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Síndrome de burnout e engajamento em profissionais de saúde: um estudo transversal

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a frequência de síndrome de burnout grave em profissionais de terapia intensiva e correlacioná-la com o engajamento com o trabalho.

Métodos:

Foi distribuído um questionário autoaplicável que incluía o Inventário de Burnout de Maslach, a Escala de Depressão Ansiedade e Estresse e o questionário Gallup. Todas as análises foram estratificadas por local de trabalho (unidade de terapia intensiva ou unidade semi-intensiva) e por grupo profissional (enfermeiros versus médicos versus fisioterapeutas).

Resultados:

Entre fevereiro de 2017 e junho de 2017, 206 dos 325 profissionais convidados (63,4%) responderam aos questionários. Destes, 55 eram médicos (26,7%), 88 eram fisioterapeutas (42,7%) e 63 eram enfermeiros (30,6%). A frequência de burnout grave foi de 34,3% (27,9 - 41,4%), e não se identificaram diferenças entre os grupos profissionais ou locais de trabalho. A frequência de casos graves ou muito graves de depressão, ansiedade ou estresse foi de 12,9%, 11,4% e 10,5%, respectivamente. O escore mediano (intervalo interquartil) observado pelo questionário Gallup foi 41 (34 - 48), e não se observaram diferenças entre os grupos profissionais ou locais de trabalho. Houve correlação negativa entre burnout e engajamento com o trabalho (r = -0,148; p = 0,035).

Conclusão:

A frequência de burnout grave foi elevada entre os profissionais de saúde que trabalham na unidade de terapia intensiva e na unidade semi-intensiva. Existe uma correlação negativa entre burnout e engajamento com o trabalho.

Descritores:
Unidade semi-intensiva; Esgotamento psicológico; Engajamento no trabalho; Depressão; Transtornos do estresse agudo; Unidades de terapia intensiva

ABSTRACT

Objective:

To evaluate the frequency of severe burnout syndrome among critical care providers and to correlate it with work engagement.

Methods:

A self-administered survey including the Maslach Burnout Inventory, Depression Anxiety and Stress Scales, and Gallup questionnaire was distributed. All analyses were stratified by setting (intensive care unit or step-down unit) and by professional group (nurses versus physicians versus physiotherapists).

Results:

Between February 2017 and June 2017, 206 out of 325 invited professionals (63.4%) answered the questionnaires. Of these, 55 were physicians (26.7%), 88 were physiotherapists (42.7%) and 63 were nurses (30.6%). The frequency of severe burnout was 34.3% (27.9 - 41.4%), and no difference was found between professional groups or settings. The frequency of severe or very severe cases of depression, anxiety or stress was 12.9%, 11.4% and 10.5%, respectively. The median (interquartile range) score observed on the Gallup questionnaire was 41 (34 - 48), and no differences were found between professional groups or settings. There was a negative correlation between burnout and work engagement (r = -0.148; p = 0.035).

Conclusion:

There is a high frequency of severe burnout among critical care providers working in the intensive care unit and step-down unit. There was a negative correlation between burnout and work engagement.

Keywords:
Step-down unit; Burnout, psychological; Work engagement; Depression; Acute stress disorders; Intensive care units

INTRODUÇÃO

A síndrome de burnout é definida como uma condição de desconforto psicológico relacionado ao trabalho, associada com mudanças fisiológicas devidas ao estresse.(11 Embriaco N, Papazian L, Kentish-Barnes N, Pochard F, Azoulay E. Burnout syndrome among critical care healthcare workers. Curr Opin Crit Care. 2007;13(5):482-8.) Ela é caracterizada por exaustão física, psicológica e emocional, em razão do esforço excessivo exercido no trabalho.(11 Embriaco N, Papazian L, Kentish-Barnes N, Pochard F, Azoulay E. Burnout syndrome among critical care healthcare workers. Curr Opin Crit Care. 2007;13(5):482-8.,22 Bianchi R, Schonfeld IS, Laurent E. Burnout-depression overlap: a review. Clin Psychol Rev. 2015;36:28-41.) A síndrome de burnout inclui três fatores multidimensionais interdependentes: exaustão emocional, despersonalização e diminuição da realização pessoal.(11 Embriaco N, Papazian L, Kentish-Barnes N, Pochard F, Azoulay E. Burnout syndrome among critical care healthcare workers. Curr Opin Crit Care. 2007;13(5):482-8.,22 Bianchi R, Schonfeld IS, Laurent E. Burnout-depression overlap: a review. Clin Psychol Rev. 2015;36:28-41.)

Os profissionais geralmente experienciam uma síndrome de burnout quando a natureza de seu trabalho demanda um contato direto com outros seres humanos, como na área da saúde.(33 Bridgeman PJ, Bridgeman MB, Barone J. Burnout syndrome among healthcare professionals. Am J Health Syst Pharm. 2018;75(3):147-52.,44 Rotenstein LS, Torre M, Ramos MA, Rosales RC, Guille C, Sen S, et al. Prevalence of Burnout among physicians: a systematic review. JAMA. 2018;320(11):1131-50.) Dentre todos os locais do hospital, a unidade de terapia intensiva (UTI) tem sido enfatizada como um dos mais estressantes, não apenas para os pacientes e seus parentes, mas também para os profissionais de saúde.(55 Le Gall JR, Azoulay E, Embriaco N, Poncet MC, Pochard F. [Burn out syndrome among critical care workers]. Bull Acad Natl Med. 2011;195(2):389-97; discussion 397-8. French.

