Acessibilidade / Reportar erro

Protocolos de mobilização precoce no paciente crítico pediátrico: revisão sistemática

RESUMO

Objetivo:

Descrever os protocolos existentes de mobilização precoce nas unidades de terapia intensiva pediátrica.

Métodos:

Trata-se de uma revisão sistemática da literatura cuja busca foi realizada nas bases MEDLINE®, Embase, SciELO, LILACS e PeDRO, sem restrição para data e idioma. Foram incluídos estudos observacionais e ensaios clínicos randomizados e não randomizados, que descrevessem um programa de mobilização precoce em pacientes admitidos na unidade de terapia intensiva pediátrica, com idades entre 29 dias a 18 anos. A qualidade metodológica dos estudos foi avaliada por meio das ferramentas Newcastle-Ottawa, Methodological Index for Non-Randomized Studies e da colaboração Cochrane.

Resultados:

Foram identificados 8.663 estudos, sendo 6 incluídos nesta revisão. Três estudos descreveram a implementação de programa de mobilização precoce, incluindo atividades como mobilização passiva progressiva, posicionamento, discussão das metas de mobilização com a equipe, além de contraindicações e critérios de interrupção. Cicloergômetro e jogos de realidade virtual também foram usados como recursos para mobilização. Quatro estudos consideram a importância da participação da equipe multiprofissional na implementação dos protocolos de mobilização precoce.

Conclusão:

De modo geral, os protocolos de mobilização precoce são baseados em intervenções individualizadas, conforme o desenvolvimento da criança. Além disso, o uso do cicloergômetro pode ser viável e seguro nesta população. A implementação de protocolos institucionais e multiprofissional pode contribuir para a prática da mobilização precoce nas unidades de terapia intensiva pediátrica, no entanto são necessários estudos que comprovem a eficácia da intervenção.

Descritores:
Cuidados críticos; Criança; Deambulação precoce; Reabilitação; Unidades de terapia intensiva pediátrica

ABSTRACT

Objective:

To describe the existing early mobilization protocols in pediatric intensive care units.

Methods:

A systematic literature review was performed using the databases MEDLINE®, Embase, SciELO, LILACS and PeDRO, without restrictions of date and language. Observational and randomized and nonrandomized clinical trials that described an early mobilization program in patients aged between 29 days and 18 years admitted to the pediatric intensive care unit were included. The methodological quality of the studies was evaluated using the Newcastle-Ottawa Scale, Methodological Index for Non-Randomized Studies and the Cochrane Collaboration.

Results:

A total of 8,663 studies were identified, of which 6 were included in this review. Three studies described the implementation of an early mobilization program, including activities such as progressive passive mobilization, positioning, and discussion of mobilization goals with the team, in addition to contraindications and interruption criteria. Cycle ergometer and virtual reality games were also used as resources for mobilization. Four studies considered the importance of the participation of the multidisciplinary team in the implementation of early mobilization protocols.

Conclusion:

In general, early mobilization protocols are based on individualized interventions, depending on the child's development. In addition, the use of a cycle ergometer may be feasible and safe in this population. The implementation of institutional and multidisciplinary protocols may contribute to the use of early mobilization in pediatric intensive care units; however, studies demonstrating the efficacy of such intervention are needed.

Keywords:
Critical care; Child; Early mobilization; Rehabilitation; Intensive care units, pediatric

INTRODUÇÃO

O objetivo inicial no manejo do paciente crítico nas unidades de terapia intensiva (UTI) é manter a máxima estabilidade hemodinâmica e ventilatória.(11 Bone MF, Feinglass JM, Goodman DM. Risk factors for acquiring functional and cognitive disabilities during admission to a PICU*. Pediatr Crit Care Med. 2014;15(7):640-8.) Nos últimos anos, a mortalidade nas UTI pediátricas reduziu significativamente, porém a proporção de crianças que desenvolveram algum grau de limitação após a alta aumentou.(22 Namachivayam P, Shann F, Shekerdemian L, Taylor A, van Sloten I, Delzoppo C, et al. Three decades of pediatric intensive care: Who was admitted, what happened in intensive care, and what happened afterward. Pediatr Crit Care Med. 2010;11(5):549-55.,33 Rennick JE, Childerhose JE. Redefining success in the PICU: new patient populations shift targets of care. Pediatrics. 2015;135(2):e289-91.) A consequente imobilização, somada a outros fatores de risco, como sepse, hiperglicemia, internação prolongada, uso de corticosteroides, benzodiazepínicos e de bloqueadores neuromusculares, pode estar relacionada com limitação na funcionalidade,(44 Pereira GA, Schaan CW, Ferrari RS. Functional evaluation of pediatric patients after discharge from the intensive care unit using the Functional Status Scale. Rev Bras Ter Intensiva. 2017;29(4):460-5) diminuição da massa e força muscular, alterações na integridade da pele, abstinência e delirium.(55 Zorowitz RD. ICU-acquired weakness: a rehabilitation perspective of diagnosis, treatment, and functional management. Chest. 2016;150(4):966-71.,66 Herrup EA, Wieczorek B, Kudchadkar SR. Characteristics of postintensive care syndrome in survivors of pediatric critical illness: A systematic review. World J Crit Care Med. 2017;6(2):124-34.)

Neste contexto, intervenções como a mobilização precoce, iniciada imediatamente após a estabilização do paciente na UTI, devem ser consideradas no processo de reabilitação dos pacientes.(77 De Jonghe B, Bastuji-Garin S, Sharshar T, Outin H, Brochard L. Does ICU-acquired paresis lengthen weaning from mechanical ventilation? Intensive Care Med. 2004;30(6):1117-21.

8 Gosselink R, Bott J, Johnson M, Dean E, Nava S, Norrenberg M, et al. Physiotherapy for adult patients with critical illness: recommendations of the European Respiratory Society and European Society of Intensive Care Medicine Task Force on Physiotherapy for Critically Ill Patients. Intensive Care Med. 2008;34(7):1188-99.

