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A sustentabilidade ecológica do consumo em Minas Gerais: uma aplicação do método da pegada ecológica

Resumo:

Embora sejam intensas as preocupações com o desenvolvimento sustentável, escassas são as tentativas de se mensurá-lo entre as unidades subnacionais no Brasil. Com o intuito de contribuir para o preenchimento dessa lacuna, este trabalho tem como objetivo principal analisar a sustentabilidade ecológica do consumo da população do Estado de Minas Gerais no ano de 2008 por meio do cálculo de sua pegada ecológica. A análise se baseia nas contribuições mais recentes para tal metodologia, buscando comparar o impacto local e a disponibilidade global de recursos. Concluiu-se que, apesar de estar dentro da própria capacidade de suporte do Estado, em termos per capita, a demanda absoluta por capital natural gera uma pressão excessiva quando comparada à disponibilidade mundial de capital natural, uma vez que, caso a população de todo o mundo mantivesse o mesmo padrão de consumo dos mineiros, seriam necessários 2,64 planetas Terra para sustentá-la.

Palavras-chave:
pegada ecológica; escala; sustentabilidade; Minas Gerais

Abstract:

Despite concerns about sustainable development being very intense, there are few attempts to measure it among sub-national units in Brazil. In order to contribute to filling this gap, this paper aims to provide an ecological sustainability assessment for the consumption of Minas Gerais's population in 2008 based on the calculation of its ecological footprint. The analysis draws upon the most recent contributions for this methodology based on comparisons between its local impact and global availability of resources. We concluded that in absolute terms the demand for natural capital in the state is less than its capacity. Nonetheless, in terms of per capita consumption it places significant pressure on global availability of natural capital because, if the global population were to consume the equivalent of an average person from Minas Gerais, there would need to be 2.64 planet Earths to sustain such a consumption level.

Keywords:
ecological footprint; scale; sustainability; Minas Gerais

1. Introdução

A crescente preocupação com o chamado desenvolvimento sustentável vem sendo desencadeada pelos impactos negativos da atividade econômica sobre o meio ambiente. Se antes da Segunda Guerra Mundial o esgotamento de recursos naturais e a degradação ambiental ocorriam de forma localizada, o desenvolvimento das forças produtivas no pós-guerra atingiu uma escala suficiente para afetar todo o planeta, levando alguns autores a considerar os chamados Golden Years como o período de "Grande Aceleração", no sentido de que houve aumento exponencial da pressão das atividades econômicas sobre a estabilidade dos ecossistemas, gerando outro padrão de escassez dos recursos. Isso exige a elaboração e a implementação de políticas econômicas adequadas e capazes de lidar com as peculiaridades trazidas por essa nova problemática ambiental (Andrade et al., 2012ANDRADE, D. C.; SIMÕES, M. S.; ROMEIRO, A. R. From an empty to a fullworld: A nova natureza da escassez e suas implicações. Economia e Sociedade, v. 21, p. 695-722, 2012.).

Há muito tempo, os economistas ecológicos chamam a atenção para o fato de que o sistema econômico é um subsistema contido em um todo maior, conhecido genericamente como ecossistema global (Gowdy; Erickson, 2005GOWDY, J.; ERICKSON, J. D. The approach of ecological economics. Cambridge Journal of Economics, v. 29, p. 207-222, 2005.; Özkaynak et al., 2012ÖZKAYNAK, B.; ADAMAN, F.; DEVINE, P. The identity of ecological economics: Retrospect and prospects., Cambridge Journal of Economics v. 36, p. 1123-1142, 2012.). Este último é finito e materialmente fechado, oferecendo, assim, um limite absoluto e instransponível para a expansão do sistema econômico. A relação entre a dimensão dos dois sistemas (econômico e natural) é conhecida por escala do sistema econômico (Daly, 1993DALY, H. E. Ecological economics: The concept of scale and its relation to allocation, distribution, and uneconomic growth. Discussion Paper: School of Public Affairs, University of Maryland, 1993.; Lawn, 2001LAWN, P. A. Scale, prices, and biophysical assessments., Ecological Economics v. 38, p. 369-382, 2001.; Malghan, 2010MALGHAN, D. On the relationship between scale, allocation, and distribution., Ecological Economics v. 69, p. 2261-2270, 2010.), e a ênfase em seu estudo é uma das principais diferenças entre a teoria econômica convencional sobre o meio ambiente (economia ambiental neoclássica) e a economia ecológica.

Além de sua ênfase no estudo da escala do sistema econômico, a economia ecológica se diferencia da economia ambiental neoclássica por reconhecer o caráter entrópico de funcionamento do sistema econômico (Georgescu-Roegen, 1971GEORGESCU-ROEGEN, N. The entropy law and the economic process. Cambridge: Harvard University Press, 1971.). De maneira simples, entropia remete à ideia de quantidade de energia não disponível em um sistema termodinâmico. Sua incorporação no debate econômico - bem como a consideração de suas implicações para o estudo da sustentabilidade - é feita pelos economistas ecológicos, segundo os quais a verdadeira escassez com a qual a humanidade inescapavelmente deverá se deparar é a de baixa entropia (Georgescu-Roegen, 1975GEORGESCU-ROEGEN, N. Energy and economic myths. Southern Economic Journal, v. 41, n. 3 (January), p. 347-381, 1975.).

Essa interpretação diverge da visão neoclássica, que implicitamente admite um funcionamento mecânico para o sistema econômico. O esquema analítico convencional aceita, pois, a possibilidade de reversão dos fenômenos socioeconômicos. Os economistas ecológicos, por sua vez, postulam a possibilidade de ocorrência de fenômenos irreversíveis e potencialmente catastróficos para a vida no planeta Terra, caso as pressões do sistema econômico forem grandes o suficiente para desestabilizar a resiliência dos ecossistemas (Chechin; Veiga, 2010CHECHIN, A. D.; VEIGA, J. E. da. A economia ecológica e evolucionária de Georgescu-Roegen. Revista de Economia Política, v. 30, n. 3 (119), p. 438-454, jul./set., 2010.).

Em se tratando da ideia de escala do sistema econômico, sua consideração remete a questionamentos sobre como mensurá-la, o que torna necessário o desenvolvimento de ferramentas capazes de fornecer um diagnóstico da situação corrente das sociedades. Em outras palavras, é importante que haja medidas sobre a distância existente entre as fronteiras do sistema econômico e o limite estabelecido pela capacidade de suporte dos ecossistemas.1 1 Capacidade de suporte do sistema (carrying capacity) é um conceito importante dentro da ecologia e remete à ideia do máximo de indivíduos de uma determinada espécie que um hábitat pode suportar. Mais detalhes sobre o conceito e sua importância para o estudo de questões ambientais podem ser vistos em Seidl e Tisddel (1999). Todavia, esse não é um exercício trivial, uma vez que a mensuração da atual escala do sistema econômico é dificultada pela escassez ou pela inexistência de dados. Além disso, a determinação dos limites máximos do ecossistema (escala máxima sustentável)2 2 Ver Lawn (2001) para uma análise sobre os conceitos de escala máxima sustentável, relativa à resiliência e capacidade de suporte dos ecossistemas, e escala ótima do sistema econômico, referente aos custos e aos benefícios provenientes da expansão do sistema econômico. Malghan (2006) oferece uma estrutura analítica para o estudo da escala e da relação entre sistema econômico e ecossistemas. esbarra nas incertezas sobre o funcionamento dos ecossistemas e sua complexidade inerente.

Apesar das dificuldades, foram desenvolvidos diversos indicadores de sustentabilidade com o objetivo principal de fornecer medidas sobre o quanto determinada sociedade (ou atividade) é sustentável (ou não). Neste contexto, o presente trabalho busca estabelecer tal medida para a população do Estado de Minas Gerais no ano de 2008 por meio da metodologia da pegada ecológica.3 3 Neste trabalho, os termos "pegada ecológica" ou simplesmente "pegada" serão utilizados indistintamente. O mesmo se pode dizer com relação a expressões "escala do sistema econômico" e "escala". Esse Estado foi escolhido como objeto deste trabalho em razão de sua importância para o país, tanto em termos econômicos, populacionais e políticos. A diversidade econômica do Estado foi um fator que favoreceu sua escolha, uma vez que a aplicação da metodologia da pegada ecológica para uma região com concentração muito alta de certo tipo de atividade poderia levar a uma distorção do indicador.

A seleção de Minas Gerais também contou com fatores como a relativa antiguidade de sua colonização (ao menos em relação ao Brasil), o que pode ter impactado em sua biocapacidade, e os potenciais efeitos ambientais decorrentes de opções de especialização em alguns ramos industriais (especialmente, os setores ligados à extração de minerais).

A discussão sobre indicadores de sustentabilidade não é livre de debates, existindo várias abordagens e visões acerca do assunto. Especialistas no tema afirmam que é preciso avançar na construção de outras metodologias e aperfeiçoamento daquelas já existentes (Stiglitz-Sen-Fitoussi, 2009STIGLITZ-SEN-FITOUSSI. Report by the Commission on the Measurement of Economic Performance and Social Progress. Paris: 2009. Disponível em: <http://www.stiglitz-sen-fitoussi.fr>. Acesso em: jan. 2013.
http://www.stiglitz-sen-fitoussi.fr...
). A despeito da controvérsia, o fato é que a obtenção de tais indicadores deve ser pré-requisito para a elaboração de políticas públicas que tenham como objetivo o chamado desenvolvimento sustentável.

O trabalho está estruturado em cinco seções, além desta introdução e das considerações finais. As seções 1 e 2 apresentam, respectivamente, alguns aspectos conceituais relacionados ao método da pegada ecológica e os procedimentos metodológicos adotados para sua aplicação em Minas Gerais. A seção 3 descreve as estimativas encontradas para cada componente de cálculo da pegada ecológica e da biocapacidade. A quarta seção, por sua vez, discute os resultados obtidos à luz da abordagem de saldo ecológico (déficit ou superávit ecológico em função dos resultados da pegada ecológica e da biocapacidade da região analisada). A seção 5 apresenta as razões pelas quais se pode considerar o consumo da população de Minas Gerais - e consequentemente sua escala - como insustentáveis. Finalmente, as considerações finais sistematizam as principais contribuições do trabalho e apresentam alguns desdobramentos de política.

2. O método da pegada ecológica: aspectos conceituais

Dentre as várias metodologias existentes para o diagnóstico da situação ambiental de determinada região, a pegada ecológica se destaca em razão de que seus resultados podem ser apresentados de forma muito intuitiva, o que certamente contribuiu para a sua difusão. De maneira simples, a pegada mostra se o consumo da população de certa região é comportado por ela, ou seja, se existem recursos suficientes em determinada região para se produzir os bens e os serviços que ali são consumidos. Sua magnitude é função de três atributos principais, quais sejam: i) intensidade de recursos na produção de bens e serviços (eficiência material e energética); ii) magnitude do consumo de bens e serviços por pessoa, o que, por sua vez, é função direta da renda disponível; e iii) tamanho da população. Tanto a metodologia quanto os resultados para vários países e períodos estão disponíveis na página da Global Footprint Network (GFN), organização sem fins lucrativos criada em 2003.4 4 Ver sítio eletrônico: http://www.footprintnetwork.org/en/index.php/GFN/. Acesso em: mar. 2013.

