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Bases colaborativas da corrupção: o lado sombrio das preferências sociais

The collaborative basis of corruption: the dark side of social preferences

Resumo

O ponto de partida deste artigo é a conjectura de que a explicação econômica tradicional para a corrupção baseada no modelo agente-principal é necessária, porém insuficiente para compreender por que a corrupção surge e persiste ao longo do tempo. Mais precisamente, o artigo sustenta a tese de que mecanismos de reciprocidade, juntamente com heurísticas e vieses, têm papel importante na explicação de condutas corruptas. Com base nas evidências experimentais que dão sustentação à nossa conjectura ousada, examinamos as implicações da chamada “guinada comportamental” para a agenda anticorrupção.

Palavras-chave:
economia comportamental; corrupção; reciprocidade; experimentos

Abstract

The departure point of this paper is the conjecture that the standard economic explanation of corruption in terms of the principal agent-model is necessary but insufficient to understand why corruption emerges and persists over time. More precisely, this article advances the thesis that reciprocity mechanisms together with heuristics and biases play an important role in the explanation of corrupt choice behaviors. Inspired by available experimental evidence in support of our bold claim, we examine what implications the so-called “behavioral turn to corruption research” might carry for the anti-corruption agenda.

Keywords:
behavioral economics; corruption; reciprocity; experiments

1 Introdução

A corrupção é um fenômeno complexo que permeia a vida humana e carrega consequências negativas nas esferas individual e coletiva. Ela reduz a qualidade de vida, arruína carreiras e reputações; retira acesso a serviços básicos, encolhe oportunidades de emprego e pode violar direitos fundamentais. Ademais, desafia a democracia e o Estado de Direito; permite o florescimento de grupos organizados para o crime, terrorismo e outras fontes de ameaça à segurança; distorce os mercados e promove queda de confiança nos membros do governo e nas instituições (Transparência Internacional, 2021; Rose-Ackerman; Palifka, 2016). Em virtude de sua extensão e consequências perversas, a corrupção desperta o interesse de pesquisadores de várias matrizes disciplinares, entre elas a economia.

Apesar do reconhecimento de que a corrupção é também um fenômeno com fundamentos históricos e culturais, a literatura econômica cresceu com a missão de iluminar a dimensão decisória da corrupção, tida como um crime de oportunidade ou de cálculo (e.g.Nye, 1967NYE, J. S. Corruption and political development: a cost-benefit analysis. American Political Science Review, v. 61, n. 2, 417-427, 1967.; Rose-Ackerman, 1975; Klitgaard, 1988KLITGAARD, R. Controlling corruption. Berkeley: University of California Press, 1988.; Shleiffer; Vishny, 1993SHLEIFFER, A.; VISHNY, R. W. Corruption. Quarterly Journal of Economics, v. 108, n. 3, p. 599-617, 1993.). Para efetuar tal tarefa, a abordagem de Becker de crime racional tem servido de benchmark para explicar o comportamento corrupto (Becker, 1968; Becker; Stigler, 1974). A pesquisa econômica de corrupção também avança com insights da perspectiva neoinstitucional, que incorpora o modelo do agente-principal na análise para destacar a influência de fatores institucionais sobre condutas ilícitas, tais como peculato, propinas e tráfico de influência (Groenendijk, 1997GROENENDIJK, N. A principal-agent model of corruption. Crime, Law and Social Change v. 17, p. 207-229, 1997.).

O ponto de partida deste artigo é a conjectura de que a explicação econômica da corrupção baseada na abordagem agente-principal é necessária, porém insuficiente para oferecer uma compreensão mais ampla do comportamento corrupto e de seus mecanismos causais.

Inspirados pelos mais recentes desenvolvimentos teóricos e empíricos da literatura econômica de economia comportamental, sustentamos a tese de que dois pressupostos psicologicamente irrealistas - indivíduos são plenamente racionais e unicamente guiados pelos seus próprios interesses - restringem nossa compreensão acerca de comportamentos corruptos do mundo real, altamente sensíveis aos efeitos do pensar automático e social do Homo sapiens (Ariely, 2012ARIELY, D. The (honest) truth about dishonesty. Nova York: HarperCollins Publishers, 2012.; World Bank, 2015; Donato, 2017DONATO, L. Behavioral research and corruption: a new promise for governments? European Law Journal, p. 1-14, 2017.; Zuñiga, 2018ZUÑIGA, N. Behavioural changes against corruption, U4 Anti-Corruption Resource Centre. U4 Helpdesk Answer, n. 8, p.1-12, 2018.; OECD, 2018).

Vale destacar que este artigo não pretende oferecer uma revisão abrangente da literatura de economia comportamental para identificar todas as suas possíveis implicações para o debate sobre corrupção. Mais precisamente, o objetivo é preencher uma lacuna existente na literatura econômica - examinar quais são as lições que a “guinada comportamental” traz para o debate sobre a importância das preferências sociais e dos mecanismos de reciprocidade na explicação dos comportamentos corruptos. Estes persistem apesar de políticas anticorrupção que promovem incentivos e diretrizes de supervisão, compliance e transparência.