9 Stiller K. Physiotherapy in intensive care: an updated systematic review. Chest. 2013;144(3):825-47.

10 Bemis-Dougherty AR, Smith JM. What follows survival of critical illness? Physical therapists' management of patients with post-intensive care syndrome. Phys Ther. 2013;93(2):179-85.
-1111 Davidson JE, Harvey MA, Bemis-Dougherty A, Smith JM, Hopkins RO. Implementation of the Pain, Agitation, and Delirium Clinical Practice Guidelines and promoting patient mobility to prevent post-intensive care syndrome. Crit Care Med. 2013;41(9 Suppl 1):S136-45.) Em adultos, a mobilização precoce está associada com desfechos positivos a curto e longo prazo, como melhora da força muscular periférica,(1212 Dantas CM, Silva PF, Siqueira FH, Pinto RM, Matias S, Maciel C, et al. Influence of early mobilization on respiratory and peripheral muscle strength in critically ill patients. Rev Bras Ter Intensiva. 2012;24(2):173-8.) mobilidade e dias fora do hospital.(1313 Tipping CJ, Harrold M, Holland A, Romero L, Nisbet T, Hodgson CL. The effects of active mobilisation and rehabilitation in ICU on mortality and function: a systematic review. Intensive Care Med. 2017;43(2):171-83.) Em pediatria, os estudos são recentes,(1414 Abdulsatar F, Walker RG, Timmons BW, Choong K. "Wii-Hab" in critically ill children: a pilot trial. J Pediatr Rehabil Med. 2013;6(4):193-204.

15 Choong K, Chacon MD, Walker RG, Al-Harbi S, Clark H, Al-Mahr G, et al. In-bed mobilization in critically ill children: a safety and feasibility trial. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):225-34.
-1616 Wieczorek B, Burke C, Al-Harbi A, Kudchadkar SR. Early mobilization in the pediatric intensive care unit: a systematic review. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):212-7.) porém as evidências demonstram que a mobilização precoce é viável e segura.(1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.,1818 Choong K, Awladthani S, Khawaji A, Clark H, Borhan A, Cheng J, Laskey S, Neu C, Sarti A, Thabane L, Timmons BW, Zheng K, Al-Harbi S; Canadian Critical Care Trials Group. Early exercise in critically ill youth and children, a preliminary evaluation: The wEECYCLE Pilot Trial. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(11):e546-54.)

Entretanto, a ausência de protocolos e de conhecimento da equipe multidisciplinar, a preocupação com a segurança do paciente, o nível de sedação e a disponibilidade de profissionais e recursos constituem importantes barreiras para a prática da mobilização precoce nas UTI pediátricas.(1919 Saliski M, Kudchadkar SR. Optimizing sedation management to promote early mobilization for critically ill children. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):188-93.,2020 Hopkins RO, Choong K, Zebuhr CA, Kudchadkar SR. Transforming PICU culture to facilitate early rehabilitation. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):204-11.) Assim, o objetivo desta revisão foi descrever os protocolos de mobilização precoce existentes em pediatria, analisando as atividades propostas, os recursos necessários e os profissionais envolvidos. A sistematização destes protocolos pode contribuir para melhor entendimento e recomendação desta prática, visando à redução de morbidades associadas e à recuperação funcional de crianças e adolescentes, por meio da implementação de práticas seguras nas UTI pediátricas.

MÉTODOS

Trata-se de revisão sistemática da literatura, seguindo as recomendações do PRISMA Statement,(2121 Moher D, Shamseer L, Clarke M, Ghersi D, Liberati A, Petticrew M, Shekelle P, Stewart LA; PRISMA-P Group. Preferred reporting items for systematic review and meta-analysis protocols (PRISMA-P) 2015 statement. Syst Rev. 2015;4:1) registrada no International prospective register of systematic reviews (PROSPERO) sob número CRD42017068238.

Critérios de elegibilidade

Foram incluídos estudos observacionais e ensaios clínicos randomizados e não randomizados ou quase experimentais que descrevessem os protocolos de mobilização precoce em UTI pediátrica em crianças e adolescentes com idades entre 29 dias e 18 anos. Foi considerada mobilização precoce qualquer exercício de mobilidade, passiva ou ativa, iniciado assim que possível durante o período de internação na UTI pediátrica, podendo incluir: exercícios passivos, ativo-assistidos ou ativos; atividades de mobilidade no leito (exemplo: troca de posturas e sedestação); transferências; ortostase; marcha estacionária e/ou deambulação; mobilização com cicloergômetro ou jogos de realidade virtual (Nintendo Wii(tm) ou Xbox 360 Kinect(tm)). O tempo de início da mobilização, com base na admissão, não foi considerado critério de inclusão. Foram incluídos estudos publicados em inglês, português ou espanhol.

Estratégia de busca e seleção dos estudos

A busca foi realizada nas bases de dados MEDLINE® via PubMed®, Embase, Physiotherapy Evidence Database (PEDro), Lietratura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Scientific Electronic Library Online (SciELO). Também foi realizada busca manual nas referências dos estudos publicados sobre o tema.

A estratégia de busca compreendeu as palavras-chaves e os termos sinônimos para a intervenção "mobilização precoce" e para a população em estudo "crianças e adolescentes em cuidados intensivos". A busca foi feita com a utilização de termos MeSH e sinônimos, sem restrição de data e idioma, até o período de março de 2017, sendo atualizada em janeiro de 2018. A estratégia de busca completa do PubMed® está apresentada no apêndice A Apêndice Apêndice A Estratégia de busca utilizada no PubMed® #1 ("Intensive Care Units, Pediatric" OR "Intensive Care Units, Pediatric" OR “Pediatric Intensive Care Units” OR "Intensive Care Units" OR "Intensive Care Units" OR “Care Unit, Intensive” OR “Care Units, Intensive” OR “Intensive Care Unit” OR “Unit, Intensive Care” OR “Units, Intensive Care” OR "Critical Care" OR “Critical Care” OR “Care, Critical” OR “Intensive Care” OR “Care, Intensive” OR “Surgical Intensive Care” OR “Care, Surgical Intensive” OR “Intensive Care, Surgical” OR "Critical Illness" OR "Critical Illness" OR “Critical Illnesses” OR “Illness, Critical” OR “Illnesses, Critical” OR “Critically Ill”) #2 (Pediatrics OR Infant OR Infants OR “Child, Preschool” OR “Preschool Child” OR “Children, Preschool” OR “Preschool Children” OR Child OR Children OR Adolescent OR Adolescents OR Adolescence OR Teens OR Teen OR Teenagers OR Teenager OR Youth OR Youths OR “Adolescents, Female” OR “Adolescent, Female” OR “Female Adolescent” OR “Female Adolescents” OR “Adolescents, Male” OR “Adolescent, Male” OR “Male Adolescent” OR “Male Adolescents”) #3 (“Early Ambulation” OR “Ambulation, Early” OR “Accelerated Ambulation” OR “Ambulation, Accelerated” OR “Early Mobilization” OR “Mobilization, Early” OR “Exercise Therapy” OR “Therapy, Exercise” OR “Exercise Therapies” OR “Therapies, Exercise” OR Rehabilitation OR Habilitation OR “Physical Therapy Modalities” OR “Modalities, Physical Therapy” OR “Modality, Physical Therapy” OR “Physical Therapy Modality” OR “Physiotherapy (Techniques)” OR “Physiotherapies (Techniques)” OR “Physical Therapy Techniques” OR “Physical Therapy Technique” OR “Techniques, Physical Therapy” OR “Neurological Physiotherapy” OR “Physiotherapy, Neurological” OR “Neurophysiotherapy” OR "virtual rehabilitation" OR "video game" OR "passive cycling exercise" OR "passive cycle ergometer") #4 #1 AND #2 AND #3 .

