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Avaliação da atividade eletromiográfica com ou sem o uso de diversos tipos de calçado, em diferentes planos de locomoção

Evaluation of eletromyographic activity with or without the use of various types of shoes, in different plans

Resumos

INTRODUÇÃO: São muito recorrentes as queixas de mulheres com desconforto na região lombar durante o uso de sapato de salto. OBJETIVO: O objetivo deste estudo foi avaliar a atividade eletromiográfica de músculos da perna e eretores da espinha associada a tipos de calçados e ao andar descalço, nos diferentes planos de locomoção, nas situações pré e pós-fadiga. MATERIAIS E MÉTODOS: Trata-se de um estudo observacional transversal, no qual foi utilizado uma amostra de conveniência com 15 mulheres jovens, com idades entre 18 e 35 anos, sedentárias. Os músculos analisados foram: tibial anterior, gastrocnêmio medial e lateral e eretores. A atividade muscular foi avaliada durante a marcha em superfície plana, subindo e descendo escada e rampa. Os calçados utilizados foram salto alto, salto baixo, tênis, chinelo, e também foi feita a avaliação sem o uso deles, ou seja, descalço. RESULTADOS: Os resultados da análise eletromiográfica mostrou que os músculos da perna tiveram maior atividade eletromiográfica pré-fadiga e os eretores, pós-fadiga dos membros inferiores, na maioria das condições e situações. CONCLUSÃO: Condições adaptativas associadas ao uso regular de salto alto foram amplamente questionadas em relação à incidência de lesões. Após fadiga de membros inferiores, houve declínio na atividade dos músculos da perna e aumento do recrutamento dos músculos eretores, justificado pela necessidade de maior estabilidade da coluna e da pelve durante a locomoção de mulheres jovens.

Eletromiografia; Marcha; Avaliação; Fadiga muscular


INTRODUCTION: It is very common women's complaints of discomfort in the lumbar region, caused by the use of high heeled shoes. OBJECTIVE: The objective of this study was to evaluate the electromyographyc activity of the muscles of the leg and spine associated with different types of shoes and barefoot, in various plans of locomotion, before and after fatigue. MATERIALS AND METHODS: This is a cross-sectional study, in which was used a sample of convenience with 15 young women, aged between 18 and 35 years, sedentary. The examined muscles were tibialis anterior, gastrocnemius medialis and lateralis and erector spinae. The muscular activity was assessed during locomotion on flat surface, up and down stairs and in an inclined surface. The shoes were high-heeled, small heeled, snickers, slipper, and it was also made an evaluation in barefoot. RESULTS: The results of electromyographyc analysis showed that the muscles of the leg had greater electromyographyc activity in the position of pre-fatigue of the lower limbs and erector spinae in the post-fatigue of the lower limbs, in most of the conditions and situations. CONCLUSION: Adaptive conditions associated with regular use of high heels has been widely questioned in relation to the incidence of injuries. In post-fatigue of the lower limbs, there was a decline in the activities of the muscles of the leg and increased recruitment of the erector muscles, justified by the need for greater stability of the spine and pelvis during the locomotion of young women.

Electromyography; Gait; Evaluation; Muscle fatigue


ARTIGOS ORIGINAIS

Avaliação da atividade eletromiográfica com ou sem o uso de diversos tipos de calçado, em diferentes planos de locomoção

Evaluation of eletromyographic activity with or without the use of various types of shoes, in different plans

Geraldo Fabiano de Souza MoraesI; Adriana Papini AntunesII; Elaine Souza RezendeIII; Poliana Cardoso Ribeiro de OliveiraIV

IFisioterapeuta, mestre em Ciências da Reabilitação, especialista em Fisioterapia Ortopédica e Esportes, professor assistente do curso de Engenharia de Saúde e Segurança da Universidade Federal de Itajubá – Câmpus Itabira - Belo Horizonte, MG - Brasil, e-mail: geraldmoraes@terra.com.br

IIFisioterapeuta, especialista em Fisioterapia Ortopédica e Desportiva - Belo Horizonte, MG - Brasil, e-mail: dripantunes@yahoo.com.br

IIIFisioterapeuta, Belo Horizonte, MG - Brasil, e-mail: enialerezende@yahoo.com.br

IVFisioterapeuta, Belo Horizonte, MG - Brasil, e-mail:polianacro@yahoo.com.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: São muito recorrentes as queixas de mulheres com desconforto na região lombar durante o uso de sapato de salto.

