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A profundidade do tubo orotraqueal em crianças predita por fórmulas apresenta boa concordância com o posicionamento verificado pela radiografia?

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a efetividade dos diferentes métodos que estimam a profundidade de inserção do tubo orotraqueal em crianças.

Métodos:

Estudo observacional e transversal, no qual foram incluídas crianças entre 29 dias e 2 anos, internadas em uma unidade de terapia intensiva pediátrica e ventiladas mecanicamente. Foram avaliadas as fórmulas baseadas na altura [(altura/10) + 5], no diâmetro interno do tubo (tubo orotraqueal × 3) e peso (peso + 6), verificando-se qual delas apresentou melhor concordância com a profundidade ideal de inserção do tubo orotraqueal avaliado por radiografia.

Resultados:

A correlação entre a fórmula da altura e a profundidade ideal observada no raio X foi forte, com r = 0,88, p < 0,05 e o coeficiente de correlação de concordância de 0,88; a correlação do peso com a profundidade no raio X foi de r = 0,75, p < 0,05 e coeficiente de correlação de concordância de 0,43; e a fórmula do tubo orotraqueal × profundidade no raio X foi de r = 0,80, p < 0,05 e coeficiente de correlação de concordância de 0,78. A análise de concordância de Lin mostrou que as medidas apresentaram concordância fraca (< 0,90).

Conclusão:

As fórmulas que estimam a profundidade de inserção do tubo orotraqueal em crianças apresentaram-se pouco precisas e discordantes com o método padrão-ouro de avaliação pelo raio X, com necessidade da criação de um novo método, baseado nas variáveis antropométricas (peso e altura) e na idade, que seja eficaz para guiar os profissionais de saúde das unidades de terapia intensiva pediátricas, no momento da intubação.

Descritores:
Intubação intratraqueal; Criança; Lactente; Tórax/diagnóstico por imagem; Unidades de terapia intensiva pediátrica

ABSTRACT

Objective:

To evaluate the effectiveness of the different formulas for estimating the insertion depth of an endotracheal tube in children.

Methods:

This was an observational and cross-sectional study that included children between 29 days and 2 years of age who were hospitalized in a pediatric intensive care unit and mechanically ventilated. The formulas based on height [(height/10) + 5], the inner diameter of the tube (endotracheal tube × 3), and weight (weight + 6) were evaluated to determine which of them showed better concordance with the ideal insertion depth of the endotracheal tube as evaluated by X-ray.

Results:

The correlation between the height-based calculation and the ideal depth observed on X-ray was strong, with r = 0.88, p < 0.05, and a concordance correlation coefficient of 0.88; the correlation between the weight-based calculation and depth on X-ray was r = 0.75, p < 0.05, and concordance correlation coefficient 0.43; and the correlation between endotracheal tube diameter-based calculation and depth on X-ray was r = 0.80, p < 0.05, and concordance correlation coefficient 0.78. Lin’s concordance correlation analysis indicated that the measurements showed weak concordance (< 0.90).

Conclusion:

The formulas that estimate the insertion depth of the endotracheal tube in children were not accurate and were discordant with the gold-standard method of X-ray evaluation. There is a need for a new method based on anthropometric variables (weight and height) and age that is effective in guiding health professionals of pediatric intensive care units at the time of intubation.

Keywords:
Intubation, intratracheal; Child; Infant; Thorax/imaging diagnosis; Intensive care units, pediatric

INTRODUÇÃO

O tamanho apropriado e, sobretudo, a profundidade de inserção de um tubo orotraqueal (TOT) devem ser precisamente determinados para pacientes pediátricos, uma vez que tanto a intubação profunda quanto a superficial podem resultar em complicações.(11 Lee SU, Jung JY, Kim DK, Kwak YH, Kwon H, Cho JH, et al. New decision formulas for predicting endotracheal tube depth in children: analysis of neck CT images. Emerg Med J. 2018;35(5):303-8.)

