Acessibilidade / Reportar erro

Provável sarcopenia e obesidade em mulheres com incontinência urinária no climatério

Resumo

Introdução:

Sarcopenia e obesidade têm relação com diversas condições de saúde. Poucos estudos, entretanto, têm analisado a presença destas condições em mulheres incontinentes no climatério, e não está claro se existe associação destas com a gravidade da incontinência urinária (IU).

Objetivo:

Analisar provável sarcopenia, sarcopenia e obesidade em mulheres com diferentes gravidades de IU na fase do climatério e a associação da sarcopenia com a gravidade da IU.

Métodos:

Estudo transversal realizado em maternidade pública do nordeste do Brasil, em mulheres com IU a partir de 40 anos. Foram avaliadas questões sociodemográficas, histórico uroginecológico, gravidade da IU (Incontinence Severity Index - ISI), força de preensão e medidas antropométricas (circunferência abdominal e índice de massa corporal - IMC). Foram analisadas médias e desvios-padrão, frequências absolutas e relativas, teste T e exato de Fisher (significância de 5%).

Resultados:

Amostra de 177 mulheres com média de 56,3 (± 9,7) anos. Sobre a IU, 69 (39,0%) mulheres apresentavam IU mista e 53,1% gravidade moderada. Apenas 18,1% apresentavam IMC normal, 46,8% obesidade geral e 80,3% obesidade abdominal. Provável sarcopenia (baixa força) foi observada em 35 (20%) mulheres e sarcopenia em 3,4%. Mulheres com IU grave ou muito grave apresentaram menor força de preensão (p = 0,02) e maior IMC (p = 0,04). A sarcopenia foi associada à maior gravidade de IU (p = 0,005).

Conclusão:

Observou-se provável sarcopenia e maior IMC em mulheres com maior gravidade de IU e associação da sarcopenia com a maior gravidade de IU. São necessárias medidas preventivas quanto a tais condições, evitando futuras complicações.

Palavras-chave:
Climatério; Obesidade; Sarcopenia; Incontinência urinária; Mulher

Abstract

Introduction:

Sarcopenia and obesity are associated with several health conditions. Few studies, however, have analyzed the presence of these conditions in climacteric women with incontinence, and the association between these conditions and the severity of urinary incontinence (UI) is not clear.

Objective:

To analyze probable sarcopenia, sarcopenia, and obesity in climacteric women with different UI severities, and the association between sarcopenia and UI severity.

Methods:

This was a cross-sectional study in a public maternity hospital in Northeast Brazil, with women aged ≥ 40 years. Sociodemographic issues, urogynecological history, UI severity (Incontinence Severity Index - ISI), grip strength, and anthropometric measures (waist circumference and body mass index - BMI) were evaluated. Means, standard deviations, absolute and relative frequencies, T test, and Fisher exact test were used (significance at 5%).

Results:

The sample comprised 177 women, with a mean age of 56.3 (± 9.7) years. Regarding UI, 69 (39.0%) women presented mixed UI, and 53.1% presented moderate UI severity. Only 18.1% women had normal BMIs, and 46.8% had general obesity and 80.3% had abdominal obesity. Probable sarcopenia (low strength) was observed in 35 (20%) women, and sarcopenia, in 3.4%. Women with severe/very severe UI presented lower grip strengths (p = 0.02) and higher BMIs (p = 0.04). Sarcopenia was associated with greater UI severity (p = 0.005).

Conclusion:

Probable sarcopenia and higher BMI were observed in women with greater UI severities, and sarcopenia was associated with greater UI severity. Preventive measures are needed in such conditions to avoid future complications.

Keywords:
Climacteric; Obesity; Sarcopenia; Urinary incontinence; Women

Introdução

O processo de envelhecimento fisiológico é acompanhado por diversas alterações, incluindo modifi-cações na composição corporal.11 Nuttall FQ. Body Mass Index: obesity, BMI, and health: a critical review. Nutr Today. 2015;50(3):117-28. DOI Dentro do processo de envelhecimento feminino existe um período denominado climatério, que corresponde ao processo de transição fisiológica da fase reprodutiva para a fase não reprodutiva da vida da mulher.22 Blümel JE, Lavín P, Vallejo MS, Sarrá S. Menopause or climacteric, just a semantic discussion or has it clinical implications? Climacteric. 2014;17(3):235-41. DOI Neste período, a deficiência dos níveis de estrógeno, em decorrência da menopausa, pode acelerar os efeitos do envelhecimento nos tecidos, incluindo o muscular, o que pode trazer consequências para a função dos músculos do assoalho pélvico.33 Johnston SL. Pelvic floor dysfunction in midlife women. Climacteric. 2019;22(3):270-6. DOI

A perda de força muscular, quando associada à perda de massa muscular, é uma condição denominada sarcopenia.44 Cruz-Jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis: Report of the European Working Group on Sarcopenia in Older People. Age Ageing. 2010;39(4):412-23. DOI O European Working Group on Sarcopenia in Older People (EWGSOP) reconhece essa condição como uma doença muscular progressiva e generalizada, que pode apresentar-se de forma grave quando associada também à perda de desempenho físico.55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI

Atualmente, a força muscular prediz com melhor precisão resultados adversos, sendo considerada a medida mais confiável da função muscular. Assim, o EWGSOP, em sua nova definição, considera provável sarcopenia quando é detectada baixa força muscular, utilizando essa medição como o parâmetro principal da sarcopenia.55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI

A sarcopenia pode causar sérios efeitos à saúde, incluindo alterações na mobilidade, risco de quedas e fraturas, o que pode levar a limitações das atividades, incapacidade funcional, comprometimento da quali-dade de vida e mortalidade.55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI,66 Dodds RM, Granic A, Robinson SM, Sayer AA. Sarcopenia, long-term conditions, and multimorbidity: findings from UK Biobank participants. J Cachexia Sarcopenia Muscle. 2020; 11(1):62-8. DOI Embora associada ao envelhecimento, atualmente sabe-se que seu desen-volvimento pode ter início a partir da quarta década de vida.55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI A perda de massa muscular é 20% maior na mulher quando comparada ao homem, sendo essa perda na população feminina a partir da quinta década de vida significativamente maior quando comparada a mulheres entre 40 e 49 anos.77 Janssen I, Heymsfield SB, Ross R. Low relative skeletal muscle mass (sarcopenia) in older persons is associated with functional impairment and physical disability. J Am Geriatr Soc. 2002;50(5):889-96. DOI

