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A expansão cafeeira e o financiamento hipotecário: Sudoeste de Minas Gerais e Nordeste Paulista na Primeira República

Coffee expansion and mortgage financing: Southwestern Minas Gerais and Northeastern São Paulo in the First Republic

Resumo

O objetivo deste artigo é compreender, comparativamente, o crédito hipotecário, condicionado pela produção, produtividade e estrutura agrária entre 1890 e 1929 de duas regiões cafeeiras, fronteiriças e dinâmicas: Sudoeste de Minas Gerais e Nordeste Paulista. A partir de dados das hipotecas e do censo de 1920, verificamos empréstimos financeiros em valores expressivos para ambas as regiões. O crescimento econômico do Sudoeste de Minas Gerais relativamente ao Nordeste Paulista ocorreu com a menor necessidade ou possibilidade de financiamento. Ao testarmos a diferença entre as duas regiões com relação às variáveis valor real, prazos e juros das hipotecas, constatamos para as duas primeiras que o crédito se diferenciava. A arbitragem dos dois mercados hipotecários não permitiu a existência de diferenças entre as regiões para a variável taxas de juros, revelando a integração financeira regional. Assim, demonstramos as diferenças entre os dois espaços, salientando a necessidade de considerar a questão regional nos estudos acerca do crédito.

Palavras-chave:
café; cafeicultura; crédito hipotecário; região

Abstract

The objective is to understand, comparatively, the mortgage credit, conditioned by the production, productivity and agrarian structure between 1890 and 1929 of two coffee regions, border and dynamic: Southwest of Minas Gerais and Northeast Paulista. Based on data from mortgages and the 1920 census, we verified financial loans in expressive amounts for both regions. The economic growth of the Southwest of Minas Gerais relative to the Northeast of São Paulo occurred with the least need or possibility of financing. When testing the difference between the two regions with respect to the variables real value, terms and interest on mortgages, we found for the first two that credit was different. The arbitrage of the two mortgage markets did not allow for differences between regions for the variable interest rates, revealing regional financial integration. Thus, we demonstrate the differences between the two spaces, highlighting the need to understand the regional issue in studies about credit.

Keywords:
coffee; coffee farming; mortgage credit; region

1 Introdução

A economia do Brasil ao final do século XIX dependia em grande medida da produção de café. Os primeiros estudos demonstraram por meio de grandes sínteses a expansão do café ao longo do território, mobilizando terras e mão de obra de forma extensiva em diferentes regiões (Milliet, 1939MILLIET, S. Roteiro do café e outros ensaios: contribuição para o estudo da história econômica e social do Brasil. São Paulo: Departamento de Cultura, 1939.; Simonsen, 1942SIMONSEN, R. C. Aspectos da história econômica do café. Separata dos Anais do Terceiro Congresso de História Nacional. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1942. p. 213-304. v. IV.; Camargo, 1952CAMARGO, J. F. Crescimento da população no Estado de São Paulo e seus aspectos econômicos: ensaio sobre relações entre a demografia e a economia. São Paulo: FFLCH/USP, 1952. 3v.; Monbeig, 1984MONBEIG, P. Pioneiros e fazendeiros de São Paulo. São Paulo: Editora HUCITEC/POLIS, 1984.). O roteiro do café demonstrou a grande mobilidade dessa cultura e dos recursos empregados, como mão de obra e capitais pelo território brasileiro, especialmente do Sudeste (Stein, 1961STEIN, S. J. Grandeza e decadência do café no vale do Paraíba, com referência especial ao município de Vassouras. São Paulo: Brasiliense, 1961.; Dean, 1977DEAN, W. Rio Claro: um sistema brasileiro de grande lavoura. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.; Holloway, 1984HOLLOWAY, T. H. Imigrantes para o café. Café e sociedade em São Paulo, 1886-1934. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.). Recentemente, novas pesquisas apoiadas em documentação inédita possibilitaram análises específicas de áreas cafeicultoras, confrontando dados e produzindo estudos de âmbito regional, sem prejuízo das interações macroeconômicas. Novas abordagens compreenderam questões populacionais, técnicas, estrutura agrária e, mais recentemente, os modos de financiamento da agricultura (Luna; Klein, 2006LUNA, F. V.; KLEIN, H. S. Evolução da sociedade e economia escravista de São Paulo de 1750 a 1850. São Paulo: EDUSP, 2006.; Faleiros, 2010FALEIROS, R. N. Fronteiras do café: fazendeiros e “colonos” no interior paulista (1917-1937). Bauru: Edusc, 2010.).

A maior parte da historiografia ainda salienta a escassez ou o pequeno emprego do crédito no financiamento da produção de café. Os poucos trabalhos sobre o crédito para o café apontam grandes divergências com relação à origem dos capitais, compreendendo, de um lado, fazendeiros, capitalistas e comerciantes locais e, de outro lado, as casas comissárias, exportadoras e bancárias sediadas em grandes centros urbanos e até mesmo no exterior (Saes, 1986SAES, F. A. M. de. Crédito e bancos no desenvolvimento da economia paulista (1850-1930). São Paulo: IPE/USP, 1986.; Hanley, 2005HANLEY, A. G. Native capital: financial institutions and economic development in São Paulo, Brazil, 1850-1920. Stanford: Stanford University Press, 2005.; Teodoro, 2006TEODORO, R. da S. O crédito no mundo dos senhores do café: Franca 1885-1914. Dissertação (Mestrado em História Econômica) - IE/UNICAMP, 2006.; Tosi; Faleiros; Teodoro, 2007TOSI, P. G.; FALEIROS, R. N.; TEODORO, R. da S. Crédito e a pequena cafeicultura no oeste paulista: Franca, 1890-1914. Revista Brasileira de Economia, v. 61, p. 1-22, 2007.; Pires, 2009PIRES, Anderson. Café, finanças e bancos: Juiz de Fora, 1889-1930. Juiz de Fora: Funalfa, 2009.; Tosi; Faleiros; Fontanari, 2011).1 1 O estudo de Teodoro utilizou-se de escrituras de hipotecas por meio do livro de notas de Franca de 1886 a 1914 e nós lançamos mão dos livros de registro hipotecário do Cartório de Registro de Imóveis de 1890 a 1928.

O objetivo deste artigo é compreender, comparativamente, duas regiões cafeeiras dinâmicas e próximas, destacando as características semelhantes e salientando as diferenças na estrutura agrária e no financiamento das atividades econômicas: Sudoeste de Minas Gerais e Nordeste Paulista. Para tanto, demonstramos a produção, produtividade e estrutura agrária, baseada no censo de 1920 (Brasil, 1924) e analisamos o crédito hipotecário que fomentava as atividades econômicas das duas regiões, fundamentados numa série de registros hipotecários de 1890 a 1929. Esses microdados permitiram uma análise quantitativa mais aprofundada da estrutura do crédito, especialmente o perfil dos devedores e credores (profissão e moradia), valores, prazos e juros, inclusive dos imóveis em garantia. A partir do contexto histórico e da análise dos resultados, verificamos que o crédito hipotecário foi relevante para a agricultura, sobretudo para a cafeicultura, em ambas as regiões, especialmente no período anterior a 1914. Por outro lado, sustentamos que os distintos tamanhos das propriedades e outros fatores históricos das duas áreas condicionaram em boa medida um acesso diferenciado ao crédito, bem como diferenças nos montantes negociados, investidos e na produção agrícola. Por fim, o financiamento por hipoteca ou outros instrumentos também condicionou a estrutura agrária e econômica da região.