6 Chuang CH, Tseng PC, Lin CY, Lin KH, Chen YY. Burnout in the intensive care unit professionals: a systematic review. Medicine (Baltimore). 2016;95(50):e5629.

7 Tironi MO, Teles JM, Barros DS, Vieira DF, Silva Filho CM, Martins Junior DF, et al. Prevalence of burnout syndrome in intensivist doctors in five Brazilian capitals. Rev Bras Ter Intensiva. 2016;28(3):270-7.

8 Fumis RR, Junqueira Amarante GA, de Fatima Nascimento A, Vieira Junior JM. Moral distress and its contribution to the development of burnout syndrome among critical care providers. Ann Intensive Care. 2017;7(1):71.
-99 Malaquin S, Mahjoub Y, Musi A, Zogheib E, Salomon A, Guilbart M, et al. Burnout syndrome in critical care team members: A monocentric cross sectional survey. Anaesth Crit Care Pain Med. 2017;36(4):223-8.) Ainda são escassos os dados a respeito da síndrome de burnout em profissionais que trabalham exclusivamente nas unidades semi-intensivas (USI).

A presença da síndrome de burnout em profissionais de saúde pode comprometer a qualidade dos cuidados fornecidos ao paciente e piorar a qualidade de vida desses profissionais.(1010 Moss M, Good VS, Gozal D, Kleinpell R, Sessler CN. An Official Critical Care Societies Collaborative Statement: Burnout Syndrome in Critical Care Health Care Professionals: A Call for Action. Am J Crit Care. 2016;25(4):368-76.) Além disso, a síndrome se associa com consequências deletérias, inclusive baixo engajamento com o trabalho, absenteísmo, aumento das taxas de rotatividade de emprego, baixa satisfação do paciente e diminuição da qualidade do serviço.(55 Le Gall JR, Azoulay E, Embriaco N, Poncet MC, Pochard F. [Burn out syndrome among critical care workers]. Bull Acad Natl Med. 2011;195(2):389-97; discussion 397-8. French.,99 Malaquin S, Mahjoub Y, Musi A, Zogheib E, Salomon A, Guilbart M, et al. Burnout syndrome in critical care team members: A monocentric cross sectional survey. Anaesth Crit Care Pain Med. 2017;36(4):223-8.,1010 Moss M, Good VS, Gozal D, Kleinpell R, Sessler CN. An Official Critical Care Societies Collaborative Statement: Burnout Syndrome in Critical Care Health Care Professionals: A Call for Action. Am J Crit Care. 2016;25(4):368-76.) Contudo, o impacto da síndrome de burnout no engajamento com o trabalho em profissionais atuantes em terapia intensiva não foi até o momento avaliado.

Assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar a frequência de síndrome de burnout grave em profissionais que trabalham com cuidados críticos, atuantes na UTI e na USI, e correlacionar esses dados com o engajamento com o trabalho. Nossa hipótese é de que a frequência da síndrome de burnout tem correlação elevada e negativa com o engajamento com o trabalho.

MÉTODOS

Foi realizado um levantamento com utilização de um questionário autoaplicável.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein (CAAE: 58687216.0.0000.0071). Todos os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa.

Este estudo foi conduzido na UTI e na USI de um hospital privado de ensino com 646 leitos localizado em São Paulo (SP). A UTI compreendia 40 leitos e a USI 95 leitos, e elas recebiam pacientes clínicos e cirúrgicos. Tanto a UTI quanto a USI tinham uma política de visitação de 24 horas por dia (acesso livre, em todo o tempo; os visitantes podiam fazer turnos de visita aos pacientes e permanecer com os pacientes durante a noite).

No momento da pesquisa, trabalhavam na UTI e na USI do hospital 325 profissionais (64 médicos, 155 enfermeiros e 106 fisioterapeutas). A proporção de profissionais por leito na UTI era de 1:10 para médicos (dia e noite) e 1:5 para enfermeiros (dia e noite); a proporção era de 1:5 para fisioterapeutas durante o turno do dia e 1:10 durante a noite. Na USI, a proporção de profissionais por leito era de 1:20 para médicos durante o dia e 1:40 durante a noite. Para enfermeiros, era de 1:7 durante o dia e 1:10 durante o período noturno e, para fisioterapeutas, 1:6 durante o período diurno e 1:20 no período noturno. Os profissionais de saúde eram independentes, isto é, trabalhavam apenas na UTI ou na USI, e os horários de trabalho (duração e número de turnos) eram os mesmos em ambas as unidades.