Além disso, estudos mostram que ao longo do período de transição da menopausa, as mulheres possuem uma maior tendência ao ganho de peso, bem como ao aumento do índice de massa corporal (IMC) e da circunferência da cintura.88 Karvonen-Gutierrez C, Kim C. Association of mid-life changes in body size, body composition and obesity status with the menopausal transition. Healthcare (Basel). 2016;4(3):42. DOI O acúmulo anormal ou excessivo de gordura é definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como obesidade, considerada um problema de saúde global devido ao aumento da prevalência nas últimas décadas e à sua associação com múltiplas comorbidades.99 World Health Organization Western Pacific Region. Overweight and obesity in the Western Pacific Region: an equity perspective. Manila, Philippines: WHO Regional Office for the Western Pacific; 2017. Full text link

A obesidade acelera o processo de envelhecimento, podendo levar a mudanças no fenótipo muscular e na quantidade e qualidade muscular.1010 Tallis J, James RS, Seebacher F. The effects of obesity on skeletal muscle contractile function. J Exp Biol. 2018;221(Pt 13): jeb163840. DOI Dessa forma, pode ocorrer alteração do desempenho contrátil e da produção de força, comprometendo a função do músculo esquelético,1010 Tallis J, James RS, Seebacher F. The effects of obesity on skeletal muscle contractile function. J Exp Biol. 2018;221(Pt 13): jeb163840. DOI além de resultar em aumento da pressão intra-abdominal, danos estruturais uretrais e vasculares no assoalho pélvico e, consequentemente, disfunções musculares.1111 Park YW, Lee JH. Female urinary incontinence and obesity assessed by anthropometry and dual-energy X-ray absorptiometry: Analysis from the 2008-09 Korean National Health and Nutrition Examination Survey. Low Urin Tract Symptoms. 2019;11(2):O28-33. DOI

Alterações da composição corporal, como sarcopenia e obesidade, parecem estar associadas a inúmeras condições de saúde.66 Dodds RM, Granic A, Robinson SM, Sayer AA. Sarcopenia, long-term conditions, and multimorbidity: findings from UK Biobank participants. J Cachexia Sarcopenia Muscle. 2020; 11(1):62-8. DOI,1010 Tallis J, James RS, Seebacher F. The effects of obesity on skeletal muscle contractile function. J Exp Biol. 2018;221(Pt 13): jeb163840. DOI Dentre estas, a incontinência urinária (IU) é uma das condições mais prevalentes em mulheres de meia-idade e idosas. A IU pode afetar negativamente a qualidade de vida, levando a limitações físicas, funcionais e psicológicas da população acometida.1212 Sussman RD, Syan R, Brucker BM. Guideline of guidelines: urinary incontinence in women. BJU Int. 2020;125(5):638-55. DOI

A International Continence Society (ICS) define a IU como qualquer queixa de perda involuntária de urina,1313 Haylen BT, Ridder D, Freeman RM, Swift SE, Berghmans B, Lee J, et al. An International Urogynecological Association (IUGA)/International Continence Society (ICS) joint report on the terminology for female pelvic floor dysfunction. Int Urogynecol J. 2010;21(1):5-26. DOI sendo classificada em três tipos principais: incontinência urinária de esforço (IUE), urge-incontinência (IUU) e mista (IUM).1414 Juliato CRT, Baccaro LF, Pedro AO, Gabiatti JRE, Lui-Filho JF, Costa-Paiva L. Factors associated with urinary incontinence in middle-aged women: a population-based household survey. Int Urogynecol J. 2017;28(3):423-9. DOI Estimativas apontam que mais de 200 milhões de pessoas no mundo sejam acometidas por esta condição de saúde.1515 Baykuş N, Yenal K. Prevalence of urinary incontinence in women aged 18 and over and affecting factors. J Women Aging. 2020;32(5):578-90. DOI Entre mulheres de meia-idade e pós-menopausa, a prevalência varia de 44% a 57%.1212 Sussman RD, Syan R, Brucker BM. Guideline of guidelines: urinary incontinence in women. BJU Int. 2020;125(5):638-55. DOI

Nesse sentido, um estudo encontrou relação entre condições musculoesqueléticas e queixas de IU, obser-vando associação da IU com a idade avançada, IMC elevado, menor força e menor velocidade da marcha em mulheres idosas.1616 Kim H, Yoshida H, Hu X, Saito K, Yoshida Y, Kim M, et al. Association between self-reported urinary incontinence and musculoskeletal conditions in community-dwelling elderly women: a cross-sectional study. Neurourol Urodyn. 2015;34(4): 322-6. DOI Entretanto, embora existam estudos que abordem a IU no Brasil, até o presente momento poucos analisaram a presença da sarcopenia e obesidade em mulheres incontinentes na fase do climatério e não foram encontrados estudos que tenham analisado possíveis associações com a gravidade da IU.

Compreendendo que a IU pode surgir em resposta à diminuição da força dos músculos do assoalho pélvico e à sobrecarga imposta sobre esses músculos, tendo em vista a alta prevalência dessa condição em mulheres, principalmente de meia-idade e idosas, e sabendo do seu impacto na qualidade de vida e funcionalidade dessas mulheres, o objetivo deste trabalho foi analisar a provável sarcopenia, sarcopenia e a obesidade em mulheres com diferentes gravidades de IU na fase do climatério e, de forma secundária, analisar a associação da sarcopenia com a gravidade da IU.

Métodos

Tipo e local de estudo

Estudo observacional analítico de caráter transversal realizado no serviço de fisioterapia do ambulatório de uroginecologia da Maternidade Escola Assis Chateaubriand (MEAC), maternidade pública do Ceará, Nordeste, Brasil. A MEAC é uma maternidade referência para todo o estado do Ceará, sendo o serviço de fisioterapia do ambulatório de uroginecologia um dos poucos no estado que oferece assistência gratuita e especializada para mulheres com IU.

Sujeitos e seleção da amostra

Trata-se de uma amostra não-probabilística, por conveniência. O recrutamento das participantes foi realizado de forma consecutiva, quando as mulheres chegavam para avaliação fisioterapêutica no ambula-tório de uroginecologia da MEAC. Foram consideradas para esse estudo as mulheres avaliadas no período de julho de 2017 a julho de 2019 que atendessem aos critérios de inclusão.