No caso do Sudoeste de Minas Gerais escolhemos um conjunto de seis comarcas na divisa com o Estado de São Paulo, compreendendo oito municípios.2 2 As fontes utilizadas para o Sudoeste Mineiro foram os livros de Inscrições Especiais de Registro Hipotecário disponíveis nos Cartórios de Registro de Imóveis das Comarcas de São Sebastião do Paraíso, Monte Santo, Guaranésia, Muzambinho, Guaxupé e Cabo Verde de 1890 a 1929. Para São Sebastião do Paraíso lançamos mão das informações mais agregadas relatadas pelos tabeliões ao governo mineiro e depositada no Arquivo Público Mineiro. Para alguns anos iniciais houve provavelmente algum sub-registro de hipotecas. A maior instabilidade da definição das comarcas bem como do próprio sub-registro hipotecário no Sudoeste Mineiro pode ter reduzido as possibilidades de financiamento por meio da hipoteca na região. A região do Sudoeste Mineiro compreendeu as comarcas de Cabo Verde (incluindo Botelhos), Monte Santo (incluindo Arceburgo), Muzambinho (incluindo Guaranésia e Guaxupé) e São Sebastião do Paraíso. De outro lado, selecionamos uma região próxima em São Paulo, que compreendeu a comarca de Franca, abarcando cinco municípios.3 3 Para a região do Nordeste Paulista escolhemos a comarca de Franca no período de 1890 a 1928, que além deste compreendia os municípios de Restinga, Cristais, Ribeirão Corrente e São José da Bela Vista. Além do maior número de municípios, o Sudoeste Mineiro compreendeu uma área maior do que o Nordeste Paulista, como veremos adiante. A documentação encontra-se depositada no 1º Cartório de Registro de Imóveis de Franca, mantendo uma sequência crescente de lançamentos que não nos mostra haver lacuna na fonte. Apesar de um movimento mais geral de crescimento da produção no período, a expansão do café no Sudoeste Mineiro e Nordeste Paulista apresentou trajetórias distintas, por conta da economia pregressa, das instituições mais favoráveis ao crédito e do fluxo de imigrantes e capitais. Mesmo existindo uma legislação nacional comum, a aplicação prática da hipoteca revelou-se de forma diferenciada nas duas áreas. O registro hipotecário para o Sudoeste Mineiro ocorreu de modo mais irregular e sofrendo frequentes alterações de comarcas.

O Sudoeste Mineiro apresentava população escrava e livre expressiva em 18724 4 No censo de 1872, o número de escravos chegou a 6.895, e o total de habitantes a 43.807, portanto a participação dos escravos na população seria de 15,7% (DGE, 1876). e produzia café desde o último quartel do século XIX (Saes; Castilho, 2013SAES, A. M.; CASTILHO, F. F. de A. Cortando a Mantiqueira: entre café e abastecimento no Sul de Minas (1880-1920). SÆculum - Revista de História, v. 29, p. 323-346, jul./ dez. 2013.; 2014). Para 1874 já se anotava a produção de café em várias cidades da região (Veiga, 1874VEIGA, Bernardo Saturnino da. Almanach Sul-Mineiro para 1874. Campanha: Typographia do Monitor Sul-Mineiro, 1874., p. 346, 355, 358, 362). Em 1884, a região do Sudoeste Mineiro já detinha 5,6 milhões de pés de café no início da década de 1880, produzindo cerca de 250 mil arrobas (Veiga, 1884, p. 45-46, 361). Posteriormente, houve a chegada da ferrovia à região na passagem do século XIX para o XX. A escala da produção cresceu e atingiu patamares mais elevados, como veremos na próxima seção (Martins, 2014MARTINS, M. L. A marcha do café no Sul de Minas, décadas de 1880-1920: Alfenas, Guaxupé, Machado e Três Pontas. Revista Territórios & Fronteiras, v. 7, n. 1, p. 287-320, jan./jun. 2014.).

O Nordeste Paulista, mais especificamente a Comarca de Franca, mantinha uma economia mais devotada à criação de gado, chegando a colheita do café a ser expressiva apenas na década de 1880 (Faleiros, 2010FALEIROS, R. N. Fronteiras do café: fazendeiros e “colonos” no interior paulista (1917-1937). Bauru: Edusc, 2010., p.41).5 5 No censo de 1872 realizado em 1874 para os municípios paulistas, o número de escravos era de 2.515, e o total de habitantes de 15.689. Os escravos representavam 16,0% da população total (DGE, 1876). Em 1888, o município de Franca produzia 60 mil arrobas. Dessa forma, a produção do Sudoeste Mineiro já era bastante superior à dessa comarca. Além disso, criava-se em média por ano 12 mil bovinos (São Paulo, 1888, p. 373). A ferrovia Mogiana atingiu primeiro Franca em 1887, apresentando um boom do café ao final do século XIX e início do XX, porém mais tardio do que a área mineira (Teodoro, 2006TEODORO, R. da S. O crédito no mundo dos senhores do café: Franca 1885-1914. Dissertação (Mestrado em História Econômica) - IE/UNICAMP, 2006.; Oliveira, 1995; 2016; Ferreira, 2005FERREIRA, V. G. Homens do crédito: o fabriqueiro da igreja e acumulação em Franca (1880-1929). Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, 2005.). Ademais, a mesma companhia ferroviária Mogiana servia as duas regiões, favorecendo a integração econômica, financeira e demográfica bem como o escoamento das safras de café pelo porto de Santos. O comércio e a mobilidade de recursos entre as duas regiões não ocorreram apenas no período cafeeiro, contando a paulista com movimentos imigratórios oriundos de Minas Gerais desde o início do século XIX (Bacellar; Brioschi, 1999BACELLAR, C. de A. P.; BRIOSCHI, L. R. Na estrada do Anhanguera: uma visão regional da história paulista. São Paulo: Humanitas, 1999.).

Na primeira seção do artigo, apresentamos a estrutura produtiva e agrária do Sudoeste Mineiro, comparativamente ao Nordeste de São Paulo, fundamentado no primeiro recenseamento demográfico e econômico do país no século XX. Posteriormente, analisamos o financiamento rural e urbano das duas regiões por meio das hipotecas, destacando a participação do café, dos credores e das condições dos empréstimos ao longo do período. Por fim, testamos por meio de análises estatísticas, notadamente por regressões, o efeito da diferença das duas regiões sobre o crédito hipotecário (valor deflacionado, juros e prazos), administrando o efeito de outras variáveis disponíveis nas fontes sobre as hipotecas.6 6 Imóveis rurais e urbanos, presença ou não de café nos imóveis, credor bancário ou não, credor e devedor local ou de outras regiões e os anos de mudanças da conjuntura econômica nacional e internacional.

2 Produção e estrutura agrária

O Sudoeste Mineiro congregava um conjunto de oito municípios na fronteira de Minas Gerais com São Paulo. De forma comparativa utilizamos dados de cinco municípios do Nordeste Paulista. Embora sejam dois espaços com população, produção e áreas distintas, eles constituíam duas áreas cafeeiras de expressão naquele momento, apresentando condições geográficas bastante semelhantes.7 7 Podemos inferir a proximidade geográfica a partir da predominância de solos, vegetação e altitudes semelhantes (www.ibge.gov.br). Desde o final do século XIX a população e a cafeicultura avançaram por ambas as regiões, apoiadas na expansão ferroviária e no afluxo de capitais.8 8 O movimento imigratório ocorreu em maior intensidade na região paulista do que na mineira. Como pode ser observado na Tabela 1, a proporção de estrangeiros na população total em 1920, nas duas regiões mostrou-se superior no Nordeste Paulista. Em 1920, a região mineira representava cerca do quadruplo da população e da área dos estabelecimentos rurais da região paulista em foco, conforme Tabela 1. Contudo, o número absoluto de propriedades era quase sete vezes maior para a mineira relativamente à paulista. Isto demonstra que o tamanho médio dos estabelecimentos paulistas superava em mais que o dobro dos mineiros, sendo os primeiros de 258 hectares, e os segundos de 105 hectares.