OBJETIVO: O objetivo deste estudo foi avaliar a atividade eletromiográfica de músculos da perna e eretores da espinha associada a tipos de calçados e ao andar descalço, nos diferentes planos de locomoção, nas situações pré e pós-fadiga.

MATERIAIS E MÉTODOS: Trata-se de um estudo observacional transversal, no qual foi utilizado uma amostra de conveniência com 15 mulheres jovens, com idades entre 18 e 35 anos, sedentárias. Os músculos analisados foram: tibial anterior, gastrocnêmio medial e lateral e eretores. A atividade muscular foi avaliada durante a marcha em superfície plana, subindo e descendo escada e rampa. Os calçados utilizados foram salto alto, salto baixo, tênis, chinelo, e também foi feita a avaliação sem o uso deles, ou seja, descalço.

RESULTADOS: Os resultados da análise eletromiográfica mostrou que os músculos da perna tiveram maior atividade eletromiográfica pré-fadiga e os eretores, pós-fadiga dos membros inferiores, na maioria das condições e situações.

CONCLUSÃO: Condições adaptativas associadas ao uso regular de salto alto foram amplamente questionadas em relação à incidência de lesões. Após fadiga de membros inferiores, houve declínio na atividade dos músculos da perna e aumento do recrutamento dos músculos eretores, justificado pela necessidade de maior estabilidade da coluna e da pelve durante a locomoção de mulheres jovens.

Palavras-chave: Eletromiografia. Marcha. Avaliação. Fadiga muscular.

ABSTRACT

INTRODUCTION: It is very common women's complaints of discomfort in the lumbar region, caused by the use of high heeled shoes.

OBJECTIVE: The objective of this study was to evaluate the electromyographyc activity of the muscles of the leg and spine associated with different types of shoes and barefoot, in various plans of locomotion, before and after fatigue.

MATERIALS AND METHODS: This is a cross-sectional study, in which was used a sample of convenience with 15 young women, aged between 18 and 35 years, sedentary. The examined muscles were tibialis anterior, gastrocnemius medialis and lateralis and erector spinae. The muscular activity was assessed during locomotion on flat surface, up and down stairs and in an inclined surface. The shoes were high-heeled, small heeled, snickers, slipper, and it was also made an evaluation in barefoot.

RESULTS: The results of electromyographyc analysis showed that the muscles of the leg had greater electromyographyc activity in the position of pre-fatigue of the lower limbs and erector spinae in the post-fatigue of the lower limbs, in most of the conditions and situations.

CONCLUSION: Adaptive conditions associated with regular use of high heels has been widely questioned in relation to the incidence of injuries. In post-fatigue of the lower limbs, there was a decline in the activities of the muscles of the leg and increased recruitment of the erector muscles, justified by the need for greater stability of the spine and pelvis during the locomotion of young women.

Keywords: Electromyography. Gait. Evaluation. Muscle fatigue.

Introdução

Um dos aspectos mais prevalentes são queixas de mulheres com desconforto na região lombar durante o uso de sapato de salto (1). Snow e Williams (2) descreveram que pode haver uma relação entre a postura assumida e os desconfortos presentes, geralmente associados à fadiga muscular e ao aumento das forças de reação do solo durante o uso desse tipo de calçado.