O presente trabalho adere à visão de que a ineficácia de políticas de combate à corrupção deve-se também à inadequação empírica de seus fundamentos teóricos (Marquette; Peiffer, 2017MARQUETTE, H.; PEIFFER, C. Grappling with the real politics of systemic corruption; theoretical debates versus "real-world functions". Governance, vol.1, no.1, p.1-16, 2017; OECD, 2018). O recente relatório sobre o índice de percepção da corrupção mundial da Transparência Internacional (2021, p. 6) destaca que, a despeito de várias políticas adotadas nas últimas décadas, a maioria dos países ainda está longe de vencer a guerra contra a corrupção.

Logo, a contribuição oferecida pelo presente artigo é a análise do lado sombrio da reciprocidade que se manifesta nas transações corruptas. Dada a natureza clandestina e sigilosa do fenômeno, sua ocorrência e persistência dependem de uma rede de colaboração entre indivíduos e grupos. A Máfia, a Cosa Nostra, o Comando Vermelho e outras associações desse tipo são um paradigma do grau máximo que essa colaboração corrupta pode alcançar, mas são muitas as manifestações menos articuladas e ainda assim poderosas desse fenômeno recorrente.

Mais do que constatar esse padrão, porém, este artigo busca um melhor entendimento de seus mecanismos. Examinar cuidadosamente a natureza recíproca de corrupção traz lições importantes tanto para o avanço da explicação econômica existente quanto para o debate sobre políticas de combate a ela.

Para embarcar em nossa tarefa analítica, o artigo está organizado da seguinte forma. A segunda seção faz uma breve reconstituição de como os economistas representam o fenômeno da corrupção e as recomendações de política que daí se extraem. A seção 3 discute a importância das noções de racionalidade limitada e preferências sociais para uma abordagem mais ampla de corrupção, informada pelas ciências comportamentais. A seção 4 revê um conjunto de pesquisas de natureza experimental que retratam o impacto da reciprocidade sobre as práticas corruptas. A quinta seção reflete sobre as implicações das preferências sociais na explicação de condutas desonestas e conclui.

2 A abordagem econômica tradicional de corrupção

A despeito da natureza multifacetada associada à corrupção, a abordagem econômica representa, tradicionalmente, o fenômeno como um crime de cálculo, em vez de um crime passional (Klitgaard, 1988KLITGAARD, R. Controlling corruption. Berkeley: University of California Press, 1988., p. 4). Tal estratégia de análise está baseada no famoso artigo de Becker (1968BECKER, G. S. Crime and punishment: an economic approach. Journal of Political Economy, v. 76, p. 169-217, 1968.) “Crime and Punishment”, que modela a racionalidade econômica da atividade criminal. Segundo tal perspectiva, a explicação do comportamento se dá em termos de julgamentos conscientes e deliberados acerca dos custos e benefícios esperados em uma determinada tarefa decisória (Garoupa, 2014GAROUPA, N. Economic theory of criminal behavior. In: Bruinsma, G.; Weisburd, D. (Ed.). Encyclopedia of Criminology and Criminal Justice. Nova York: Springer, 2014.).

De acordo com o modelo beckeriano, o criminoso potencial tem um benefício (B) que acomoda tanto os benefícios financeiros quanto os psicológicos do crime. Ademais, ele considera os custos das atividades de aplicação e cumprimento da lei (law enforcement). Considerando indivíduos racionais e neutros ao risco, podemos assumir que os custos correspondem à probabilidade de punição (p) multiplicada por seus custos, que decorrem da extensão da sentença condenatória (C). Sendo assim, como indica Glaeser (1999GLAESER, E. An overview of crime and punishment. Harvard University Working Paper, 1999.), o indivíduo decide com base nos retornos esperados líquidos: B-p×C . O crime torna-se previsível quando o benefício esperado é, na margem, maior do que o custo. Esse retrato da racionalidade econômica do crime implica a visão de que a corrupção envolve julgamento e tomada de decisão sob risco. Além disso, a abordagem beckeriana do crime admite que seu retorno possa ser comparado, por exemplo, com os ganhos W oferecidos por uma atividade legal. Logo, a decisão em favor da atividade criminal como a corrupção ocorre quando w*=B-p×C-W, sendo w* a remuneração ótima associada a tal curso de ação. Moral da história: o número de crimes cresce quando o benefício da infração aumenta, e se reduz quando as probabilidades de punição e sua severidade aumentam (e os ganhos da atividade legal são comparativamente mais altos).

Vale ressaltar que essa interpretação está em sintonia com a premissa de que indivíduos são agentes racionais em busca de seus interesses próprios, em um mundo com recursos escassos (Rose-Ackerman, 1975, p. 5).

Numa linha de raciocínio complementar à explicação beckeriana, economistas interessados em estudar os fatores institucionais que afetam o comportamento corrupto apoiam-se na abordagem do agente-principal (Klitgaard, 1988KLITGAARD, R. Controlling corruption. Berkeley: University of California Press, 1988.; Shleifer; Vishny, 1993). À luz de tal perspectiva, a corrupção resulta de um desvio de relação contratual que se estabelece entre duas partes, principal e agente. O principal (que pode ser, por exemplo, um alto membro do escalão do serviço público ou até mesmo a sociedade) delega seu poder decisório ao agente (um servidor público ou político eleito), cuja função é representar os interesses do primeiro. Em tal abordagem, os riscos da corrupção manifestam-se em virtude de dois elementos: a divergência de interesses entre as partes envolvidas e a existência de informação assimétrica. Ambos geram incentivos para o agente usar estrategicamente o poder e a confiança recebidos para satisfazer seus próprios interesses ou os de seus clientes potenciais, em detrimento do principal e dos interesses da maioria (Groenendijk, 1997GROENENDIJK, N. A principal-agent model of corruption. Crime, Law and Social Change v. 17, p. 207-229, 1997.).