Conforme a Tabela 1, a produção de café encontrava-se presente em quase a metade dos estabelecimentos rurais recenseados para o Sudoeste Mineiro, porém, em proporção um pouco maior para o Nordeste Paulista. A área cultivada para as duas regiões diferia em quase três vezes em relação a sua dimensão, porém se destinava principalmente para a cafeicultura. O café ocupava mais da metade dessas terras cultivadas. Para o Sudoeste Mineiro havia a ocupação dos terrenos cultivados pelos cafezais um pouco maior (72,6%), em face ao espaço paulista (67,6%). Essa diferença decorreu do proporcionalmente maior emprego das terras para o cultivo de alimentos na segunda região. Além do tamanho das áreas serem muito distintas, esse último fato também se refletiu na produção agrícola, pois a colheita de café era mais do que o quadruplo para a área de Minas relativamente à área de São Paulo. Todavia, isto não ocorreu para as produções de milho, arroz e feijão, que eram mais próximas ao dobro. Desse modo, os dois espaços cultivavam café e, em menor monta, alimentos, sendo o mineiro um pouco mais concentrado no primeiro produto do que o paulista (Tosi; Faleiros, 2011TOSI, P. G.; FALEIROS, R. N.; FONTANARI, R. Modalidades e hierarquia do crédito na cafeicultura paulista (1889-1930). Revista Brasileira de Economia, v. 65, p. 401-412, 2011.; Colistete, 2015COLISTETE, R. P. Regiões e especialização na agricultura cafeeira: São Paulo no início do século XX. Revista Brasileira de Economia, v. 69, n. 3, p. 331-354, 2015.).

Tabela 1
Estatísticas agrárias e econômicas do censo de 1920

As demais áreas eram ocupadas por matas e um conjunto de terras não cultivadas, por conta de serem impróprias, ainda não trabalhadas ou campos para criação. Para o Nordeste Paulista, esse conjunto respondeu por pouco mais de três quartos das terras (76,0%), enquanto no Sudoeste Mineiro foi de apenas 56,3% da área total. Provavelmente, a grande maioria desse espaço deve ter sido utilizada para a pecuária de forma extensiva. Com relação aos bovinos, o número da região mineira era quase o triplo da paulista, porém para a criação de suínos a diferença entre elas chegou a quase oito vezes. Assim, a pecuária desenvolveu-se significativamente nas duas áreas proporcional às terras destinadas à atividade, alcançando maior expressão de suínos em Minas Gerais.

A estimativa do PIB das duas regiões mostra maior participação das atividades agrícolas para o Sudoeste Mineiro, respondendo por mais de três quartos do total (81,6%). Para o Nordeste paulista, a parcela agrícola do PIB correspondeu a cerca de dois terços (66,6%). Outrossim, a agricultura assumia proporcionalmente maior papel na área mineira.

Outro modo de comparar as economias das regiões consiste na análise do emprego de insumos mais modernos e da produtividade. Apesar da produção de café ser cinco vezes maior no Sudoeste Mineiro, verificamos um número semelhante de arados nas duas regiões. No Nordeste Paulista havia dois tratores que não existiam na área vizinha mineira. A introdução proporcionalmente maior de máquinas de beneficiamento e agrícolas favoreceu a melhoria da produtividade na área paulista.9 9 No jornal de Guaranésia, verificamos o pagamento do imposto de indústria e profissões por parte de 14 máquinas de beneficiar café em 1910 (Monitor Mineiro, 5 fev. 1910, p. 3; Idem, 11 fev. 1910, p. 3). Em 1922, já havia 31 de máquinas de beneficiar e uma de “rebenificiar” café (Idem, 12 fev. 1922, p. 4-6). Desse modo, houve crescimento expressivo do serviço de beneficiar café por meio de máquinas. A decisão de investimento em máquinas conduziu a necessidade de mobilizar recursos para sua aquisição, por meio de capitais próprios ou de terceiros.

Na Tabela 2, medimos a produtividade agrícola por meio do número de trabalhadores declarados como rurais no censo de 1920. Para o café construímos um leque maior de indicadores, como produção por mil pés de café ou por hectare cultivado. A produtividade cafeeira mostrou-se um pouco mais elevada para o Nordeste Paulista do que o Sudoeste Mineiro. Já para os alimentos, a produtividade relevou-se muito superior para a região paulista. Por fim, a criação de bovinos foi mais produtiva por trabalhador na área paulista, porém a de suínos maior em Minas. Essa última consistiu na única atividade com maior rendimento na área mineira.

Tabela 2
Produtividade agrícola do censo de 1920

No conjunto da economia, o PIB per capita reproduziu essa diferença de produtividade, pois foi 21,5% superior para o Nordeste Paulista em relação ao Sudoeste Mineiro. A renda per capita revelou-se superior na área de São Paulo. De modo semelhante, o PIB agrícola estimado pelo IPEA por trabalhador rural revelou-se 27,1% maior no Nordeste Paulista do que no Sudoeste Mineiro. Assim, havia uma maior renda rural na região de São Paulo.

A cafeicultura moldou a estrutura agrária preexistente, em função de um rush para as áreas produtoras. O Nordeste Paulista mantinha, proporcionalmente, maiores propriedades do que as do Sudoeste Mineiro, conforme Tabela 3. Para essa última região quase metade dos estabelecimentos tinha até 40 hectares. De outro lado, as faixas mais elevadas de tamanho de propriedade foram mais representadas no Nordeste Paulista. Por fim, o maior estabelecimento ocorreu também na área paulista, atingindo 5.483 hectares.

Uma medida de concentração fundiária pode ser o índice de Gini, que se estima por meio das faixas de tamanho constantes no censo. O resultado foi um índice de 0,640 para a área mineira e de 0,654 para a paulista. A concentração revelou-se um pouco maior para a última região. Na área de Minas Gerais, a menor média de tamanho das propriedades bem como uma desigualdade ligeiramente inferior possibilitava menos empréstimos, já que, como apontado pela literatura, os grandes proprietários acessam mais facilmente o crédito.

Tabela 3
Estrutura agrária do censo 1920

O Sudoeste Mineiro e o Nordeste Paulista consistiam em duas áreas de expansão dos cafezais ao final do século XIX e início do XX. A produção do café e de cereais revelou-se superior na área mineira em 1920, mas em proporção menor para os cereais. A utilização de insumos modernos e a produtividade agrícola mostrou-se mais expressiva na área paulista, bem como a renda per capita. A estrutura agrária também foi mais concentrada em propriedades maiores na região paulista do que na mineira. Destarte, essas diferenças produtivas e fundiárias marcaram o mercado de crédito das duas regiões, em especial o hipotecário, que dependia dos colaterais para sua ocorrência. Por outro lado, o maior acesso ao crédito facilitaria o investimento em propriedades maiores e mais produtivas, num mútuo condicionamento.

3 Financiamento hipotecário

A expansão do crédito facilitou os investimentos na agricultura e a negociação de propriedades rurais, principalmente nas áreas de crescimento da cafeicultura. As transações hipotecárias no Sudoeste Mineiro compreenderam, de 1890 a 1929, pouco mais de 1500 transações, abarcando quase 16 mil contos de réis, deflacionados a valores de 1913, conforme Tabela 4.10 10 Como se trata de um período bastante largo e marcado por mudanças dos preços, deflacionamos os valores hipotecados pelo Deflator Implícito do Produto (www.ipeadata.gov.br). No Nordeste Paulista, verificamos negociações de pouco mais de 1700 hipotecas de 1890 a 1928, não sendo um volume muito superior ao do Sudoeste Mineiro. Entretanto, as quantias negociadas envolveram quase 30 mil contos de réis de 1913, superando amplamente as negociações da região mineira.11 11 Desconsideramos para ambas as regiões os casos das ferrovias e companhias agrícolas e de energia elétrica, em virtude de essas empresas compreenderem uma área maior que a da própria região. Embora o Sudoeste Mineiro seja muito maior em termos demográficos, em área, produção de café e PIB, os valores reais hipotecados revelaram-se muito superiores no Nordeste Paulista, em mais do que o dobro. Isso ressaltou menor necessidade ou possibilidade do crédito hipotecário para a região mineira nessa época.

