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Intensidade tecnológica das exportações mundiais: uma análise de misturas finitas e do "learning-by-exporting"como determinante

Resumos

As características e os determinantes das exportações de bens de alta tecnologia para 123 países, durante o período 1986-2004, são estudados neste texto. Em primeiro lugar, com base na metodologia de misturas finitas, discute-se a existência de clubes de exportadores de alta tecnologia no mundo. São identificados três grupos, exibindo pouca transição de componentes ao longo do tempo, o que demonstra a cumulatividade e a irreversibilidade do comércio tecnológico. Em segundo lugar, valendo-se do modelo de painel, são analisados os determinantes desse tipo de exportação, considerando, entre outras, a importância do learning-by-exporting e do capital humano.

exportações; alta tecnologia; aprendizado; misturas finitas


This text studies the characteristics and determinants of exports of high tech goods to 123 countries worldwide over the 1986-2004 period. Firstly, from the finite mixtures method, the existence of clubs in exporting high tech in the world is discussed. Three groups are identified, showing low transition of components over time, demonstrating the cumulativeness and irreversibility of high tech trade. Secondly, from the panel model the determinants of such exports are analyzed, considering among other things, the importance of learning by exporting and of human capital.

exports; high tech; finite mixtures; learning


ECONOMIA E SOCIEDADE BRASILEIRAS

IProfessora da UFSC

IIProfessor da UFPR

RESUMO

As características e os determinantes das exportações de bens de alta tecnologia para 123 países, durante o período 1986-2004, são estudados neste texto. Em primeiro lugar, com base na metodologia de misturas finitas, discute-se a existência de clubes de exportadores de alta tecnologia no mundo. São identificados três grupos, exibindo pouca transição de componentes ao longo do tempo, o que demonstra a cumulatividade e a irreversibilidade do comércio tecnológico. Em segundo lugar, valendo-se do modelo de painel, são analisados os determinantes desse tipo de exportação, considerando, entre outras, a importância do learning-by-exporting e do capital humano.

Palavras-chave: exportações, alta tecnologia, aprendizado, misturas finitas.

Classificação JEL C100, F140, L600.

ABSTRACT

This text studies the characteristics and determinants of exports of high tech goods to 123 countries worldwide over the 1986-2004 period. Firstly, from the finite mixtures method, the existence of clubs in exporting high tech in the world is discussed. Three groups are identified, showing low transition of components over time, demonstrating the cumulativeness and irreversibility of high tech trade. Secondly, from the panel model the determinants of such exports are analyzed, considering among other things, the importance of learning by exporting and of human capital.

Key words: exports, high tech, finite mixtures, learning.

JEL Classification C100, F140, L600.

1_ Introdução

Diferentes contribuições teóricas e estudos empíricos enfatizam a influência da composição setorial das atividades produtivas sobre as oportunidades de crescimento e o processo de especialização produtiva, tecnológica e comercial. A tecnologia tem papel significante na configuração dos padrões comerciais das economias e no desenvolvimento dos sistemas de inovação nacionais (Dosi, Pavitt e Soete, 1990; Fagerberg e Verspagen, 2007). As características específicas do processo de criação e acumulação tecnológica podem desenvolver um padrão de capacidade e dificultar a mudança da estrutura exportadora (Lall, 2001), num contexto de mudança estrutural das atividades tecnológicas e comércio nas últimas duas décadas.

Em particular, as evidências sugerem que as indústrias que oferecem oportunidades tecnológicas altas - aquelas que lideram a mudança tecnológica no mundo - apresentam as maiores taxas de crescimento nas exportações (Montobbio e Rampa, 2005). Similarmente, há uma associação entre a performance tecnológica e o crescimento exportador ao nível dos países (Laursen e Meliciani, 2000; Malerba e Montobbio, 2003) que depende substancialmente da capacidade deles de desenvolver seu sistema de inovação, como é destacado em Fagerberg e Verspagen (2007).

A importância de tal análise aparece se considerarmos que as diferenças na capacidade tecnológica podem explicar a existência de polarização e clubes de convergência da renda na economia mundial (Castellacci e Archibugi, 2005). Neste sentido, o trabalho seminal de Baumol (1986) aponta a existência de clubes de convergência (OECD, economias centralmente planificadas e países em desenvolvimento) e demonstra que os padrões de convergência diferem entre os referidos grupos. À medida que os estudos sobre crescimento "divergente" foram avançando (Durlauf e Johnson, 1995; Quah, 1996; Pritchett, 1997), os modelos de crescimento endógeno começaram a explorar os possíveis fatores que poderiam explicar os padrões de persistência, polarização e formação de clubes na distribuição da renda mundial (Galor, 1996).

Vários trabalhos formalizaram, recentemente, a ideia de que a existência de clubes de convergência dos níveis de renda per capita é resultado de diferenças em capacidade tecnológica, como dizem Nakajima (2003), Howitt e Mayer-Foulkes (2002) e Castellacci e Archibugi (2005). Esses autores abordam como as diferenças na capacidade tecnológica determinam a existência de três grupos de países:

i. os países avançados, condutores da atividade inovadora;

ii. um grupo de países de renda média, que conseguem imitar as tecnologias estrangeiras;

iii. um cluster de países retardatários, que não são capazes de inovar nem de imitar.

O objetivo principal do trabalho é mostrar que as exportações de alta tecnologia se distribuem heterogeneamente entre os países e também diferenciar os determinantes desse tipo de exportação entre o learning-by-doing e o learning-by-exporting. Será demonstrado que países com maior nível de experiência exportadora acumulada tendem a produzir e a exportar bens de alta tecnologia mesmo quando se controla pelo learning-by-doing da exportação de bens de alta tecnologia.