Vale ressaltar que a explicação do comportamento corrupto em termos da abordagem do agente-principal está em consonância com a definição mais utilizada de corrupção como “abuso de poder confiado a alguém para obtenção de ganho privado” (Transparência Internacional, 2021). Assim como o modelo de crime racional de Becker, a perspectiva do agente-principal aplicada à corrupção depende do princípio econômico de que indivíduos optam por cursos de ação que lhes conferem ganhos marginais iguais ou maiores do que os custos marginais. Mais uma vez, a explicação do comportamento pressupõe que os indivíduos sejam plenamente racionais e guiados apenas pelos seus interesses.

Sendo esse o quadro, a abordagem econômica tradicional recomenda reformas no ambiente institucional para um melhor alinhamento dos interesses de principal e agente. Tais reformas podem incluir melhorias nos canais de informação e monitoramento das ações executadas por gestores e burocratas, seguidos de uma política de elevação dos salários dos agentes para premiar sua adesão ao código de integridade. Todavia, os custos de monitoramento dos potenciais incentivos para a trapaça dos agentes, somados aos esforços de persuasão ou iniciativas de diretrizes (como mecanismos de freios e contrapesos), não são negligenciáveis. O somatório desses custos requer que o principal esteja sempre disposto a calcular as vantagens relativas da supervisão, dispositivos de controle e estratégias de punição dos agentes vis-à-vis os seus custos adicionais.

Reconhecemos que a análise econômica da corrupção ancorada no modelo do agente-principal é importante para um melhor entendimento das relações de interdependência entre esquemas de boa governança e agenda anticorrupção (Rose-Ackerman; Palifka, 2016). Todavia, este artigo sugere que a abordagem do agente-principal é limitada para compreendermos a conduta corrupta e como combatê-la, principalmente em ambientes de corrupção sistêmica (Marquette; Peiffer, 2017MARQUETTE, H.; PEIFFER, C. Grappling with the real politics of systemic corruption; theoretical debates versus "real-world functions". Governance, vol.1, no.1, p.1-16, 2017). Em tais contextos, políticas anticorrupção inspiradas apenas no modelo do agente-principal apostam na ideia de que esse combate depende essencialmente de reformas que alteram o cálculo dos custos e benefícios individuais da atividade ilícita. O problema é que tal diagnóstico inspira políticas anticorrupção que subestimam a influência da dinâmica social no fenômeno que pretendem combater. Infelizmente o comportamento corrupto sobrevive mesmo quando os canais de transparência e responsabilização crescem, como têm demonstrado pesquisas recentes (OECD, 2018).

Com isso em mente, argumentamos que a abordagem comportamental contribui para o entendimento da corrupção que tem lugar no mundo real, povoado por pessoas que têm racionalidade, força de vontade e autointeresse limitados. Não se trata de um mero crime de cálculo racional de indivíduos guiados pelos seus próprios interesses materiais. Logo, o entendimento mais amplo da corrupção e dos desafios associados a seu enfrentamento depende da incorporação da influência dos julgamentos e pensamentos que indivíduos formam sobre a sociedade e sobre seus pares na análise econômica.

3 Fundamentos da abordagem comportamental: pensar automático e social

A despeito de seus avanços e desdobramentos analíticos, a economia comportamental tem caracterização bastante ampla, definindo-se pelo compromisso de desenvolver modelos e teorias psicologicamente mais realistas do que os oferecidos pela tradição neoclássica (Angner; Loewenstein, 2012ANGNER, E.; LOEWENSTEIN, G. Behavioral economics. Philosophy of Economics, Elsevier, p. 641-689, 2012.; Angner, 2019). Para Sendil Mullainathan e Richard Thaler (2001MULLAINATHAN, S.; THALER, S.H. Behavioral economics. Working paper NBER, 2001., p. 1.095), a pesquisa em economia comportamental pode ser diferenciada pela iniciativa de relaxar três pressupostos fundamentais dos modelos tradicionais de escolha: racionalidade ilimitada, força de vontade ilimitada e autointeresse ilimitado. A primeira faz referência às competências cognitivas dos indivíduos no mundo real. A limitada força de vontade destaca que os indivíduos têm preferências temporais conflitantes e por isso nem sempre escolhem o que é melhor para eles no futuro. A limitação do autointeresse ou egoísmo, por sua vez, é incorporada à abordagem comportamental para enfatizar que os agentes não são guiados apenas pelos seus interesses próprios; eles também fazem julgamentos e tomam decisões com base nas expectativas e interesses alheios.

