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Malogro da fortuna: Política de crédito, hipotecas e Caixas Econômicas na década de 1930

Resumo:

A Grande Depressão da década de 1930 conduziu o governo brasileiro a modificar a legislação sobre o sistema financeiro, como a lei da usura e do reajustamento econômico. Tais mudanças ajudaram a evitar um aprofundamento da Grande Depressão, porém não permitiram a recuperação do crédito. Verificamos as mudanças do crédito por meio do mercado de hipotecas e da participação dos bancos públicos, principalmente as Caixas Econômicas. Essa instituição expandiu significativamente sua atuação, tanto na captação de depósitos como principalmente na concessão de empréstimos. Notamos uma política anticíclica no mercado financeiro, principalmente por meio de instituições públicas, como os empréstimos hipotecários das Caixas.

Palavras-chave:
Grande Depressão; reajustamento econômico; crédito; hipotecas; Caixas Econômicas.

Abstract:

The Great Depression of the 1930s led the Brazilian government to modify the legislation of the financial system, for instance the law of usury and economic readjustment. The changes in legislation helped Brazil prevent a deepening of the Great Depression domestically, but did not allow the recovery of credit. Changes in credit in the mortgage market and the share of public banks, especially with Caixas Econômicas were observed. This institution significantly expanded its operations both in attracting deposits and loans. There was a countercyclical policy in the financial market, predominantly in public institutions, such as mortgage policies from Caixas Econômicas.

Keywords:
Great Depression; economic readjustment; credit; mortgages; Caixas Econômicas.

1. Introdução

[...] logo após o choque da crise externa, os agricultores em geral e os cafeicultores em particular passaram a enfrentar o problema de como pagar suas dívidas bancárias. A intervenção do governo no mercado cafeeiro evitou o pânico, mas não foi o suficiente para resolver o problema. Diante disso, sob a iniciativa de Oswaldo Aranha, o governo provisório promulgou o decreto [...] Lei do Reajustamento Econômico [...]. (Simonsen, 1996SIMONSEN, Mário Henrique. Oswaldo Aranha e o Ministério da Fazenda. In: CAMARGO, Aspásia. Oswaldo Aranha: a estrela da revolução. São Paulo: Mandarim, 1996., p. 407-408).

As grandes crises produzem profunda alteração das condições econômicas e financeiras, modificando de forma brusca a renda, o emprego, o câmbio, os preços etc. Tais modificações condicionam desequilíbrios nos contratos firmados em momentos anteriores. Desse modo, além da redução do produto da economia como um todo, ocorrem profundas transferências de renda entre os indivíduos em virtude dos negócios já firmados, conduzindo a um crescimento da inadimplência, dificuldade de financiamento e, de acordo com o tamanho da crise, até mesmo à paralisação dos novos negócios e, de forma mais grave, falências de instituições bancárias.1 1 Keynes apontou, em meado de 1931, a gravidade desse processo: "Never before has there been such a world-wide collapse over almost the whole field of the money values of real assets as we have experienced in the last two years. And, finally, during the last few months-so recently that the bankers themselves have, as yet, scarcely appreciated it-it has come to exceed in very many cases the amount of the conventional "margins." In the language of the market the "margins" have run off. The exact details of this are not likely to come to the notice of the outsider until some special event-perhaps some almost accidental event-occurs which brings the situation to a dangerous head. For, so long as a bank is in a position to wait quietly for better times and to ignore meanwhile the fact that the security against many of its loans is no longer as good as it was when the loans were first made, nothing appears on the surface and there is no cause for panic. Nevertheless, even at this stage the underlying position is likely to have a very adverse effect on new business." (1931, p. 172-173).

Um dos problemas mais graves durante uma grande depressão consiste nas consequências da deflação dos preços sobre os contratos de financiamento. O estudo clássico de Irving Fisher revelou as dificuldades do cumprimento dos contratos depois de um período de sobre-endividamento, sendo denominada teoria dívida-deflação.2 2 Ver Fisher (1933). Keynes salientou também: "They have given their guarantee to the real lender; and this guarantee is only good if the money value of the asset belonging to the real borrower is worth the money which has been advanced on it.It is for this reason that a decline in money values so severe as that which we are now experiencing threatens the solidity of the whole financial structure. Banks and bankers are by nature blind. They have not seen what was coming." (1931, p. 176-177). Os devedores contraíram empréstimos para realizar determinado empreendimento num padrão de preços, porém posteriormente houve deflação. O efeito da retração mostra-se mais elevado para os preços dos ativos com maior relação com o crédito. Os ativos imobiliários consistem num exemplo de bens que respondem fortemente à disponibilidade de financiamento.

Em condições anormais, o Estado toma medidas para minimizar os efeitos da crise. Nos anos 1930, as corridas contra os depósitos das instituições bancárias e a inadimplência dos devedores mostraram-se um mecanismo fundamental para o aprofundamento da crise, como ocorrido nos EUA.3 3 Além da contração monetária durante a Grande Depressão, Bernanke (1983) aponta o aumento dos custos de intermediação financeira durante as grandes crises de elevada inadimplência, reduzindo a eficiência do setor financeiro e "congelando" o mercado de crédito num efeito não monetário da crise. No caso brasileiro, os efeitos da crise mostraram-se menos severos, mesmo no mercado financeiro.4 4 Ver Furtado (2000), Fishlow (1972), Villela & Suzigan (1975) e Peláez & Suzigan (1981). Não obstante diferenças de interpretação sobre as razões para esse resultado, não se observou grandes ondas de falências bancárias. Ao abandonar a conversibilidade em ouro das notas da Caixa de Estabilização e permitir uma desvalorização cambial, o governo liberou a possibilidade de emissão monetária, além de monopolizar as cambiais. Posteriormente, uma série de medidas governamentais tomadas auxiliou, no seu conjunto, a recuperação econômica a partir de 1932.5 5 As estimativas de produto real apontam o início da recuperação nesse ano de 1932; ver várias estimativas em Haddad (1978, p. 34) ou em IBGE (1990, p. 101). A revolução constitucionalista de 1932 contribuiu para a elevação dos gastos, porém a recuperação se manteve nos anos seguintes. Na área financeira, destacaram-se as medidas de limitação da taxa de juros a 12% ao ano (lei da usura), fim da cláusula de indexação dos contratos em ouro ou câmbio e o reajustamento econômico reduzindo as dívidas dos agricultores à metade.

Independentemente das divergências da literatura econômica sobre o impacto das políticas governamentais para a recuperação, as análises sobre mercado financeiro durante a Grande Depressão restringiram-se ao sistema monetário e bancário, especialmente pela atuação do Banco do Brasil, por meio da carteira de Crédito Agrícola e Industrial (CREAI).6 6 Ver Neuhaus (1975), Peláez & Suzigan (1981), Bielschowsky (1975), e mesmo Goldsmith (1986, p. 166-170), Costa (1978, p. 138-152), Oliveira (1996) e Costa Neto (2004). Mais recentemente, a historiografia demonstrou a existência de um mercado financeiro relativamente desenvolvido antes da Grande Depressão, tanto em termos de ações como de títulos.7 7 Ver Levy (1977), Goldsmith (1986), Triner (2000), Hanley (2005) e Musacchio (2009). Verificamos que grande parte desse mercado operava fora do sistema bancário; assim precisamos ampliar a discussão desse momento tão crítico da economia brasileira, incorporando novos instrumentos e atores.

Aprofundamos a análise do mercado financeiro durante a Grande Depressão, por meio do levantamento de informações sobre os ativos financeiros não apenas dos bancos, mas também sobre o mercado hipotecário e as Caixas Econômicas, que naquela época muitas vezes não foram consideradas como instituição bancária. As fontes das informações não se restringiram aos Anuários Estatísticos do IBGE, mas incluíram outros documentos referentes ao período em estudo, em especial as Estatísticas Econômicas e Financeiras do Tesouro Nacional. No caso da Caixa, utilizamos principalmente seus relatórios. Desse modo, objetivamos complementar a formação de um quadro mais amplo do mercado financeiro naquela época.

Numa primeira seção, analisamos as medidas legais tomadas pelo governo para reanimar a economia e sua aplicação na justiça, em especial referentes ao mercado de crédito. Posteriormente, a partir do conjunto de dados levantados, analisamos os efeitos da crise e das medidas tomadas pelo governo para a recuperação do crédito. A discussão realizou-se por meio da análise dos depósitos em instituições financeiras e, principalmente, das hipotecas. Por fim, destacamos a atuação das Caixas Econômicas federais, que nessa época passaram a atuar no financiamento imobiliário por meio de hipotecas. Assim, podemos compreender melhor a própria crise e as ações tomadas pelo governo brasileiro naquele momento.

2. Política anticíclica

A Grande Depressão marcou profundamente o século XX, não apenas os países mais desenvolvidos, mas também os periféricos. O Brasil sofreu severa retração dos preços de exportação, principalmente o do café, e dos capitais estrangeiros para o país. Uma aguda crise de balanço de pagamentos formou-se no país, conduzindo ao controle cambial e a renegociação da dívida externa.8 8 Ver Abreu (1990, p. 74-82). Além disto, houve intervenção forte na economia, por meio da política anticíclica de compra dos excedentes cafeeiros e também da reestruturação do sistema bancário e do crédito.9 9 Ver, por exemplo, Furtado (2000, quinta parte) e Simonsen (1996, p. 384-386). Desse modo, o impacto mostrou-se menos expressivo no Brasil, tanto em termos de declínio da renda quanto na duração da crise.10 10 A crise iniciou-se um pouco antes em razão da ação deliberada do Banco do Brasil de restringir o crédito e acumular encaixes em setembro de 1928; ver Neuhaus (1975, p. 89). O grande número de falências determinou a execução da política, pois a lei de falências de 1908 era bastante favorável ao devedor inadimplente. Por outro lado, o país já apresentou crescimento da renda em 1932 e ao longo do restante da década. Por fim, a deflação ocorreu na maior parte desses anos, desde 1929 até 1933, de acordo com o deflator implícito do PIB. O Banco do Brasil assumiu funções de banco central por meio da realização, novamente, do redesconto a partir de dezembro de 1930 e da recém-criada Caixa de Mobilização Bancária, em 1932, estabelecendo reservas compulsórias para os bancos.11 11 A reabertura da Carteira de Redesconto do Banco do Brasil auxiliou, ainda em 1930, a política anticíclica (ver Decreto nº 19.525, de 24 de dezembro de 1930). Posteriormente, houve a criação da Caixa de Mobilização Bancária, pelo Decreto nº 21.499, de 9 de junho de 1932. Na exposição de motivos, o governo expressou-se nesse último decreto da seguinte forma: "Considerando que o retraimento do crédito impede o desenvolvimento das fontes de riqueza do país; Considerando que esse retraimento é em parte resultante da política de previsão que os bancos se viram compelidos a seguir em face da crise mundial cujas consequências criaram um ambiente de geral desconfiança, Considerando que é essencial restabelecer a normalidade das operações de crédito bancário e que para isso é necessário assegurar aos bancos condições de mobilidade de seus ativos que lhes permitam, em qualquer emergência, fazer face aos compromissos assumidos e às necessidades gerais da economia do país [...]" (cf. site visitado em 28/3/2011 http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=34874&tipoDocumento=DEC&tipoTexto=PUB). Em 1935, a Carteira de Redesconto ampliou o teto dos descontos de títulos, abarcando não apenas as letras comerciais, mas também as industriais e agrícolas.12 12 Ver Villela & Suzigan (1975, p. 183). Geraldo Beuclair de Oliveira salientou que o "Decreto nº 21.537, de 15 de junho de 1932, considerando a conveniência de atender às necessidades de financiamento da produção industrial (que dificilmente podem ser a curto prazo) autorizou o redesconto de títulos destinados ao financiamento do setor fabril." (1996, p. 83). Mais adiante, reforçou: "Isto reforça o argumento de que os bancos comerciais, antes do advento do crédito especializado, atendiam na medida do possível ao setor manufatureiro, inclusive com empréstimos a longo prazo." (idem, p. 88). Assim, constituiu-se uma retaguarda para o sistema financeiro nacional num momento de grande dificuldade, ajudando os bancos comerciais e o Banco do Brasil a atender a demanda crédito da produção interna daquela época.13 13 Como afirma Paulo Neuhaus: "A partir de 1933, a CAMOB desempenhou importante papel, em conexão com o programa de Reajustamento Econômico, ocasião em que forneceu aos Bancos reservas líquidas depois que parte das dívidas dos agricultores ao sistema bancário foi perdoada por decreto governamental." (1975, p. 115).

A crise econômica e a deflação tornaram as dívidas firmadas anteriormente muito difíceis de ser pagas pelos devedores.14 14 A teoria de Fisher (1933) de dívida-deflação é importante para entender as dificuldades posteriores a um período de sobre-endividamento. No caso brasileiro, os problemas anteriores deviam-se à indexação de dívidas ao ouro ou câmbio e às taxas de juros fixadas nas condições vigentes nos anos anteriores à Grande Depressão, bastante superiores às daquele momento. A imprensa defendia abertamente a necessidade de alteração dos contratos de dívida hipotecária agrícola, como se observa nessa passagem da Folha da Manhã de quatro de abril de 1933: "A moratória é medida que se impõe. Impõe-se porque não foi o lavrador a criar a situação angustiosa em que se vem debatendo. [...] Não é justo, pois permitir-se que velhos e honestos fazendeiros sejam despojados do patrimônio de seus filhos, dissabor porque muitos já passaram.". Havia uma clara pressão por parte dos agricultores paulistas pela aprovação da lei, inclusive por meio de associações de classe e partidos, como o da Lavoura. O Código Civil de 1916 permitia o estabelecimento de contratos em moeda estrangeira e com juros que as partes convencionassem em cláusula expressa.15 15 Ver Simonsen (1995, p. 12-13). Em face da crise, como em outros países, o governo limitou, por decreto em 1933, os juros máximos cobrados dos devedores em 12%, denominada de "lei da usura". Essa norma ainda vetou a cobrança de juros compostos e limitações maiores para as hipotecas, justificando as medidas no próprio decreto do seguinte modo:

Considerando que todas as legislações modernas adotam normas severas para regular, impedir e reprimir os excessos praticados pela usura; Considerando que é de interesse superior da economia do país não tenha o capital remuneração exagerada impedindo o desenvolvimento das classes produtoras; decreta: Art. 1º É vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em quaisquer contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal do Código Civil [de 6% ao ano / RLM] § 1º Essas taxas não excederão de 10 % ao ano se os contratos forem garantidos com hipotecas urbanas, nem de 8% ao ano se as garantias forem de hipotecas rurais ou de penhores agrícolas. [...] Art. 3º As taxas de juros estabelecidas nesta lei entrarão em vigor com a sua publicação e a partir desta data serão aplicáveis aos contratos existentes ou já ajuizados. 16 16 Decreto nº 22.626, de 7 de abril de 1933. (cf. site http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=102665&tipoDocumento=DEC&tipoTexto=PUB visitado em 29/3/2011). A lei reduziu as multas contratuais a 10%; em geral, tais ônus chegavam a 20% somadas a despesas advocatícias de pelo menos 5%. Por fim, a lei permitiu o pagamento em dez prestações anuais, possibilitando para a maior parte dos casos um alongamento dos prazos de pagamento. No jornal Estado de S. Paulo de 7 de abril informava-se: "A situação do débito hipotecário dos lavradores era alarmante e daí entender o governo ser mais racional, encarar-se o problema na sua origem. E, em vez da moratória, a solução mais lógica seria o decreto que se encontra já em poder do chefe do governo, combatendo a usura". No dia seguinte, a Folha da Manhã afirmava: "O governo provisório fez um decreto em que se atende à necessidade da moratória para a lavoura.", ou seja alongamento dos prazos de pagamento. Em anúncio do Partido da Lavoura na primeira página da Folha da Manhã do dia 9 de abril, o interventor em São Paulo foi aclamado pela "conquista" da sua aprovação.