Todos os trabalhadores em terapia intensiva (médicos, enfermeiros e fisioterapeutas) convidados para tomar parte neste estudo receberam um convite por e-mail. A participação foi voluntária, e as respostas foram mantidas anônimas.

Utilizou-se um questionário de autoaplicável através do programa Research Electronic Data Capture (REDCap) para coleta dos dados. Os dados demográficos foram colhidos, e incluíram-se três instrumentos: (1) o Inventário de Burnout de Maslach (MBI), para avaliar a síndrome de burnout;(1111 Maslach C, Jackson SE, Leiter MP. Maslach burnout inventory manual. 3rd ed. Palo Alto, CA: Consulting Psychologists Press; 1996.,1212 Maslach C, Jackson SE. The measurement of experienced burnout. J Organ Behav. 1981;2(2):99-113.) (2) a Escala de Depressão Ansiedade e Estresse (DASS-21)(1313 Lovibond SH, Lovibond PF. Manual for the depression anxiety stress scales. 2nd ed. Sydney: Psychology Foundation of Australia; 1995.

14 Vignola RC, Tucci AM. Adaptation and validation of the depression, anxiety and stress scale (DASS) to Brazilian Portuguese. J Affect Disord. 2014;155:104-9.
-1515 Apostolo JL, Mendes AC, Azeredo ZA. Adaptation to Portuguese of the Depression, Anxiety and Stress Scales (DASS). Revista Lat Am Enfermagem. 2006;14(6):863-71.) e (3) o questionário Gallup (Material suplementar).(1616 The Gallup Organization. Q12®. Meta-Analysis. Omaha, Nebraska; 2006.) Todos os instrumentos foram traduzidos e validados para a língua portuguesa.

O MBI é um questionário de 22 itens que avalia os três domínios do burnout: exaustão emocional (nove itens), despersonalização (cinco itens) e realização pessoal (oito itens).(1111 Maslach C, Jackson SE, Leiter MP. Maslach burnout inventory manual. 3rd ed. Palo Alto, CA: Consulting Psychologists Press; 1996.,1212 Maslach C, Jackson SE. The measurement of experienced burnout. J Organ Behav. 1981;2(2):99-113.) O DASS-21 é um instrumento de 21 itens utilizado para avaliar depressão (sete itens), ansiedade (sete itens) e estresse (sete itens).(1313 Lovibond SH, Lovibond PF. Manual for the depression anxiety stress scales. 2nd ed. Sydney: Psychology Foundation of Australia; 1995.

14 Vignola RC, Tucci AM. Adaptation and validation of the depression, anxiety and stress scale (DASS) to Brazilian Portuguese. J Affect Disord. 2014;155:104-9.
-1515 Apostolo JL, Mendes AC, Azeredo ZA. Adaptation to Portuguese of the Depression, Anxiety and Stress Scales (DASS). Revista Lat Am Enfermagem. 2006;14(6):863-71.) O questionário Gallup tem 12 questões e é utilizado para avaliar o engajamento com o trabalho por meio do uso de uma escala Likert, que varia entre 1 (“discordo totalmente”) e 5 (“concordo totalmente”) (material suplementar).(1616 The Gallup Organization. Q12®. Meta-Analysis. Omaha, Nebraska; 2006.)

Definiram-se pontos de corte bem estabelecidos para o diagnóstico de burnout grave para cada uma das dimensões do MBI. Um escore ≥ 27 pontos indica níveis elevados de exaustão emocional; escore ≥ 10 pontos indica despersonalização, e escore ≤ 33 pontos indica baixos níveis de realização pessoal.(1111 Maslach C, Jackson SE, Leiter MP. Maslach burnout inventory manual. 3rd ed. Palo Alto, CA: Consulting Psychologists Press; 1996.) Diagnosticou-se burnout grave quando se encontraram altos níveis de exaustão emocional, despersonalização e baixos níveis de realização pessoal.

Para as respostas no instrumento DASS-21, escore ≥ 21 pontos foi utilizado para indicar depressão grave, ≥15 pontos para indicar ansiedade grave e ≥ 26 pontos para indicar estresse grave.(1313 Lovibond SH, Lovibond PF. Manual for the depression anxiety stress scales. 2nd ed. Sydney: Psychology Foundation of Australia; 1995.) Finalmente, não houve um ponto de corte validado para o questionário Gallup. Assim, no presente estudo, as respostas foram consideradas em uma escala contínua entre 12 e 60, sendo que os níveis mais altos representam maior engajamento.

Análise estatística

Os dados são apresentados como mediana (intervalo interquartil - IQR) e frequências absolutas e relativas. A frequência de burnout grave é mostrada como percentagem com intervalo de confiança de 95% (IC95%). Os resultados dos questionários MBI e DASS-21 são apresentados segundo pontos de corte bem estabelecidos e definidos, e o escore total segundo a soma das respostas, com variação entre zero e 132 para o MBI e entre zero e 63 para o DASS-21, sendo que níveis mais altos indicam mais burnout (MBI), depressão, ansiedade ou estresse (DASS-21). O questionário Gallup foi avaliado como escore total.