Os títulos e os resumos dos artigos identificados na estratégia de busca foram analisados por dois revisores independentes, de acordo com os critérios de inclusão e exclusão. Na fase seguinte, os mesmos revisores realizaram a leitura completa dos artigos selecionados para a verificação dos critérios de elegibilidade de forma independente. Os artigos com informações insuficientes no resumo também foram selecionados para leitura na íntegra. Em casos de discordância, um terceiro avaliador foi consultado.

Extração e análise dos dados

Os dados foram extraídos de forma independente pelos revisores, utilizando tabela padronizada, que compreendeu a caracterização da amostra, a descrição do protocolo de mobilização precoce (início da mobilização, atividade realizada, recursos utilizados, duração, frequência e progressão), os profissionais envolvidos e os principais resultados encontrados. A análise dos dados foi realizada de forma descritiva.

Avaliação do risco de viés

A avaliação da qualidade metodológica foi realizada de forma descritiva e independente pelos mesmos dois revisores. A qualidade metodológica dos estudos observacionais foi avaliada pela Newcastle-Ottawa Scale (NOS); os estudos prospectivos foram avaliados pela ferramenta para estudos de coorte; e os estudos retrospectivos, pela ferramenta para estudos caso-controle, sendo considerados três aspectos: seleção dos grupos (zero - 4 pontos), qualidade de ajuste para confusão (zero - 2 pontos) e avaliação da exposição ou do desfecho de interesse no estudo (zero - 3 pontos), totalizando 9 pontos, o que representa alta qualidade metodológica.(2222 Wells GA, Shea B, O'Connell D, Peterson D, Welch V, Losos M, et al. The Newcastle-Ottawa Scale (NOS) for assessing the quality of nonrandomised studies in meta-analyses. 2014 [internet]. Available from: http://www.ohri.ca/programs/clinical_epidemiology/oxford.asp.
http://www.ohri.ca/programs/clinical_epi...
) Os ensaios clínicos controlados randomizados foram avaliados conforme a recomendação da Colaboração Cochrane por meio dos itens: geração da sequência aleatória, sigilo da alocação, cegamento dos avaliadores dos desfechos, análise por intenção de tratar e descrição das perdas e exclusões.(2323 Higgins JP, Green S, editors. Cochrane handbook for systematic reviews of interventions. New Jersey: Wiley Online Library; 2008.) Os estudos não randomizados foram avalidos conforme o Methodological Index for Non-Randomized Studies (MINORS), que compreende 12 itens, sendo os 8 primeiros aplicáveis para estudos não comparativos e pontuados em zero (não relatado), 1 (relatado mas inadequado) ou 2 (relatado e adequado), totalizando 16 pontos.(2424 Slim K, Nini E, Forestier D, Kwiatkowski F, Panis Y, Chipponi J. Methodological index for non-randomized studies (minors): development and validation of a new instrument. ANZ J Surg. 2003;73(9):712-6.)

RESULTADOS

Do total de 8.663 estudos identificados, 6 artigos foram incluídos nesta revisão sistemática (Figura 1). Foram incluídos dois estudos observacionais prospectivos,(1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.,2525 Tsuboi N, Nozaki H, Ishida Y, Kanazawa I, Inamoto M, Hayashi K, et al. Early mobilization after pediatric liver transplantation. J Pediatr Intensive Care. 2017;6(3):199-205.) um estudo observacional retrospectivo,(2626 Betters KA, Hebbar KB, Farthing D, Griego B, Easley T, Turman H, et al. Development and implementation of an early mobility program for mechanically ventilated pediatric patients. J Crit Care. 2017;41:303-8.) dois estudos quase-experimentais(1414 Abdulsatar F, Walker RG, Timmons BW, Choong K. "Wii-Hab" in critically ill children: a pilot trial. J Pediatr Rehabil Med. 2013;6(4):193-204.,1515 Choong K, Chacon MD, Walker RG, Al-Harbi S, Clark H, Al-Mahr G, et al. In-bed mobilization in critically ill children: a safety and feasibility trial. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):225-34.) e um ensaio clínico controlado randomizado,(1818 Choong K, Awladthani S, Khawaji A, Clark H, Borhan A, Cheng J, Laskey S, Neu C, Sarti A, Thabane L, Timmons BW, Zheng K, Al-Harbi S; Canadian Critical Care Trials Group. Early exercise in critically ill youth and children, a preliminary evaluation: The wEECYCLE Pilot Trial. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(11):e546-54.) totalizando 394 pacientes, com média de idade de oito anos, variando de crianças menores de 1 ano até 16 anos. O motivo da admissão na UTI pediátrica variou entre os estudos, incluindo causas clínicas e cirúrgicas. As características dos estudos incluídos estão apresentadas na tabela 1.

Figura 1
Fluxograma dos estudos incluídos na revisão sistemática.

Tabela 1
Características dos estudos incluídos

Os protocolos de mobilização precoce estão apresentados na tabela 2. Três estudos descreveram a implementação de um programa de mobilização precoce.(1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.,2525 Tsuboi N, Nozaki H, Ishida Y, Kanazawa I, Inamoto M, Hayashi K, et al. Early mobilization after pediatric liver transplantation. J Pediatr Intensive Care. 2017;6(3):199-205.,2626 Betters KA, Hebbar KB, Farthing D, Griego B, Easley T, Turman H, et al. Development and implementation of an early mobility program for mechanically ventilated pediatric patients. J Crit Care. 2017;41:303-8.) O primeiro descreveu um programa interdisciplinar de mobilização denominado PICU Up!, composto por três níveis progressivos baseados na condição do paciente, parâmetros ventilatórios e nível de sedação, e definido diariamente durante o round da unidade. O protocolo incluiu rotinas como iluminação, posicionamento, troca de decúbito, fisioterapia e terapia ocupacional, sentar, saída do leito e deambulação, e avaliação diária de delirium. As atividades foram implementadas pela equipe de enfermagem e demais profissionais envolvidos e planejadas conforme a necessidade da criança.(1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.)