Critérios de inclusão e de exclusão

Para participar do estudo, as mulheres precisavam ter ingressado no serviço ambulatorial de fisioterapia no período referido, ter 40 anos ou mais e diagnóstico de IU. Além disso, não poderiam apresentar doenças neurológicas e/ou degenerativas, como Parkinson, acidente vascular cerebral, fratura no membro superior dominante ou qualquer outra condição que comprometesse a mensuração da força de preensão e o preenchimento dos questionários, sendo identificadas pelos pesquisadores no primeiro contato ou autorrelatadas pela participante. A desistência ou impossibilidade, de qualquer natureza, em realizar algum dos procedimentos do protocolo de pesquisa foram consideradas como critérios de exclusão.

Coletas de dados e instrumentos utilizados

Previamente à coleta de dados, os entrevistadores foram treinados e supervisionados quanto aos procedimentos realizados. O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da MEAC (CAAE: 69965617.0.0000.5050) e as coletas foram iniciadas após a aprovação. As mulheres foram incluídas de acordo com a ordem de entrada no serviço de fisioterapia uroginecológica da maternidade.

No primeiro contato foram esclarecidos protocolos e objetivos da pesquisa e, em seguida, solicitou-se a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclare-cido (TCLE). Após o consentimento, as informações foram coletadas por meio de um questionário estruturado, avaliação de medidas antropométricas, teste de força de preensão e questionário da severidade da IU. Todas as variáveis serão descritas a seguir.

Variáveis socioeconômicas e demográficas

Quanto ao estado civil, as mulheres foram catego-rizadas em “com parceria” e “sem parceria”. Em relação à etnia/raça, foram classificadas como: branca, parda ou negra. Sobre a escolaridade, foram classificadas em analfabeta, até ensino fundamental completo, até ensino médio completo e ensino superior ou mais. As mulheres foram categorizadas em sim ou não quanto à realização de atividade remunerada.

Histórico uroginecológico e obstétrico

Em relação ao histórico uroginecológico e obstétrico, foram consideradas as variáveis tipo de IU e número de gestações e partos. Sobre os tipos de IU, as mulheres foram categorizadas em IUE, IUU e IUM. A variável número de gestações também foi considerada para análise.

No que diz respeito à transição menopausal, as mulheres foram questionadas quanto à presença ou ausência dos ciclos menstruais, bem como o tempo de ausência desses. Dessa forma, foram categorizadas em três períodos: pré-menopausa (ciclos menstruais regulares, podendo ser mais curtos, porém sem atrasos); perimenopausa (mudança no intervalo dos ciclos maior que sete dias, a partir da observação dos últimos ciclos menstruais, até um ano de amenorreia); e pós-menopausa (mulheres que tenham tido a última menstruação há mais de um ano), seguindo a classificação STRAW (Stages of Reproductive Aging Workshop).1717 Harlow SD, Gass M, Hall JE, Lobo R, Maki P, Rebar RW, et al. Executive summary of the Stages of Reproductive Aging Workshop + 10: addressing the unfinished agenda of staging reproductive aging. J Clin Endocrinol Metab. 2012;97(4):1159-68. DOI

Gravidade da incontinência urinária

A medida de gravidade da IU foi avaliada pelo questionário Incontinence Severity Index (ISI). O ISI é um instrumento breve, validado, que facilita a avaliação e classificação da gravidade da IU.1818 Pereira VS, Constantino e Santos JY, Correia GN, Driusso P. Tradução e validação para a língua portuguesa de um questionário para avaliação da gravidade da incontinência urinária. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(4):182-7. DOI Ademais, possui boa confiabilidade (coeficiente α de Cronbach = 0,93 e coeficiente de correlação intra-classe = 0,96) e uma satisfatória validade de constructo (r = 0,72, p < 0,01).1818 Pereira VS, Constantino e Santos JY, Correia GN, Driusso P. Tradução e validação para a língua portuguesa de um questionário para avaliação da gravidade da incontinência urinária. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(4):182-7. DOI Composto por duas questões, sobre a frequência e a quantidade de perda urinária, o escore final é obtido a partir da multiplicação dos escores da frequência pela quantidade de perda urinária, possibilitando sua classificação em leve, moderada, grave ou muito grave.1818 Pereira VS, Constantino e Santos JY, Correia GN, Driusso P. Tradução e validação para a língua portuguesa de um questionário para avaliação da gravidade da incontinência urinária. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(4):182-7. DOI Para a análise do presente estudo, a gravidade foi categorizada da seguinte forma: leve a moderada e grave ou muito grave.

Exercício físico

No que concerne à prática de exercício físico, as mulheres foram questionadas quanto à realização, tipo de atividade, frequência e duração por semana. No presente estudo, as mulheres foram consideradas como fisicamente ativas quando fizessem regularmente no mínimo 150 minutos/semana.1919 World Health Organization. Global recommendations on physical activity for health, 2011. Genebra: WHO; 2010. Full text link

Medidas antropométricas - Classificação da obesi-dade geral e abdominal

Utilizou-se balança digital da marca Líder®, modelo P-150 C, para a medida de peso (kg) e estadiômetro para registro da altura (m), posteriormente utilizados para o cálculo do IMC (kg/m2). A partir dos valores de IMC, de acordo com a classificação internacional da OMS,2020 World Health Organization. Global database on Body Mass Index [cited 2021 Mar 2]. Available from: https://tinyurl.com/4vp6cjc8
https://tinyurl.com/4vp6cjc8...
foram criadas as seguintes categorias para classificação da obesidade geral: 18,50 a 24,99 (peso normal); 25,00 a 29,99 (sobrepeso); 30,00 a 34,99 (obeso I); ≥ 35,00 (obeso II e III).

Para a mensuração da circunferência da cintura, utilizou-se fita métrica Fiberglass com divisões de 1 mm e a medição seguiu os procedimentos sugeridos pelo documento Waist circumference and waist-hip ratio: report of a WHO expert consultation.2121 World Health Organization. Waist circumference and waist-hip ratio: report of a WHO expert consultation 2008 [cited 2021 Mar 2]. Available from: https://tinyurl.com/mw2ydpp5
https://tinyurl.com/mw2ydpp5...
A participante foi posicionada com os pés unidos, braços cruzados sobre o tórax e foi instruída a relaxar. A medida foi realizada acima das cristas ilíacas e abaixo das costelas, ao final de uma expiração normal. Mulheres com circunferência ≥ 88 cm foram consideradas com obesidade abdominal, conforme proposto pelas diretrizes brasileiras de obesidade definidas pela Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica.2222 Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO). Diretrizes Brasileiras de Obesidade. 4 ed. São Paulo: ABESO; 2016. p. 18.

