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Impactos do Programa Bolsa Família no mercado de trabalho e na renda dos trabalhadores rurais

Impacts of Bolsa Família program in the labor market and income of rural workers

Resumo:

O presente estudo avalia os efeitos do Programa Bolsa Família (PBF) no mercado de trabalho das famílias pobres que residem em áreas rurais do Brasil. Para a análise, foi utilizado o Censo Demográfico (2010) e duas metodologias: Balanceamento por Entropia e Efeito Quantílico de Tratamento (EQT), que verificam o efeito médio e ao longo da distribuição, respectivamente. Visando melhorar o equilíbrio entre o grupo de tratados e controle foi aplicado o algoritmo CEM, desenvolvido por Iacus, King e Porro (2009). Dessa forma, combinou-se o CEM com o balanceamento por entropia para determinar o Efeito Médio de Tratamento sobre os Tratados (ATT). Como resultado, observou-se que no Brasil e regiões as horas trabalhadas dos beneficiários são menores que a dos não beneficiários, assim como a renda do trabalho. Quanto aos efeitos na distribuição, para a maioria dos quantis o efeito é nulo, entretanto, em alguns quantis, os beneficiários possuem menos horas trabalhadas que os não beneficiários. Portanto, os resultados na média indicaram um possível “efeito desincentivo” do programa sobre as horas trabalhadas, ocasionando uma redução na renda das famílias proveniente do trabalho. Por outro lado, na análise por quantis não se pode afirmar o mesmo, visto que os resultados dos efeitos nas horas trabalhadas foram distintos.

Palavras-Chave:
Programa Bolsa Família; entropia; Efeito Quantílico de Tratamento; mercado de trabalho.

Abstract:

This study evaluates the effects of the Bolsa Família Program (PBF) in the labor market of poor families living in rural areas of Brazil. For the analysis, we used the Census (2010) and two methodologies: Balancing Entropy Quantílico and treatment effect (EQT), checking the average effect and throughout the distribution, respectively. To improve the balance between the treated group and control was applied CEM algorithm developed by Iacus, King, and Porro (2009). Thus, combined with the CEM balancing entropy to determine the Average Treatment Effect on Treaties (ATT). As a result, it was observed that in Brazil and regions, the working hours of the beneficiaries is lower than that of non-beneficiaries, as well as labor income. The effects on distribution, for most quantile the effect is null, however, in some quantile, beneficiaries have fewer working hours than non beneficiaries. Therefore, the results in the average indicated a possible "disincentive effect" of the program on the hours worked, causing a decrease in household income from work. On the other hand, the analysis by quantile can not say the same, as the results of the effects on hours worked were different.

Keywords:
Bolsa Família Program; Entropy; Quantílico Treatment Effect; Label Market.

1 Introdução

O meio rural vem passando por diversas transformações nas últimas décadas, entre elas está a adoção do modelo de modernização do setor agrícola, ocorrida em meados da década de 1960, com a introdução de meios de produção mais avançados e de políticas públicas destinadas a este setor. Consequentemente esse período marcou o início de um novo modelo econômico no país por meio da mudança do chamado modelo de substituição de importações pela modernização do setor agrário e formação do Complexo Agroindustrial (Teixeira, 2005TEIXEIRA, J. C. Modernização da agricultura no Brasil: impactos econômicos, sociais e ambientais. Revista Eletrônica da Associação dos Geógrafos Brasileiros - Seção Três Lagoas, v. 2, n. 2, 2005.).

De acordo com Ferreira et al. (2006FERREIRA, M. de O. et al.Especialização produtiva e mudança estrutural da agropecuária cearense. Teoria e Evidência Econômica, Passo Fundo, v. 14, n. 26, p. 91-111, maio 2006.), embora tenha havido uma mudança produtiva na agropecuária brasileira, essa mudança se deu de forma desigual entre as regiões do país. Goodman, Sorj e Wilkison (1985GOODMAN, D.; SORJ, B.; WILKISON, J. Agroindústria, políticas públicas e estruturas rurais: análise recentes sobre a agricultura brasileira. Revista de Economia Política, v. 5 n.4, p.31-35, 1985.apudNascimento et al., 2008NASCIMENTO, C. A. et al. A Qualidade do emprego rural fluminense nos anos recentes (2002 e 2006). Congresso da Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia RuraL, 46, 2008, Rio Branco . Anais... Rio Branco, 2008. Disponível em: <Disponível em: http://www.sober.org.br > Acesso em: 05 mai. 2015.
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), destacam que os médios e grandes produtores foram os mais beneficiados, principalmente aqueles que se direcionavam para a produção de produtos de exportação e/ou ligados às agroindústrias, em especial os do Centro-Sul do país. Conforme Teixeira (2005TEIXEIRA, J. C. Modernização da agricultura no Brasil: impactos econômicos, sociais e ambientais. Revista Eletrônica da Associação dos Geógrafos Brasileiros - Seção Três Lagoas, v. 2, n. 2, 2005.), os produtores das pequenas propriedades não foram incluídos nesse processo de modernização devido aos altos custos de produção. Assim, alguns pequenos produtores (principalmente aqueles que praticavam agricultura de subsistência) abandonaram as atividades agrícolas, deixando o campo e migrando para os centros urbanos.

Já na década de 1990, a abertura comercial brasileira foi implementada pelo governo Collor, na qual foi eliminada a maior parte das barreiras não-tarifárias e reduziu gradativamente o nível e o grau de proteção da indústria local (Averbug, 1999AVERBUG, A. A Economia Brasileira nos anos 90: abertura e integração comercial na década de 90. Rio de Janeiro: BNDES, 1999.). Com isso, a entrada de produtos agrícolas similares aos nacionais foi permitida, aumentando a concorrência no mercado interno (Carvalho; Marinho, 2003CARVALHO, R.; MARINHO, E. L. L. Transformações Estruturais, Variações na Eficiência Técnica e Produtividade Total dos Fatores no Setor Agrícola dos Países Sul-Americanos - 1970 a 2000. ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 31., 2003. Anais... Porto Seguro, ANPEC, 2003. ). Aliada à abertura comercial, outras mudanças sofridas no período foram responsáveis pela diminuição da oferta de empregos no setor agrícola, como a redução de incentivos do governo, a sobrevalorização do câmbio e a queda do preço dos produtos agrícolas (Santos et al, 2010SANTOS, G. C. et al.Mercado de trabalho e rendimento no meio rural brasileiro. Economia Aplicada, Ribeirão Preto, v. 14, n. 3, p. 355-379, set. 2010.).

Todos esses desdobramentos ampliaram ainda mais as disparidades de renda no meio rural. Incapazes de competir com a grande indústria rural, os pequenos produtores que escolheram continuar no campo, passaram a buscar outras formas de sobrevivência além da produção para o autoconsumo, assim, conforme Santos et al. (2010SANTOS, G. C. et al.Mercado de trabalho e rendimento no meio rural brasileiro. Economia Aplicada, Ribeirão Preto, v. 14, n. 3, p. 355-379, set. 2010.), atividades não agrícolas, como artesanato, cultivo de flores, ecoturismo, prestação de serviços e comércio, viraram fontes de renda, viabilizando a permanência nas áreas rurais.

Diante disso, o meio rural apresenta uma grande distorção em relação à área urbana quanto a alguns indicadores, como menor rendimento médio familiar e maior percentual de famílias pobres e extremamente pobres (IBGE, 2015IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Banco de Dados Agregados. Sistema IBGE de Recuperação Automática - SIDRA. Disponível em:Disponível em:http://www.ibge.gov.br Acesso em: 20 abr. 2015.
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). Na tentativa de reverter ou amenizar esse quadro, algumas estratégias vêm sendo empregadas na esperança de fortalecer e promover o segmento rural, como políticas de crédito e programas de transferências de renda, em especial, o Programa Bolsa Família (PBF).1 1 Instituído pela Medida Provisória nº 132, de 20 de outubro 2003. Oficializado pela Lei nº 10.836, de 09 de janeiro de 2004, e Decreto nº 5.209, de 17 de setembro de 2004.