Para definir o learning-by-exporting, é considerado o paralelo entre esse tipo de aprendizado e o conceito de learning-by-doing (Arrow, 1962). Tal aprendizado é caracterizado pela experiência que surge da resolução de novos problemas durante as atividades. A repetição das mesmas atividades é associada a rendimentos decrescentes no aprendizado; a fim de conseguir resultados crescentes, é necessário que existam situações novas, que estimulem. A participação nos mercados internacionais, mais competitivos, exige que os países (através das suas firmas) resolvam novos problemas a se inserir nesses mercados.

Apesar das prescrições de políticas encorajadoras, as evidências empíricas que documentam a aquisição de tecnologia através da exportação são escassas. Pesquisas recentes que buscam extrair uma relação causal entre exportações e performance das firmas rejeitam essa hipótese em favor da explicação de que firmas mais produtivas são selecionadas para os mercados exportadores (Clerides, Lach e Tybout, 1998; Aw, Chung e Roberts, 2000; Delgado, Fariñas e Ruano, 2002). Eles mencionam que a produtividade das firmas aumenta antes da entrada no mercado internacional e, portanto, concluem que a exportação é um resultado dos ganhos de produtividade em vez de sua causa. Esses estudos são baseados em microdados das firmas em que não são considerados os efeitos de equilíbrio geral trazidos com as exportações.11 Acemoglu (2010) discute como análises baseadas em microdados que desconsideram efeitos de equilíbrio geral podem levar a conclusões errôneas sobre as consequências macroeconômicas das políticas.

O presente trabalho contorna tais problemas existentes nos microdados ao analisar, em uma perspectiva macroeconômica, os efeitos do learning-by-exporting entre países. Propõem-se dois modelos econométricos para analisar a dinâmica das exportações de bens de alta tecnologia (AT). No primeiro deles, um modelo de misturas finitas mostra a divisão em grupos de países segundo os graus de exportação de AT e a evolução desses grupos, crescimento do conteúdo tecnológico das exportações e transição de países entre grupos. A segunda contribuição do artigo é feita por meio de um modelo de painel de dados dinâmicos no qual são separados os efeitos do learning-by-doing daqueles do learning-by-exporting em uma estimação que considera os efeitos de equilíbrio geral do aprendizado.

Os resultados revelam que os países podem ser divididos em três grupos quanto ao conteúdo tecnológico de suas exportações. Tais grupos se assemelham àqueles de capacidade tecnológica estimados por Castellacci e Archibugi (2005) e exibem dinâmica interessante. Enquanto o grupo de baixa exportação de AT fica estagnado entre 1986 e 2004, o grupo seguinte tem decréscimo de sua atividade exportadora de AT. Observa-se aumento no conteúdo tecnológico das exportações apenas no grupo mais avançado. Em compensação, podemos perceber a transição de 8% dos países do primeiro para o segundo grupo e de 11% do grupo intermediário para aquele de alta exportação de AT.

No que diz respeito às evidências sobre os efeitos de learning-by-exporting, podemos verificar que as exportações em geral têm impacto positivo e significante no conteúdo tecnológico do comércio internacional. Através de um painel dinâmico, pode-se também separar os efeitos do learning-by-doing daqueles do learning-by-exporting, ambos positivos e significantes.

O trabalho é organizado como segue. A seção dois apresenta a literatura relacionada com as exportações de alta tecnologia e sua ligação com a experiência exportadora acumulada (learning-by-exporting), o estoque de capital humano e o tamanho do país. A seção três exibe as características dos dados e as variáveis utilizadas, assim como as suas fontes. Na seção quatro, é descrito o método empregado para a análise da distribuição de exportações de alta tecnologia, o modelo de misturas finitas e os principais resultados quanto aos diferentes grupos encontrados para o primeiro e o último ano da amostra. A seção cinco trata da modelagem econométrica, explicitando as especificações e os estimadores utilizados. Na seção seis, estão os resultados encontrados por modelo estimado e alguns testes que validam essas especificações. Para finalizar, são apresentadas as conclusões do trabalho na seção sete.

2_ A relação entre conteúdo tecnológico nas exportações, "learning-by-exporting", e nível de produto

Um grande número de modelos assinala a importância das economias de escala, a diferenciação dos produtos, os recursos humanos, o aprendizado tecnológico, as empresas multinacionais e seu investimento direto externo e os spillovers como determinantes dos padrões internacionais das exportações em geral e as exportações de alta tecnologia em particular. A primeira contribuição pode ser atribuída a Krugman (1979), que desenvolve um modelo de equilíbrio geral no qual só o Norte pode inovar e produzir novos produtos e o Sul imita as tecnologias. Os resultados mostram que os países - como os produtos - podem ser hierarquizados por nível tecnológico, e os países do nível superior dessa escala se especializam nos bens intensivos em tecnologia. Retornos crescentes de escala e inovação de produtos geram especialização no comércio e vantagens de líderes. Em equilíbrio, porém, a imitação reduz as defasagens tecnológicas entre países, e o poder monopolístico dos líderes é temporário. Vários autores expandem esse tipo de análise na linha de crescimento endógeno. Tal linha, usualmente referida como "a nova teoria do comércio", modela a tecnologia como um produto econômico, resultado tanto de investimentos em pesquisas quanto em mecanismos de learning-by-doing ou ainda num contexto de comércio, learning-by-exporting.

