Falck-Ytter Y, Flottorp S, Guyatt GH, Harbour RT, Haugh MC, Henry D, Hill S, Jaeschke R, Leng G, Liberati A, Magrini N, Mason J, Middleton P, Mrukowicz J, O'Connell D, Oxman AD, Phillips B, Schünemann HJ, Edejer T, Varonen H, Vist GE, Williams JW Jr, Zaza S; GRADE Working Group. Grading quality of evidence and strength of recommendations. BMJ. 2004;328(7454):1490.
-1515 Guyatt GH, Oxman AD, Kunz R, Vist GE, Falck-Ytter Y, Schünemann HJ; GRADE Working Group. What is "quality of evidence" and why is it important to clinicians? BMJ. 2008;336(7651):995-8.)

Pelo sistema GRADE, a qualidade das evidências é classificada segundo os níveis: alta, moderada, baixa e muito baixa (Quadro 1). Algumas organizações, quando utilizam o GRADE, combinam as categorias baixa e muito baixa.

Quadro 1
Qualidade das evidências GRADE(1111 Guyatt GH, Oxman AD, Kunz R, Falck-Ytter Y, Vist GE, Liberati A, Schünemann HJ; GRADE Working Group. Going from evidence to recommendations. BMJ. 2008;336(7652):1049-51.

12 Guyatt GH, Oxman AD, Kunz R, Jaeschke R, Helfand M, Liberati A, Vist GE, Schünemann HJ; GRADE Working Group. Incorporating considerations of resources use into grading recommendations. BMJ. 2008;336(7654):1170-3.

13 Guyatt GH, Oxman AD, Vist GE, Kunz R, Falck-Ytter Y, Alonso-Coello P, Schünemann HJ; GRADE Working Group. GRADE: an emerging consensus on rating quality of evidence and strength of recommendations. BMJ. 2008;336(7650):924-6.

14 Atkins D, Best D, Briss PA, Eccles M, Falck-Ytter Y, Flottorp S, Guyatt GH, Harbour RT, Haugh MC, Henry D, Hill S, Jaeschke R, Leng G, Liberati A, Magrini N, Mason J, Middleton P, Mrukowicz J, O'Connell D, Oxman AD, Phillips B, Schünemann HJ, Edejer T, Varonen H, Vist GE, Williams JW Jr, Zaza S; GRADE Working Group. Grading quality of evidence and strength of recommendations. BMJ. 2004;328(7454):1490.

15 Guyatt GH, Oxman AD, Kunz R, Vist GE, Falck-Ytter Y, Schünemann HJ; GRADE Working Group. What is "quality of evidence" and why is it important to clinicians? BMJ. 2008;336(7651):995-8.
-1616 Guyatt GH, Norris SL, Schulman S, Hirsh J, Eckman MH, Akl EA, Crowther M, Vandvik PO, Eikelboom JW, McDonagh MS, Lewis SZ, Gutterman DD, Cook DJ, Schünemann HJ; American College of Chest Physicians. Methodology for the development of antithrombotic therapy and prevention of thrombosis guidelines: Antithrombotic Therapy and Prevention of Thrombosis, 9th ed: American College of Chest Physicians Evidence-Based Clinical Practice Guidelines. Chest. 2012;141(2 Suppl):53S-70S.)

A avaliação criteriosa da qualidade da evidência foi realizada por dois revisores de forma independente.

RESULTADOS

Ao final do processo de busca, apenas nove artigos foram encontrados (Quadro 2). Estes apresentavam-se repetidos entre as bases de dados: Cochrane Library com dois artigos repetidos, Web of Science com seis, Scopus com cinco, PubMed com oito e SciELO com nenhum. Dois (22%) artigos apresentaram nível de evidência A, um (11%) apresentou nível de evidência B e seis (67%) apresentaram nível de evidência C (Tabela 1).