Ainda, ao final desse ano de 1933 e também inspirado no abandono do padrão-ouro por diversos países, o governo proibiu a indexação em ouro ou moeda estrangeira, chamada de cláusula-ouro nos contratos. 17 17 Decreto nº 23.501, de 27 de novembro de 1933. De acordo com Mário Henrique Simonsen, essa proibição foi uma forma de evitar o reajuste das tarifas das concessionárias de serviços públicos, que pressionavam o governo (cf. Simonsen, 1995, p. 16SIMONSEN, Mário Henrique. 30 anos de indexação. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1995.). De toda a sorte, o decreto declarava a recorrência dessa medida em diversos países periféricos ou não:

Considerando que em quase todas as nações tem sido decretada a nulidade da cláusula ouro e de outros processos artificiosos de pagamento, que importem na repulsa ao meio circulante; Considerando que, além dos países cujos sistemas monetários sofreram profundo abalo, pela desvalorização quase total de sua moeda fiduciária, a França, a Inglaterra e os Estados Unidos adotaram rigorosas medidas, entre as quais muitas das abaixo prescritas para evitar, ou sustar, a depreciação de sua moeda papel; [...] Decreta: Art. 1º É nula qualquer estipulação de pagamento em ouro, ou em determinada espécie de moeda, ou por qualquer meio tendente a recusar o restringir, nos efeitos, o curso forçado do mil réis papel.

A desvalorização da moeda nacional e a deflação elevaram extraordinariamente os valores reais dos pagamentos indexados ao ouro ou câmbio e até mesmo dos contratos com juros pré-fixados em moeda nacional; assim se procurava reduzir as bruscas transferências de renda entre devedores e credores naquele momento. Mesmo assim, muitos empréstimos tornaram-se impagáveis, especialmente agrícolas, colocando as próprias instituições bancárias em potenciais insolventes.18 18 O Banco Português constitui um exemplo de instituição bancária em dificuldade de receber seus créditos. De acordo com Teresa Marques, diferentemente do banco Boa Vista, "o peso das hipotecas sobre o movimento do ativo foi crescendo à medida que o banco aprofundava as suas dificuldades, após 1930, até atingir a espantosa proporção de 14% do movimento em 1933." (Marques, 1998, p. 223). Não houve concessões de novas hipotecas durante o início dos anos 1930, mas a retração dos negócios aumentou a importância relativa dos empréstimos antigos. Para remover o risco de insolvência generalizada, a lei do reajustamento econômico encampou metade das dívidas dos agricultores contraídas antes de 30 de junho de 1933, desde que com garantia real ou pignoratícia. As dívidas foram trocadas por apólices do governo federal, denominadas de obrigações do reajustamento econômico. Essa legislação inspirou-se no New Deal dos EUA, que alongou a prazo das dívidas dos agricultores e reduziu os juros. Por fim, o próprio decreto explicou a necessidade das medidas tomadas:

Considerando que para as medidas nacionais de defesa cambial contribuiu a produção agrícola com a quase totalidade do sacrifício exigido ao país; Considerando que, em virtude da situação criada pela generalização da crise, a terra e todos os seus produtos sofreram uma redução considerável de valor; Considerando que tal redução de valor criou uma situação de graves dificuldades para a quase totalidade dos agricultores ou seja a própria economia nacional que na agricultura assenta as suas bases; Considerando que em tais casos cabe ao poder público provir, tomando as providências para a defesa dos interesses nacionais, confundidos com os dos particulares, Decreta: Art 1º Fica reduzido de 50%, na data deste decreto, de todos os débitos de agricultores, contraídos antes de 30 de junho do corrente ano, quando tiverem garantia real ou pignoratícia [...] Art 3º Como indenização do prejuízo sofrido pelos credores em virtude do disposto nos artigos 1º e 2º, ser-lhes entregues, pelo seu valor par, apólices do Governo Federal ao juro de 6% ao ano, do valor nominal de um conto de réis cada uma, para cuja emissão fica autorizado o ministrado da Fazenda até o limite de 500 mil contos de réis. 19 19 O Decreto nº 23.533, de 1º de dezembro de 1933. (cf. site visitado em 29/3/2011 http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=42681&tipoDocumento=DEC&tipoTexto=PUB). Há nítida associação entre as leis, como Annibal Villela e Wilson Suzigan afirmaram: "O desconto de 50% nas dívidas dos fazendeiros foi considerado pela lei como pagamento antecipado dos primeiros 5 pagamentos anuais das parcelas de 10%, de acordo com a lei da usura. Daí, durante os primeiros cinco anos após o Reajustamento Econômico, os credores só poderiam exigir os juros de seus empréstimos." (1975, p. 201).

Poucos dias após a publicação do decreto, o Ministro da Fazenda Oswaldo Aranha recebeu críticas à lei do reajustamento na Assembleia Constituinte. Apesar da discussão na Constituinte não fosse sobre o decreto, as repercussões da nova legislação provocaram acirrado debate. Como representante do Amazonas, Leopoldo Tavares da Cunha Mello ressaltou o seu benefício apenas para a lavoura de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, em detrimento da do "Norte":

Quer como solução técnica, quer como seleção, o decreto é infeliz. Protege a uma minoria de brasileiros, a meia dúzia de agricultores que já tiveram a ventura de ter crédito, e aos bancos e capitalistas, que emprestaram aos mesmos agricultores os seus dinheiros. A agricultura do Brasil não é somente a que está devendo. Há uma agricultura que precisa ser protegida e, até agora, nada mereceu. (Diário da Assembleia Nacional, 6 de dezembro de 1933, p. 296).

De outro lado, como representante profissional dos gráficos da Paraíba, Vasco de Toledo chamou a atenção para o favorecimento aos bancos da nova legislação: "Protege tão somente a plutocracia bancária; favorece a ela única e exclusivamente, porque eram dívidas que estavam como que canceladas. O decreto não vem, de nenhum modo, beneficiar o povo." (ibidem). A resposta do ministro salientou, ainda nessa sessão, a hipertrofia das dívidas, independentemente de Estado:

[...] as propriedades estavam sob o peso de um capitalismo que, na forma de empréstimo, com ou sem garantia, havia absorvido a atividade dos homens do campo, dos homens rurais do Brasil. Foi a vista disso que o governo adotou essa lei que pode estar errada, porque nós somos humanos e estamos na vida para acertar e errar, mas que visa atingir esse objetivo, que é menos de proteção à lavoura do que fazer com que os detentores do dinheiro no Brasil compartilhem dos prejuízos aos quais a coletividade brasileira forçou os lavradores de seu país. (Diário da Assembleia Nacional, 6 de dezembro de 1933, p. 296).

No ano seguinte, Oswaldo Aranha participou de outra discussão sobre a Lei do Reajustamento também na Assembleia Nacional Constituinte.20 20 Nessa sessão, o constituinte do Rio de Janeiro Acúrcio Torres demandou do governo a ampliação do benefício para as dívidas quirografárias que fossem provadas e principalmente a criação da carteira hipotecária agrícola do Banco do Brasil: "A lavoura, repito, precisa de todo amparo, mas não do amparo sui generis e incerto que lhe ofereceu o governo; precisa do auxílio direto, do pagamento de seus débitos, com a sub-rogação do país nos respectivos créditos em prazo longo e até sem juros. Auxiliemos a lavoura, sem a intervenção do intermediário - banco ou casa bancária. Auxiliemos a lavoura, sem atendermos a outros objetivos que não ao amparo, franco e decidido, pois de outra foram, teremos essa obra desvirtuada e, quem sabe, comprometida até o bom nome de quem protege e de quem é protegido." (Anais da Assembleia Constituinte de 1934, 16 de fevereiro de 1934, p. 89). Assim, a Lei do Reajustamento continuava a provocar reações bastante enfáticas dos constituintes. Embora o motivo da sua participação naquela ocasião decorresse da renegociação da dívida externa do país, ele reforçou a importância da lei do reajustamento e a necessidade de regulamentar sua aplicação em discurso pronunciado em fevereiro de 1934:

Tenho, para mim, que a lei do Reajustamento era a única providência capaz de restabelecer a ordem normal da economia brasileira, violada por necessidades públicas da coletividade nacional. [...] para sua integral realização, uma etapa, talvez de larga demora, um tanto prejudicial [...] ao jogo dos interesses que ela veio despertar, justamente porque conseguiu, como nenhuma outra Lei, provocar em todos os recantos do País opiniões de toda a natureza, algumas relevantes, numa soma, que só as minhas mãos chegou, entre cartas e telegramas, a mais de duas mil. (Anais da Assembleia Constituinte de 1934, 16 de fevereiro de 1934, p. 90-91ANAIS da Assembleia Nacional Constituinte de 1934. 2015. Disponível em: <Disponível em: http://imagem.camara.gov.br/constituinte_principal.asp >. Acesso em: 5/10/2015.
http://imagem.camara.gov.br/constituinte...
).

Em 1934, o governo criou, novamente por decreto, uma Câmara de Reajustamento Econômico para verificar a procedência dos pedidos de ressarcimento dos prejuízos dos credores, formada por três membros indicados pelo chefe do governo provisório.21 21 Decreto nº 24.233, de 12 de maio de 1934. Posteriormente, o Banco do Brasil recebeu, por meio de contrato, os serviços de apoio à coleta e preparação dos pedidos para a Câmara de Reajustamento. De acordo com o relatório do banco do exercício de 1935: "Desde o início do serviço, no último trimestre de 1934, até fins de 1935, haviam sido recebidos pelo banco 24.378 processos de pedidos de indenização, dos quais 5.284 foram encaminhados à Câmara de Reajustamento Econômico. Em fins de 1935, estavam, pois, em poder do banco, para fins de verificações e diligências, 19.094 processos, dos quais 8.219, ainda em poder de agências, se achavam na primeira fase dos trâmites preparatórios, enquanto os restantes 10.875, já em exame na Matriz, dependiam de verificações sumárias, para subirem ao julgamento da Câmara." (1936, p. 50). De acordo com esse último decreto, as decisões da Câmara não poderiam ter recurso para nenhum juízo ou autoridade, gerando discussões no meio jurídico. Discutiu-se, no Tribunal de Contas da União, até mesmo a necessidade ou não do registro dos pagamentos nesse tribunal, em virtude do atraso na entrega das apólices aos credores.22 22 A Sociedade Rural Brasileira de São Paulo criticou, por meio do deputado Miguel Coutinho na Assembleia Legislativa, a demora em receber as apólices, já que as dos processos julgados em 8 de agosto de 1936 ainda não tinham sido entregues até o momento da sessão de 28 de outubro de 1937 (cf. Diário Oficial do Estado de São Paulo, 29 de outubro de 1937, p. 22). De fato, os recursos iniciais de 500 mil contos esgotaram-se ao longo de 1936, suspendendo os pagamentos em agosto. Um crédito suplementar de 250 mil contos foi aprovado em 1937, mas o Tribunal de Contas exigiu o registro dos pagamentos desses recursos adicionais. Esperava-se uma nova lei do governo federal para suprimir o registro. As medidas emergenciais tomadas decorreram de condições excepcionalmente adversas, principalmente para a agricultura, como o ministro Bernardino José de Souza, do Tribunal de Contas da União, afirmou sobre a Câmara: " A execução dos serviços extraordinários ligados às providências tomadas não foi confiada, ali como aqui, aos órgãos administrativos normais, mas sim a comissões especiais e entidades autônomas, algumas de caráter sui-generis, divergentes das linhas de administração clássica. " (Diário Oficial da União, 13 de julho de 1937, p. 15.022).

Nessa sessão do Tribunal de Contas da União de 31 de maio de 1937, o ministro informou que a Câmara julgou 22.392 processos até 29 de maio de 1937.23 23 Os processos julgados pela Câmara foram em número bastante menor do que os recebidos pelo Banco do Brasil. Desse total, apenas pouco menos de dois terços receberam despacho favorável (14.246). Em termos de valor, as diferenças foram ainda maiores, totalizando as declarações de crédito 2.457.616 contos de réis, mas as indenizações concedidas até o momento foram de apenas 679.442 contos. Assim, em cerca de três anos de funcionamento, a Câmara já indenizou um montante superior ao previsto no decreto inicial, necessitando de créditos complementares posteriores.24 24 O decreto do governo subestimou o estoque de dívidas agrícolas com garantias reais existentes em 1933, necessitando ampliar o limite de emissão de apólices à medida do avanço do trabalho da Câmara. Em 1937, houve o crédito adicional de 250 mil contos de réis. No ano seguinte, elevou-se o limite de emissão de apólices a 900 mil contos, por meio do Decreto-Lei nº 729, de 22 de setembro de 1938. Finalmente, em 1941, concluiu-se a ampliação a 920 mil contos, de acordo com o Decreto-Lei nº 3.048, de 13 de fevereiro. Ademais, havia créditos especiais para o pagamento de juros. Tais informações demonstram uma atuação bastante decisiva da Câmara nesses anos.

As ações do governo durante essa época ajudaram a evitar um declínio completo do mercado de crédito rural. A nova legislação foi aclamada pelos apoiadores do governo, como podemos notar no telegrama de agradecimento dos fazendeiros do Rio Grande do Sul em março de 1934:

Nome dos criadores e agricultores de diversos municípios do Rio Grande do Sul, favorecidos pela lei do reajustamento econômico, [...] que vem sofrendo horrível crise, agricultura, principalmente a pecuária, cujos fazendeiros foram, em grande parte, obrigados a hipotecar campos. O próprio Banco Rio Grande do Sul foi beneficiado pela lei, pois via suas ações cotadas abaixo do valor real, devido a algumas transações e desvalorização dos imóveis. [...] A lei do reajustamento econômico e a lei da usura têm servido de grande auxílio, principalmente ao comércio, lavoura, pecuária e outros ramos. (Diário Oficial da União, 14 de março de 1934, p. 3.028).

Os bancos favoreceram-se da nova legislação, ocorrendo forte valorização das suas ações. O relatório apresentado aos acionistas do Banco do Brasil em abril de 1934 declarava as consequências da lei da usura e reajustamento numa versão bastante oficial, como informava o seu presidente Arthur de Souza Costa e futuro ministro da Fazenda:

Ambas essas medidas determinaram para os bancos uma diminuição de proventos, a primeira, reduzindo as taxas sem indenização alguma, e a segunda, concedendo uma indenização para o abatimento ordenado, cuja renda, entretanto, é inferior à que era auferida com a dívida substituída. Essa é a conclusão do exame apenas pelos resultados imediatos. Considerando-se, porém, a gravíssima situação da agricultura em todo o mundo, tem-se, forçosamente, de concluir que, sobretudo a última medida, é de grande alcance em favor do próprio sistema bancário, outorgando aos seus devedores em dificuldades condições novas de vitalidade e prevenindo que se torne precária a de outros, cuja situação, ainda boa no presente, não poderá, no entanto, deixar de sentir afinal os efeitos da crise generalizada. A diminuição de lucros que os bancos sofrerem em consequência dessas leis terá de ser compensada no tempo pela melhora de suas condições de segurança [...]. (Revista Bancária Brasileira, vol. II, abril de 1934, p. 117).