Escolhemos dividir o período em intervalos de tempo distintos, pautados pelas mudanças produzidas pela Primeira Grande Guerra e até mesmo pelos fluxos financeiros. Podemos observar algumas transformações ao longo do tempo, ao dividirmos a amostra em dois momentos: 1890-1913 e 1914-1929.12 12 Ressaltamos que as informações para Franca compreendem as hipotecas até meado do ano de 1928. Considerando as duas regiões em conjunto, para o primeiro período notamos um número maior de hipotecas, evolvendo uma quantia em réis um pouco superior à do momento seguinte. Algumas possibilidades de explicação podem ser relacionadas à Guerra e ao crescimento de outras formas de financiamento da economia na década de 1920, como via bancos e outros intermediários utilizando de novos instrumentos que não a hipoteca.13 13 O Banco Hipotecário e Agrícola de Minas Gerais realizava, além de hipotecas, outras operações de crédito, como descontos e redescontos, depósitos e emissão de obrigação. No caso dos descontos, os instrumentos aceitos foram os seguintes: títulos representativos de mercadorias, warrants, letras e notas do Tesouro, letras de câmbio e notas promissórias de lavradores, comissários e industriais (Monitor Mineiro, 23 mar. 1912, p. 4). Ver: Costa, 1978. Se compararmos os dois períodos, verificamos para a área paulista uma retração menor do que em Minas do número e mesmo do valor das hipotecas. Apesar de compartilharem uma mesma conjuntura econômica, financeira e cafeeira, o resultado da comparação evidenciou maior dinamismo na região paulista relativamente aoutra. Por fim, o Nordeste Paulista não apenas detinha o maior montante de hipotecas como apresentou dinâmica financeira superior durante o período estudado.

Tabela 4
Hipotecas rurais e urbanas com e sem café (1890-1929)

A partir dos bens relacionados nas garantias dos empréstimos, conseguimos avaliar se entre esses colaterais havia imóveis rurais e a presença ou não de cafezais. Para as hipotecas do Sudoeste Mineiro, as garantias constituíam-se principalmente de bens rurais, chegando a 55,7% dos casos e mais ainda em termos dos valores (74,6%). Tal resultado também foi verificado para o Nordeste Paulista, mas notamos uma parcela superior à do Sudoeste Mineiro, atingindo 79,2% dos valores em transações que apresentavam colaterais rurais. De outro lado, as negociações que apresentavam garantia baseada em cafezais compreenderam a maior parte dos montantes transacionados, sendo de 59,4% para Minas e ainda mais para São Paulo, que alcançou 69,4%. Quando analisamos em separado os dois momentos, verificamos que esses resultados decorreram, mormente, das transações do primeiro período para as duas regiões. A partir de 1914, as hipotecas com colaterais rurais ainda respondiam pela maior parte dos valores negociados, porém muito menor do que antes (55,7% para Minas e 71,4% para São Paulo). Por fim, as participações dos empréstimos com garantia de cafezais nas quantias negociadas também diminuíram no segundo período para o Sudoeste Mineiro e para o Nordeste Paulista: 44,2% e 62,3%, respectivamente. A retração ocorreu de forma mais intensa na região mineira do que na paulista. As atividades urbanas dinamizaram-se em maior proporção do que as rurais, demandando mais crédito e hipotecas entre os dois períodos. Contudo, as transações rurais, entre elas as cafeeiras predominavam no crédito hipotecário para as duas áreas, principalmente a paulista.

Os proprietários rurais conseguiam obter valores hipotecados proporcionais ao tamanho da sua propriedade, atingindo uma correlação entre a área dos imóveis e as quantias financiadas de 0,63 para o Sudoeste Mineiro e 0,45 para o Nordeste Paulista. Entre os bens oferecidos em garantia das hipotecas, verificamos a presença de benfeitorias, mas muitas vezes sem o detalhamento e especificação do que se trata. Em geral, compreendem as instalações e equipamentos utilizados na produção e beneficiamento das mercadorias, como edificações e máquinas. Estas últimas foram elencadas em 30 hipotecas para Minas, principalmente para beneficiamento de café e arroz. Quatro delas já empregavam força motriz a vapor, como essa hipoteca de 1926: “Uma máquina de beneficiar café ‘S. Paulo’ movida a vapor, seus pertences e acessórios, com respectiva casa de morada e terreno com a área de uma quarta de alqueire, havidos por construção própria.” No caso do Nordeste Paulista, observamos um número maior de hipotecas vinculadas a máquinas, alcançando um total de 43 transações.

Os credores do Sudoeste Mineiro consistiam na sua grande maioria de moradores da região, tanto em termos de número de transações (76,7%) como dos valores por eles negociados (57,6%). Para o Nordeste Paulista, os moradores da localidade responderam também por pouco mais da metade do total negociado (56,0%), ou seja, porcentual menor do que em Minas. Não houve grande distinção entre os dois períodos. Os principais credores de fora da região mineira foram os paulistas, desde a Capital São Paulo e o porto de exportação de Santos como também as cidades do interior fronteiriças a Minas Gerais. Não obstante o reduzido número de transações, essas áreas de São Paulo responderam por pouco mais de um quarto dos valores transacionados no Sudoeste Mineiro (25,9%). No Nordeste Paulista, apenas os moradores da capital paulista e de Santos representaram 28,1% dos valores transacionados, ou seja, uma parcela superior que a região mineira. Desse modo, os capitais paulistas constituíam parcela expressiva do financiamento na região mineira. O contrário não se mostrou semelhante, pois os credores mineiros no Nordeste Paulista não eram tão expressivos. Eles realizaram 22 hipotecas no valor de apenas 259 contos, menos de um ponto porcentual do total emprestado (0,9%). Não verificamos financiamento hipotecário direto do exterior para o Sudoeste Mineiro. No Nordeste Paulista, o financiamento direto com o exterior respondeu por apenas 1,9% do total. Alguns italianos realizavam empréstimos como pessoas físicas aos residentes no interior do Brasil. De outro lado, um morador em Paris e a Brazilian Warrant Company, com sede em Londres, realizaram um empréstimo cada.

Para o Sudoeste Mineiro, os principais credores foram os agricultores, representando quase quatro décimos dos valores financiados (38,5%). De outro lado, os bancos efetuaram 19 empréstimos e responderam por quase um quinto (19,1%), e os negociantes pouco mais de um décimo (11,3%). Entre as instituições bancárias destacamos o Banco do Brasil, com quatro financiamentos, totalizando 1.357 contos de réis, e a casa bancária F. Barreto de Mococa (SP), com nove de 1914 a 1927, que somaram 836 contos.14 14 Reunimos os casos do Banco da República de 1890 a 1896 com o do seu sucessor Banco do Brasil de 1922. Esse último foi o maior empréstimo, representando mais da metade dos valores de 1914 a 1929, destinado à mineração de ferro. Os empréstimos da F. Barreto destinaram-se a uma usina hidroelétrica. Outros fornecedores bancários destacavam-se na região mineira de forma mais pulverizada. Uma ilustração é um caso de 1912 do Banco Hipotecário e Agrícola de Minas Gerais, que foi criado em 1911 com subsídio do governo e capital francês, realizando empréstimos a juros módicos (7%) e a prazos mais longos (120 meses). Por fim, houve um caso do Banco de Crédito Real de Minas Gerais em 1914 e outro do Banco J. O. Rezende em 1927. Assim, a presença bancária realizava-se de forma pontual para poucos casos de grandes propriedades rurais ou empreendimentos de maior porte, até mesmo para hidroelétricas.

Do lado paulista, observamos 40 empréstimos bancários, perfazendo 10,2% dos valores hipotecados. As principais instituições foram o Banco Hipotecário e Agrícola de São Paulo (10 casos somando 778 contos de réis) e o Banco de Crédito Real de São Paulo (7 casos totalizando 715 contos). A primeira de capital francês era a equivalente da mineira, criada em 1909, que realizou financiamentos de 1919 a 1928, quando já se encontrava sob o controle do governo paulista.15 15 A partir de 1926 passou a ser denominado de Banco do Estado de São Paulo. A segunda consistiu numa instituição criada ainda no Império e realizou empréstimos de 1895 a 1899, que posteriormente entrou em processo de falência. O Banco do Brasil realizou um financiamento em 1894 e outro em 1926 (somando 287 contos) e o Banco de Ribeirão Preto também efetuou, em 1892, dois empréstimos no valor real total de 424 contos.16 16 Também reunimos um caso do Banco da República de 1894 com outro já denominado de Banco do Brasil, de 1926. Por fim, havia a casa bancária de Hygino Caleiro em Franca, que emprestou uma dúzia de vezes, totalizando pouco mais de 452 contos.