Para Moran et al. (2008MORAN, D. D.; WACKERNAGEL, M.; KITZES, J. A.; GOLDFINGER, S. H.; BOUTAUD, A. Measuring sustainable development - nation by nation., Ecological Economics v. 64, p. 470-4, 2008.), a pegada ecológica mede o quanto da capacidade regenerativa da biosfera é usada pelas atividades humanas. Essa é a ideia por trás do Earth Overshoot Day (ou "Dia de Sobrecarga da Terra", em tradução livre), calculado pela Global Footprint Network, que mede o dia a partir do qual a demanda por recursos e serviços dos ecossistemas se mantém por meio da degradação do estoque de capital natural em determinado ano. Segundo informações fornecidas por essa fonte, o overshoot day para o ano de 2013 foi alcançado em 20 de agosto. Em 1993 e 2003, respectivamente, essas datas foram 21 de outubro e 22 de setembro, o que mostra o contínuo aumento da demanda humana por bens e serviços do meio ambiente e a crescente incapacidade de a regeneração natural dos ecossistemas evitar a depleção do capital natural (Mattoon; Kingsland, 2013MATTOON, S.; KINGSLAND, H. S. Ausgust 20th is Earth overshoot day: The date this year our ecological footprint exceed our planet's budget. Global Footprint Network, 2013. ).

Pode-se dizer, ainda, que a pegada ecológica consiste em mensurar a demanda pelo capital natural e seu respectivo estoque com a vantagem de que, por meio dela, é possível distinguir entre depleção de capital natural e o simples uso dos serviços provenientes desse capital (Wackernagel et al., 2005WACKERNAGEL, M.; MONFREDA, C.; MORAN, D.; WERMER, P.; GOLDFINGER, S.; DEUMLING, D.; MURRAY, M. National Footprint and Biocapacity Accounts 2005: The Underlying Calculation Method., Oakland, CA: Global Footprint Network 2005., p. 2). Segundo Ewing et al. (2010EWING, B.; REED, A.; GALLI, A.; KITZES, J.; WACKERNAGEL, M. Calculation methodology for the National Footprints Account, 2010 Edition. Oakland, CA: Global Footprint Network, 2010., p. 3, tradução própria):

A pegada ecológica é baseada em 6 hipóteses fundamentais (adaptado de Wackernagel et al., 2002):

  • A maioria dos recursos que as pessoas consomem e os rejeitos que geram pode ser rastreada e quantificada;

  • Um importante subconjunto dos fluxos de recursos e rejeitos pode ser medido em termos de área biologicamente produtiva necessária para manter estes fluxos. Fluxos de recursos e rejeitos que não podem ser mensurados são excluídos do cálculo, levando a uma subestimação sistemática da verdadeira pegada ecológica da humanidade;

  • Ponderando cada área em proporção à sua bioprodutividade, diferentes áreas podem ser convertidas em uma unidade comum de hectares globais (gha), hectares com a bioprodutividade média do mundo;

  • Como um único hectare global corresponde a um único uso, e cada hectare global em um ano dado representa a mesma quantia de bioprodutividade, elas podem ser somadas para se obter um indicador agregado da pegada ecológica ou da biocapacidade;

  • A demanda humana, expressa como pegada ecológica, pode ser diretamente comparada com a oferta natural, biocapacidade, quando ambas são expressas em hectares globais;

  • A área demandada pode superar a ofertada se a demanda em um ecossistema excede a capacidade de regeneração deste ecossistema.

O cálculo da bioprodutividade média global - definida como o produto médio por hectare de cada cultura (ou outras formas de uso do solo), ponderada pelos fatores de equivalência (que serão apresentados mais adiante) e utilizada para a construção da unidade hectare global (gha) - foi feito com base em dados disponíveis em órgãos de pesquisa como a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO, na sigla em inglês). O cálculo leva em conta que um hectare de alta produtividade equivalerá a mais hectares globais que um de baixa produtividade, mas o método foi construído de forma que a soma dos hectares globais equivalesse à soma dos hectares efetivamente existentes (Wackernagel et al., 2005WACKERNAGEL, M.; MONFREDA, C.; MORAN, D.; WERMER, P.; GOLDFINGER, S.; DEUMLING, D.; MURRAY, M. National Footprint and Biocapacity Accounts 2005: The Underlying Calculation Method., Oakland, CA: Global Footprint Network 2005.).

Os diferentes tipos de uso da terra são convertidos em uma unidade padrão, no caso os hectares globais, por meio dos fatores de equivalência, cujo critério é a capacidade de produção de recursos úteis aos seres humanos, e não apenas a biomassa que produzem (Ewing et al., 2010EWING, B.; REED, A.; GALLI, A.; KITZES, J.; WACKERNAGEL, M. Calculation methodology for the National Footprints Account, 2010 Edition. Oakland, CA: Global Footprint Network, 2010.). Os tipos de uso da terra, nessa metodologia, dividem-se em: área de culturas agrícolas, pastos, florestas, áreas de pesca, área construída (considerada tão produtiva quanto as áreas agrícolas, uma vez que geralmente são construídas sobre elas) e áreas de sequestro de carbono, necessárias para evitar que os rejeitos da combustão fóssil tenham impacto sobre o meio ambiente (Ewing et al., 2010).

É interessante notar que a pegada ecológica é uma medida apenas dos componentes biológicos do consumo, não incluindo os componentes minerais (não renováveis). Se à primeira vista isso pode parecer um erro, tal opção metodológica é acertada, uma vez que o consumo de recursos não renováveis só é sustentável se parte desses é destinada ao desenvolvimento de uma alternativa renovável a esse recurso não renovável (Daly, 1990DALY, H. E. Toward some operational principles of sustainable development., Ecological Economics v. 2, p. 1-6, 1990.). Essa alternativa renovável e sustentável seria contabilizada na biocapacidade, cuja ideia é quantificar a capacidade de a natureza produzir recursos renováveis, fornecer área física para construções e oferecer serviços para absorção de resíduos das atividades humanas (WWF, 2012WWF (World Wide Fund for) Nature. Living planet report 2012: Biodiversity, biocapacity and better choices. Gland, Switzerland: WWF, 2012.).

Além da Global Footprint Network (GFN, 2010GFN (Global Footprint Network). The Ecological Footprint Atlas 2010. 2010. Disponível em: <http://www.footprintnetwork.org/atlas>. Vários acessos.
http://www.footprintnetwork.org/atlas...
), citada anteriormente, o World Wide Fund for Nature (WWF) publica relatórios bienais com os resultados para o planeta como um todo e para países individuais, inclusive para o Brasil (WWF, 2012WWF (World Wide Fund for) Nature. Living planet report 2012: Biodiversity, biocapacity and better choices. Gland, Switzerland: WWF, 2012.). No Brasil, alguns autores já utilizaram o método da pegada ecológica para avaliar a sustentabilidade do consumo da população de algumas unidades subnacionais, limitando-se, porém, a análises de cidades e/ou regiões metropolitanas. Esse é o caso, por exemplo, do exercício feito pelo WWF para estimar a pegada ecológica da cidade de Campo Grande, capital de Mato Grosso do Sul. A conclusão obtida foi que esse município tem uma pegada ecológica de 3,14 gha por pessoa, superior à média mundial de 2,7 gha por pessoa apresentadas no mesmo estudo (WWF, 2012). Este trabalho utilizou dados da última Pesquisa do Orçamento Familiar (POF) de 2008, referindo-se, portanto, a esse ano.

Leite e Viana (2001LEITE, A. M. F.; VIANA, M. O. de L. Pegada ecológica: Instrumento de análise do metabolismo do socioecossistema urbano Fortaleza: UFC, 2001.) calcularam a pegada ecológica da Região Metropolitana de Fortaleza para o ano de 1996, cujo resultado foi de 2,94 gha per capita, o que correspondeu a 22,4 vezes a biocapacidade disponível na área analisada. Em outro estudo, Cervi (2008CERVI, J. L. A pegada ecológica do município do Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais) - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, 2008.) realizou o cálculo para a cidade do Rio de Janeiro no ano de 2003, chegando à conclusão de que a pegada ecológica carioca foi de 3,11 gha per capita, enquanto sua biocapacidade era de apenas 0,11 gha por pessoa. Isso significa que eram necessárias 27,35 vezes a biocapacidade em termos de hectares globais disponível na área da cidade do Rio de Janeiro para sustentar o próprio consumo.

Em nível estadual, não foram encontradas na literatura estimativas da pegada ecológica para os Estados brasileiros, o que indica que este trabalho é pioneiro no que se refere ao cálculo da pegada ecológica para unidades federativas no Brasil. Considera-se que essa seja uma contribuição deste artigo, uma vez que os resultados podem ser importantes insumos do ponto de vista da sustentabilidade ecológica para o processo de desenho e implementação de políticas de desenvolvimento regional, especialmente aquelas que lidam com os aspectos de (re)distribuição espacial das atividades econômicas.

3. Procedimentos metodológicos para o cálculo da pegada ecológica e da biocapacidade em Minas Gerais

O cálculo da pegada ecológica da população de um determinado território - que corresponde à demanda por serviços advindos do capital natural - é feito com base no consumo realizado dentro de seus limites geográficos. O processo é representado na equação 1.

Em que PEc é a pegada ecológica do consumo, PEp é a demanda por bens da região que são fornecidos pelo ecossistema, como alimentos e produtos florestais, pela biocapacidade esterilizada na forma de áreas urbanas e por biocapacidade necessária para sequestrar o carbono emitido pela população da região. PEi é a mesma demanda, porém relacionada à produção de bens que provêm de fora da região considerada (importações), e PEe é a parcela da PEp que corresponde à produção da região remetida para fora dela - as exportações (Ewing et al., 2010EWING, B.; REED, A.; GALLI, A.; KITZES, J.; WACKERNAGEL, M. Calculation methodology for the National Footprints Account, 2010 Edition. Oakland, CA: Global Footprint Network, 2010.). Essa equação é utilizada quando os dados de consumo da população não estão disponíveis, sendo então utilizados os dados de produção e comércio.

No presente trabalho, porém, tal equação não será utilizada, uma vez que os dados sobre "exportação" e "importação" de biocapacidade de Minas Gerais para o resto do país e do mundo não estão disponíveis. Outro motivo para tanto é que os dados sobre o consumo estão disponíveis diretamente na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), não sendo necessário calculá-los indiretamente.

Todas as demandas são calculadas em termos de hectares de produtividade média mundial para o tipo de uso da terra correspondente, dividindo-se a demanda física pela produtividade média mundial. São convertidas em área necessária para suprir essa demanda em termos de hectares globais, multiplicando-se pelos fatores de equivalência para o determinado tipo de uso de terra.5 5 Os fatores de equivalência são calculados como uma razão entre a máxima produtividade ecológica potencial de um hectare médio de determinado tipo específico de uso de terra e a produtividade média de todas as terras biologicamente produtivas do planeta. Dessa forma, o fator de equivalência permite transformar a demanda por hectares efetivos para atender determinada demanda em hectares globais, medida comum a todos os tipos de uso de terra considerados na pegada ecológica. Isso possibilita a comparação entre o impacto ambiental do consumo de diferentes bens. Por exemplo, toma-se a demanda por carne bovina em toneladas, divide-se pela produtividade média mundial dos pastos em termos de toneladas por hectares e multiplica-se o resultado pelo fator de equivalência dos pastos (Wackernagel et al., 2005WACKERNAGEL, M.; MONFREDA, C.; MORAN, D.; WERMER, P.; GOLDFINGER, S.; DEUMLING, D.; MURRAY, M. National Footprint and Biocapacity Accounts 2005: The Underlying Calculation Method., Oakland, CA: Global Footprint Network 2005.). O Quadro 1 abaixo resume o processo.