O grande objetivo das revisões dos postulados irrealistas do modelo tradicional é oferecer melhores explicações para os fenômenos observados e inspirar políticas públicas mais eficazes e congruentes com a realidade. O programa de pesquisa da economia comportamental já mudou a pesquisa e o debate em várias áreas, tais como finanças, desenvolvimento econômico, saúde, meio ambiente e direito (Diamond; Vartiainen. 2007DIAMOND, P; VARTIAINEN, V. (Ed.). Behavioral economics and its applications. Princeton: Princeton University Press, 2007.; Della Vigna, 2009; Chetty, 2015CHETTY, R. Economics and public sector: a pragmatic perspective. American Economic Review, v. 105, n. 5, p. 1-33, 2015.). Neste artigo, defendemos que tais desdobramentos teóricos e empíricos também prometem novas direções para os estudos de corrupção, que são trilhadas por Lambsdorff (2012LAMBSDORFF, J. G. Behavioral and experimental economics as guidance to anticorruption. In: SERRA, D.; WANTCHEKON, L. New advances in Experimental Research on Corruption: Research in Experimental Economics, v. 15, p. 279-299, 2012.), Zamir e Teichman (2018ZAMIR, E.; TEICHMAN, D. Behavioral law and economics. OUP-USA, 2018.), Zúñiga (2018) e Muramatsu e Bianchi (2021MURAMATSU, R.; BIANCHI, A. M. Behavioral economics of corruption and its implications. Revista de Economia Política, v. 41, n. 1, pp. 100-116, 2021.). No que se segue discutiremos o vínculo das noções de racionalidade limitada (pensar rápido) e preferências sociais (pensar socialmente) com a literatura mais recente sobre integridade e corrupção.

3.1 Racionalidade limitada, heurísticas e vieses no comportamento corrupto

A partir da década de 1950, Herbert Simon inicia suas críticas à teoria da utilidade esperada (TUE), que se tornou o benchmark da teoria da escolha racional. Segundo o autor, a hipótese empírica de maximização de utilidade esperada tem bases comportamentais inaceitavelmente irrealistas. Ela subestima que os decisores do mundo real possuem limitada capacidade de processamento de informação e não têm como fazer escolhas baseadas em busca completa de todos os possíveis cursos de ação, avaliação das diferentes perspectivas envolvidas e seleção da alternativa maximizadora (e.g. Simon, 1959; 1992). Em resposta a essa impossibilidade, Simon propôs um modelo de racionalidade limitada amplo, baseado na conjectura de que indivíduos economizam suas habilidades cognitivas e por isso recorrem a atalhos mentais ou rotinas chamadas de heurísticas, ao fazerem julgamentos e escolhas em contextos complexos. Tal perspectiva parece ter inspirado os esforços empíricos de Amos Tversky e Daniel Kahneman para derivação de uma alternativa teórica - a Teoria da Perspectiva (TP) - que explica o comportamento efetivo dos agentes com base em heurísticas (Tversky, 1974; Kahneman; Tversky, 1981).

Vale enfatizar que Kahneman (2003KAHNEMAN, D. Maps of bounded rationality: psychology for behavioral economics. American Economic Review, v. 93, n. 5, p. 1.449-1.475, 2003.) explicita a versão do modelo de racionalidade limitada que tem inspirado os recentes avanços da economia comportamental. De acordo com o autor, o cérebro humano evoluiu ao longo de sua história com uma arquitetura cognitiva que acomoda dois sistemas mentais - o sistema 1 (intuição) e o 2 (raciocínio). Enquanto o primeiro ilumina o pensamento rápido, intuitivo e automático, que comumente vem à tona quando percebemos tarefas decisórias das quais nossa vida ou sobrevivência dependem, o sistema 2 refere-se aos processos e atividades mentais que exigem esforço, tempo e controle para produzirem resultados, tais como nossos julgamentos e decisões deliberadas. Por exemplo, a fuga imediata resultante da percepção de uma ameaça ou perigo é uma resposta do sistema automático; já a demonstração de um teorema matemático é manifestação do pensar devagar.

Cabe também destacar que em um mundo no qual atenção, memória e tempo são recursos escassos, agentes limitadamente racionais recorrem de modo automático e não deliberado aos dispositivos do sistema 1 - atalhos mentais ou heurísticas. Nesse caso, faz todo sentido dizer que o sistema intuitivo é o herói da história da ação humana, pois ele cria sem grande esforço as primeiras impressões e percepções que servem de insumos para crenças, reflexões e escolhas do sistema 2 (Kahneman, 2011KAHNEMAN, D. Thinking fast and slow. New York: FSG Books, 2011., p. 21).

A ironia da história é que, se, por um lado o sistema 1 nos capacita a tomar decisões rápidas, por outro, ele pode promover comportamentos subótimos ou enviesados. Tudo depende de como os agentes percebem os contextos, pois os comportamentos de escolha ativados pelo sistema 1 são fortemente influenciados pelas molduras mentais (Kahneman; Tversky, 1981KAHNEMAN, D.; TVERSKY, A. The framing of decisions and the psychology of choice. Science, v. 211, n. 4.481, p. 453-458, 1981.). Em contextos de perda, indivíduos exibem comportamentos mais arriscados e atribuem maior valor ao consumo presente, mesmo quando a gratificação futura é maior. Nos cenários de ganho, por sua vez, os agentes revelam aversão à perda e, por isso, tomam decisões menos arrojadas e mais alinhadas com suas preferências futuras (Thaler, 2019THALER, R. H. Misbehaving: a construção da economia comportamental. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2019.).