Todas as análises foram estratificadas segundo o local de trabalho (UTI versus USI) e grupo profissional (enfermeiros versus médicos versus fisioterapeutas). Realizou-se uma comparação entre os grupos com utilização dos testes de Mann-Whitney, Kruskal-Wallis e/ou exato de Fisher, conforme apropriado. Para comparação entre os graus de burnout, depressão, ansiedade e estresse entre os locais de trabalho e grupos profissionais, utilizou-se um teste de Cochran-Armitage para levar em conta a escala ordinal dos instrumentos.

Utilizaram-se duas abordagens para avaliar os fatores associados com síndrome de burnout grave. Primeiro, os profissionais de saúde codificados como com burnout grave foram comparados com os sem burnout. Então, as variáveis com diferenças significantes entre os dois grupos (considerando um p < 0,05) foram incluídas em um modelo de efeitos mistos, considerando local e grupo profissional como efeitos aleatórios. As variáveis com p < 0,05 nesse modelo final foram consideradas como fatores independentes associados com burnout. Finalmente, as correlações entre os escores pelo MBI, DASS-21 e Gallup foram avaliadas por meio de modelos de gráficos de dispersão, correlação de Pearson e linear.

Como análises adicionais, a frequência de burnout grave foi avaliada em profissionais de terapia intensiva com e sem triagem positiva para depressão segundo o DASS-21, sendo os profissionais classificados como sem depressão quando tinham escore DASS-21 < 10. Além disso, a frequência de burnout grave foi avaliada em profissionais de terapia intensiva com trabalho exclusivamente no hospital. Devido às múltiplas comparações, o valor de p para essas análises adicionais foi corrigido com utilização da correção de Bonferroni; o valor de p foi considerado significante quando seu valor se mostrou < 0,005.

O nível de significância estabelecido foi de 0,05 (nos casos em que não descrito de forma diferente), e todas as análises foram conduzidas com utilização do programa R v.3.4.0 (R Foundation for Statistical Computing, Viena, Áustria).

RESULTADOS

Entre fevereiro e junho de 2017, 206 dos 325 profissionais convidados (62,4%) responderam à pesquisa. Destes, 55 eram médicos (26,7%), 88 eram fisioterapeutas (42,7%), e 63 eram enfermeiros (30,6%). A maioria dos profissionais que responderam ao levantamento era da UTI (57,8% [119/206]). A taxa mais elevada de respostas foi dos médicos (85,9%), seguida por fisioterapeutas (83,0%) e enfermeiros (40,6%).

As características basais dos participantes são apresentadas na tabela 1. A mediana (IQR) de idade dos participantes foi de 35 (31 - 39) anos. Em sua maioria, os participantes eram do sexo feminino, casados e pós-graduados. A maioria dos participantes trabalhava entre 3 e 5 dias no hospital e não exercia atividades em outra instituição. Todas as características foram similares entre os locais de trabalho (Tabela 1).

Tabela 1
Características dos participantes incluídos

Frequência da síndrome de burnout grave

A frequência da síndrome de burnout grave na coorte total foi de 34,3% (27,9% - 41,4%) sem qualquer diferença com relação ao local de trabalho (34,2% [25,8% - 43,6%] na UTI em comparação com 34,5% [24,7% - 45,8%] na USI; p = 0,960) ou grupo profissional (34,1% [24,5% - 45,0%] entre fisioterapeutas versus 33,9% [22,6% - 47,1%] entre enfermeiros versus 35,3% [22,8% - 50,0%] entre médicos; p = 0,986) (Tabela 2 e Figura 1).

Tabela 2
Frequência da síndrome de burnout grave, depressão, ansiedade, estresse e engajamento com o trabalho entre os participantes
Figura 1
Frequência de síndrome de burnout grave segundo o grupo profissional e local de trabalho.

UTI - unidade de terapia intensiva.


A maioria dos participantes demonstrou nível moderado de exaustão emocional (50,2% [43,2% - 57,3%]), nível elevado de despersonalização (67,3% [60,3% - 73,6%]) e baixo nível de realização pessoal (94,5% [90,2% - 97,1%]). Não houve diferença nos componentes do MBI ou no escore total entre os locais de trabalho e grupos profissionais (Tabela 2).

Avaliação de depressão, ansiedade, estresse e engajamento com o trabalho

A frequência de casos graves ou muito graves de depressão, ansiedade e estresse foi, respectivamente, de 12,9% (8,7% - 18,5%), 11,4% (7,5% - 16,8%) e 10,4% (6,7% - 15.7%) (Tabela 2). Ocorreu diferença na frequência de depressão e estresse segundo o local de trabalho, sendo que os profissionais atuantes na UTI tiveram frequência mais alta de casos graves ou muito graves (p = 0,001 para depressão e p = 0,046 para estresse) (Tabela 2). Além disso, uma frequência maior de casos muito graves de ansiedade foi identificada entre enfermeiros (p = 0,003).

O escore mediano (IQR) no questionário Gallup foi de 41 (34 - 48), sem diferenças com relação ao local de trabalho (p = 0,239) ou grupo profissional (p = 0,403) (Tabela 2 e Tabela 1S - Material suplementar).