A circunferência da cintura pode fornecer uma esti-mativa de aumento da gordura abdominal, mesmo na ausência de uma mudança do IMC, evitando alguns erros de classificação.11 Nuttall FQ. Body Mass Index: obesity, BMI, and health: a critical review. Nutr Today. 2015;50(3):117-28. DOI Esses erros podem ocorrer devido ao IMC não diferenciar massa magra e massa gorda corporal, podendo uma pessoa ter um IMC considerado normal mesmo tendo uma alta porcentagem de massa gorda.11 Nuttall FQ. Body Mass Index: obesity, BMI, and health: a critical review. Nutr Today. 2015;50(3):117-28. DOI

Força de preensão

Para a avaliação da força de preensão manual, uilizou-se o dinamômetro hidráulico SAEHAN® - SH 5001 calibrado, que fornece registro da força muscular em quilogramas-força (kgf). A medição foi realizada conforme recomendado pela Sociedade Americana de Terapeutas de Mão,2323 Fess E. Grip strength. In: Casanova JS, editor. Clinical assessment recommendations. 2 ed. Chicago: American Society of Hand Therapists; 1992. p. 41-5. com a voluntária na posição sentada, com ombro aduzido e em rotação neutra, cotovelo posicionado em 90º de flexão e com o antebraço e punho em posições neutras.

Nesta posição, após demonstração pelo avaliador, foram solicitadas contrações máximas sustentadas por cinco segundos, com intervalo de um minuto entre as medições, sendo considerado o membro dominante para a avaliação. Considerou-se a média aritmética das três medidas consecutivas para análise.2323 Fess E. Grip strength. In: Casanova JS, editor. Clinical assessment recommendations. 2 ed. Chicago: American Society of Hand Therapists; 1992. p. 41-5. As mulheres foram classificadas com baixa força de preensão (provável sarcopenia) quando apresentaram valores abaixo do percentil 20 (≤ 13,0 kgf) da amostra.44 Cruz-Jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis: Report of the European Working Group on Sarcopenia in Older People. Age Ageing. 2010;39(4):412-23. DOI

Massa muscular esquelética (MME)

A predição da massa muscular foi obtida a partir da equação de predição da MME proposta por Lee et al.2424 Lee RC, Wang Z, Heo M, Ross R, Janssen I, Heymsfield SB. Total-body skeletal muscle mass: development and cross-validation of anthropometric prediction models. Am J Clin Nutr. 2000;72(3):796-803. DOI (em amostra de adultos entre 20 e 81 anos), a qual teve como referência a ressonância magnética e a seguinte equação final: MME (kg) = (0,244 * MC) + (7,8 * EST) + (6,6 * sexo) - (0,098 * idade) + (etnia - 3,3), onde EST = estatura (m); MC = massa corporal (kg); sexo: 1 = homens e 0 = mulheres; etnia: 1,2 = asiáticos; 1,4 = afrodescendentes, negros e pardos; 0 = caucasianos, brancos.2424 Lee RC, Wang Z, Heo M, Ross R, Janssen I, Heymsfield SB. Total-body skeletal muscle mass: development and cross-validation of anthropometric prediction models. Am J Clin Nutr. 2000;72(3):796-803. DOI

Essa equação foi validada no Brasil e, segundo Rech et al.,2525 Rech CR, Dellagrana RA, Marucci MFN, Petroski EL. Validade de equações antropométricas para estimar a massa muscular em idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2012; 14(1):23-31. DOI a quantidade de MME estimada não diferiu estatisticamente da obtida pela DEXA (Dual-Energy X-ray Absorptiometry), apresentando alta correlação tanto em homens (r = 0,90; p < 0,05), quanto em mulheres (r = 0,86; p < 0,05). Além disso, os autores observaram concordância entre os métodos (Kappa = 0,743; p < 0,001), com elevada sensibilidade (86%) e especificidade (89%), demonstrando não haver dife-rença entre os valores de prevalência da sarcopenia da DEXA e da equação de Lee et al.2424 Lee RC, Wang Z, Heo M, Ross R, Janssen I, Heymsfield SB. Total-body skeletal muscle mass: development and cross-validation of anthropometric prediction models. Am J Clin Nutr. 2000;72(3):796-803. DOI,2525 Rech CR, Dellagrana RA, Marucci MFN, Petroski EL. Validade de equações antropométricas para estimar a massa muscular em idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2012; 14(1):23-31. DOI

Após o valor obtido pela equação de predição da MME, calculou-se o índice de massa muscular esquelética (IMME), considerando IMME = MME [massa muscular esquelética (kg)/altura (m2)]. As mulheres foram classificadas como baixa massa muscular quando apresentaram valores do IMME abaixo do percentil 20 (≤ 7,88 kg/m2) da amostra estudada.44 Cruz-Jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis: Report of the European Working Group on Sarcopenia in Older People. Age Ageing. 2010;39(4):412-23. DOI

Classificação da sarcopenia e provável sarcopenia

De acordo com o novo consenso europeu de sarcopenia estabelecido pelo EWGSOP, a sarcopenia é provável quando detectada baixa força muscular, sendo o diagnóstico confirmado pela associação à baixa massa muscular. A sarcopenia é considerada grave quando encontrada baixa força muscular, baixa massa muscular e baixo desempenho físico associados.55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI Nesse estudo, considerou-se presença de provável sarcopenia quando a mulher apresentava reduzida força de preensão (≤ 13 kgf); e sarcopenia, a reduzida força de preensão (≤ 13 kgf) associada à baixa massa muscular avaliada pelo IMME (≤ 7,88 kg/m2).55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI

Análise dos dados

Para a análise estatística, utilizou-se o software SPSS, versão 20.0 (SPSS, Chicago, IL, USA). A normalidade dos dados foi verificada por meio do teste de Shapiro-Wilk. A análise descritiva da amostra foi apresentada utilizando-se médias e desvios-padrão para as variáveis quantitativas e frequências absolutas e relativas para as variáveis categóricas.

O teste t de Student foi utilizado para as compara-ções das variáveis de composição corporal e força de preensão entre os grupos de gravidade da IU. Por fim, para as análises de associação entre as variáveis categóricas independentes (sarcopenia e obesidade) e a variável dependente (gravidade da IU), utilizou-se o teste exato de Fisher. Para todos os testes foi considerado um nível de significância estatística de 5%.

Resultados

A amostra do presente estudo foi composta por 177 mulheres. Sobre os dados sociodemográficos, observou-se que a média de idade das mulheres foi de 56,31 (± 9,75) anos. Observando pela faixa etária, 61,6% apresentavam idade menor que 60 anos. Quanto à escolaridade, 50,3% possuíam ensino fundamental completo e apenas 9,1% possuíam ensino superior ou mais. A maioria das mulheres referiu parceria (n = 100; 56,5%) e apenas 68 (38,4%) relataram exercer alguma atividade remunerada. Quanto ao número de gestações e partos, observou-se respectivamente as médias de 3,77 (± 2,92) e 3,06 (± 2,42).