Quadro 1:
Estrutura do cálculo da pegada ecológica

Os dados correspondentes às três primeiras linhas (consumo de produtos agrícolas, pecuários e provenientes da pesca, respectivamente) podem ser agrupados sob a categoria mais ampla de "alimentos" e foram obtidos na POF do biênio 2008-2009 (IBGE, 2012a).

O consumo de produtos florestais se divide em consumo de madeira para habitação e utensílios, produção de calor e consumo de papel, de acordo com a metodologia da pegada ecológica (Cervi, 2008CERVI, J. L. A pegada ecológica do município do Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais) - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, 2008.). O consumo de papel é obtido por meio de uma proxy calculada com base nos dados da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa, 2009BRACELPA (Associação Brasileira de Celulose e Papel). Conjuntura BRACELPA. São Paulo: BRACELPA, 2009.) para o país como um todo, uma vez que não há dados para o consumo de papel em Minas Gerais. Valendo-se desses dados, calculou-se um consumo médio no Brasil de 45,8 quilogramas (kg) de papel por pessoa por ano para 2008.

Por sua vez, informações sobre o consumo de madeira para produção de calor e para uso industrial (construção inclusa) encontram-se no Relatório de Movimentações no Sistema de Documentos de Origem Florestal (Relatório DOF) do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama, 2012IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis). Documento de Origem Florestal. 2012. Disponível em <Disponível em http://www.ibama.gov.br/documentos/relatorios-dof >. Acesso em: dez. 2012.
http://www.ibama.gov.br/documentos/relat...
). Os dados referentes à emissão de dióxido de carbono (CO2) são fornecidos pelo Inventário de Emissões de Gases do Efeito Estufa (Inventário GEE) da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam, 2008FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Inventário de emissões de gases de efeito estufa do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: FEAM, 2008.) do Estado de Minas Gerais, no qual também consta a proporção da área do Estado que corresponde às áreas urbanas e às áreas de cada bioma.

Uma vez obtidos os dados de consumo dos alimentos e dos produtos florestais, eles devem ser ponderados pela produtividade média mundial, obtida na FAO. A área urbana deverá ser ponderada pelo fator de produtividade da agricultura na região, cujo cálculo será explicado abaixo. A emissão de CO2 deve ser ponderada pela capacidade de sequestro de carbono do ecossistema, encontrada no Inventário GEE. Os dados de sequestro de carbono para o mundo foram retirados de Pan et al. (2011PAN, Y.; BIRDSEY, R. A.; FANG, J.; HOUGHTON, R.; KAUPPI, P. E.; KURZ, W. A.; PHILLIPS, O. L.; SHVIDENKO, A.; LEWIS, S. L.; CANADELL, J. G.; CIAIS, P.; JACKSON, R. B.; PACALA, S. W.; MCGUIRE, A. D.; PIAO, S.; RAUTIAINEN, A.; SITCH, S.; HAYES, D. A large and persistent carbon sink in the world's forests. Science, v. 333, p. 988-993, ago. 2011.) e ponderados pela área de floresta obtida na FAO (FAOSTAT, 2012FAOSTAT. Base de dados da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations) - diversas estatísticas. 2012. Disponível em: <http://faostat.fao.org/>. Vários acessos.
http://faostat.fao.org/...
). Depois de feitas as ponderações do consumo, essas são multiplicadas pelos fatores de equivalência, disponíveis em Ewing et al. (2010EWING, B.; REED, A.; GALLI, A.; KITZES, J.; WACKERNAGEL, M. Calculation methodology for the National Footprints Account, 2010 Edition. Oakland, CA: Global Footprint Network, 2010.).

Já o cálculo da biocapacidade em nível nacional ou subnacional (regiões, Estados, municípios), que corresponde à oferta ecológica, é feito por meio do cálculo de fatores de produtividade. De acordo com Ewing et al. (2010EWING, B.; REED, A.; GALLI, A.; KITZES, J.; WACKERNAGEL, M. Calculation methodology for the National Footprints Account, 2010 Edition. Oakland, CA: Global Footprint Network, 2010.), tais fatores de produtividade são específicos às unidades nacionais ou subnacionais e são calculados da seguinte forma:

Em que FP é o fator de produtividade nacional para um dado tipo de uso da terra, Yn e Yw são, respectivamente, o rendimento nacional e global por hectare do mesmo tipo de uso de terra. O fator de produtividade é calculado para cada produto.6 6 A estimativa deste fator para bananas, por exemplo, é calculada da seguinte forma: toma-se a produtividade média nacional (ou regional, como no caso do presente trabalho) de bananas por hectare e divide-se a mesma pela produtividade média mundial de bananas por hectare. Assim, obtém-se o fator de produtividade nacional, que mostra o quanto a região é produtiva em relação ao resto do mundo.

Uma vez obtido o fator de produtividade nacional, esse é multiplicado pelo fator de equivalência (Ewing et al., 2010EWING, B.; REED, A.; GALLI, A.; KITZES, J.; WACKERNAGEL, M. Calculation methodology for the National Footprints Account, 2010 Edition. Oakland, CA: Global Footprint Network, 2010.) correspondente ao uso da terra e pela área utilizada para produção de determinado bem, obtendo-se, assim, a estimativa de biocapacidade em termos de hectares globais para esse mesmo bem. Tal processo é repetido para todos os produtos de cada tipo de uso de terra, e, por fim, a estimativa de biocapacidade em hectares globais para cada produto é somada de forma a fornecer a biocapacidade total da região. O Quadro 2 resume o processo.

As áreas da agricultura, de pasto, de florestas (consideradas tanto pela produção de produtos florestais como pela sua capacidade de sequestro de carbono) e seus rendimentos, necessários para o cálculo do fator de produtividade, podem ser obtidos no Censo Agropecuário (Censo AP - IBGE, 2012bIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Censo Agropecuário 2006. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012b. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
http://www.sidra.ibge.gov.br/...
), na Produção da Extração Vegetal e Silvicultura (PEVS) (IBGE, 2008aIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Produção da extração vegetal e da silvicultura. Rio de Janeiro (volume 23, p. 1-47): IBGE, 2008a.), na Produção Agrícola Municipal (PAM), na Produção Pecuária Municipal (PPM), ambas do IBGE (IBGE, 2012cIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa Agrícola Municipal e Pesquisa da Pecuária Municipal. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012c. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
http://www.sidra.ibge.gov.br/...
), e também no Inventário GEE (Feam, 2008FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Inventário de emissões de gases de efeito estufa do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: FEAM, 2008.). A produção de pescados foi retirada dos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável (IDS) do IBGE (IBGE, 2008bIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Indicadores de Desenvolvimento Sustentável - Brasil 2008. Rio de Janeiro: IBGE, 2008b.).7 7 Os dados do Censo AP referem-se ao ano de 2006, e os do Inventário GEE, ao ano de 2005. Todos os outros dados dizem respeito ao ano de 2008. Uma limitação inerente às aplicações do método da pegada ecológica é a possível incoincidência temporal dos dados disponíveis. Todavia, a base de cálculo é 2008, já que é o ano a que se refere à POF, utilizada no estudo.

Quadro 2:
Estrutura do cálculo da biocapacidade

A área existente dos diferentes tipos de uso da terra é ponderada pelos fatores de produtividade de cada tipo de uso da terra, cujo cálculo, como exposto acima, é feito valendo-se de dados da produção na região, obtidos nas mesmas fontes que fornecem a área, e pela produtividade média global, obtida em FAOSTAT (2012)FAOSTAT. Base de dados da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations) - diversas estatísticas. 2012. Disponível em: <http://faostat.fao.org/>. Vários acessos.
http://faostat.fao.org/...
. No caso dos pescados, foi utilizada uma proxy calculada com base na produção mundial de peixes dividida pela área total bioprodutiva dos oceanos, proxy essa retirada do trabalho de Cindin e Silva (2004CINDIN, R. C. P. J.; SILVA, R. S. Pegada ecológica: Instrumentos de avaliação dos impactos antrópicos no meio natural Estudos Geográficos (Rio Claro), v. 2, n. 1, p. 43-52, 2004.), cujo resultado é uma produção de 33,1 kg de pescado por hectare. As áreas urbanas e as necessárias para sequestro de carbono são exceções, uma vez que são ponderadas pela produtividade local, obtidas em Feam (2008)FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Inventário de emissões de gases de efeito estufa do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: FEAM, 2008. e nas pesquisas referentes à agricultura do IBGE. O Quadro 3 sistematiza as fontes de dados utilizadas.

Quadro 3:
Fontes de dados utilizadas para o cálculo da pegada ecológica e da biocapacidade de Minas Gerais em 2008

Por fim, uma vez obtidas as estimativas de pegada ecológica e biocapacidade, correspondendo à demanda e à oferta de recursos naturais, é possível compará-las (pois estão na mesma unidade) para se chegar a uma medida de uso da biocapacidade. Caso a pegada ecológica exceda a biocapacidade, a região terá um déficit ecológico, comparação sintetizada na equação 3.

Em que SEMG, BIOMG e PEMG representam, respectivamente, o saldo ecológico, a biocapacidade e a pegada ecológica de Minas Gerais no ano de 2008.8 8 Os Quadros 1 e 2 apresentam, respectivamente, a estrutura de cálculo da PEMG e da BIOMG. Esse déficit pode ser mantido de duas formas: por meio da importação de biocapacidade de países/regiões que possuam superávits ecológicos ou da depleção do próprio capital natural (Wackernagel et al., 2005WACKERNAGEL, M.; MONFREDA, C.; MORAN, D.; WERMER, P.; GOLDFINGER, S.; DEUMLING, D.; MURRAY, M. National Footprint and Biocapacity Accounts 2005: The Underlying Calculation Method., Oakland, CA: Global Footprint Network 2005.). Se o déficit estiver sendo mantido por meio da depleção de capital natural, o nível de consumo do país (ou região) não é sustentável.

4. Resultados da pegada ecológica e da biocapacidade para Minas Gerais

Esta seção tem por objetivo descrever os resultados da aplicação da metodologia da pegada ecológica do consumo dentro do território mineiro. O cálculo foi feito para o ano de 2008, visto que a base para o cálculo da pegada ecológica são os dados de consumo fornecidos pela POF do biênio de 2008-2009 (IBGE, 2012aIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2008-2009. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012a. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
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). Com base nesse cálculo, chegou-se a uma pegada ecológica total para o Estado de Minas Gerais em torno de 91,48 milhões de hectares globais (gha), o que corresponde a uma pegada per capita de aproximadamente 4,75 gha.9 9 A pegada ecológica per capita foi calculada com base na estimativa da população do Estado de Minas Gerais em 2007 (19.273.506 habitantes). Há uma estimativa do IBGE para o total da população residente no território mineiro em 2008, porém essa ultrapassa a população efetiva de 2010 (resultante de censo demográfico) em quase 300 mil pessoas. Para evitar algum tipo de dúvida com relação à acurácia da estimativa de 2008, optou-se por utilizar o dado de 2007. O fato de a pegada ecológica de Minas Gerais ser superior à sua área (aproximadamente 58,84 milhões de ha) pode sugerir à primeira vista que o Estado é ecologicamente deficitário. Essa comparação, porém, não é apropriada, pois para tal é necessário calcular a biocapacidade do Estado em termos de hectares globais, uma vez que a pegada ecológica também utiliza esta última unidade.