Para o cálculo da profundidade de inserção do TOT em crianças, são indicados diversos métodos e fórmulas. As fórmulas mais comumente utilizadas baseiam-se no diâmetro do TOT, multiplicando-o por 3 (TOT × 3); na altura, calculando [(altura/10) + 5]; e. no peso, adicionando-se a constante numérica 6 ao mesmo.(22 Phipps LM, Thomas NJ, Gilmore RK, Raymond JA, Bittner TR, Orr RA, et al. Prospective assessment of guidelines for determining appropriate depth of endotracheal tube placement in children. Pediatr Crit Care Med. 2005;6(5):519-22.

3 Tochen ML. Orotracheal intubation in the newborn infant: a method for determining depth of tube insertion. J Pediatr. 1979;95(6):1050-1.
-44 Morgan GA, Steward DJ. Linear airway dimensions in children: including those from cleft palate. Can Anaesth Soc J. 1982;29(1):1-8.)

Nas crianças, a traqueia é curta, e a extensão ou flexão do pescoço pode causar deslocamento do TOT, com consequente extubação acidental ou intubação seletiva. Idealmente, uma posição do tubo no meio da traqueia permitiria uma margem de segurança durante o movimento da cabeça e do pescoço. A ponta do TOT deve aparecer entre a primeira vértebra torácica (T1) e a carina.(55 Miller KA, Kimia A, Monuteaux MC, Nagler J. Factors associated with misplaced endotracheal tubes during intubation in pediatric patients. J Emerg Med. 2016;51(1):9-18.,66 Ugalde P, Miro S, Fréchette E, Deslauriers J. Correlative anatomy for thoracic inlet; glottis and subglottis; trachea, carina, and main bronchi; lobes, fissures, and segments; hilum and pulmonary vascular system; bronchial arteries and lymphatics. Thorac Surg Clin. 2007;17(4):639-59.)

O mau posicionamento do TOT e a profundidade do tubo são associados com diversas possíveis complicações, incluindo hipoxemia, atelectasia, intubação seletiva, barotrauma, pneumotórax, ventilação insuficiente, lesão de cordas vocais, síndrome do escape de ar, extubação acidental e até mesmo a morte. Esse posicionamento inadequado do tubo é uma ocorrência comum na população neonatal e pediátrica. Alguns autores relatam incidência de 35 - 50% de pacientes com idade menor que 1 ano. Nas emergências pediátricas, cerca de 30% das intubações são realizadas com a colocação inadequada do tubo. Nas unidades de terapia intensiva (UTI) pediátrica, essa porcentagem é de 13%. Para confirmação da posição correta do TOT, a radiografia de tórax continua sendo o padrão-ouro.(11 Lee SU, Jung JY, Kim DK, Kwak YH, Kwon H, Cho JH, et al. New decision formulas for predicting endotracheal tube depth in children: analysis of neck CT images. Emerg Med J. 2018;35(5):303-8.,77 Koshy T, Misra S, Chatterjee N, Dharan BS. Accuracy of a chest X-ray-based method for predicting the depth of insertion of endotracheal tubes in pediatric patients undergoing cardiac surgery. J Cardiothorac Vasc Anesth. 2016;30(4):947-53.,88 Chowdhry R, Dangman B, Pinheiro JM. The concordance of ultrasound technique versus X-ray to confirm endotracheal tube position in neonates. J Perinatol. 2015;35(7):481-4.)

As complicações mais comuns associadas à intubação traqueal na pediatria são intubação traqueal seletiva (31,1%), extubação acidental (25,6%) e hipóxia (41,1%), quando se considera idade menor que 2 anos.(99 Principi T, Fraser DD, Morrison GC, Farsi SA, Carrelas JF, Maurice EA, et al. Complications of mechanical ventilation in the pediatric population. Pediatr Pulmonol. 2011;46(5):452-7.