No trabalho de Grossman e Helpman (1995), a ênfase recai sobre a hipótese da natureza dos spillovers tecnológicos. Se o conhecimento é livre e pode ser instantaneamente adquirido, existe, então, um estoque internacional de informação científica e técnica: a vantagem comparativa nas atividades inovadoras depende só das diferenças no custo dos insumos, nesse caso, o capital humano. Uma abundância relativa desse insumo implica uma vantagem comparativa no setor tecnologicamente intensivo, dado um melhor resultado em P&D. Se os spillovers têm alcance local, cada país acumula seu estoque de conhecimento em forma proporcional a suas atividades de P&D. Como consequência, as economias com um estoque inicial de tecnologia amplo terão vantagem inicial, independentemente dos recursos relativos que possuam. A experiência prévia, ou seja, os resultados do learning-by-doing ou exporting, mais do que o capital humano e seus custos, determinam a alocação internacional de recursos de P&D. O modelo tem um equilíbrio caracterizado pela aglomeração geográfica das atividades inovadoras, com países capazes de se converter em líderes em setores tecnológicos mediante altas taxas de inovação. Aqui, as condições iniciais de capacidade tecnológica são cruciais, mas, no caso de spillovers globais, as diferenças históricas entre países não têm importância para as vantagens comparativas dinâmicas. A nova teoria do comércio internacional sugere que os países em desenvolvimento são seguidores (technological followers), com escassez de capital humano, e historicamente carentes em conhecimentos científico e tecnológico. Desta forma, e dada a natureza dos spillovers tecnológicos, especializam-se nos recursos naturais e produtos tradicionais intensivos em trabalho e técnicas maduras e importam dos países desenvolvidos os bens que carregam as inovações.

Autores como Dosi, Pavitt e Soete (1990) salientam, dentro da teoria do ciclo do produto, que a distribuição setorial das atividades tecnológicas e exportadoras depende das trajetórias nacionais, específicas e cumulativas que geram vantagens de produtividade em certos setores num país. O processo de competência tecnológica implica trajetórias ao longo de coeficientes fixos e irreversibilidades. Sem embargo, como depois foi reconhecida por Vernon (1979), essa situação começa a mudar no início da década de setenta, quando muitos países em desenvolvimento se transformam em mais experimentados, e suas produções passam a envolver produtos que se encontram nos primeiros estágios do seu ciclo de vida.

Empiricamente, as evidências apontam que a variância em termos de distribuição de exportações mundiais pode ser explicada por um conjunto de variáveis tecnológicas que apresentam o país e cada setor (Amable e Verspagen, 1995; Dosi, Pavitt e Soete, 1990; Fagerberg, 1988; Montobbio e Rampa, 2005). Relações estatisticamente significantes entre variáveis tecnológicas e exportadoras são também apresentadas em termos de padrões de tecnologia e especialização comercial (Malerba e Montobbio, 2003).

Outros trabalhos mostram as diferentes características desse processo nos países em desenvolvimento. Nos referidos países, não só é importante o esforço tecnológico para fechar a defasagem tecnológica, mas também as características de distribuição de habilidades entre os trabalhadores em relação ao investimento direto externo feito por corporações transnacionais e as políticas públicas que conduzam o processo do avanço e difusão tecnológicos e ainda a relação entre tecnologia e resultados nas exportações. Isso porque é reconhecido que o papel das transnacionais e seus investimentos são importantes para o progresso tecnológico; nos países hóspedes, essa relevância varia de acordo com o nível de industrialização e das habilidades dos produtores locais para beneficiar-se das atividades das multinacionais.

Lall (2001) destaca outros fatores que afetam a transferência e a adoção tecnológica nos países em desenvolvimento, como o acesso a bens de capital, tecnologias-chave, upgrading nas habilidades e infraestrutura. Especialmente em países "seguidores", a educação joga um papel-chave na difusão de tecnologias, mais importante nesses países que a criação propriamente dita, como forma de alcançar os estágios sucessivos do processo produtivo. Hausmann, Hwang e Rodrik (2007) sugerem que o tipo de bens no qual um país se especializa terá importantes implicações para os resultados econômicos do futuro, e essa especialização será em parte consequência da qualidade do capital humano.

Fagerberg e Verspagen (2007) mostram que, assim como nos anos oitenta, a imitação tecnológica foi fator significativo para gerar crescimento nos países de baixa renda; durante os noventa, a habilidade de conseguir o catch up dependeu fundamentalmente de desenvolver os sistemas nacionais de inovação em tais países.

Para definir o learning-by-exporting, deve ser considerada a definição de learning-by-doing. No trabalho clássico de Arrow (1962), o autor sugere duas características básicas do aprendizado. Em primeiro lugar, o aprendizado é produto da experiência: o aprendizado se desenvolve tentando resolver um problema; desse modo, só pode ser ampliado durante o desenvolvimento de uma atividade. Em segundo lugar, o aprendizado associado com repetições deve contar com estímulos que ocasionem aumentos de resultados que não possam ser alcançados com a mera repetição. O paralelo com o aprendizado nas exportações é direto. Exportar implica resolver problemas tais como entrar em novos mercados, adotar padrões técnicos para satisfazer esses novos mercados. A produção de bens de exportação pode demandar a introdução de bens de capital mais sofisticados, trabalhadores com maior qualificação e novos insumos. Os mercados de exportação tendem a ser mais competitivos que o mercado doméstico, requerendo que as firmas aprimorem sua qualidade. Todos esses mecanismos podem ajudar no aumento da produtividade ao nível das firmas e por transferência do país (Fernandes e Isgut, 2005).

Com base em um modelo de crescimento endógeno, no qual o learning-by-doing exibe spillovers entre os bens, Young (1991) pesquisa o efeito dinâmico do comércio internacional sobre o crescimento, quando uma economia passa da autarquia para o livre comércio. O autor considera duas economias, LDC (Less Developed Countries) e DC (Developed Countries), e esta última apresenta nível inicial de conhecimentos técnicos maior que a LDC. Os resultados do modelo apontam que, sob livre comércio, a economia LDC experimenta perdas dinâmicas no comércio, em termos de progresso técnico e crescimento, e a economia DC experimenta ganhos. Contudo, desde que o progresso técnico do exterior pode melhorar o bem-estar no país doméstico, os consumidores de LDC aproveitam maior utilidade intertemporal em consequência do livre comércio. No caso do DC, os consumidores desfrutam de um progresso técnico superior, os ganhos estáticos tradicionais do comércio e ainda experimentam melhora no bem-estar intertemporal.