Tabela 2
Característica dos protocolos de mobilização precoce em pediatria

O segundo apresentou um programa de mobilização precoce implementado em UTI pediátrica analisando amostra de crianças e adolescentes pós-transplante hepático. Um dos elementos deste programa correspondeu ao planejamento diário pela equipe multidisciplinar das metas de mobilização para cada paciente, envolvendo exercícios de amplitude de movimento, sentar, transferência para a poltrona, ortostase e marcha. Nos pacientes em ventilação mecânica invasiva, apenas exercícios de amplitude de movimento foram considerados.(2525 Tsuboi N, Nozaki H, Ishida Y, Kanazawa I, Inamoto M, Hayashi K, et al. Early mobilization after pediatric liver transplantation. J Pediatr Intensive Care. 2017;6(3):199-205.) O terceiro estudo definiu como mobilização precoce a mobilização ativa dos pacientes em ventilação mecânica, conforme as metas de mobilidade e desenvolvimento propostas para a idade.(2626 Betters KA, Hebbar KB, Farthing D, Griego B, Easley T, Turman H, et al. Development and implementation of an early mobility program for mechanically ventilated pediatric patients. J Crit Care. 2017;41:303-8.)

A viabilidade e a segurança do videogame interativo (Nintendo Wii(tm)) em pacientes na UTI pediátrica foram avaliadas em dois estudos.(1414 Abdulsatar F, Walker RG, Timmons BW, Choong K. "Wii-Hab" in critically ill children: a pilot trial. J Pediatr Rehabil Med. 2013;6(4):193-204.,1515 Choong K, Chacon MD, Walker RG, Al-Harbi S, Clark H, Al-Mahr G, et al. In-bed mobilization in critically ill children: a safety and feasibility trial. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):225-34.) Foi realizado protocolo piloto de 2 dias de intervenção, duas vezes ao dia, durante 10 minutos ou mais.(1414 Abdulsatar F, Walker RG, Timmons BW, Choong K. "Wii-Hab" in critically ill children: a pilot trial. J Pediatr Rehabil Med. 2013;6(4):193-204.) O jogo escolhido foi Wii(tm) Boxing, que estimulava o movimento ativo dos membros superiores, requeria habilidade manual mínima e podia ser realizado no leito, no entanto, dependia da cooperação e do nível de consciência da criança. Neste estudo, 75% dos pacientes incluídos não completaram o protocolo de 2 dias de intervenção devido a excesso de sedação, transferência da UTI pediátrica ou recusa pelos pais/criança. Dos oito pacientes incluídos, quatro estavam em ventilação mecânica invasiva durante a intervenção. Posteriormente, a intervenção com Nintendo Wii(tm) foi comparada com o cicloergômetro, de acordo com o nível de consciência e habilidade cognitiva da criança.(1515 Choong K, Chacon MD, Walker RG, Al-Harbi S, Clark H, Al-Mahr G, et al. In-bed mobilization in critically ill children: a safety and feasibility trial. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):225-34.) Nos pacientes cooperativos e conscientes, a mobilização ativa foi estimulada por meio de jogos interativos com Nintendo Wii(tm) (Sport Pack e Mario Kart) e, nos pacientes não cooperativos, devido à alteração no nível de consciência por sedação e/ou idade cognitiva, utilizou-se cicloergômetro passivo de membros inferiores. O protocolo consistia em 2 dias de intervenção, com duração de 10 a 20 minutos no primeiro dia e 20 minutos no segundo dia.

O uso do cicloergômetro também foi avaliado adjunto à fisioterapia no recente ensaio clínico de Choong et al.(1818 Choong K, Awladthani S, Khawaji A, Clark H, Borhan A, Cheng J, Laskey S, Neu C, Sarti A, Thabane L, Timmons BW, Zheng K, Al-Harbi S; Canadian Critical Care Trials Group. Early exercise in critically ill youth and children, a preliminary evaluation: The wEECYCLE Pilot Trial. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(11):e546-54.) A intervenção tinha duração de 30 minutos e era realizada cinco vezes na semana. A mediana de idade dos pacientes randomizados no grupo intervenção foi de 8 anos e, no grupo controle, de 9 anos. Este estudo confirmou que a mobilização precoce é segura e viável nos pacientes pediátricos, e a mobilização com cicloergômetro pode otimizar duração e intensidade da intervenção.

Em relação aos profissionais envolvidos, quatro estudos relataram o envolvimento da equipe multiprofissional na promoção da mobilização precoce, envolvendo, além do fisioterapeuta, a equipe de enfermagem, médicos, terapeuta ocupacional e fonoaudiólogo.(1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.,1818 Choong K, Awladthani S, Khawaji A, Clark H, Borhan A, Cheng J, Laskey S, Neu C, Sarti A, Thabane L, Timmons BW, Zheng K, Al-Harbi S; Canadian Critical Care Trials Group. Early exercise in critically ill youth and children, a preliminary evaluation: The wEECYCLE Pilot Trial. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(11):e546-54.,2525 Tsuboi N, Nozaki H, Ishida Y, Kanazawa I, Inamoto M, Hayashi K, et al. Early mobilization after pediatric liver transplantation. J Pediatr Intensive Care. 2017;6(3):199-205.,2626 Betters KA, Hebbar KB, Farthing D, Griego B, Easley T, Turman H, et al. Development and implementation of an early mobility program for mechanically ventilated pediatric patients. J Crit Care. 2017;41:303-8.)

