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Assimetrias nas respostas dos estados brasileiros aos choques na política monetária e no câmbio: uma análise utilizando um modelo FAVAR

Asymmetries of the Brazilian states’ responses to shocks in monetary and exchange rate policies: an assessment using a FAVAR model

Resumo

Este artigo analisa se os estados brasileiros constituem uma Área Monetária Ótima ao examinar a existência de assimetrias nas respostas estaduais aos choques na política monetária e no câmbio, além de comparar a resposta estadual aos choques comuns e idiossincráticos. Para tanto, utiliza-se a metodologia inicialmente desenvolvida por Lima et al. (2018)LIMA, E. C. R.; MARTINEZ, T. S.; CERQUEIRA, V. S. Monetary policy and exchange rate: Effects on disaggregated prices in a Favar model for Brazil. Brazilian Review of Econometrics, v. 38, n 1, p. 129-174, 2018. para estimar modelos de Vetores Autorregressivos Aumentados por Fatores Dinâmicos (FAVAR), que incorpora o amostrador de Gibbs proposto por Waggoner e Zha (2003)WAGGONER, D.; ZHA, T. A Gibbs simulator for restricted VAR models. Journal of Economic Dynamics and Control, v. 26, p. 349-366, 2003. para identificar Vetores Autorregressivos Estruturais (SVAR) através de restrições de sinais nas funções impulso-resposta ao amostrador de Gibbs, desenvolvido por Bernanke e Boivin (2003)BERNANKE, B. S.; BOIVIN, J. Monetary policy in a data-rich environment. Journal of Monetary Economics, v. 50, p. 525-546, 2003. para estimar modelos FAVAR. O modelo permite identificar assimetrias nas respostas das taxas de crescimento do produto e dos preços dos estados brasileiros aos choques na política monetária e no câmbio, além de estimar a importância relativa das respostas das taxas de crescimento econômico estaduais aos choques comuns e específicos.

Palavras-chave
assimetria de choques; vetores autorregressivos aumentados por fatores dinâmicos (FAVAR); Áreas Monetárias Ótimas (AMO)

Abstract

In this paper, we analyze whether the Brazilian states constitute an optimal monetary area by examining the possible asymmetries in the states’ responses to shocks in monetary and exchange policy, in addition to comparing the states’ responses to common and idiosyncratic shocks. The methodology initially developed by Lima et al. (2018)LIMA, E. C. R.; MARTINEZ, T. S.; CERQUEIRA, V. S. Monetary policy and exchange rate: Effects on disaggregated prices in a Favar model for Brazil. Brazilian Review of Econometrics, v. 38, n 1, p. 129-174, 2018. is used to estimate Factor-Augmented Vector Autoregressive (FAVAR) models that incorporates the Gibbs sampling, proposed by Wagoner and Zha (2003)WAGGONER, D.; ZHA, T. A Gibbs simulator for restricted VAR models. Journal of Economic Dynamics and Control, v. 26, p. 349-366, 2003. to identify structural vector autoregressive (SVAR) through sign restrictions in the impulse response functions to the Gibbs sampling developed by Bernanke and Boivin (2003)BERNANKE, B. S.; BOIVIN, J. Monetary policy in a data-rich environment. Journal of Monetary Economics, v. 50, p. 525-546, 2003. to estimate FAVAR models. The model allows us to identify asymmetries in the responses of the growth economic rates and of the inflation of the Brazilian states to the shocks in the monetary policy and the exchange rate, besides estimating the relative importance of the responses of the states’ economic growth to the common and specific shocks.

Keywords
asymmetry of shocks; factor-augmented vector autoregressive (FAVAR); Optimal Monetary Area

1 Introdução

Este artigo analisa se os estados brasileiros constituem uma Área Monetária Ótima (AMO) ao examinar a existência de assimetrias nas respostas estaduais aos choques na política monetária e no câmbio, além de comparar a resposta estadual aos choques comuns e idiossincráticos. O trabalho busca contribuir com a literatura existente por adotar, em âmbito estadual no Brasil, um modelo de Vetores Autorregressivos Aumentados por Fatores Dinâmicos (FAVAR)1 1 Do termo em língua inglesa Factor-Augmented Vector Autoregressive. com identificação, via restrições de sinais, dos choques na política monetária e no câmbio. É também analisada a importância relativa da resposta das taxas de crescimento dos níveis de atividade econômica estaduais aos choques comuns e específicos identificados pelo modelo. Em um país com elevada heterogeneidade econômica e social em nível regional é de se esperar uma assimetria nas respostas dos estados brasileiros aos choques na política monetária e no câmbio - esta é a hipótese básica que motivou este trabalho.

Acrescente-se que, do ponto de vista metodológico, há a questão de qual metodologia mais adequada para tratar de uma amostra relativamente curta, além do problema da qualidade de alguns dados, como é o caso da estimativa da taxa de variação do nível de atividades estaduais. O modelo FAVAR foi adotado por entendermos que a abordagem bayesiana lida melhor com amostras pequenas, sendo assim a melhor metodologia existente para esse propósito, além de ter a vantagem de usar restrições de sinais que melhoram os resultados nas funções impulso-resposta. Nesse sentido, utilizou-se neste trabalho a metodologia desenvolvida originalmente por Lima et al. (2018)LIMA, E. C. R.; MARTINEZ, T. S.; CERQUEIRA, V. S. Monetary policy and exchange rate: Effects on disaggregated prices in a Favar model for Brazil. Brazilian Review of Econometrics, v. 38, n 1, p. 129-174, 2018. para estimar modelos FAVAR, que incorpora o amostrador de Gibbs proposto por Waggoner e Zha (2003)WAGGONER, D.; ZHA, T. A Gibbs simulator for restricted VAR models. Journal of Economic Dynamics and Control, v. 26, p. 349-366, 2003. para identificar Vetores Autorregressivos Estruturais (SVAR) através de restrições de sinais nas funções impulso-resposta ao amostrador de Gibbs desenvolvido por Bernanke e Boivin (2003)BERNANKE, B. S.; BOIVIN, J. Monetary policy in a data-rich environment. Journal of Monetary Economics, v. 50, p. 525-546, 2003. para estimar modelos FAVAR2 2 Palma (2007) estimou um modelo SVAR identificado através da combinação de restrições de sinais e de curto prazo para verificar empiricamente a resposta da política monetária (taxa de juros) a choques na taxa de câmbio no Brasil durante o regime de metas de inflação. . Essa nova metodologia não está sujeita às deficiências apontadas por Arias et al. (2014)ARIAS, J. E.; RUBIO-AMÍREZ, J. F.; WAGGONER D. F. Inference based on SVARs identified with sign and zero restrictions: Theory and applications. International Finance Discussion Papers, n. 1.100, Federal Reserve System, abr. 2014. ao método adotado por Mountford e Uhlig (2008)MOUNTFORD, A.; UHLIG, H. What are the effects of fiscal policy shocks? Journal of Applied Econometrics, v. 24, n. 6, p. 960-992, 2008.. Uma vantagem dos modelos FAVAR é possibilitar a inclusão de grande quantidade de variáveis, condensando a informação presente nelas num pequeno número de fatores dinâmicos. Isso possibilita a análise num único modelo dos efeitos dos choques nos estados brasileiros. Outra contribuição deste trabalho é utilizar o modelo Nowcast a fim de se expandir a quantidade de observações estaduais do indicador de nível de atividade escolhido (IBCR).