Chuang (1997) incorpora a noção do learning-by-doing induzido pelo comércio dentro de um modelo de crescimento. Duas condições são fundamentais para que isso ocorra: em primeiro lugar, exportações e importações são duas fontes da mesma importância para intensificar o processo de aprendizado. Todavia, a natureza ou as características dos bens comercializados também influenciam o efeito sobre esse aprendizado. Segundo, a abertura comercial é necessária, mas não o suficiente para induzir a um crescimento maior. Um fator-chave nos spillovers tecnológicos que podem aprimorar o padrão do crescimento é com que tipo de país a economia comercia.

3_ Dados, fontes e variáveis utilizados

A classificação de exportações de alta tecnologia utilizada neste trabalho segue duas fontes: OCDE (Hatzichronoglou, 1997) e TradeCAN (CEPAL). A classificação da OCDE foi construída por setor industrial e complementada depois por produto, levando em conta tanto o nível tecnológico específico do setor como a tecnologia inclusa nas compras de bens intermediários e de capital. A classificação a cinco dígitos tem como vantagem inserir só os produtos considerados de alta tecnologia, mesmo que esses se encontrem dentro da cadeia produtiva de menor intensidade tecnológica, evitando problemas de sobre-estimação ou subestimação de produtos, considerados de alta intensidade tecnológica. Existem, entretanto, algumas desvantagens na utilização desta base:

a. painel desbalanceado: só a partir de 2000, contamos com uma amostra significativa de países;

b. isso impossibilita comparar valores médios e desvios padrão da variável objeto de estudo, dado que não contamos com uma série balanceada ao longo dos anos de estudo, incorporando-se países nesse período.

A classificação de TradeCAN é de três dígitos e, em comparação com a classificação da OCDE, em alguns setores sobre-estima e em outros subestima os bens considerados de alta tecnologia. Como vantagem para sua utilização, pode ser citada a possibilidade da construção de uma série temporal balanceada, o que facilita a comparação durante esse tempo, a possibilidade de conformação de um painel balanceado. Uma comparação de ambas as bases permite concluir que, mesmo existindo diferenças, elas não são determinantes na conformação dos resultados.

Os dados de variáveis macroeconômicas como PIB, poupança doméstica bruta (gds), investimento direto externo (fdi), abertura da economia (medida pela razão importações + exportações/PIB) e população foram captados do Penn World Table, mark 6 (dados até 2003) e do World Development Indicators (dados de 2004). Os dados de educação (taxa bruta de matrículas no ensino médio) são de Barro e Lee (2000) e do World Development Indicators (anos 2001 a 2004).

São considerados 123 países. Não são levados em conta os países da ex-União Soviética e Europa Oriental, tendo em vista que, no período considerado, esses mudaram, depois de 1989. Não são considerados outros países por falta de dados ou por serem muito pequenos, com menos de um milhão de habitantes.

Nossa hipótese estabelece que países com maior nível de experiência exportadora acumulada tendem a produzir e a exportar bens de alta tecnologia, associados com indústrias jovens e com certas características desejáveis do ponto de vista da competitividade22 Como será tratado na seção 4, as exportações de alta tecnologia estão altamente correlacionadas a indicadores tecnológicos como o calculado pelo World Development Indicators (WDI). e do crescimento econômico.

A determinação empírica dessa hipótese implica a eleição de uma proxy para learning-by-exporting. Uma vez que o nosso interesse é conhecer os padrões da especialização do comércio como a intensidade tecnológica das indústrias dos diferentes países, podemos aceitar que uma proxy relevante para learning-by-exporting é a experiência exportadora acumulada, como sugere Chuang (1997). Dessa forma, definiremos as exportações acumuladas per capita, relativas à experiência acumulada de seus parceiros no comércio. Como os níveis de exportação acumulada per capita apresentam forte tendência temporal, será utilizada a razão de exportações de manufaturas per capita de cada país dividido pela maior exportação per capita da amostra. Dessa maneiras, a proxy para o aprendizado induzido pelo comércio exterior, LBE, será dada por:

Em que EXPt,Τ denota as exportações do país j no tempo Τ, N(j, Τ) denota a população desse país no mesmo período, e maxj representa a maior exportação acumulada per capita nos nossos dados.

4_ A distribuição das exportações de alta tecnologia

Uma primeira avaliação de grande utilidade é a análise exploratória dos dados, que ajuda, com base na análise gráfica e dos estimadores não paramétricos, a conhecer como se apresenta a distribuição da variável objeto de estudo.

Na continuação, tem-se a figura de densidade de Kernel33 Em termos teóricos, o estimador de densidade de Kernel, introduzido por Rosenblatt (1956), generaliza o histograma, usando uma função alternativa de pesos. para os anos 1986 e 2004. Uma primeira observação permite inferir que essa variável mostra um comportamento assimétrico para a esquerda, o que significa que a maior parte dos países da amostra tem percentagem extremamente baixa de exportações de alta tecnologia sobre o total de exportações.

A comparação entre 1986 e 2004 permite vislumbrar alguma dinâmica intradistribuição e uma possível formação de clubes, especialmente no ano 2004, o queserá posteriormente analisado valendo-se do teste de misturas finitas (Gráfico 1).


Para analisar a possível existência de grupos dentro da distribuição de exportações de alta tecnologia, deve ser definida a distribuição de misturas finitas, modelo que será utilizado para testar a ocorrência, ou não, desses grupos.

Seja fX a densidade de distribuição das exportações de alta tecnologia cross-country de um ano e seja fY a densidade das exportações de AT, então

fY (y) = fX(e y)ey. A multi-modalidade surge de fX como uma mistura finita de outras densidades unimodais, nessa situação:

Em que os pesos pi > 0, Σpi = 1 e g(x; µ, Σ) são uma família de densidades paramétricas, a distribuição log-normal. Nesse caso, na distribuição de exportações de alta tecnologia cross-section, os componentes correspondem a grupos com diferentes níveis de exportação de AT como porcentagem do total de exportações. Uma característica importante dessa metodologia é que o número de componentes é preservado se os dados são modificados via transformação estritamente monotônica.