10 Jin-Hee K, Ro YJ, Seong-Won M, Chong-Soo K, Seong-Deok K, Lee JH, et al. Elongation of the trachea during neck extension in children: implications of the safety of endotracheal tubes. Anesth Analg. 2005;101(4):974-7, table of contents.
-1111 Song IK, Kim SH, Ryu J, Lee E, Oh HM, Kim EH, et al. Prediction of the midtracheal level based on external anatomical landmarks: implication of the optimal insertion depth of endotracheal tubes in pediatric patients. Paediatr Anaesth. 2016;26(12):1142-7.)) A atelectasia também já foi documentada como a mais frequente das complicações, ocorrendo em 36% dos casos, com incidência em 12% dos menores de 1 ano.(99 Principi T, Fraser DD, Morrison GC, Farsi SA, Carrelas JF, Maurice EA, et al. Complications of mechanical ventilation in the pediatric population. Pediatr Pulmonol. 2011;46(5):452-7.)

Nesse sentido, a identificação de uma fórmula que estime precisamente a profundidade ideal do TOT no momento da intubação em pediatria torna-se primordial para prevenção dessas complicações.(99 Principi T, Fraser DD, Morrison GC, Farsi SA, Carrelas JF, Maurice EA, et al. Complications of mechanical ventilation in the pediatric population. Pediatr Pulmonol. 2011;46(5):452-7.) Atualmente, existem diversas fórmulas que podem ser utilizadas, sem que haja, porém, um consenso sobre qual delas se aproxima mais do melhor método.

O objetivo deste estudo foi verificar, a partir das fórmulas mais utilizadas na prática, qual ou quais delas apresentam maior concordância na predição da profundidade ideal do TOT em relação ao posicionamento na radiografia.

MÉTODOS

Realizou-se estudo observacional, transversal, cujo período de coleta se deu de setembro de 2017 a janeiro de 2018. Por conveniência, foram incluídos lactentes (29 dias a 2 anos) que estivessem em ventilação mecânica com TOT na UTI pediátrica do Hospital das Clínicas Gaspar Vianna. O referido hospital é referência em cardiologia. A UTI pediátrica em questão possuía dez leitos, sendo um leito de isolamento, e sua demanda era predominantemente de crianças com cardiopatias congênitas. Foram excluídos os pacientes com desvio de coluna vertebral, com malformações de vias aéreas (laringe, traqueia e brônquios) e deformidades de membros inferiores. O protocolo foi aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Pará, com parecer 2.248.923, e do Hospital das Clínicas Gaspar Vianna, com parecer 2.311.338. A figura 1 expõe um fluxograma com a sequência das avaliações.

Figura 1
Fluxograma. UTI - unidade de terapia intensiva; MMII - membros inferiores; VAS - vias aéreas superiores; TOT - tubo orotraqueal; LS - Lábio superior.

Coletaram-se idade, peso, estatura, diâmetro e profundidade do TOT, além de sexo. A idade, o peso e o sexo foram verificados pelos prontuários. A estatura da criança foi medida por uma fita métrica, tendo como referências o calcâneo e o ápice do crânio na posição de decúbito dorsal, com o leito totalmente na horizontal.

Verificou-se a profundidade do TOT em centímetros, considerando como referência o lábio superior da criança. Posteriormente, foi avaliada a radiografia de tórax no negatoscópio. Para que a radiografia fosse considerada adequada, as extremidades mediais das clavículas precisavam estar equidistantes dos processos espinhosos vertebrais, e a carina devia estar perfeitamente visível. A altura ideal foi obtida pela identificação do ponto médio localizado entre a primeira vértebra torácica (T1) e a carina, com utilização de régua simples de 30cm. Também foi obtida pela radiografia a distância em centímetros entre a altura ideal e a posição em que se encontrava a ponta do TOT. A mensuração da altura da criança, a identificação da profundidade de inserção do TOT no leito e a obtenção da altura ideal e da diferença entre altura real e ideal pela radiografia do tórax foram realizadas pelo mesmo profissional.

Para o propósito de nosso estudo, definimos, a priori, a posição médio-traqueal como espaço entre a primeira vértebra torácica (T1) e a carina.(55 Miller KA, Kimia A, Monuteaux MC, Nagler J. Factors associated with misplaced endotracheal tubes during intubation in pediatric patients. J Emerg Med. 2016;51(1):9-18.)