Os estudos de assimetrias de choques ganharam proeminência por sintetizarem de maneira eficaz os custos envolvidos na perda do controle sobre a política monetária. Algumas análises de assimetrias regionais têm mostrado diferenças significativas nas respostas estaduais aos choques comuns, contestando a ideia de que a política monetária deva se basear apenas em indicadores econômicos agregados. Além disso, um melhor conhecimento acerca dos efeitos regionais da política monetária e da taxa de câmbio permite melhor entendimento dos problemas de política econômica. Em particular, é de se esperar que quanto maior a assimetria dos estados a choques monetários e cambiais mais diferenciados deverão ser os impactos desses choques.

Uma recorrente justificativa às assimetrias encontradas nas respostas a choques entre estados e regiões brasileiras são as diferenças de suas estruturas produtivas e indicadores socioeconômicos muito heterogêneos. Os resultados, no entanto, não são conclusivos e, por vezes, divergem. Dessa forma, a identificação de tais assimetrias nas respostas estaduais e a análise de suas causas ainda se fazem pertinentes, uma vez que, sendo esses efeitos possivelmente contrários aos esperados, a política adotada em nível federal pode levar a problemas de ajustamento econômico e de ampliação das desigualdades regionais.

O presente artigo divide-se em seis seções, além desta introdução. Na seção 2 efetua-se uma pequena revisão de literatura, destacando alguns dos principais trabalhos de assimetria de choques no Brasil. A seção 3 detalha a metodologia utilizada, enquanto a seção 4 detalha os dados escolhidos, bem como o tratamento a esses dados. A seção 5, por sua vez, analisa os resultados encontrados. Por fim, a seção 6 tece as considerações finais.

2 Breve revisão de literatura

2.1 Áreas monetárias ótimas e assimetrias

A teoria de Áreas Monetárias Ótimas (AMO) foi inicialmente sistematizada no artigo de Robert Mundell (1961)MUNDELL, R. A. A theory of optimum currency areas. The American Economic Review, v. 51, n. 4, p.657-665, 1961.. Nesse artigo seminal, o autor questiona se os países de mercados comuns deveriam ou não adotar uma moeda única e se algumas moedas deveriam permanecer indexadas. Partindo do pressuposto de que o objetivo principal da política econômica consiste em manter o equilíbrio externo num contexto de pleno emprego, sua análise argumentava que o grau de mobilidade dos fatores de produção - tanto trabalho quanto capital - constituir-se-ia em importante questão para determinar o regime cambial ótimo. Mundell (1961, p. 657)MUNDELL, R. A. A theory of optimum currency areas. The American Economic Review, v. 51, n. 4, p.657-665, 1961. define área monetária como o território no qual as taxas de câmbio são fixas. A partir daí, levanta a hipótese de que o território apropriado para uma área monetária pode não ser aquele definido pelas fronteiras territoriais. Ao fazer isso, segundo Broz (2005, p. 54)BROZ, T. The theory of optimum currency areas: A literature review. Privredna Kretanja i Ekonomska Politika, v. 15, n. 104, p. 53-78, 2005., ele se torna o primeiro a sugerir que uma área monetária poderia ser um território que não necessariamente coincide com a delimitação corrente dos países.

McKinnon (1963)MCKINNON, R. I. Optimum currency area. The American Economic Review, v. 53, n. 4, p. 717-725, 1963., por sua vez, enfatizou a relevância do tamanho e da abertura das economias - isto é, a relação entre a produção de tradables e non-tradables de um país - para determinar a eficiência do sistema cambial: para ele, quanto maior e mais aberta for a economia de um país, mais eficiente é o sistema de câmbio fixo para restaurar o equilíbrio externo e manter a estabilidade interna. Kenen (1969)KENEN, P. The Theory of Optimum Currency Areas: An Eclectic View, University of Chicago Press, Chicago, 1969., indo ao encontro da abordagem de Mundell relacionada ao grau de mobilidade dos fatores de produção como uma condição importante para a escolha do regime cambial ótimo, argumentou que esse dependeria, também, do grau de mobilidade dos fatores de produção intraindústria: quanto maior a diversificação de uma economia em termos de atividade produtiva e capacidade ocupacional, menores são os seus custos de desemprego e inflacionário decorrentes de choques econômicos imprevistos. Assim, enquanto McKinnon (1963)MCKINNON, R. I. Optimum currency area. The American Economic Review, v. 53, n. 4, p. 717-725, 1963. dedicou-se ao grau de abertura ao comércio exterior, Kenen (1969)KENEN, P. The Theory of Optimum Currency Areas: An Eclectic View, University of Chicago Press, Chicago, 1969. enfatizou a importância da diversificação na estrutura produtiva das economias.

Segundo a teoria da AMO, as condições econômicas para a adoção de uma união monetária são as seguintes: a) o tamanho e a abertura da economia envolvida no comércio internacional; b) o livre movimento dos fatores de produção - capital e trabalho; c) o elevado nível do comércio intra-regional e da diversidade da produção; e d) a capacidade de ajustamento da economia face às suscetibilidades de choques comuns e assimétricos (Ferrari-Filho; Paula, 2002FERRARI-FILHO, F.; PAULA, L. F. Será consistente a proposta de criação de uma União Monetária no Mercosul? Revista de Economia Política, v. 22, n. 2, p. 174-182, 2002., p. 177); sendo o foco deste artigo este último aspecto.

Estudos recentes relacionados à teoria das Áreas Monetárias Ótimas têm em comum o fato de buscarem verificar as propriedades envolvidas na análise dos custos e benefícios de se pertencer a uma União Monetária. Isso permite não só analisar a formação de novas uniões monetárias, mas também compreender melhor os impactos regionais de políticas econômicas.

Nesse contexto, os estudos de assimetria de choques têm possibilitado condensar uma parte dos fatores relevantes levantados pela teoria das AMO na definição dos custos e benefícios envolvidos em se fazer parte de uma união monetária. Quanto a essa capacidade de síntese, Mongelli (2002, p. 13)MONGELLI, F. P. ‘New’ views on the optimum currency area theory: What is EMU telling us. European Central Bank Working Paper n. 138, abr. 2002. compara o desenvolvimento dos estudos de similaridade de choques como o surgimento de uma nova meta-property. Fundamentada em estudos empíricos, essa nova propriedade proveu maior solidez às análises dos custos e benefícios associados às áreas monetárias por possuir o poder de capturar a interação dos diversos dos fatores desejáveis das AMO.

Para exemplificar essas interações entre as características presentes nos estudos de assimetria de choques, tendo como foco os canais de transmissão da política monetária, Mongelli (2002, p. 25)MONGELLI, F. P. ‘New’ views on the optimum currency area theory: What is EMU telling us. European Central Bank Working Paper n. 138, abr. 2002. fornece um exemplo de uma economia mais aberta e diversificada. Ele supõe que uma economia com essas características estaria mais propensa a resistir a choques menores e mais diferenciados (propriedades de grau de abertura da economia e diversificação). À medida que o choque atue, a flexibilidade de preços e salários poderia imediatamente suavizar o ajuste (propriedade de flexibilidade de preços e salários). Se essa flexibilidade não é suficiente e ainda há recursos ociosos após o choque, uma maior mobilidade de fatores de produção também suavizaria o processo de ajuste, mesmo que levasse mais tempo (propriedade de mobilidade dos fatores de produção). Já no caso de um ajuste mais longo, enquanto a economia está caminhando para um novo equilíbrio, uma maior integração do mercado financeiro pode impulsionar o canal de riqueza e suavizar o ajuste mesmo que não integralmente (propriedade de integração do mercado financeiro). Em conjunto a isso as políticas econômicas fiscais do governo central, que também têm um papel importante na resposta a choques, poderiam suavizar o ajuste (propriedade das transferências fiscais), mesmo que apresentem variação entre os países em respeito ao timing, força e execução.