O início da mobilização precoce variou entre os estudos, acontecendo do primeiro ao 56º dia de internação. No estudo de Wieczorek et al.,(1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.) a mobilização teve início nas primeiras 72 horas de internação na UTI pediátrica, semelhante ao estudo de Choong et al.,(1818 Choong K, Awladthani S, Khawaji A, Clark H, Borhan A, Cheng J, Laskey S, Neu C, Sarti A, Thabane L, Timmons BW, Zheng K, Al-Harbi S; Canadian Critical Care Trials Group. Early exercise in critically ill youth and children, a preliminary evaluation: The wEECYCLE Pilot Trial. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(11):e546-54.) com mediana de 2 (1 - 4) dias. Nos pacientes pós-transplante hepático, 65% da amostra foi mobilizada nas primeiras 72 horas de admissão.(2525 Tsuboi N, Nozaki H, Ishida Y, Kanazawa I, Inamoto M, Hayashi K, et al. Early mobilization after pediatric liver transplantation. J Pediatr Intensive Care. 2017;6(3):199-205.) No estudo de Betters et al.,(2626 Betters KA, Hebbar KB, Farthing D, Griego B, Easley T, Turman H, et al. Development and implementation of an early mobility program for mechanically ventilated pediatric patients. J Crit Care. 2017;41:303-8.) a mobilização ocorreu independentemente do tempo de internação. Os pacientes eram avaliados nas primeiras 72 horas de admissão e diariamente reavaliados, de acordo com os critérios de elegibilidade, já que a intervenção dependia da cooperação da criança.

A segurança da mobilização precoce foi avaliada pela ocorrência de eventos adversos. A intervenção demonstrou-se segura nos seis estudos incluídos e nenhum incidente relacionado à mobilização foi registrado.

A qualidade metodológica dos estudos observacionais variou de 2 a 7 pontos. As principais limitações presentes foram o limitado tamanho amostral, a presença do desfecho de interesse no início do estudo e o tempo de seguimento dos pacientes. O único ensaio clínico randomizado incluído apresentou baixo risco de viés, assim como os estudos quase-experimentais, com total de 12 pontos. A principal limitação dos estudos foi em relação ao cegamento dos avaliadores, uma vez que o principal desfecho de interesse era a viabilidade da intervenção (Tabela 3).

Tabela 3
Avaliação do risco de viés dos estudos incluídos

DISCUSSÃO

O objetivo da presente revisão sistemática foi descrever e analisar os protocolos de mobilização precoce em terapia intensiva pediátrica. Apesar das limitadas evidências, observou-se que a intervenção é viável e segura neste contexto. De modo geral, nos protocolos analisados, as atividades são planejadas de forma individualizada e baseadas no desenvolvimento da criança. Recursos como cicloergômetro e jogos de realidade virtual também podem ser considerados nesta população.

Os estudos sobre mobilização precoce na população pediátrica são recentes. Os trabalhos incluídos nesta revisão foram publicados nos últimos 5 anos. A mobilização precoce tem sido implementada em algumas UTI pediátricas, com destaque em países como Canadá e Estados Unidos. Em 2011, em seis UTI pediátricas canadenses pesquisadas, menos de 10% dos pacientes eram mobilizados precocemente (< 48 horas) e apenas duas UTI possuíam diretriz de mobilização.(2727 Choong K, Foster G, Fraser DD, Hutchison JS, Joffe AR, Jouvet PA, Menon K, Pullenayegum E, Ward RE; Canadian Critical Care Trials Group. Acute rehabilitation practices in critically ill children: a multicenter study. Pediatr Crit Care Med. 2014;15(6):e270-9.) Em recente estudo, 77% dos pacientes admitidos em UTI pediátrica canadense foram mobilizados nas primeiras 72 horas de admissão,(1818 Choong K, Awladthani S, Khawaji A, Clark H, Borhan A, Cheng J, Laskey S, Neu C, Sarti A, Thabane L, Timmons BW, Zheng K, Al-Harbi S; Canadian Critical Care Trials Group. Early exercise in critically ill youth and children, a preliminary evaluation: The wEECYCLE Pilot Trial. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(11):e546-54.) semelhante ao estudo de Wieczorek et al.(1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.) (76%). A implementação de protocolos institucionais, como nestes recentes estudos, pode facilitar a avaliação e a identificação dos pacientes aptos, e possibilitar o início da mobilização tão logo que possível.

O programa interdisciplinar de mobilização precoce descrito por Wieczorek et al.(1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.) apresenta três níveis progressivos de mobilização, conforme variáveis clínicas e ventilatórias, e estabelece critérios objetivos em caso de necessidade de pausa/interrupção da intervenção. Programas como este são capazes de orientar a prática de mobilização nas UTI.(2828 Dubb R, Nydahl P, Hermes C, Schwabbauer N, Toonstra A, Parker AM, et al. Barriers and strategies for early mobilization of patients in intensive care units. Ann Am Thorac Soc. 2016;13(5):724-30.) Recentemente, foi publicado uma diretriz de recomendações para a prática de mobilização precoce em pacientes críticos pediátricos, elaborado por um grupo multidisciplinar com experiência na área.(2929 Choong K, Canci F, Clark H, Hopkins RO, Kudchadkar SR, Lati J, et al. Practice recommendations for early mobilization in critically ill children. J Pediatr Intensive Care. 2017;7(1):14-26.)

Considerando o uso de recursos para facilitar a mobilização precoce em pacientes críticos pediátricos, a mobilização passiva com cicloergômetro foi viável e segura na maioria dos pacientes, aumentando a movimentação dos membros inferiores.(1414 Abdulsatar F, Walker RG, Timmons BW, Choong K. "Wii-Hab" in critically ill children: a pilot trial. J Pediatr Rehabil Med. 2013;6(4):193-204.) O recente estudo publicado por Choong et al.(1818 Choong K, Awladthani S, Khawaji A, Clark H, Borhan A, Cheng J, Laskey S, Neu C, Sarti A, Thabane L, Timmons BW, Zheng K, Al-Harbi S; Canadian Critical Care Trials Group. Early exercise in critically ill youth and children, a preliminary evaluation: The wEECYCLE Pilot Trial. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(11):e546-54.) avaliou a eficácia do cicloergômetro adjunto à fisioterapia na mobilização de crianças e adolescentes − trata-se do primeiro ensaio clínico controlado randomizado nesta população. Foi possível observar que a mobilização com cicloergômetro pode ser implementada desde os primeiros dias da admissão na UTI pediátrica, 1,5 (1 - 3) dias versus 2,5 (2 - 7) dias no grupo controle. Ressalta-se que todos os pacientes eram mobilizados conforme as diretrizes institucionais de mobilização.(2929 Choong K, Canci F, Clark H, Hopkins RO, Kudchadkar SR, Lati J, et al. Practice recommendations for early mobilization in critically ill children. J Pediatr Intensive Care. 2017;7(1):14-26.)