Em uma comparação mais adequada, a pegada ecológica per capita do Brasil em 2007 foi de 2,90 gha, ao passo que a média global é de 2,70 gha por pessoa (GFN, 2010GFN (Global Footprint Network). The Ecological Footprint Atlas 2010. 2010. Disponível em: <http://www.footprintnetwork.org/atlas>. Vários acessos.
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). Percebe-se, portanto, que a pegada ecológica per capita em Minas Gerais é superior à média brasileira e mundial em 63,79% e 75,92%, respectivamente.

Se a pegada ecológica é a demanda por serviços do capital natural, a biocapacidade pode ser entendida como a oferta. A biocapacidade total do Estado foi calculada em 214,38 milhões de gha, o que resulta em uma biocapacidade per capita de 11,12 gha para o ano de 2008. Para efeito de comparação, a biocapacidade per capita do Brasil foi, em 2007, de 9,0 gha, enquanto a média global foi de 1,80 gha por pessoa (GFN, 2010GFN (Global Footprint Network). The Ecological Footprint Atlas 2010. 2010. Disponível em: <http://www.footprintnetwork.org/atlas>. Vários acessos.
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), o que mostra a relativa riqueza de recursos naturais tanto do país quanto do Estado de Minas Gerais.

4.1 Pegada ecológica do consumo e biocapacidade dos alimentos

A pegada ecológica do consumo de alimentos corresponde à necessidade de terras para a produção desses, unindo, portanto, os três primeiros tipos de uso da terra definidos pela metodologia (terras agrícolas, pastos e áreas de pesca).

Para realizar o cálculo, foram utilizados os dados de consumo alimentar (IBGE, 2012aIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2008-2009. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012a. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
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), que, por meio de amostragem e tendo como unidade básica os domicílios, estimam a aquisição de alimentos no domicílio para a alimentação familiar. Por meio desse processo, a POF fornece estimativas do consumo per capita dos alimentos consumidos pela população. Para o cálculo da pegada ecológica desse componente, o consumo per capita foi multiplicado pela população de Minas Gerais no ano de 2007 (19.273.506 habitantes).

Os mais de 1.121 itens alimentares citados pelos participantes da amostra foram agrupados em 17 grupos de alimentos pela POF. Durante o cálculo, esses 17 grupos foram reduzidos para 16, seguindo o procedimento de Cervi (2008CERVI, J. L. A pegada ecológica do município do Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais) - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, 2008.), utilizado em seu cálculo da pegada ecológica para a cidade do Rio de Janeiro.

A modificação feita foi incluir as vísceras dos animais juntamente ao consumo de outras carnes, uma vez que não é possível produzir vísceras sem produzir carne. Para que se possam colocar todos os dados na mesma unidade de medida (hectares globais), a metodologia exige que se calcule o rendimento da produção de carnes por hectare, o que foi possível após a adoção da agrupação mencionada.

Ainda de acordo com procedimentos adotados por Cervi (2008CERVI, J. L. A pegada ecológica do município do Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais) - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, 2008.), os grupos remanescentes foram reorganizados, e seus subgrupos agregados de acordo com a similitude das matérias-primas e da produtividade média. Por exemplo, os diversos tipos de feijão foram agregados em uma única variável "feijão", uma vez que os dados disponíveis para rendimento por hectare da produção dessa cultura não especificam a produtividade de cada tipo de feijão. Outro exemplo foi a junção de couve-flor e brócolis na mesma variável, desta vez seguindo os dados fornecidos pela FAO, que os agrega.

A fim de se avaliar a quantidade de recursos demandados em razão do desperdício no transporte, no armazenamento e no processamento, segue-se o procedimento de Leite e Viana (2001LEITE, A. M. F.; VIANA, M. O. de L. Pegada ecológica: Instrumento de análise do metabolismo do socioecossistema urbano Fortaleza: UFC, 2001.), que, ao calcularem a pegada ecológica da Região Metropolitana de Fortaleza, estimaram um desperdício de 30% do total da produção de alimentos. Embora se possa alegar que não seja uma demanda real de serviços ecossistêmicos, o desperdício deve ser incluído no cálculo da pegada ecológica, já que sua eliminação implica custos, não sendo, portanto, automática. A eliminação do desperdício por meio de melhoras nas condições de transporte e armazenamento dos alimentos apresenta-se como mais um obstáculo à redução da pegada ecológica.

Obtidos o consumo per capita de alimentos e a população total do Estado, partiu-se para o próximo passo da metodologia, que consiste em dividir a quantidade total consumida de cada tipo de alimento pela respectiva produtividade média mundial por hectare (quadro 1). Esse cálculo é necessário para que a demanda por cada tipo de alimento possa ser calculada em termos de hectares globais, havendo assim base para comparações tanto dentro quanto fora do país. A produtividade média mundial para os alimentos considerados na análise é fornecida pela base de dados da FAO (FAOSTAT, 2012FAOSTAT. Base de dados da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations) - diversas estatísticas. 2012. Disponível em: <http://faostat.fao.org/>. Vários acessos.
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).

Alguns casos merecem um olhar mais próximo. Nos casos dos produtos da pecuária (carne, leite, lã, ovos, laticínios e manteiga), não há dados para o seu rendimento mundial por hectare para cada tipo de animal. O procedimento adotado foi o de somar a produção mundial de cada tipo de carne e dividi-la pela área total de pastos no planeta10 10 A área total de pastos do planeta foi em torno de 3,37 bilhões de ha para o ano de 2008 (FAOSTAT, 2012). (uma vez que não existem dados para pastagem por espécie de animal). Da mesma forma, a produção de produtos primários da pecuária (nominalmente leite, lã e ovos) também foi somada e dividida pela área total de pastagem. Por fim, somou-se a produção de produtos processados da pecuária, ou seja, manteiga e laticínios, e novamente se dividiu o resultado pela área total de pasto. Essa foi a forma encontrada para se obter a produtividade mundial desses produtos em termos de hectares de pasto.

O cálculo da pegada do consumo de bebidas foi feito tendo como base apenas vinho e cerveja, os únicos para os quais havia dados de produção mundial em FAOSTAT (2012)FAOSTAT. Base de dados da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations) - diversas estatísticas. 2012. Disponível em: <http://faostat.fao.org/>. Vários acessos.
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. Tal produção foi então dividida pela área total somada de produção de cevada e uvas vinícolas. Já a pegada do consumo de sais e condimentos foi calculada valendo-se da produtividade média mundial na produção de pimenta, uma vez que a categoria condimentos é muito ampla e heterogênea e que sal não faria sentido, por ser um minério, e não um produto de origem animal ou vegetal, não entrando, portanto, em cálculos de biocapacidade e consequentemente nos de pegada ecológica.

Alguns produtos, como palmito, urucum e pupunha não possuem dados de rendimento médio por hectare na base de dados da FAO. Assim, para esses produtos, foi utilizado o rendimento médio nacional, fornecido pela PAM (IBGE, 2012cIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa Agrícola Municipal e Pesquisa da Pecuária Municipal. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012c. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
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), tendo, portanto, como hipótese implícita que o rendimento médio mundial seja igual ao doméstico. Essa não é uma hipótese muito realista, mas, dada a indisponibilidade desses dados, é o que melhor se pode fazer para incluí-los no cálculo da pegada ecológica de Minas Gerais.

Merece atenção ainda o caso das farinhas, das féculas e de outros produtos industrializados derivados da produção agrícola. Para a maioria desses produtos, não há dados mundiais de rendimento por hectare. Mesmo a obtenção de tais dados para o Brasil é muito difícil, uma vez que não é usual utilizar a produtividade de produtos industriais em termos de hectares. No caso da farinha de trigo e de mandioca e da fécula de mandioca, foram obtidas estimativas dos coeficientes técnicos em termos de matérias-primas nas associações de produtores, e esses então foram aplicados sobre a produtividade da matéria-prima de forma a obter uma estimativa da produtividade em termos de hectares desses produtos.11 11 Detalhes sobre o cálculo da produtividade por hectare desses produtos podem ser vistos nos apêndices do trabalho de Gonzalez (2013). Resumidamente, essa etapa do cálculo da pegada ecológica utilizou informações de Cervi (2008), FAOSTAT (2012), Sindipan (2013) e ainda do Kansas Wheat Comission and Kansas Association of Wheat Growers. Disponível em: <http://www.kswheat.com/>. Acesso em: out. 2012.

Para os derivados de milho, foram utilizadas as produtividades obtidas por Cervi (2008CERVI, J. L. A pegada ecológica do município do Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais) - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Rio de Janeiro, 2008.), ponderadas pelo rendimento do milho por hectare no Estado de Minas Gerais, visto que as produtividades levantadas pelo trabalho na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) referiam-se ao país como um todo. Para massas, panificados e bolos, novamente foram utilizados os dados levantados por Cervi (2008).

Em relação a Minas Gerais, a pegada ecológica total do consumo de alimentos (agrícola + pecuária + pescados) foi de aproximadamente 20 milhões de gha. Isso significa que, para alimentar tal população, considerando a média mundial da bioprodutividade da terra, seria necessária essa quantidade de hectares produzindo alimento. A Tabela 1 traz essas informações de forma pormenorizada.

Tabela 1:
Pegada ecológica do consumo de alimentos no Estado de Minas Gerais, em 2008, por tipo de uso da terra

Com base nessa tabela, comparando seus resultados com outros dados aferidos sobre o consumo da população, é possível demonstrar o quanto o consumo de derivados de animais exige do planeta em termos de serviços ecossistêmicos: enquanto em Minas Gerais o consumo médio per capita de produtos agrícolas soma 222,05 kg por ano e o de produtos pecuários apenas 89,81 kg/ano, a pegada dos produtos pecuários é aproximadamente de 2,72 vezes maior do que a dos produtos agrícolas (IBGE, 2012aIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2008-2009. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012a. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
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).

Caso se considere apenas o consumo de carne da população de Minas Gerais, cuja quantidade per capita é de 33,15 kg por ano, sua pegada per capita é de 0,26 gha, sendo quase a mesma de todos os produtos agrícolas somados, cujo consumo em termos quantitativos, ou seja, o consumo dos produtos em termos de massa (kg), é apenas 14,9% do consumo de produtos agrícolas (IBGE, 2012aIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2008-2009. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012a. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
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).12 12 Esse tipo de análise corrobora as preocupações relativas à evolução da insustentabilidade global em função do aumento de renda da população e o consequente aumento de demanda por proteína animal.

A biocapacidade do Estado de Minas Gerais para as áreas agrícolas foi calculada majoritariamente com os dados da PAM para o ano de 2008 (IBGE, 2012cIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa Agrícola Municipal e Pesquisa da Pecuária Municipal. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012c. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
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). Em alguns casos, os únicos dados disponíveis eram do Censo AP (IBGE, 2012bIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Censo Agropecuário 2006. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012b. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
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). Embora possa gerar alguma distorção, essa discrepância de períodos ainda é menor do que se incorreria num cenário em que os produtos fossem simplesmente ignorados. Os resultados desse cálculo são resumidos na Tabela 2.