Destaca-se que apenas 32 (18,1%) mulheres apre-sentavam IMC normal e 83 (46,8%) foram classificadas dentro das categorias de obesidade. A média de IMC encontrada foi de 30,07 (± 5,42). Em relação à circunfe-rência de cintura, a média foi de 96,83 (± 12,26) e 80,3% apresentavam obesidade abdominal. Demais variáveis e categorias podem ser observadas na Tabela 1.

Tabela 1
Caracterização da amostra (n = 177)

Em relação ao tipo de IU, 39% das mulheres apresentavam IUM. Quanto à gravidade da IU, 4% foram classificadas com severidade leve, 53,1% moderada, 27,7% grave e 15,2% muito grave. Essa variável foi recategorizada em dois grupos para a análise de associação (leve a moderada; grave a muito grave). Esses valores e os demais tipos de incontinência urinária podem ser observados na Tabela 2.

Tabela 2
Tipo e gravidade da incontinência urinária (IU) de acordo com o questionário ISI

A média da força de preensão entre as mulheres avaliadas foi de 18,08 (± 5,61) kgf. Na Tabela 3 podem ser observadas as médias da MME, do IMME, bem como o número de mulheres com baixa massa muscular, baixa força muscular (provável sarcopenia) e os dois déficits associados (sarcopenia: 3,4%).

Tabela 3
Massa muscular esquelética (MME), índice de massa muscular esquelética (IMME), força de preensão e sarcopenia em mulheres com incontinência urinária

Comparando o valor da força de preensão e variáveis de composição corporal entre os diferentes grupos de gravidade da IU, observa-se diferença estatística significativa para a força de preensão (p = 0,02) e IMC (p = 0,04). Mulheres com IU grave ou muito grave apresentaram menor média de força de preensão e maior média de IMC (Tabela 4).

Tabela 4
Comparação da força de preensão, MME, IMME, circunferência abdominal e IMC entre os diferentes grupos de severidade da incontinência urinária

Por fim, de forma secundária, quando analisada a associação da sarcopenia com a severidade da IU (ISI), observa-se diferença estatística significativa (p = 0,005), mostrando que a sarcopenia (déficit de força e massa muscular) está presente em mulheres com severidade grave ou muito grave (Tabela 5).

Tabela 5
Análise da associação entre sarcopenia e severidade da incontinência urinária

Discussão

Este estudo teve como objetivo principal verificar a provável sarcopenia, sarcopenia e a obesidade, bem como a existência de associação entre sarcopenia e gravidade da IU em mulheres com IU na fase do climatério. Observa-se que mulheres com IU grave ou muito grave apresentaram menor média da força de preensão (provável sarcopenia) e maior média de IMC. Observa-se ainda alta frequência de obesidade geral e abdominal, bem como associação de sarcopenia (déficit de força e massa muscular) com maior gravidade de IU.

A baixa força de preensão, considerada como provável sarcopenia, está associada a diversos problemas de saúde, como quedas, fraturas, aumento das limitações funcionais e baixa qualidade de vida.55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI A força de preensão é um marcador não invasivo simples e barato de força muscular, considerado um componente-chave do diagnóstico de sarcopenia.55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI

No presente estudo, 35 mulheres encontravam-se com baixa força muscular, ou seja, com provável sarcopenia. Ao serem comparados os valores da força de preensão entre os diferentes grupos de severidade da IU, observou-se diferença estatística significativa (p = 0,02). A média da força de preensão encontrada foi de 18,0 kgf. Nesse sentido, um estudo propõe valores de referência da força de preensão manual para indivíduos de 18 a 85 anos de idade, sendo considerada para mulheres entre 55 a 59 anos a média de 25,1 kgf no membro dominante.2626 Wang YC, Bohannon RW, Li X, Sindhu B, Kapellusch J. Hand-Grip strength: normative reference values and equations for individuals 18 to 85 years of age residing in the United States. J Orthop Sports Phys Ther. 2018;48(9):685-93. DOI Já o consenso sobre sarcopenia traz o ponto de corte de 16 kgf.55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI Comparando com a amostra do presente estudo, percebe-se um valor médio baixo da força de preensão para mulheres com média de 56 anos. Portanto, esses dados servem de alerta para a adoção de medidas preventivas a fim de evitar que essas mulheres apresentem sarcopenia futuramente, além de outras complicações associadas ao déficit de força. Medidas preventivas como nutrição adequada e prática de exercício físico regular parecem retardar ou reverter a sarcopenia.55 Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI

De forma secundária, a sarcopenia foi encontrada em 3,4% da amostra. Valor aproximado foi observado no estudo de Abe et al.,2727 Abe T, Thiebaud RS, Loenneke JP, Loftin M, Fukunaga T. Prevalence of site-specific thigh sarcopenia in Japanese men and women. Age (Dordr). 2014;36(1):417-26. DOI ao avaliarem mulheres com menos de 60 anos, similar à amostra em estudo, no qual encontraram sarcopenia em menos de 3% das mulheres. Já Simsek et al.,2828 Simsek H, Meseri R, Sahin S, Kilavuz A, Bicakli DH, Uyar M, et al. Prevalence of sarcopenia and related factors in community-dwelling elderly individuals. Saudi Med J. 2019;40(6):568-74. DOI ao avaliarem 909 idosos com idade superior a 65 anos, dos quais 582 eram do sexo feminino, observaram a presença de sarcopenia em 5,2%.

Por meio de uma revisão sistemática, observou-se prevalência de 1 a 29% de sarcopenia em pessoas com média de idade de 59,2 a 85,8 anos, 14 a 29% para aqueles que vivem em instituições de longa permanência e 10% para aqueles em cuidados hospi-talares agudos.2929 Cruz-Jentoft AJ, Landi F, Schneider SM, Zúñiga C, Arai H, Boirie Y, et al. Prevalence of and interventions for sarcopenia in ageing adults: a systematic review. Report of the International Sarcopenia Initiative (EWGSOP and IWGS). Age Ageing. 2014; 43(6):748-59. DOI Segundo Cruz-Jentoft et al.,2929 Cruz-Jentoft AJ, Landi F, Schneider SM, Zúñiga C, Arai H, Boirie Y, et al. Prevalence of and interventions for sarcopenia in ageing adults: a systematic review. Report of the International Sarcopenia Initiative (EWGSOP and IWGS). Age Ageing. 2014; 43(6):748-59. DOI a prevalência da sarcopenia varia bastante na literatura, sendo esta provavelmente justificada pelas diferentes populações e regiões estudadas, bem como devido aos diferentes métodos utilizados para a sua avaliação.