Kouparitsas (2001)KOUPARITSAS, M. A. Is the United States an optimum currency area? An empirical analysis of regional business cycles. Federal Reserve Bank of Chicago Working Paper 2001-2022, 2001. buscou sumarizar as precondições levantadas pelos economistas como relevantes na constituição de uma Área Monetária Ótima. Ao atender esses critérios, a optimalidade da resposta a choques na política monetária estaria garantida, pois as regiões teriam ciclos de negócios semelhantes. Os critérios definidos pelo autor seriam: “a) as regiões deveriam estar expostas a fontes semelhantes de distúrbios econômicos (choques comuns); b) a importância relativa desses choques entre as regiões deveria ser similar (choques simétricos); c) as regiões deveriam ter uma resposta similar aos choques comuns (resposta comum); e d) se as regiões estão submetidas a choques região-específicos (choques idiossincráticos), elas precisam ser capazes de se ajustar rapidamente” (2001, p. 1).

2.2 Literatura empírica nacional

No Brasil, alguns trabalhos empíricos buscaram analisar a questão da assimetria de choques entre os estados brasileiros. Entre os trabalhos mais recentes destacam-se os de Rocha et al. (2011)ROCHA, R. M.; SILVA, M. E. A.; GOMES, S. O. Por que os estados brasileiros têm reações assimétricas a choques na política monetária? Revista Brasileira de Economia, v. 65, n. 4, p. 413-441, 2011., que fazem a seguinte pergunta: “por que os estados brasileiros têm reações assimétricas a choques na política monetária?”. Para tanto, utilizam-se de um modelo de Vetor Auto Regressivo Estrutural (SVAR). A partir das funções impulso-resposta estaduais obtidas, verifica-se que os estados tendem a ter respostas assimétricas a choques de política monetária tanto no curto quanto no longo prazo. Os autores salientam que não foi possível observar um padrão no que se refere aos estados pertencentes à determinada região. Numa segunda etapa do trabalho, os autores buscam identificar, através de variáveis indicativas de cada um dos canais de transmissão, as causas das assimetrias verificadas nas respostas estaduais a choques de política monetárias. Utilizam regressões cross-section para fatores selecionados de três canais de transmissão da política monetária: canal da taxa de juros, o canal do crédito e o canal socioeconômico. O valor absoluto da maior resposta negativa aos choques monetários em cada estado obtida na etapa anterior é utilizado como variável dependente, e variáveis selecionadas com base nos canais de transmissão de política monetária, como variáveis independentes.

Já em Guimarães (2012)GUIMARÃES, R. R. S. Política monetária e produto regional no Brasil (2002-2011). Dissertação (Mestrado em Economia) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, 2012. e Guimarães e Monteiro (2014)GUIMARÃES, R. R. S.; MONTEIRO, S. M. M. Monetary policy and regional output in Brazil. Revista Brasileira de Economia, v. 68, n. 1, p. 73-101, 2014. busca-se verificar se a política monetária brasileira causa efeitos simétricos sobre a atividade econômica das regiões brasileiras. Os autores se utilizam de modelos VAR estrutural com decomposição de Cholesky e de uma análise prévia de Componentes Principais. Analisando o resultado do VAR com variáveis nacionais, os autores concluem que a política monetária brasileira afeta o produto real conforme esperado pela literatura econômica, sendo este passível de ser mensurado pelo componente comum. Além disso, considera-se um indício de assimetria o fato de a política monetária afetar esse componente comum a todas as regiões brasileiras. Já a partir da análise dos resultados auferidos com os modelos VAR regiões-específicos os autores concluem que, quando não consideraram no modelo a decomposição dos produtos regionais, as respostas estaduais apresentaram assimetrias; já no modelo onde se decompuseram os índices de atividade conforme realizado em Kouparitsas (2001)KOUPARITSAS, M. A. Is the United States an optimum currency area? An empirical analysis of regional business cycles. Federal Reserve Bank of Chicago Working Paper 2001-2022, 2001. verifica-se que a resposta do componente região-específico não se mostra significativamente diferente de zero.

Braatz (2013)BRAATZ, J. Impactos regionais assimétricos das políticas monetária e cambial no Brasil: uma abordagem com o método VAR. Dissertação (Mestrado em Economia) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013. busca analisar possíveis assimetrias nas respostas regionais a choques de política monetária e cambial nos estados brasileiros. Destaca-se nesse sentido ser o único trabalho encontrado até então sobre os efeitos assimétricos dos choques cambiais sobre a atividade econômica nos estados brasileiros. Os resultados indicaram que os estados do Norte e Nordeste e Centro-Oeste são mais afetados por choques de política monetária, em contraste com os estados do Sudeste e Sul do país, possivelmente por dificuldades de acesso a outras formas de financiamento, baixo nível de abertura e concentração setorial. Para a política cambial os estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste também são os mais afetados que os das regiões Sul e Sudeste. O autor sugere que isto se deve à pouca abertura comercial e à pouca diversidade nas exportações. Já os estados com estrutura produtiva mais desenvolvida e diversa e com maiores participações no PIB brasileiro possuem menor sensibilidade a mudanças cambiais.

Silva (2014)SILVA, I. E. M. The differential regional effects of monetary and fiscal policies in Brazil. In: 42º ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA ANPEC, 2014. Anais..., por sua vez, busca examinar se as políticas monetária e fiscal têm efeitos simétricos entre as regiões brasileiras. Para isso o autor utiliza-se de um VAR estrutural com uma identificação com abordagem Bayesiana por restrições de sinais. O autor verifica através dos resultados que no caso de choques de política monetária as respostas estaduais não variam muito entre as regiões, com aumento na taxa de juros, queda nos preços e na base monetária, apreciação do câmbio contemporaneamente e redução do crédito. À exceção da região Centro-Oeste, o consumo e a atividade regional tendem a crescer contemporaneamente, decaindo a valores negativos nos meses subsequentes. O autor conclui então que os efeitos dos choques de política monetária sobre os produtos regionais tendem a ser simétricos e mais importantes no curto prazo.

Dessa breve resenha da literatura empírica sobre os efeitos dos choques monetários e cambiais sobre os estados brasileiros, pode-se concluir que a maioria dos trabalhos (Rocha et al., 2011ROCHA, R. M.; SILVA, M. E. A.; GOMES, S. O. Por que os estados brasileiros têm reações assimétricas a choques na política monetária? Revista Brasileira de Economia, v. 65, n. 4, p. 413-441, 2011.; Guimarães, 2011; Guimarães; Monteiro, 2014GUIMARÃES, R. R. S.; MONTEIRO, S. M. M. Monetary policy and regional output in Brazil. Revista Brasileira de Economia, v. 68, n. 1, p. 73-101, 2014.; Braatz, 2013BRAATZ, J. Impactos regionais assimétricos das políticas monetária e cambial no Brasil: uma abordagem com o método VAR. Dissertação (Mestrado em Economia) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.) encontraram respostas assimétricas dos estados a choques da política monetária, sendo que apenas um deles aferiu os efeitos dos choques cambais, cujos efeitos foram assimétricos por região do país, enquanto um trabalho (Silva, 2014SILVA, I. E. M. The differential regional effects of monetary and fiscal policies in Brazil. In: 42º ENCONTRO NACIONAL DE ECONOMIA ANPEC, 2014. Anais...) concluiu que os efeitos de choques de política monetária sobre o produto nos estados tendem a ser simétricos.