Em primeiro lugar, considera-se o teste de um sobre dois componentes no mix. O problema a testar é: H0: fY é normalmente distribuída contra H1: fY é de forma (1). A função verossimilhança é dada por:

Em que C é uma constante fixa (neste caso C = 2). Sejam os parâmetros que maximizam In(p, µ1, µ2, Σ) e (µ, Σ) os que maximizam In(1/2, µ, µ, Σ). A hipótese H1 é rejeitada para valores grandes da estatística LRT modificada:

Para valores desconhecidos de Σ, a distribuição assintótica de Mn é desconhecida; sem embargo, Chen, Chen e Kalbfleisch (2005) demonstraram que a distribuição chi-quadrado é uma boa aproximação (no limite superior). O teste pode ser ampliado para analisar a presença de mais de dois componentes.44 Na prática, o teste dos autores para conhecer a presença de mais de um componente na distribuição segue os seguintes passos: a) Estimar uma distribuição normal para a distribuição da variável utilizada em log, obtendo os parâmetros da média e a variância. b) Calcular os MLEs modificados dos dois componentes com variância igual e parâmetro de penalização C = 2. O resultado deverá nos dar: as médias, a variância, a probabilidade. c) Ver o resultado da função de LR modificada e o valor de p do limite superior da estatística chi-quadrado. Esse resultado deverá nos levar a concluir se rejeitamos a hipótese de um componente simples a favor da hipótese de dois componentes. d) Em seguida, podemos testar dois sobre três ou mais componentes.

Na continuação, na Tabela 1, é apresentado o resultado do modelo de misturas finitas para três componentes dentro da amostra para os dois anos, dado que a estatística Χ² para o teste de três contra dois componentes determina a rejeição da hipótese nula a favor da existência de três componentes na amostra, tanto em 1986 como em 2004.

Na Tabela 1, podemos ver que as médias dos grupos entre o ano inicial e o final da amostra se mantêm em valores muito próximos, com diferenças estatisticamente insignificantes. Por outro lado, a frequência dentro de cada grupo sofre bastante alteração nesse período. A coluna p apresenta a frequência de países nos grupos determinados. Neste caso, vemos que a frequência de países com baixa percentagem de exportações de alta tecnologia cai de 51% para 42%, a frequência do grupo intermediário se mantém quase inalterada (variação de -3%) e aquela do grupo com uma média de 27% de exportações de alta tecnologia, no total de exportações, aumenta de 10% para 22%. Isso estaria indicando uma obilidade intradistribuição importante nos grupos.

A literatura econômica traz uma explicação para essa evidência. O processo de mundialização da produção alargou o leque de países com acesso à produção de bens de alta tecnologia por meio da implementação de investimento direto estrangeiro (FDI). Xu e Wang (1999) dividem as economias pelo nível de renda em três grupos e verificam que o grupo dos países ricos é favorecido pelo comércio mediante a importação de bens de capital e a utilização de patentes internacionais. Países de renda média são favorecidos pela importação de bens de capital, enquanto o grupo de países pobres apenas da produção de bens patenteados no exterior. O aumento do fluxo de comércio intraindústria (mundialização do processo produtivo), com o respectivo aumento dos níveis de investimento direto estrangeiro, é uma hipótese que não pode ser rejeitada na explicação da migração de países de média intensidade tecnológica de exportações para um grupo de alta intensidade. Mesmo a migração de 9% dos países de baixa intensidade tecnológica para o grupo de média intensidade pode estar ligada a tal processo.

Como demonstrado por Grossman e Rossi-Hansberg (2008), o comércio mudou nas últimas décadas de simples trocas de bens por uma crescente troca de valores agregados em diversas fases do processo produtivo, o que denominam de "comércio de tarefas" (trade in tasks). A consequência do avanço das tecnologias de comunicação e transporte levou várias firmas com capacidade de gerenciar uma escala de produção em nível global a localizar parte de sua produção em economias que lhes trouxessem custos menores de acordo com a etapa do processo produtivo. Os autores mostram ainda que os efeitos dessa oferta externa de tarefas são análogos a uma mudança tecnológica intensiva em determinado fator (aquele abundante nas regiões exportadoras de tarefas).

A configuração desses grupos e a forte correlação encontrada entre as exportações de alta tecnologia e o indicador de tecnologia calculado pelo WDI55 O coeficiente de correlação entre o percentual de exportações de alta tecnologia sobre o total de exportações de cada país e o score tecnológico (do indicador de competitividade do WDI) é de 0,5622 (estimativas dos autores). podem estar confirmando a presença de três clusters, que estabelecem Castellacci e Archibugi (2005), de acordo com diversos indicadores tecnológicos:66 Inclui medidas de oito características: patentes, artigos científicos, penetração de internet, penetração de telefonia, consumo de eletricidade, matrículas no ensino terciário em Ciências e Engenharia, anos médios de estudo e taxa de alfabetização.

i. Cluster 1: Avançados (grandes habilidades, alta inovação, lideres dinâmicos) - Grupo dos países mais avançados tecnologicamente composto de um pequeno conjunto de economias industrializadas. Os membros do cluster se mantêm relativamente estáveis ao longo do tempo, sendo a maior mudança datada do início do século XXI com a entrada de uns poucos países muito dinâmicos da Ásia (Cingapura, Hong Kong e Coreia do Sul).