Em relação ao videogame interativo (Nintendo Wii(tm)), o uso foi viável em apenas uma minoria de crianças na UTI pediátrica, com resultados conflitantes em relação ao nível de atividade. A movimentação dos membros superiores foi maior durante a intervenção com Wii(tm) quando comparada com o restante do dia.(1414 Abdulsatar F, Walker RG, Timmons BW, Choong K. "Wii-Hab" in critically ill children: a pilot trial. J Pediatr Rehabil Med. 2013;6(4):193-204.) No entanto, no segundo estudo analisado, não houve aumento da movimentação dos membros superiores em comparação com os 20 minutos de maior atividade do dia.(1515 Choong K, Chacon MD, Walker RG, Al-Harbi S, Clark H, Al-Mahr G, et al. In-bed mobilization in critically ill children: a safety and feasibility trial. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):225-34.) Esse fato pode ser justificado, pois os níveis de atividade com videogame são altamente variáveis, dependendo do jogo prescrito e da capacidade de compreensão e motivação da criança.(3030 Biddiss E, Irwin J. Active video games to promote physical activity in children and youth: a systematic review. Arch Pediatr Adolesc Med. 2010;164(7):664-72.)

O termo "early mobilization", ou "mobilização precoce", refere-se à reabilitação do paciente crítico iniciada imediatamente após a estabilização hemodinâmica e respiratória, podendo estar em ventilação mecânica invasiva e/ou em uso de drogas vasopressoras.(3131 Bailey P, Thomsen GE, Spuhler VJ, Blair R, Jewkes J, Bezdjian L, et al. Early activity is feasible and safe in respiratory failure patients. Crit Care Med. 2007;35(1):139-45.) O período de início da mobilização precoce variou entre os estudos analisados. Atualmente, não existe consenso para o início da intervenção. No entanto, as complicações relacionadas ao imobilismo do paciente crítico são claramente descritas na literatura. A perda de massa muscular em adultos é observada ainda na primeira semana de internação na UTI.(3232 Puthucheary ZA, Rawal J, McPhail M, Connolly B, Ratnayake G, Chan P, et al. Acute skeletal muscle wasting in critical illness. JAMA. 2013;310(15):1591-600.) Em crianças submetidas à ventilação mecânica já foi observada redução de 9,5% da espessura do músculo quadríceps femoral no quinto dia da admissão.(3333 Valla FV, Young DK, Rabilloud M, Periasami U, John M, Baudin F, et al. Thigh ultrasound monitoring identifies decreases in quadriceps femoris thickness as a frequent observation in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(8):e339-47) Isso reforça a necessidade da intervenção ser iniciada o mais breve possível, a fim de prevenir as complicações já conhecidas.

A mobilização precoce também pode reduzir a ocorrência do delirium em pacientes críticos. A padronização da sedação em pacientes pediátricos em ventilação mecânica e a implementação de um programa de mobilização precoce reduziram a prevalência média mensal em 8%.(3434 Simone S, Edwards S, Lardieri A, Walker LK, Graciano AL, Kishk OA, et al. Implementation of an ICU bundle: an interprofessional quality improvement project to enhance delirium management and monitor delirium prevalence in a single PICU. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(6):531-40.) O protocolo de mobilização instituído compreendia cinco níveis progressivos, semelhante ao proposto por Wieczorek et al.(1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.)

Dos seis trabalhos incluídos, quatro relataram o envolvimento da equipe multiprofissional no processo de implementação da mobilização precoce. Os estudos reforçam que a discussão diária e individualizada dos objetivos da intervenção com demais membros da equipe multidisciplinar é essencial para a promoção da mobilização. A otimização da sedação também deve ser discutida com a equipe, considerando a segurança e o conforto da criança.(1919 Saliski M, Kudchadkar SR. Optimizing sedation management to promote early mobilization for critically ill children. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):188-93.,3535 Green M, Marzano V, Leditschke IA, Mitchell I, Bissett B. Mobilization of intensive care patients: a multidisciplinary practical guide for clinicians. J Multidiscip Healthc. 2016;9:247-56.) Visto que as principais barreiras observadas nos estudos foram sedação excessiva, número de profissionais, carga de trabalho associada (fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais) e disponibilidade de materiais adequados, rounds e checklists podem facilitar a comunicação interprofissional e auxiliar na promoção da mobilização precoce. Além disso, a formação de grupos de trabalho e atividades de capacitação e educação da equipe assistencial são importantes para promover a cultura da mobilização precoce nas UTI pediátricas.(1616 Wieczorek B, Burke C, Al-Harbi A, Kudchadkar SR. Early mobilization in the pediatric intensive care unit: a systematic review. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):212-7.,1717 Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.)

O envolvimento e a participação da família, item "F" do ABCDEF bundle,(3636 Marra A, Ely EW, Pandharipande PP, Patel MB. The ABCDEF Bundle in Critical Care. Crit Care Clin. 2017;33(2):225-43.) também parecem ser ferramentas facilitadoras na promoção da mobilização precoce em pacientes pediátricos, oferecendo conforto, e melhorando a comunicação com a criança e a participação ativa da família no cuidado.(2020 Hopkins RO, Choong K, Zebuhr CA, Kudchadkar SR. Transforming PICU culture to facilitate early rehabilitation. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):204-11.,2626 Betters KA, Hebbar KB, Farthing D, Griego B, Easley T, Turman H, et al. Development and implementation of an early mobility program for mechanically ventilated pediatric patients. J Crit Care. 2017;41:303-8.)