As mudanças legais foram aplicadas aos contratos de dívida. Os processos judiciais passaram a se referir a essa legislação, evidenciando sua aplicação. Uma ilustração consiste na citação publicada no Diário Oficial de São Paulo da comarca da capital: "Vencendo juros à razão de um e um quarto por cento ao mês (reduzidos a dez por cento ao ano, da data da vigência da Lei da Usura)" (14 de maio de 1936, p. 32).25 25 O relatório da diretoria da Companhia Industrial e Agrícola Ribeirão das Lages demonstra a aplicação da nova legislação aos contratos de dívida agrícola e lançamentos contábeis efetuados: "O balanço geral encerrado em 31 de dezembro de 1933 e bem assim relatar-lhes o que se passou naquele ano. Os nossos devedores com garantias hipotecárias agrícolas, 27 de maio de 1933, em virtude de prévio acordo reduziram a sua dívida, que naquela data era de cerca de 450 contos de réis, tendo pago por conta dessa importância a quantia 170 contos de réis, em troca da quitação que lhes demos em 3 das propriedades que faziam parle de nossa garantia, tendo eu feito consignar na escritura o direito aos remanescentes se, enquanto formos credores, recair qualquer ação executiva sobre as 3 referidas propriedades. Nessa mesma ocasião ficou combinado e confirmado em carta de 29 daquele mês que ficava concedido aos devedores o prazo de até 23 de setembro de 1934, para o pagamento da 1ª prestação que, de acordo com a lei de usura devia ser em abril corrente. Fiz ainda ciente aos devedores da nova taxa de juros que passou a ser de 8% a partir de 7 de abril de 1933, de acordo com a lei e bem assim cientifiquei-os igualmente dos lançamentos que havia mandado fazer a débito dos mesmos na conta 'Garantias hipotecárias' da diferença de juros não debitados, condicionalmente. em 1932, bem como da importância correspondente à capitalização dos mesmos juros, desde 1931, também ainda não debitados, conforme expus aos senhores acionistas no meu relatório de 8 de abril de 1933. Em virtude da lei de Reajustamento Económico, mandei extrair o saldo devedor em 1 de dezembro, da conta 'Garantias hipotecárias' e bem assim lançar a débito do Governo Federal (Lei de Reajustamento Econômico) a quantia de 147:101$300, em quanto montava os 50% da divida hipotecária atingida pela referida lei; e mandei creditar aos devedores (conta garantias hipotecárias) a referida importância. Assim, quando formos embolsados das apólices a que se refere a citada lei de "Reajustamento Econômico", mandaremos fechar aquela conta. Todos os documentos exigidos pela lei já se acham prontos esperando apenas que comece a funcionar a Câmara de Reajustamento para serem entregues à mesma." (Diário Oficial da União, 12 de maio de 1934, p. 58) Em outro caso, o juiz de Agudos J. de Castro Roza declarou a resistência do Judiciário em acolher a "lei da usura":

Só quem não esteja ao par das lides forenses poderá negar a pronunciada reserva, senão repugnância, com que a Lei de Usura, ou da Moratória Agrícola, foi recebida por grande parte do judiciário. Magistrados houve que lhe negaram aplicação e, outros muitos, − estes em sua quase totalidade até mesmo das mais altas instâncias - limitaram seus efeitos a simples suspensão temporária dos executivos ajuizados. (Diário Oficial do Estado de São Paulo, 9 de setembro de 1936, p. 22).

A conclusão do magistrado foi de que a lei da usura não suspendeu as execuções. Para ele, a legislação objetivou restringir os excessos vigentes nos contratos:

Considere-se a remodelação dos contratos hipotecários de então dando-lhes, além do mais: 1º) prazo novo e dilatado, a contar-se da sua aplicação; 2º) facilidade de pagamento em prestações mensais; 3º) redução da costumeira leonina taxa de juros; 4º) redução da não menos leonina multa contratual, invariavelmente de 20%, em benefício do credor, e, muitas vezes, mais 20% para honorários de advogados; 5º) inclusão das despesas judiciais na multa contratual - a cargo do devedor, além das multas, que anteriormente estavam. (Diário Oficial do Estado de São Paulo, 9 de setembro de 1936, p. 22).

As Caixas de Aposentadoria e Pensões realizavam empréstimos e muitas vezes cobraram juros superiores aos da lei, consignados em folha de pagamento dos associados, conforme Decreto nº 21.763, de 24 de agosto de 1932.26 26 Este decreto possibilitava a cobrança de juros de 12% ao ano quando feitos até o prazo de 24 meses e de 15% ao ano em maior prazo, cobráveis pela tabela Price sobre a quantia realmente devida em cada mês. Tais ocorrências também gravavam sobre a cobrança da Caixa Econômica e do Instituto Nacional de Previdência, etc. Os juros cobrados eram "excessivos e próprios da agiotagem", como afirmou o Sindicato dos Empregados da Companhia Cantareira e Viação Fluminense: "O fato é que as próprias instituições oficiais de crédito continuam até hoje a operar a taxas superiores a esse limite e isso porque, alegam elas, o prazo é superior a um ano" (Diário Oficial da União, 9 de julho de 1937, p. 14.782-83). Entretanto, o consultor Alcino Baía demonstrou em consulta sobre a redução dos juros desses contratos que "como o decreto nº 22.626, citado (lei da usura) se refere a juro corrido que é o comum e não ao contrato pelo sistema Price [do desconto em folha / RLM], não assiste ao peticionário direito ao que pede" (Diário Oficial da União, 25 de janeiro de 1934, p. 1724). De toda a sorte, um novo decreto de 1938 tornou as taxas da lei da usura aplicáveis também nesses casos, apesar de muitas vezes levar a prejuízo para as Caixas.27 27 Decreto nº 312, de 3 de março de 1938.

A retroatividade da lei da usura para os contratos anteriores à data de publicação também motivou questionamentos judiciais. A acolhida mostrou-se melhor em relação aos juros reduzidos do que referente às multas, mas as evidências recolhidas nas publicações oficiais apontam para aplicar em ambas as condições dos contratos.28 28 Ver Acórdão dos juízes da Câmara Civil da Corte de Apelação sobre um executivo hipotecário de 1935 (Diário Oficial do Estado de São Paulo, 12 de maio de 1935, p. 28). De todo modo, a aplicação da lei mostrou-se bastante ampla nesses anos 1930, revelando o acolhimento pelo Judiciário de muitos processos que lançaram mão da nova legislação. Juristas reafirmaram a necessidade de alteração da lei em face de uma nova realidade econômica e social.29 29 Como Renato Marcondes de Lacerda em seu Instituto da Hipoteca de 1934 afirmou: "156. A função do crédito não é mais entendida como uma função puramente individual. Os recentes decretos sobre o reajustamento econômico são disso a melhor prova. A intervenção do governo veio demonstrar a necessidade de modificar-se a legislação hipotecária, que tem causado a ruína dos devedores e até de credores. 157. Se a hipoteca operasse a circulação, não teria sofrido a desmoralização que sofreu. Os imóveis, mesmo numa época de depressão dos valores, como a que atravessamos, não se teriam desvalorizado tanto, causando a infelicidade completa dos devedores, que tudo tiveram de entregar aos credores ficando alguns ainda a dever. A consequência de tudo é a paralização da lavoura, da indústria, do comércio, a miséria e a instabilidade geral.[...] 158. E assim é, porque o devedor, além de perder o seu imóvel, ainda sofre, sozinho, as consequências da situação geral, para a qual não contribuiu, não sendo responsável pela queda dos valores" (Lacerda, 1934, capítulo VIII).

Não obstante a grande repercussão das novas leis, seja entre os representantes da sociedade civil daquela época, seja mesmo na esfera jurídica, a historiografia econômica pouco se debruçou sobre elas. A análise da lei do Reajustamento Econômico revelou-se ambígua, como afirmou Neuhaus (1975NEUHAUS, Paulo. História monetária do Brasil: 1900-45. Rio de Janeiro: IBMEC,1975., p. 124). Annibal Villela e Wilson Suzigan não observaram impacto relevante dessa legislação:

No período 1934-1945, a Câmara de Reajustamento aprovou cerca de 18.700 processos e o total de indenizações (a preços correntes) foi da ordem de 920 milhões de cruzeiros. Desse total, 54% corresponderam ao Estado de São Paulo e 55% foram para o café. [...] Em termos globais, o impacto do Reajustamento Econômico sobre a economia do setor agrícola ou sobre a economia brasileira como um todo parece ter sido insignificante se se levar em conta que, em 1939, o produto líquido da agricultura foi estimado em 10.200 milhões de cruzeiros e o produto interno bruto em 45.600 milhões de cruzeiros [...]. (1975, p. 201).

Na estimativa de Villela e Suzigan, o reajustamento representou apenas 2,0% do PIB de 1939. Apesar da visão desses autores, em seu estudo clássico da substituição de importações brasileira, Fishlow calculou o aumento específico para a renda dos cafeicultores em pelo menos 20% em decorrência da lei (1972, p. 30FISHLOW, Albert. Origens e consequências da substituição de importações no Brasil. Estudos Econômicos, v. 2, n. 6, p. 7-75, dez. 1972.). Como o pagamento total de 920 mil contos refere-se às dívidas então existentes em 1933, se utilizarmos o PIB estimado por Haddad para esse ano, chegaremos a uma participação do PIB de 3,6%. Tal porcentual representaria metade do estoque das dívidas agrícolas com garantias reais daquele ano, salientado a importância do crédito nesse setor econômico até aquele momento. Destarte, Paulo Neuhaus concluiu a sua interpretação dos resultados do programa:

[...] foi um dos elementos (embora não fosse provavelmente um dos mais importantes) responsáveis pela recuperação econômica do Brasil a partir de 1932 removendo, simultaneamente, do sistema bancário o ônus das insolvências que afetaram o setor agropecuário em consequência da Depressão. (1975, p. 125NEUHAUS, Paulo. História monetária do Brasil: 1900-45. Rio de Janeiro: IBMEC,1975.).

O somatório das medidas monetárias e financeiras auxiliou a superação dos problemas gerados pela crise. As novas leis aplicadas aos financiamentos já existentes provocaram mudanças bastante expressivas para o sistema financeiro. O deputado paulista Leopoldo e Silva resumiu a questão do crédito na Assembleia Legislativa paulista numa sessão de 1937: "V. Exc. Diz a falta de crédito da Lavoura. Não senhor, a lavoura tem crédito, o que lhe falta é o crédito que não lhe dão. Assim, eu diria a falta de 'concessão de crédito'" (Diário Oficial do Estado de São Paulo, 29 de outubro de 1937, p. 22). O governo resolveu a questão da insolvência dos créditos firmados anteriormente, porém novos créditos para a agricultura mostravam-se de difícil solução. Outra forma de atuação governamental foi o destacado papel do Banco do Brasil na economia, representando, já em 1935, 30% dos depósitos e 39% dos empréstimos dos bancos e elevando posteriormente sua participação.30 30 Ver Bielschowsky (1975, p. 61-62), Villela & Suzigan (1975, p. 79-80 e 187-188) e Malan et alii (1977, p. 242-251). Verificamos evidências da maior participação pública por meio da criação da carteira de Crédito Agrícola e Industrial (CREAI) do Banco do Brasil em 1937 e, como veremos adiante, da expansão das Caixas Econômicas nessa década, que proveriam o financiamento a mais longo prazo da economia.31 31 O Banco do Brasil tornou-se a grande instituição bancária daquela época. Apesar da crise, o banco ampliou a rede de agências e atingiu a maioria dos Estados. Na área do crédito, a CREAI alargou os seus financiamentos à produção e a prazos mais longos por meio de fundos especializados com a emissão de bônus, por causa da escassez de recursos privados mesmo depois das medidas tomadas para a recuperação da crise. A crise no mercado hipotecário privado conduziu à necessidade de maior participação pública, por meio do penhor rural não prejudicado pela preferência hipotecária mesmo que em execução (cf. Decreto nº 1.003, de 29 de dezembro de 1938). Beskow salientou as razões para a sua criação: reduzida parcela dos empréstimos para os setores agrícola e industrial em favor do Tesouro Nacional, Estados, municípios e Departamento Nacional do Café e a insuficiência dos fundos para empréstimos (cf. 1994, p. 194-195). Iliane Silva destacou o direcionamento entre 1937 e 1945 principalmente para a agricultura, mas também para a indústria (cf. Silva, 2010, p. 114). A ideia era de mobilizar os recursos dos institutos de previdência para o financiamento da economia, mas posteriormente também recorreu aos recursos da poupança compulsória e emissão monetária (ver Silva, 2007). A partir desse quadro legal e da própria historiografia, podemos avaliar tais alterações por meio de alguns indicadores do mercado financeiro.

3. Crise do crédito brasileiro

As instituições bancárias expandiram-se significativamente ao longo dos anos 1920, como já apontado na literatura por Saes (1998SAES, Flávio Azevedo Marques de. Crescimento e consolidação do sistema bancário em São Paulo na década de 1920. In: LORENZO, Helena Carvalho de; COSTA, Wilma Peres da (Org.). A década de 1920 e as origens do Brasil moderno. São Paulo: Editora da Unesp, 1998.) e Triner (2000TRINER, Gail D. Banking and economic development: Brazil, 1889-1930. New York: Palgrave, 2000.). A crise não alterou tal tendência, continuada na segunda metade dos anos 1930 para atender às necessidades da industrialização e da urbanização do país. Como afirmado por Bielschowsky para esse período:

O movimento bancário cresceu com espantosa rapidez [na década de 1920 / RLM], tendo o valor dos empréstimos e depósitos mais do que duplicado em termos reais. Assim, o que provavelmente ocorreu na segunda metade da década de 30 foi que, uma vez contornada a crise do início da década, a expansão bancária pode prosseguir sem problemas. E prosseguiu, então, com uma verdadeira proliferação do número de agências, o que correspondeu provavelmente a uma fase de interiorização da rede bancária. (1975, p. 58).