Uma tabela foi alimentada com os referidos dados, incluindo os valores obtidos pelo cálculo das três fórmulas do estudo: número do TOT (diâmetro em milímetros) × 3; altura da criança (em centímetros)/10 + 5 e peso da criança (em quilogramas) + 6.

Posteriormente, a análise desses dados visou estabelecer a eficácia de cada fórmula pela proximidade do valor obtido com a altura ideal identificada na radiografia.

Análise estatística e cálculo amostral

A análise dos dados foi realizada por meio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 23.0 e MedCalc. Os dados foram armazenados em planilha no Microsoft Excel® 2013, e cada participante recebeu um código para garantir seu anonimato. O teste de normalidade Shapiro-Wilk foi aplicado para analisar as variáveis contínuas. Aquelas que apresentaram curva normal foram analisadas pelo teste de correlação de Pearson. Foram definidos para análise de correlação linear (r) = 0, força nula; r > 0 até 0,3, força fraca; r > 0,3 até 0,6, força regular; r > 0,6 até 0,9, força forte; r > 0,9 até 1, força muito forte e r = 1, força perfeita. Após essa análise de correlação, as significantes foram analisadas por um teste de regressão linear, para verificar o grau de interferência das variáveis na profundidade ideal.

Os dados categóricos foram analisados por meio do teste Q de Cochran. A diferença significativa foi definida quando valor de p < 5%, utilizando-se também o teste de coeficiente de correlação de concordância (CCC) de Lin. Para essa análise, foram definidos: CCC < 0,90, - fraco; 0,90 - 0,95, moderado; 0,95- 0,99, forte/substancial e > 0,99 perfeito. Para a análise gráfica, foi utilizado o gráfico de Bland-Altman. O cálculo amostral foi realizado a partir da análise de correlação do comprimento da traqueia com o peso do paciente.(1111 Song IK, Kim SH, Ryu J, Lee E, Oh HM, Kim EH, et al. Prediction of the midtracheal level based on external anatomical landmarks: implication of the optimal insertion depth of endotracheal tubes in pediatric patients. Paediatr Anaesth. 2016;26(12):1142-7.) Tal correlação foi r = 0,82, com p < 0,05. Considerando erro beta de 0,1 e alfa de 5%, power de 90%, bicaudal, a amostra deveria ser de, pelo menos, 15 crianças. Optamos por coletar um número maior, devido a eventuais perdas que pudessem ocorrer. Consideramos o peso, ao invés da altura e da idade, por aquele ter tido a menor correlação, e estas tiveram, respectivamente, correlações com comprimento da traqueia de 0,9 e 0,86. Logo, o número de indivíduos avaliados cobre também esses desfechos.

RESULTADOS

Foram avaliadas 30 crianças com idade de 1 mês a 2 anos, internadas na UTI pediátrica do Hospital das Clínicas Gaspar Vianna. Todas tinham diagnóstico de cardiopatia congênita, sendo 16 (53,3%) do sexo masculino. Suas características são demonstradas na tabela 1. Todas as radiografias de tórax foram consideradas adequadas pela simetria e possibilidade de visualização da carina.

Tabela 1
Características da amostra

A fórmula da altura foi a que mais vezes se aproximou do ponto ideal observado no raio X, em 13/30 (43,3%) das crianças, sendo o percentual da fórmula do TOT em 11/30 (36,7%) e a do peso em 9/30 (30%). Ao analisar a diferença de 0,1cm em relação à posição ideal para verificar a prevalência de intubações inadequadas, verificou-se que 86,7% das intubações foram inadequadas; com diferença de 0,3cm, foram 76,7% das intubações, e com 0,5cm, 63,3% das intubações (Figura 2).

Figura 2
Prevalência de intubações inadequadas.

O teste Q de Cochran evidenciou que não houve diferença estatisticamente significativa entre as fórmulas (p = 0,66), apresentando proporção semelhante no número de vezes que as mesmas estiveram próximas da posição ideal para intubação orotraqueal em pediatria.