Os estudos incluídos nesta revisão sistemática são metodologicamente heterogêneos e apresentaram ampla variabilidade em relação à população estuda. Os motivos primários de admissão na UTI pediátrica envolveram diversas condições clínicas e faixa etária ampla. A idade dos pacientes nas UTI pediátricas pode variar de 29 dias a 14 ou 18 anos, conforme as rotinas hospitalares. Espera-se que crianças mais velhas sejam mais aptas à mobilização precoce, devido à maturidade cognitiva e funcional e à tolerância a menores níveis de sedação.(3737 Cameron S, Ball I, Cepinskas G, Choong K, Doherty TJ, Ellis CG, et al. Early mobilization in the critical care unit: A review of adult and pediatric literature. J Crit Care. 2015;30(4):664-72.) Adicionalmente, deve-se considerar a prevalência de crianças admitidas nas UTI pediátricas com condições crônicas complexas (83,9%);(3838 Fonseca JG, Ferreira AR. [Application of the Pediatric Index of Mortality 2 in pediatric patients with complex chronic conditions]. J Pediatr (Rio J). 2014;90(5):506-11. Portuguese.) em um dos estudos incluídos, 70% dos pacientes apresentavam condição crônica preexistente,(1818 Choong K, Awladthani S, Khawaji A, Clark H, Borhan A, Cheng J, Laskey S, Neu C, Sarti A, Thabane L, Timmons BW, Zheng K, Al-Harbi S; Canadian Critical Care Trials Group. Early exercise in critically ill youth and children, a preliminary evaluation: The wEECYCLE Pilot Trial. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(11):e546-54.) o que pode dificultar a prática da mobilização.

As publicações disponíveis sobre a mobilização precoce em pediatria limitam-se a estudos com Nível de Evidência 2 (Oxford Centre of Evidence-Based Medicine), enquanto que, em adultos, há evidências Nível 1 sobre a eficácia da mobilização do paciente crítico na recuperação funcional.(2929 Choong K, Canci F, Clark H, Hopkins RO, Kudchadkar SR, Lati J, et al. Practice recommendations for early mobilization in critically ill children. J Pediatr Intensive Care. 2017;7(1):14-26.) Nesta revisão, foram incluídos estudos observacionais, quase-experimentais, e apenas um ensaio clínico randomizado foi identificado. Foram localizados dois ensaios clínicos em andamento registrados no ClinicalTrials.gov (NCT02958124) (NCT02209935).

Limitações

Apesar da presente revisão ter seguido rigorosamente as recomendações do PRISMA e ter compreendido ampla busca, a fim de identificar todos os estudos publicados, limitações devem ser consideradas. Primeiramente, devido à escassez de estudos de intervenção, também foram incluídos estudos observacionais e ensaios clínicos não randomizados ou quase-experimentais. Outro ponto importante foi que as intervenções poderiam variar de acordo com o desenvolvimento e a capacidade de cooperação da criança, o que pode influenciar nos desfechos e comprometer as comparações. Por fim, além das diferenças metodológicas, destacam-se o pequeno número de estudos publicados e o tamanho amostral, o que sugere a necessidade de novos estudos com maior número de pacientes, tempo de seguimento adequado e maior rigor metodológico.

CONCLUSÃO

Os protocolos de mobilização precoce são baseados em intervenções individualizadas, planejadas conforme o desenvolvimento da criança. O uso do cicloergômetro como recurso para mobilização pode aumentar a movimentação das crianças e adolescentes na unidade de terapia intensiva pediátrica, enquanto a viabilidade do uso do videogame interativo é limitada nesta população, devido à capacidade de cooperação. Apesar das evidências disponíveis até o momento e do baixo rigor metodológico dos artigos incluídos, a implementação de protocolos multiprofissionais parece ser ferramenta viável para a promoção da mobilização precoce em terapia intensiva pediátrica. No entanto, são necessários novos estudos, com protocolos de intervenção padronizados e ensaios clínicos randomizados, para avaliar a eficácia da mobilização precoce nesta população.