Quadro 2
Principais características dos estudos
Tabela 1
Sistema GRADE para qualidade da evidência

DISCUSSÃO

Existem poucos artigos publicados sobre o uso da VNI no manejo da asma aguda grave em crianças, sendo a maioria deles com delineamento observacional. Os dois únicos ensaios clínicos randomizados(1717 Basnet S, Mander G, Andoh J, Klaska H, Verhulst S, Koirala J. Safety, efficacy, and tolerability of early initiation of noninvasive positive pressure ventilation in pediatric patients admitted with status asthmaticus: a pilot study. Pediatr Crit Care Med. 2012;13(4):393-8.,1818 Thill PJ, McGuire JK, Baden HP, Green TP, Checchia PA. Noninvasive positive-pressure ventilation in children with lower airway obstruction. Pediatr Crit Care Med. 2004;5(4):337-42.) existentes têm limitações como o fato de não haver cegamento de pesquisador e sujeito, e por apresentarem um número pequeno de crianças incluídas. Em 2010, a Pediatric Critical Care Medicine publicou o resumo de um trabalho apresentado em um evento sobre o tema, o qual tratava-se, provavelmente, do início do estudo publicado em 2012,(1717 Basnet S, Mander G, Andoh J, Klaska H, Verhulst S, Koirala J. Safety, efficacy, and tolerability of early initiation of noninvasive positive pressure ventilation in pediatric patients admitted with status asthmaticus: a pilot study. Pediatr Crit Care Med. 2012;13(4):393-8.) um ensaio clínico randomizado prospectivo open-label comparando o uso de VNI associada à terapia padrão com apenas a terapia padrão no tratamento de asma aguda grave em crianças de 1 a 18 anos.

Um dos ensaios clínicos randomizados(1818 Thill PJ, McGuire JK, Baden HP, Green TP, Checchia PA. Noninvasive positive-pressure ventilation in children with lower airway obstruction. Pediatr Crit Care Med. 2004;5(4):337-42.) encontrados não exclui a possibilidade de haver sujeitos com outras doenças obstrutivas de vias aéreas inferiores na amostra de seu estudo, em virtude da dificuldade que se tem em fazer esse diagnóstico diferencial, porém foca-se no paciente asmático, utilizando, inclusive, uma escala para avaliação da gravidade da crise de asma (Clinical Asthma Score) como instrumento de sua pesquisa.

O ensaio prospectivo(1919 Needleman JP, Sykes JA, Schroeder SA, Singer LP. Noninvasive positive pressure ventilation in the treatment of pediatric status asthmaticus. Pediatr Asthma Allergy Immunol. 2004;17(4):272-7.) incluído na revisão sistemática utiliza a pletismografia como medida objetiva para avaliação da melhora da dinâmica respiratória. Os autores concluíram que a VNI é um tratamento seguro e efetivo para o manejo de asma aguda grave na população pediátrica.

Os demais trabalhos encontrados são observacionais, incluindo coortes(44 Mayordomo-Colunga J, Medina A, Rey C, Concha A, Menéndez S, Arcos ML, et al. Non-invasive ventilation in pediatric status asthmaticus: a prospective observational study. Pediatr Pulmonol. 2011;46(10):949-55.,2020 Williams AM, Abramo TJ, Shah MV, Miller RA, Burney-Jones C, Rooks S, et al. Safety and clinical findings of BiPAP utilization in children 20 kg or less for asthma exacerbations. Intensive Care Med. 2011;37(8):1338-43.,2121 Beers SL, Abramo TJ, Bracken A, Wiebe RA. Bilevel positive airway pressure in the treatment of status asthmaticus in pediatrics. Am J Emerg Med. 2007;25(1):6-9.) e séries/relatos de casos.(1010 Carroll CL, Schramm CM. Noninvasive positive pressure ventilation for the treatment of status asthmaticus in children. Ann Allergy Asthma Immunol. 2006;96(3):454-9.,2222 Akingbola OA, Simakajornboon N, Hadley Jr EF, Hopkins RL. Noninvasive positive-pressure ventilation in pediatric status asthmaticus. Pediatr Crit Care Med. 2002;3(2):181-4.,2323 Haggenmacher C, Biarent D, Otte F, Fonteyne C, Clement S, Deckers S. [Non-invasive bi-level ventilation in paediatric status asthmaticus]. Arch Pediatr. 2005;12(12):1785-7)