Para o Sudoeste Mineiro, ainda havia proprietários (10,0%), capitalistas (8,8%) e comerciantes (5,4%) que realizavam empréstimos. Entre os capitalistas encontramos o morador Antônio Pimenta de Pádua, que realizou 26 empréstimos entre 1897 e 1920, somando 774 contos de réis. De outro lado, casas comissárias e exportadoras de café situadas em Santos operavam adiantando recursos ou financiando os cafeicultores de São Paulo e Minas Gerais. No Sudoeste Mineiro, diversas empresas atuavam nessa atividade, desde empresas nacionais a estrangeiras, como a tradicional firma alemã Theodor Wille. Várias empresas nacionais destacavam-se, como a Marques, Valle & Cia, que realizou 283 contos em empréstimos. Havia uma dúzia de casas do porto de Santos financiando cafeicultores na região mineira, mas que atuavam no interior de São Paulo. Muitas delas faziam propaganda nos jornais da região oferecendo seus serviços.

Podemos comparar os valores negociados pelos credores segundo sua profissão entre as comarcas do Sudoeste Mineiro e do Nordeste Paulista. Ao compararmos os dois períodos em análise na Tabela 5, verificamos uma retração da participação dos capitalistas, comissários, comerciantes, lavradores e negociantes para as duas localidades. De outro lado, houve um crescimento da parcela dos bancos e proprietários. No caso do Sudoeste Mineiro, observamos maior representação dos lavradores e dos bancos, se comparado ao Nordeste Paulista. Para as instituições bancárias do Sudoeste Mineiro verificamos uma participação bastante reduzida no primeiro período, mas muito maior no segundo, chegando a um terço do total dos valores negociados. O avanço bancário mostrou-se baseado em diferentes companhias desde o maior banco do país até bancos regionais.

Tabela 5
Valores hipotecados segundo os credores (1890-1929)

Da parte dos devedores mineiros, a quase totalidade residia na região, seja em termos do número (93,4%) ou dos valores (75,0%). Para o Nordeste Paulista, a participação dos moradores da própria região foi semelhante: 76,6%. Na área de Minas, havia pouco mais de um quinto dos valores negociados por moradores no Estado vizinho de São Paulo (23,7%), salientando-se que provavelmente esses deveriam possuir propriedades na região vizinha mineira. Não houve o movimento contrário. Os moradores de Minas detinham poucas hipotecas no Nordeste Paulista. Essas ocorreram em tão somente nove casos e no valor de apenas 139 contos (0,5% do total emprestado nessa região). Os paulistas da capital mantinham 8,7% do total financiado no Nordeste Paulista. As profissões que concentraram as maiores parcelas dos valores negociados eram agrícolas (67,9%), ou proprietários (16,9%). A agricultura recebeu a maior parcela dos financiamentos hipotecários.

A partir desse quadro mais geral dos financiamentos hipotecários das duas regiões, centramos a análise na questão da integração dos dois mercados. Para tanto, restringimos a comparação à principal atividade econômica, que consistia na agricultura e se fundamentava principalmente no café. A cafeicultura dos dois lados da fronteira mobilizava pessoas, mercadorias e capitais, mesmo que em montantes distintos como visto anteriormente. Assim, a análise das condições dos empréstimos rurais de Minas e São Paulo mostrou resultados muito semelhantes, conforme a Figura 1, para taxas de juros, e a Figura 2, para prazos.17 17 A correlação da taxa de juros média anual para as duas regiões revelou-se expressiva (0,66), porém não foi significativa para os prazos médios: -0,26. A maior variabilidade dos prazos em relação às taxas de juros pode ter influenciado o resultado, pois o coeficiente de variação foi de 0,29 para os juros e de 0,69 para os prazos do Sudoeste Mineiro, e de 0,35 e 0,88 para o Nordeste Paulista. Assim, a arbitragem das duas regiões mostrou-se mais expressiva para as taxas de juros do que dos prazos. Se no início do período cotejado notamos diferenças significativas tanto nas taxas de juros médias quanto nos prazos médios, posteriormente as séries das duas áreas aproximaram-se bastante. Quando analisamos os intervalos de um desvio padrão a mais ou menos em relação aos juros médios (linhas mais finas na Figura 1), notamos que a média de taxa de juros de uma região (linhas mais grossas) na maioria dos anos encontra-se dentro desse intervalo superior e inferior da outra área em estudo, e vice-versa. Isso apontou para a grande proximidade das taxas de juros dos financiamentos das duas regiões, apesar de os montantes transacionados revelarem-se bastante distintos.18 18 Para os prazos, em muitos casos os desvios padrão foram muito superiores aos da média, revelando grandes diferenças entre as negociações mesmo na média de um ano para o outro. Dessa forma, não foi possível plotar no gráfico os intervalos. Como o prazo médio das duas regiões chegou a 33,8 para o Nordeste Paulista, e a 31,3 para o Sudoeste Mineiro, e os desvios padrão elevados em relação à média (29,6 e 21,5, respectivamente), não podemos negar que as médias são distintas.

Figura 1
Taxa de juros média anual e seu intervalo de variação das hipotecas rurais (1890-1929)

A conjuntura nacional refletiu-se nos comportamentos das condições dos empréstimos. A política expansionista do Encilhamento produziu juros menores e prazos mais longos no início do nosso período de análise. Contudo, no momento seguinte, os efeitos da desvalorização cambial, da inflação e dos preços desfavoráveis do café produziram o aumento nominal dos juros, mesmo antes da política econômica mais restritiva implementada por Joaquim Murtinho a partir de 1898 (Franco, 1983FRANCO, G. Reforma monetária e instabilidade durante a transição republicana. Dissertação (Mestrado em Economia) - Pontifícia Universidade Católica, Rio de Janeiro, 1983.). A retração dos prazos ocorreu em momento mais próximo à política de Murtinho, relativamente à elevação dos juros. A superação da crise bancária, a reformulação do Banco do Brasil, a política de defesa do café e o estabelecimento da Caixa de Conversão no início do século XX permitiram a diminuição das taxas de juros médias até 1912 (Triner, 2000TRINER, G. Banking and economic development: Brazil, 1889-1930. New York: Palgrave, 2000.; Hanley, 2005HANLEY, A. G. Native capital: financial institutions and economic development in São Paulo, Brazil, 1850-1920. Stanford: Stanford University Press, 2005.), porém os prazos não apresentaram tendência até o final do período em estudo. A Primeira Guerra não levou a alterações expressivas nas condições dos empréstimos hipotecários, apesar da inflação maior e das grandes variações do preço do café no período. Por fim, depois da Grande Guerra ocorreu retração das taxas de juros até a primeira metade da década de 1920, mas foi revertida antes mesmo da crise de 1929.

Mesmo negociando valores hipotecários rurais muito diferentes proporcionalmente à produção e população, a taxa média de juros caminhou ao redor de 12% ao ano, após a primeira década do século XX nas duas regiões. De outro lado, o prazo médio dos empréstimos em meses manteve-se no intervalo de 30 a 40 meses para o maior número de anos no século XX. Ao final do período houve uma tendência de redução dos prazos médios, principalmente para o Sudoeste Mineiro. Apesar de menos intensa para os prazos, os resultados demonstram certo grau de arbitragem entre as duas praças, revelando movimentação de capitais entre diferentes espaços cafeeiros. A presença de recursos oriundos da capital de São Paulo e de Santos nas duas regiões facilitou a equiparação das condições dos empréstimos. De outro lado, os financiamentos oriundos do Rio de Janeiro eram mais presentes na região mineira. Destarte, a existência de uma ampla circulação de capitais entre regiões cafeeiras e centros comerciais e de exportação produziu um mercado de crédito integrado.