3 Metodologia

Conforme visto na seção anterior, a maior parte dos estudos realizados no Brasil que identificam respostas de variáveis macroeconômicas estaduais aos choques de política monetária utiliza a metodologia dos Vetores Autorregressivos (VAR). Antes do desenvolvimento dessa metodologia era comum o emprego de modelos de equações simultâneas. Em seu artigo seminal “Macroeconomics and RealitySims (1980)SIMS, C. A. Macroeconomics and reality. Econometrica, v. 48, n. 1, p. 1-48, 1980. critica as hipóteses de identificação utilizadas nos modelos de equações simultâneas e propõe a utilização de modelos VAR estruturais. Uma das grandes vantagens dos modelos VAR é que não é necessária a distinção prévia de variáveis endógenas e exógenas, admitindo-se simultaneidade entre elas.

A metodologia VAR, no entanto, não é imune a críticas. Segundo Bernanke et al. (2004, p. 2)BERNANKE, B. S.; BOIVIN, J.; ELIASZ, P. Measuring monetary policy: A Factor Augmented Vector Autoregressive (FAVAR) approach. NBER Working Paper n. 10.220, jan. 2004. uma das constantes restrições à metodologia é a pequena quantidade de variáveis utilizadas nos modelos. Busca-se utilizar modelos de baixa dimensão a fim de não se perder graus de liberdade. Por conta disso, “os modelos VAR padrão raramente apresentam mais de seis ou oito variáveis”. Mesmo quando se utilizam de procedimentos bayesianos esses modelos comumente apresentam menos de vinte variáveis.

Stock e Watson (2002, p. 147)STOCK, J. H.; WATSON, M. W. Macroeconomic forecasting using diffusion indexes. Journal of Business & Economic Statistics, v. 20 n. 2, p. 147-162, 2002. ressaltam que, mesmo que se utilizem procedimentos de escolha entre as variáveis para obter modelos parcimoniosos e que se obtenham resultados relativamente satisfatórios ao explicar e prever indicadores econômicos, em última instância, a performance desses indicadores dependerá ainda apenas das poucas variáveis que foram utilizadas. Além disso, algumas análises prescindem da utilização de um amplo conjunto de variáveis.

A utilização de uma quantidade limitada de informações nos modelos teóricos mostra-se ainda mais problemática quando se tem em mente que vivemos na chamada era da informação. O desenvolvimento tecnológico propiciou que os agentes econômicos, tais quais os Bancos Centrais, disponham de uma miríade de informações econômicas em seus mais diversos níveis de agregação e periodicidade de uma forma quase instantânea. Dessa forma, não é sensato crer que essas informações não sejam utilizadas em suas tomadas de decisões. Pressuposto este que faz parte dos modelos econométricos VAR desenvolvidos. Segundo Bernanke e Boivin (2003, p. 526)BERNANKE, B. S.; BOIVIN, J. Monetary policy in a data-rich environment. Journal of Monetary Economics, v. 50, p. 525-546, 2003., por conta disso os modelos acadêmicos acabam por se tornarem menos precisos e informativos do que poderiam ser.

A fim de transpor as dificuldades encontradas em ampliar o número de informações utilizadas nos modelos econométricos VAR, Stock e Watson (2002)STOCK, J. H.; WATSON, M. W. Macroeconomic forecasting using diffusion indexes. Journal of Business & Economic Statistics, v. 20 n. 2, p. 147-162, 2002. desenvolveram um modelo combinando a metodologia VAR e a metodologia de fatores dinâmicos, com o qual possibilitam a inclusão de um vasto número de informações, com o objetivo de minimizar problemas tais quais o price puzzle3 3 Tendo em vista o curto histórico e o atraso verificado na divulgação das estatísticas econômicas regionais oficiais, a estimativa da taxa de variação do nível de atividades estaduais para os períodos em que não havia dados foi feita a partir de diversas séries informativas dispostas num painel não balanceado, utilizando-se o método Nowcast, que explora informações de uma grande quantidade de séries de dados. A ideia é que os sinais sobre a direção da mudança no PIB podem ser extraídos de um conjunto heterogêneo de informação: índice de volume de vendas no varejo, índice de estoque do emprego formal, índice de produção industrial, receita de ICMS de estados e municípios, consumo de energia elétrica (MW/h), IBCR e, para o estado de São Paulo, o PIB calculado pela SEADE. .

Os chamados modelos Vetores Autorregressivos Aumentados por Fatores Dinâmicos (FAVAR), segundo Bernanke e Boivin (2003, p. 527)BERNANKE, B. S.; BOIVIN, J. Monetary policy in a data-rich environment. Journal of Monetary Economics, v. 50, p. 525-546, 2003. possuem algumas vantagens, entre elas, destacam-se:

First, it is flexible, in the sense that it can potentially accommodate data of different vintages, at different frequencies, and of different spans, thus replicating the use of multiple data sources by central banks. Second, their methodology offers a data-analytic framework that is clearly specified and statistically rigorous but remains agnostic about the structure of the economy.

Assim, torna-se possível a inclusão de uma imensa quantidade de dados provenientes de diversas fontes e épocas e com frequências e extensões distintas a fim de obter melhores resultados e ainda permanecer livre de assumir pressupostos sobre a estrutura econômica.

Segundo Bernanke et al. (2004, p. 25)BERNANKE, B. S.; BOIVIN, J.; ELIASZ, P. Measuring monetary policy: A Factor Augmented Vector Autoregressive (FAVAR) approach. NBER Working Paper n. 10.220, jan. 2004., como consequência teríamos que:

[…] it permits us to obtain the responses of a large set of variables to monetary policy innovations, which provides both a more comprehensive picture of the effects of policy innovations as well as a more complete check of the empirical plausibility of the underlying specification.

Dessa forma, os modelos FAVAR possibilitam maiores possibilidades de conferir os efeitos sobre uma gama maior de variáveis, possibilitando melhor compreensão do fenômeno analisado.

Outra crítica comum à metodologia VAR diz respeito à utilização da identificação através da decomposição de Cholesky. Cooley e Leroy (1985, p. 306)COOLEY, T. F.; LEROY, S. F. Atheoretical macroeconometrics: a critique. Journal of Monetary Economics, v. 16, p. 283-308, 1985. destacam que a definição da ordem das variáveis pode ser interpretada como arbitrária e, assim sendo, necessitam de uma justificação teórica. Para contornar esse problema surge a imposição de restrições de sinais sobre as funções impulso-resposta, o que elimina a necessidade de ordenar as variáveis por seu grau de endogeneidade.

3.1 Modelo

Neste artigo é adotada a metodologia desenvolvida por Lima et al. (2018)LIMA, E. C. R.; MARTINEZ, T. S.; CERQUEIRA, V. S. Monetary policy and exchange rate: Effects on disaggregated prices in a Favar model for Brazil. Brazilian Review of Econometrics, v. 38, n 1, p. 129-174, 2018. para estimar modelos de Vetores Autorregressivos Aumentados por Fatores Dinâmicos (FAVAR). Essa metodologia incorpora o amostrador de Gibbs, proposto por Waggoner e Zha (2003)WAGGONER, D.; ZHA, T. A Gibbs simulator for restricted VAR models. Journal of Economic Dynamics and Control, v. 26, p. 349-366, 2003. para indentificar Vetores Autorregressivos Estruturais (SVAR) - através de restrições de sinais nas funções impulso-resposta -, ao amostrador de Gibbs, desenvolvido por Bernanke e Boivin (2003)BERNANKE, B. S.; BOIVIN, J. Monetary policy in a data-rich environment. Journal of Monetary Economics, v. 50, p. 525-546, 2003. para estimar modelos FAVAR. O modelo FAVAR foi adotado neste trabalho por entendermos que a abordagem bayesiana lida melhor com amostras pequenas, sendo, nesse sentido, a melhor metodologia existente para esse propósito, além de ter a vantagem de usar restrições de sinais que melhoram os resultados obtidos nas funções impulso-resposta.