Outro estudo testou a hipótese de que o uso de um nível de CPAP poderia produzir modulações autonômicas, aumentando a ativação parassimpática, além da broncodilatação gerada pelo efeito mecânico da pressão positiva. O nível de CPAP utilizado foi de 10cmH2O durante 20 minutos. Esse estudo(2424 de Freitas Dantas Gomes EL, Costa D, Germano SM, Borges PV, Sampaio LM. Effects of CPAP on clinical variables and autonomic modulation in children during an asthma attack. Respir Physiol Neurobiol. 2013;188(1):66-70.) demonstrou um aumento do tônus vagal durante a administração do CPAP, persistindo o efeito após a cessação do mesmo, devido à ativação da via parassimpática não colinérgica, inibindo, assim, a broncoconstrição gerada pelo estímulo da via colinérgica.

Pondera-se também a possibilidade de a VNI melhorar a deposição de aerossol (broncodilatador) nas vias aéreas por terapia inalatória durante crises de asma e agudização da DPOC.(2525 Dhand R. Aerosol therapy in patients receiving noninvasive positive pressure ventilation. J Aerosol Med Pulm Drug Deliv. 2012;25(2):63-78.) Os resultados parecem depender de inúmeros fatores associados, como o tipo de respirador, o modo ventilatório, o tipo de interface entre paciente-respirador, a posição da conexão para a aerossol terapia no circuito, entre outros. Apesar disso, acredita-se que a associação de VNI e medicações inalatórias apresente um efeito positivo, desde que se tenha bastante atenção na forma de aplicação da técnica.

Existem algumas complicações que podem vir associadas ao uso da VNI, como lesões de pele (apoio da máscara), distensão gástrica, podendo levar a vômitos e aspirações,(2626 Gay PC. Complications of noninvasive ventilation in acute care. Respir Care. 2009;54(2):246-57; discussion 257-8.) enfisema subcutâneo, entre outros. Na prática clínica, tenta-se minimizar esses efeitos deletérios através do uso de placas de hidrocoloide na região de apoio das máscaras ou prongas, uso de sonda nasogástrica aberta em frasco, pausas curtas para alívio da face e ajustes nos parâmetros pressóricos utilizados na VNI sempre que necessário.

Outro fator a ser considerado, é que alguns pacientes podem manifestar desconforto devido à pressão e ao fluxo de ar.(2626 Gay PC. Complications of noninvasive ventilation in acute care. Respir Care. 2009;54(2):246-57; discussion 257-8.) Em alguns casos pode haver a necessidade do uso de algum tipo de sedação, que deve ser bem avaliada, uma vez que pode eventualmente levar à depressão respiratória.

As limitações dos estudos apresentados podem ter relação com o fato de ser bastante difícil que a utilização de uma máscara (ou outra interface de VNI) não seja percebida pelo paciente e pelo pesquisador, e também por ser complicado ofertar apenas oxigênio (sem pressões - tornando um grupo controle) pela mesma, uma vez que a máscara pode gerar desconforto e provavelmente não gerará a fração inspirada de oxigênio (FiO2) que se objetiva, como quando usando sistemas normais de oxigenoterapia.

Deve-se pensar também na questão ética. A crise de asma aguda grave é uma condição que pode levar ao óbito do paciente, devendo sua terapêutica ser cuidadosamente selecionada para resolução do quadro, o quanto antes, tornando mais difícil a simples randomização dos pacientes para a utilização ou não da VNI para tal.