A fórmula da altura com a profundidade ideal observada no raio X apresentou correlação forte, com r = 0,88, p < 0,05 e CCC = 0,88; a correlação do peso com a profundidade no raio X também foi forte com r = 0,75, p < 0,05 e CCC = 0,43; e a fórmula TOT com a profundidade no raio X obteve r = 0,80, p < 0,05 e CCC = 0,78. A análise de concordância de Lin mostrou que as medidas apresentaram concordância fraca < 0,90. A medida que mais se aproximou da moderada foi a fórmula da altura. Analisando os gráficos de Bland-Altman, a figura 3B, que representa a fórmula da altura, mostra erro padrão de 0,2 e desvio de 2,6 a 3. Essa foi a fórmula com menor erro padrão comparada às demais, porém o desvio foi muito grande ao redor desse erro. A figura 3D, da fórmula do peso, expõe a medida com maior erro (1,6) e menor desvio (1,96). A figura 3F, da medida pela fórmula do TOT, demonstra erro padrão de 0,2, mas com desvio de 3,2 a 3,6. As três fórmulas apresentaram correlações moderadas a fortes, mas foram discordantes pela análise de Bland-Altman (Figura 3).

Figura 3
Gráficos de correlação e concordância. (A) Correlação da fórmula altura × profundidade no raio X, r = 0,89 e p < 0,05; (B) Bland-Altman. Fórmula da altura × profundidade no raio X; (C) correlação da fórmula do peso × profundidade no raio X, r = 0,75 e p < 0,05; (D) Bland-Altman. Fórmula do peso × profundidade no raio X; (E) Correlação da fórmula tubo orotraqueal × profundidade no raio X, r = 0,80 e p < 0,05; (F) Bland-Altman fórmula tubo orotraqueal × profundidade no raio X.

Após as análises de correlação, foi aplicada a regressão linear, tendo sido verificadas as possíveis relações entre a profundidade e as variáveis peso, altura e diâmetro do tubo. Em relação ao peso (r = 0,69; p < 0,001; R2 = 0,47), houve correlação positiva e altamente significativa, com 47% da variação na profundidade ideal sendo explicada pelo peso. A altura apresentou r = 0,7, p < 0,001 e R2 = 0,49, demonstrando-se também altamente significativa e responsável por 49% da variação na profundidade ideal. O diâmetro do tubo apresentou correlação positiva, altamente significativa, com r = 0,49, p = 0,003, R2 = 0,24, e 24% da variação na profundidade ideal pôde ser atribuída ao diâmetro do tubo. Confirmou-se, pelas demais análises, que a altura foi a medida que pareceu ser mais influente no correto posicionamento do TOT.

DISCUSSÃO

O principal achado deste estudo foi que a altura consistiu na variável de maior influência na profundidade ideal do TOT, semelhante ao estudo que originou a fórmula da altura de Morgan,(44 Morgan GA, Steward DJ. Linear airway dimensions in children: including those from cleft palate. Can Anaesth Soc J. 1982;29(1):1-8.) o qual observou que o comprimento da traqueia aumenta linearmente com a estatura. Porém, nesse estudo, a amostra foi composta por crianças com mais de 4 anos de idade, justificando-se o grande percentual de tubos mal posicionados, com incidências acima de 25%, segundo a literatura,(77 Koshy T, Misra S, Chatterjee N, Dharan BS. Accuracy of a chest X-ray-based method for predicting the depth of insertion of endotracheal tubes in pediatric patients undergoing cardiac surgery. J Cardiothorac Vasc Anesth. 2016;30(4):947-53.) e de 56,7%, no nosso estudo. Tanto os estudos citados quanto o presente estudo avaliaram crianças menores de 4 anos com a fórmula da altura.

Outro ponto a ser destacado é a imprecisão das fórmulas do peso e do diâmetro do TOT. As fórmulas apresentaram CCC menores do que a fórmula da altura. Gill et al.(1212 Gill I, Stafford A, Murphy MC, Geoghegan AR, Crealey M, Laffan E, et al. Randomised trial of estimating oral endotracheal tube insertion depth in newborns using weight or vocal cord guide. Arch Dis Child Fetal Neonatal Ed. 2018;103(4):F312-6.) confirmaram essa imprecisão na fórmula do peso, em especial em recém-nascidos de extremo baixo peso. Também revisão sistemática da Cochrane de 2012(1313 Schmölzer GM, Roehr CC. Techniques to ascertain correct endotracheal tube placement in neonates. Cochrane Database Syst Rev. 2014;(9):CD010221.) já apontava para evidência insuficiente desses métodos de predição da profundidade ideal, com o raio X ainda como o melhor método para posicionar o TOT.