O modelo FAVAR em espaço-de-estados e nas formas reduzida e estrutural é descrito, de forma sumária, pelas seguintes equações:

Equação da Medida:

(1) Z t = Λ G t + ε t e t ~ N 0 , R R diagonal ; ε t = e t , 0 , P = cov ε t .

Equação de Transição (VAR Forma Reduzida)

(2) G t = Φ L G t 1 + DJ + v t v t ~ N 0 , τ , e t independente de v t ;

ѵt ~ N(0,τ), et independente de ѵt;

Equação de Transição (VAR Estrutural)

(3) HG t = H Φ L G t 1 + HDJ + Hv t ; v t ~ N 0 , τ , e t independente de v t ;

ѵt ~ N(0,τ), et independente de ѵt;

H = triangular inferior com números positivos na diagonal principal; pondo-se ut = t então cov(ut) = I.

Onde: Λ=fy0I;Zt=Xt,Yt;Gt=Ft,Yt;Yt é um vetor com um número pequeno M de variáveis macroeconômicas integráveis de ordem 1 e que cointegram; Ft é um vetor com um número pequeno de K fatores dinâmicos não observados extraídos das séries de preços desagregados; Xt é um vetor com as variáveis macroeconômicas em nível estadual; é um polinômio do operador de defasagens L de ordem finita p; e são matrizes de cargas fatoriais que contêm restrições priori para que seus parâmetros sejam identificáveis; D é uma matriz (M+K) x h de parâmetros de variáveis exógenas; J é um vetor h x 1 de variáveis exógenas; a matriz H é triangular inferior com números positivos na diagonal principal e é normalizada de tal forma que pondo-se ut = t, então, cov(ut) = I. O FAVAR na forma reduzida é composto pelas equações 1 e 2. Já na forma estrutural ele é composto pelas equações 1 e 3.

Seja HΦ(L) = C1L +…+ CpLp, ψ = [C1CpD] e Wt = [Gt–1 Gt–2 .... Gt–pJ]’, então, a equação (3) pode ser sumariada da seguinte forma:

(4) G t ' H ' = W t ' ψ ' + u t '

Seja T = (X1, X2, ..., XT) a história de X entre o período 1 e o período T. Então pode-se definir T = (F1, F2, ..., FT). A seguir vamos explicitar a metodologia utilizada na estimação das equações do FAVAR.

Seja θ = (HF (L),D,Lf,Ly,R,τ). O procedimento do amostrador de Gibbs adotado consiste nos seguintes passos:

  • Passo 01: Escolha um conjunto de valores iniciais para os parâmetros θ = (HF (L),D,Lf,Ly,R,τ), denominado θ(0);

  • Passo 02: Condicionado no θ(0) e nos dados T = (TT), extraia um conjunto de valores para T(1) = (T(1), ỸT) da densidade posteriori condicional p(T | T, θ(0));

  • Passo 03: Condicionado nos valores da amostra e na simulação “s” para T, T(s), extraia um valor para o parâmetro θ, digamos θ(s+1), a partir da distribuição posteriori condicional p(θ | T, T, s) e obtenha uma extração da função impulso-resposta que satisfazem às restrições de sinais impostas pela teoria econômica.

O passo 03 é composto por dois subpassos: a) extração de Λ(s+1) e P(s+1) da posteriori conjunta p((Λ̃, P) | Z̃t, F̃Ts); b) extração de ψ(s+1) e de H(s+1) e da função impulso-resposta que satisfaz à restrição de sinal da posteriori conjunta p((ψ, H) | Z̃t, F̃T(s)). Na extração de ψ(s) e de H(s) utilizamos um procedimento totalmente diferente do proposto por Bernanke e Boivin (2003)BERNANKE, B. S.; BOIVIN, J. Monetary policy in a data-rich environment. Journal of Monetary Economics, v. 50, p. 525-546, 2003. ou por Mountford e Uhlig (2009). Adotamos, como em Lima et al. (2018)LIMA, E. C. R.; MARTINEZ, T. S.; CERQUEIRA, V. S. Monetary policy and exchange rate: Effects on disaggregated prices in a Favar model for Brazil. Brazilian Review of Econometrics, v. 38, n 1, p. 129-174, 2018., o amostrador de Gibbs proposto por Waggoner e Zha (2003)WAGGONER, D.; ZHA, T. A Gibbs simulator for restricted VAR models. Journal of Economic Dynamics and Control, v. 26, p. 349-366, 2003. para obter as funções impulso-resposta do VAR estrutural que satisfazem às restrições de sinais.

Os dois últimos passos (passos 02 e 03) constituem uma iteração, e são repetidos até que as distribuições empíricas de T(s) e θ(s) convirjam para as teóricas. Onde “s” é o índice da iteração. Geman e Geman (1984, p. 731)GEMAN, S.; GEMAN, D. Stochastic relaxation, Gibbs distributions and the Bayesian restoration of images. IEEE Transactions on Pattern Analysis and Machine Intelligence, v. 6, p. 721-741, 1984. demonstram que à medida que o número de iterações “s” converge para o infinito (s → ∞) as distribuições marginal e conjunta dos valores amostrados de T(s) e θ(s) convergem para as verdadeiras distribuições a uma taxa exponencial.

Os passos (01), (02) e o primeiro subpasso do passo (03) estão detalhadamente descritos em Almeida, Alves e Lima (2012)ALMEIDA, G.; ALVES, P.; LIMA, E. Impactos dos choques na política monetária e no câmbio no Brasil: um modelo de autorregressão vetorial estrutural aumentada por fatores dinâmicos. Texto para discussão, n. 1.711, IPEA, 2012., pp. 13-14. No segundo subpasso do passo (03) foi utilizado o algoritmo proposto por Waggoner e Zha (2003)WAGGONER, D.; ZHA, T. A Gibbs simulator for restricted VAR models. Journal of Economic Dynamics and Control, v. 26, p. 349-366, 2003., conforme descrito em Lima et al. (2018)LIMA, E. C. R.; MARTINEZ, T. S.; CERQUEIRA, V. S. Monetary policy and exchange rate: Effects on disaggregated prices in a Favar model for Brazil. Brazilian Review of Econometrics, v. 38, n 1, p. 129-174, 2018.. O amostrador de Gibbs, desenvolvido por eles, permite obter extrações ψ(s) e H(s) da distribuição posteriori conjunta p((ψ, H) | Z̃t, F̃T(s)), que satisfazem às restrições de sinais impostas às funções impulso-resposta. Waggoner e Zha utilizam a versão da priori de Litterman para VAR estrutural sugerida por Sims e Zha (1998, p. 955). Os hiperparâmetros utilizados na determinação da variância das prioris para os coeficientes, no presente estudo foram: λ1 que controla o aperto geral e também da matriz de relações contemporâneas; λ2, que controla o aperto relativo dos coeficientes defasados; λ3, que controla o aperto da variância com o aumento do lag; e λ4, que controla o aperto relativo do termo constante. Os valores para cada um dos hiperparâmetros são dados na Tabela 1.

Tabela 1
Valores dos hiperparâmetros utilizados na extração de ψ e de H

3.2 Identificação dos choques

Para a identificação dos choques foram utilizadas restrições de sinais extraídas do modelo Mundell-Flemming estocástico dinâmico. Lima et al. (2009)LIMA, E. C. R.; MAKA, A.; ALVES, P. Monetary policy and exchange rate shocks in Brazil: Sign restrictions versus a new hybrid identification approach. In: 31º ENCONTRO BRASILEIRO DE ECONOMETRIA, 2009. Anais… descrevem um modelo com expectativas racionais, estocástico de uma economia aberta e com preços rígidos, utilizado para justificar as restrições de sinal empregadas para identificar o modelo SVAR. Dispõem-se na Tabela 2 as restrições impostas nas funções impulso-resposta para a identificação dos choques de política monetária com base nesse modelo:

Tabela 2
Restrições de sinais utilizadas para identificação dos choques na política monetária

De acordo com as restrições sumariadas na Tabela 2 após um choque de política monetária “contracionista”, a taxa de juros não cai, e o nível de preços, a produção, o estoque de M1 não aumentam (considerando uma janela de 4 passos à frente) e a taxa de câmbio não cai (considerando uma janela de 1 passo à frente).