O PBF é um programa de transferência direta de renda condicionada e foi criado pelo Governo Federal com o objetivo de, no curto prazo, aliviar a situação de pobreza e promover segurança alimentar e nutricional das famílias que se encontram em posição de vulnerabilidade social em todo o país, impondo condicionalidades nas áreas da educação, saúde e assistência social.

As maiores críticas e questionamentos são a respeito de um possível efeito negativo que o programa possui sobre o mercado de trabalho, o chamado “efeito desincentivo” (Costa et al., 2014COSTA, E. M.; CAVALCANTI, D. M.; SILVA, J. L. M. da; SAMPAIO, R. M. B. Impactos Regionais do Programa Bolsa Família: uma análise sobre o Mercado de Trabalho das Famílias Pobres. ANPEC: XLII ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 2014 . Disponível em: < Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro/2014/submissao/files_I/i13-dc0aad69d0a6580ef400e1ea2c1accc7.pdf > Acesso em: 20 abr. 2015. 2014
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) ao trabalho. Segundo Tavares (2008TAVARES, P. A. Efeito do Programa Bolsa Família sobre a oferta de trabalho das mães. XIII Seminário sobre Economia Mineira - Economia, História, Demografia e Políticas Públicas. Diamantina, MG, 2008.), esse efeito, também conhecido como efeito-renda, trata da redução da oferta de trabalho dos membros adultos das famílias beneficiadas em vista das transferências monetárias recebidas por estes. Ou seja, existe um tipo de recompensa pela perda salarial por meio da transferência de renda repassada às famílias, assim, a renda familiar não é comprometida.

Alguns trabalhos empíricos foram realizados com o objetivo de mostrar possíveis impactos do Programa Bolsa Família no mercado de trabalho, a exemplo de Ferro e Nicollela (2007FERRO, A. R.; NICOLLELA, A. C. The impact of conditional cash transfers programs on household working decision in Brazil. São Paulo, 2007. Disponível em: <Disponível em: http://www.iza.org/conference_files/worldb2007/ferro_a3468.pdf >. Acesso em: 9 março 2015.
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), Teixeira (2008TEIXEIRA, C. G. Análise do Impacto do Programa Bolsa Família na oferta de trabalho dos homens e das mulheres. PNUD/IPC, 2008. Disponível em:<Disponível em:http://www.ipc-undp.org/publications/mds/27P.pdf >. Acesso em: 20 abr. 2015.
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), Tavares (2008TAVARES, P. A. Efeito do Programa Bolsa Família sobre a oferta de trabalho das mães. XIII Seminário sobre Economia Mineira - Economia, História, Demografia e Políticas Públicas. Diamantina, MG, 2008.) e Costa et al. (2014COSTA, E. M.; CAVALCANTI, D. M.; SILVA, J. L. M. da; SAMPAIO, R. M. B. Impactos Regionais do Programa Bolsa Família: uma análise sobre o Mercado de Trabalho das Famílias Pobres. ANPEC: XLII ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 2014 . Disponível em: < Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro/2014/submissao/files_I/i13-dc0aad69d0a6580ef400e1ea2c1accc7.pdf > Acesso em: 20 abr. 2015. 2014
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).

Ferro e Nicollela (2007FERRO, A. R.; NICOLLELA, A. C. The impact of conditional cash transfers programs on household working decision in Brazil. São Paulo, 2007. Disponível em: <Disponível em: http://www.iza.org/conference_files/worldb2007/ferro_a3468.pdf >. Acesso em: 9 março 2015.
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) analisaram o efeito das transferências de renda condicionadas quanto à taxa de participação e as horas trabalhadas dos adultos nas áreas urbanas e rurais, com base nos dados da PNAD do ano de 2003. Os efeitos encontrados foram positivos e significativos apenas para homens e mulheres residentes em áreas urbanas e negativo para mulheres residentes em áreas rurais.

Teixeira (2008TEIXEIRA, C. G. Análise do Impacto do Programa Bolsa Família na oferta de trabalho dos homens e das mulheres. PNUD/IPC, 2008. Disponível em:<Disponível em:http://www.ipc-undp.org/publications/mds/27P.pdf >. Acesso em: 20 abr. 2015.
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) estima o efeito do PBF na oferta de trabalho em atividades formais e informais de homens e mulheres beneficiários do programa, com dados da PNAD 2006. O cálculo é feito por meio do efeito médio do tratamento (Average Treatment Effect on the Treated - ATT) e a análise gráfica do efeito local do programa (Average Local Effect - ALE). Os resultados apontam que o PBF tem efeito negativo na oferta de trabalho das mulheres. Por sua vez, na oferta de trabalho dos homens, o efeito é negativo para os que trabalham por conta própria e nulo para os que trabalham no mercado formal.

Tavares (2008TAVARES, P. A. Efeito do Programa Bolsa Família sobre a oferta de trabalho das mães. XIII Seminário sobre Economia Mineira - Economia, História, Demografia e Políticas Públicas. Diamantina, MG, 2008.) investigou o impacto do PBF sobre a oferta de trabalho das mães beneficiadas. Foram utilizados dados da Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (PNAD), referentes ao ano de 2004, e o método do Propensity score Matching (PSM) para assim fazer um confractual e encontrar mães que não foram beneficiadas pelo programa comparáveis às mães que foram. Os resultados encontrados evidenciam um pequeno efeito-renda negativo, mas que não é suficiente para gerar um efeito-desincentivo ao trabalho. Entretanto, também foi observado um efeito positivo que se sobrepõe ao efeito negativo, a autora explica que isso pode decorrer devido a uma maior disponibilidade de tempo das mães para trabalhar, visto que as crianças e jovens têm um aumento da frequência escolar e assim reduzem sua oferta de trabalho.

Costa et al. (2014COSTA, E. M.; CAVALCANTI, D. M.; SILVA, J. L. M. da; SAMPAIO, R. M. B. Impactos Regionais do Programa Bolsa Família: uma análise sobre o Mercado de Trabalho das Famílias Pobres. ANPEC: XLII ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 2014 . Disponível em: < Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro/2014/submissao/files_I/i13-dc0aad69d0a6580ef400e1ea2c1accc7.pdf > Acesso em: 20 abr. 2015. 2014
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) fizeram uma análise do impacto do PBF na renda e nas horas de trabalho das famílias pobres em todas as regiões brasileiras. Para a análise, foram utilizados dados do Censo (2010) do IBGEIBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico de 2010. Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.ibge.gov.br. Vários acessos.
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e o método do Efeito Quantílico do Tratamento (EQT), em especial o estimador proposto por Firpo (2007FIRPO, Sérgio. Efficient Semiparametric Estimation of Quantile Treatment Effects. Econométrica, v. 75, n. 1, 2007.). Os resultados mostraram que em grupos específicos de famílias beneficiadas houveram menos horas trabalhadas e uma menor renda do trabalho quando comparado às famílias não beneficiadas. No tocante às regiões, os resultados foram distintos, tendo as regiões Nordeste e Norte efeitos negativos no mercado de trabalho, enquanto os resultados para as demais regiões foram mais homogêneos. Também foi possível observar efeitos para o Brasil urbano e Brasil rural, no qual os impactos foram diferentes, com efeitos neutros, positivos e negativos para os dois casos, entretanto o efeito desincentivo ao trabalho foi mais forte no Brasil rural do que no urbano, especialmente nos quantis mais elevados. Os autores indicam que parte dessas diferenças observadas pode ter ligação com o dinamismo econômico específico de cada região.