Figura 2
Prazo médio das hipotecas (em meses, 1890-1929)

Não obstante a produção, área e populações em escalas distintas, as duas regiões apresentaram valores negociados semelhantes em boa parcela dos anos em estudo, conforme a Figura 3.19 19 A correlação entre o número de hipotecas do Sudoeste Mineiro e o do Nordeste Paulista no período alcançou 0,52. Por outro lado, a correlação entre os valores reais das duas regiões em idêntico intervalo de tempo atingiu 0,35. O valor real médio dos empréstimos revelou-se maior no Nordeste Paulista do que no Sudoeste Mineiro: 17,5 contos de réis e 10,1 contos, respectivamente. O coeficiente de variação chegou a 2,83 para a primeira região e de 3,73 para a segunda, revelando grande variabilidade dos valores. Ao final do século XIX houve valores maiores para Nordeste Paulista, em face de algumas transações de montantes superiores. Posteriormente à Primeira Grande Guerra ocorreu outro movimento de separação dos valores das negociações até o final do período em estudo.20 20 A produção de café cresceu em Franca após a grande geada de 1918 até o final da década de 1920 (Faleiros, 2010, p. 148). Assim, no Nordeste Paulista verificamos uma maior utilização das hipotecas relativamente ao seu produto e população do que no Sudoeste Mineiro. A entrada em larga escala do cafeeiro na região paulista apenas em fins do século XIX demandou mais capitais para investimento na expansão da cultura e em seus equipamentos.

Figura 3
Valores reais das hipotecas rurais (1890-1927)

Além das condições dos financiamentos hipotecários rurais semelhantes para as duas regiões, os valores reais transacionados revelaram movimentos conjuntos, ou seja, foram correlacionados. A política expansionista do Encilhamento e o boom cafeeiro das regiões favoreceram a expansão do crédito durante toda a década de 1890, apesar de uma política já restritiva desde 1898. A retração expressiva do crédito hipotecário ocorreu apenas no início do século XX. A partir de 1906, houve uma recuperação até um pouco antes da Grande Guerra. Tal resultado decorreu da reestruturação financeira do Banco do Brasil, da política de defesa do café, da estabilização do câmbio e da entrada de capitais do exterior, inclusive por meio de bancos estrangeiros. O conflito mundial provocou uma nova redução do volume de crédito. Depois de 1918, houve um crescimento da oferta de crédito hipotecário, acompanhando o crescimento econômico e financeiro daquele momento, principalmente mediante instituições bancárias nacionais, tanto estatais como privadas. Apesar de um atraso na recuperação do crédito para Minas após a Grande Guerra, o dinamismo dessa região foi relativamente menor do que a paulista. No conjunto do período, observamos comportamento semelhante do crédito nas duas regiões, o que reforça a existência de circulação de capitais entre as regiões e as principais praças financeiras e a arbitragem entre elas.

4 O crédito hipotecário diferenciava-se entre as duas regiões?

Na tentativa de confirmar as diferenças entre as regiões efetuaram-se regressões estatísticas. O objetivo não consiste em estabelecer uma relação de causalidade de valor, juros e prazos dos financiamentos hipotecários, pois são variáveis endogenamente definidas no momento da contratação do empréstimo pelos credores e devedores, baseados na garantia oferecida. O experimento decorreu da necessidade de verificar se ser agente econômico de uma região ou de outra produzia alteração nessas variáveis, que foram as explicadas nas regressões.

Inicialmente, definimos as variáveis explicativas (independentes) que dispomos na documentação compulsada, como apresentamos a seguir. Um primeiro conjunto de informações extraídas das fontes compreendeu as variáveis dummies,21 21 Uma variável construída a partir de informações selecionadas, por exemplo, como dados qualitativos. que podem ser de valor 0 ou 1. A primeira variável Sudoeste Mineiro assumiu valor 1 quando for hipoteca dessa região, e 0 para o caso de ser do Nordeste Paulista. Essa variável abarcou a questão da diferença entre as duas regiões, sendo significativa haverá distinção, e se não for não ocorrerá distinção para a localização da hipoteca. A segunda variável Cafezal consistiu em valor igual a 1 para os financiamentos que possuíam cafezal como colateral e 0 sem cafeeiro, assim seria uma evidência do efeito da presença do café para as variáveis explicadas, como veremos adiante. A terceira variável Banco decorreu de o credor ser instituição bancária (1), ou não sendo isso informou-se zero. As variáveis credor e devedor local assumiram valor 1 para essa ocorrência, e quando não for, zero, destacando a diferenciação de ser morador da região ou não. A variável Rural apresentou valor 1 quando o colateral compreendeu imóveis rurais, não ocorrendo esse caso informou-se zero. Por fim, destacamos os anos de mudanças expressivas da conjuntura econômica como variáveis explicativas: 1898, de início da política restritiva de Murtinho: 1913, do final de uma grande expansão: 1906, começo da Caixa de Conversão e Convênio de Taubaté: 1914, início da Grande Guerra: 1919, recessão do período pós-Grande Guerra; 1926, começo da Caixa de Estabilização. Todas elas são zero até o ano anterior à transformação, e a partir do ano de mudança assumiram o valor 1. A partir da regressão os resultados dos coeficientes calculados das variáveis dummies podem ser comparados entre si, pois elas só podem assumir valores 0 ou 1, quando os seus coeficientes da regressão assumem maior valor em módulo apresentam efeito maior sobre a variável explicada (dependente).

Além das variáveis dummies, utilizamos como variáveis quantitativas: o preço do café em Nova York e as três disponíveis na própria fonte documental: valor real, juros e prazos.22 22 O preço anual médio do café no atacado em Nova York foi de cents por libra, disponível em:< https://fred.stlouisfed.org>. Acesso em: 10 dez. 2019. O preço do café permitiu-nos verificar o efeito do mercado internacional da preciosa rubiácea sobre o mercado de crédito hipotecário no interior do país. As outras três variáveis constituíram as nossas variáveis explicadas, mas quando regredimos uma em função das dummies incluímos as outras duas como explicativas, e vice-versa. Como as três variáveis mostraram-se correlacionadas isso poderia prejudicar o resultado das regressões, porém, os seus coeficientes revelaram-se significantes, demonstrando um poder explicativo da variável dependente. 23 23 As correlações foram estaticamente significativas, atingindo os seguintes resultados: valor real e juros (-0,128); valor real e prazos (0,244), juros e prazos (-0,306), preços do café e valor real (0,038) e preços do café e juros (-0,116). Apenas a correlação entre preços do café e prazos não foi significativa (0,027). As variáveis quantitativas foram transformadas em logaritmo para reduzir sua variabilidade e quando incluídas como explicativas apresentaram coeficientes comparáveis, pois indicam o quanto a sua variação produz alteração na variável explicada.

Uma forma de testar as diferenças das regiões pode ser vista na Tabela 6 por meio das três regressões por mínimos quadrados ordinários. Na primeira regressão (1), o valor real das hipotecas foi explicado negativamente pela taxa de juros e pelo Sudoeste Mineiro. Ainda nessa regressão as variáveis preço do café, cafezal, rural, banco e prazos explicaram o valor real. Desse modo, se o agente morasse na região mineira reduziria significativamente os valores reais hipotecados, bem como a elevação dos juros produziria um efeito no mesmo sentido. Quando o devedor consistia em agricultor (rural) e cafeicultor (cafezal) e o credor era banco havia haveria um incremento dos valores, sendo os dois últimos os mais impactantes das variáveis dummies. Da mesma forma, à medida que os prazos aumentavam os valores também cresciam. Como esperado e apontado pela literatura, o preço do café elevou o valor real transacionado no interior do país, e os efeitos dos juros e prazos revelaram-se em sentidos opostos, porém em intensidades próximas. De outro lado, os devedores ou credores locais realizaram empréstimos em valores menores do que o restante, revelando uma capacidade maior de alcançar pessoas de menores patrimônios e, por consequência, de colateral. Finalmente, alguns anos apresentaram impacto significativo no valor real, em geral intensificando ou contrabalançando os efeitos da variação anual dos preços internacionais do café. Destacamos possíveis condicionantes: os anos de amplificação do efeito do café em 1913 (quando do boom antes da Guerra) e 1926 (momento de criação do Banespa e ampliação dos empréstimos), e os anos de contrapeso em 1906 (valorização cambial), 1914 (início da Grande Guerra) e 1919 (compensando o extraordinário crescimento dos preços em função da geada e do fim da Grande Guerra).