Neste momento, o leitor pode estar se perguntando se o sistema de pensamento devagar está em perfeita sintonia com a tradicional explicação beckeriana de corrupção e com a aplicação do modelo do agente-principal. Nossa resposta é positiva. O comportamento corrupto envolve deliberação e avaliação mais cuidadosa sobre os incentivos existentes e as consequências das alternativas em termos de seus payoffs. Tudo isso é prerrogativa do processamento de informação feito pelo sistema 2. E quanto à conexão entre corrupção e o pensar rápido? O comportamento corrupto é também influenciado pelas heurísticas e vieses, como argumentaremos a seguir.

Kahneman e Tversky (1981KAHNEMAN, D.; TVERSKY, A. The framing of decisions and the psychology of choice. Science, v. 211, n. 4.481, p. 453-458, 1981.) oferecem evidências de que as escolhas são influenciadas pela maneira como as opções são apresentadas aos indivíduos e percebidas por eles em termos de ganhos ou perdas. Tais resultados sugerem que as escolhas são dependentes dos contextos ou molduras (frames) presentes nas tarefas decisórias. Os autores descobrem que os indivíduos percebem e respondem a perdas e ganhos de maneira assimétrica: os agentes são mais prudentes e avessos à perda quando estão em contexto de ganho e mais dispostos a correr riscos quando se encontram em uma moldura de perda.

O que dizer das escolhas éticas? As pesquisadoras Mary Kern e Dolly Chugh (2009KERN, M.; CHUGH, D. Bounded ethicality: the perils of loss framing. Psychological Science, v. 20, n. 3, p. 373-384, 2009.) testaram se comportamentos desonestos ou antiéticos podem ser explicados pelos mecanismos de julgamento e decisão do sistema 1. Suas muitas pesquisas dão suporte empírico à conjectura de que molduras de perda motivam comportamentos mais arriscados e condutas desonestas. As autoras compararam experimentalmente o comportamento dos participantes em dois tipos de cenário, um de perda, outro de ganho. Elas constataram que no primeiro cenário participantes tornaram-se mais propensos a violar regras éticas, como uso de informação privilegiada (inside information) em troca de benefícios, do que no segundo. Em outro experimento as autoras concluíram que uma moldura de perda estimulava a decisão de um corretor de imóveis de fazer promessas falsas a um potencial comprador.

Yuval Feldman e Eliran Halali (2017FELDMAN, Y; HALALI, E. Regulating “good” people in subtle conflicts of interest situations. Business Ethics, v. 154, p. 65-83, 2017.) examinam se os mecanismos do pensamento automático influenciam os julgamentos dos indivíduos de modo tal que eles optem por desvios de condutas profissionais e violações de normas de integridade. De acordo com os pesquisadores, vários comportamentos desonestos parecem ser manifestações de conflitos de interesses pessoais, nem sempre alinhados com senso de dever profissional e integridade. Em um experimento no qual os participantes tinham de fazer uma avaliação objetiva sobre o tipo de pesquisa e desempenho dos pesquisadores de um centro de pesquisa universitário, Feldman e Halali descobriram que a avaliação dos pareceristas externos (que poderiam ser contratados futuramente pelo centro) foi significativamente mais favorável do que aquela dos pareceristas que trabalhavam no próprio centro. Os autores destacam que os participantes do experimento nas condições de controle de pensamento rápido fizeram avaliações bem mais positivas e enviesadas do centro de pesquisa do que os examinadores no contexto de pensamento lento e cuidadoso. Isso sugere que, sob a influência do sistema 1, os indivíduos podem subestimar os conflitos de interesse e optar por condutas eticamente questionáveis.

A literatura de economia comportamental destaca também dois vieses cognitivos - excesso de confiança e confirmação - que exercem influência automática sobre escolhas morais e comportamentos desonestos. Enquanto, por um lado, o excesso de confiança leva os indivíduos a superestimarem suas próprias habilidades e competências, o viés de confirmação decorre da tendência de buscar ou interpretar fatos e evidências de maneira ajustada a crenças e expectativas previamente estabelecidas (Nickerson, 1998NICKERSON, R. S. Confirmation bias: a ubiquitous phenomenon in many guises. Review of General Psychology, v. 2, n. 2, p.175-220, 1998.).

Feldman (2017FELDMAN, Y; HALALI, E. Regulating “good” people in subtle conflicts of interest situations. Business Ethics, v. 154, p. 65-83, 2017.) destaca que os indivíduos têm dificuldade para reconhecer suas limitadas habilidades de compreensão dos elementos morais subjacentes a seus próprios julgamentos e decisões. Esse fenômeno é também apontado por Shalvi, Gino, Barkan e Ayal (2015SHALVI, S.; GINO, F.; BARKAN, R.; AYAL, S. Self-serving justifications: doing wrong and feeling moral. Journal of Health Psychology, v. 24, n. 2, p.125-130, 2015.), os quais argumentam que as pessoas processam informações de modo alinhado com suas crenças e muitas vezes recorrem a mecanismos de autoengano para justificarem ações desonestas. Um bom exemplo é o do médico famoso, ciente de sua reputação de profissional comprometido com o bem-estar do paciente. Esse indivíduo pode ser incapaz de admitir que suas escolhas de medicamento são influenciadas pelas relações clientelistas mantidas com um laboratório que financia seu grupo de pesquisa na universidade e patrocina suas conferências.