Alguns estudos (2-4) demonstraram que as maiores alterações que ocorrem nos membros inferiores, de acordo com a altura do salto, são o aumento significativo na flexão plantar, na mudança da orientação relativa das estruturas ósseas das articulações do tornozelo, metatársica e metatarsofalangeanas, alteração dos ângulos de inserção dos músculos do pé e do tornozelo e diminuição do ângulo máximo do joelho durante a fase de balanço e na velocidade de extensão do joelho.

Trabalhos anteriores sugerem que alterações na atividade muscular terão um efeito previsível sobre as forças de reação do solo. Tais trabalhos demonstraram que os flexores plantares são músculos principais que contribuem para o impulso propulsor na última metade do apoio da marcha (5, 6).

Neptune et al. (7) mostraram que o gastrocnêmio medial é o único flexor plantar que auxilia no início da fase de balanço. Em síntese, há pouco consenso sobre o papel funcional dos músculos individualmente durante a fase de balanço da marcha.

Durante a marcha, o corpo se movimenta de forma semelhante a um pêndulo invertido. Na primeira metade da fase de apoio, a energia cinética é transformada em energia potencial gravitacional, que é parcialmente recuperada; o corpo inclina para frente e para baixo na segunda metade da fase de apoio. Quando uma perna atinge o chão, as energias cinética e potencial gravitacional são armazenadas temporariamente como energia elástica em músculos, tendões e ligamentos e, então, é quase totalmente recuperada durante a fase de impulso (8).

O trabalho estático é altamente fatigante e, sempre que possível, deve ser evitado. Quando isso não for possível, pode ser aliviado por meio de mudanças de postura, uso de sapatos adequados ou por meio de apoios para partes do corpo, com o objetivo de reduzir as contrações estáticas dos músculos (9).

Dentre os melhores recursos para a prevenção, está a opção pelos calçados mais baixos, que dão mais sustentação e equilíbrio e não forçam determinadas áreas do corpo. Outra boa prática é alongar periodicamente os músculos da coxa e da panturrilha (10).

Hoje em dia, as mulheres estão mais inseridas no mercado de trabalho, e o uso de salto é frequente, principalmente associado à questão estética. Devido a relatos de incômodos como dores, alterações posturais e deformidades nos pés, é extremamente importante verificar qual tipo de calçado seria o mais adequado e o mais confortável para o uso diário.

O objetivo deste estudo foi avaliar a atividade eletromiográfica dos músculos da perna e eretores da espinha associados aos tipos de calçados e sem eles (descalço), nos diferentes planos de locomoção, nas situações pré e pós-fadiga.

Materiais e métodos

Trata-se de um estudo observacional transversal, no qual foi utilizada uma amostra de conveniência com 15 mulheres jovens, com idades entre 18 e 35 anos, sedentárias. Os dados foram coletados entre fevereiro e junho de 2008.

Os critérios de exclusão foram mulheres que possuíssem rigidez articular, dor que incapacite a realização dos testes, discrepância de MMII (acima de um centímetro), terem tido entorse de tornozelo há menos de seis meses do estudo, terem sido diagnosticadas com ruptura ligamentar nos tornozelos, terem sido submetidas a cirurgias ou fisioterapia nos membros inferiores há menos de seis meses. Também foram excluídas mulheres obesas – IMC ≥ 30 (11), grávidas, diabéticas, que utilizassem auxílio à marcha e/ou palmilhas, com presença de edema de tornozelo e pés, hipotrofia acima de dois centímetros de panturrilha e coxa, que possuíssem hálux valgo, joanete do V metatarso e neuroma de Morton que impossibilitasse a realização dos procedimentos.

Esse estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Newton Paiva, com o número interno do projeto 0082, de 6 de março de 2008.

Instrumentos

Foi utilizado, para mensurar flexibilidade, um goniômetro universal (Baseline®, Aurora, IL, EUA), tendo duas hastes de 31,5 cm de comprimento e um fulcro com precisão de medida de um grau. A goniometria refere-se à medida dos ângulos formados nas articulações pelos segmentos corporais. Ao utilizar um goniômetro universal, o examinador obtém essas medidas colocando as partes do instrumento junto aos segmentos imediatamente proximal e distal à articulação que está sendo avaliada. É um equipamento de medida do ângulo articular que apresenta validade e confiabilidade já descritas na literatura (12, 13).