Tabela 6
Determinantes do valor real, taxa de juros e prazos (1890-1929)

Para as condições dos empréstimos, os resultados mostraram-se nem sempre no mesmo sentido nas regressões 2 para taxa de juros e 3 para prazos. Como esperado à luz da literatura, o valor real assumiu um efeito significativo e negativo para as taxas de juros e positivo para os prazos. Quanto maior a riqueza e por consequência o colateral dos agentes maior seria a capacidade de financiamento em condições mais favoráveis. A inclusão do valor real como explicativa atuou para centralizar nela a capacidade explicativa da diferenciação dos valores das hipotecas, retirando a significância das instituições bancárias (variável banco), que se associaram aos grandes valores emprestados. A atividade rural (variável rural) produziu, de modo significativo, uma redução dos juros e elevação dos prazos, gerando financiamentos em condições mais favoráveis. Por outro lado, a variável cafezal foi significativa para explicar as taxas de juros e prazos, mas o sentido foi de elevar os juros e os prazos.24 24 Salientamos que a significância do cafezal para explicar a taxa de juros foi quase ao limite de aceitação de 10%. Tal resultado do cafezal apontou melhora nas condições dos empréstimos em termos dos prazos, mas não dos juros.25 25 A inclusão da variável valor real como explicativa, controlando o efeito dos acréscimos dos valores sobre juros, produziu coeficiente da variável café positivo. Tal resultado contradiz o esperado do efeito da cafeicultura no sentido de facilitar empréstimos a taxas mais favoráveis. De modo similar, a variável credor local elevou as duas condições dos financiamentos, mas no caso do devedor local apenas expandiu os prazos, conforme a regressão 3. O preço do café produziu redução das taxas de juros e também dos prazos. Esse último resultado mostrou-se diferente do esperado pela literatura. As variáveis 1898, 1906, 1913 e 1919 apresentaram efeitos semelhantes no sentido da melhora das condições de financiamento, diminuindo os juros e intensificando os efeitos dos preços do café. Também para 1898 e 1913 houve o efeito da elevação dos prazos, compensando os preços. Contudo, já o ano de 1926 produziu efeito oposto, aumentando as taxas de juros e compensando o efeito dos preços do café.26 26 Os anos de 1906 e 1926 revelaram-se significativos apenas para as taxas de juros. De outro lado, o de 1919 mostrou-se somente significativo e positivo para os prazos. Por fim, a variável prazos explicou significativamente juros, e vice-versa.

A variável Sudoeste Mineiro também não se revelou significativa para explicar a taxa de juros. A arbitragem entre as duas regiões revelou-se mais significativa para juros, não permitindo diferenças entre elas quando controlamos outras variáveis estudadas. A diferenciação regional introduziu distinções em termos dos valores reais e dos prazos, ocorrendo as menores quantias e maiores prazos para o Sudoeste Mineiro. Apesar de haver expressiva mobilidade de pessoas, capitais e mercadorias por meio da fronteira paulista e mineira antes mesmo do café, os nossos resultados mostram práticas semelhantes (como dos juros) e também distintas de financiamento. No caso das distinções, observamos quantias negociadas em menor monta e maior presença de credores locais no Sudoeste Mineiro relativamente à área paulista. A menor demanda ou possibilidade de acesso ao crédito hipotecário no Sudoeste Mineiro condicionou-se pelo povoamento relativamente mais antigo, maior capital acumulado, mais diversidade produtiva, menos urbanização, pela estrutura agrária marcada por propriedades de menores dimensões e menor institucionalização do registro hipotecário.

5 Considerações finais

A economia da mineração do século XVIII demandou uma estrutura produtiva direcionada para o mercado interno, que alcançou as terras do Sudoeste Mineiro e posteriormente do Nordeste Paulista. Ao longo do século XIX a economia dessas regiões manteve-se calcada em atividades de abastecimento interno, utilizando grandes espaços e mão de obra escrava, tanto na pecuária bovina e suína como no cultivo de alimentos. A precocidade da acumulação de recursos humanos e materiais em atividades rurais na região mineira permitiu maior realocação de fatores para a cafeicultura, necessitando de menor financiamento no período tratado pelo nosso estudo. O Sudoeste Mineiro vivenciou o início da expansão cafeeira anterior ao seu desenvolvimento ferroviário, utilizando as tropas de muares como meio de transporte. A produção de café já alcançava volumes expressivos ainda no século XIX para essa região mineira. A partir desse momento o crescimento ocorreu de forma mais gradativa do que as áreas próximas vizinhas do Nordeste de São Paulo. Destarte, o café chegou concomitantemente à ferrovia e, por consequência, se revelou mais tardio e dinâmico no Nordeste Paulista, demandando elevados empréstimos e investimentos na época em questão.

Os nossos resultados demonstraram, em ambas as regiões em estudo, expressivos montantes reais hipotecados, porém se reduzindo do primeiro período (1890-1913) para o segundo (1914-1929). No caso das diferenças, verificamos, para o Sudoeste Mineiro relativamente ao Nordeste paulista, volumes de crédito hipotecário menores em comparação à produção cafeeira e até mesmo à população. Apesar da proporção inferior de uso dos empréstimos com garantia real e de investimentos em equipamentos na área mineira, as condições médias dos financiamentos mostraram-se semelhantes, tanto em prazos como principalmente em taxas de juros. A conjuntura nacional e internacional da economia e do café no período como um todo se refletiram nos movimentos dos valores reais das duas áreas, que se correlacionaram. A mobilidade de fatores entre elas ajudava a equiparação das condições dos empréstimos, principalmente de recursos oriundos de São Paulo, que também alcançaram de forma expressiva Minas Gerais nesse momento. Em que pesem volumes de crédito diferenciados, as semelhanças nas condições decorriam da circulação de capitais dentro de um mercado financeiro integrado.

A maioria dos recursos emprestados originava-se, e se destinava, a pessoas residentes na própria região, destacando a relevância do crédito local. Os recursos de fora desse espaço decorriam principalmente da capital da República (o Rio de Janeiro) e do Estado de São Paulo, tanto do porto de Santos, da capital e do interior paulista mais próximo da divisa mineira. As quantias de fora das duas regiões revelaram-se oriundas de casas comissárias ou exportadoras, bem como de bancos principalmente a partir de 1914, facilitando a arbitragem das condições dos empréstimos. O exercício estatístico a fim de verificar o efeito conjunto das variáveis estudadas demonstrou que o valor real, prazo e juros podem ser explicados pelas variáveis: preço internacional do café, cafezal, agentes locais, bancos e garantia rural. Quando testamos a região como fator distintivo do crédito hipotecário, verificamos que houve tanto uma retração dos valores reais como elevação dos prazos para as hipotecas do Sudoeste Mineiro relativamente ao Nordeste Paulista, controlando as demais variáveis disponíveis. A arbitragem entre os mercados revelou-se mais expressiva para as taxas de juros, que resultou na região mineira como variável explicativa não significativa. Contudo, as propriedades em porte relativamente mais diminuto no Sudoeste Mineiro limitavam o acesso ao crédito hipotecário e aos investimentos em equipamentos, como máquinas principalmente de beneficiamento.

O Sudoeste Mineiro relativamente ao Nordeste Paulista apresentava o povoamento mais antigo, maior acumulação prévia de capital, economia mais rural e diversificada, estrutura agrária menos concentrada baseada em propriedades menores e maior dificuldade de institucionalização do registro hipotecário, permitindo um crescimento da cafeicultura com menos necessidade ou possibilidade de uso de recursos financeiros, como o da hipoteca. Assim, mesmo existindo distinções em montantes e prazos das hipotecas para as duas regiões no exercício efetuado, o crédito auxiliou e foi auxiliado pelo grande boom cafeeiro em ambas as áreas, apesar de ritmos diferenciados. Tal resultado reforçou a validade e a necessidade de estudos regionais para ampliar o entendimento do passado brasileiro.