Fatores associados com síndrome de burnout grave

As características dos profissionais que atuavam em terapia intensiva com e sem síndrome de burnout grave são apresentadas na tabela 2S (Material suplementar). Ocorreu uma diferença em relação ao estado civil (p = 0,036), com frequência mais alta de dor (p = 0,047) e maior número de dias atuando em outro hospital (p = 0,020) nos profissionais de terapia intensiva com síndrome de burnout grave (tabela 2S - Material suplementar). Além disso, os trabalhadores com síndrome de burnout grave tinham escores mais altos em todos os componentes do DASS-21 (p = 0,001, para depressão e ansiedade, e p < 0,001, para estresse) e menor engajamento com o trabalho segundo o questionário Gallup (p = 0,014) (Tabela 2S - Material suplementar).

Na análise multivariada, níveis moderados a graves de estresse (razão de chance - OR - ajustada de 5,54 [IC95% 1,78 - 18,63], com p = 0,004 para níveis moderados, e OR 11,47 [1,68 - 109,34], com p = 0,017 para níveis graves) e trabalhar entre 3 e 5 dias em outro hospital (OR 3,61 [1,53 - 8,75], p = 0,003) associaram-se de forma independente com maior risco de síndrome de burnout grave (Tabela 3).

Tabela 3
Fatores associados com síndrome de burnout grave na análise multivariada

Correlação entre os escores Inventário de Burnout de Maslach, Escala de Depressão Ansiedade e Estresse e engajamento com o trabalho

Ocorreram correlação positiva entre o escore DASS-21 e o MBI (r = 0,445; p < 0,001) e correlação negativa entre engajamento com o trabalho e o escore DASS-21 (r = -0,375; p < 0,001) e entre engajamento com o trabalho e o escore MBI (r = -0,148; p = 0,035) (Figura 2).

Figura 2
Correlação entre (A) escore da Escala de Depressão Ansiedade e Estresse e Inventário de Burnout de Maslach; (B) Gallup e Escala de Depressão Ansiedade e Estresse e (C) Gallup e Inventário de Burnout de Maslach.

MBI - Inventário de Burnout de Maslach; DASS-21 - Escala de Depressão Ansiedade e Estresse.


Análises adicionais

Após a correção de Bonferroni, não houve diferença na frequência de síndrome de burnout grave nos praticantes com ou sem uma triagem positiva para depressão (43,4% [32,3% - 55,2%] versus 28,8% [21,2% - 37,7%]; p = 0,046) (Tabela 3S - Material suplementar). Além disso, não houve diferença na frequência de síndrome de burnout grave segundo a presença ou ausência de triagem positiva para depressão, local de trabalho ou grupo profissional (Tabela 3S - Material suplementar). Finalmente, não houve diferença na frequência de síndrome de burnout grave entre os participantes que trabalhavam exclusivamente no hospital e os que não eram exclusivos (29,7% [21,8% - 38,9%] versus 41,0% [30,5% - 52,3%]; p = 0,100) (Tabela 3S - Material suplementar).

DISCUSSÃO

No presente estudo demonstramos que existe uma elevada frequência de síndrome de burnout grave entre os profissionais atuantes em cuidados intensivos; não há diferença nessa frequência com relação ao local de trabalho ou grupo profissional; existe associação entre estresse e número de dias atuando em outro hospital e risco de síndrome de burnout grave; é positiva a correlação entre depressão, ansiedade, estresse e burnout e há uma correlação negativa entre burnout e engajamento com o trabalho.