O excesso de confiança (uma manifestação do pensar rápido) também denota a tendência de acreditarmos ser mais honestos e virtuosos do que de fato somos. Tal ajuste cognitivo possibilita que as pessoas adquiram imunidade contra suas condutas antiéticas, mantendo assim uma elevada confiança em sua integridade (Nohria, 2015NOHRIA, N. You´re not as virtuous as you think. The Washington Post, Washington, 15 out. 2015.Disponível em: https://www.washingtonpost.com/opinions/youre-not-as-virtuous-as-you-think/2015/10/15/fec227c4-66b4-11e5-9ef3-fde182507eac_story.html. Acesso em: 20 setembro 2020
https://www.washingtonpost.com/opinions/...
).

Max Bazerman e Ann Tenbrunsel (2011BAZERMAN, M. H.; TENBRUNSEL, A. E. Blind spots: why do we fail to do what´s right and what to do about it. Princeton University Press, 2011.) afirmam que uma autoconfiança excessiva leva os indivíduos a sempre apelarem a uma justificativa ou restrição para explicar sua conduta ilícita, em vez de admitir sua preferência por um curso de ação corrupta. De maneira análoga, um recente relatório sobre integridade no setor público mostra que servidores com elevado poder discricionário e sujeitos a pressões diversas não conseguem perceber que seu excesso de autoconfiança dá reforço para comportamentos desonestos (OECD, 2018).

3.2 Preferências sociais e condutas ilícitas

Em nome de uma análise da tomada de decisão psicologicamente mais realista, os economistas comportamentais não apenas investigam a influência do “pensar automático” sobre as escolhas efetivamente observadas dos indivíduos em sociedade; eles fazem também um esforço de incorporar mais explicitamente o papel de preferências, expectativas e crenças que os agentes formam sobre as outras pessoas com quem interagem ou que lhes servem de referência.

É lugar comum afirmar que nossa maneira de pensar e agir depende do que os outros pensam e fazem. Os agentes do mundo real cooperam com membros da família, círculo de amigos e redes de colegas, ainda que muitas vezes de modo condicional. Comportamentos altruístas revelam-se mesmo quando os ganhos de reputação são nulos. Tudo isso sugere que o “pensar socialmente” ou autointeresse limitado também se coloca como um princípio relevante para o entendimento mais amplo de várias condutas e atividades humanas (World Bank, 2015). Tais considerações estão no cerne daquilo que a economia comportamental chama de “preferências sociais”.

A despeito de sua ambiguidade, o conceito de preferências sociais é útil, pois joga luz sobre o fato de que o comportamento dos indivíduos é influenciado por considerações de normas sociais compartilhadas (inclusive as de justiça) e por sua inclinação para cooperar de modo recíproco (Croson; Konow, 2009CROSON, R.; KONOW J. Social preferences and moral biases. Journal of Economic Behavior & Organization, v. 69, n. 3, p. 201-21, 2009.).

Poucos questionam a visão de que os indivíduos no mundo real endossam certas normas, até mesmo quando elas implicam padrões de comportamento que promovem ineficiência ou redistribuição de renda. Há várias evidências de que empresas hesitam em cortar salários e aumentar os preços de bens essenciais nas conjunturas de recessão econômica (Kahneman et al., 1986KAHNEMAN, D.; TVERSKY, A.; KNETSCH J.; THALER, R. Fairness and the assumptions of economics. Journal of Business, v. 59, n. 4, part 2, p. S285-S300, 1986.; Fehr; Fischbacher, 2002FEHR, E.; FISCHBACHER, U. Why social preferences matter: the impact of non-selfish motives on competition, cooperation and incentives. The Economic Journal, v. 112, n. 478, p. C1-C33, 2002.). As decisões de pagamento de impostos e evasão fiscal também são afetadas por normas compartilhadas de justiça distributiva que os agentes formam sobre o sistema tributário (Alm; Sanchez; Dejuan, 1995ALM, J.; SANCHEZ, I.; DEJUAN, A. Economic and non-economic factors in tax compliance. Kyklos, v. 48, n. 1, p. 1-18, 1995.; Andreoni; Erad; Feinstein, 1998ANDREONI, J.; ERARD, B.; FEINSTEIN, J. Tax compliance. Journal of Economic Literature v. 36, n. 2, p. 818-860, 1998.).1 1 Dado que o conceito de justiça depende das regras tácitas do jogo que governam as interações humanas, a percepção do que é (in)justo é dependente do contexto e é sensível tanto aos níveis de aspiração dos indivíduos quanto à sua identidade de grupo.

Em um famoso experimento de jogo de ultimato, no qual um proponente e um respondente deveriam dividir uma soma positiva de dinheiro ($10), Guth, Schmittberger e Schwarze (1982GÜTH, W.; SCHMITTBERGER, R.; SCHWARZE, B. An experimental analysis of ultimatum bargaining. Journal of Economic Behavior and Organization v. 3, n. 4, p. 367-388, 1982.) constatam que os agentes recusavam ofertas que consideravam injustas - muito inferiores à regra de divisão igualitária - mesmo que isso lhes trouxesse prejuízos materiais (v., também, Bianchi, 1998BIANCHI, A. M. Are Brazilian economists different? Revista Brasileira de Economia, v. 52, n. 3, p. 427-439, 1998.). Em outras palavras, indivíduos possuem preferências por justiça e estão dispostos a punir proponentes gananciosos, como observaram Henrich et al., (2004HENRICH, J.; BOYD, R.; BOWLES, S.; CAMERER, C.; FEHR, E.; GINTIS, H. Foundations of human sociality: economic experiments and ethnographic evidence from fifteen small-scale societies. Nova York: Oxford University Press, 2004.) em pesquisa feita em mais de 15 países diferentes. Será que tais expressões do pensar socialmente influenciam igualmente os comportamentos desonestos?