Podemos avaliar a crise e a recuperação não apenas por meio das informações das instituições bancárias, que já foram mais estudadas. Utilizamos três indicadores para analisar o mercado monetário e creditício daquela época: estoque de M1 e de depósitos a prazo em bancos comerciais (inclusive Banco do Brasil) e a concessão de novas hipotecas.32 32 M1 é a soma do papel-moeda em poder público e dos depósitos à vista. As informações de M1 e depósitos a prazo foram obtidas no site www.ipeadata.gov.br em 3/2/2012. Os empréstimos das instituições bancárias são muito semelhantes à soma dos depósitos à vista e a prazo, assim optamos pelos depósitos, já que os dados foram consolidados por Wilson Suzigan (ver IBGE, 1990). O comportamento da série de empréstimos mostrou relativa estabilidade nominal entre 1928 e 1931, crescendo a partir desse momento. Por outro lado, eles representaram um quinto do PIB em 1928-29 (19,7%), aumentando posteriormente, primeiro em razão da redução do produto e depois em função da elevação dos próprios empréstimos, chegando a um quarto do PIB em 1934 (25,3%). As ações do governo revolucionário conduziram a uma expansão monetária a partir de 1931, que ajudou na recuperação da crise, como pode ser observada no Gráfico 1. Tal expansão elevou a razão de M1/PIB de pouco menos de um quinto para mais de um quarto. De outro lado, lançamos mão de dois outros ativos financeiros para a análise do mercado financeiro da época: os depósitos a prazo e as hipotecas. Os primeiros apresentaram uma tendência de crescimento acelerado na segunda metade da década de 1920, atingindo quase um décimo do PIB em 1930 e evidenciando o crescimento das instituições bancárias nessa época.33 33 A melhora do funcionamento do sistema bancário decorreu da criação da Inspetoria Geral dos Bancos em 1921, a fim de fiscalizar as instituições bancárias (Decreto nº 14.728, de 16 de março de 1921). Posteriormente, houve retração significativa para cerca de seis pontos porcentuais em 1934. Embora as hipotecas não apresentassem tendência crescente ao longo do lustro final da década de 1920, mantinham importância semelhante aos depósitos a prazo. A retração das transações hipotecárias mostrou-se mais expressiva após 1931, reduzindo de pouco mais de seis pontos porcentuais (6,6%) para menos de dois pontos em 1934 (1,9%). Destarte, ao contrário da expansão monetária, os depósitos a prazo e principalmente o crédito hipotecário revelaram-se severamente marcados pela crise.

Gráfico 1:
Ativos financeiros em % PIB (1925-1934)

Outra forma de observar a contração severa das hipotecas consiste no número de transações realizadas, que atingiram 30 mil no Brasil, em 1930, e retraíram a pouco mais de doze mil em 1934.34 34 O valor médio real das hipotecas brasileiras cresceu de 19,5 contos de réis em 1929 para 24,2 em 1931; porém se reduziu a 17,2 em 1933 e recuperou-se um pouco em 1934 (18,3). Assim, a redução do número revelou-se mais importante do que dos seus valores. De outro modo, em termos dos valores nominais das novas transações hipotecárias, a redução mostrou-se semelhante de quase um milhão e meio contos de réis para pouco mais de quinhentos mil contos em idênticos anos. Por outro lado, os depósitos à vista apresentam tendência crescente no período, e os depósitos a prazo já começaram a se recuperar em 1934 comparativamente ao ano anterior, salientando a confiança nas instituições bancárias mesmo durante a crise.

A Grande Depressão modificou não apenas os montantes totais transacionados, mas também a distribuição no espaço. Desde o início do século, as hipotecas urbanas foram mais importantes do que as rurais; durante a crise, ocorreu um aumento da importância das primeiras. Enquanto essas hipotecas urbanas representaram pouco mais de dois terços do número de novas hipotecas (69,9%) e mais da metade dos valores transacionados (59,6%) em 1929, a participação elevou-se, como já observado por Goldsmith (1986GOLDSMITH, Raymond W. Brasil 1850-1984: desenvolvimento financeiro sob um século de inflação. São Paulo: Haper & Row, 1986., p. 178), para mais de quatro quintos das duas variáveis em 1934 (80,3% e 80,6%, respectivamente). As hipotecas urbanas valorizaram-se, equiparando os valores médios rurais e urbanos em 1934. A crise mostrou-se mais severa no ambiente rural, retraindo não apenas o número de transações, mas também os valores concedidos.35 35 Enquanto o valor nominal médio urbano manteve-se razoavelmente constante entre 1929 e 1934, o valor médio rural apresentou declínio expressivo.

Se considerarmos em termos regionais na Tabela 1, notamos uma diminuição da importância relativa do Estado de São Paulo, que representava pouco mais da metade do número de hipotecas (53,0%) e dos valores (58,7%) em 1929.36 36 Pires e Almico (2008) também apontaram significativa retração do crédito hipotecário em Juiz de Fora, no início dos anos 1930, que era o centro da Zona da Mata. Essa região destacava-se na produção de café em Minas Gerais. Após cinco anos, as participações retraíram suas parcelas para pouco mais de quatro décimos (41,4% e 40,2%, respectivamente). A retração das hipotecas rurais em São Paulo foi ainda maior, salientando a crise do setor cafeeiro no início dos anos 1930.37 37 Enquanto o número de hipotecas rurais no Brasil reduziu-se a quase um quarto entre 1929 e 1934, as paulistas diminuíram a um quinto. De outro lado, a participação do Distrito Federal e a da região Sul aumentaram, chegando a 16,4% e 22,8% em número e 26,7% e 10,2% em valor em 1934, respectivamente. Assim, a Grande Depressão foi mais severa em São Paulo, especialmente para a cafeicultura, que abarcava a maior parte da agricultura do Estado.38 38 Podemos ilustrar tal situação por meio do município de Ribeirão Preto, grande produtor de café nas primeiras décadas do século XX. Nessa cidade, o número de hipotecas retraiu-se de 240 em 1929 para 75 em 1934, de outro lado os valores reais das hipotecas diminuíram de 16 mil contos de réis para 4,7 mil em idênticos anos. As economias mais relacionadas ao meio urbano e ao mercado interno apresentaram menores consequências da crise.

Tabela 1:
Participação dos Estados no número e valores hipotecados (1928-1934)

O sistema bancário avançou expressivamente durante a década de 1920, como afirmou Goldsmith: "O período entreguerras conheceu uma expansão rápida e bastante tranquila" (1986GOLDSMITH, Raymond W. Brasil 1850-1984: desenvolvimento financeiro sob um século de inflação. São Paulo: Haper & Row, 1986., p. 166).39 39 Além do aumento do número de bancos, houve aumento dos ativos, empréstimos e depósitos. Durante a crise, a razão depósitos/PIB de 19,6% em 1929 para 24,0% em 1931, que em parte se deve à retração do PIB (cf. Goldsmith, 1986, p. 167). Contudo, os ativos bancários recuperam, nominalmente, os montantes de 1929 já em 1932. Assim, o autor concluiu que "o sistema bancário brasileiro foi menos afetado pela Grande Depressão" (Goldsmith, 1986, p. 172). Contudo, os bancos ainda não realizavam a maior parte das hipotecas, ressaltando a presença de particulares. Em 1934, o perfil do crédito modificou-se mais pronunciadamente, alcançando os bancos 16,4% do número de novas hipotecas e 42,0% dos valores transacionados no Brasil. O Distrito Federal destacou-se na presença bancária entre as hipotecas, somando quase a metade das transações cariocas (43,0%) e mais de dois terços dos valores (68,0%). Apesar da sua importância no crédito hipotecário, o Estado de São Paulo revelou uma penetração bancária muito mais restrita, alcançando apenas 5,5% do número e uma parcela um pouco mais substantiva dos valores negociados no Brasil em 1934 (27,8%).40 40 O município de São Paulo realizou mais da metade das hipotecas bancárias do Estado em 1934, seja em número (51,4%), seja em valor (62,5%). A tradição bancária em Minas Gerais pode ser corroborada pela realização de 29,0% das hipotecas mineiras e 54,5% dos valores em 1934.41 41 Ver Costa (1978). Além do Distrito Federal e Minas Gerais, os valores hipotecados pelos bancos superaram os dos particulares em 1934 para o Maranhão e Pernambuco. Contudo, no primeiro caso, consistiu numa única transação bancária. Desse modo, a crise também nos parece favorecer a ação dos bancos mesmo num mercado em crise como o hipotecário, ainda que concentrados nos grandes centros.42 42 Nessa época, o principal banco hipotecário em São Paulo foi o Banespa, sobre qual se deve consultar Costa (1988). Apesar de a participação das hipotecas nos seus ativos oscilar muito de um ano para o outro, tal parcela atingiu uma média de 11,5% no triênio 1927-1929; porém se reduziu a 9,2% no seguinte (1930-1932), mantendo tal patamar no restante da década. Por outro lado, os balanços do Banco do Brasil não informavam, até o início dos anos 1930, de forma separada a presença das hipotecas no seu ativo. Outras instituições também atuavam nesse mercado, como o Lar Brasileiro Associação de Crédito Hipotecário, com matriz do Rio de Janeiro e sucursal em São Paulo, cuja soma dos empréstimos hipotecários atingiu pouco mais de cem mil contos de réis no início de 1932. Essa quantia representou 44,6% do ativo da associação.

As condições dos empréstimos também se alteraram durante a crise. Apesar de mais de três quartos das hipotecas serem firmadas a prazos menores de três anos, até 1929, verificamos diminuição da sua representatividade para menos de dois terços em 1934 (64,1%). Em termos de valores, a participação das hipotecas de prazos mais curtos também diminuiu nesses anos, passando de 56,5% em 1929 para 37,9% em 1934. De outro lado, os negócios a taxas de juros inferiores a quinze pontos porcentuais diminuíram ainda mais a sua parcela de quase três quartos do número (72,0%) para dois terços (66,2%) e de mais de nove décimos dos valores (92,3%) para quatro quintos (79,4%) em 1933.43 43 Utilizamos as informações das taxas de juros de 1933, e não de 1934, uma vez que estas últimas já se marcaram pela lei da usura. Ao que tudo indica, as informações disponíveis apontam, possivelmente, para um aumento dos prazos dos empréstimos hipotecários e das taxas de juros durante a crise, decorrência da forte seleção de crédito e do crescimento dos agentes públicos, como veremos adiante.

4. Mercado hipotecário de algumas capitais

As hipotecas constituem financiamentos com garantia real de caráter essencialmente privado entre pessoas físicas e jurídicas antes de 1930, assumindo papel mais destacado as primeiras nessa época. Infelizmente, as informações mais completas para as hipotecas brasileiras deixaram de ser computadas a partir de 1934. Os únicos dados disponíveis referem-se a seis capitais de Estados: Recife, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Porto Alegre. Entre 1929 e 1934, essas capitais realizaram pouco mais de quatro quintos das hipotecas, seja em número (42,2%), seja um pouco mais em valor (45,0%). Isso demonstra a importância dessas capitais no mercado hipotecário brasileiro, atrelando-se ao desenvolvimento urbano e industrial do país.

No Gráfico 2, fornecemos o comportamento do número e valor real das hipotecas dessas capitais. Entre a primeira informação referente ao ano de 1909 e a segunda relativa a 1928, notamos um crescimento de mais de três vezes das duas variáveis. A tendência manteve-se crescente até 1929, tanto em número como em valor. A partir desse ano, o número de hipotecas declinou, porém o valor, somente após 1931. Tal fato decorreu principalmente do crescimento extraordinário das transações hipotecárias na capital carioca nesse ano de 1931, ao contrário das outras que se retraíram. Posteriormente, o declínio ocorreu até 1933, quando se estabilizou o patamar das séries, que oscilou, mas não apresentou crescimento até 1937. Por fim, nos dois últimos anos considerados, observamos alguma recuperação, mas insuficiente para retornar ao patamar anterior à crise.

Gráfico 2:
Valor real e número das hipotecas de seis capitais (1909-1939, valores em contos de réis de 1929)

Se utilizarmos o comparativo com o PIB, o resultado não se modifica de modo significativo. Houve um aumento da importância do mercado hipotecário nessas capitais, entre 1909 e 1928, alcançando o incremento de 0,6% do PIB. Tal crescimento continuou até 1931, quando atingiu pouco mais de três pontos porcentuais. Desse modo, destacamos participação muito expressiva de apenas seis capitais inscrevendo hipotecas nesse último ano, representando 47,2% do total inscrito no país e salientando a dimensão alcançada por esse mercado nas principais cidades do país. Após esse ano, a retração mostrou-se severa, atingindo um patamar inferior a um ponto porcentual depois de 1934. Dessa forma, a participação no PIB das hipotecas reduziu-se durante a crise e não se recuperou posteriormente, retornando ao patamar semelhante ao de 1909.

Gráfico 3:
Valor das hipotecas inscritas nas seis capitais (1909-1939, em % do PIB)

As informações para toda a década de 1930 demonstraram que a retração também ocorreu de forma severa no meio urbano, que se relacionou em menor monta às atividades exportadoras e não contou com a Lei do Reajustamento Econômico. Não observamos para essas capitais uma recuperação dos montantes das hipotecas efetuados anteriormente à crise até o final da década de 1930.44 44 Se compararmos com a realidade norte-americana, verificamos que a demora na recuperação dos empréstimos hipotecários residenciais também se mostrou maior do que os de negócios, não se recuperando em 1934 nem mesmo em 1935 (ver Bernanke, 1983, p. 273). A questão hipotecária não se restringiu aos anos mais críticos da Grande Depressão, tornando motivo para o governo atuar no mercado financeiro nacional. Contudo, não obstante as diversas medidas tomadas, as novas leis não possibilitaram a recuperação desse mercado na década de 1930. Apesar de um quadro geral de estagnação do fluxo de novas hipotecas até o final da década, as instituições públicas atuaram de forma anticíclica, seja o Banco do Brasil por meio da CAMOB e da CREAI, seja mesmo as Caixas, como veremos a seguir.

5. Caixas Econômicas Federais

Além dos bancos, as Caixas Econômicas detinham, desde o século XIX, grande importância no recolhimento de depósitos populares, aplicados geralmente em títulos públicos.45 45 A Caixa Econômica da Corte foi criada pelo Decreto nº 2.723, de 12 de janeiro de 1861. A partir de 1874, Caixas em diferentes províncias foram abertas, como a de São Paulo e a do Rio Grande do Sul em 1875. Já no ano de 1883, existiam 16 Caixas nas capitais de províncias distintas, além da do município da corte. Desse modo, a população menos abastada conseguia aplicar seus recursos de forma mais acessível, recebendo juros de até 6% ao ano e ajudando no financiamento do governo. Desde o início, operavam também na realização de empréstimos por meio de penhor pelo Monte Socorro, cobrando 9% ao ano, mas posteriormente foi reduzida essa taxa.46 46 Os empréstimos começaram a se diversificar em função da reforma de 1915 (Decreto nº 11.820, de 15 de dezembro), mediante empréstimos sob a caução de apólices da União. O vice-presidente Antonio Ludgero de Souza Castro informa em seu relatório da Caixa Econômica Federal de São Paulo de 1919 a necessidade da ampliação de títulos aceitos em descontos e realizar empréstimo consignado para os funcionários públicos federais: "É também de grande conveniência dar ao Monte Socorro autorização para emprestar sobre o penhor de apólices e letras do Estado ou da Câmara Municipal da Capital. Esses títulos têm grande cotação na praça. Os empréstimos a funcionário federais, sob garantia de seus vencimentos, com as precauções necessárias, livraria os servidores da União das garras da agiotagem e proporcionaria a este Instituto lucros apreciáveis." (p. 8-9). A Primeira Grande Guerra produziu severo choque nos depósitos das Caixas, não se recuperando na década de 1920 (cf. Adams, 2006ADAMS, Alison Anne. A social and economic history of popular banking in Rio de Janeiro, 1821-1929. Tese (Phd em História) - Harvard University, 2006.). As medidas do governo revolucionário de 1930 favoreceram a recuperação e o aumento da sua importância, como a autorização, ainda que pontualmente, para realizarem empréstimos consignados e hipotecários a partir dos saldos depositados, que gerou discussões dentro do próprio governo.47 47 As Caixas iniciaram suas operações de empréstimos por consignação para funcionários públicos a partir do Decreto nº 20.225, de 18 de julho de 1931. A Caixa Econômica Federal do Rio de Janeiro começou a realizar hipotecas ainda nesse ano de 1931. Por outro lado, a Caixa de São Paulo realizou três empréstimos hipotecários em 1933 e, já no ano seguinte, 51 (cf. Balanço publicado no Estado de S. Paulo de 6 de janeiro de 1937). Posteriormente, o novo regulamento das Caixas Econômicas Federais de 1934 referendou essas ações, permitindo um escopo maior de empréstimos:

Considerando que o desenvolvimento das Caixas Econômicas [...] não se fará enquanto não se lhes der a precisa autonomia, de modo a lhe ser possível a realização de operações próprias, pelo emprego útil e previdente dos depósitos; e, por fim. Considerando que, com a realização dessas operações, se conseguem dois objetivos: um de assistência - o empréstimo; outro econômico - os juros recebidos. [...] Art. 57. As Caixas Econômicas poderão operar em empréstimos de dinheiro: a) sob caução de títulos da dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal, cotados na bolsa; b) sob consignação de juros de títulos mencionados na letra a; c) sob penhor civil ou comercial de joias, pedras preciosas, metais, moedas, ou coisas; d) sob consignação de vencimentos de funcionários públicos, civis e militares, desde que tais vencimentos figurem permanentemente nos orçamentos, bem como dos próprios funcionários das Caixas Econômicas; e) sob consignação de vencimentos de funcionários dos Estados, municípios, e empregados de estabelecimentos de crédito, devendo as condições desses empréstimos ser estabelecidas por proposta dos Conselhos Administrativos e aprovação do Conselho Superior; f) sob garantia hipotecária; g) sob garantia de taxas criadas ou fixadas pelo Governo Federal, Estadual ou municipais, e uma vez que tais taxas sejam arrecadadas pelas Caixas Econômicas; i) sob garantia de Bancos de notória idoneidade. [...] Art. 64. Os empréstimos hipotecários só poderão ser feitos sob garantia de imóveis que não sejam de natureza agrícola. (Decreto nº 24.427, de 19 de junho de 1934).