Já com relação ao choque no câmbio, analisando as restrições sumariadas na Tabela 3, temos que, após choque na taxa de câmbio, os valores da taxa de juros, do nível de preços, da produção e do estoque de M1 não caem e ocorre uma apreciação da taxa de câmbio real (a moeda doméstica deprecia) numa janela de 4 passos à frente do choque.

Tabela 3
Restrições de sinais utilizadas para identificação dos choques no câmbio

Além disso, foram testadas restrições nas funções impulso-resposta dos estados a fim de identificar os choques em nível estadual. Após a utilização de diferentes restrições em diferentes períodos considerou-se como o modelo mais adequado aquele com restrições na função impulso-resposta da variável IPCA do estado de Minas Gerais na janela 1 a 4. Essa restrição mostrou-se efetiva na identificação dos choques de política monetária e cambial nos IPCAs estaduais e isso é razoável ao considerarmos que o estado de Minas apresenta uma estrutura econômica similar à brasileira, com regiões diversificadas, além de representar parte considerável do produto nacional.

Tabela 4
Restrições de sinais utilizadas no modelo para identificação dos choques estaduais

4 DADOS

Conforme detalhado na Tabela 5, os dados utilizados a fim de compor o vetor Yt de variáveis observadas foram: o índice PIB real brasileiro trimestral divulgado pelo IBGE; o índice da série histórica do IPCA brasileiro nos últimos meses de cada trimestre, também disponível no IBGE; a taxa de câmbio R$/US$ (comercial/compra) média em reais, divulgada pelo Banco Central do Brasil e colhida no Ipeadata; a taxa de juros SELIC, disponibilizada pelo BCB, acumulada no trimestre e anualizada na base 252; os meios de pagamento M1 no final do trimestre, disponibilizados pelo Banco Central; e a taxa referencial de swaps DI média, prefixada no trimestre, disponibilizada pela BM&F Bovespa (prazo de 180 dias - % anual). O período abrangido foi do 4º trimestre de 1999 ao 2º trimestre de 2016. As variáveis são I(1) e cointegram de acordo com o teste de Johansen.

Tabela 5
Variáveis, transformações, teste Phillips-Perron, período utilizado e fonte (Xt)

Já o vetor de variáveis observadas Xt é composto pelas variações trimestrais do IPCA das capitais (regiões metropolitanas, quando aplicável) dos estados analisados, como proxy do índice de preços estadual e pela taxa de variação trimestral do IBCR, ampliada pela estimativa realizada pelo Nowcast. Assim, foi utilizada a taxa de variação trimestral do IBCR para a o período em que este encontra-se disponível, e no período onde não há dados foi utilizada a estimativa realizada via Nowcast.3 3 Tendo em vista o curto histórico e o atraso verificado na divulgação das estatísticas econômicas regionais oficiais, a estimativa da taxa de variação do nível de atividades estaduais para os períodos em que não havia dados foi feita a partir de diversas séries informativas dispostas num painel não balanceado, utilizando-se o método Nowcast, que explora informações de uma grande quantidade de séries de dados. A ideia é que os sinais sobre a direção da mudança no PIB podem ser extraídos de um conjunto heterogêneo de informação: índice de volume de vendas no varejo, índice de estoque do emprego formal, índice de produção industrial, receita de ICMS de estados e municípios, consumo de energia elétrica (MW/h), IBCR e, para o estado de São Paulo, o PIB calculado pela SEADE.

Tendo em vista a dificuldade em se obter dados confiáveis e de periodicidade trimestral em nível estadual foi necessário restringir o número de estados incluídos na análise para dez, a saber: São Paulo, Paraná, Pará, Goiás, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Minas Gerais, Bahia e Ceará. O corte dos estados se deu pela disponibilidade de dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) das capitais e regiões metropolitanas e de dados do Índice de Atividade Econômica Regional (IBCR).

Como teste de raiz unitária foi utilizado o teste Phillips-Perron considerando α = 1%, reportado na Tabela 6.

Tabela 6
Variáveis, transformações, teste Phillips-Perron, período utilizado e fonte (Yt)

Cabe também destacar que o teste de Johansen indicou a presença de ao menos duas relações de cointegração nas variáveis de Yt. Além disso, foi realizado um teste a fim de avaliar o número de lags a serem utilizados na equação (4), para isso foram também incluídos os fatores estimados (). Os resultados do teste encontram-se na Tabela 7.

Tabela 7
Resultado do teste de seleção de defasagem do VAR

Optou-se pela utilização de dois lags tomando uma perspectiva de estimação bayesiana.

5 RESULTADOS

As respostas das variáveis nacionais aos choques de política monetária e cambial, estimadas com as restrições de sinais apresentadas, encontram-se na Figura 1. Nos gráficos são apresentadas as medianas das respostas, bem como as bandas de probabilidade de 68% num horizonte de 12 trimestres após os choques, obtidos a partir do software Matlab versão R2010a.

Figura 1
Resposta das variáveis de Yt aos choques

Observam-se nos gráficos da Figura 1 as restrições impostas sobre as funções impulso-resposta nacionais e a conformidade da variável swap (irrestrita), identificando os choques de política monetária e no câmbio corretamente. O foco deste trabalho, no entanto, se dá na identificação das respostas das taxas de variação trimestrais nos níveis de atividade econômica e de preços em âmbito estadual aos choques na política monetária e no câmbio.

A fim de se obter a melhor forma de identificação desses choques foram testados modelos com diferentes restrições nas funções impulso-resposta estaduais. Inicialmente foram estimados três modelos, um sem restrições nas respostas das variáveis estaduais e dois modelos com restrições em uma janela de 4: um para as variações dos preços do estado de São Paulo e outro para as variações dos preços de Minas Gerais.4 4 Para maiores detalhes sobre a metodologia adotada, ver seção 3.2. A escolha dos estados de São Paulo e Minas Gerais para a inclusão das restrições deve-se ao peso do primeiro no PIB brasileiro e às semelhanças do segundo em termos das diferenças socioeconômicas entre as regiões do estado com o país. Ao se analisarem os resultados pode-se perceber que: a) as respostas dos níveis de atividade estaduais se mostravam não significativas em todos os modelos; b) a restrição imposta sobre as variações nos preços de Minas Gerais mostrou-se mais efetiva na identificação dos choques nos níveis de preços, obtendo respostas com os sinais esperados e menores bandas de erros.

Buscando identificar melhor os choques de política monetária e no câmbio sobre os níveis de atividade dos estados foram rodados: a) modelos com restrições de janela 4 apenas na variação dos níveis de atividade, e; b) modelos com restrições nas respostas nas variações dos níveis de atividade e dos preços nos estados de Minas Gerais e São Paulo para diversas janelas5 5 Por “janela” entende-se o número de períodos (neste caso, trimestres) sobre os quais as restrições serão impostas. Uma janela 4 significa que a restrição será válida do primeiro ao quarto trimestre. . Verificou-se então que, ao se tentar impor as mais diversas restrições nas respostas dos níveis de atividade estaduais aos choques analisados as respostas auferidas para os níveis de atividade não se tornaram mais significativas, implicando aumento das bandas da função impulso-resposta. Além disso, essas restrições fizeram com que a identificação dos choques nas respostas dos níveis de preços estaduais ficasse substancialmente comprometida.