Sim, a percepção das decisões tomadas por outros agentes pode dar origem a comportamentos desonestos, como constatam Nives Della Valle e Matteo Ploner (2017VALLE, N. D.; PLONER, M. Reacting to unfairness: group identity and dishonest behavior. Games, v. 8, n. 28, p. 1-19, 2017.). Um exemplo é o dos funcionários que optam por comportamentos corruptos em reação ao fato de se sentirem tratados injustamente pelas empresas onde trabalham. De forma semelhante, normas compartilhadas sobre o que é moralmente aceitável também têm o poder de influenciar condutas corruptas.

Raymond Fisman e Edward Miguel (2007FISMAN, R.; MIGUEL, E. Cultures of corruption: evidence from diplomatic parking tickets. Journal of Political Economy, v. 115, n. 6, p. 1020-1048, 2007.) embarcam em um experimento natural com diplomatas de 149 países a serviço das Nações Unidas para testar se existe um vínculo causal entre percepções socialmente compartilhadas e comportamentos corruptos. Graças à imunidade diplomática, esses servidores e suas famílias tinham, no momento da pesquisa, o privilégio de estacionar em locais proibidos de Nova York. Isso lhes proporcionava um contexto favorável ao abuso de seu poder público para satisfazer objetivos privados. Os autores tomaram como proxy de desonestidade o número de multas que esses indivíduos tomaram e foram dispensados de pagar em virtude de seu privilégio. A incidência de violações às regras foi então comparada com indicadores gerais de corrupção dos países a cujo serviço esses indivíduos estavam. A pesquisa mostrou uma alta correlação: diplomatas de países onde a corrupção era alta infringiram muito mais as normas do que aqueles de países onde a corrupção era baixa. Tais resultados sugerem que as normas de corrupção do ambiente institucional de origem do servidor público podem ser previsores importantes de sua propensão a agir desonestamente.

A corrupção corrompe, como têm constatado pesquisas conduzidas em moldes experimentais. Outro exemplo interessante é o trabalho de Simon Gächter e Jonathan Schulz (2016GÄCHTER, S.; SCHULZ, J.F. Intrinsic honesty and the prevalence of rule violations across societies. Nature, v. 531, p. 496-499, 2016.), que investiga se ambientes institucionais com grande predominância de violação das regras prejudicam a honestidade intrínseca das pessoas e, consequentemente, estimulam condutas desonestas. Tal como outros experimentos descritos neste artigo, o experimento em questão usou um formato simples, não invasivo, que preservava o anonimato e a privacidade dos participantes. Estes foram convidados a lançar um dado e relatar a face obtida em jogadas sucessivas, sendo que seu ganho dependia do resultado informado. Para manter o anonimato, a face do dado era apenas observável para o próprio participante. O experimento em questão foi conduzido em 23 países diferentes, para os quais os autores primeiramente construíram um “Índice de Predominância de Violação das Regras (PRV, no original)”, a partir de dados de 2003 sobre corrupção, evasão fiscal e política fraudulenta. Os resultados do experimento são alinhados com a conjectura de que a corrupção tem efeito multiplicador, uma vez que os participantes de países de alto PRV (que sinalizava um ambiente de maior corrupção) mentiram mais sobre seu desempenho do que aqueles oriundos dos países com baixo PRV.

A economia comportamental ressalta que, em um mundo marcado por informação assimétrica e interações medidas por contratos cujas cláusulas são incompletas, a tendência humana de cooperar com quem coopera (reciprocidade positiva) e de punir quem trapaceia ou viola uma regra de justiça (reciprocidade negativa) contribui enormemente para a sustentação da cooperação. Segundo Samuel Bowles e Herbert Gintis (2002BOWLES, S.; GINTIS, H. Homo reciprocans. Nature, v. 415, p. 125-127, 2002.), os seres humanos cooperam de modo condicional, e o mecanismo da reciprocidade sinaliza até mesmo para indivíduos egoístas que contribuir para um projeto comum pode ser “a melhor política”. As preferências do Homo reciprocans reforçam as crenças compartilhadas de que a ameaça de punição pelos membros do grupo é crível. Como resultado, o comportamento cooperativo sobrevive e dissemina-se também em grupos de indivíduos desconhecidos, cuja probabilidade de recorrentes interações é pequena.

Tais manifestações das preferências sociais trazem vantagens principalmente nos contextos de privação e incerteza, em que as redes de colaboração envolvendo membros internos e externos à família são cruciais para o acesso a bens e serviços básicos como alimentação, moradia e saúde. Porém, os mecanismos de reciprocidade, que comumente são celebrados como forças motoras da evolução das condutas cooperativas, também trazem consequências não pretendidas perversas. A perpetuação de práticas corruptas é um exemplo: a inclinação humana à cooperação recíproca dá reforço a mecanismos dos quais a corrupção também depende para sobreviver.