A frequência da síndrome de burnout grave encontrada no presente estudo (considerando níveis elevados nos três domínios que caracterizam a síndrome) foi mais alta do que o relatado por alguns estudos prévios.(88 Fumis RR, Junqueira Amarante GA, de Fatima Nascimento A, Vieira Junior JM. Moral distress and its contribution to the development of burnout syndrome among critical care providers. Ann Intensive Care. 2017;7(1):71.,1717 Embriaco N, Azoulay E, Barrau K, Kentish N, Pochard F, Loundou A, et al. High level of burnout in intensivists: prevalence and associated factors. Am J Respir Crit Care Med. 2007;175(7):686-92.,1818 Barros DS, Tironi MO, Nascimento Sobrinho CL, Neves FS, Bitencourt AG, Almeida AM, et al. Intensive care unit physicians: socio-demographic profile, working conditions and factors associated with burnout syndrome. Rev Bras Ter Intensiva. 2008;20(3):235-40.) A elevada frequência de burnout, especialmente quando relacionada à exaustão emocional e despersonalização, pode sugerir elevada carga de trabalho e desequilíbrio entre a capacidade técnica e relacionamentos interpessoais.(1010 Moss M, Good VS, Gozal D, Kleinpell R, Sessler CN. An Official Critical Care Societies Collaborative Statement: Burnout Syndrome in Critical Care Health Care Professionals: A Call for Action. Am J Crit Care. 2016;25(4):368-76.,1919 Poncet MC, Toullic P, Papazian L, Kentish-Barnes N, Timsit JF, Pochard F, et al. Burnout syndrome in critical care nursing staff. Am J Respir Crit Care Med. 2007;175(7):698-704.,2020 Merlani P, Verdon M, Businger A, Domenighetti G, Pargger H, Ricou B; STRESI+ Group. Burnout in ICU caregivers: a multicenter study of factors associated to centers. Am J Respir Crit Care Med. 2011;184(10):1140-6.) Alguns estudos demonstraram que fatores individuais e fatores relacionados à organização do processo de trabalho aumentam a predisposição ao burnout.(2121 Trigo TR, Teng CT, Hallak JE. Síndrome de burnout ou estafa profissional e os transtornos psiquiátricos. Rev Psiq Clin. 2007;34(5):223-33.) Fatores associados com aumento do risco de burnout incluem elevada carga de trabalho, baixo controle sobre o trabalho, baixo nível de suporte dos colaboradores, baixos níveis de reconhecimento e falta de congruência entre os valores éticos e morais do trabalhador e da instituição.(2222 Maslach C. Burnout: A multidimensional perspective. In: Schaufeli WB, Maslach C, Marek T, editors. Professional burnout: recent developments in theory and research. (Series in applied psychology). Philadelphia, PA, US: Taylor & Francis; 1993. p. 19-32.) Trabalhadores com alto nível de perfeccionismo que se preocupam muito com o resultado do seu trabalho são os que apresentam maior risco de burnout.(2323 Hill AP, Curran T. Multidimensional Perfectionism and burnout: a meta-analysis. Pers Soc Psychol Rev. 2016;20(3):269-88.)

Em contraste com outros estudos, não se identificou qualquer diferença em termos de frequência de síndrome de burnout grave segundo o local de trabalho ou grupo profissional.(88 Fumis RR, Junqueira Amarante GA, de Fatima Nascimento A, Vieira Junior JM. Moral distress and its contribution to the development of burnout syndrome among critical care providers. Ann Intensive Care. 2017;7(1):71.,1010 Moss M, Good VS, Gozal D, Kleinpell R, Sessler CN. An Official Critical Care Societies Collaborative Statement: Burnout Syndrome in Critical Care Health Care Professionals: A Call for Action. Am J Crit Care. 2016;25(4):368-76.,2020 Merlani P, Verdon M, Businger A, Domenighetti G, Pargger H, Ricou B; STRESI+ Group. Burnout in ICU caregivers: a multicenter study of factors associated to centers. Am J Respir Crit Care Med. 2011;184(10):1140-6.) Postulou-se que os médicos e enfermeiros da UTI têm um alto risco de desenvolver burnout grave, assim como outros profissionais de saúde. Contudo, há poucos dados disponíveis a respeito da frequência de burnout grave em outros profissionais de saúde, como fisioterapeutas, terapeutas respiratórios ou fonoaudiólogos.(88 Fumis RR, Junqueira Amarante GA, de Fatima Nascimento A, Vieira Junior JM. Moral distress and its contribution to the development of burnout syndrome among critical care providers. Ann Intensive Care. 2017;7(1):71.,1010 Moss M, Good VS, Gozal D, Kleinpell R, Sessler CN. An Official Critical Care Societies Collaborative Statement: Burnout Syndrome in Critical Care Health Care Professionals: A Call for Action. Am J Crit Care. 2016;25(4):368-76.,2020 Merlani P, Verdon M, Businger A, Domenighetti G, Pargger H, Ricou B; STRESI+ Group. Burnout in ICU caregivers: a multicenter study of factors associated to centers. Am J Respir Crit Care Med. 2011;184(10):1140-6.) Uma possível explicação para nossos achados se refere às rondas diárias que envolvem todos os profissionais atuantes em cuidados críticos, as quais permitem que eles compartilhem as decisões e as responsabilidades com os demais profissionais envolvidos nos cuidados do paciente.