Apesar de saques maiores que os depósitos para o conjunto das Caixas em 1929 e 1930, no restante da década os segundos superaram amplamente os primeiros em todos os anos.48 48 O relatório do gerente da Caixa Econômica Federal de São Paulo salienta o quadro da crise ao final de 1929: "[...] o movimento foi crescente até o mês de outubro [...], decrescendo nos dois meses seguintes, devido, sem dúvida, à campanha eleitoral, que provocou, por meio de boatos terroristas, a desconfiança popular, diminuindo as entradas e aumentando as retiradas, quer no número quer nas quantias. Foram tomadas providências adequadas, sendo os depositantes satisfeitos com a máxima prontidão, de modo a ser mantido integral o crédito do instituto, evitando-se assim a corrida que parecia iminente. Na data em que escrevo [20/3/1930 / RLM], já as quantias retiradas estão voltando, sendo feitos novos depósitos em profusão." (1930, p. 49). Além das entradas menores do que as saídas nos depósitos em 1929 e 1930, a Caixa Econômica Federal da Bahia, em seu relatório de 1933, informou o aumento dos penhores em função da crise de 1929: "O aumento sensível de penhores registrados em 1930, em nossos guichês, foi uma consequência da crise de 1929 [...] processando-se, após o crack, um reerguimento do comércio, pela rearticulação das suas atividades, pela consolidação do crédito, por um sistema mais seguro de operar, diminuíram sensivelmente os penhores feitos pelas classes comerciais." (1934, p. 22-23). Esse resultado de maiores saques também ocorreu em outros momentos de crise, como em 1914 e 1921. Durante a crise, o número de cadernetas e, principalmente, os valores reais dos depósitos nas Caixas Econômicas Federais cresceram expressivamente, como podemos observar no Gráfico 4.49 49 Os títulos públicos também ganharam maior preferência em relação aos títulos privados durante a crise. De 1931 a 1938, em geral, mais de nove décimos das transações na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro foram de títulos públicos da dívida interna (cf. Levy, 1977, p. 415-16). Em 1933, a quantidade de cadernetas ultrapassou a um milhão, e, em 1935, o estoque de depósitos superou a um milhão de contos de réis de 1929. No final do período considerado, existiam mais de 1,5 milhão de cadernetas, que detinham um montante de mais de dois milhões de contos de réis de 1929. A procura pelos depósitos nas Caixas mostrou um crescimento, decorrente da busca por instituições mais seguras nesses anos de crise e recuperação.50 50 Analisando esses dados e principalmente o valor do depósito por caderneta, Goldsmith afirmou: "A poupança, através de depósitos na Caixa Econômica Federal, tornou-se mais comum e aparentemente espalhou-se para grupos de nível de renda mais baixa." (1986, p. 173). O número de cadernetas por mil habitantes cresceu de 25,6 em 1929 para 41,2 em 1940, revelando que quase um vigésimo da população detinha caderneta de algumas das Caixas.

Gráfico 4:
Cadernetas e depósitos reais nas Caixas Econômicas Federais (1925-1940, valores em contos de réis de 1929)

Para a Caixa do Rio de Janeiro, possuímos dados mais detalhados, especialmente dos empréstimos, como fornecido no Gráfico 5. Os empréstimos das Caixas apresentaram uma expansão extraordinária a partir de 1931 tanto em termos de valores reais como em proporção dos depósitos. O crescimento formidável nos primeiros anos da década da Grande Depressão dos empréstimos teve caráter expansionista para a economia, como visto no Gráfico 5, abaixo, para a Caixa carioca.

O governo permitiu novas opções de financiamento por meio de hipotecas, conta garantida e consignado. Se no final da década de 1920 os penhores e as cauções de títulos representavam ao redor de um décimo dos depósitos, os empréstimos em suas diferentes formas alcançaram mais de três quartos dos depósitos da Caixa carioca, principalmente mediante os financiamentos mais novos. Até 1929, não houve empréstimo por meio de conta garantida para governo estadual ou municipal51 51 Os empréstimos por conta garantida também poderiam ser realizados para entidades privadas com responsabilidade de uma pública. e hipoteca ou consignado até 1930. Ao final da década de 1930, verificamos participação elevada dessas formas de empréstimos, chegando a representar 38,3%, 36,8% e 16,1% em 1940. Os tipos mais tradicionais de financiamento da Caixa perfizeram 6,3% para o penhor e 2,5% para caução nesse ano.52 52 Ver Censo de 1940 (cf. IBGE, 1950, v. III, p. 384-387). Anteriormente, o penhor representava quase a metade do total dos empréstimos (46,0%), e a caução, o restante em 1929.

Gráfico 5:
Empréstimos reais e sobre os depósitos da Caixa Econômica do Rio de Janeiro (valores em contos de réis de 1929)

A totalidade dos financiamentos da Caixa do Rio mostrou-se mais relevante do que a paulista, atingindo 71,2% dos depósitos em 1934, representando mais de três vezes os encaixes nos bancos e o regulamentar no Tesouro Nacional. A partir de 1938, a Caixa do Rio incentivou empréstimos hipotecários de menor valor, aumentando sua participação no total das hipotecas realizadas no Distrito Federal, como informa o relatório de 1940:

Tendo financiado em 1937 apenas 23,3% de todas as operações hipotecárias realizadas no Distrito Federal, fez subir essa porcentagem para 48,4% em 1938, 49,4% em 1939 e, afinal 60,5% em 1940. A Caixa mantém, portanto, a primazia quanto ao número de operações hipotecárias realizadas na Capital da República, vale dizer, executa fielmente a política social que tanto recomenda o nosso governo. (Luz, 1941LUZ, Carlos Coimbra da. A Caixa Econômica do Rio de Janeiro em 1940 (Relatório)., Rio de Janeiro: IBGE 1941., p. 167).53 53 Em 1936, a participação foi de 22,3% do total de hipotecas realizadas no Distrito Federal. As Caixas realizaram quase dois terços dos empréstimos sobre imóveis com garantia hipotecária dos estabelecimentos de crédito (bancos, casas bancárias, Caixas, etc.) em 1939 (64,2%). Assim, as Caixas já eram mais atuantes no mercado hipotecário do que o restante do sistema bancário. De fato, nos Anuários Estatísticos do Brasil, as Caixas eram consideradas em separado do sistema bancário, como no censo, mas na Previdência e Assistência Social até o meado dos anos 1950, por isso seus depósitos não foram considerados nos depósitos a prazo do Gráfico 1.

Apesar do maior número de empréstimos hipotecários da Caixa do Rio em relação ao total, a participação no valor total das hipotecas realizadas no Distrito Federal ainda representava de 36,7% em 1936 a 26,8% em 1940 (cf. Luz, 1941LUZ, Carlos Coimbra da. A Caixa Econômica do Rio de Janeiro em 1940 (Relatório)., Rio de Janeiro: IBGE 1941., p. 168). O destino dos empréstimos hipotecários foi principalmente para residências (próprias e edifícios de apartamentos e vilas residenciais), respondendo por mais da metade dos valores financiados ainda existentes ao final de 1940 (50,9%). Além disso, as indústrias também receberam pouco mais de um quarto do total das hipotecas existentes em 31 de dezembro de 1940 (26,1%, cf. idem, p. 175), destacando as usinas açucareiras e as fábricas de tecidos. Por outro lado, a moda do prazo foi de 15 anos, respondendo por mais de três quartos do total (75,8%, cf. idem, p. 177). Os prazos de 10 e 20 anos ainda detinham elevada participação, 5,9% e 12,5% do total dos empréstimos hipotecários da Caixa do Rio existentes ao final de 1940. Assim, os empréstimos mais longos representaram cerca de três quartos do total em 1939 e 1940 (cf. idem, p. 126).

Ainda em 1940, as hipotecas da Caixa carioca destinavam principalmente aos residentes no Distrito Federal (70,9%), Pernambuco (12,9%) e Minas Gerais (4,4%), conforme Luz (1941LUZ, Carlos Coimbra da. A Caixa Econômica do Rio de Janeiro em 1940 (Relatório)., Rio de Janeiro: IBGE 1941., p. 173). A elevada participação de Pernambuco decorre provavelmente de financiamentos às usinas açucareiras. Os empréstimos de conta garantida da Caixa do Rio eram realizados a governos estaduais e municipais e entidades privadas, principalmente do Rio Grande do Sul (40,1%), do Distrito Federal (18,2%) e de Minas Gerais (17,3%) (cf. idem, p. 134). Os demais empréstimos mantinham-se mais concentrados no Distrito Federal.

Podemos também evidenciar tais mudanças por meio dos balanços da Caixa Econômica Federal de São Paulo. As cauções de títulos já se realizavam de forma regular nos empréstimos da Caixa paulista durante a década de 1920 e de modo crescente, por meio do Monte Socorro, como o penhor. Se no início dessa década os empréstimos perfaziam menos de um vigésimo do patrimônio (2,8% em 1920), ao seu final atingiram ao redor de um quinto do total do ativo (em 1929, 16,7% e, em 1930, 23,7%, cf. Relatórios de 1929CAIXA ECONÔMICA FEDERAL DE SÃO PAULO. Relatório da Caixa Econômica Federal de São Paulo relativa ao ano de 1929. São Paulo: Irmãos Ferraz, 1930. e 1930CAIXA ECONÔMICA FEDERAL DE SÃO PAULO. Relatório da Caixa Econômica Federal de São Paulo relativa ao ano de 1930., São Paulo: Irmãos Ferraz 1931.). A tendência de maior importância dos empréstimos relativamente à aplicação em títulos do Tesouro Nacional continuou na década seguinte. Nos balanços de 1935 a 1939, a Caixa paulista detinha montantes próximos tanto depositados na Delegacia Fiscal como em empréstimos, representando os últimos pouco mais de um terço do ativo (35,8% a 39,4% nesses anos, respectivamente).54 54 Balanços publicados no Estado de S. Paulo de 21 de julho de 1935, 6 de janeiro de 1937, 21 de julho de 1938 e 30 de julho de 1939. Em 1934, os empréstimos da Caixa paulista representaram apenas 28,4% dos depósitos. No primeiro balanço, a principal forma de financiamento foi por meio da caução de títulos em 1935 (62,8% do total), seguida pela hipoteca (26,7%). Ao final da década, houve inversão da relação, assumindo as hipotecas 54,7% do total emprestado em 1939 e os títulos apenas 6,7%. O crescimento da importância da hipoteca nos empréstimos pode ser observado também no balanço de 1942. As hipotecas à indústria e sobre imóveis representaram 71,4% dos empréstimos, ao passo que os penhores, somente 5,1%.55 55 Devemos destacar que pouco mais de quatro quintos das hipotecas da Caixa paulista foram para empréstimos industriais (43,1%, cf. Diário Oficial da União, 16 de julho de 1942, p. 11.248). Nesse balanço, as hipotecas enquadraram-se nos empréstimos em longo prazo, os quais em geral o prazo para amortização é superior a cinco anos. Elas consistiram na principal forma desses empréstimos a prazos maiores. No conjunto, os financiamentos em longo prazo representaram mais de quatro quintos do total (83,5%). Assim, o avanço dessas operações de crédito nas Caixas Econômicas mostrou-se extraordinário ao longo da década, tornando-as importantes financiadoras do mercado imobiliário urbano, principalmente por meio das hipotecas.

As garantias das hipotecas eram proporcionalmente maiores do que as dos títulos, perfazendo os empréstimos cerca de um terço dos valores dos colaterais da Caixa paulista em 1939. Tal fato decorre da menor liquidez da propriedade imobiliária em relação aos títulos que eram cotados em Bolsa e serviam de referência para os próprios empréstimos. As condições dos empréstimos sob a caução de títulos foi anunciada da seguinte forma: "Garantia de títulos federais, estaduais, municipais e demais títulos com que opera, serão concedidos ao prazo de 6 meses, taxa de 7% ao ano e mais a comissão de 0,5% pela abertura de crédito. A percentagem para esses empréstimos será até 75% do valor da cotação dos títulos." (O Estado de S. Paulo, 20 de junho de 1943, p. 12).

Para Belo Horizonte, dispomos da estatística hipotecária, que apontou que a Caixa Econômica Federal era a principal credora desses empréstimos, respondendo por 32,2% do número e 37,7% dos valores negociados em 1936.56 56 Conforme o Anuário de Belo Horizonte (INE, 1937, p. 96). No balanço de 1937, a parcela dos depósitos emprestada totalizou mais de três quartos (78,1%). Dentre os financiamentos, os de curto prazo responderam por pouco mais da metade (53,9%), principalmente na forma de consignações e cauções. Nos empréstimos mais longos, as hipotecas foram preponderantes, representando 43,7% dos financiamentos de curto e longo prazo em 1937.57 57 Conforme o Balanço da Caixa Econômica Federal de Minas Gerais, publicado no Correio Paulistano de 26 de junho de 1938, p. 19.