Diante do exposto, surgem alguns questionamentos: o Programa Bolsa Família gera “efeito-desincentivo” ao trabalho nas famílias beneficiadas pelo programa situadas nas áreas rurais? Caso provoque, esse impacto é observado em todos os estratos de renda e nas horas trabalhadas?

Bem como Costa et al. (2014COSTA, E. M.; CAVALCANTI, D. M.; SILVA, J. L. M. da; SAMPAIO, R. M. B. Impactos Regionais do Programa Bolsa Família: uma análise sobre o Mercado de Trabalho das Famílias Pobres. ANPEC: XLII ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 2014 . Disponível em: < Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro/2014/submissao/files_I/i13-dc0aad69d0a6580ef400e1ea2c1accc7.pdf > Acesso em: 20 abr. 2015. 2014
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), este estudo fará uso da metodologia de Firpo (2007FIRPO, Sérgio. Efficient Semiparametric Estimation of Quantile Treatment Effects. Econométrica, v. 75, n. 1, 2007.), entretanto, cabe destacar que os autores verificam os efeitos do Programa Bolsa Família no meio rural do Brasil como um todo, porém, neste artigo, será analisado o meio rural das regiões do Brasil. Além disso, o presente trabalho capta o efeito médio de tratamento sobre os tratados por meio da combinação das metodologias CEM (2009) e Balanceamento por Entropia (2011). Dessa forma, a contribuição deste trabalho para a literatura se apresenta, principalmente, por mensurar o efeito do programa, especificamente para as áreas rurais das regiões brasileiras, na média e em toda a distribuição, permitindo verificar os estratos de renda e as horas de trabalho semanais, nos quais o efeito é mais expressivo.

Este artigo está estruturado em quatro seções, incluindo esta introdução. A metodologia será apresentada na segunda seção. Os resultados podem ser observados na seção três. E, por último, as considerações finais do trabalho serão apresentadas na seção quatro.

2 Metodologia e base de dados

2.1 Modelos Econométricos

2.1.1 Algoritmo CEM

Um problema associado aos métodos de matching baseados no propensity score é o seu fraco desempenho em encontrar grupos de comparação equilibrados. De fato, o alvo principal dos métodos de matching consiste em eliminar observações de modo a obter um melhor equilíbrio comparativo entre grupos tratados e o grupo de controle (Blackwell et al., 2009BLACKWELL, M.; IACUS, S.; KING, G.; PORRO, G. CEM: Coarsened exact matching in Stata. The Stata Journal. v. 9, n. 4, p. 524-546, 2009.).

Para tentar contornar esses problemas, Iacus, King e Porro (2009IACUS, S. M.; KING, G; PORRO, G. Matching for causal inference without balance checking. 2009. Disponível em: <Disponível em: http://gking.harvard.edu/files/cem.pdf >. Acesso em: 27 Maio 2016.
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) desenvolveram o algoritmo Coarsened Exact Matching (CEM), o qual não exige nenhuma hipótese sobre o processo de geração de dados (DGP), com exceção da ignorabilidade. Além disso, tal método garante que os desiquilíbrios entre os grupos de tratados e de controle pós o matching não sejam maiores que um limite previamente selecionado.

Iacus, King e Porro (2009IACUS, S. M.; KING, G; PORRO, G. Matching for causal inference without balance checking. 2009. Disponível em: <Disponível em: http://gking.harvard.edu/files/cem.pdf >. Acesso em: 27 Maio 2016.
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, 2011IACUS, S; KING, G; PORRO, G. Causal Inference without Balance Checking: Coarsened Exact Matching. Political Analysis , 2011.) mostraram por meio de simulações de um grande número de DGPs que CEM possui propriedades estatísticas superiores aos métodos tradicionais, como menor desiquilíbrio entre grupos pós matching, menor dependência do modelo, dentre outros. Além disso, o CEM permite a melhora da análise de outros métodos, como o próprio PSM e a Entropia, por exemplo. Diversos autores têm aplicado esse método na literatura em muitas áreas, tais como, Aroca et al. (2014AROCA, P.; BRIDA, J. G.; VOLO, S. Tourism statistics: correcting data inadequacy using coarsened exact matching. Working Paper. School of Economics and Management at the Free University of Bozen, 2014.) e Schurer et al. (2015SCHURER, S. et al.The Medical Care Costs of Mood Disorders: A Coarsened Exact Matching Approach, IZA Discussion Papers, 2015.).

O algoritmo do CEM segue os seguintes passos:

  1. Dado as covariadas X, é realizado uma cópia de X, denominada X*;

  2. X* é “engrossado” (coarsened) ou de acordo com cortes amostrais previamente selecionados ou utilizando um método automático desenvolvido por Iacus, King e Porro (2009IACUS, S. M.; KING, G; PORRO, G. Matching for causal inference without balance checking. 2009. Disponível em: <Disponível em: http://gking.harvard.edu/files/cem.pdf >. Acesso em: 27 Maio 2016.
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    );

  3. Cria-se um estrato por unidade de observação de X* e se coloca cada observação no estrato;

  4. Relaciona o estrato com os dados originais, X, e elimina-se as observações do estrato que não contém ao menos um tratado ou uma unidade de controle.

Iacus, King e Porro (2009IACUS, S. M.; KING, G; PORRO, G. Matching for causal inference without balance checking. 2009. Disponível em: <Disponível em: http://gking.harvard.edu/files/cem.pdf >. Acesso em: 27 Maio 2016.
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) desenvolvem uma medida de desequilíbrio global, dada pela estatística L1, em que esta é baseada na diferença entre histogramas multidimensionais de todas as covariadas de pré-tratamento nos grupos de tratados e controles e pode ser representada por: \(${{\mathcal{L}}_{1}}\left( f,g \right)=\frac{1}{2}\underset{{{l}_{1}}\ldots {{l}_{k}}}{\mathop \sum }\,\left| {{f}_{{{l}_{1}}\ldots {{l}_{k}}}}-{{g}_{{{l}_{1}}\ldots {{l}_{k}}}} \right| \). O equilíbrio perfeito global é encontrado por L1=0, e valores elevados para L1 indicam grandes desequilíbrios entre os grupos, com valor máximo de L1 = 1, no qual indica completa separação. Denote as frequências relativas dos dados pareados por fm e gm, então uma boa solução para o pareamento produzirá uma redução na estatística L1, ou seja, \( {{\mathcal{L}}_{1}}\left( {{f}^{m}},~{{g}^{m}} \right)\le {{\mathcal{L}}_{1}}\left( f,g \right) \).

Neste trabalho não será utilizado o CEM para a comparação direta entre grupos de tratados e de controle, mas sim, para melhorar o desempenho de outro método ao escolher mais adequadamente, com menos desequilíbrio, as observações a serem pareadas.

2.1.2 Entropia

Hainmueller (2012HAINMUELLER J. Entropy Balancing for Causal Effects: A Multivariate Reweighting Method to Produce Balanced Samples in Observational Studies. Political Analysis, v. 20 n. 1, p. 25-46, 2012.) desenvolveu um método multivariado que permite ponderar um conjunto de dados, tais que, as distribuições das variáveis nas observações reponderadas satisfaçam um conjunto de condições especiais de momentos, de forma que exista equilíbrio exato sobre o primeiro, segundo, e possivelmente maiores momentos das distribuições de variáveis independentes nos grupos de tratamento e controle. Esse método permite que o pesquisador especifique um nível de equilíbrio desejável para as covariadas usando um conjunto de condições associadas aos momentos da distribuição.