Tendo em conta as ilações realizadas acerca dos resultados obtidos com os modelos descritos, considerou-se que a restrição de janela 4 apenas nas variações dos níveis de preços do estado de Minas Gerais mostrou-se mais eficaz, posto que melhorou a identificação das respostas dos preços estaduais aos choques analisados. As inclusões das outras restrições descritas não foram bem-sucedidas em identificar choques nos níveis de atividades e prejudicaram a identificação das respostas nos preços.

Os gráficos dispostos na Figura 2 apresentam as funções impulso-resposta dos níveis de preços estaduais aos choques de política monetária do modelo escolhido. Salienta-se que as funções impulso-resposta estaduais são apresentadas com as medianas das respostas, bem como as bandas de probabilidade de 68% num horizonte de 12 trimestres após os choques.

Figura 2
Resposta dos níveis de preços estaduais aos choques de política monetária

Da análise dos gráficos, sob uma perspectiva Bayesiana, verifica-se que a restrição imposta no estado de Minas Gerais fez com que os estados de São Paulo, Paraná, Ceará e Goiás apresentassem respostas significativas ao choque na política monetária. Nota-se, ainda, a defasagem semelhante na resposta desses estados.

Da análise dos gráficos, sob uma perspectiva Bayesiana, verifica-se que a restrição imposta no estado de Minas Gerais fez com que as respostas se tornassem mais significativas ao choque na política monetária. Nota-se ainda grande simetria nas respostas ao choque no que concerne à direção e intensidade.

Os gráficos da Figura 3 exibem as funções impulso-respostas dos níveis de preços estaduais aos choques no câmbio. Assim, tal como nas respostas aos choques de política monetária, verificou-se notável simetria ao se analisarem o sentido e a intensidade da resposta aos choques no câmbio e, nesse caso, todos os estados apresentaram respostas significativas.

Figura 3
Resposta dos níveis de preços estaduais aos choques no câmbio

Recordando o terceiro critério considerado relevante por Kouparitsas (2001)KOUPARITSAS, M. A. Is the United States an optimum currency area? An empirical analysis of regional business cycles. Federal Reserve Bank of Chicago Working Paper 2001-2022, 2001. na identificação de uma AMO, segundo o qual as regiões devem apresentar respostas comuns aos choques, a análise das funções impulso-respostas das variações dos níveis de preços estaduais aos choques de política monetária e no câmbio - conforme mostra os gráficos da Figura 3 - indica que os estados analisados atendem a esse critério pelo menos nessas respostas.

Ao analisarmos as respostas dos níveis de atividade estaduais aos choques de política monetária e no câmbio, no entanto, não foram encontradas respostas significativas. Conforme discutido anteriormente, buscou-se contornar o problema ao inserir restrições nas funções impulso-resposta para o nível de atividade de São Paulo e Minas Gerais. Tomou-se como pressuposto o fato de que que as características do estado de Minas Gerais - por sua diversidade produtiva e de renda - se assemelham, guardadas as devidas proporções, à diversidade encontrada no âmbito nacional, e que tanto São Paulo quando Minas representam parcela significativa do produto nacional. No entanto, ao serem introduzidas essas restrições as respostas nos níveis de preços se tornaram não significativas para todos os estados analisados.

Foi realizada a comparação entre os modelos rodados com dados obtidos para o nível de atividade estadual via Nowcast com aqueles rodados apenas com os dados do IBCR. O resultado obtido mostra que os modelos rodados com os dados estimados via Nowcast obtiveram resultados mais significativos no que tange à identificação dos choques estruturais no âmbito estadual. Além disso, verificou-se alta taxa de correlação entre as taxas de variação dos níveis de atividades econômica estaduais obtidas via Nowcast com a taxa de variação do PIB brasileiro.6 6 Utilizou-se o software E-views 8.1 para se estimar um VAR com identificação de Cholesky tendo como variáveis os níveis de atividades utilizados no modelo FAVAR. As funções impulso-resposta de todos os estados foram positiva e significativa, demonstrando variações similares àquelas verificadas no PIB brasileiro. Dessa forma, a estimativa do Nowcast foi considerada essencial para melhorar os resultados do modelo.

Fundamentando-se nos resultados do modelo e nas análises supracitadas, concluiu-se que apesar de as variações nos níveis de atividades estaduais estarem fortemente correlacionadas com as variações no PIB nacional, ao se analisarem as respostas dessas variáveis estaduais aos choques considerados elas não são significativas. Dessa maneira, não se pode dizer que há previsibilidade quanto às respostas no nível de atividade estaduais aos choques na política monetária e no câmbio.

Se por um lado as respostas dos níveis de preços estaduais indicam que as São Paulo, Paraná, Ceará e Goiás respondem aos choques na política monetária de maneira similar e significativa (Figura 2), de outro, as respostas ao choque no câmbio atingem a todos os estados analisados de maneira similar (Figura 3); assim, as respostas dos níveis de atividade sugerem que não há previsibilidade na resposta dos níveis de atividade estaduais aos choques considerados.

O modelo permite ainda identificar as respostas dos níveis de atividade estaduais aos choques específicos e ao comum. Entende-se por choque específico ou idiossincrático aquele que, inicialmente, afeta adversamente apenas um estado. O choque comum, por sua vez, diz respeito aos choques que afetam a economia do país como um todo. Isso nos permite aferir se os estados estão expostos a fontes de distúrbios comuns, se esses choques são simétricos e se o ajustamento das regiões aos choques idiossincráticos é rápido, respectivamente, o primeiro, segundo e quarto critérios apontados por Kouparitsas (2001)KOUPARITSAS, M. A. Is the United States an optimum currency area? An empirical analysis of regional business cycles. Federal Reserve Bank of Chicago Working Paper 2001-2022, 2001..

Nos gráficos dispostos na Figura 4 apresentam-se as respostas nas variações da atividade estadual aos choques específico e comum.

Figura 4
Resposta dos níveis de atividade estaduais a choques específico e comum

Atentando-nos para a coluna que apresenta as respostas a um choque região-específico (Figura 4), verificamos que o ajustamento dos estados analisados a esse tipo de choque possui durações relativamente semelhantes, com convergência em torno de dois ou três trimestres após o choque. Interessante notar que, entre os estados da amostra, apenas Goiás e Paraná parecem se ajustar de maneira relativamente mais vagarosa ao choque idiossincrático, sugerindo que essas regiões sejam mais afetadas quando atingidas por choques específicos.

Para avaliarmos a importância relativa do choque específico e do choque comum adotamos um indicador cuja construção vamos explicitar a seguir. Seja: EEi = a mediana da banda de probabilidade do choque inicial (zero passo à frente) obtida da função impulso-resposta do choque específico do estado “i”; e CCi = a mediana da banda de probabilidade do choque inicial (zero passo à frente) obtida da função impulso-resposta do choque comum do estado “i”. Então o indicador para a importância do choque específico para o estado “i” em relação ao choque comum é dada por [(EEi/CCi)-1]*100. Utilizando esse indicador alguns estados se mostraram mais integrados (percentual menor de importância do choque específico em relação ao choque comum), entre esses destacamos: São Paulo, Ceará e Rio de Janeiro. Os estados que se mostraram menos integrados (percentual maior de importância do choque específico em relação ao choque comum) foram Minas Gerais, Paraná e Goiás. Esses resultados sugerem a existência de um padrão no qual os estados com maior participação no PIB brasileiro são mais integrados; a exceção a essa regra é o Ceará, um estado relativamente menos importante quanto ao nível de produção econômica, mas que apresenta um choque comum relativamente importante quando comparado ao choque específico (109% do choque específico). Em geral, os estados com menor participação no PIB brasileiro parecem ser menos integrados. Minas Gerais, entretanto, apresenta um choque comum relativamente pequeno quando comparado ao choque específico (70% do choque específico).