Em relação à Bahia, a Caixa expandiu fortemente os empréstimos, que passaram de menos de um décimo dos depósitos no início da década de 1930 para mais da metade em 1939 (55,9%).58 58 Ver Relatórios da Caixa Econômica Federal da Bahia de 1933 e 1940. Ainda podemos mencionar o caso da Caixa do Rio Grande do Sul, que elevou a participação dos empréstimos nos depósitos de 3,1% em 1930 para 39,5% em 1939. Neste último ano, as hipotecas representaram cerca de um terço dos empréstimos (33,0%), e as cauções, mais de quatro décimos (44,5%), conforme relatório da Caixa gaúcha de 1931 e 1939. Pinto de Aguiar, então presidente da Caixa, afirmou em reportagem no jornal A Batalha: "Iniciamos criando a carteira de empréstimos sob consignação [em 1931/RLM], onde hoje temos um saldo em movimento de mais de 11 mil contos. A situação do funcionalismo público era angustiosa, tal a agiotagem que se fazia em torno dos seus vencimentos." (A Batalha, 11 de maio de 1937, p. 4). De acordo com o balanço de 1939, os empréstimos de curto prazo perfaziam cerca de um quarto do total, dos quais os consignados aos funcionários federais (incluindo os do Banco do Brasil e da própria Caixa), estaduais e municipais representavam três quartos desse subtotal. Dos financiamentos a mais longo prazo, as hipotecas corresponderam a 42,0%, e os empréstimos ao governo estadual e municipal, 31,3%. Os governos e seus funcionários abarcaram parcela muito expressiva dos recursos para empréstimo da Caixa baiana.

Para concluir a análise das Caixas, consideraremos as Caixas Econômicas Federais autônomas situadas nos Estados mais desenvolvidos; verificamos, no Gráfico 6, um crescimento relativo dos empréstimos em relação aos depósitos de 1934 a 1940. No primeiro ano do período considerado, os financiamentos perfaziam quase a metade dos depósitos das Caixas Federais (48,9%), mas em 1939 essa participação chegou a 59,0% (cf. Henrique, 1960HENRIQUE, João. Estrutura e conjuntura das Caixas Econômicas Federais. Rio de Janeiro: Conselho Superior das Caixas Econômicas Federais, 1960., p. 94 e 109).59 59 Esta informação diverge da do recenseamento de 1940, na qual os empréstimos representaram quase um terço do saldo dos depósitos de todas as Caixas em 1939 (cf. IBGE, 1950, v. III, p. 384-387). Há duas possíveis explicações para essa divergência, decorrente em parte de uma possível inclusão das Caixas Estaduais, mas que naquele momento realizavam poucos empréstimos, e de serem os créditos concedidos nesse ano apenas, ao contrário do estoque das informações dos Anuários. A possibilidade de diversificar a aplicação dos recursos depositados nas Caixas Federais facilitou a realização de financiamentos distintos do tradicional penhor e dos depósitos no Tesouro Nacional. Os empréstimos com hipotecas e garantias simultâneas de longo prazo perfizeram 36,6% dos depósitos em 1936, porém chegou a 45,6% em 1940, como pode ser visto no gráfico abaixo.60 60 Nesses anos 1930, a carteira de empréstimos pode ser dividida de acordo com o prazo do crédito. De acordo com relatório da Caixa do Rio (Luz, 1941, p. 125), realizavam-se penhores e cauções de títulos no curto prazo (até seis meses); as consignações e diversos no médio prazo (de 6 a 48 meses) e hipotecas e financiamentos com garantias diversas (ou simultâneas) no longo prazo (mais de quatro anos). Se compararmos os empréstimos das Caixas Autônomas em relação aos do Banco do Brasil, notamos participação crescente das primeiras em comparação aos do segundo, passando de 15,6% em 1934 para 33,1% em 1940. Desse modo, a atuação das Caixas demonstrou uma dinâmica mais elevada nos empréstimos do que a do Banco do Brasil nessa década de 1930, não obstante serem em montantes menores do que os financiamentos do principal banco do país.

Gráfico 6:
Empréstimos e hipotecas das Caixas Econômicas Federais Autônomas (em % dos depósitos)

As Caixas ampliaram sua atuação não apenas por meio da captação de maior volume de depósitos durante a década de 1930, mas principalmente por meio dos empréstimos. Novas possibilidades foram abertas e permitiram a aplicação em carteira hipotecária e pública, como governos municipais e estaduais. Esses novos financiamentos tiveram um papel anticíclico na economia nessa década da Grande Depressão, antes mesmo da reestruturação da carteira de redescontos em 1935 e da criação da CREAI do Banco do Brasil em 1937.61 61 A reorganização da carteira de redescontos do Banco do Brasil foi um importante passo para o financiamento da produção, inclusive industrial (ver Oliveira, 1996, p. 88).

6. Considerações finais

Num momento bastante crítico da economia brasileira no século XX, o sistema financeiro nacional modificou-se expressivamente, tanto em função das condições severas da economia como também por meio das ações do governo, muitas vezes mediante medidas extremas demandadas pela própria sociedade, como a lei da usura e a do reajustamento econômico. De outro, verificamos que a atuação de forma anticíclica alcançou o mercado financeiro, permitindo às instituições bancárias públicas expandirem extraordinariamente seus empréstimos. Tais medidas tomadas numa conjuntura de Grande Depressão continuaram em vigor nas décadas seguintes e, por consequência, marcaram de forma indelével o sistema financeiro no pós-guerra.

Como resultado ainda durante a Grande Depressão, conseguiu-se evitar uma crise financeira e bancária mais profunda, como uma corrida bancária por meio do redesconto ou uma crise não monetária gerada pela inadimplência decorrente do binômio dívida-deflação por meio da legislação da usura e do reajustamento. Entretanto, a recuperação do sistema financeiro na sua totalidade não ocorreu durante a década de 1930, não obstante o crescimento das operações das instituições bancárias, principalmente públicas, que ganharam participação em mercados que até então detinham participação reduzida, como o hipotecário. Numa época de maior presença do Estado no mundo e no Brasil, as empresas financeiras públicas assumiram ativo papel na economia no período tanto o Banco do Brasil, por meio do redesconto e da carteira agrícola e industrial, já salientado pela literatura, como as Caixas Econômicas no meio urbano, atingindo até mesmo a indústria.

Apesar do conjunto do fluxo de novas hipotecas nas capitais não ter se recuperado ao longo da década de 1930, as Caixas Econômicas Federais foram autorizadas a atuar em novas linhas e avançaram expressivamente nos depósitos e, principalmente, nos empréstimos ao longo dessa década, especialmente por meio de hipotecas urbanas, cauções de títulos, contas garantidas e consignações de funcionários públicos. Elas passaram a responder por uma parcela expressiva dos financiamentos hipotecários urbanos, tornando-se o principal agente desse mercado a prazo mais longos. Assim, essas instituições bancárias públicas atuaram fortemente na tentativa de recuperação da atividade econômica. A dinâmica dos empréstimos das Caixas revelou-se mais expressiva do que a do Banco do Brasil na década de 1930.

Agradecimento

Agradeço o apoio do projeto Cátedras IPEA/CAPES para o Desenvolvimento, bem como o da Fapesp (projeto número 2012/09121-2).