Todos os autores têm apontado a VNI como uma terapia eficaz e segura como adjunta no tratamento de crianças em crise de asma aguda grave não responsivas ao tratamento convencional; entretanto, considerem-se as ressalvas observadas sobre a qualidade metodológica dos estudos.

CONCLUSÃO

Sugere-se que o emprego da ventilação mecânica não invasiva na crise de asma aguda grave em crianças não responsivas ao tratamento padrão é aplicável a maioria desses pacientes, mas as evidências não podem ser consideradas conclusivas, uma vez que pesquisa adicional de alta qualidade provavelmente tenha um impacto modificador na estimativa de efeito.

  • Editor responsável: Werther Brunow de Carvalho

REFERÊNCIAS

  • 1
    Marohn K, Panisello JM. Noninvasive ventilation in pediatric intensive care. Curr Opin Pediatr. 2013;25(3):290-6.
  • 2
    Argent AC, Biban P. What's new on NIV in the PICU: does everyone in respiratory failure require endotracheal intubation? Intensive Care Med. 2014;40(6):880-4.
  • 3
    Papiris S, Kotanidou A, Malagari K, Roussos C. Clinical review: severe asthma. Crit Care. 2002;6(1):30-44.
  • 4
    Mayordomo-Colunga J, Medina A, Rey C, Concha A, Menéndez S, Arcos ML, et al. Non-invasive ventilation in pediatric status asthmaticus: a prospective observational study. Pediatr Pulmonol. 2011;46(10):949-55.
  • 5
    Diretrizes da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia para o Manejo da Asma - 2012. J Bras de Pneumol. 2012;38(Supl 1):S1-46.
  • 6
    Schettino GP, Reis MA, Galas F, Park M, Franca S, Okamoto V. [Mechanical ventilation noninvasive with positive pressure]. J Bras Pneumol. 2007;33 Suppl 2S:S92-105. Portuguese.
  • 7
    Carson KV, Usmani ZA, Smith BJ. Noninvasive ventilation in acute severe asthma: current evidence and future perspectives. Curr Opin Pulm Med. 2014;20(1):118-23.
  • 8
    Pons Odena M, Cambra Lasaosa FJ; Sociedad Española de Cuidados Intensivos Pediátricos. [Mechanical ventilation in pediatrics (III). Weaning, complications and other types of ventilation. Noninvasive ventilation]. An Pediatr (Barc). 2003;59(2):165-72. Spanish.
  • 9
    James MM, Beilman GJ. Mechanical ventilation. Surg Clin North Am. 2012;92(6):1463-74.
  • 10
    Carroll CL, Schramm CM. Noninvasive positive pressure ventilation for the treatment of status asthmaticus in children. Ann Allergy Asthma Immunol. 2006;96(3):454-9.
  • 11
    Guyatt GH, Oxman AD, Kunz R, Falck-Ytter Y, Vist GE, Liberati A, Schünemann HJ; GRADE Working Group. Going from evidence to recommendations. BMJ. 2008;336(7652):1049-51.
  • 12
    Guyatt GH, Oxman AD, Kunz R, Jaeschke R, Helfand M, Liberati A, Vist GE, Schünemann HJ; GRADE Working Group. Incorporating considerations of resources use into grading recommendations. BMJ. 2008;336(7654):1170-3.
  • 13
    Guyatt GH, Oxman AD, Vist GE, Kunz R, Falck-Ytter Y, Alonso-Coello P, Schünemann HJ; GRADE Working Group. GRADE: an emerging consensus on rating quality of evidence and strength of recommendations. BMJ. 2008;336(7650):924-6.
  • 14