Considere uma amostra com n1, observações pertencentes ao grupo dos tratados, e n0 unidades de controle, os quais foram selecionados aleatoriamente de uma população de tamanho N1 e N0 respectivamente \( {{n}_{1}}\le {{N}_{1}}~e~{{n}_{0}}\le {{N}_{0}}~ \). Seja \( {{D}_{i}}\in \left\{ 1,0 \right\} \) uma variável de tratamento binária, em que irá assumir o valor igual a 1 se a unidade i pertencer ao tratamento e 0 se pertencer ao grupo de controle. Seja X uma matriz que contém as observações de J variáveis exógenas de pré-tratamento; Xij corresponde o valor da j-ésima covariada da unidade i, tais que, Xi = (Xi1,Xi2,...,Xij), refere-se ao vetor de características da unidade i, e Xj refere-se ao vetor coluna com j-th covariada. A densidade das covariadas nas populações de tratamento e controle são dadas por \( {{f}_{X|D=1}}~e~{{f}_{X|D=0}} \) respectivamente. O resultado potencial Yi(Di) corresponde ao par de resultados para a unidade i dadas as condições de tratado e controle, assim, o resultado observado é dado por Y=Y1D+1-DY(0)

O Efeito Médio Tratamento sobre os Tratados (EMTT) é dado por τ=EY1D=1-E[Y(0)|D=1]. A primeira esperança pode ser diretamente identificada do grupo de tratados, mas a segunda corresponde ao contrafactual, o qual não é observado. Assumindo seleção nos observáveis, \( Y\left( 0 \right)\bot D|X \), e sobreposição, Pr(D=1|X=x) menor que 1 para todo x no suporte de \( ~{{f}_{X|D=1}} \) o EMTT é identificado como:

τ = E Y D - E Y X = x , D = 0 f X | D = 1 ( x ) d x (1)

Para estimar o último termo da equação 1, a distribuição da covariável no grupo de controle necessita ser ajustada para torná-la semelhante à distribuição no grupo de tratamento, tal que o indicador de tratamento D se torne mais perto de ser ortogonal em relação às covariáveis. Uma variedade de métodos de pré-processamento de dados, tais como pareamento pelo vizinho mais próximo, cem, escore de propensão têm sido propostos para reduzir o desequilíbrio na distribuição de variáveis independentes. Uma vez que as distribuições de variáveis independentes são ajustadas, métodos de análise padrão, tais como a regressão, podem ser posteriormente utilizados para estimar o tratamento com menor erro e modelo de dependência (Imbens, 2004IMBENS, G. W. Nonparametric Estimation of Average Treatment Effects under Exogeneity: A Review. Review of Economics and Statistics, v. 86 n. 1, p. 4-29, 2004.; Rubin, 2006RUBIN, D. B. Matched Sampling for Causal Effects. Cambridge: Cambridge University Press. 2006.; Ho et al., 2007HO, DE; IMAI, K.; KING, G.; STUART, E. A. Matching as Nonparametric Preprocessing for Reducing Model Dependence in Parametric Causal Inference. Political Analysis , v. 15 n. 3, p. 199, 2007.; Iacus et al., 2011IACUS, S; KING, G; PORRO, G. Causal Inference without Balance Checking: Coarsened Exact Matching. Political Analysis , 2011.; Sekhon, 2009SEKHON, J. S. Opiates for the Matches: Matching Methods for Causal Inference. Annual Review of Political Science, v. 12, p. 487-508, 2009.).

Considere o caso mais simples no qual o efeito tratamento nos dados pré-processados é estimado usando a diferença nos resultados médios entre os grupos de tratados e controle ajustado. Um método de pré-processamento popular é usar escore de propensão ponderado (Hirano; Imbens; Ridder, 2003HIRANO, K.; IMBENS, G.; RIDDER, G. Efficient Estimation of Average Treatment Effects Using the Estimated Propensity Score. Econometrica , v. 71 n. 4, p. 1161-1189, 2003.), em que a média contrafactual é estimada como:

\[E\widehat{Y\left( 0 \right)|D=1}=\frac{\mathop{\sum }_{\{i|D=0\}}{{Y}_{i}}{{d}_{i}}}{\mathop{\sum }_{\{i|D=0\}}{{d}_{i}}}\] (2)

Em que as unidades de controle recebem um peso dado por \( {{d}_{i}}=\frac{\hat{p}\left( {{x}_{i}} \right)}{1-\hat{p}\left( {{x}_{i}} \right)}.\hat{p}\left( {{x}_{i}} \right) \) na equação 2 é o escore de propensão, o qual é comumente estimado por meio de uma regressão probit ou logit. Se este modelo estiver corretamente especificado, então o peso estimado di vai assegurar que a distribuição do covariável das unidades de controle reponderadas irá corresponder à distribuição no grupo de tratamento. No entanto, na prática, essa abordagem muitas vezes não consegue equilibrar conjuntamente todas as covariáveis.

O balanceamento por entropia generaliza a abordagem de ponderação do escore de propensão ao estimar os pesos diretamente de um conjunto de restrições de equilíbrio que exploram o conhecimento do pesquisador sobre os momentos de amostra. Considere 𝑤_𝑖 o peso do balanceamento por entropia escolhido para cada unidade de controle, os quais foram encontrados pelo seguinte esquema de reponderação que minimiza a distância métrica de entropia:

\[\underset{{{w}_{i}}}{\mathop{\min }}\,H\left( w \right)=\underset{\{i|D=0\}}{\mathop \sum }\,{{w}_{i}}\text{log}({{w}_{i}}/{{q}_{i}})\] (3)

Sujeito às restrições de equilíbrio e normalização

\[\underset{\left\{ i\text{ }\!\!|\!\!\text{ }D=0 \right\}}{\mathop \sum }\,{{w}_{i}}{{c}_{ri}}\left( {{X}_{i}} \right)={{m}_{r}}\] (4)

Com r E 1, ..., R

\[\underset{\left\{ i\text{ }\!\!|\!\!\text{ }D=0 \right\}}{\mathop \sum }\,{{w}_{i}}=1\] (5)

\[{{w}_{i}}\ge 0\] (6)

para todo i, tal que D = 0

Onde \( {{q}_{i}}=\frac{1}{{{n}_{0}}} \) é um peso base e cri(Xi) = mr descreve um conjunto de R restrições impostas aos momentos das covariadas no grupo de controle reponderados. Inicialmente, escolhe-se a covariada que será incluída na reponderação. Para cada covariada, especifica-se um conjunto de restrições de balanceamento (Eq. 04) para equiparar os momentos das distribuições das covariadas entre os grupos de tratamento e controles reponderados. As restrições de momentos podem ser a média (primeiro momento), a variância (segundo momento), e a assimentria (terceiro momento). Uma restrição típica do balanceamento é formulada de tal forma que mr contenha o momento de uma covariada específica Xj para o grupo de tratamento e a função de momento para o grupo de controle é especificada como :\( {{c}_{ri}}\left( {{X}_{ij}} \right)=X_{ij}^{r}~ou~{{c}_{ri}}\left( {{X}_{ij}} \right)={{\left( {{X}_{ij}}-{{\mu }_{j}} \right)}^{r}} \) com média \( {{\mu }_{i}} \)

Dessa forma, o balanceamento por entropia procura, para um conjunto de unidades, pesos W = (wi,...wn0)', no qual minimiza a equação (3), distância de entropia entre W e o vetor base de pesos Q=(qi,...,qn0)', sujeita às restrições de balanceamento na equação (4), restrição de normalização (equação 5), e restrição de não-negatividade (Equação 6).

Segundo Hainmueller (2012HAINMUELLER J. Entropy Balancing for Causal Effects: A Multivariate Reweighting Method to Produce Balanced Samples in Observational Studies. Political Analysis, v. 20 n. 1, p. 25-46, 2012.), o método da entropia pode ser combinado com outros métodos de pareamento, tais como, CEM e PEP, visando, assim, equilibrar com maior robustez as covariadas. Nesse caso, o autor sugere aplicar inicialmente o CEM, para desconsiderar as unidades de tratados e controles desequilibradas, e em seguida fazer a ponderação via entropia. Dessa forma, este trabalho irá seguir esse procedimento, minimizando os desequilíbrios entre os grupos de tratados e controle.