Os mecanismos fisiopatológicos responsáveis pelo desenvolvimento da sarcopenia são múltiplos e complexos, incluindo a inatividade física, patologias, alterações fisiológicas do envelhecimento, nutrição inadequada, entre outros.44 Cruz-Jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis: Report of the European Working Group on Sarcopenia in Older People. Age Ageing. 2010;39(4):412-23. DOI Assim, considerando que a sarcopenia é uma condição multifatorial, ressalta-se que no presente estudo não foram realizadas análises controlando possíveis fatores de confusão, o que possibilita viés de resultados.

Diante desse contexto, e considerando que a média de idade desta amostra foi de 56,3 anos, chama-se a atenção para a presença dessa condição com a força e a massa muscular insuficientes em algumas mulheres. Assim, pensando em longo prazo, essa população poderá evoluir com limitações em sua funcionalidade, isto é, não apenas relacionadas à estrutura e função do corpo, mas também às suas atividades e participação social.

Em relação à obesidade geral, a frequência observada foi de 46,8%, dentro das categorias de obesidade definidas pelo IMC, enquanto a obesidade abdominal foi de 82,1%. Entre mulheres incontinentes, Baykuş e Yenal1515 Baykuş N, Yenal K. Prevalence of urinary incontinence in women aged 18 and over and affecting factors. J Women Aging. 2020;32(5):578-90. DOI observaram frequência semelhante, de 47,7%, avaliada pelo IMC. O número de pessoas obesas vem aumentando mundialmente; em 2016, a OMS relatou que cerca de 13% dos adultos no mundo eram obesos.3030 World Health Organization. Obesity and overweight [cited 2020 Dec 1]. Available from: https://tinyurl.com/ye232zrz
https://tinyurl.com/ye232zrz...
Ademais, estudos mostram que essa prevalência é maior na população feminina quando comparada à masculina.88 Karvonen-Gutierrez C, Kim C. Association of mid-life changes in body size, body composition and obesity status with the menopausal transition. Healthcare (Basel). 2016;4(3):42. DOI O período de transição da menopausa pode contribuir para essa diferença, visto que a literatura tem associado esse período ao aumento do peso corporal e alterações na composição corporal, geralmente na forma de adiposidade abdominal e diminuição da massa muscular magra.88 Karvonen-Gutierrez C, Kim C. Association of mid-life changes in body size, body composition and obesity status with the menopausal transition. Healthcare (Basel). 2016;4(3):42. DOI,3131 Kapoor E, Collazo-Clavell ML, Faubion SS. Weight gain in women at midlife: a concise review of the pathophysiology and strategies for management. Mayo Clin Proc. 2017;92(10):1552-8. DOI

O IMC é uma medida frequentemente utilizada em pesquisas e ambientes clínicos. A circunferência da cintura, porém, torna-se mais relevante, pois considera a distribuição de gordura, sendo este parâmetro um fator preditivo independente para a mortalidade.88 Karvonen-Gutierrez C, Kim C. Association of mid-life changes in body size, body composition and obesity status with the menopausal transition. Healthcare (Basel). 2016;4(3):42. DOI Em um estudo realizado com mulheres de meia-idade (média de 49,9 ± 5,5 anos) no Nordeste, os autores observaram obesidade abdominal em 67,4% das avaliadas,3232 Moreira MA, Zunzunegui MV, Vafaei A, Câmara SMA, Oliveira TS, Maciel ACC. Sarcopenic obesity and physical performance in middle aged women: a cross-sectional study in Northeast Brazil. BMC Public Health. 2016;16:43. DOI número um pouco inferior ao observada no presente estudo (80,3%), que foi realizado apenas com mulheres com IU. Park e Lee1111 Park YW, Lee JH. Female urinary incontinence and obesity assessed by anthropometry and dual-energy X-ray absorptiometry: Analysis from the 2008-09 Korean National Health and Nutrition Examination Survey. Low Urin Tract Symptoms. 2019;11(2):O28-33. DOI observaram que mulheres incontinentes (média de 55,4 ± 13,3 anos) tiveram significativamente maiores valores de IMC (p < 001) e circunferência da cintura (p < 001) quando comparadas a mulheres continentes. Esses achados indicam que mulheres com IU podem apresentar maiores valores de IMC e de circunferência da cintura.

No estudo realizado por Park e Baek,3333 Park S, Baek KA. Association of general obesity and abdominal obesity with the prevalence of urinary incontinence in women: cross-sectional secondary data analysis. Iran J Public Health. 2018;47(6):830-7. DOI mulheres não obesas (< 25 kg/m2) com obesidade abdominal (circunferência da cintura ≥ 80 cm) tiveram maior chance de IU, seguidas por mulheres obesas (IMC ≥25 kg/m2) com obesidade abdominal, o que indica que a obesidade abdominal pode ter um impacto maior na IU do que a obesidade geral.

A obesidade abdominal pode levar a várias consequências metabólicas como a dislipidemia, hipertensão e doença cardiovascular, sendo esta última a principal causa de morte em mulheres na pós-menopausa.3131 Kapoor E, Collazo-Clavell ML, Faubion SS. Weight gain in women at midlife: a concise review of the pathophysiology and strategies for management. Mayo Clin Proc. 2017;92(10):1552-8. DOI Diante disso, faz-se necessário refletir sobre esses valores e voltar a atenção para o controle da composição corporal em mulheres de meia-idade, a fim de tomar medidas preventivas para reduzir complicações futuras. No presente estudo, observou-se alta frequência de obesidade e maior média do IMC em mulheres com IU grave ou muito grave e uma tendência de maior média da circunferência da cintura neste grupo. Dessa forma, a redução do peso corporal é incentivada, pois está relacionada positivamente à melhora dos sintomas de incontinência.3333 Park S, Baek KA. Association of general obesity and abdominal obesity with the prevalence of urinary incontinence in women: cross-sectional secondary data analysis. Iran J Public Health. 2018;47(6):830-7. DOI