Para esses autores, os amplos aumentos dos indicadores que utilizam para medir a capacidade tecnológica provocam rápido avanço da fronteira tecnológica na última década, fazendo o processo de catching up pelos países seguidores mais e mais dificultoso.

ii. Cluster 2: Seguidores (habilidades médias-altas, baixa inovação, lento catching up) - Comparado com o cluster anterior, este grupo mostra habilidade muito menor para criar e imitar conhecimentos avançados. Os membros deste cluster se mantêm relativamente estáveis durante a década de 90 e início dos anos 2000, e seu núcleo está constituído por economias do Sudeste da Ásia, do Sul da Europa, do Oriente Médio, da América Latina mais o grupo de países que conformavam a Ex-União de Repúblicas Socialistas Soviéticas.

No início dos anos 2000, produzem-se algumas mudanças neste grupo, especialmente a saída de um pequeno conjunto de economias dinâmicas da Ásia e da Europa continental que se move para o grupo de países tecnologicamente avançados, com a entrada de alguns poucos países que rapidamente melhoraram sua capacidade tecnológica ao longo de 1990, da Ásia, do Oriente Médio, da América Central e da África.

iii. Cluster 3: Marginalizados (habilidades baixas, inovação baixa, catching up quase inexistente) - Trata se do maior grupo de países, reunindo mais de 60% da população mundial nos anos 1990 e produzindo só 23% do PIB mundial no começo da década de 2000. O núcleo deste cluster é constituído por grandes economias mundiais e ainda quase todos os países da África. Os membros se mantêm relativamente estáveis, e só um restrito número de economias conseguiu administrar o catch up e juntar-se ao cluster de "seguidores" nos anos 2000 (China, Indonésia, Vietnã, Iran, Omã, uns poucos países da América Central e da África). Algumas dessas economias que lograram a saída do referido cluster são muito grandes; então, o peso deste clube tecnológico na economia mundial é muito menor no início dos anos 2000, tanto em termos de população (32,5%) como de PIB (menos de 8%).

Em termos de habilidade para criar e imitar novas tecnologias, este grupo está muito distante da fronteira tecnológica, mas também consideravelmente distante dos países seguidores do segundo cluster.

5_ Modelagem econométrica

A pesquisa estará articulada em duas partes empíricas. Em primeiro lugar, será estimado um modelo de efeitos fixos com variável instrumental. Em segundo, será estimado um modelo de painel dinâmico. A seguir se apresenta uma justificativa para a utilização de cada uma dessas metodologias.

5.1_ Efeitos fixos com variável instrumental

A natureza da relação entre exportações de alta tecnologia, nível do PIB e educação permite inferir que a relação de causalidade não é clara. A endogeneidade entre as variáveis evidencia a necessidade de utilização de ferramental econométrico adequado para o tratamento de tais variáveis.

Neste sentido, o crescimento do PIB mundial e o crescimento do comércio parecem ser bons instrumentos, uma vez que estariam justificando o crescimento do learning-by-exporting, já que o componente principal dessa variável são as exportações de bens manufaturados. Num contexto de elevado grau de interdependência das economias nacionais, internacionalização crescente dos mercados e das estruturas produtivas, o PIB mundial responderia pelo regime de demanda externa influenciando a dinâmica das exportações.

A especificação de variáveis instrumentais padrão considera o seguinte modelo:

em que exatit corresponde a exportações de alta tecnologia (% total) do país i, no período t, lbeit é a experiência exportadora acumulada, eduit é a taxa bruta de matriculas no ensino médio, como proxy do estoque de capital humano, lngdpit é o nível do PIB, Zit é o conjunto de variáveis de controle que podem ajudar a explicar as exportações de alta tecnologia, ui capta o efeito fixo, Εit é o erro não correlacionado com as variáveis explicativas.

O conjunto de variáveis de controle Zit inclui a abertura ao comércio externo (medida pela razão de (exportações + importações)/PIB); o grau de abertura do país; o montante de investimento direto externo, fdi; o grau de especialização em exportações de recursos naturais, rrnn; a taxa de poupança doméstica (% PIB); e a taxa de poupança interna.

O modelo acima considera que o crescimento do PIB mundial e o crescimento do comércio mundial influenciam a experiência exportadora de bens dos países e esta, por sua vez, influencia o aumento das exportações de alta tecnologia do país i. Estimativas consistentes podem ser obtidas por meio da estimação de mínimos quadrados em dois estágios (2SLS).

O teste de Hausman verifica a validade da hipótese de ausência de diferença sistemática entre os parâmetros de um modelo de efeitos fixos e um modelo de efeitos aleatórios. A estatística do teste é dada por:

5.2_ Painel dinâmico

É possível especificar, ademais, um modelo dinâmico incluindo a defasagem da variável dependente (Arellano e Bond, 1991):

A variável dependente defasada é incluída como variável para ajustamento dos efeitos do tamanho desta variável no ano anterior. Os efeitos não observáveis específicos dos países são representados pelo parâmetro ui , enquanto os erros aleatórios independentes são representados por Εit. A inclusão da variável dependente defasada no segundo modelo introduz um viés nas estimativas obtidas por meio do método least square dummy variables (LSDV).

Dado o modelo na forma matricial,

podemos utilizar E(x'iΕi ) = 0 como condição de igualdade de momento populacional.77 A ideia-chave da estimativa de momentos é que, tendo em vista um conjunto de pressupostos do processo de geração de dados, podemos estabelecer regras de igualdade sobre momentos condicionados populacionais e, então, analogamente, utilizar sobre a amostra disponível esses mesmos momentos condicionados para se obter os estimadores. A partir da analogia dos momentos amostrais, chega-se a:

Resolvendo esta equação para β, temos que

Supondo um conjunto de instrumentos Z, para os quais E(Z'Ε) = 0, uma condição do momento populacional para a estimativa do Método dos Momentos Generalizados será:

que possui o análogo amostral apontado por

Escolhendo-se a estimativa β, que minimiza a expressão

em que W é uma matriz de pesos, temos uma solução similar ao estimador 2SLS apresentada por:

com matriz de variável assintótica dada por:

em que

Uma estimativa consistente de V-1 que minimiza Ω e produz estimativas robustas para os erros padrão é:

Simulações de Monte Carlo foram realizadas por Arellano e Bond (1991) para a verificação da consistência dos estimadores GMM. Os resultados apontaram a existência de viés no estimador de Anderson-Hsiao, em razão de este último não utilizar todos os possíveis instrumentos disponíveis nos dados no contexto de GMM. Na prática, a partir das t-2 condições restantes, esse estimador verifica a existência de instrumentos apropriados para o tratamento da correlação entre ∆yit-1 e ∆uit. Os resíduos transformados satisfazem grande número de condições de momentos da forma E(z'it∆uit ) = 0 em que

representa os instrumentos utilizados no período de tempo t.