2.1.3 Efeito quantílico de tratamento - Modelo de Firpo (2007FIRPO, Sérgio. Efficient Semiparametric Estimation of Quantile Treatment Effects. Econométrica, v. 75, n. 1, 2007.)

O modelo de efeito quantílico de tratamento exógeno e não condicional proposto por Firpo (2007FIRPO, Sérgio. Efficient Semiparametric Estimation of Quantile Treatment Effects. Econométrica, v. 75, n. 1, 2007.) será utilizado para obter o efeito do PBF nas áreas rurais. Isso porque uma família pode ou não pertencer ao programa devido a fatores aleatórios, dada uma restrição de renda e características observáveis, portanto, o tratamento utilizado deve ser exógeno. E não condicional deve-se ao fato de muitas famílias serem elegíveis ao programa, mas que não são selecionadas devido aos recursos direcionados ao programa serem limitados, dessa forma, a participação ou não condicional das famílias é feita de forma aleatória.

Neste estudo, o tratamento diz respeito a receber ou não o benefício do PBF, portanto os beneficiários do PBF fazem parte do grupo de tratamento e os não beneficiários do grupo de controle. Visto isso, o modelo de EQT de Firpo (2007FIRPO, Sérgio. Efficient Semiparametric Estimation of Quantile Treatment Effects. Econométrica, v. 75, n. 1, 2007.) é definido a seguir.

Seja T a variável que indica o tratamento para um indivíduo i, que assume valores de 0 e 1. Se Ti=1 o indivíduo assume a forma de tratado e se Ti=0, de não tratado. Seja Yi a variável de resposta desse evento, ou seja, os resultados potenciais de receber ou não o tratamento, dessa forma, se Yi(1) o indivíduo recebe o tratamento e se Yi(0), não recebe o tratamento. Então, define-se o resultado observado como:

\[{{Y}_{i}}=~{{Y}_{i}}\left( 1 \right)-~{{T}_{i}}+~{{Y}_{i}}\left( 0 \right)-~\left( 1-{{T}_{i}} \right)\] (7)

Diante disso, definindo τ como um número real em [0,1] o efeito quantílico de tratamento (EQT) é dado por:

\[{{q}_{t}}~=~{{q}_{1,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}}-~{{q}_{0,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}}\] (8)

onde \( {{q}_{j,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}}\equiv in{{f}_{q}}\Pr \left[ Y\left( j \right)\le ~{{q}_{j,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}} \right]\ge \text{ }\!\!\tau\!\!\text{ },\text{ }\!\!~\!\!\text{ j}=0,1 \)

A expressão acima mostra que o EQT é a diferença entre os valores do quantil τ das funções de distribuição cumulativas da variável resposta referentes ao grupo de tratamento e o de controle, para um dado quantil. Para estimar o EQT é necessário seguir duas etapas: em primeiro lugar, estima-se o escore de propensão e posteriormente calcula-se a diferença entre tratados e não tratados. Os estimadores do escore de propensão são definidos como a probabilidade condicional de receber um tratamento, dado por características de pré-tratamento observáveis:

\[p\left( X \right)=\Pr \left( T=1\text{ }\!\!|\!\!\text{ }X=x \right)\] (9)

A utilização do escore de propensão requer que sejam adotadas três hipóteses: independência condicional, suporte comum e quantis bem definidos e únicos. A hipótese de independência condicional implica que os valores de Yi independem da aplicação do tratamento, condicionada a um determinado conjunto de variáveis X observáveis:

Hipótese 1: \[{{Y}_{i}}\left( 1 \right),~{{Y}_{i}}\left( 0 \right)~\bot {{T}_{i}}|{{X}_{i}}$ \]

Já a hipótese de suporte comum garante que as observações de tratamento têm observações de comparação "nas proximidades" na distribuição de escore de propensão, ou em outros termos:

Para algum

Hipótese 2: \[c > 0, c < p(x) < 1 – c\]

Hipótese 3: Para j=0,1, Y(j) é uma variável aleatória contínua com suporte em R, no qual há um conjunto não vazio de Y1 e Y1, de tal forma que \( {{Y}_{i}}=\{\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }\in ~\left( 0,1 \right);\text{ }\!\!~\!\!\text{ Pr}\left[ Y\left( j \right)\le {{q}_{j,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}}\text{ }\!\!~\!\!\text{ }\text{ }\!\!~\!\!\text{ c} \right]\text{ }\!\!~\!\!\text{ }\left\langle \text{Pr}\left[ Y\left( j \right)\le {{q}_{j,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}}+\text{ }\!\!~\!\!\text{ c} \right],~\forall ~c~\in R,c \right\rangle 0~ \). Essa hipótese que mostra que os quantis são bem definidos e únicos.

Cabe mencionar que diferentemente da metodologia exposta na subseção anterior, a metodologia de Firpo (2007FIRPO, Sérgio. Efficient Semiparametric Estimation of Quantile Treatment Effects. Econométrica, v. 75, n. 1, 2007.) não faz o pareamento (matching) dos escores de propensão, e a estimação do escore de propensão é feita por meio de um modelo logit global. Dessa forma, o estimador de EQT é dado por \( \overset{\hat{\ }}{\mathop{q}}\,t=~{{\hat{q}}_{1,~\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}}-{{\hat{q}}_{0,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}} \) em que:

\[{{\hat{q}}_{j,~\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}}\equiv \arg mi{{n}_{q}}\underset{i=1}{\overset{N}{\mathop \sum }}\,{{\hat{w}}_{j,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}}~.~{{\rho }_{\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }}}\left( {{Y}_{i}}-~q \right)\] (10)

De tal forma que os quantis podem ser estimados mediante a minimização de uma soma da função check 𝜌 (.), assim como foi proposto por Koenker e Basset (1978BASSET, Gilbert; KOENKER, R. Regression quantiles. Econometrica, v. 46, n. 1, p. 33-50, 1978) apud Cavalcanti (2013CAVALCANTI, D. M. Avaliação dos Impactos do Programa Bolsa Família na Renda, Educação e no Mercado de Trabalho das Famílias Pobres do Brasil. Dissertação. (Mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Programa de Pós-Graduação em Economia, Centro de Ciências Sociais Aplicadas. 2013.). Os pesos de cada uma das observações, wi, é dada pela seguinte expressão:

\[{{\hat{w}}_{1,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }\!\!~\!\!\text{ }}}=\frac{{{T}_{i}}}{N.\hat{p}\left( {{X}_{i}} \right)}\] (11)

e

\[{{\hat{w}}_{o,\text{ }\!\!\tau\!\!\text{ }\!\!~\!\!\text{ }}}=~\frac{1-{{T}_{i}}}{N.\left( 1-\hat{p} \right)\left( {{X}_{i}} \right)}\]

2.2 Grupos de tratamento e controle

A avaliação do impacto do Bolsa Família no mercado de trabalho será realizada por meio da comparação dos resultados de dois grupos, tratamento, o qual considera as famílias que atendem aos critérios de elegibilidade e são beneficiárias do programa; grupo de controle, composto pelas famílias que atendem aos critérios de elegibilidade, mas que não são beneficiárias, pois não foram selecionadas por algum motivo.

2.3 Base de dados e variáveis do modelo

Os dados utilizados neste trabalho foram retirados do Censo Demográfico realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGEIBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2013. Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.ibge.gov.br. Vários acessos.
http://www.ibge.gov.br...
) para o ano de 2010.2 2 Visto que foi o último censo divulgado.