A magnitude da resposta dos estados ao choque comum é menor do que a resposta dos estados ao choque específico em oito dos dez estados analisados, o que parece endossar a existência de assimetria nos movimentos do produto na região. Quando avaliamos a importância relativa dos choques específico e comum podemos identificar quais estados estão mais ou menos integrados entre si. A fim de analisar melhor esse grau de integração, apresenta-se na Tabela 8 a importância relativa dos choques comuns em relação aos choques específicos no passo 0 (trimestre do choque) bem como a participação dos estados analisados no PIB brasileiro do ano de 2013.

Tabela 8
Importância do choque comum em relação aos choques específicos nos níveis de atividades estaduais e participação no Produto Interno Bruto (IBGE 2013)

Os estados foram listados na Tabela 8 a partir daqueles onde as respostas ao choque comum têm maior importância em relação aos choques específicos para aqueles cuja importância é menor. Cabe lembrar que um elemento central para a análise de assimetria de choques entre os estados brasileiros é em que medida a resposta ao choque específico é menor (ou maior) que a resposta ao choque comum entre os estados brasileiros. Resultado que parece estar em linha com a maior parte da ainda escassa literatura empírica nacional sobre efeitos dos choques monetários e da taxa de câmbio sobre os estados, como sumariado na seção 2.2. Quanto maior a importância relativa da resposta ao choque comum mais integrado é o estado e maior a semelhança no movimento do produto.

Apenas em São Paulo e Ceará os choques comuns se mostram maiores quando comparados aos choques idiossincráticos. No outro extremo, Goiás e Paraná apresentam os menores valores, indicando menor integração. Esse resultado vai ao encontro daquele obtido ao se analisar a demora no ajustamento a choques específicos, nos quais os mesmos estados apresentaram ajustamento mais demorado aos choques idiossincráticos. Ao analisar os dados de participação no PIB nacional, alguns resultados obtidos na análise da importância relativa dos choques comuns se destacam. Podemos notar que estados que têm grande participação no PIB nacional tendem a apresentar respostas importantes ao choque comum. No entanto, alguns estados parecem fugir à regra. Este seria o caso dos estados do Ceará e Pará, que apresentaram importantes respostas ao choque comum, apesar da menor participação no produto nacional.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo foi analisado se os estados brasileiros constituem uma Área Monetária Ótima (AMO) apenas no critério relativo à capacidade de ajustamento da economia face às suscetibilidades e assimetrias das respostas aos choques comuns e específicos. Para tanto, examinou-se a existência de possíveis assimetrias nas respostas estaduais aos choques na política monetária e no câmbio, além de comparar a resposta dos estados aos choques comum e idiossincrático.

Observou-se que a restrição imposta na resposta da taxa de variação do nível de preços do estado de Minas Gerais aos choques analisados melhorou significativamente a identificação dos choques nos demais estados analisados. Quanto às respostas dos preços a choques na política monetária e no câmbio, observou-se considerável concordância no sentido e intensidade entre as respostas estaduais, indicando respostas simétricas nos preços em relação aos dois choques analisados.

Já ao se considerar a resposta na variação dos níveis de atividade econômica estaduais os resultados mostraram-se não significativos. Testes realizados mostraram que, apesar de as variações nos níveis de atividade econômica estaduais estarem bastante correlacionadas com as variações do PIB brasileiro, ao se considerar a resposta destes aos choques de política monetária e no câmbio, esta mesma relação não se mantém. Isto sugere que não há previsibilidade nessas respostas.

Por fim, ao se analisarem as respostas da atividade econômica estadual a choques específicos e comuns, observou-se que a maioria dos estados apresenta importância relativa do choque comum menor em relação ao específico. Com exceção de São Paulo e Ceará, todos os demais estados em análise mostraram impacto maior de choques idiossincráticos vis-à-vis os choques comuns. Além disso, Paraná e Goiás, além de serem os dois estados onde as respostas aos choques específicos têm maior importância, seus choques apresentam ainda maior persistência. Esses resultados indicam que os estados são pouco integrados e têm maior dificuldade em se recuperar de choques assimétricos.

Assim, podemos concluir que os resultados auferidos nas respostas dos níveis de preços estaduais aos choques analisados apontam a presença de evidente simetria. Apesar disso, as respostas na taxa de variação nos níveis de atividade econômica se mostraram não significativas. A velocidade de ajuste a choques idiossincráticos mostrou-se em média de três trimestres, com os estados de Paraná e Goiás apresentando ajustamento mais longo, além de apresentarem as menores respostas ao choque comum em relação aos idiossincráticos. Ademais, em consonância com estudos anteriores observou-se que estados que possuem grande participação no PIB nacional tendem a apresentar respostas importantes ao choque comum, à exceção do Ceará.

Nesse sentido, dada a heterogeneidade da estrutura produtiva e social regional no Brasil, que se traduz em assimetrias nas respostas a choques comuns, além da menor importância relativa dos choques comuns em relação a choques específicos, não se pode afirmar que a economia brasileira se constitui em uma área monetária ótima, em que pese o fato de as respostas dos níveis de preços estaduais aos choques analisados apontarem a presença de simetria.

Como sugestão para trabalhos futuros destaca-se a possibilidade de inclusão de outras variáveis no modelo no sentido de buscar identificar os fatores determinantes das assimetrias encontradas e analisar fatores específicos da teoria da AMO, a despeito da dificuldade de se encontrar dados em nível estadual com periodicidade trimestral. Pode-se, também, buscar segmentar a amostra a fim de analisar comparativamente as assimetrias em diferentes períodos amostrais.

  • 1
    Do termo em língua inglesa Factor-Augmented Vector Autoregressive.
  • 2
    Palma (2007) estimou um modelo SVAR identificado através da combinação de restrições de sinais e de curto prazo para verificar empiricamente a resposta da política monetária (taxa de juros) a choques na taxa de câmbio no Brasil durante o regime de metas de inflação.
  • 3
    Tendo em vista o curto histórico e o atraso verificado na divulgação das estatísticas econômicas regionais oficiais, a estimativa da taxa de variação do nível de atividades estaduais para os períodos em que não havia dados foi feita a partir de diversas séries informativas dispostas num painel não balanceado, utilizando-se o método Nowcast, que explora informações de uma grande quantidade de séries de dados. A ideia é que os sinais sobre a direção da mudança no PIB podem ser extraídos de um conjunto heterogêneo de informação: índice de volume de vendas no varejo, índice de estoque do emprego formal, índice de produção industrial, receita de ICMS de estados e municípios, consumo de energia elétrica (MW/h), IBCR e, para o estado de São Paulo, o PIB calculado pela SEADE.
  • 4
    Para maiores detalhes sobre a metodologia adotada, ver seção 3.2. A escolha dos estados de São Paulo e Minas Gerais para a inclusão das restrições deve-se ao peso do primeiro no PIB brasileiro e às semelhanças do segundo em termos das diferenças socioeconômicas entre as regiões do estado com o país.
  • 5
    Por “janela” entende-se o número de períodos (neste caso, trimestres) sobre os quais as restrições serão impostas. Uma janela 4 significa que a restrição será válida do primeiro ao quarto trimestre.
  • 6
    Utilizou-se o software E-views 8.1 para se estimar um VAR com identificação de Cholesky tendo como variáveis os níveis de atividades utilizados no modelo FAVAR. As funções impulso-resposta de todos os estados foram positiva e significativa, demonstrando variações similares àquelas verificadas no PIB brasileiro.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    30 Jan 2018
  • Aceito
    20 Fev 2019
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