  • Registrado no banco de dados PROSPERO - CRD42017068238.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Bone MF, Feinglass JM, Goodman DM. Risk factors for acquiring functional and cognitive disabilities during admission to a PICU*. Pediatr Crit Care Med. 2014;15(7):640-8.
  • 2
    Namachivayam P, Shann F, Shekerdemian L, Taylor A, van Sloten I, Delzoppo C, et al. Three decades of pediatric intensive care: Who was admitted, what happened in intensive care, and what happened afterward. Pediatr Crit Care Med. 2010;11(5):549-55.
  • 3
    Rennick JE, Childerhose JE. Redefining success in the PICU: new patient populations shift targets of care. Pediatrics. 2015;135(2):e289-91.
  • 4
    Pereira GA, Schaan CW, Ferrari RS. Functional evaluation of pediatric patients after discharge from the intensive care unit using the Functional Status Scale. Rev Bras Ter Intensiva. 2017;29(4):460-5
  • 5
    Zorowitz RD. ICU-acquired weakness: a rehabilitation perspective of diagnosis, treatment, and functional management. Chest. 2016;150(4):966-71.
  • 6
    Herrup EA, Wieczorek B, Kudchadkar SR. Characteristics of postintensive care syndrome in survivors of pediatric critical illness: A systematic review. World J Crit Care Med. 2017;6(2):124-34.
  • 7
    De Jonghe B, Bastuji-Garin S, Sharshar T, Outin H, Brochard L. Does ICU-acquired paresis lengthen weaning from mechanical ventilation? Intensive Care Med. 2004;30(6):1117-21.
  • 8
    Gosselink R, Bott J, Johnson M, Dean E, Nava S, Norrenberg M, et al. Physiotherapy for adult patients with critical illness: recommendations of the European Respiratory Society and European Society of Intensive Care Medicine Task Force on Physiotherapy for Critically Ill Patients. Intensive Care Med. 2008;34(7):1188-99.
  • 9
    Stiller K. Physiotherapy in intensive care: an updated systematic review. Chest. 2013;144(3):825-47.
  • 10
    Bemis-Dougherty AR, Smith JM. What follows survival of critical illness? Physical therapists' management of patients with post-intensive care syndrome. Phys Ther. 2013;93(2):179-85.
  • 11
    Davidson JE, Harvey MA, Bemis-Dougherty A, Smith JM, Hopkins RO. Implementation of the Pain, Agitation, and Delirium Clinical Practice Guidelines and promoting patient mobility to prevent post-intensive care syndrome. Crit Care Med. 2013;41(9 Suppl 1):S136-45.
  • 12
    Dantas CM, Silva PF, Siqueira FH, Pinto RM, Matias S, Maciel C, et al. Influence of early mobilization on respiratory and peripheral muscle strength in critically ill patients. Rev Bras Ter Intensiva. 2012;24(2):173-8.
  • 13
    Tipping CJ, Harrold M, Holland A, Romero L, Nisbet T, Hodgson CL. The effects of active mobilisation and rehabilitation in ICU on mortality and function: a systematic review. Intensive Care Med. 2017;43(2):171-83.
  • 14
    Abdulsatar F, Walker RG, Timmons BW, Choong K. "Wii-Hab" in critically ill children: a pilot trial. J Pediatr Rehabil Med. 2013;6(4):193-204.
  • 15
    Choong K, Chacon MD, Walker RG, Al-Harbi S, Clark H, Al-Mahr G, et al. In-bed mobilization in critically ill children: a safety and feasibility trial. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):225-34.
  • 16
    Wieczorek B, Burke C, Al-Harbi A, Kudchadkar SR. Early mobilization in the pediatric intensive care unit: a systematic review. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):212-7.
  • 17
    Wieczorek B, Ascenzi J, Kim Y, Lenker H, Potter C, Shata NJ, et al. PICU Up!: Impact of a quality improvement intervention to promote early mobilization in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2016;17(12):e559-66.
  • 18
    Choong K, Awladthani S, Khawaji A, Clark H, Borhan A, Cheng J, Laskey S, Neu C, Sarti A, Thabane L, Timmons BW, Zheng K, Al-Harbi S; Canadian Critical Care Trials Group. Early exercise in critically ill youth and children, a preliminary evaluation: The wEECYCLE Pilot Trial. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(11):e546-54.
  • 19
    Saliski M, Kudchadkar SR. Optimizing sedation management to promote early mobilization for critically ill children. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):188-93.
  • 20
    Hopkins RO, Choong K, Zebuhr CA, Kudchadkar SR. Transforming PICU culture to facilitate early rehabilitation. J Pediatr Intensive Care. 2015;4(4):204-11.
  • 21
    Moher D, Shamseer L, Clarke M, Ghersi D, Liberati A, Petticrew M, Shekelle P, Stewart LA; PRISMA-P Group. Preferred reporting items for systematic review and meta-analysis protocols (PRISMA-P) 2015 statement. Syst Rev. 2015;4:1
  • 22
    Wells GA, Shea B, O'Connell D, Peterson D, Welch V, Losos M, et al. The Newcastle-Ottawa Scale (NOS) for assessing the quality of nonrandomised studies in meta-analyses. 2014 [internet]. Available from: http://www.ohri.ca/programs/clinical_epidemiology/oxford.asp
    » http://www.ohri.ca/programs/clinical_epidemiology/oxford.asp
  • 23
    Higgins JP, Green S, editors. Cochrane handbook for systematic reviews of interventions. New Jersey: Wiley Online Library; 2008.
  • 24
    Slim K, Nini E, Forestier D, Kwiatkowski F, Panis Y, Chipponi J. Methodological index for non-randomized studies (minors): development and validation of a new instrument. ANZ J Surg. 2003;73(9):712-6.
  • 25
    Tsuboi N, Nozaki H, Ishida Y, Kanazawa I, Inamoto M, Hayashi K, et al. Early mobilization after pediatric liver transplantation. J Pediatr Intensive Care. 2017;6(3):199-205.
  • 26
    Betters KA, Hebbar KB, Farthing D, Griego B, Easley T, Turman H, et al. Development and implementation of an early mobility program for mechanically ventilated pediatric patients. J Crit Care. 2017;41:303-8.
  • 27
    Choong K, Foster G, Fraser DD, Hutchison JS, Joffe AR, Jouvet PA, Menon K, Pullenayegum E, Ward RE; Canadian Critical Care Trials Group. Acute rehabilitation practices in critically ill children: a multicenter study. Pediatr Crit Care Med. 2014;15(6):e270-9.
  • 28
    Dubb R, Nydahl P, Hermes C, Schwabbauer N, Toonstra A, Parker AM, et al. Barriers and strategies for early mobilization of patients in intensive care units. Ann Am Thorac Soc. 2016;13(5):724-30.
  • 29
    Choong K, Canci F, Clark H, Hopkins RO, Kudchadkar SR, Lati J, et al. Practice recommendations for early mobilization in critically ill children. J Pediatr Intensive Care. 2017;7(1):14-26.
  • 30
    Biddiss E, Irwin J. Active video games to promote physical activity in children and youth: a systematic review. Arch Pediatr Adolesc Med. 2010;164(7):664-72.
  • 31
    Bailey P, Thomsen GE, Spuhler VJ, Blair R, Jewkes J, Bezdjian L, et al. Early activity is feasible and safe in respiratory failure patients. Crit Care Med. 2007;35(1):139-45.
  • 32
    Puthucheary ZA, Rawal J, McPhail M, Connolly B, Ratnayake G, Chan P, et al. Acute skeletal muscle wasting in critical illness. JAMA. 2013;310(15):1591-600.
  • 33
    Valla FV, Young DK, Rabilloud M, Periasami U, John M, Baudin F, et al. Thigh ultrasound monitoring identifies decreases in quadriceps femoris thickness as a frequent observation in critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(8):e339-47
  • 34
    Simone S, Edwards S, Lardieri A, Walker LK, Graciano AL, Kishk OA, et al. Implementation of an ICU bundle: an interprofessional quality improvement project to enhance delirium management and monitor delirium prevalence in a single PICU. Pediatr Crit Care Med. 2017;18(6):531-40.
  • 35
    Green M, Marzano V, Leditschke IA, Mitchell I, Bissett B. Mobilization of intensive care patients: a multidisciplinary practical guide for clinicians. J Multidiscip Healthc. 2016;9:247-56.
  • 36
    Marra A, Ely EW, Pandharipande PP, Patel MB. The ABCDEF Bundle in Critical Care. Crit Care Clin. 2017;33(2):225-43.
  • 37
    Cameron S, Ball I, Cepinskas G, Choong K, Doherty TJ, Ellis CG, et al. Early mobilization in the critical care unit: A review of adult and pediatric literature. J Crit Care. 2015;30(4):664-72.
  • 38
    Fonseca JG, Ferreira AR. [Application of the Pediatric Index of Mortality 2 in pediatric patients with complex chronic conditions]. J Pediatr (Rio J). 2014;90(5):506-11. Portuguese.

Apêndice

Apêndice A
Estratégia de busca utilizada no PubMed®

Editado por

Editor responsável: Gilberto Friedman

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jun 2019
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2019

Histórico

  • Recebido
    19 Jul 2018
  • Aceito
    01 Nov 2018
Associação de Medicina Intensiva Brasileira - AMIB Rua Arminda, 93 - Vila Olímpia, CEP 04545-100 - São Paulo - SP - Brasil, Tel.: (11) 5089-2642 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbti.artigos@amib.com.br