Seguindo Costal et al. (2014COSTA, E. M.; CAVALCANTI, D. M.; SILVA, J. L. M. da; SAMPAIO, R. M. B. Impactos Regionais do Programa Bolsa Família: uma análise sobre o Mercado de Trabalho das Famílias Pobres. ANPEC: XLII ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 2014 . Disponível em: < Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro/2014/submissao/files_I/i13-dc0aad69d0a6580ef400e1ea2c1accc7.pdf > Acesso em: 20 abr. 2015. 2014
http://www.anpec.org.br/encontro/2014/su...
), os impactos dos Programa Bolsa Família no mercado de trabalho serão avaliados utilizando duas variáveis de resultado: horas trabalhadas do chefe familiar, pois, pretende-se analisar se o programa reduz ou não as horas trabalhadas dos chefes beneficiários, verificando se realmente há um efeito desincentivo ao trabalho devido ao repasse monetário; e renda do trabalho per capita, que busca verificar se a renda das famílias oriunda do trabalho está aumentando ou reduzindo por possíveis efeitos negativos, de desincentivo ao trabalho, do programa.

Para fazer uma comparação dos resultados dos grupos de tratamento e de controle, é necessário que os dois grupos sejam bastante homogêneos entre eles. Assim, com o intuito de garantir que o modelo capte o efeito do programa, fez-se necessário controlar características observáveis do grupo familiar e do domicílio. Para tanto, o CadÚnico foi utilizado como referência para verificar quais são as variáveis registradas nesse sistema que são pertinentes para a determinação do recebimento do programa.

O grupo de covariadas é dividido em quatro categorias, como mostra o quadro 1 abaixo.

Quadro1:
Covariadas utilizadas para o matching

3 Resultados

3.1 Estatísticas descritivas

A distribuição dos domicílios rurais pobres elegíveis para o Programa Bolsa Família pode ser observada na Tabela 1. Os dados amostrais denotam um total de 430.227 unidades domiciliares, e, quando ponderados pelo peso, os dados do Universo mostram que os números de domicílios correspondem a 2.742.705.

No Brasil, o percentual de famílias beneficiadas pelo PBF no meio rural equivale a 59,60% do total de famílias elegíveis. Quando a análise é feita por regiões, percebe-se que o Nordeste é responsável pela maior quantidade de famílias beneficiadas, tanto em termos absolutos quanto relativos, com cerca de 68,68% da amostra de 261.500 domicílios e representando 72,03% do total dos beneficiários do país. Em seguida, destacam-se as regiões Norte e Sudeste, que participam com 12,98% e 8,93%, respectivamente, no total de beneficiários no Brasil, mas só contemplam 46,20% (Norte) e 46,94% (Sudeste) das famílias elegíveis em suas regiões. Já as regiões Sul e Centro-Oeste possuem participações menos expressivas, representando 4,02% e 2,03% dos beneficiários no país e com menos de 40% de suas populações recebendo benefícios.

Tabela 1:
Estatísticas descritivas - Brasil e Regiões - Rural - 2010

Analisando as estatísticas descritivas das variáveis utilizadas para mensurar o impacto do Bolsa Família no mercado de trabalho3 3 Tais resultados podem ser requisitados aos autores por email. constata-se que as horas trabalhadas dos chefes familiares e a renda do trabalho per capita nas regiões Nordeste e Norte, tanto dos beneficiários como dos não beneficiários do programa, ficam abaixo da média do Brasil e das demais regiões. Além disso, é possível perceber uma grande disparidade entre a renda do trabalho per capita dos beneficiários e não beneficiários.

No Brasil, as famílias que são beneficiadas pelo PBF recebem R$37,41 a menos que as famílias não beneficiadas. Regionalmente, essas disparidades são mais expressivas nas regiões Centro-Oeste (R$37,62), Norte (R$35,41) e Nordeste (R$34,01). É interessante observar que, embora os beneficiários possuam uma menor renda do trabalho se comparados aos não beneficiários, a proporção da população beneficiária que trabalha é superior a não beneficiária em quase todas as regiões, à exceção da região Sul (em que as proporções são iguais). Isto é, as ocupações dos beneficiários devem ter baixas remunerações.

As famílias que recebem o programa têm em média três filhos, por outro lado, as famílias não beneficiadas têm em média 2 filhos. Outro fator relevante é o baixo nível de instrução dos chefes familiares: a grande maioria apenas sabe ler ou somente possui o grau primário. Essa baixa escolaridade dificulta o processo de qualificação e a conquista de melhores postos de trabalho. Além disso, apesar de uma grande parcela de chefes familiares estar ocupada, somente um pequeno percentual possui carteira de trabalho assinada, ou seja, uma elevada quantidade de trabalhadores deve estar no mercado informal, trabalhando por conta própria ou para o seu próprio sustento. As regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul possuem relativamente mais trabalhadores com carteira assinada - tanto para beneficiários do programa quanto para os não beneficiários - do que as regiões Nordeste e Norte, estas últimas ainda ficam abaixo da média brasileira.

As demais características do chefe domiciliar, dos componentes familiares e do domicílio são bastante semelhantes para todas as regiões, porém algumas características do domicílio para a região Norte estão abaixo das demais regiões, a exemplo do percentual de residências com água encanada, coleta de lixo, saneamento e eletricidade.

3.2 Resultados do balanceamento

3.2.1 Impacto do Programa Bolsa Família nas horas trabalhadas do chefe familiar

Conforme Hainmueller e Xu (2013HAINMUELLER J.; XU, Y. Ebalance: A Stata Package for Entropy Balancing. Journal of Statistical Software. v. 54, n.7. 2013), pode-se combinar o CEM com a Entropia. Assim, foi realizado o balanceamento pelo método CEM e posteriormente o balanceamento por entropia, a fim de permitir que o grupo de tratados e controle fosse o mais semelhante possível. A tabela 2 abaixo mostra os resultados do desequilíbrio global4 4 O desequilíbrio global é dado pela estatística L1, sendo determinado na diferença entre o histograma L1 multidimensional de todas as covariáveis de pré-tratamento do grupo tratado e do grupo de controle. Quanto mais próximo for L1=0, mais balanceados estarão os dois grupos, quanto mais próximo for L1=1, mais separados são os tratados e controle. entre as covariáveis do grupo de tratados e controle, antes e após a aplicação do algoritmo CEM, bem como as observações para os pareados e não pareados após o balanceamento.

Ao comparar os resultados de desequilíbrio (estatística L1 antes do balanceamento; estatística L1 após o balanceamento), observa-se, na Tabela 2, que para as horas trabalhadas houve uma redução dessa medida entre as covariáveis dos dois grupos, tanto para o Brasil como para as regiões, demonstrando que a aplicação desse algoritmo proporcionou um melhor equilíbrio entre tratados e controle. Para o Brasil, a amostra, a partir desse método, passou a conter 19.860 tratados e 18.444 controles comparáveis. Nota-se ainda que ao aplicar o CEM o balanceamento melhorou, mas ainda existem diferenças entre os dois grupos. Portanto, faz-se necessária a aplicação do balanceamento por entropia para dar mais robustez à análise.

Tabela 2:
Balanceamento CEM - Brasil e Regiões - Rural

Com relação ao balanceamento por Entropia, a Tabela 3 abaixo mostra que, para o Brasil Rural, o comportamento da média, variância e assimetria da distribuição antes e após o procedimento de balanceamento eram distintos entre os grupos analisados.

Tabela 3:
Balanceamento por Entropia Covariadas das Horas Trabalhadas - Brasil Rural

Verificando as covariadas, percebe-se que antes do ajustamento à média, a variância e assimetria entre o grupo dos tratados e controles eram diferentes. Após o balanceamento, houve o ajustamento dessas estatísticas para todas as covariadas inseridas, ou seja, o balanceamento está perfeitamente ajustado para os três primeiros momentos da distribuição das variáveis independentes. Ademais, os resultados para as regiões rurais indicaram resultados similares ao encontrado para o Brasil. A região Centro-Oeste foi a única em que os resultados não foram perfeitamente ajustados, entretanto, são valores muito próximos.5 5 Tais resultados podem ser requisitados aos autores por email.