    Atkins D, Best D, Briss PA, Eccles M, Falck-Ytter Y, Flottorp S, Guyatt GH, Harbour RT, Haugh MC, Henry D, Hill S, Jaeschke R, Leng G, Liberati A, Magrini N, Mason J, Middleton P, Mrukowicz J, O'Connell D, Oxman AD, Phillips B, Schünemann HJ, Edejer T, Varonen H, Vist GE, Williams JW Jr, Zaza S; GRADE Working Group. Grading quality of evidence and strength of recommendations. BMJ. 2004;328(7454):1490.
  • 15
    Guyatt GH, Oxman AD, Kunz R, Vist GE, Falck-Ytter Y, Schünemann HJ; GRADE Working Group. What is "quality of evidence" and why is it important to clinicians? BMJ. 2008;336(7651):995-8.
  • 16
    Guyatt GH, Norris SL, Schulman S, Hirsh J, Eckman MH, Akl EA, Crowther M, Vandvik PO, Eikelboom JW, McDonagh MS, Lewis SZ, Gutterman DD, Cook DJ, Schünemann HJ; American College of Chest Physicians. Methodology for the development of antithrombotic therapy and prevention of thrombosis guidelines: Antithrombotic Therapy and Prevention of Thrombosis, 9th ed: American College of Chest Physicians Evidence-Based Clinical Practice Guidelines. Chest. 2012;141(2 Suppl):53S-70S.
  • 17
    Basnet S, Mander G, Andoh J, Klaska H, Verhulst S, Koirala J. Safety, efficacy, and tolerability of early initiation of noninvasive positive pressure ventilation in pediatric patients admitted with status asthmaticus: a pilot study. Pediatr Crit Care Med. 2012;13(4):393-8.
  • 18
    Thill PJ, McGuire JK, Baden HP, Green TP, Checchia PA. Noninvasive positive-pressure ventilation in children with lower airway obstruction. Pediatr Crit Care Med. 2004;5(4):337-42.
  • 19
    Needleman JP, Sykes JA, Schroeder SA, Singer LP. Noninvasive positive pressure ventilation in the treatment of pediatric status asthmaticus. Pediatr Asthma Allergy Immunol. 2004;17(4):272-7.
  • 20
    Williams AM, Abramo TJ, Shah MV, Miller RA, Burney-Jones C, Rooks S, et al. Safety and clinical findings of BiPAP utilization in children 20 kg or less for asthma exacerbations. Intensive Care Med. 2011;37(8):1338-43.
  • 21
    Beers SL, Abramo TJ, Bracken A, Wiebe RA. Bilevel positive airway pressure in the treatment of status asthmaticus in pediatrics. Am J Emerg Med. 2007;25(1):6-9.
  • 22
    Akingbola OA, Simakajornboon N, Hadley Jr EF, Hopkins RL. Noninvasive positive-pressure ventilation in pediatric status asthmaticus. Pediatr Crit Care Med. 2002;3(2):181-4.
  • 23
    Haggenmacher C, Biarent D, Otte F, Fonteyne C, Clement S, Deckers S. [Non-invasive bi-level ventilation in paediatric status asthmaticus]. Arch Pediatr. 2005;12(12):1785-7
  • 24
    de Freitas Dantas Gomes EL, Costa D, Germano SM, Borges PV, Sampaio LM. Effects of CPAP on clinical variables and autonomic modulation in children during an asthma attack. Respir Physiol Neurobiol. 2013;188(1):66-70.
  • 25
    Dhand R. Aerosol therapy in patients receiving noninvasive positive pressure ventilation. J Aerosol Med Pulm Drug Deliv. 2012;25(2):63-78.
  • 26
    Gay PC. Complications of noninvasive ventilation in acute care. Respir Care. 2009;54(2):246-57; discussion 257-8.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    13 Abr 2015
  • Aceito
    12 Set 2015
Associação de Medicina Intensiva Brasileira - AMIB Rua Arminda, 93 - Vila Olímpia, CEP 04545-100 - São Paulo - SP - Brasil, Tel.: (11) 5089-2642 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbti.artigos@amib.com.br