REFERÊNCIAS

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  • VILLELA, Annibal; SUZIGAN, Wilson. Política do governo e crescimento da economia brasileira: 1889-1945. 2. ed., Rio de Janeiro: IPEA/INPES 1975.
  • 1
    Keynes apontou, em meado de 1931, a gravidade desse processo: "Never before has there been such a world-wide collapse over almost the whole field of the money values of real assets as we have experienced in the last two years. And, finally, during the last few months-so recently that the bankers themselves have, as yet, scarcely appreciated it-it has come to exceed in very many cases the amount of the conventional "margins." In the language of the market the "margins" have run off. The exact details of this are not likely to come to the notice of the outsider until some special event-perhaps some almost accidental event-occurs which brings the situation to a dangerous head. For, so long as a bank is in a position to wait quietly for better times and to ignore meanwhile the fact that the security against many of its loans is no longer as good as it was when the loans were first made, nothing appears on the surface and there is no cause for panic. Nevertheless, even at this stage the underlying position is likely to have a very adverse effect on new business." (1931, p. 172-173KEYNES, John Maynard. Essays in persuasion. London: Macmillan, 1931. Disponível em:<Disponível em:http://gutenberg.ca/ebooks/keynes-essaysinpersuasion/keynes-essaysinpersuasion-00-h.html >. Acesso em: 5/10/2015.
    http://gutenberg.ca/ebooks/keynes-essays...
    ).
  • 2
    Ver Fisher (1933)FISHER, Irving. The debt-deflation theory of Great Depressions. Econometrica. Vol. 1 n. 4, out. 1933, p. 337-357.. Keynes salientou também: "They have given their guarantee to the real lender; and this guarantee is only good if the money value of the asset belonging to the real borrower is worth the money which has been advanced on it.It is for this reason that a decline in money values so severe as that which we are now experiencing threatens the solidity of the whole financial structure. Banks and bankers are by nature blind. They have not seen what was coming." (1931, p. 176-177).
  • 3
    Além da contração monetária durante a Grande Depressão, Bernanke (1983) BERNANKE, Ben S. Nonmonetary effects of the financial crisis in the propagation of the Great Depression. The American Economic Review. v. 73, n. 3, p. 257-276, jun. 1983.aponta o aumento dos custos de intermediação financeira durante as grandes crises de elevada inadimplência, reduzindo a eficiência do setor financeiro e "congelando" o mercado de crédito num efeito não monetário da crise.
  • 4
    Ver Furtado (2000)FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional/Publifolha, 2000., Fishlow (1972)FISHLOW, Albert. Origens e consequências da substituição de importações no Brasil. Estudos Econômicos, v. 2, n. 6, p. 7-75, dez. 1972., Villela & Suzigan (1975)VILLELA, Annibal; SUZIGAN, Wilson. Política do governo e crescimento da economia brasileira: 1889-1945. 2. ed., Rio de Janeiro: IPEA/INPES 1975. e Peláez & Suzigan (1981)PELÁEZ, Carlos Manuel; SUZIGAN, Wilson. História monetária do Brasil: análise da política, comportamento e instituições monetárias. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1981..
  • 5
    As estimativas de produto real apontam o início da recuperação nesse ano de 1932; ver várias estimativas em Haddad (1978, p. 34) HADDAD, Claudio L. S. Crescimento do produto real no Brasil, 1900-1947. Rio de Janeiro: FGV, 1978.ou em IBGE (1990, p. 101)IBGE. Estatísticas históricas do Brasil, 1550-1988. 2. ed., Rio de Janeiro: IBGE 1990.. A revolução constitucionalista de 1932 contribuiu para a elevação dos gastos, porém a recuperação se manteve nos anos seguintes.
  • 6
    Ver Neuhaus (1975)NEUHAUS, Paulo. História monetária do Brasil: 1900-45. Rio de Janeiro: IBMEC,1975., Peláez & Suzigan (1981)PELÁEZ, Carlos Manuel; SUZIGAN, Wilson. História monetária do Brasil: análise da política, comportamento e instituições monetárias. Brasília: Editora da Universidade de Brasília, 1981., Bielschowsky (1975)BIELSCHOWSKY, Ricardo Alberto. Bancos e acumulação de capital na industrialização brasileira: uma análise introdutória (1935-1962). Dissertação (Mestrado em Economia) - ICH/UnB, 1975., e mesmo Goldsmith (1986, p. 166-170)GOLDSMITH, Raymond W. Brasil 1850-1984: desenvolvimento financeiro sob um século de inflação. São Paulo: Haper & Row, 1986., Costa (1978, p. 138-152)COSTA, Fernando Nogueira da. Bancos em Minas Gerais (1889-1964). Dissertação (Mestrado em Economia) - IFCH/Unicamp, 1978., Oliveira (1996)OLIVEIRA, Geraldo de Beauclair Mendes de. Expansão do crédito e industrialização no Brasil: 1930-1945América Latina em la Historia Económica: Boletín de Fuentes, n. 6, p. 81-90, jul./dic. 1996. e Costa Neto (2004)COSTA NETO,Yttrio Corrêa da . Bancos oficiais no Brasil: origens e aspectos do seu desenvolvimento. Brasília: BCB, 2004..
  • 7
    Ver Levy (1977)LEVY, Maria Bárbara. História da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: IBMEC, 1977. , Goldsmith (1986)GOLDSMITH, Raymond W. Brasil 1850-1984: desenvolvimento financeiro sob um século de inflação. São Paulo: Haper & Row, 1986., Triner (2000)TRINER, Gail D. Banking and economic development: Brazil, 1889-1930. New York: Palgrave, 2000., Hanley (2005)HANLEY, Anne G. Native capital: financial institutions and economic development in São Paulo, Brazil, 1850-1920. Stanford: Stanford University Press, 2005. e Musacchio (2009)MUSACCHIO, Aldo. Experiments in financial democracy: corporate governance and financial development in Brazil, 1882-1950. New York: Cambridge University Press, 2009..
  • 8
    Ver Abreu (1990, p. 74-82)ABREU, Marcelo de Paiva (Org.). A ordem do progresso: cem anos de política econômica republicana (1889-1989) Rio de Janeiro: Campus, 1990..
  • 9
    Ver, por exemplo, Furtado (2000, quinta parte)FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia Editora Nacional/Publifolha, 2000. e Simonsen (1996, p. 384-386)SIMONSEN, Mário Henrique. Oswaldo Aranha e o Ministério da Fazenda. In: CAMARGO, Aspásia. Oswaldo Aranha: a estrela da revolução. São Paulo: Mandarim, 1996..
  • 10
    A crise iniciou-se um pouco antes em razão da ação deliberada do Banco do Brasil de restringir o crédito e acumular encaixes em setembro de 1928; ver Neuhaus (1975, p. 89)NEUHAUS, Paulo. História monetária do Brasil: 1900-45. Rio de Janeiro: IBMEC,1975.. O grande número de falências determinou a execução da política, pois a lei de falências de 1908 era bastante favorável ao devedor inadimplente. Por outro lado, o país já apresentou crescimento da renda em 1932 e ao longo do restante da década. Por fim, a deflação ocorreu na maior parte desses anos, desde 1929 até 1933, de acordo com o deflator implícito do PIB.
  • 11
    A reabertura da Carteira de Redesconto do Banco do Brasil auxiliou, ainda em 1930, a política anticíclica (ver Decreto nº 19.525, de 24 de dezembro de 1930). Posteriormente, houve a criação da Caixa de Mobilização Bancária, pelo Decreto nº 21.499, de 9 de junho de 1932. Na exposição de motivos, o governo expressou-se nesse último decreto da seguinte forma: "Considerando que o retraimento do crédito impede o desenvolvimento das fontes de riqueza do país; Considerando que esse retraimento é em parte resultante da política de previsão que os bancos se viram compelidos a seguir em face da crise mundial cujas consequências criaram um ambiente de geral desconfiança, Considerando que é essencial restabelecer a normalidade das operações de crédito bancário e que para isso é necessário assegurar aos bancos condições de mobilidade de seus ativos que lhes permitam, em qualquer emergência, fazer face aos compromissos assumidos e às necessidades gerais da economia do país [...]" (cf. site visitado em 28/3/2011 http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=34874&tipoDocumento=DEC&tipoTexto=PUB).
  • 12
    Ver Villela & Suzigan (1975, p. 183)VILLELA, Annibal; SUZIGAN, Wilson. Política do governo e crescimento da economia brasileira: 1889-1945. 2. ed., Rio de Janeiro: IPEA/INPES 1975.. Geraldo Beuclair de Oliveira salientou que o "Decreto nº 21.537, de 15 de junho de 1932, considerando a conveniência de atender às necessidades de financiamento da produção industrial (que dificilmente podem ser a curto prazo) autorizou o redesconto de títulos destinados ao financiamento do setor fabril." (1996, p. 83OLIVEIRA, Geraldo de Beauclair Mendes de. Expansão do crédito e industrialização no Brasil: 1930-1945América Latina em la Historia Económica: Boletín de Fuentes, n. 6, p. 81-90, jul./dic. 1996.). Mais adiante, reforçou: "Isto reforça o argumento de que os bancos comerciais, antes do advento do crédito especializado, atendiam na medida do possível ao setor manufatureiro, inclusive com empréstimos a longo prazo." (idem, p. 88).
  • 13
    Como afirma Paulo Neuhaus: "A partir de 1933, a CAMOB desempenhou importante papel, em conexão com o programa de Reajustamento Econômico, ocasião em que forneceu aos Bancos reservas líquidas depois que parte das dívidas dos agricultores ao sistema bancário foi perdoada por decreto governamental." (1975, p. 115NEUHAUS, Paulo. História monetária do Brasil: 1900-45. Rio de Janeiro: IBMEC,1975.).
  • 14
    A teoria de Fisher (1933)FISHER, Irving. The debt-deflation theory of Great Depressions. Econometrica. Vol. 1 n. 4, out. 1933, p. 337-357. de dívida-deflação é importante para entender as dificuldades posteriores a um período de sobre-endividamento. No caso brasileiro, os problemas anteriores deviam-se à indexação de dívidas ao ouro ou câmbio e às taxas de juros fixadas nas condições vigentes nos anos anteriores à Grande Depressão, bastante superiores às daquele momento. A imprensa defendia abertamente a necessidade de alteração dos contratos de dívida hipotecária agrícola, como se observa nessa passagem da Folha da Manhã de quatro de abril de 1933: "A moratória é medida que se impõe. Impõe-se porque não foi o lavrador a criar a situação angustiosa em que se vem debatendo. [...] Não é justo, pois permitir-se que velhos e honestos fazendeiros sejam despojados do patrimônio de seus filhos, dissabor porque muitos já passaram.". Havia uma clara pressão por parte dos agricultores paulistas pela aprovação da lei, inclusive por meio de associações de classe e partidos, como o da Lavoura.
  • 15
    Ver Simonsen (1995, p. 12-13)SIMONSEN, Mário Henrique. 30 anos de indexação. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1995..
  • 16
    Decreto nº 22.626, de 7 de abril de 1933. (cf. site http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=102665&tipoDocumento=DEC&tipoTexto=PUB visitado em 29/3/2011). A lei reduziu as multas contratuais a 10%; em geral, tais ônus chegavam a 20% somadas a despesas advocatícias de pelo menos 5%. Por fim, a lei permitiu o pagamento em dez prestações anuais, possibilitando para a maior parte dos casos um alongamento dos prazos de pagamento. No jornal Estado de S. Paulo de 7 de abril informava-se: "A situação do débito hipotecário dos lavradores era alarmante e daí entender o governo ser mais racional, encarar-se o problema na sua origem. E, em vez da moratória, a solução mais lógica seria o decreto que se encontra já em poder do chefe do governo, combatendo a usura". No dia seguinte, a Folha da Manhã afirmava: "O governo provisório fez um decreto em que se atende à necessidade da moratória para a lavoura.", ou seja alongamento dos prazos de pagamento. Em anúncio do Partido da Lavoura na primeira página da Folha da Manhã do dia 9 de abril, o interventor em São Paulo foi aclamado pela "conquista" da sua aprovação.
  • 17
    Decreto nº 23.501, de 27 de novembro de 1933.
  • 18
    O Banco Português constitui um exemplo de instituição bancária em dificuldade de receber seus créditos. De acordo com Teresa Marques, diferentemente do banco Boa Vista, "o peso das hipotecas sobre o movimento do ativo foi crescendo à medida que o banco aprofundava as suas dificuldades, após 1930, até atingir a espantosa proporção de 14% do movimento em 1933." (Marques, 1998, p. 223MARQUES, Teresa Cristina de Novaes. O setor bancário privado carioca entre 1918 e 1945: os bancos Boavista e Português do Brasil - um estudo de estratégias empresariais. Dissertação (Mestrado em História Social) - IFCS/UFRJ, 1998.). Não houve concessões de novas hipotecas durante o início dos anos 1930, mas a retração dos negócios aumentou a importância relativa dos empréstimos antigos.
  • 19
    O Decreto nº 23.533, de 1º de dezembro de 1933. (cf. site visitado em 29/3/2011 http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=42681&tipoDocumento=DEC&tipoTexto=PUB). Há nítida associação entre as leis, como Annibal Villela e Wilson Suzigan afirmaram: "O desconto de 50% nas dívidas dos fazendeiros foi considerado pela lei como pagamento antecipado dos primeiros 5 pagamentos anuais das parcelas de 10%, de acordo com a lei da usura. Daí, durante os primeiros cinco anos após o Reajustamento Econômico, os credores só poderiam exigir os juros de seus empréstimos." (1975, p. 201VILLELA, Annibal; SUZIGAN, Wilson. Política do governo e crescimento da economia brasileira: 1889-1945. 2. ed., Rio de Janeiro: IPEA/INPES 1975.).
  • 20
    Nessa sessão, o constituinte do Rio de Janeiro Acúrcio Torres demandou do governo a ampliação do benefício para as dívidas quirografárias que fossem provadas e principalmente a criação da carteira hipotecária agrícola do Banco do Brasil: "A lavoura, repito, precisa de todo amparo, mas não do amparo sui generis e incerto que lhe ofereceu o governo; precisa do auxílio direto, do pagamento de seus débitos, com a sub-rogação do país nos respectivos créditos em prazo longo e até sem juros. Auxiliemos a lavoura, sem a intervenção do intermediário - banco ou casa bancária. Auxiliemos a lavoura, sem atendermos a outros objetivos que não ao amparo, franco e decidido, pois de outra foram, teremos essa obra desvirtuada e, quem sabe, comprometida até o bom nome de quem protege e de quem é protegido." (Anais da Assembleia Constituinte de 1934, 16 de fevereiro de 1934, p. 89ANAIS da Assembleia Nacional Constituinte de 1934. 2015. Disponível em: <Disponível em: http://imagem.camara.gov.br/constituinte_principal.asp >. Acesso em: 5/10/2015.
    http://imagem.camara.gov.br/constituinte...
    ). Assim, a Lei do Reajustamento continuava a provocar reações bastante enfáticas dos constituintes.
  • 21
    Decreto nº 24.233, de 12 de maio de 1934. Posteriormente, o Banco do Brasil recebeu, por meio de contrato, os serviços de apoio à coleta e preparação dos pedidos para a Câmara de Reajustamento. De acordo com o relatório do banco do exercício de 1935: "Desde o início do serviço, no último trimestre de 1934, até fins de 1935, haviam sido recebidos pelo banco 24.378 processos de pedidos de indenização, dos quais 5.284 foram encaminhados à Câmara de Reajustamento Econômico. Em fins de 1935, estavam, pois, em poder do banco, para fins de verificações e diligências, 19.094 processos, dos quais 8.219, ainda em poder de agências, se achavam na primeira fase dos trâmites preparatórios, enquanto os restantes 10.875, já em exame na Matriz, dependiam de verificações sumárias, para subirem ao julgamento da Câmara." (1936, p. 50BANCO DO BRASIL. Relatório do Banco do Brasil apresentado à Assembleia Geral dos acionistas na sessão ordinária de 18 de abril de 1936. Rio de Janeiro: Typ. Jornal do Comércio, 1936.).
  • 22
    A Sociedade Rural Brasileira de São Paulo criticou, por meio do deputado Miguel Coutinho na Assembleia Legislativa, a demora em receber as apólices, já que as dos processos julgados em 8 de agosto de 1936 ainda não tinham sido entregues até o momento da sessão de 28 de outubro de 1937 (cf. Diário Oficial do Estado de São Paulo, 29 de outubro de 1937, p. 22). De fato, os recursos iniciais de 500 mil contos esgotaram-se ao longo de 1936, suspendendo os pagamentos em agosto. Um crédito suplementar de 250 mil contos foi aprovado em 1937, mas o Tribunal de Contas exigiu o registro dos pagamentos desses recursos adicionais. Esperava-se uma nova lei do governo federal para suprimir o registro.
  • 23
    Os processos julgados pela Câmara foram em número bastante menor do que os recebidos pelo Banco do Brasil.
  • 24
    O decreto do governo subestimou o estoque de dívidas agrícolas com garantias reais existentes em 1933, necessitando ampliar o limite de emissão de apólices à medida do avanço do trabalho da Câmara. Em 1937, houve o crédito adicional de 250 mil contos de réis. No ano seguinte, elevou-se o limite de emissão de apólices a 900 mil contos, por meio do Decreto-Lei nº 729, de 22 de setembro de 1938. Finalmente, em 1941, concluiu-se a ampliação a 920 mil contos, de acordo com o Decreto-Lei nº 3.048, de 13 de fevereiro. Ademais, havia créditos especiais para o pagamento de juros.
  • 25
    O relatório da diretoria da Companhia Industrial e Agrícola Ribeirão das Lages demonstra a aplicação da nova legislação aos contratos de dívida agrícola e lançamentos contábeis efetuados: "O balanço geral encerrado em 31 de dezembro de 1933 e bem assim relatar-lhes o que se passou naquele ano. Os nossos devedores com garantias hipotecárias agrícolas, 27 de maio de 1933, em virtude de prévio acordo reduziram a sua dívida, que naquela data era de cerca de 450 contos de réis, tendo pago por conta dessa importância a quantia 170 contos de réis, em troca da quitação que lhes demos em 3 das propriedades que faziam parle de nossa garantia, tendo eu feito consignar na escritura o direito aos remanescentes se, enquanto formos credores, recair qualquer ação executiva sobre as 3 referidas propriedades. Nessa mesma ocasião ficou combinado e confirmado em carta de 29 daquele mês que ficava concedido aos devedores o prazo de até 23 de setembro de 1934, para o pagamento da 1ª prestação que, de acordo com a lei de usura devia ser em abril corrente. Fiz ainda ciente aos devedores da nova taxa de juros que passou a ser de 8% a partir de 7 de abril de 1933, de acordo com a lei e bem assim cientifiquei-os igualmente dos lançamentos que havia mandado fazer a débito dos mesmos na conta 'Garantias hipotecárias' da diferença de juros não debitados, condicionalmente. em 1932, bem como da importância correspondente à capitalização dos mesmos juros, desde 1931, também ainda não debitados, conforme expus aos senhores acionistas no meu relatório de 8 de abril de 1933. Em virtude da lei de Reajustamento Económico, mandei extrair o saldo devedor em 1 de dezembro, da conta 'Garantias hipotecárias' e bem assim lançar a débito do Governo Federal (Lei de Reajustamento Econômico) a quantia de 147:101$300, em quanto montava os 50% da divida hipotecária atingida pela referida lei; e mandei creditar aos devedores (conta garantias hipotecárias) a referida importância. Assim, quando formos embolsados das apólices a que se refere a citada lei de "Reajustamento Econômico", mandaremos fechar aquela conta. Todos os documentos exigidos pela lei já se acham prontos esperando apenas que comece a funcionar a Câmara de Reajustamento para serem entregues à mesma." (Diário Oficial da União, 12 de maio de 1934, p. 58)