A incontinência urinária é considerada um relevante problema de saúde no mundo, pois pode levar ao com-prometimento físico, emocional, psicossocial, sexual, higiênico, entre outros, além de altos gastos em saúde para o sistema público de saúde.1515 Baykuş N, Yenal K. Prevalence of urinary incontinence in women aged 18 and over and affecting factors. J Women Aging. 2020;32(5):578-90. DOI No presente estudo, a maior parte da amostra (39,0%) apresentou IU mista. Dados semelhantes foram vistos no estudo realizado por Juliato et al.1414 Juliato CRT, Baccaro LF, Pedro AO, Gabiatti JRE, Lui-Filho JF, Costa-Paiva L. Factors associated with urinary incontinence in middle-aged women: a population-based household survey. Int Urogynecol J. 2017;28(3):423-9. DOI com 749 mulheres brasileiras de meia-idade (média de 52,5 ± 4,4 anos), nas quais observou-se maior presença de IUM (40,2%). Embora a literatura mostre que o tipo mais comum seja a IUE, a IUM é mais predominante em mulheres mais velhas, além de acometer essa população de forma mais grave.3434 Minassian VA, Bazi T, Stewart WF. Clinical epidemiological insights into urinary incontinence. Int Urogynecol J. 2017;28(5): 687-96. DOI

No que diz respeito à severidade da IU, observamos que mais de 40% da amostra foi classificada como grave a muito grave. Além disso, quando analisada a associação da sarcopenia com a severidade da IU (ISI), observou-se diferença estatística significativa (p = 0,005), mostrando que a sarcopenia (déficit de força e massa muscular) está presente em mulheres com severidade de IU grave ou muito grave. Sobre essa associação não existem evidências na literatura até o momento, embora estudos tenham observado relação da menor força e menor desempenho físico com a IU.1616 Kim H, Yoshida H, Hu X, Saito K, Yoshida Y, Kim M, et al. Association between self-reported urinary incontinence and musculoskeletal conditions in community-dwelling elderly women: a cross-sectional study. Neurourol Urodyn. 2015;34(4): 322-6. DOI,3535 Corrêa LCAC, Pirkle CM, Wu YY, Vafaei A, Curcio CL, Câmara SMA. Urinary incontinence is associated with physical performance decline in community-dwelling older women: results from the international mobility in aging study. J Aging Health. 2019;31(10):1872-91. DOI

Reconhecem-se algumas limitações desta pesquisa, como a avaliação da massa muscular por meio da equação de predição, por medidas antropométricas, embora seja validada em relação ao padrão-ouro, como a ressonância magnética,2525 Rech CR, Dellagrana RA, Marucci MFN, Petroski EL. Validade de equações antropométricas para estimar a massa muscular em idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2012; 14(1):23-31. DOI como também a forma de preenchimento do questionário por meio do autorrelato; entretanto, ressalta-se que são questionários validados e amplamente utilizados em pesquisas. Ademais, considerando que a seleção da amostra do estudo foi por conveniência, chama-se a atenção para possível viés de seleção.

Sugere-se a realização de futuro estudo longitudinal, no qual possa ser analisada a relação de causa e efeito entre a sarcopenia e a gravidade da IU, que não é possível ser observada em estudos transversais. Sugere-se, ainda, a realização de estudos considerando mulheres com e sem IU para análise da sarcopenia, assim como as limitações que esta condição pode trazer relacionadas a atividades e participação social.

Por fim, considerando que a média de idade das mulheres foi inferior a 60 anos, verifica-se um número considerável de mulheres com provável sarcopenia (baixa força muscular) e maior frequência de sarcopenia em comparação a estudos prévios da literatura. Além disso, encontra-se, também, alta porcentagem de obesidade geral e abdominal nesta população. Assim, compreendendo as repercussões que a sarcopenia e a obesidade podem causar, ressalta-se a importância da aplicação de estratégias preventivas, visando a redução de complicações relacionadas a essas condições. Destaca-se, ainda, que a sarcopenia está associada à maior severidade da IU, reforçando a importância da prevenção e recuperação dessa condição, com o obje-tivo de contribuir para a redução da gravidade da IU.

Conclusão

Neste estudo, observou-se a presença de sarcopenia provável (baixa força muscular) e sarcopenia em mulheres na fase do climatério com IU, bem como alta frequência de obesidade geral e abdominal. Além disso, houve associação de sarcopenia com maior gravidade de IU. Dessa forma, sabendo das limitações que essas condições podem trazer a essas mulheres, destaca-se a necessidade de medidas preventivas, que promovam o aumento da massa e força muscular, redução do peso corporal e da circunferência de cintura, além da prática de exercício físico e alimentação adequada, uma vez que a sarcopenia e obesidade são condições reversíveis. Assim, tais medidas também podem contribuir para a redução da gravidade da IU, prevenindo futuras complicações.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Maternidade Escola Assis Chateaubriand e Projeto de Fisioterapia na Saúde da Mulher (PROFISM) da Universidade Federal do Ceará (UFC).