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  • Códigos JEL:

    N.26, N56.
  • JEL Codes:

    N.26; N56.
  • 1
    O estudo de Teodoro utilizou-se de escrituras de hipotecas por meio do livro de notas de Franca de 1886 a 1914 e nós lançamos mão dos livros de registro hipotecário do Cartório de Registro de Imóveis de 1890 a 1928.
  • 2
    As fontes utilizadas para o Sudoeste Mineiro foram os livros de Inscrições Especiais de Registro Hipotecário disponíveis nos Cartórios de Registro de Imóveis das Comarcas de São Sebastião do Paraíso, Monte Santo, Guaranésia, Muzambinho, Guaxupé e Cabo Verde de 1890 a 1929. Para São Sebastião do Paraíso lançamos mão das informações mais agregadas relatadas pelos tabeliões ao governo mineiro e depositada no Arquivo Público Mineiro. Para alguns anos iniciais houve provavelmente algum sub-registro de hipotecas. A maior instabilidade da definição das comarcas bem como do próprio sub-registro hipotecário no Sudoeste Mineiro pode ter reduzido as possibilidades de financiamento por meio da hipoteca na região. A região do Sudoeste Mineiro compreendeu as comarcas de Cabo Verde (incluindo Botelhos), Monte Santo (incluindo Arceburgo), Muzambinho (incluindo Guaranésia e Guaxupé) e São Sebastião do Paraíso.
  • 3
    Para a região do Nordeste Paulista escolhemos a comarca de Franca no período de 1890 a 1928, que além deste compreendia os municípios de Restinga, Cristais, Ribeirão Corrente e São José da Bela Vista. Além do maior número de municípios, o Sudoeste Mineiro compreendeu uma área maior do que o Nordeste Paulista, como veremos adiante. A documentação encontra-se depositada no 1º Cartório de Registro de Imóveis de Franca, mantendo uma sequência crescente de lançamentos que não nos mostra haver lacuna na fonte.
  • 4
    No censo de 1872, o número de escravos chegou a 6.895, e o total de habitantes a 43.807, portanto a participação dos escravos na população seria de 15,7% (DGE, 1876).
  • 5
    No censo de 1872 realizado em 1874 para os municípios paulistas, o número de escravos era de 2.515, e o total de habitantes de 15.689. Os escravos representavam 16,0% da população total (DGE, 1876).
  • 6
    Imóveis rurais e urbanos, presença ou não de café nos imóveis, credor bancário ou não, credor e devedor local ou de outras regiões e os anos de mudanças da conjuntura econômica nacional e internacional.
  • 7
    Podemos inferir a proximidade geográfica a partir da predominância de solos, vegetação e altitudes semelhantes (www.ibge.gov.br).
  • 8
    O movimento imigratório ocorreu em maior intensidade na região paulista do que na mineira. Como pode ser observado na Tabela 1, a proporção de estrangeiros na população total em 1920, nas duas regiões mostrou-se superior no Nordeste Paulista.
  • 9
    No jornal de Guaranésia, verificamos o pagamento do imposto de indústria e profissões por parte de 14 máquinas de beneficiar café em 1910 (Monitor Mineiro, 5 fev. 1910, p. 3; Idem, 11 fev. 1910, p. 3). Em 1922, já havia 31 de máquinas de beneficiar e uma de “rebenificiar” café (Idem, 12 fev. 1922, p. 4-6). Desse modo, houve crescimento expressivo do serviço de beneficiar café por meio de máquinas.
  • 10
    Como se trata de um período bastante largo e marcado por mudanças dos preços, deflacionamos os valores hipotecados pelo Deflator Implícito do Produto (www.ipeadata.gov.br).
  • 11
    Desconsideramos para ambas as regiões os casos das ferrovias e companhias agrícolas e de energia elétrica, em virtude de essas empresas compreenderem uma área maior que a da própria região.
  • 12
    Ressaltamos que as informações para Franca compreendem as hipotecas até meado do ano de 1928.
  • 13
    O Banco Hipotecário e Agrícola de Minas Gerais realizava, além de hipotecas, outras operações de crédito, como descontos e redescontos, depósitos e emissão de obrigação. No caso dos descontos, os instrumentos aceitos foram os seguintes: títulos representativos de mercadorias, warrants, letras e notas do Tesouro, letras de câmbio e notas promissórias de lavradores, comissários e industriais (Monitor Mineiro, 23 mar. 1912, p. 4). Ver: Costa, 1978.
  • 14
    Reunimos os casos do Banco da República de 1890 a 1896 com o do seu sucessor Banco do Brasil de 1922. Esse último foi o maior empréstimo, representando mais da metade dos valores de 1914 a 1929, destinado à mineração de ferro. Os empréstimos da F. Barreto destinaram-se a uma usina hidroelétrica.
  • 15
    A partir de 1926 passou a ser denominado de Banco do Estado de São Paulo.
  • 16
    Também reunimos um caso do Banco da República de 1894 com outro já denominado de Banco do Brasil, de 1926.
  • 17
    A correlação da taxa de juros média anual para as duas regiões revelou-se expressiva (0,66), porém não foi significativa para os prazos médios: -0,26. A maior variabilidade dos prazos em relação às taxas de juros pode ter influenciado o resultado, pois o coeficiente de variação foi de 0,29 para os juros e de 0,69 para os prazos do Sudoeste Mineiro, e de 0,35 e 0,88 para o Nordeste Paulista. Assim, a arbitragem das duas regiões mostrou-se mais expressiva para as taxas de juros do que dos prazos.
  • 18
    Para os prazos, em muitos casos os desvios padrão foram muito superiores aos da média, revelando grandes diferenças entre as negociações mesmo na média de um ano para o outro. Dessa forma, não foi possível plotar no gráfico os intervalos. Como o prazo médio das duas regiões chegou a 33,8 para o Nordeste Paulista, e a 31,3 para o Sudoeste Mineiro, e os desvios padrão elevados em relação à média (29,6 e 21,5, respectivamente), não podemos negar que as médias são distintas.
  • 19
    A correlação entre o número de hipotecas do Sudoeste Mineiro e o do Nordeste Paulista no período alcançou 0,52. Por outro lado, a correlação entre os valores reais das duas regiões em idêntico intervalo de tempo atingiu 0,35. O valor real médio dos empréstimos revelou-se maior no Nordeste Paulista do que no Sudoeste Mineiro: 17,5 contos de réis e 10,1 contos, respectivamente. O coeficiente de variação chegou a 2,83 para a primeira região e de 3,73 para a segunda, revelando grande variabilidade dos valores.
  • 20
    A produção de café cresceu em Franca após a grande geada de 1918 até o final da década de 1920 (Faleiros, 2010, p. 148).
  • 21
    Uma variável construída a partir de informações selecionadas, por exemplo, como dados qualitativos.
  • 22
    O preço anual médio do café no atacado em Nova York foi de cents por libra, disponível em:< https://fred.stlouisfed.org>. Acesso em: 10 dez. 2019.
  • 23
    As correlações foram estaticamente significativas, atingindo os seguintes resultados: valor real e juros (-0,128); valor real e prazos (0,244), juros e prazos (-0,306), preços do café e valor real (0,038) e preços do café e juros (-0,116). Apenas a correlação entre preços do café e prazos não foi significativa (0,027).
  • 24
    Salientamos que a significância do cafezal para explicar a taxa de juros foi quase ao limite de aceitação de 10%.
  • 25
    A inclusão da variável valor real como explicativa, controlando o efeito dos acréscimos dos valores sobre juros, produziu coeficiente da variável café positivo. Tal resultado contradiz o esperado do efeito da cafeicultura no sentido de facilitar empréstimos a taxas mais favoráveis.
  • 26
    Os anos de 1906 e 1926 revelaram-se significativos apenas para as taxas de juros. De outro lado, o de 1919 mostrou-se somente significativo e positivo para os prazos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Out 2021
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2021

Histórico

  • Recebido
    22 Jun 2020
  • Aceito
    11 Set 2020
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