Foi utilizado o eletromiógrafo de superfície da marca EMG System, modelo EMG 1600 (EMG System, São José dos Campos, SP, Brasil), conectado a um microcomputador com oito eletrodos de superfície ativos, bipolares, Ag/AgCl. Os resultados dos testes foram armazenados e analisados por um programa específico, seguindo o manual do fabricante.

A eletromiografia (EMG) possibilita o registro dos sinais elétricos gerados pelas células musculares, o que permite a análise da atividade muscular durante o movimento simples ou associado à realização de uma tarefa. A validade e a precisão da avaliação da atividade muscular, por meio da utilização da EMG, estão relacionadas ao processo de detecção dos sinais e à correta condução dos procedimentos de análise, bem como a conhecimentos de possíveis interferências durante o processo de coleta (14, 15).

Locais de análise da locomoção

Utilizou-se um plano com uma distância retilínea de seis metros, uma rampa de um metro e sessenta centímetros, com uma inclinação de 16º, e uma escada com três degraus, com altura de 16 centímetros e largura de 24 centímetros.

Procedimentos

Inicialmente, todas as voluntárias foram esclarecidas quanto aos objetivos e aos procedimentos do estudo e, em seguida, assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Em seguida, foi feita uma avaliação padronizada, por uma avaliadora devidamente treinada, para identificação, anamnese e exame físico de cada voluntária.

Após avaliação, a voluntária realizou um sorteio, por meio de envelope selado, para aleatorização dos planos de locomoção e dos calçados a serem utilizados durante a coleta da atividade muscular, antes e após o protocolo de fadiga.

Foi demarcada uma distância de seis metros para locomoção no plano. Durante a análise, desprezaram-se os dois metros iniciais e finais, a fim de se evitar interferências na coleta da eletromiografia durante a aceleração e a desaceleração da marcha.

Uma avaliadora realizou a tricotomia dos respectivos pontos de inserção dos eletrodos, seguindo as recomendações (14), e a higienização do local por meio de fricção com gaze e álcool. Os músculos analisados foram tibial anterior (TA), gastrocnêmio medial (GM) e lateral (GL) e eretores (ERET), todos bilateralmente. Foram colocados dois eletrodos na região em que a avaliadora detectava, por palpação, a região de maior contração muscular (14). Os eletrodos foram afixados a uma distância de dois centímetros de cada um. Foi colocado um eletrodo "terra" sobre o acrômio direito, como forma de padronização das medidas.

Após a colocação dos eletrodos, observou-se o "silêncio" muscular, e, em seguida, solicitou-se a contração dos músculos a serem analisados, durante os respectivos movimentos realizados, a fim de se confirmar o posicionamento correto do equipamento. Posteriormente, foi realizada a contração voluntária máxima isométrica (CVMI) de cada músculo, para normalização dos dados e posterior análise da atividade muscular. Os dados foram armazenados no programa específico.

A atividade muscular foi avaliada durante a locomoção em solo plano, subindo e descendo escadas (três degraus com 15 centímetros de altura cada), aclive e em declive (16). Os sapatos utilizados foram: salto alto tipo Chanel, salto baixo tipo Chanel, tênis, chinelo modelo Havaianas®, além de ter sido feita a avaliação sem sapatos, ou seja, descalço. Foram considerados sapato de salto alto aqueles com altura entre nove e onze centímetros e, para salto baixo, foram considerados aqueles entre cinco e sete centímetros. Para o tênis, foi necessário que ele tivesse uma elevação de calcanhar de dois a quatro centímetros.