References

  • 1
    Nuttall FQ. Body Mass Index: obesity, BMI, and health: a critical review. Nutr Today. 2015;50(3):117-28. DOI
  • 2
    Blümel JE, Lavín P, Vallejo MS, Sarrá S. Menopause or climacteric, just a semantic discussion or has it clinical implications? Climacteric. 2014;17(3):235-41. DOI
  • 3
    Johnston SL. Pelvic floor dysfunction in midlife women. Climacteric. 2019;22(3):270-6. DOI
  • 4
    Cruz-Jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis: Report of the European Working Group on Sarcopenia in Older People. Age Ageing. 2010;39(4):412-23. DOI
  • 5
    Cruz-Jentoft AJ, Bahat G, Bauer J, Boirie Y, Bruyère O, Cederholm T, et al. Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing. 2019;48(4):601. DOI
  • 6
    Dodds RM, Granic A, Robinson SM, Sayer AA. Sarcopenia, long-term conditions, and multimorbidity: findings from UK Biobank participants. J Cachexia Sarcopenia Muscle. 2020; 11(1):62-8. DOI
  • 7
    Janssen I, Heymsfield SB, Ross R. Low relative skeletal muscle mass (sarcopenia) in older persons is associated with functional impairment and physical disability. J Am Geriatr Soc. 2002;50(5):889-96. DOI
  • 8
    Karvonen-Gutierrez C, Kim C. Association of mid-life changes in body size, body composition and obesity status with the menopausal transition. Healthcare (Basel). 2016;4(3):42. DOI
  • 9
    World Health Organization Western Pacific Region. Overweight and obesity in the Western Pacific Region: an equity perspective. Manila, Philippines: WHO Regional Office for the Western Pacific; 2017. Full text link
  • 10
    Tallis J, James RS, Seebacher F. The effects of obesity on skeletal muscle contractile function. J Exp Biol. 2018;221(Pt 13): jeb163840. DOI
  • 11
    Park YW, Lee JH. Female urinary incontinence and obesity assessed by anthropometry and dual-energy X-ray absorptiometry: Analysis from the 2008-09 Korean National Health and Nutrition Examination Survey. Low Urin Tract Symptoms. 2019;11(2):O28-33. DOI
  • 12
    Sussman RD, Syan R, Brucker BM. Guideline of guidelines: urinary incontinence in women. BJU Int. 2020;125(5):638-55. DOI
  • 13
    Haylen BT, Ridder D, Freeman RM, Swift SE, Berghmans B, Lee J, et al. An International Urogynecological Association (IUGA)/International Continence Society (ICS) joint report on the terminology for female pelvic floor dysfunction. Int Urogynecol J. 2010;21(1):5-26. DOI
  • 14
    Juliato CRT, Baccaro LF, Pedro AO, Gabiatti JRE, Lui-Filho JF, Costa-Paiva L. Factors associated with urinary incontinence in middle-aged women: a population-based household survey. Int Urogynecol J. 2017;28(3):423-9. DOI
  • 15
    Baykuş N, Yenal K. Prevalence of urinary incontinence in women aged 18 and over and affecting factors. J Women Aging. 2020;32(5):578-90. DOI
  • 16
    Kim H, Yoshida H, Hu X, Saito K, Yoshida Y, Kim M, et al. Association between self-reported urinary incontinence and musculoskeletal conditions in community-dwelling elderly women: a cross-sectional study. Neurourol Urodyn. 2015;34(4): 322-6. DOI
  • 17
    Harlow SD, Gass M, Hall JE, Lobo R, Maki P, Rebar RW, et al. Executive summary of the Stages of Reproductive Aging Workshop + 10: addressing the unfinished agenda of staging reproductive aging. J Clin Endocrinol Metab. 2012;97(4):1159-68. DOI
  • 18
    Pereira VS, Constantino e Santos JY, Correia GN, Driusso P. Tradução e validação para a língua portuguesa de um questionário para avaliação da gravidade da incontinência urinária. Rev Bras Ginecol Obstet. 2011;33(4):182-7. DOI
  • 19
    World Health Organization. Global recommendations on physical activity for health, 2011. Genebra: WHO; 2010. Full text link
  • 20
    World Health Organization. Global database on Body Mass Index [cited 2021 Mar 2]. Available from: https://tinyurl.com/4vp6cjc8
    » https://tinyurl.com/4vp6cjc8
  • 21
    World Health Organization. Waist circumference and waist-hip ratio: report of a WHO expert consultation 2008 [cited 2021 Mar 2]. Available from: https://tinyurl.com/mw2ydpp5
    » https://tinyurl.com/mw2ydpp5
  • 22
    Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO). Diretrizes Brasileiras de Obesidade. 4 ed. São Paulo: ABESO; 2016 p. 18.
  • 23
    Fess E. Grip strength. In: Casanova JS, editor. Clinical assessment recommendations. 2 ed. Chicago: American Society of Hand Therapists; 1992 p. 41-5.
  • 24
    Lee RC, Wang Z, Heo M, Ross R, Janssen I, Heymsfield SB. Total-body skeletal muscle mass: development and cross-validation of anthropometric prediction models. Am J Clin Nutr. 2000;72(3):796-803. DOI
  • 25
    Rech CR, Dellagrana RA, Marucci MFN, Petroski EL. Validade de equações antropométricas para estimar a massa muscular em idosos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2012; 14(1):23-31. DOI
  • 26
    Wang YC, Bohannon RW, Li X, Sindhu B, Kapellusch J. Hand-Grip strength: normative reference values and equations for individuals 18 to 85 years of age residing in the United States. J Orthop Sports Phys Ther. 2018;48(9):685-93. DOI
  • 27
    Abe T, Thiebaud RS, Loenneke JP, Loftin M, Fukunaga T. Prevalence of site-specific thigh sarcopenia in Japanese men and women. Age (Dordr). 2014;36(1):417-26. DOI
  • 28
    Simsek H, Meseri R, Sahin S, Kilavuz A, Bicakli DH, Uyar M, et al. Prevalence of sarcopenia and related factors in community-dwelling elderly individuals. Saudi Med J. 2019;40(6):568-74. DOI
  • 29
    Cruz-Jentoft AJ, Landi F, Schneider SM, Zúñiga C, Arai H, Boirie Y, et al. Prevalence of and interventions for sarcopenia in ageing adults: a systematic review. Report of the International Sarcopenia Initiative (EWGSOP and IWGS). Age Ageing. 2014; 43(6):748-59. DOI
  • 30
    World Health Organization. Obesity and overweight [cited 2020 Dec 1]. Available from: https://tinyurl.com/ye232zrz
    » https://tinyurl.com/ye232zrz
  • 31
    Kapoor E, Collazo-Clavell ML, Faubion SS. Weight gain in women at midlife: a concise review of the pathophysiology and strategies for management. Mayo Clin Proc. 2017;92(10):1552-8. DOI
  • 32
    Moreira MA, Zunzunegui MV, Vafaei A, Câmara SMA, Oliveira TS, Maciel ACC. Sarcopenic obesity and physical performance in middle aged women: a cross-sectional study in Northeast Brazil. BMC Public Health. 2016;16:43. DOI
  • 33
    Park S, Baek KA. Association of general obesity and abdominal obesity with the prevalence of urinary incontinence in women: cross-sectional secondary data analysis. Iran J Public Health. 2018;47(6):830-7. DOI
  • 34
    Minassian VA, Bazi T, Stewart WF. Clinical epidemiological insights into urinary incontinence. Int Urogynecol J. 2017;28(5): 687-96. DOI
  • 35
    Corrêa LCAC, Pirkle CM, Wu YY, Vafaei A, Curcio CL, Câmara SMA. Urinary incontinence is associated with physical performance decline in community-dwelling older women: results from the international mobility in aging study. J Aging Health. 2019;31(10):1872-91. DOI

Editado por

Editora associada: Maria Augusta Heim

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    29 Jul 2021
  • Revisado
    11 Fev 2022
  • Aceito
    25 Mar 2022
Pontifícia Universidade Católica do Paraná Rua Imaculada Conceição, 1155 - Prado-Velho -, Curitiba - PR - CEP 80215-901, Telefone: (41) 3271-1608 - Curitiba - PR - Brazil
E-mail: revista.fisioterapia@pucpr.br