Posteriormente ao pareamento por entropia, foi possível calcular o efeito médio do tratamento sobre os tratados (ATT) do Bolsa Família nas horas trabalhadas, que pode ser visto na Tabela 4 abaixo. Os resultados mostram que o impacto do PBF nas horas trabalhadas do chefe familiar, no Brasil, foi em média de -2,65, ou seja, os beneficiários do programa possuem menos horas trabalhadas do que os não beneficiários. O mesmo é observado para todas as regiões, sendo o maior impacto verificado nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul, no qual os beneficiários possuem 6,04, 3,13 e 1,80, respectivamente, a menos de horas trabalhadas se comparados às famílias que não recebem o repasse monetário.

Tabela 4:
Impacto do PBF nas horas trabalhadas do chefe familiar - Brasil e Regiões - Rural.

Menor impacto foi observado na região Nordeste, cujo efeito foi de -1,14, porém, este não foi significativo para a região Norte. Vale ressaltar que 2010 foi um ano de seca no Nordeste e que mais de 50% dos beneficiários são agricultores. Assim pode ser que neste ano o repasse monetário do programa tenha ajudado a atender apenas às necessidades fundamentais dos beneficiários, sem que tenha havido grandes incentivos para uma maior redução das horas trabalhadas.

Embora os resultados das horas trabalhadas entre os beneficiários e o grupo de controle tenham mostrado que as Regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul são aquelas que apresentam o maior “efeito desincentivo” médio, elas têm em média mais horas trabalhadas que as demais regiões. Por outro lado, o Norte e o Nordeste apresentaram o menor “efeito desincentivo” e são responsáveis pelo maior número de beneficiários do Programa Bolsa Família no Brasil, como visto na Tabela 1, denotando que apesar de serem regiões com mais beneficiários e com problemas estruturais, o efeito desincentivo é menor quando comparado ao Brasil e demais regiões. Isso, provavelmente, decorre do benefício do PBF não permitir que os trabalhadores de regiões mais pobres como as regiões Norte e Nordeste, prescindam do trabalho, não gerando alto desincentivo ao trabalho. Quanto à região Centro-Oeste, uma possível explicação para a grande diferença entre os dois grupos talvez seja o tamanho da amostra para essa região.

3.2.2 Impacto do Programa Bolsa Família na renda do trabalho per capita

Seguindo os procedimentos realizados para a análise anterior, estimaram-se as medidas de desequilíbrio global, no qual a Tabela 5 abaixo apresenta estatística L1 = 0,8626 antes do balanceamento, e estatística L1 = 0,6547 após o balanceamento para o caso do Brasil Rural. Observa-se que para a renda do trabalho houve uma redução dessa medida entre as covariáveis dos tratados e controles, demonstrando que a aplicação do CEM como ocorrido na análise anterior melhorou o equilíbrio entre os grupos. Então, a amostra após o procedimento passou a conter 35.372 tratados e 49.664 controles, comparáveis. Além disso, percebe-se que antes do balanceamento o número de tratados era muito superior ao número de controles, o que poderia gerar um desequilíbrio no suporte comum. Para todas as regiões, a estatística L1 também apresentava valores altos antes do balanceamento, já após a aplicação do CEM houve uma melhora no equilíbrio entre os grupos.

Tabela 5:
Balanceamento CEM - Brasil e Regiões - Rural

Assim como na análise das horas trabalhadas, os resultados do balanceamento por Entropia para a renda do trabalho, Tabela 6, mostram que para o Brasil Rural, a média, variância e assimetria da distribuição antes e após a entropia eram diferentes entre os grupos analisados. Ressalta-se que o mesmo acontece para as regiões.6 6 Tais resultados podem ser requisitados aos autores por email.

Após o balanceamento pela entropia no Brasil rural, utilizando os três primeiros momentos da distribuição das variáveis independentes, houve o ajustamento dessas estatísticas para todas as covariadas analisadas, ou seja, o balanceamento está perfeitamente ajustado.

Por exemplo, a covariada idade do chefe da família, antes do ajustamento tinha como média (38,04), variância (100,00) e assimetria (0,3443) para o grupo dos tratados, para o grupo de controle tinha-se média (37,09), variância (139,10) e assimetria (0,2780) do grupo de controle. Após o balanceamento, houve o ajustamento dessas estatísticas para a covariada em questão, sendo que tanto para o grupo de tratados quanto para o grupo de controle a média (38,04), variância (100,00) e assimetria (0,3443) passaram a ser as mesmas. Quanto aos resultados para as regiões rurais, os resultados foram similares ao encontrado para o Brasil.

Tabela 6:
Balanceamento por Entropia Covariadas da Renda do Trabalho per capita - Brasil Rural

A Tabela 7 mostra o Efeito Médio do Tratamento sobre os Tratados (ATT) para o Brasil e Regiões Rurais. Por meio dela, percebe-se que, em média, as famílias beneficiadas pelo programa no Brasil possuem renda do trabalho per capita inferior às famílias elegíveis não beneficiárias, chegando a uma diferença de R$22,05. Nas regiões, essa diferença é maior na região Sul (-R$19,46), enquanto a região Norte (-R$15,27) é responsável pela menor diferença, seguida do Sudeste (-R$16,73) e Centro-Oeste (-R$16,74).

Portanto, pode-se verificar que no Brasil e Regiões os beneficiários do Bolsa Família possuem renda do trabalho inferior per capita quando comparados com aqueles elegíveis que não participam do programa, sendo que, para as regiões, o maior e o menor impacto ocorreu nas Região Sul e Norte, respectivamente.

Tabela 7:
Impacto do PBF na renda do trabalho per capita do chefe familiar - Brasil e Regiões - Rural

3.3 Resultados para o Modelo de Firpo (2007FIRPO, Sérgio. Efficient Semiparametric Estimation of Quantile Treatment Effects. Econométrica, v. 75, n. 1, 2007.)

3.3.1 Impacto do Programa Bolsa Família nas horas trabalhadas do chefe familiar

Os efeitos do Bolsa Família nas horas trabalhadas do chefe familiar para as regiões, na distribuição, são apresentados na Tabela 8. Para os quantis, os resultados apresentam efeitos distintos. Pode-se perceber que no primeiro quantil, em que a quantidade de horas trabalhadas é de 2 horas semanais (para o Nordeste, Norte, Sudeste e Centro-Oeste) e 3 horas semanais (para o Sul), não existe “efeito desincentivo” ao trabalho para os trabalhadores. A não existência desse efeito persiste nos primeiros quantis para a região Nordeste e Norte. Já na região Norte, é possível perceber efeitos negativos mais fortes nos quantis mais elevados e um pequeno impacto positivo entre os quantis 0,1 e 0,25.

A região Centro-Oeste tem a maior redução (12 horas) na jornada de trabalho, mais precisamente para os indivíduos que trabalham 80 horas semanais. Para as regiões Sudeste e Sul, destacam-se efeitos negativos entre os quantis 0,1 e 0,25. Ademais, a região Centro-Oeste é a que possui maiores efeitos desincentivo ao trabalho, enquanto a região Norte é responsável pelos menores efeitos.