Diversos estudos já relataram alguns fatores de risco associados com a síndrome de burnout, como idade, sexo, tempo dedicado ao trabalho, experiência profissional, relacionamentos interpessoais, personalidade e crenças, estado civil e nível de educação.(66 Chuang CH, Tseng PC, Lin CY, Lin KH, Chen YY. Burnout in the intensive care unit professionals: a systematic review. Medicine (Baltimore). 2016;95(50):e5629.,1010 Moss M, Good VS, Gozal D, Kleinpell R, Sessler CN. An Official Critical Care Societies Collaborative Statement: Burnout Syndrome in Critical Care Health Care Professionals: A Call for Action. Am J Crit Care. 2016;25(4):368-76.,2424 Salvagioni DA, Melanda FN, Mesas AE, González AD, Gabani FL, Andrade SM. Physical, psychological and occupational consequences of job burnout: A systematic review of prospective studies. PloS One. 2017;12(10):e0185781.) Fatores relacionados com a organização do trabalho têm sido muito pouco estudados, especialmente no que se refere a conflitos.(2525 Azoulay E, Timsit JF, Sprung CL, Soares M, Rusinová K, Lafabrie A, Abizanda R, Svantesson M, Rubulotta F, Ricou B, Benoit D, Heyland D, Joynt G, Français A, Azeivedo-Maia P, Owczuk R, Benbenishty J, de Vita M, Valentin A, Ksomos A, Cohen S, Kompan L, Ho K, Abroug F, Kaarlola A, Gerlach H, Kyprianou T, Michalsen A, Chevret S, Schlemmer B; Conflicus Study Investigators and for the Ethics Section of the European Society of Intensive Care Medicine. Prevalence and factors of intensive care unit conflicts: the conflicus study. Am J Respir Crit Care Med. 2009;180(9):853-60.) Azoulay et al. relataram prevalência de percepção de conflitos de até 70% na equipe da UTI, e, quando presentes, esses conflitos eram percebidos como graves em mais de metade dos casos e associados com aumento da tensão no trabalho.(2525 Azoulay E, Timsit JF, Sprung CL, Soares M, Rusinová K, Lafabrie A, Abizanda R, Svantesson M, Rubulotta F, Ricou B, Benoit D, Heyland D, Joynt G, Français A, Azeivedo-Maia P, Owczuk R, Benbenishty J, de Vita M, Valentin A, Ksomos A, Cohen S, Kompan L, Ho K, Abroug F, Kaarlola A, Gerlach H, Kyprianou T, Michalsen A, Chevret S, Schlemmer B; Conflicus Study Investigators and for the Ethics Section of the European Society of Intensive Care Medicine. Prevalence and factors of intensive care unit conflicts: the conflicus study. Am J Respir Crit Care Med. 2009;180(9):853-60.) O desconforto moral é outro fator importante, definido como a incapacidade de um agente moral para agir segundo seus valores fundamentais e as obrigações percebidas em função das pressões internas e externas, o que é considerado um conflito. O desconforto emocional se associa independentemente com o desenvolvimento da síndrome de burnout.(88 Fumis RR, Junqueira Amarante GA, de Fatima Nascimento A, Vieira Junior JM. Moral distress and its contribution to the development of burnout syndrome among critical care providers. Ann Intensive Care. 2017;7(1):71.)

No presente estudo encontramos uma associação positiva entre o tempo trabalhando em outro hospital e um maior risco de burnout. Alguns estudos demonstraram associação entre a carga de trabalho e maior risco de burnout.(1717 Embriaco N, Azoulay E, Barrau K, Kentish N, Pochard F, Loundou A, et al. High level of burnout in intensivists: prevalence and associated factors. Am J Respir Crit Care Med. 2007;175(7):686-92.,2626 Barbosa FT, Eloi RJ, Santos LM, Leão BA, Lima FJ, Sousa-Rodrigues CF. Correlation between weekly working time and burnout syndrome among anesthesiologists of Maceio-AL. Braz J Anesthesiol. 2017;67(2):115-21.) Profissionais de saúde que frequentemente trabalham em outro hospital durante a semana (3 a 5 dias por semana) devem lidar com demandas diferentes de trabalho em cada hospital. Isso pode influenciar no estresse psicológico sofrido em resultado dessas distintas demandas de trabalho. Entretanto, os que trabalham mais de cinco dias em outro hospital acabam tendo menos dias na semana para lidar com as diferentes demandas do trabalho, o que provavelmente lhes causa um menor estresse psicológico. Na verdade, uma carga de trabalho mais alta é comum entre profissionais de saúde e contribui para burnout e estresse. É importante mencionar que a carga e trabalho não depende unicamente do número de horas trabalhadas, e sim também do estresse psicológico sofrido pelas demandas do trabalho.(2727 Tironi MO, Nascimento Sobrinho CL, Barros DS, Reis EJ, Marques Filho ES, Almeida A, et al. [Professional Burnout Syndrome of intensive care physicians from Salvador, Bahia, Brazil]. Rev Assoc Med Bras (1992). 2009;55(6):656-62.)

Neste estudo, observamos maior frequência de dores musculoesqueléticas em profissionais envolvidos com cuidados críticos. Sugeriu-se que, apesar do estresse psicológico associado com o burnout, a síndrome pode também levar a problemas físicos.(2424 Salvagioni DA, Melanda FN, Mesas AE, González AD, Gabani FL, Andrade SM. Physical, psychological and occupational consequences of job burnout: A systematic review of prospective studies. PloS One. 2017;12(10):e0185781.) Na verdade, os transtornos musculoesqueléticos parecem estar diretamente associados com burnout, uma vez que os profissionais com essa síndrome têm maior risco de dor em curto e longo prazo, quando comparados a profissionais sem burnout.(2828 Yassi A, Hancock T. Patient safety--worker safety: building a culture of safety to improve healthcare worker and patient well-being. Healthc Q. 2005;8 Spec No:32-8.,2929 Armon G, Melamed S, Shirom A, Shapira I. Elevated burnout predicts the onset of musculoskeletal pain among apparently healthy employees. J Occup Health Psychol. 2010;15(4):399-408.)