Tabela 2:
Biocapacidade dos alimentos no Estado de Minas Gerais, em 2008, por tipo de uso da terra

A área de produção agrícola no Estado de Minas Gerais somou aproximadamente 4,75 milhões de ha, somando-se as áreas de plantio das culturas disponíveis na PAM e no Censo AP (anos de 2008 e 2006, respectivamente). Em termos de biocapacidade, as áreas agrícolas de Minas Gerais apresentam uma biocapacidade em torno de 15,53 milhões de gha, o que representa aproximadamente 7,24% do total da biocapacidade do Estado. Em termos per capita, a biocapacidade agrícola de Minas Gerais é de aproximadamente 0,81 gha.

A biocapacidade das áreas de pecuária foi calculada com base na PPM (IBGE, 2012cIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa Agrícola Municipal e Pesquisa da Pecuária Municipal. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012c. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.
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), utilizando-se do mesmo processo de agregação descrito anteriormente: como não há dados para as áreas de pasto por animal, a produção de carne foi somada e dividida pelo total de pastos (em torno de 10,83 milhões de ha) para, então, se obter o rendimento por hectare. Da mesma forma, foram somados os produtos derivados de animais. O resultado foi uma biocapacidade das áreas de pecuária de aproximadamente 25,40 milhões de gha, sendo a biocapacidade per capita aproximadamente igual a 1,32 gha (algo como 11,85% da biocapacidade total do Estado).

A biocapacidade das águas onde há pesca foi calculada com base nos dados de produção total fornecidos pelos Indicadores de Desenvolvimento Sustentável do IBGE (IBGE, 2008bIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Indicadores de Desenvolvimento Sustentável - Brasil 2008. Rio de Janeiro: IBGE, 2008b.), e na área alagada total do Estado, retirada de Feam (2008)FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Inventário de emissões de gases de efeito estufa do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: FEAM, 2008.. A biocapacidade das áreas produtoras de pescado foi calculada em 198,06 mil gha, com uma biocapacidade per capita de apenas 0,01 gha (0,09% da biocapacidade total do Estado). A razão dessa proporção tão baixa é a ausência de áreas litorâneas em Minas Gerais, o que resume sua área produtora de pescado aos rios e lagos, que é de apenas 588,4 mil ha, conforme Feam (2008).

4.2 Pegada ecológica do consumo e biocapacidade dos produtos florestais

O consumo de produtos florestais se divide em três categorias: consumo de madeira para habitação e utensílios, consumo para produção de calor e consumo de papel. O consumo de madeira para habitação e utensílios foi obtido no relatório DOF para o ano de 2008 (Ibama, 2012IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis). Documento de Origem Florestal. 2012. Disponível em <Disponível em http://www.ibama.gov.br/documentos/relatorios-dof >. Acesso em: dez. 2012.
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), que considera apenas a madeira certificada. Isso é um problema para o cálculo da pegada ecológica, uma vez que a subestima por não considerar a madeira irregularmente extraída. O mesmo problema se apresenta para a madeira destinada à produção de calor, visto que os dados foram retirados do mesmo relatório. O consumo de madeira para habitação e utensílios corresponde aos dois primeiros itens do relatório (madeira em tora e madeira serrada), enquanto a madeira calorífica corresponde aos itens 3 e 4 do relatório, nominalmente lenha e carvão vegetal.

Quanto ao consumo de papel, não há dados para o Estado de Minas Gerais. A obtenção desse consumo se deu, portanto, de forma indireta: o relatório Conjuntura Bracelpa (Bracelpa, 2009BRACELPA (Associação Brasileira de Celulose e Papel). Conjuntura BRACELPA. São Paulo: BRACELPA, 2009.) traz o consumo de papel para o Brasil em 2008 (8,041 t). A quantidade foi, então, dividida pela população total do país na estimativa do IBGE para 2008, obtendo-se uma medida per capita desse consumo naquele ano (45,8 kg).

A pegada ecológica total foi de aproximadamente 26,83 milhões de gha e uma pegada per capita em torno de 1,39 hectare global. Os resultados são pormenorizados na Tabela 3.

Tabela 3:
Pegada ecológica do consumo de produtos florestais no Estado de Minas Gerais, em 2008, por categoria

Como se pode ver, há grande desproporção entre a pegada relacionada à madeira para construção e utensílios e a dos outros produtos florestais. Uma explicação possível é a de que inexistem dados para o consumo (em termos físicos) de madeira na forma de móveis e outros produtos cuja matéria-prima é madeira, além do que há o problema da não mensuração de madeira clandestina.13 13 Isso indica que, para essa categoria, apenas se considerou a utilização de madeira para construção, o que não é uma atividade comum no Brasil e em Minas Gerais. Assim, a pegada ecológica dos produtos florestais, principalmente na primeira categoria, fica subestimada por escassez de dados.

A área de floresta produtora de produtos florestais no Estado de Minas Gerais foi 2.032.824 hectares no ano de 2008. Os dados para produtos florestais foram retirados da Pesquisa da Extração Vegetal e Silvicultura (PEVS) do IBGE (IBGE, 2008aIBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Produção da extração vegetal e da silvicultura. Rio de Janeiro (volume 23, p. 1-47): IBGE, 2008a.). A biocapacidade das florestas para os produtos florestais é de aproximadamente 18,84 milhões de gha, com uma biocapacidade per capita em torno de 0,98 hectares globais, representando aproximadamente 8,79% da biocapacidade total do Estado. A biocapacidade dos produtos florestais se concentra principalmente na produção de papel e de madeira para produção de calor, cada uma dessas representando, respectivamente, 33,31% e 65,22% da biocapacidade dos produtos florestais.

4.3 Área urbana

A área urbana do Estado de Minas Gerais precisa ser considerada no cálculo de sua pegada ecológica por se tratar de certa forma de um custo de oportunidade: a área utilizada pelas cidades deixa de ser usada para a produção agropecuária ou de produtos florestais. A metodologia considera que a bioprodutividade das áreas urbanas é igual a das áreas agrícolas, uma vez que as cidades costumam surgir em terrenos férteis, em função da ocupação agrícola (Wackernagel et al., 2005WACKERNAGEL, M.; MONFREDA, C.; MORAN, D.; WERMER, P.; GOLDFINGER, S.; DEUMLING, D.; MURRAY, M. National Footprint and Biocapacity Accounts 2005: The Underlying Calculation Method., Oakland, CA: Global Footprint Network 2005.). O cálculo da biocapacidade das áreas urbanas também considera sua bioprodutividade como igual a das áreas agrícolas, pelas razões mencionadas acima. Desta forma, o saldo ecológico para as áreas urbanas é sempre zero, sendo a pegada sempre igual à biocapacidade para as áreas urbanas, visto que todas as variáveis consideradas no cálculo (área, produtividade por hectare e fator de equivalência) são iguais para a pegada, bem como para a biocapacidade. Por esse motivo, as áreas urbanas não serão tratadas nesta seção no que se refere à sua biocapacidade.

A área urbana total de Minas Gerais é fornecida pelo Inventário GEE (Feam, 2008) e totalizou 294.192 hectares em 2005. Uma vez conhecida, a área foi dividida pela média do rendimento médio mundial por hectare dos produtos agrícolas considerados, seguindo a metodologia descrita acima. Após a multiplicação pelo fator de equivalência, chegou-se ao resultado de que a pegada ecológica das áreas urbanas de Minas Gerais totaliza 606,96 mil gha, e a correspondente estimativa per capita de aproximadamente 0,03 hectares globais. Em termos percentuais, a pegada para áreas urbanas representa apenas 0,66% do total da pegada ecológica de Minas Gerais e 0,28% da biocapacidade total calculada para o Estado.

Há de se lembrar, porém, que esse tipo de uso da terra representa grandes impactos ambientais propiciados pela aglomeração humana. Rees e Wackernagel (1996REES, W.; WACKERNAGEL, M. Urban ecological footprints: Why cities cannot be sustainable - and why they are a key to sustainability. Environment Impact Assessment Review, v. 16, p. 223-248, 1996.) afirmam que, muito embora representem uma das maiores conquistas do modelo civilizatório pós-Revolução Industrial, as cidades funcionam como uma espécie de "buraco negro" de entropia, absorvendo quantidades muito maiores de produção que poderiam ser suportadas pelas suas próprias áreas.

4.4 Emissão de gases do efeito estufa e biocapacidade do sequestro de carbono

Os dados para emissão de gases do efeito estufa, medidos em toneladas de gás carbônico equivalente,14 14 O dióxido de carbono equivalente é a medida utilizada para calcular a emissão, usando-o como denominador comum para os vários tipos de gases que provocam o efeito estufa, ponderando cada gás pelo seu respectivo potencial de aquecimento global (Feam, 2008). foram retirados do Inventário GEE (Feam, 2008), divulgado pela Fundação Estadual do Meio Ambiente do Estado de Minas Gerais com base em dados produzidos pela Universidade Federal de Lavras (UFLA). Os dados são de 2005 (os mais recentes disponíveis).

A pegada ecológica total calculada para a emissão de gases do efeito estufa foi em torno de 44,05 milhões de gha, e a pegada per capita, de aproximadamente 2,29 gha. A pegada relacionada à emissão representa a mais alta proporção na pegada total da população do Estado (48,15%). Graças ao seu grande peso na demanda por biocapacidade do Estado, na Tabela 4 apresenta-se a desagregação desse resultado, com o objetivo de prover maiores subsídios para a análise. Note-se que nesta tabela há até três níveis de desagregação, e, quanto mais desagregada a categoria, mais deslocada à direita ela se encontra.

Tabela 4:
Pegada ecológica da emissão de gases de efeito estufa (GEE) no Estado de Minas Gerais em 2008 por setor

Valendo-se dos dados desagregados, percebe-se que a maior parte da pegada ecológica da emissão de GEE está no setor de Agricultura, Florestas e Uso do Solo (aproximadamente 52,34% da pegada da emissão de GEE). Dentro desse setor, ressalta-se a contribuição da pecuária, uma vez que a fermentação entérica (emissão de metano por meio dos flatos do gado) corresponde em torno de 21,57% da pegada total da emissão de GEE, e o manejo de dejetos da pecuária (em torno de 3,67 milhões de gha) representa outros 8,34% da pegada da emissão. O setor referente a outros usos do solo, por sua vez, tem sua emissão principalmente ligada à conversão de mata nativa para a pecuária (Feam, 2008FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Inventário de emissões de gases de efeito estufa do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: FEAM, 2008.).

Observa-se que a contribuição conjunta da pecuária (fermentação entérica e manejo de dejetos) é de aproximadamente 57,13% dentro do setor de Agricultura, Florestas e Uso do Solo, sendo a maior dentro desse setor. Essas informações corroboram a impressão de que a pecuária tem peso significativo dentro da pegada ecológica total (ver nota de rodapé 12).

Outro setor importante na pegada da emissão de GEE é o setor de energia, com peso aproximado de 35,75% do total. Nesse setor, os subsetores de maior impacto são o de Consumo Energético da Indústria e o de Transportes. Considerando-se este último, a quase totalidade da pegada de emissão provém do transporte rodoviário (em torno de 96,19% de toda a pegada do subsetor de Transportes), o que demonstra parcialmente o custo ambiental da opção pelo modal rodoviário de transporte.