Para aqueles que trabalham 40 horas semanais, tanto para o Brasil quanto para as regiões, não existem efeitos significativos, com exceção da região Centro-Oeste, em que parte dos beneficiários que se encontram nessa faixa chegam a ofertar até 4 horas a menos com relação aos que não são beneficiários. Tais resultados seguem os encontrados por Costa et al. (2014COSTA, E. M.; CAVALCANTI, D. M.; SILVA, J. L. M. da; SAMPAIO, R. M. B. Impactos Regionais do Programa Bolsa Família: uma análise sobre o Mercado de Trabalho das Famílias Pobres. ANPEC: XLII ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA, 2014 . Disponível em: < Disponível em: http://www.anpec.org.br/encontro/2014/submissao/files_I/i13-dc0aad69d0a6580ef400e1ea2c1accc7.pdf > Acesso em: 20 abr. 2015. 2014
http://www.anpec.org.br/encontro/2014/su...
), os quais consideraram para o Brasil urbano e rural.

Destacam-se alguns efeitos encontrados: 1) efeitos neutros, não significantes, para os quantis em que são poucas as horas trabalhadas do chefe familiar e para os que trabalham 40 horas semanais nas regiões, com exceção da Centro-Oeste. 2) efeitos negativos para os que trabalham acima de 40 horas semanais em todas as regiões, excetuando-se os quantis com efeito nulo, neste caso, o recebimento do benefício pode implicar na busca da aproximação do montante de horas previsto pela CLT, qual seja, reduzindo o excesso de trabalho para 40 horas. 3) Efeitos positivos entre os quantis 0,1 e 0,25 da região Norte, no qual as famílias beneficiadas encontram incentivos para aumentar a quantidade de horas trabalhadas.

Tabela 8:
Impacto do PBF nas horas trabalhadas dos chefes familiares - Brasil e Regiões - Rural

3.3.2 Impacto do Programa Bolsa Família na renda do trabalho per capita

A Tabela 9 retrata o impacto do Programa Bolsa Família na renda do trabalho per capita. Por meio dela, percebe-se que, à exceção do primeiro quantil da região Nordeste, a renda dos beneficiários do PBF, se comparada aos não beneficiários, é menor ao longo de toda a distribuição para todas as regiões do país.

Com relação às regiões Nordeste e Norte, os maiores impactos em termos monetários são observados da mediana pra cima, chegando a receber até R$22,75 (Nordeste) e R$23,33 (Norte) a menos que as famílias elegíveis não beneficiadas. Já nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul, a redução na renda é maior no quantil 0,75 (assim como para o Brasil), correspondendo a uma diminuição de R$23,00, R$25,50 e R$25,00, respectivamente.

Tratando-se do impacto percentual no quantil, os efeitos negativos são mais encontrados nas regiões Sul e Centro-Oeste, nas quais os chefes domiciliares beneficiados recebem 35,0% (quantil 0,1) e 34,3% (quantil 0,01), respectivamente, a menos que os não beneficiados.

Tabela 9:
Impacto do PBF na Renda do trabalho per capita - Brasil e Regiões - Rural

(³)***Estatisticamente significante a 1%; **Estatisticamente significante a 5%; *Estatisticamente significante a 10%.

Fonte: Elaborado pelos autores, com base nas estimações

Logo, embora haja uma menor renda oriunda do trabalho dos beneficiários se comparada a dos não beneficiários, não se pode afirmar que essa diferença seja atribuída exclusivamente ao efeito desincentivo ao trabalho, visto que foram observados distintos efeitos na distribuição. Ademais, a redução de horas trabalhadas no caso de altos quantis pode não ser somente causada pelo efeito desincentivo, mas também por um aumento no poder de barganha do trabalhador em abrir mão de jornadas excessivas de trabalho para ter uma compensação de renda por meio do PBF.

4 Considerações finais

Este trabalhou procurou avaliar possíveis efeitos do Programa Bolsa Família nas horas trabalhadas do chefe familiar e na renda do trabalho per capita dos indivíduos que se situam em áreas rurais, contribuindo com a literatura em vista dos poucos estudos existentes que buscam avaliar o impacto do programa no mercado de trabalho destas áreas.

A análise foi feita utilizando dados do Censo Demográfico de 2010, sendo utilizado três metodologias: CEM (2009), Entropia (2011) e EQT (2007). O primeiro e segundo métodos buscam deixar o suporte comum entre o grupo de tratados e controle homogêneo, além disso, a Entropia também encontra efeito médio de tratamento sobre os tratados. A principal diferença entre esses métodos reside no fato de que a Entropia analisa o efeito médio nas variáveis, enquanto o EQT avalia o efeito ao longo da distribuição.

Considerando os efeitos médios, foi possível observar em todas as regiões e no Brasil como um todo resultados negativos sobre as horas trabalhadas e sobre a renda do trabalho dos beneficiários do programa comparados às famílias que são elegíveis, mas não são beneficiadas. Assim, constatou-se um efeito desincentivo para o Brasil e Regiões, sendo este efeito de maior impacto na região Centro Oeste, enquanto o menor impacto foi registrado na região Nordeste. Ademais, o Nordeste é a região com a maior quantidade de beneficiários do programa no Brasil, no entanto, esta região é a que oferta menos horas trabalhadas em média no país, enquanto a região Sul é a que oferta mais, logo, para os beneficiários que se encontram na região Nordeste, uma maior redução das horas trabalhadas poderia implicar em uma perda monetária mais significativa em comparação com beneficiários da região Sul.

Quanto aos efeitos na distribuição, foram verificados três tipos de efeitos nas horas trabalhadas do chefe familiar: 1) efeitos neutros nos quantis em que as horas trabalhadas equivalem a no máximo 3 horas para todas as regiões, bem como nos quantis em que as horas trabalhadas são de 40 horas, com exceção da região Centro-Oeste e em outros quantis pontuais. 2) Efeitos negativos, especialmente, onde as horas trabalhadas são superiores a 40 horas, talvez explicada pelo aumento do poder de barganha do trabalhador de abrir mão de jornadas excessivas de trabalho. 3) Efeitos positivos entre os quantis 0,1 e 0,25 da região Norte. Ressalta-se ainda que os maiores e menores efeitos desincentivo ao trabalho foram observados na região Centro-Oeste e Norte, respectivamente. Para a renda do trabalho, os efeitos na distribuição foram negativos, exceto para o primeiro quantil da região Nordeste, ou seja, os beneficiários possuem menor renda do trabalho do que os não beneficiários.

Os resultados não necessariamente implicam que essa menor renda do trabalho per capita dos beneficiários é consequência da redução de horas trabalhadas do chefe familiar, visto que os efeitos negativos nas horas trabalhadas foram em poucos quantis, enquanto na renda foi ao longo de todos os quantis analisados. Diante disso, devem existir outros fatores que tenham impacto no mercado de trabalho que não foram identificados nos resultados aqui obtidos, como, por exemplo, os postos de trabalho ocupados pelos indivíduos e o diferente dinamismo econômico de cada região rural do país.

Referências

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  • 1
    Instituído pela Medida Provisória nº 132, de 20 de outubro 2003. Oficializado pela Lei nº 10.836, de 09 de janeiro de 2004, e Decreto nº 5.209, de 17 de setembro de 2004.
  • 2
    Visto que foi o último censo divulgado.
  • 3
    Tais resultados podem ser requisitados aos autores por email.
  • 4
    O desequilíbrio global é dado pela estatística L1, sendo determinado na diferença entre o histograma L1 multidimensional de todas as covariáveis de pré-tratamento do grupo tratado e do grupo de controle. Quanto mais próximo for L1=0, mais balanceados estarão os dois grupos, quanto mais próximo for L1=1, mais separados são os tratados e controle.
  • 5
    Tais resultados podem ser requisitados aos autores por email.
  • 6
    Tais resultados podem ser requisitados aos autores por email.

Disponibilidade de dados

Citações de dados

IACUS, S. M.; KING, G; PORRO, G. Matching for causal inference without balance checking. 2009. Disponível em: <Disponível em: http://gking.harvard.edu/files/cem.pdf >. Acesso em: 27 Maio 2016.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    07 Mar 2016
  • Aceito
    16 Jan 2017
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