Observou-se fraca correlação positiva entre os escores DASS-21 e MBI. Alinhado a isso, alguns autores sugerem uma superposição entre burnout e depressão, especialmente em razão de os instrumentos utilizados para avaliar ambas as condições serem compostos, principalmente, por aspectos ligados à fadiga.(22 Bianchi R, Schonfeld IS, Laurent E. Burnout-depression overlap: a review. Clin Psychol Rev. 2015;36:28-41.,3030 Ahola K, Honkonen T, Isometsä E, Kalimo R, Nykyri E, Aromaa A, et al. The relationship between job-related burnout and depressive disorders--results from the Finnish Health 2000 Study. J Affect Disord. 2005;88(1):55-62.

31 Bianchi R, Schonfeld IS, Laurent E. Is burnout a depressive disorder? A reexamination with special focus on atypical depression. Int J Stress Manag. 2014;21(4):307-24.
-3232 Maslach C, Leiter MP. Understanding the burnout experience: recent research and its implications for psychiatry. World Psychiatry. 2016;15(2):103-11.) Entretanto, alguns pesquisadores argumentam que síndrome de burnout e depressão são condições distintas.(3333 Leiter MP, Durup J. The discriminant validity of burnout and depression: A confirmatory factor analytic study. Anxiety Stress Coping. 1994;7(4):357-73.,3434 Cresswell SL, Eklund RC. The convergent and discriminant validity of burnout measures in sport: a multi-trait/multi-method analysis. J Sports Sci. 2006;24(2):209-20.)

Existe clara evidência de que a síndrome de burnout pode afetar também a instituição na qual o profissional atua, uma vez que pode levar a uma diminuição do desempenho profissional, com impacto direto nos cuidados ao paciente.(1010 Moss M, Good VS, Gozal D, Kleinpell R, Sessler CN. An Official Critical Care Societies Collaborative Statement: Burnout Syndrome in Critical Care Health Care Professionals: A Call for Action. Am J Crit Care. 2016;25(4):368-76.) Por exemplo, a presença de burnout em enfermeiros tem sido associada com diminuição da qualidade dos cuidados, menor satisfação do paciente, maior número de eventos adversos, taxas mais elevadas de infecções associadas ao tratamento e níveis mais elevados de mortalidade em 30 dias.(3535 Cimiotti JP, Aiken LH, Sloane DM, Wu ES. Nurse staffing, burnout, and health care-associated infection. Am J Infect Control. 2012;40(6):486-90.,3636 Poghosyan L, Clarke SP, Finlayson M, Aiken LH. Nurse burnout and quality of care: cross-national investigation in six countries. Res Nurs Health. 2010;33(4):288-98.)

Este é o primeiro estudo a avaliar uma associação entre a síndrome de burnout e o engajamento com o trabalho em profissionais que atuam com cuidados críticos. O estudo não teve poder estatístico para estabelecer um relacionamento causal, e, presentemente, existe um debate a respeito do relacionamento entre o engajamento e o burnout, discutindo-se se são construtos distintos ou se engajamento é apenas o oposto de burnout.(3737 Goering DD, Shimazu A, Zhou F, Wada T, Sakai R. Not if, but how they differ: A meta-analytic test of the nomological networks of burnout and engagement. Burn Res. 2017;5:21-34.) O relacionamento entre burnout e engajamento pode ser devido à incapacidade do trabalhador de lidar adequadamente com as demandas impostas pelo trabalho, quer por questões individuais ou em razão da organização do processo de trabalho.

O presente estudo apresenta algumas limitações. Primeiramente, foi um estudo realizado em um único centro, e isto deve ser levado em conta quando se interpretam os resultados. Em segundo lugar, devido à natureza anônima e voluntária das entrevistas, mais de 30% da equipe e cerca de 60% dos enfermeiros não responderam à pesquisa. Em terceiro lugar, algumas das questões não foram respondidas, criando falta de alguns dados para a análise. Quarto, não se avaliaram as personalidades individuais e conflitos. Quinto, há um risco de viés de seleção, uma vez que os participantes foram voluntários, e profissionais com algum grau de burnout podem ter sido mais propensos a responder do que os sem burnout. Sexto, a carga de trabalho dos profissionais de saúde não foi avaliada, o que nos impede de determinar qual sua contribuição para o desenvolvimento de burnout grave. Finalmente, é importante enfatizar que os instrumentos utilizados no estudo são apenas para triagem. Para um diagnóstico mais detalhado, é necessária uma cuidadosa avaliação psiquiátrica.

CONCLUSÃO

A frequência de síndrome de burnout grave foi elevada entre profissionais atuantes em terapia intensiva, sem diferenças segundo o local de trabalho ou grupo profissional. Além disso, encontramos uma correlação negativa entre burnout e engajamento com o trabalho.

AGRADECIMENTOS

A Helena Spalic, pela revisão do manuscrito original em inglês.

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Editado por

Editor responsável: Márcio Soares

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Out 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2020

Histórico

  • Recebido
    14 Out 2019
  • Aceito
    04 Fev 2020
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