Reescrevem-se as condições de momento populacional e o equivalente amostral como E(Z'u) = 0 e

em que o estimador ótimo do Método dos Momentos Generalizados é obtido por:

Os estimadores do Método dos Momentos Generalizados possuem uma propriedade fundamental: para determinado T fixo e é consistente e possui distribuição assintótica normal, N(θ, Σ) , com matriz de variância consistente assintótica dada por

6_ Resultados

Para a comparação dos efeitos da variável LBE, educação e PIB sobre o crescimento das exportações de alta tecnologia, assim como a contribuição do PIB mundial e do comércio como variáveis instrumentais, foram estimados dois tipos de modelo. Num primeiro estágio, modelos de efeitos fixos e aleatórios com variável instrumental e sem ela. Em segundo lugar, o modelo de Arellano e Bond que utiliza como instrumento a variável dependente defasada. Neste caso, estimam-se os seguintes casos:

i. Arellano-Bond,

ii. Arellano-Bond com erros robustos;

iii. Arellano-Bond em dois estágios.

Os resultados da Tabela 3 dizem respeito ao resultado dos diferentes métodos de estimação e da contribuição da variável instrumental para a correção de endogeneidade entre as variáveis exportações de alta tecnologia, learning-by-exporting e educação. O teste para a escolha entre o modelo de efeitos fixos e de efeitos aleatórios mostra que as estimativas obtidas por meio do modelo de efeitos aleatórios são não consistentes, como pode ser constatado na Tabela 2. Este resultado é encontrado mesmo controlando-se a endogeneidade existente entre as variáveis através da estimação em dois estágios, como pode ser observado na Tabela 3.

Nota-se relação positiva e significante entre as exportações de alta tecnologia e o nível inicial de experiência exportadora acumulada. O impacto da experiência acumulada, lbe, sobre as exportações de alta tecnologia (como % do total de exportações) é importante: um fechamento de 1% na defasagem de experiência acumulada entre um dado país e aquele que tem a experiência máxima aumenta o conteúdo de exportações de alta tecnologia desse país (relativo ao país com a maior experiência) entre 0,8% e 1,24%.

Percebe-se redução da intensidade dos impactos positivos na medida em que se utiliza um conjunto de instrumentos (coluna dois). Maior estoque de capital humano relativamente instruído provoca efeito positivo e significativo nas exportações de alta tecnologia. O nível de PIB também aparece como uma das variáveis que influenciam positivamente a variável dependente.

Verifica-se que a especialização exportadora em recursos naturais (variável de controle) atua de forma negativa e significativa sobre as exportações de alta tecnologia, o que implicaria um trade-off na especialização produtiva nos países.

A estimação mediante efeitos fixos específicos de cada país é relevante e necessária para controlar as importantes diferenças entre os países não observadas. Sem embargo, uma vez que muito da variação pode ser considerada num sentido cross-sectional mais do que entre países, foi realizada uma regressão pooled, que remove os efeitos fixos dos países, de forma a demonstrar que os resultados não aparecem como um "artifício" da metodologia dos efeitos fixos. Os resultados são similares aos apresentados, considerando erros robustos. Em particular, o coeficiente da variável lbd é positivo e significante, apenas com um pequeno viés negativo.

Na Tabela 4, a seguir, são exibidos os modelos de Arellano e Bond. Uma redução de 1% na defasagem de experiência acumulada aumenta, em média, o conteúdo de exportações de alta tecnologia em 0,8%, com respeito ao país de maior experiência acumulada.

O efeito de persistência da série, medida do learning-by-doing, dada pela inclusão da variável dependente defasada no modelo, possibilita descontar parte do efeito das exportações de alta tecnologia, em razão de o país "ter uma experiência acumulada grande" no período t-1. As diferentes estimações mostram um efeito persistência alto, em torno de 73%. Esse resultado indica a importância sobre o efeito das estratégias individuais dos países quanto a políticas de export-high-tech-led growth.

Todas as variáveis instrumentais se mostraram significativas. A variável especialização de recursos apresentou sinal negativo, como esperado. A abertura da economia se mostrou positiva, assim como os investimentos diretos externos.

O teste de Sargan permite inferir acerca da validade da instrumentalização utilizada. Sob a hipótese nula de que os instrumentos são válidos, a estatística do teste é dada por:

A rejeição da hipótese nula revela que os instrumentos utilizados não são válidos. Nos modelos da Tabela 4, o teste de Sargan não rejeitou a hipótese de validade dos instrumentos em todos os casos.

Os resultados apontam que os países conseguem aumentar a quantidade de exportações de bens de alta tecnologia quando estão mais expostos à concorrência dos mercados mundiais, ou seja, quando maior é o learning-by-exporting. Os países, através das suas firmas, quando exportam aprendem por que entrar em mercados de exportação exige resolver novos problemas, como, por exemplo, adotar novas normas técnicas, introduzir equipamentos mais eficientes e assegurar a qualidade dos produtos para satisfazer os novos mercados. Esse aprendizado é positivo para aprimorar a pauta exportadora, passando a exportar bens de alta tecnologia. Fernandes e Isgut (2005) estimam ganhos de 5% do learning-by-exporting no nível da firma. Os efeitos do learning-by-exporting são maiores que aqueles estimados por meio dos microdados de firmas exportadoras, já que captam também os efeitos de equilíbrio geral em virtude do aprendizado de firmas exportadoras.