Foi utilizado foot switch para determinar as fases da marcha, flash sincronizado com o eletromiógrafo, a fim de se determinar o início do movimento e o registro da marcha. Um metrônomo foi utilizado para cadenciar e padronizar a velocidade de marcha em 110 passos por minuto, no plano.

Após a primeira coleta, a participante foi encaminhada para um protocolo de fadiga dos músculos do tríceps sural, bilateralmente. Esse protocolo correspondeu à participante executar movimentos de flexão plantar concêntrica e excentricamente, ininterruptamente, até a sensação de queimação e de não suportar mais executar as repetições (16, 17).

Após a aplicação desse protocolo, foram feitas as mesmas medidas pré-fadiga, sendo que a sequência de calçados e as atividades foram previamente aleatorizadas. Todos os dados de análise da locomoção nos diversos planos, utilizando os diversos calçados e de maneira descalça, foram armazenados no programa específico do equipamento, para posterior análise.

Redução dos dados

Para análise eletromiográfica, utilizou-se o programa AqDanalysis, seguindo as recomendações do fabricante. Para normalização dos dados, utilizou-se o cálculo da Root Mean Square (RMS) e cálculo da porcentagem da CVMI. O processamento dos dados eletromiográficos incluiu retificação e filtragem dos sinais. Os dados foram coletados a uma frequência de 1000 Hz e foram filtrados com um filtro passa alta de 10 Hz e um filtro passa baixa de 500 Hz.

Análise estatística

Estatísticas descritivas, testes de normalidade (Shapiro-Wilk) e testes de igualdade de variância (Levene) foram realizados para todas as variáveis, utilizando-se o pacote estatístico Statistical Package of Social Science for Windows (SPSS), na sua versão 15.0 (SPSS Inc©, Chatanoga, IL).

Foi usado o teste Post Hoc com correção de Scheffé para comparações múltiplas, a fim de se determinar o efeito de interação dos calçados. Para análise da influência das situações de pré e pós-fadiga, nos diversos planos utilizados e com os diferentes calçados e de maneira descalça, utilizou-se o t Student para amostras pareadas. O nível de significância estabelecido foi de α igual a 5%.

Resultados

Participaram deste estudo 15 voluntárias, com idade variando entre 18 e 31 anos (23,2 ± 3,36 anos), sedentárias. Das 15 voluntárias, 13 eram destras e duas eram sinistras. A descrição das voluntárias está demonstrada na Tabela 1.

Neste estudo, foram analisados os músculos tibial anterior direito (TAD), tibial anterior esquerdo (TAE), gastrocnêmio medial direito (GMD), gastrocnêmio medial esquerdo (GME), gastrocnêmio lateral direito (GLD), gastrocnêmio lateral esquerdo (GLE), eretor da espinha direito (ERETD), eretor da espinha esquerdo (ERETE), os quais apresentaram diferenças significativas, demonstradas na Tabela 2.

Discussão

Os resultados da análise eletromiográfica dos músculos avaliados demonstram que os músculos da perna apresentaram maior atividade eletromiográfica na situação de pré-fadiga dos MMII, e os eretores da espinha, na situação pós-fadiga dos MMII, na maioria das condições e situações.

O músculo TA é o motor primário para a dorsiflexão de tornozelo e ajuda em sua estabilização (18). No presente estudo, os músculos TAD e TAE apresentaram diferenças significativas quando as voluntárias estavam descalças nas condições descer rampa e subir rampa, respectivamente, durante a fase de balanço da marcha, e com o uso de salto baixo, no plano, durante a fase de balanço da marcha. Além disso, observou-se, também, um aumento na atividade eletromiográfica pós-fadiga, exceto para o TAE descalço-subir rampa.

O músculo TA controla o posicionamento do pé tanto na fase de apoio, com um aumento da estabilidade da base de suporte do segmento em contato com o solo, quanto na fase de balanço, durante o movimento de dorsiflexão, que prepara o pé para o próximo apoio do calcâneo, durante o ciclo da marcha (19, 20). Isso pode ser um fator que justificaria a diferença significativa encontrada nesses músculos ao subir e descer rampa, durante a fase de balanço da marcha.

