Prezado Editor,
Os horários flexíveis de visitação na unidade de terapia intensiva (UTI) vem se tornando cada vez mais reconhecidos como forma de melhorar os cuidados centrados no paciente e seus familiares.(11 Gerritsen RT, Hartog CS, Curtis JR. New developments in the provision of family-centered care in the intensive care unit. Intensive Care Med. 2017;43(4):550-3.,22 Giannini A, Garrouste-Orgeas M, Latour JM. What's new in ICU visiting policies: can we continue to keep the doors closed? Intensive Care Med. 2014;40(5):730-3.) Além de ser procedimento seguro e associado com melhores desfechos relacionados ao paciente e à família,(33 Westphal GA, Moerschberger MS, Vollmann DD, Inácio AC, Machado MC, Sperotto G, et al. Effect of a 24-h extended visiting policy on delirium in critically ill patients. Intensive Care Med. 2018;44(6):968-70.,44 Nassar Junior AP, Besen BA, Robinson CC, Falavigna M, Teixeira C, Rosa RG. Flexible versus restrictive visiting policies in ICUs: a systematic review and meta-analysis. Crit Care Med. 2018;46(7):1175-80.) horários flexíveis de visitação são parte importante de uma abordagem de reconhecimento e respeito pelo relacionamento familiar durante a evolução da doença crítica.(11 Gerritsen RT, Hartog CS, Curtis JR. New developments in the provision of family-centered care in the intensive care unit. Intensive Care Med. 2017;43(4):550-3.,22 Giannini A, Garrouste-Orgeas M, Latour JM. What's new in ICU visiting policies: can we continue to keep the doors closed? Intensive Care Med. 2014;40(5):730-3.) Nesse contexto, é essencial ter o conhecimento das características dos visitantes, com o fim de determinar a melhor forma de lhes proporcionar apoio e promover a sustentabilidade dos modelos de visitação flexível (MVFs). Particularmente a avaliação das diferenças entre os sexos dos visitantes é necessária, já que fatores específicos relativos a esse aspecto podem influenciar na demanda de estratégias adaptadas de comunicação, compartilhamento do processo de tomada de decisão e prevenção do ônus psicológico. Por esta razão, conduzimos este estudo, para investigar a existência de uma desproporção em termos de sexo dos parentes que visitam pacientes adultos em condição crítica mediante um MVF.
Conduzimos ensaio transversal em uma única UTI clínico-cirúrgica com 48 leitos, pertencente a um hospital terciário localizado na Região Sul do país, entre janeiro e outubro de 2018. Durante este período, permitiu-se aos parentes próximos realizar visitas a pacientes críticos por até 12 horas ao dia. Para poder tomar parte no MVF, os visitantes precisavam participar de uma reunião educacional com o intuito de ajudá-los a compreender aspectos estruturais e organizacionais da terapia intensiva (Tabela 1). Incluíram-se nesta análise todos os membros da família que consecutivamente concordaram em tomar parte do MVF e participaram da reunião educacional durante o período do estudo. O protocolo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital Moinhos de Vento. Dentre os 1.610 familiares avaliados, 1.148 (71%) eram do sexo feminino. Em todas as categorias de parentesco, a frequência de visitas de mulheres foi maior que a de homens (Figura 1).
Distribuição dos familiares visitantes na unidade de terapia intensiva segundo o sexo e o tipo de parentesco.
Os dados mostram o número de visitantes. A categoria "outros" inclui familiares com outros tipos de parentesco (por exemplo: avós, netos, tios, primos, padrasto/madrasta, enteado/enteada). Utilizou-se o teste qui quadrado de qualidade do ajuste para determinar se a distribuição de frequência dos sexos em cada uma das categorias de parentesco seguia a hipótese de proporção masculino:feminino de 1:1.
Esta maior proporção de mulheres entre visitantes à UTI pode ser explicada por um conjunto de fatores sociais, culturais e psicológicos. Em primeiro lugar, é frequente que se espere que as mulheres cuidem dos familiares enfermos. Coerentemente, as circunstâncias sociais e culturais específicas em que vivem mulheres e homens, desde a infância até a idade adulta, podem levar a reações distintas, com relação aos deveres de cuidar. Em segundo lugar, existe desigualdade entre os sexos, no que se refere ao mercado de trabalho, o que pode contribuir para maior pressão social sobre as mulheres para que assumam o papel de visitantes na UTI; como é menos provável que as mulheres tenham trabalho fora de casa, estariam mais disponíveis para visitas à UTI. Em terceiro lugar, há diferenças entre os sexos com relação à forma de lidar com o estresse, o que pode influenciar na forma como mulheres e homens enfrentam a doença crítica de seus entes queridos. Enquanto mulheres tendem a ter formas mais emotivas de lidar com estas questões (e também sofrerem maior estresse emocional), os homens, em geral, tendem a ter estilos mais racionais e ser mais desapegados.(55 Matud MP. Gender differences in stress and coping styles. Pers Individ Dif. 2004;37(7):1401-15.) Estas diferenças podem ter contribuído para esta predominância de mulheres entre visitantes à UTI.
Em conclusão, nossos resultados demonstraram diferença entre os sexos dos visitantes nos horários flexíveis de visitação à UTI, tendo as mulheres assumido predominantemente o papel de visitantes familiares. Este achado chama a atenção para a importância de melhorar as estratégias de suporte com foco na mulher para visitantes nas UTIs nos horários flexíveis de visitação.
AGRADECIMENTOS
Aos participantes e investigadores, por seu comprometimento com este estudo.
REFERÊNCIAS
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1Gerritsen RT, Hartog CS, Curtis JR. New developments in the provision of family-centered care in the intensive care unit. Intensive Care Med. 2017;43(4):550-3.
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2Giannini A, Garrouste-Orgeas M, Latour JM. What's new in ICU visiting policies: can we continue to keep the doors closed? Intensive Care Med. 2014;40(5):730-3.
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3Westphal GA, Moerschberger MS, Vollmann DD, Inácio AC, Machado MC, Sperotto G, et al. Effect of a 24-h extended visiting policy on delirium in critically ill patients. Intensive Care Med. 2018;44(6):968-70.
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4Nassar Junior AP, Besen BA, Robinson CC, Falavigna M, Teixeira C, Rosa RG. Flexible versus restrictive visiting policies in ICUs: a systematic review and meta-analysis. Crit Care Med. 2018;46(7):1175-80.
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5Matud MP. Gender differences in stress and coping styles. Pers Individ Dif. 2004;37(7):1401-15.
Editado por
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
20 Jan 2020 -
Data do Fascículo
Oct-Dec 2019
Histórico
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Recebido
26 Jan 2019 -
Aceito
18 Fev 2019