O mesmo se pode dizer com relação ao peso relativo do consumo energético da indústria mineira. Como se sabe, ao longo de sua evolução econômica, Minas Gerais especializou-se na indústria extrativa (Garcia; Andrade, 2007GARCIA, J. R.; ANDRADE, D. C. Panorama geral da industrialização de Minas Gerais (1970-2000). Leituras de Economia Política, v. 12, p. 169-181, 2007.), que, por definição, é intensiva em uso de energia.

Os setores de resíduos e de processos industriais têm participação pequena, contando juntos com aproximadamente 11,91% da pegada da emissão total de GEE em Minas Gerais. Todavia, não se deve esquecer de que está sendo considerada apenas a emissão de gases de efeito estufa, e não a de outros poluentes que, apesar de não contribuírem diretamente para o aquecimento global, também degradam o meio ambiente. Novamente, deve-se mencionar a especialização de Minas Gerais na indústria extrativa, a qual gera, além da emissão de gases, outras categorias de rejeitos potencialmente nocivos ao meio ambiente e impacto na paisagem, como a erosão do solo.

Quanto à biocapacidade para o sequestro de carbono, a área de vegetação (natural e plantada) em Minas Gerais considerada nesse cálculo é de aproximadamente 20,97 milhões de ha (Feam, 2008FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Inventário de emissões de gases de efeito estufa do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: FEAM, 2008.), somando as áreas remanescentes de Cerrado, Mata Atlântica e Caatinga com as florestas plantadas pelo homem (florestas de eucalipto, por exemplo). Desse total, a Mata Atlântica respondia por 35,71% em termos de área; o Cerrado e a Caatinga,15 15 Os dados obtidos em Feam (2008) não permitem diferenciar Cerrado e Caatinga. Sabe-se que o bioma Caatinga é o menos representativo dentre aqueles presentes no território mineiro, cuja ocorrência se dá no Norte do Estado (área original equivalente a apenas 1,91% da área total do Estado), mas, ao mesmo tempo, é o menos degradado. Os remanescentes deste bioma equivaliam, em 2009, a 46,90% de sua área original, contra apenas 3,42% para a Mata Atlântica, e 43,33% para o Cerrado (Ibama, 2009). por 58,72%; e as florestas plantadas, por 5,57%. Note-se que alguns dos ecossistemas pertencentes aos biomas Cerrado e Caatinga não são propriamente florestas, mas foram considerados como tal para efeito do cálculo da capacidade de sequestro de carbono, já que, em razão de sua biodiversidade, retêm estoques de carbono muito superiores às áreas destinadas à agropecuária.

Em Minas Gerais, a biocapacidade referente ao sequestro de carbono foi calculada em torno de 153,81 milhões de gha, com uma biocapacidade per capita de 7,98 gha, representando aproximadamente 71,74% da biocapacidade total do Estado. Esse alto valor pode ser explicado pela grande capacidade de sequestro de carbono das florestas tropicais, uma vez que elas tanto crescem mais rapidamente do que suas contrapartes das regiões de clima temperado como sequestram uma quantidade muito grande de carbono (Dean, 1997DEAN, W. A ferro e fogo: A história e a devastação da Mata Atlântica brasileira. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.).

Sobre este último ponto, para fins meramente ilustrativos, pode-se utilizar a comparação entre o Brasil, um país com grande área de floresta tropical, e a Rússia, um país com grande área de floresta temperada. No ano de 2005, enquanto o Brasil possuía uma área de floresta total de 477,7 milhões de ha, a Rússia possuía 808,8 milhões de ha. Todavia, enquanto as florestas brasileiras mantêm um estoque de carbono total de 49.335 milhões de toneladas de carbono, as florestas russas mantêm um estoque de 32.210 milhões de toneladas (FAO, 2006FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations). Global forest resources assessment 2005: Progress toward sustainable forest management. Roma: FAO, 2006.). Explica-se, portanto, por que a bioprodutividade das florestas mineiras em sequestro de carbono é 5,82 vezes maior do que a média mundial de 593,44 kg de carbono sequestrado por hectare de floresta (FAO, 2006), o que leva a uma grande biocapacidade no que tange a esse serviço de regulação oferecido pelo capital natural.

5. Saldo ecológico em Minas Gerais

Uma vez obtidos os resultados da pegada ecológica e da biocapacidade, pode-se calcular o saldo ecológico da região (equação 3). Com base nesse resultado, é possível avaliar se a região está em déficit ecológico, situação em que sua população consome mais serviços ecossistêmicos do que essa é capaz de fornecer.

No caso de Minas Gerais, a aplicação da equação 3 permite concluir que essa unidade da federação possui um superávit de aproximadamente 122,90 milhões de gha. Isso significa que o Estado possuía, em 2008, biocapacidade suficiente para fazer frente a toda a sua demanda por serviços ecossistêmicos (representada pela sua pegada ecológica) e ainda poderia prover serviços para regiões deficitárias. Em termos per capita, o superávit ecológico de MG é de aproximadamente 6,38 gha. Em termos relativos, a população de Minas Gerais utiliza apenas 42,67% de sua biocapacidade. As Tabelas 5 e 6 resumem todas as estimativas descritas nas seções anteriores.

Com base nesses resultados, algumas inferências podem ser feitas. Em primeiro lugar, assim como para o Brasil,16 16 Conforme estimativas da Global Footprint Network (GFN, 2010), em termos per capita a pegada ecológica no Brasil foi de 2,90 gha, e a biocapacidade, de 9,0 gha, no ano de 2007. O saldo ecológico brasileiro (6,1 gha globais per capita) é próximo à estimativa encontrada para o Estado de Minas Gerais (aproximadamente 6,38 gha per capita). Em nível mundial, o estudo citado indicou que houve um déficit ecológico em 2007 equivalente a 0,90 gha per capita (pegada ecológica global de 2,70 gha e biocapacidade global de 1,80 gha, ambas em termos per capita). Minas Gerais é uma região privilegiada em termos de capital natural, representado aqui pela sua biocapacidade, cujo alto valor indica que seria possível sustentar, sem incorrer em déficit ecológico, pouco mais de duas vezes a atual população do Estado supondo-se o mesmo padrão de consumo. A capacidade de suporte do Estado, assim como a do resto do país, é consideravelmente maior do que a da média mundial.

Tabela 5:
Biocapacidade, pegada ecológica e saldo ecológico total por componente de cálculo em Minas Gerais, no ano de 2008 (em gha)
Tabela 6:
Biocapacidade, pegada ecológica e saldo ecológico per capita por componente de cálculo em Minas Gerais, no ano de 2008 (em gha)

Considerando os resultados acima e com base em uma observação superficial, poder-se-ia concluir que o Estado de Minas Gerais apresenta situação confortável em termos de sustentabilidade ecológica do consumo de sua população, já que a biocapacidade total do Estado está bem acima da estimativa agregada da pegada ecológica. Todavia, esse tipo de interpretação deve ser evitada, já que a desagregação dos resultados mostra que, em alguns componentes, o Estado apresenta clara situação de déficit ecológico, como é o caso dos produtos florestais e dos pescados. Além disso, outras formas de interpretação, cujos detalhes são apresentados na próxima seção, indicam que resultados semelhantes aos obtidos neste estudo podem indicar uma situação de insustentabilidade.

6. O padrão insustentável do consumo no mundo, no Brasil e em Minas Gerais

Os autores pioneiros no cálculo da pegada ecológica, em resposta às críticas direcionadas a supostas falhas do método (Costanza, 2000COSTANZA, R. Forum: The ecological footprint. Special section of ecological economics. Ecological Economics, v. 32, p. 341-394, 2000.), afirmam que os resultados da pegada ecológica de cada região devem ser comparados à biocapacidade global. Segundo esse raciocínio, a pegada não deve ser entendida como um indicador do grau de sustentabilidade do local, mas sim como indicador da contribuição da região para a insustentabilidade global, o que pode reduzir a utilidade do indicador para a governança ambiental local (Veiga, 2010VEIGA, J. E. da. Indicadores de sustentabilidade. Estudos Avançados, v. 24, n. 68, p. 39-52, 2010.).

Ao se comparar a pegada per capita local com a biocapacidade per capita global, obtém-se o número mínimo de planetas Terra necessários para manter o nível de consumo da região, caso esse fosse o nível mundial (Moran et al., 2008MORAN, D. D.; WACKERNAGEL, M.; KITZES, J. A.; GOLDFINGER, S. H.; BOUTAUD, A. Measuring sustainable development - nation by nation., Ecological Economics v. 64, p. 470-4, 2008.). A análise deve necessariamente ser feita em termos per capita, visto que apenas assim se pode obter a quantidade de planetas necessários para sustentar o padrão de consumo de determinada população, caso tal nível fosse universalizado, uma vez que se trata de um nível médio de consumo. Dentro dessa visão, pode-se dizer que a população do Estado de Minas Gerais contribui significativamente para a depleção do capital natural global, pois sua pegada ecológica em 2008 foi de aproximadamente 4,75 gha per capita, ao passo que a biocapacidade global em 2007 foi igual a 1,8 gha per capita (GNF, 2010GFN (Global Footprint Network). The Ecological Footprint Atlas 2010. 2010. Disponível em: <http://www.footprintnetwork.org/atlas>. Vários acessos.
http://www.footprintnetwork.org/atlas...
).17 17 Não há informações disponíveis sobre a biocapacidade e a pegada globais em nível per capita para 2008. Optou-se, portanto, por utilizar a estimativa de 2007.

Segundo o estudo de Moran et al. (2008MORAN, D. D.; WACKERNAGEL, M.; KITZES, J. A.; GOLDFINGER, S. H.; BOUTAUD, A. Measuring sustainable development - nation by nation., Ecological Economics v. 64, p. 470-4, 2008.), em 1961 a biocapacidade global per capita disponível era de 3,4 gha. Essa redução deve-se principalmente ao aumento da população, já que mais pessoas resultam em menos área bioprodutiva disponível. Segundo os economistas ecológicos, esse é o típico crescimento horizontal da escala, que ocorre principalmente em países menos desenvolvidos (mais pessoas com um nível de consumo individual mais ou menos constante). Há também o chamado crescimento vertical da escala, característico de países desenvolvidos (população mais ou menos constante e níveis de consumo individual crescentes) (Mueller, 2007MUELLER, C. C. Os economistas e as relações entre o sistema econômico e o meio ambiente. Brasília: Editora UnB, 2007.). Atualmente, a maior ameaça à intensificação do crescimento da pegada ecológica é a combinação do crescimento horizontal e vertical da escala do sistema econômico, fenômeno que acontece principalmente em países em desenvolvimento/emergentes como Brasil, Rússia, Índia, Indonésia, China e África do Sul (grupo BRIICS), nos quais ainda se verifica crescimento populacional18 18 Em geral, mesmo que as taxas de crescimento populacional estejam em declínio, o grande estoque de população existente nesses países faz com que o incremento absoluto da população não seja desprezível. associado ao aumento de consumo viabilizado pelo incremento no nível de renda da população. De fato, esse tipo de preocupação, explicitada em WWF (2012)WWF (World Wide Fund for) Nature. Living planet report 2012: Biodiversity, biocapacity and better choices. Gland, Switzerland: WWF, 2012., sinaliza o potencial de maiores estimativas de pegada ecológica para esses países em um futuro próximo.