Bogey, Perry e Gitter (20) descrevem uma rápida ativação do músculo TA, durante a fase inicial de balanço da marcha, como forma de preparação para o descolamento do segmento distal do MI do solo, bem como na fase terminal do balanço, com o objetivo de manter a dorsiflexão do tornozelo, para aumentar a estabilidade para o início da nova fase de contato do segmento distal no duplo apoio.

Com a coativação dos músculos da perna durante o apoio do segmento distal do MI e em função do protocolo de fadiga, uma maior ativação do TA também pode se manifestar como forma de recrutamento desse músculo, para maior estabilidade do segmento distal do MI durante os ciclos da marcha.

Em relação à ativação do músculo GMD, observou-se diferenças significativas quando as voluntárias estavam de chinelo descendo escadas e de tênis no plano, na fase de apoio, e de salto alto no plano, na fase de balanço da marcha. Observou-se, também, um aumento na atividade eletromiográfica pós-fadiga, apenas com o uso do chinelo.

O GME apresentou diferenças significativas na condição descalça descendo escadas e subindo rampa, na fase de apoio de MID da locomoção, com o uso de tênis subindo escadas, na fase de apoio de MIE, de salto alto no plano e descendo rampa, na fase de apoio de MIE, e subindo escadas, na fase de apoio de MID. Observou-se, também, um aumento da atividade eletromiográfica pós-fadiga, apenas com o uso do tênis.

O GLD apresentou diferença significativa na condição descalça, no plano, na fase de apoio da marcha. O GLE apresentou diferença significativa na condição descalça subindo rampa, na fase de apoio da locomoção.

O Gastrocnêmio ajuda na propulsão durante a locomoção do indivíduo nas AVD e nas atividades profissionais. A prevalência de maior atividade desse músculo durante a fase de apoio da marcha pode ser compreendida em virtude da necessidade de manutenção da estabilidade da massa corporal e absorção e dissipação de forças reativas, pois atua tanto na fase do impulso quanto no apoio inicial para controle da flexão do joelho, por ser um músculo biarticular (21).

Gefen et al. (22) demonstraram um aumento na atividade eletromiográfica do GL em relação ao GM com o uso de salto alto em mulheres que tinham hábitos regular e não regular de uso. Avaliaram, ainda, que a fadiga muscular do Gastrocnêmio foi preponderante na porção lateral em relação à medial durante o uso de sapato de salto alto.

Neste estudo, as porções mediais do músculo Gastrocnêmio apresentaram maior atividade eletromiográfica que as porções laterais. Isso pode ser explicado pelo fato de o movimento de inversão dos pés aumentar com o desequilíbrio corporal acentuado pelo uso de sapatos com pouca estabilidade, como chinelo e salto alto, e pelo pouco uso de sapatos com o calcanhar elevado (18, 22).

Os ERET são importantes músculos antigravitacionais que atuam predominantemente de forma estática. Os tecidos passivos, como cápsulas, ligamentos e discos da coluna vertebral, são mais sobrecarregados após os elementos ativos tornarem-se menos efetivos, em detrimento da fadiga muscular (23).

A maioria das condições e situações pré e pós-fadiga dos músculos da perna, avaliadas com o uso dos diversos sapatos e sem o uso deles (descalço), apresentou diferenças significativas para os músculos ERET bilateralmente.

Os ERETE isoladamente apresentaram diferenças significativas apenas com o uso de chinelo subindo escadas, na fase de apoio de MID, e descendo escadas, na fase de apoio de MIE da locomoção. Com o uso de salto alto, apresentou diferenças significativas ao descer escadas, com apoio do MID, e ao subir rampa, tanto com o apoio do MID quanto do MIE. Os ERETD isoladamente apresentaram diferenças significativas com o uso de tênis, ao subir e descer rampa com apoio de MID, e com uso de salto baixo, ao subir escadas com apoio de MID.