7_ Observações finais

Este trabalho teve como objetivo conhecer a forma em que a distribuição das exportações de alta tecnologia se apresenta, bem como encontrar os determinantes dessas exportações. A análise se justifica pela importância do comércio e da tecnologia para o crescimento dos países.

A primeira conclusão que podemos tirar diz respeito à distribuição de exportações de alta tecnologia. Para os países com menor percentual de exportação de alta tecnologia, o valor da média permanece inalterado; no caso dos países com um percentual intermediário de exportações tecnológicas, a média diminui, e o resultado mais pronunciado se dá no caso de países com porcentagem alta, para os quais o coeficiente aumenta bastante. Enquanto cai à proporção de pertencer ao grupo um e ao grupo dois, aumenta a proporção de pertencer ao grupo três, aquele que mostraria os países com maior porcentagem de exportação sobre o total. Esta conclusão deve ser cuidadosamente analisada, porque indicaria que países tecnologicamente retardatários poderiam ter conseguido captar certas tecnologias e mudar de grupo. Tal asseveração, porém, requer uma análise dentro de cada rubrica, no sentido de que as rubricas que compõem as exportações de alta tecnologia não mudaram no período de quase vinte anos, que vão de 1986 até 2004, o que poderia significar que certos países começaram a exportar bens que já não podem ser considerados de alta tecnologia, dado os avanços que foram produzidos ao longo desse período.

A segunda conclusão tange à influência do learning-by-exporting na produtividade e nos custos produtivos. Os ganhos dessas atividades são maiores nas indústrias de alta tecnologia e declinam quando o conteúdo tecnológico declina, e as indústrias ficam maduras (Fernandes e Isgut, 2005). Desta forma, melhor entendimento dos determinantes dos fluxos de comércio internacional requer considerar a inter-relação entre o aprendizado produtivo-exportador e os conteúdos tecnológicos das atividades produtivo-exportadoras.

Nessa direção, investigamos empiricamente como o learning-by-exporting influencia a natureza da especialização dos países na produção e, consequentemente, no comércio. Usando dados em painel de 123 países e o período de 1986 a 2004, foi encontrado que tal variável ajuda a explicar a variação no conteúdo tecnológico das exportações. Países com maior experiência produzem e exportam bens com alto conteúdo tecnológico.

Além da importância das exportações de bens em geral, foram incluídas em nossas estimativas as exportações de bens de alta tecnologia defasada. A significância do coeficiente estimado nos permite inferir sobre os diferentes impactos entre o learning-by-doing (resultante da exportação defasada dos bens de alta tecnologia) e o learning-by-exporting (resultante da experiência exportadora dos países). As estimativas com dados de exportação por países agregam efeitos de equilíbrio geral dado pelo aprendizado das firmas com as atividades exportadoras.

Esses resultados reforçam a relevância de políticas orientadas a diminuir a instabilidade na lucratividade da atividade exportadora, para evitar quebras no aprendizado associado ao comércio do país.

Artigo recebido em maio de 2009;

Aprovado em agosto de 2010.

E-mail de contato dos autores:eva@cse.ufsc.br; flaviogonsalves@hotmail.com

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  • Intensidade tecnológica das exportações mundiais: uma análise de misturas finitas e do "learning-by-exporting"como determinante

    Eva Yamila da Silva CatelaI; Flávio de Oliveira GonçalvesII
  • 1
    Acemoglu (2010) discute como análises baseadas em microdados que desconsideram efeitos de equilíbrio geral podem levar a conclusões errôneas sobre as consequências macroeconômicas das políticas.
  • 2
    Como será tratado na seção 4, as exportações de alta tecnologia estão altamente correlacionadas a indicadores tecnológicos como o calculado pelo World Development Indicators (WDI).
  • 3
    Em termos teóricos, o estimador de densidade de Kernel, introduzido por Rosenblatt (1956), generaliza o histograma, usando uma função alternativa de pesos.
  • 4
    Na prática, o teste dos autores para conhecer a presença de mais de um componente na distribuição segue os seguintes passos: a) Estimar uma distribuição normal para a distribuição da variável utilizada em log, obtendo os parâmetros da média e a variância.
    b) Calcular os MLEs modificados dos dois componentes com variância igual e parâmetro de penalização C = 2. O resultado deverá nos dar: as médias, a variância, a probabilidade.
    c) Ver o resultado da função de LR modificada e o valor de p do limite superior da estatística chi-quadrado. Esse resultado deverá nos levar a concluir se rejeitamos a hipótese de um componente simples a favor da hipótese de dois componentes. d) Em seguida, podemos testar dois sobre três ou mais componentes.
  • 5
    O coeficiente de correlação entre o percentual de exportações de alta tecnologia sobre o total de exportações de cada país e o
    score tecnológico (do indicador de competitividade do WDI) é de 0,5622 (estimativas dos autores).
  • 6
    Inclui medidas de oito características: patentes, artigos científicos, penetração de internet, penetração de telefonia, consumo de eletricidade, matrículas no ensino terciário em Ciências e Engenharia, anos médios de estudo e taxa de alfabetização.
  • 7
    A ideia-chave da estimativa de momentos é que, tendo em vista um conjunto de pressupostos do processo de geração de dados, podemos estabelecer regras de igualdade sobre momentos condicionados populacionais e, então, analogamente, utilizar sobre a amostra disponível esses mesmos momentos condicionados para se obter os estimadores.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Maio 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Aceito
      Ago 2010
    • Recebido
      Maio 2009
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