O Gráfico 1, abaixo, apresenta a tendência da pegada ecológica total e da biocapacidade total (ambas em termos per capita) para o mundo, entre 1961 e 2007. Percebe-se nitidamente uma tendência perversa de aumento de insustentabilidade em nível global iniciada já em meados da década de 1970. Como mencionado, a estimativa de pegada ecológica varia em função do aumento do consumo individual e da eficiência de produção. Já a biocapacidade flutua conforme as práticas agrícolas (usos de fertilizantes e irrigação), a degradação dos ecossistemas, o clima e o tamanho da população.

Gráfico 1:
Evolução da pegada ecológica total per capita e da biocapacidade total per capita no mundo, entre 1961 e 2007.

Já o Gráfico 2 apresenta a situação de Minas Gerais em comparação ao mundo, ao Brasil e a alguns grupos de países selecionados.19 19 Os grupos de renda utilizados nos Gráficos 2 e 3 (países de alta, média e baixa renda) refletem a classificação do Banco Mundial (GFN, 2010). Percebe-se que a situação de Minas Gerais e do Brasil se difere das demais categorias representadas, uma vez que a biocapacidade é superior à estimativa da pegada ecológica. Todavia, pelo menos dois fatores devem ser considerados ao analisar tais resultados.

Em primeiro lugar, deve-se ter mente uma perspectiva de evolução temporal dessas duas grandezas. Os dados apresentados não permitem esse tipo de análise, mas não há motivos para crer que a dinâmica da pegada ecológica e da biocapacidade no Brasil e em Minas Gerais seja diferente da apresenta no Gráfico 1. Em outras palavras, espera-se que o saldo ecológico do Brasil em termos per capita apresente tendência de redução, muito embora a dinâmica de evolução temporal do saldo ecológico brasileiro seja mais lenta que a equivalente dinâmica em nível mundial.

Gráfico 2:
Pegada ecológica do consumo per capita e biocapacidade total per capita no mundo, no Brasil, em Minas Gerais e em grupos de países selecionados

Em segundo lugar, a discussão até aqui desenvolvida procurou mostrar a pertinência de se comparar a pegada ecológica local e a biocapacidade global em termos per capita. Essa comparação revela que a situação de Minas Gerais se assemelha à dos países de alta renda, cujo padrão de consumo universalizado exigiria 3,38 Terras para sustentar a população mundial (Gráfico 3).

Os resultados encontrados mostram que em 2008 a pegada ecológica de Minas Gerais foi aproximadamente 164% superior à biocapacidade global (em termos per capita), o que demonstra que é preocupante o nível atual de consumo no Estado em termos de sua contribuição para a sustentabilidade ecológica global.

A razão (razão Š) apresentada no Gráfico 3 indica que, caso o mundo inteiro apresentasse o mesmo padrão de consumo da população mineira, seriam necessários 2,64 planetas Terra para sustentar esse padrão de consumo universalizado. Em nível mundial, tal razão é igual a 1,5, o que indica que a Terra demoraria um ano e meio para regenerar plenamente os recursos renováveis que a espécie humana consome em apenas um ano (WWF, 2012WWF (World Wide Fund for) Nature. Living planet report 2012: Biodiversity, biocapacity and better choices. Gland, Switzerland: WWF, 2012.).

Gráfico 3:
Razão entre pegada ecológica local per capita e biocapacidade global per capita (razão Š) no mundo, no Brasil, em Minas Gerais e em grupos de países selecionados

Considerando a razão entre a pegada ecológica per capita local e a biocapacidade global per capita (Gráfico 3), a condição mínima para sustentabilidade é Š ≤ 1, sendo que, em alguns casos, mesmo o atendimento desse critério não impede a degradação local (Moran et al., 2008MORAN, D. D.; WACKERNAGEL, M.; KITZES, J. A.; GOLDFINGER, S. H.; BOUTAUD, A. Measuring sustainable development - nation by nation., Ecological Economics v. 64, p. 470-4, 2008.).

Além da sustentabilidade ecológica, Moran et al. (2008MORAN, D. D.; WACKERNAGEL, M.; KITZES, J. A.; GOLDFINGER, S. H.; BOUTAUD, A. Measuring sustainable development - nation by nation., Ecological Economics v. 64, p. 470-4, 2008.) afirmam ainda que o desenvolvimento sustentável deve englobar outras dimensões, como a prosperidade socioeconômica das nações. Embora limitada em vários aspectos, esta última poderia ser mensurada pela difundido Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), criado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Se esse for o caso, Moran et al. (2008) afirmam que dois critérios mínimos para o desenvolvimento sustentável seriam Š ≤ 1, como apontado acima, e IDH ≥ 0,8. Em Minas Gerais, Š= 2,64 e IDH = 0,731,20 20 Dado referente ao ano de 2010, conforme o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (média geométrica dos índices das dimensões renda, educação e longevidade, com pesos iguais) (Ipeadata, 2013). o que indica que, além de ser ecologicamente insustentável, Minas Gerais não satisfaz as condições mínimas do desenvolvimento sustentável do ponto de vista socioeconômico.

Com o intuito de reforçar a tese de que Minas Gerais possui um padrão de consumo insustentável em termos ecológicos, a Tabela 7 abaixo apresenta, de forma sintética, uma comparação entre a pegada ecológica per capita estimada do consumo da população mineira e a biocapacidade mundial per capita para cada uso da terra. Nesse tipo de análise, o Estado de Minas Gerais só é superavitário nos produtos agrícolas, nos pescados e nas áreas urbanas (superávits ecológicos iguais a 0,32 gha, 0,14 gha e 0,03 gha, respectivamente) Todavia, tais números são baixos se comparados aos déficits nos outros tipos de uso da terra: para produtos pecuários e para os serviços ecossistêmicos providos pelas florestas,21 21 Os produtos florestais foram considerados em conjunto com a capacidade de sequestro de carbono por não haver dados disponíveis para estes separadamente. os déficits foram, respectivamente, 0,51 gha e 2,94 gha

Tabela 7:
Pegada ecológica de Minas Gerais, no ano de 2008, versus biocapacidade mundial per capita

Infere-se, portanto, que a escala do consumo da população de Minas Gerais, no ano de 2008, contribui para o desmatamento e a consequente perda de biodiversidade, já que o déficit para os produtos pecuários é superior ao superávit dos produtos agrícolas e dos pescados somados, ou seja, haveria necessidade de se elevar a produção caso a população mundial passasse a consumir no mesmo nível da população de Minas Gerais.

Finalmente, o déficit ecológico de Minas Gerais em relação ao mundo, quando se considera a pegada ecológica local e a biocapacidade mundial em termos per capita, contribui para a depleção do capital natural pelo sobreconsumo dos recursos. De acordo com Barnosky et al. (2012BARNOSKY, A. D.; HADLY, E. A.; BASCOMPTE, J.; BERLOW, E. L.; BROWN, J. H.; FORTELIUS, M.; GETZ, W. M.; HARTE, J.; HASTINGS, A.; MARQUET, P. A.; MARTINEZ, N. D.; MOOERS, A.; ROOPNARINE, P.; VERMEIJ, G.; WILLIANS, J. W.; GILLESPIE, R.; KITZES, J.; MARSHALL, C.; MATZKE, N.; MINDELL, D. P.; REVILLA, E.; SMITH, A. B. Approaching a state shift in Earth's biosphere. Nature, v. 486, p. 52-58, 2012.), tamanha pressão sobre a biosfera provavelmente desencadeará mudanças em seu estado em um futuro próximo, o que levaria à perda de muitos recursos biológicos essenciais à vida (serviços ecossistêmicos e biodiversidade).

A interpretação da pegada ecológica descrita acima é mais adequada em virtude de os ecossistemas não serem estanques e estarem integrados a um sistema maior. No caso dos GEE, por exemplo, sua emissão não fica confinada às regiões de origem. Ao contrário, essa tem efeito global e, além disso, pode se acumular na atmosfera. Assim, é pouco importante o fato de que, em Minas Gerais, a capacidade local de sequestro de carbono é superior à quantidade de GEE localmente emitido (superávit ecológico em relação ao sequestro de carbono de 5,69 gha per capita). Ao contrário da aparente situação favorável em termos de sustentabilidade, tem-se que a pegada ecológica da emissão de GEE em Minas Gerais, no ano de 2008 (em torno de 2,29 gha per capita), isoladamente, ultrapassa a biocapacidade mundial per capita no ano de 2007.

Diante das análises feitas, os resultados do presente trabalho apontam para a necessidade de redução da escala do subsistema econômico em Minas Gerais, sob pena de o Estado continuar a contribuir para o aquecimento global, além de outros problemas decorrentes dos impactos danosos da atividade econômica sobre o meio ambiente global.

Esse tipo de interpretação suscita preocupações mais sérias a partir do momento em que são levadas em conta a complexidade inerente dos ecossistemas. Estes, diferentemente do que sugere a visão mecanicista da teoria econômica neoclássica, apresentam comportamentos não lineares e podem exibir irreversibilidades, principalmente quando são ultrapassados os pontos de resiliência ecossistêmica. Em essência, a aproximação dos limiares biofísicos coloca em risco a estabilidade do ecossistema global, forçando a consolidação do chamado Antropoceno (Steffen et al., 2007STEFFEN, W.; CRUTZEN, P. J.; MCNEILL, J. R. The Anthropocene: Are humans now overwhelming the Great Forces of? Nature Ambio , v. 36, n. 8, p. 614-620, 2007.).

7. Considerações finais

Este artigo objetivou estimar uma medida do grau de sustentabilidade do consumo da população do Estado de Minas Gerais por meio da aplicação do método da pegada ecológica. Os resultados obtidos permitiram concluir que, muito embora a maior parte das estimativas de pegada ecológica (usos agrícola, pecuária e emissão de GEE) no ano de 2008 esteja aquém da biocapacidade do Estado, o nível de consumo per capita da população de Minas Gerais gera pressão excessiva sobre os recursos da biosfera. Isso porque a maneira mais adequada de interpretar os resultados é por meio da comparação entre a pegada ecológica regional e a biocapacidade mundial em termos per capita. Quando se procede a esse tipo de comparação, os resultados indicaram que Minas Gerais apresenta déficit ecológico para todos os componentes estimados, à exceção dos produtos agrícolas, pescados e áreas urbanas. Constatou-se ainda que, caso a população de todo o mundo mantivesse o mesmo padrão de consumo dos mineiros, seriam necessários 2,64 planetas Terra para sustentá-la.

Numa perspectiva econômico-ecológica, que refuta a possibilidade de substituição contínua entre capital natural e capital produzido, tal resultado aponta para a necessidade da redução da escala do subsistema econômico da região. Levando-se em conta a visão pré-analítica de que o sistema econômico está contido em sistema maior que é finito e materialmente fechado, a pegada ecológica pode ser considerada uma medida da escala atual do subsistema econômico, ao passo que a biocapacidade é uma medida da escala máxima sustentável para o subsistema econômico.

Embora não tenham sido foco deste artigo, políticas necessárias para tornar mais sustentável o consumo de Minas Gerais devem contemplar medidas como o combate ao consumismo conspícuo, a contenção do crescimento populacional, a redução da intensidade energético-material da produção e consumo (aumento da eficiência), a conscientização ambiental da população, dentre outras.