Não foram observadas diferenças significativas para os ERET bilateralmente: nas condições descalço no plano e ao subir rampa, tanto com apoio de MID quanto de MIE, e ao descer rampa com apoio de MID; com o uso de tênis, ao subir escadas, tanto com apoio de MID quanto de MIE, e descer rampa com apoio de MIE; com o uso de salto baixo, no plano, tanto com apoio de MID quanto de MIE; ao subir escadas com apoio de MIE, descer escadas com apoio de MID e descer rampa com apoio de MID; com o uso de salto alto, no plano apoio de MIE, subir escadas com apoio de MID e descer escadas com apoio de MIE.

Em relação à atividade eletromiográfica dos músculos eretores da espinha, houve diferença significativa nas condições de pré e pós-fadiga, na maioria das condições de estudos com todos os tipos de calçados e sem o uso deles (descalço). Tais achados contradizem os encontrados no estudo de Bendix et al. (24), no qual os músculos eretores da espinha foram avaliados e não foram observadas diferenças estatísticas significativas com o uso sapatos de salto alto.

A análise eletromiográfica indicou menor atividade dos ERET quando comparado aos músculos da perna na situação de pré-fadiga, em função da menor exigência dos músculos lombares após as voluntárias alcançarem o equilíbrio necessário, calçando os sapatos de salto alto. Pelo fato de ter sido utilizado o protocolo de fadiga, pode-se inferir que os eretores da espinha foram mais recrutados para manter a postura durante a locomoção, compensando a redução da ativação dos outros músculos avaliados. Como sugerido por Lee et al. (25), os músculos eretores se adaptam à situação de fadiga compensando a redução da ativação dos músculos dos MMII.

O chinelo foi o calçado que promoveu maior atividade eletromiográfica dos músculos eretores da espinha, tanto à direita como à esquerda. Tal fato pode ser justificado por ser um calçado instável, sem apoio nas laterais do pé e na região posterior do calcâneo, quando comparado aos outros calçados utilizados.

Relevância clínica

O uso regular de salto, principalmente o alto, pode levar ao aprendizado motor da mulher que usa esse tipo de calçado com frequência, pois a repetição de uma tarefa é um fator determinante para a plasticidade cortical, que, por sua vez, gera automatismo do gesto (26). Consequentemente, pode haver menor recrutamento de fibras para realizar uma tarefa e gasto energético reduzido.

Condições adaptativas, tais como fraqueza, encurtamento e desequilíbrios musculares, associadas ao uso regular de calçados com salto têm sido amplamente questionadas em relação à incidência de lesões como entorses de joelho e tornozelo, além de alterações posturais, como aumento da lordose lombar ou sua retificação.

Portanto, medidas preventivas, tais como implementação de um programa de atividade física regular, com reforço muscular e alongamentos, devem ser prescritas e orientadas às mulheres com esse hábito, além de serem implantadas em empresas, a fim de se prevenirem lesões e quadros álgicos. Dessa forma, poder-se-ia evitar a diminuição na capacidade produtiva, bem como diminuir a taxa de absenteísmo, desonerando o sistema de saúde vigente no país.

Conclusão

A avaliação eletromiográfica demonstrou, na maioria das condições utilizadas, uma maior atividade dos músculos da perna na condição pré-fadiga, principalmente com sapato de salto alto e chinelo, provavelmente pela instabilidade e pelo não hábito de uso regular desses calçados.

Na situação pós-fadiga dos MMII, houve um declínio nas atividades dos músculos da perna e maior recrutamento dos músculos eretores, justificados pela necessidade de mais estabilidade da coluna e da pelve durante a locomoção de mulheres jovens.

Recebido: 16/08/2010

Aprovado: 15/05/2012

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Out 2012
  • Data do Fascículo
    Set 2012

Histórico

  • Recebido
    16 Maio 2010
  • Aceito
    15 Maio 2012
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