  • 26
    Este decreto possibilitava a cobrança de juros de 12% ao ano quando feitos até o prazo de 24 meses e de 15% ao ano em maior prazo, cobráveis pela tabela Price sobre a quantia realmente devida em cada mês.
  • 27
    Decreto nº 312, de 3 de março de 1938.
  • 28
    Ver Acórdão dos juízes da Câmara Civil da Corte de Apelação sobre um executivo hipotecário de 1935 (Diário Oficial do Estado de São Paulo, 12 de maio de 1935, p. 28).
  • 29
    Como Renato Marcondes de Lacerda em seu Instituto da Hipoteca de 1934 afirmou: "156. A função do crédito não é mais entendida como uma função puramente individual. Os recentes decretos sobre o reajustamento econômico são disso a melhor prova. A intervenção do governo veio demonstrar a necessidade de modificar-se a legislação hipotecária, que tem causado a ruína dos devedores e até de credores. 157. Se a hipoteca operasse a circulação, não teria sofrido a desmoralização que sofreu. Os imóveis, mesmo numa época de depressão dos valores, como a que atravessamos, não se teriam desvalorizado tanto, causando a infelicidade completa dos devedores, que tudo tiveram de entregar aos credores ficando alguns ainda a dever. A consequência de tudo é a paralização da lavoura, da indústria, do comércio, a miséria e a instabilidade geral.[...] 158. E assim é, porque o devedor, além de perder o seu imóvel, ainda sofre, sozinho, as consequências da situação geral, para a qual não contribuiu, não sendo responsável pela queda dos valores" (Lacerda, 1934, capítulo VIIILACERDA, Renato Marcondes de. O instituto da hipoteca: sua evolução necessária. São Paulo: s.ed., 1934.).
  • 30
    Ver Bielschowsky (1975, p. 61-62)BIELSCHOWSKY, Ricardo Alberto. Bancos e acumulação de capital na industrialização brasileira: uma análise introdutória (1935-1962). Dissertação (Mestrado em Economia) - ICH/UnB, 1975., Villela & Suzigan (1975, p. 79-80 e 187-188)VILLELA, Annibal; SUZIGAN, Wilson. Política do governo e crescimento da economia brasileira: 1889-1945. 2. ed., Rio de Janeiro: IPEA/INPES 1975. e Malan et alii (1977, p. 242-251)MALAN, Pedro S. et al. Política econômica externa e industrialização no Brasil (1939-1952). Rio de Janeiro: IPEA/INPES, 1977..
  • 31
    O Banco do Brasil tornou-se a grande instituição bancária daquela época. Apesar da crise, o banco ampliou a rede de agências e atingiu a maioria dos Estados. Na área do crédito, a CREAI alargou os seus financiamentos à produção e a prazos mais longos por meio de fundos especializados com a emissão de bônus, por causa da escassez de recursos privados mesmo depois das medidas tomadas para a recuperação da crise. A crise no mercado hipotecário privado conduziu à necessidade de maior participação pública, por meio do penhor rural não prejudicado pela preferência hipotecária mesmo que em execução (cf. Decreto nº 1.003, de 29 de dezembro de 1938). Beskow salientou as razões para a sua criação: reduzida parcela dos empréstimos para os setores agrícola e industrial em favor do Tesouro Nacional, Estados, municípios e Departamento Nacional do Café e a insuficiência dos fundos para empréstimos (cf. 1994, p. 194-195BESKOW, Paulo Roberto. O crédito rural público numa economia em transformação: estudo histórico e avaliação econômica das atividades de financiamento agropecuário da CREAI/BB, de 1937 a 1965. Tese (Doutorado em economia) - IE/Unicamp, 1994.). Iliane Silva destacou o direcionamento entre 1937 e 1945 principalmente para a agricultura, mas também para a indústria (cf. Silva, 2010, p. 114SILVA, Iliane Jesuína da. Estado e agricultura no primeiro governo Vargas (1930-1945). Tese (Doutorado em Desenvolvimento Econômico) - IE/Unicamp, 2010.). A ideia era de mobilizar os recursos dos institutos de previdência para o financiamento da economia, mas posteriormente também recorreu aos recursos da poupança compulsória e emissão monetária (ver Silva, 2007SILVA, Mauro Santos. Política de mobilização de capitais para investimento privado: regulação bancária, funding, operacionalização e desempenho da CREAI (1932-1945). Revista da EconomiA. Selecta, v. 8, n. 4, p. 123-148, dez. 2007.).
  • 32
    M1 é a soma do papel-moeda em poder público e dos depósitos à vista. As informações de M1 e depósitos a prazo foram obtidas no site www.ipeadata.gov.br em 3/2/2012. Os empréstimos das instituições bancárias são muito semelhantes à soma dos depósitos à vista e a prazo, assim optamos pelos depósitos, já que os dados foram consolidados por Wilson Suzigan (ver IBGE, 1990IBGE. Estatísticas históricas do Brasil, 1550-1988. 2. ed., Rio de Janeiro: IBGE 1990.). O comportamento da série de empréstimos mostrou relativa estabilidade nominal entre 1928 e 1931, crescendo a partir desse momento. Por outro lado, eles representaram um quinto do PIB em 1928-29 (19,7%), aumentando posteriormente, primeiro em razão da redução do produto e depois em função da elevação dos próprios empréstimos, chegando a um quarto do PIB em 1934 (25,3%).
  • 33
    A melhora do funcionamento do sistema bancário decorreu da criação da Inspetoria Geral dos Bancos em 1921, a fim de fiscalizar as instituições bancárias (Decreto nº 14.728, de 16 de março de 1921).
  • 34
    O valor médio real das hipotecas brasileiras cresceu de 19,5 contos de réis em 1929 para 24,2 em 1931; porém se reduziu a 17,2 em 1933 e recuperou-se um pouco em 1934 (18,3). Assim, a redução do número revelou-se mais importante do que dos seus valores.
  • 35
    Enquanto o valor nominal médio urbano manteve-se razoavelmente constante entre 1929 e 1934, o valor médio rural apresentou declínio expressivo.
  • 36
    Pires e Almico (2008) PIRES, Anderson José; ALMICO, Rita de Cássia da Silva. Crédito e finanças em uma sociedade cafeeira. História e Economia v. 4, n. 2, p. 221-247, 2008.também apontaram significativa retração do crédito hipotecário em Juiz de Fora, no início dos anos 1930, que era o centro da Zona da Mata. Essa região destacava-se na produção de café em Minas Gerais.
  • 37
    Enquanto o número de hipotecas rurais no Brasil reduziu-se a quase um quarto entre 1929 e 1934, as paulistas diminuíram a um quinto.
  • 38
    Podemos ilustrar tal situação por meio do município de Ribeirão Preto, grande produtor de café nas primeiras décadas do século XX. Nessa cidade, o número de hipotecas retraiu-se de 240 em 1929 para 75 em 1934, de outro lado os valores reais das hipotecas diminuíram de 16 mil contos de réis para 4,7 mil em idênticos anos.
  • 39
    Além do aumento do número de bancos, houve aumento dos ativos, empréstimos e depósitos. Durante a crise, a razão depósitos/PIB de 19,6% em 1929 para 24,0% em 1931, que em parte se deve à retração do PIB (cf. Goldsmith, 1986, p. 167GOLDSMITH, Raymond W. Brasil 1850-1984: desenvolvimento financeiro sob um século de inflação. São Paulo: Haper & Row, 1986.). Contudo, os ativos bancários recuperam, nominalmente, os montantes de 1929 já em 1932. Assim, o autor concluiu que "o sistema bancário brasileiro foi menos afetado pela Grande Depressão" (Goldsmith, 1986, p. 172).
  • 40
    O município de São Paulo realizou mais da metade das hipotecas bancárias do Estado em 1934, seja em número (51,4%), seja em valor (62,5%).
  • 41
    Ver Costa (1978)COSTA, Fernando Nogueira da. Bancos em Minas Gerais (1889-1964). Dissertação (Mestrado em Economia) - IFCH/Unicamp, 1978.. Além do Distrito Federal e Minas Gerais, os valores hipotecados pelos bancos superaram os dos particulares em 1934 para o Maranhão e Pernambuco. Contudo, no primeiro caso, consistiu numa única transação bancária.
  • 42
    Nessa época, o principal banco hipotecário em São Paulo foi o Banespa, sobre qual se deve consultar Costa (1988)COSTA, Fernando Nogueira da. Banco do Estado: o caso Banespa. Tese (Doutorado em Economia) - IE/UNICAMP, 1988.. Apesar de a participação das hipotecas nos seus ativos oscilar muito de um ano para o outro, tal parcela atingiu uma média de 11,5% no triênio 1927-1929; porém se reduziu a 9,2% no seguinte (1930-1932), mantendo tal patamar no restante da década. Por outro lado, os balanços do Banco do Brasil não informavam, até o início dos anos 1930, de forma separada a presença das hipotecas no seu ativo. Outras instituições também atuavam nesse mercado, como o Lar Brasileiro Associação de Crédito Hipotecário, com matriz do Rio de Janeiro e sucursal em São Paulo, cuja soma dos empréstimos hipotecários atingiu pouco mais de cem mil contos de réis no início de 1932. Essa quantia representou 44,6% do ativo da associação.
  • 43
    Utilizamos as informações das taxas de juros de 1933, e não de 1934, uma vez que estas últimas já se marcaram pela lei da usura.
  • 44
    Se compararmos com a realidade norte-americana, verificamos que a demora na recuperação dos empréstimos hipotecários residenciais também se mostrou maior do que os de negócios, não se recuperando em 1934 nem mesmo em 1935 (ver Bernanke, 1983, p. 273BERNANKE, Ben S. Nonmonetary effects of the financial crisis in the propagation of the Great Depression. The American Economic Review. v. 73, n. 3, p. 257-276, jun. 1983.).
  • 45
    A Caixa Econômica da Corte foi criada pelo Decreto nº 2.723, de 12 de janeiro de 1861. A partir de 1874, Caixas em diferentes províncias foram abertas, como a de São Paulo e a do Rio Grande do Sul em 1875. Já no ano de 1883, existiam 16 Caixas nas capitais de províncias distintas, além da do município da corte.
  • 46
    Os empréstimos começaram a se diversificar em função da reforma de 1915 (Decreto nº 11.820, de 15 de dezembro), mediante empréstimos sob a caução de apólices da União. O vice-presidente Antonio Ludgero de Souza Castro informa em seu relatório da Caixa Econômica Federal de São Paulo de 1919 a necessidade da ampliação de títulos aceitos em descontos e realizar empréstimo consignado para os funcionários públicos federais: "É também de grande conveniência dar ao Monte Socorro autorização para emprestar sobre o penhor de apólices e letras do Estado ou da Câmara Municipal da Capital. Esses títulos têm grande cotação na praça. Os empréstimos a funcionário federais, sob garantia de seus vencimentos, com as precauções necessárias, livraria os servidores da União das garras da agiotagem e proporcionaria a este Instituto lucros apreciáveis." (p. 8-9).
  • 47
    As Caixas iniciaram suas operações de empréstimos por consignação para funcionários públicos a partir do Decreto nº 20.225, de 18 de julho de 1931. A Caixa Econômica Federal do Rio de Janeiro começou a realizar hipotecas ainda nesse ano de 1931. Por outro lado, a Caixa de São Paulo realizou três empréstimos hipotecários em 1933 e, já no ano seguinte, 51 (cf. Balanço publicado no Estado de S. Paulo de 6 de janeiro de 1937).
  • 48
    O relatório do gerente da Caixa Econômica Federal de São Paulo salienta o quadro da crise ao final de 1929: "[...] o movimento foi crescente até o mês de outubro [...], decrescendo nos dois meses seguintes, devido, sem dúvida, à campanha eleitoral, que provocou, por meio de boatos terroristas, a desconfiança popular, diminuindo as entradas e aumentando as retiradas, quer no número quer nas quantias. Foram tomadas providências adequadas, sendo os depositantes satisfeitos com a máxima prontidão, de modo a ser mantido integral o crédito do instituto, evitando-se assim a corrida que parecia iminente. Na data em que escrevo [20/3/1930 / RLM], já as quantias retiradas estão voltando, sendo feitos novos depósitos em profusão." (1930, p. 49CAIXA ECONÔMICA FEDERAL DE SÃO PAULO. Relatório da Caixa Econômica Federal de São Paulo relativa ao ano de 1930., São Paulo: Irmãos Ferraz 1931.). Além das entradas menores do que as saídas nos depósitos em 1929 e 1930, a Caixa Econômica Federal da Bahia, em seu relatório de 1933, informou o aumento dos penhores em função da crise de 1929: "O aumento sensível de penhores registrados em 1930, em nossos guichês, foi uma consequência da crise de 1929 [...] processando-se, após o crack, um reerguimento do comércio, pela rearticulação das suas atividades, pela consolidação do crédito, por um sistema mais seguro de operar, diminuíram sensivelmente os penhores feitos pelas classes comerciais." (1934, p. 22-23CAIXA ECONÔMICA FEDERAL DA BAHIA. Relatório do exercício de 1933 apresentado ao Exmo. Sr. Ministro da Fazenda pelo Conselho Administrativo da Caixa Econômica Federal da Bahia. Bahia: Tipografia Naval, 1934.). Esse resultado de maiores saques também ocorreu em outros momentos de crise, como em 1914 e 1921.
  • 49
    Os títulos públicos também ganharam maior preferência em relação aos títulos privados durante a crise. De 1931 a 1938, em geral, mais de nove décimos das transações na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro foram de títulos públicos da dívida interna (cf. Levy, 1977, p. 415-16LEVY, Maria Bárbara. História da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: IBMEC, 1977. ).
  • 50
    Analisando esses dados e principalmente o valor do depósito por caderneta, Goldsmith afirmou: "A poupança, através de depósitos na Caixa Econômica Federal, tornou-se mais comum e aparentemente espalhou-se para grupos de nível de renda mais baixa." (1986, p. 173GOLDSMITH, Raymond W. Brasil 1850-1984: desenvolvimento financeiro sob um século de inflação. São Paulo: Haper & Row, 1986.). O número de cadernetas por mil habitantes cresceu de 25,6 em 1929 para 41,2 em 1940, revelando que quase um vigésimo da população detinha caderneta de algumas das Caixas.
  • 51
    Os empréstimos por conta garantida também poderiam ser realizados para entidades privadas com responsabilidade de uma pública.
  • 52
    Ver Censo de 1940 (cf. IBGE, 1950, v. III, p. 384-387IBGE. Recenseamento geral do Brasil: censos econômicos. Rio de Janeiro: IBGE, 1950, v. III.).
  • 53
    Em 1936, a participação foi de 22,3% do total de hipotecas realizadas no Distrito Federal. As Caixas realizaram quase dois terços dos empréstimos sobre imóveis com garantia hipotecária dos estabelecimentos de crédito (bancos, casas bancárias, Caixas, etc.) em 1939 (64,2%). Assim, as Caixas já eram mais atuantes no mercado hipotecário do que o restante do sistema bancário. De fato, nos Anuários Estatísticos do Brasil, as Caixas eram consideradas em separado do sistema bancário, como no censo, mas na Previdência e Assistência Social até o meado dos anos 1950, por isso seus depósitos não foram considerados nos depósitos a prazo do Gráfico 1.
  • 54
    Balanços publicados no Estado de S. Paulo de 21 de julho de 1935, 6 de janeiro de 1937, 21 de julho de 1938 e 30 de julho de 1939. Em 1934, os empréstimos da Caixa paulista representaram apenas 28,4% dos depósitos.
  • 55
    Devemos destacar que pouco mais de quatro quintos das hipotecas da Caixa paulista foram para empréstimos industriais (43,1%, cf. Diário Oficial da União, 16 de julho de 1942, p. 11.248). Nesse balanço, as hipotecas enquadraram-se nos empréstimos em longo prazo, os quais em geral o prazo para amortização é superior a cinco anos. Elas consistiram na principal forma desses empréstimos a prazos maiores. No conjunto, os financiamentos em longo prazo representaram mais de quatro quintos do total (83,5%).
  • 56
    Conforme o Anuário de Belo Horizonte (INE, 1937, p. 96INE. Anuário Estatístico de Belo Horizonte: ano I - 1937. Belo Horizonte: Oficinas Gráficas da Estatística Geral, 1937.).
  • 57
    Conforme o Balanço da Caixa Econômica Federal de Minas Gerais, publicado no Correio Paulistano de 26 de junho de 1938, p. 19.
  • 58
    Ver Relatórios da Caixa Econômica Federal da Bahia de 1933CAIXA ECONÔMICA FEDERAL DA BAHIA. Relatório do exercício de 1933 apresentado ao Exmo. Sr. Ministro da Fazenda pelo Conselho Administrativo da Caixa Econômica Federal da Bahia. Bahia: Tipografia Naval, 1934. e 1940CAIXA ECONÔMICA FEDERAL DA BAHIA. Relatório da Caixa Econômica Federal da Bahia referente ao ano de 1939 apresentado ao Exmo. Sr. Ministro da Fazenda e Presidente do Conselho Superior das Caixas Econômicas Federais pelo Dr. Lauro A. Passos Presidente do Conselho Administrativo. Bahia: Livraria e Papelaria Catilina, 1940.. Ainda podemos mencionar o caso da Caixa do Rio Grande do Sul, que elevou a participação dos empréstimos nos depósitos de 3,1% em 1930 para 39,5% em 1939. Neste último ano, as hipotecas representaram cerca de um terço dos empréstimos (33,0%), e as cauções, mais de quatro décimos (44,5%), conforme relatório da Caixa gaúcha de 1931CAIXA ECONÔMICA FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL. Relatório da Caixa Econômica Federal do Rio Grande do Sul referente ao ano de 1931 apresentado ao Exmo. Sr. Ministro da Fazenda pelo Major Floriano Nunes Dias, Presidente do Conselho Administrativo. Porto Alegre: Livraria Americana, 1931. e 1939CAIXA ECONÔMICA FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL. Relatório da Caixa Econômica Federal do Rio Grande do Sul referente ao ano de 1939 apresentado ao Exmo. Sr. Ministro da Fazenda pelo Dr. Cylon F. Rosa, Presidente do Conselho Administrativo. Porto Alegre: s. ed., 1940..
  • 59
    Esta informação diverge da do recenseamento de 1940, na qual os empréstimos representaram quase um terço do saldo dos depósitos de todas as Caixas em 1939 (cf. IBGE, 1950, v. III, p. 384-387). Há duas possíveis explicações para essa divergência, decorrente em parte de uma possível inclusão das Caixas Estaduais, mas que naquele momento realizavam poucos empréstimos, e de serem os créditos concedidos nesse ano apenas, ao contrário do estoque das informações dos Anuários.
  • 60
    Nesses anos 1930, a carteira de empréstimos pode ser dividida de acordo com o prazo do crédito. De acordo com relatório da Caixa do Rio (Luz, 1941, p. 125), realizavam-se penhores e cauções de títulos no curto prazo (até seis meses); as consignações e diversos no médio prazo (de 6 a 48 meses) e hipotecas e financiamentos com garantias diversas (ou simultâneas) no longo prazo (mais de quatro anos).
  • 61
    A reorganização da carteira de redescontos do Banco do Brasil foi um importante passo para o financiamento da produção, inclusive industrial (ver Oliveira, 1996, p. 88OLIVEIRA, Geraldo de Beauclair Mendes de. Expansão do crédito e industrialização no Brasil: 1930-1945América Latina em la Historia Económica: Boletín de Fuentes, n. 6, p. 81-90, jul./dic. 1996.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2015

Histórico

  • Recebido
    19 Nov 2012
  • Aceito
    27 Mar 2014
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