Do ponto de vista da análise regional, estimativas da pegada ecológica em níveis subnacionais podem fornecer informações relevantes sob uma ótica de sustentabilidade ecológica de diferentes regiões em um mesmo país. Isto é, análises em escalas estadual ou local podem oferecer importantes parâmetros para que estratégias que visam ao desenvolvimento regional incorporem de maneira satisfatória argumentos de cunho ambiental. Contudo, é preciso avançar no aprimoramento metodológico de indicadores de sustentabilidade no que diz respeito a aplicações em estudos regionais, além do que é premente um esforço de construção de uma base de dados compatível com requerimentos de pesquisa nesse nível de análise.

Naturalmente, diferentes opções de políticas, seja nacionais, seja regionais, têm suas vantagens e desvantagens. O mais importante é reconhecer que impedir que o padrão de consumo ultrapasse a capacidade de regeneração dos ecossistemas é apenas uma condição mínima e necessária, mas não suficiente, para a sustentabilidade ecológica e social de uma determinada região.

Economias emergentes ainda não estão completamente preparadas para um debate maduro sobre a necessidade de redução do consumo de suas populações. Ao contrário, ao longo da primeira década do século XXI, a ampliação do consumo tem sido a opção feita para a redução das desigualdades sociais que ainda prevalecem. Embora tal estratégia seja compreensível e plausível para economias emergentes e tenha produzido resultados relativamente satisfatórios no curto prazo, é preciso reconhecer o seu caráter de insustentabilidade ecológica sob um horizonte temporal mais longo. Como bem afirmam os participantes da Comissão Oxford Martin para as Futuras Gerações (Oxford Martin School, 2013OXFORD MARTIN SCHOOL. Now for the long term. The report of the Oxford Martin Commission for Future Generations. Oxford, UK: University of Oxford, 2013.), os desafios impostos pelas megatendências que moldarão os fenômenos socioeconômicos neste novo século exigem que sejam incorporadas visões estratégicas de longo prazo nas atuais tomadas de decisão.

Quando comparado à média mundial, o Estado de Minas Gerais pode ser considerado privilegiado por sua dotação de recursos naturais. Isso, porém, não deve legitimar a expansão ininterrupta do sistema econômico. As pressões antrópicas sobre os ecossistemas podem contribuir de maneira decisiva para mudanças potencialmente catastróficas e irreversíveis no estado da biosfera, o que levaria a um pioramento das condições mínimas de vida no planeta Terra. Mesmo com todas as incertezas e as dificuldades políticas envolvidas, esse tipo de discussão está se tornando cada vez mais premente. Inadiáveis também são os esforços na busca de soluções sustentáveis para a compatibilização entre a escala do sistema econômico e a capacidade de suporte dos ecossistemas. Devem fazer parte desses esforços aprimoramentos nos indicadores e nas metodologias para a mensuração do desenvolvimento sustentável.

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  • WWF (World Wide Fund for) Nature Living planet report 2012: Biodiversity, biocapacity and better choices. Gland, Switzerland: WWF, 2012.
  • 1
    Capacidade de suporte do sistema (carrying capacity) é um conceito importante dentro da ecologia e remete à ideia do máximo de indivíduos de uma determinada espécie que um hábitat pode suportar. Mais detalhes sobre o conceito e sua importância para o estudo de questões ambientais podem ser vistos em Seidl e Tisddel (1999)SEIDL, I.; TISDELL, C. A. Carrying capacity reconsidered: From Malthus' population theory to cultural carrying capacity., Ecological Economics v. 31, p. 395-408, 1999..
  • 2
    Ver Lawn (2001)LAWN, P. A. Scale, prices, and biophysical assessments., Ecological Economics v. 38, p. 369-382, 2001. para uma análise sobre os conceitos de escala máxima sustentável, relativa à resiliência e capacidade de suporte dos ecossistemas, e escala ótima do sistema econômico, referente aos custos e aos benefícios provenientes da expansão do sistema econômico. Malghan (2006)MALGHAN, D. On being the right size: A framework for the analytical study of scale, economy, and ecosystem. 2006. 312 f. Tese (Doutorado em Filosofia) - University of Maryland, Baltimore, 2006. oferece uma estrutura analítica para o estudo da escala e da relação entre sistema econômico e ecossistemas.
  • 3
    Neste trabalho, os termos "pegada ecológica" ou simplesmente "pegada" serão utilizados indistintamente. O mesmo se pode dizer com relação a expressões "escala do sistema econômico" e "escala".
  • 4
    Ver sítio eletrônico: http://www.footprintnetwork.org/en/index.php/GFN/. Acesso em: mar. 2013.
  • 5
    Os fatores de equivalência são calculados como uma razão entre a máxima produtividade ecológica potencial de um hectare médio de determinado tipo específico de uso de terra e a produtividade média de todas as terras biologicamente produtivas do planeta. Dessa forma, o fator de equivalência permite transformar a demanda por hectares efetivos para atender determinada demanda em hectares globais, medida comum a todos os tipos de uso de terra considerados na pegada ecológica. Isso possibilita a comparação entre o impacto ambiental do consumo de diferentes bens.
  • 6
    A estimativa deste fator para bananas, por exemplo, é calculada da seguinte forma: toma-se a produtividade média nacional (ou regional, como no caso do presente trabalho) de bananas por hectare e divide-se a mesma pela produtividade média mundial de bananas por hectare. Assim, obtém-se o fator de produtividade nacional, que mostra o quanto a região é produtiva em relação ao resto do mundo.
  • 7
    Os dados do Censo AP referem-se ao ano de 2006, e os do Inventário GEE, ao ano de 2005. Todos os outros dados dizem respeito ao ano de 2008. Uma limitação inerente às aplicações do método da pegada ecológica é a possível incoincidência temporal dos dados disponíveis. Todavia, a base de cálculo é 2008, já que é o ano a que se refere à POF, utilizada no estudo.
  • 8
    Os Quadros 1 e 2 apresentam, respectivamente, a estrutura de cálculo da PEMG e da BIOMG.
  • 9
    A pegada ecológica per capita foi calculada com base na estimativa da população do Estado de Minas Gerais em 2007 (19.273.506 habitantes). Há uma estimativa do IBGE para o total da população residente no território mineiro em 2008, porém essa ultrapassa a população efetiva de 2010 (resultante de censo demográfico) em quase 300 mil pessoas. Para evitar algum tipo de dúvida com relação à acurácia da estimativa de 2008, optou-se por utilizar o dado de 2007.
  • 10
    A área total de pastos do planeta foi em torno de 3,37 bilhões de ha para o ano de 2008 (FAOSTAT, 2012FAOSTAT. Base de dados da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations) - diversas estatísticas. 2012. Disponível em: <http://faostat.fao.org/>. Vários acessos.
    http://faostat.fao.org/...
    ).
  • 11
    Detalhes sobre o cálculo da produtividade por hectare desses produtos podem ser vistos nos apêndices do trabalho de Gonzalez (2013). Resumidamente, essa etapa do cálculo da pegada ecológica utilizou informações de Cervi (2008), FAOSTAT (2012), Sindipan (2013)SINDIPAN. Sem trigo, aumenta o consumo de mandioca. 2013. Disponível em: <Disponível em: http://www.sindipan.org.br/portal/verNoticia.php?id=5 >. Acesso em: jan. 2013.
    http://www.sindipan.org.br/portal/verNot...
    e ainda do Kansas Wheat Comission and Kansas Association of Wheat Growers. Disponível em: <http://www.kswheat.com/>. Acesso em: out. 2012.
  • 12
    Esse tipo de análise corrobora as preocupações relativas à evolução da insustentabilidade global em função do aumento de renda da população e o consequente aumento de demanda por proteína animal.
  • 13
    Isso indica que, para essa categoria, apenas se considerou a utilização de madeira para construção, o que não é uma atividade comum no Brasil e em Minas Gerais.
  • 14
    O dióxido de carbono equivalente é a medida utilizada para calcular a emissão, usando-o como denominador comum para os vários tipos de gases que provocam o efeito estufa, ponderando cada gás pelo seu respectivo potencial de aquecimento global (Feam, 2008FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Inventário de emissões de gases de efeito estufa do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: FEAM, 2008.).
  • 15
    Os dados obtidos em Feam (2008)FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente). Inventário de emissões de gases de efeito estufa do Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte: FEAM, 2008. não permitem diferenciar Cerrado e Caatinga. Sabe-se que o bioma Caatinga é o menos representativo dentre aqueles presentes no território mineiro, cuja ocorrência se dá no Norte do Estado (área original equivalente a apenas 1,91% da área total do Estado), mas, ao mesmo tempo, é o menos degradado. Os remanescentes deste bioma equivaliam, em 2009, a 46,90% de sua área original, contra apenas 3,42% para a Mata Atlântica, e 43,33% para o Cerrado (Ibama, 2009IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis). Monitoramento dos biomas. 2009. Disponível em: <http://siscom.ibama.gov.br/monitorabiomas>. Acesso em: jan. 2013.
    http://siscom.ibama.gov.br/monitorabioma...
    ).
  • 16
    Conforme estimativas da Global Footprint Network (GFN, 2010GFN (Global Footprint Network). The Ecological Footprint Atlas 2010. 2010. Disponível em: <http://www.footprintnetwork.org/atlas>. Vários acessos.
    http://www.footprintnetwork.org/atlas...
    ), em termos per capita a pegada ecológica no Brasil foi de 2,90 gha, e a biocapacidade, de 9,0 gha, no ano de 2007. O saldo ecológico brasileiro (6,1 gha globais per capita) é próximo à estimativa encontrada para o Estado de Minas Gerais (aproximadamente 6,38 gha per capita). Em nível mundial, o estudo citado indicou que houve um déficit ecológico em 2007 equivalente a 0,90 gha per capita (pegada ecológica global de 2,70 gha e biocapacidade global de 1,80 gha, ambas em termos per capita).
  • 17
    Não há informações disponíveis sobre a biocapacidade e a pegada globais em nível per capita para 2008. Optou-se, portanto, por utilizar a estimativa de 2007.
  • 18
    Em geral, mesmo que as taxas de crescimento populacional estejam em declínio, o grande estoque de população existente nesses países faz com que o incremento absoluto da população não seja desprezível.
  • 19
    Os grupos de renda utilizados nos Gráficos 2 e 3 (países de alta, média e baixa renda) refletem a classificação do Banco Mundial (GFN, 2010GFN (Global Footprint Network). The Ecological Footprint Atlas 2010. 2010. Disponível em: <http://www.footprintnetwork.org/atlas>. Vários acessos.
    http://www.footprintnetwork.org/atlas...
    ).
  • 20
    Dado referente ao ano de 2010, conforme o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (média geométrica dos índices das dimensões renda, educação e longevidade, com pesos iguais) (Ipeadata, 2013IPEADATA. Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. 2013. Disponível em <Disponível em http://www.ipeadata.gov.br/ >. Acesso em: out. 2013.
    http://www.ipeadata.gov.br/...
    ).
  • 21
    Os produtos florestais foram considerados em conjunto com a capacidade de sequestro de carbono por não haver dados disponíveis para estes separadamente.

Disponibilidade de dados

Citações de dados

FAOSTAT. Base de dados da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations) - diversas estatísticas. 2012. Disponível em: <http://faostat.fao.org/>. Vários acessos.

IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2008-2009. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012a. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.

IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Censo Agropecuário 2006. Banco de Dados Agregados, Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). 2012b. Disponível em: <http://www.sidra.ibge.gov.br/>. Vários acessos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2015

Histórico

  • Recebido
    25 Nov 2013
  • Aceito
    27 Mar 2014
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