Confirma-se essa imprecisão pela elevada incidência de intubações inadequadas, considerando como margem de erro 0,3cm e 0,5cm (76,7% e 63,3%, respectivamente). Assim, mesmo com margem de 0,5cm em relação à posição ideal, mais de 60% das intubações ainda continuam sendo classificadas como inadequadas. O máximo desvio foi de 3,6cm, o que, para uma traqueia anatomicamente bem menor comparada à do adulto, representa risco imensurável de complicações.

Um dado muito importante no estudo foram as correlações da profundidade de inserção do TOT com as variáveis peso, altura e diâmetro do tubo. Todas as variáveis apresentaram correlações moderadas a forte, demonstrando a insuficiência da realização apenas da análise de correlação. Análises de concordância também devem ser realizadas; neste estudo, elas garantiram um reflexo mais fiel da realidade da utilização dessas fórmulas.

Sugere-se, então, a criação de um novo método para cálculo da profundidade do TOT em pediatria, que considere faixas etárias, além de peso e estatura. Só assim, deve ser possível otimizar a precisão do posicionamento correto do TOT no momento da intubação e prevenir as inúmeras complicações desse procedimento em pediatria.

Uma limitação que pode ser levantada neste estudo é a amostra, que, embora tenha sido estimada por cálculo, ainda é limitada. Resultados de outros estudos(1414 Boensch M, Schick V, Spelten O, Hinkelbein J. [Estimation of the optimal tube length: systematic review article on published formulae for infants and children]. Anaesthesist. 2016;65(2):115-21. German.

15 Dillier CM, Trachsel D, Baulig W, Gysin C, Gerber AC, Weiss M. Laryngeal damage due to an unexpectedly large and inappropriately designed cuffed pediatric tracheal tube in a 13-month-old child. Can J Anaesth. 2004;51(1):72-5.

16 Leung C. Optimal insertion depth for endotracheal tubes in extremely low-birth-weight infants. Pediatr Crit Care Med. 2018;19(4):328-31.

17 Trevisanuto D, Doglioni N, Zanardo V. The management of endotracheal tubes and nasal cannulae: the role of nurses. Early Hum Dev. 2009;85(10 Suppl):S85-7.
-1818 Weiss M, Balmer C, Dullenkopf A, Knirsch W, Gerber ACh, Bauersfeld U, et al. Intubation depth markings allow an improved positioning of endotracheal tubes in children. Can J Anaesth. 2005;52(7):721-6.) apontam a mesma direção sobre a imprecisão das fórmulas, denotando que, provavelmente, esse fator não tenha sido um viés capaz de alterar o resultado deste estudo. Outas limitações incluem o fato de a pesquisa ter sido unicêntrica, podendo ter influência das características antropométricas da população regional; das mensurações serem observador-dependentes; e de não haver protocolo institucional para determinação do tamanho ideal do TOT no momento da intubação, sem utilização da fita de emergência pediátrica Broselow na UTI avaliada.

CONCLUSÃO

As fórmulas que estimam a profundidade de inserção do tubo orotraqueal em crianças apresentaram-se pouco precisas e discordantes com o método padrão-ouro de avaliação (a radiografia do tórax). Faz-se necessária a criação de um novo método, baseado nas variáveis antropométricas (peso e altura) e na idade, o qual deve ser eficaz para guiar os profissionais de saúde das unidades de terapia intensiva pediátricas e nos centros cirúrgicos, no momento da intubação.

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Editado por

Editor responsável: Jefferson Pedro Piva

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2020

Histórico

  • Recebido
    27 Mar 2019
  • Aceito
    10 Fev 2020
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