Em seu estudo sobre corrupção em Uganda, Odd-Helge Fjeldstad (2005FJELDSTAD, O-H. Corruption in tax administration: lessons from institutional reforms in Uganda. WP CMI working paper, 2005.) ressalta que as obrigações de parentesco e normas de lealdade aos pares e amigos fazem com que os servidores públicos considerados bons sejam apenas aqueles que beneficiam membros de sua rede de relacionamento social. Mais recentemente, Walton e Jackson (2020WALTON, G.; JACKSON, D. Reciprocity networks, service delivery and corruption: the wantok system in Papua New Guinea. U4 Anti-corruption Resource Centre, Chr. Michelsen Institute Norway, n. 1, 2020. Disponível em: <https://www.u4.no/publications/reciprocity-networks-service-delivery-and-corruption-the-wantok-system-in-papua-new-guinea>. Acesso em: 3 June 2020.
https://www.u4.no/publications/reciproci...
) estudaram o sistema informal de reciprocidade existente em Papua Nova Guiné, chamado de sistema wantok. A rede de colaboração implantada nesse sistema trouxe ganhos sociais para aqueles de seus membros que se comprometiam crivelmente com assistência mútua a parentes, amigos e membros da comunidade.

Entretanto, Walton e Jackson (2020WALTON, G.; JACKSON, D. Reciprocity networks, service delivery and corruption: the wantok system in Papua New Guinea. U4 Anti-corruption Resource Centre, Chr. Michelsen Institute Norway, n. 1, 2020. Disponível em: <https://www.u4.no/publications/reciprocity-networks-service-delivery-and-corruption-the-wantok-system-in-papua-new-guinea>. Acesso em: 3 June 2020.
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) assinalam que redes de preferências sociais também trazem desafios, porque obrigam os indivíduos a beneficiarem seus pares, mesmo que isso implique favoritismo, má alocação dos recursos e práticas de corrupção. Embora lealdade, confiança, generosidade sejam fundamentais para a internalização de normas e consolidação de uma identidade de grupo, elas podem entrar em conflito com protocolos impessoais de integridade e governança.

É nesse contexto que as preferências sociais, juntamente com os componentes do pensamento automático, revelam seu lado sombrio e ajudam a expandir nosso entendimento dos mecanismos subjacentes aos comportamentos desonestos e corruptos. Eles influenciam julgamentos e tomadas de decisão que precedem as escolhas de práticas como nepotismo, favoritismo e clientelismo.

4 Influências sociais e corrupção: evidências experimentais

Nesta seção serão discutidas algumas evidências experimentais sobre como a reciprocidade e outros elementos das preferências sociais podem ser um fator relevante para a corrupção sistêmica e quais consequências isso traz para o debate.

4.1 As bases colaborativas da corrupção

Experimentos que investigam os fundamentos comportamentais da desonestidade e corrupção têm se multiplicado no período mais recente (p. ex., Ariely, 2012ARIELY, D. The (honest) truth about dishonesty. Nova York: HarperCollins Publishers, 2012.). Entretanto, é mais escassa a literatura experimental que trata a corrupção como um fenômeno que resulta da disposição humana a cooperar de modo condicional e recíproco. Nesse grupo destaca-se o conjunto de experimentos conduzido por Ori Weisel e Saul Shalvi (2015WEISEL, O.; SHALVI, S. The collaborative roots of corruption. PNAS, v. 112, n. 34, p. 10.651-10.656, 2015.), que se tornou referência para pesquisas posteriores. Os autores advertem que a forma coletiva de corrupção faz com que a pessoa corra mais riscos de ver sua reputação negativamente afetada e sofra as consequências disso. Cria-se um vínculo específico de colaboração, em que retribuir atos de outros participantes da mesma situação torna-se um ingrediente essencial no estabelecimento de uma associação de longo prazo.

O experimento consistiu num jogo de dados de seis faces, lançados por duplas constituídas pelos jogadores A e B (Weisel; Shalvi, 2015WEISEL, O.; SHALVI, S. The collaborative roots of corruption. PNAS, v. 112, n. 34, p. 10.651-10.656, 2015.). Esses jogadores se viam diante de situações em que podiam falar a verdade ou mentir sobre a face do dado obtida em cada lance, sendo que a mentira era a alternativa mais vantajosa. Ao relatar um número maior no lançamento do dado, o participante A fazia jus a um ganho que variava positivamente de acordo com esse número. Os dois participantes ganhavam também quando havia alinhamento de resultados, ou seja, quando B relatava ter obtido a mesma face do dado do que A.

De uma maneira geral a preservação do anonimato dos participantes é um elemento sempre presente nos experimentos sobre corrupção. Assim, o verdadeiro resultado do lançamento só era de conhecimento do próprio jogador, condição que reproduz situações da vida real nas quais existe uma zona de penumbra que impede que a mentira seja descoberta.

Ao analisarem seus resultados à luz de um cálculo de probabilidades, Weisel e Shalvi (2015WEISEL, O.; SHALVI, S. The collaborative roots of corruption. PNAS, v. 112, n. 34, p. 10.651-10.656, 2015.) constataram que ambos os jogadores foram desonestos. Houve uma incidência de lançamentos que resultavam em números grandes (digamos, a face 5 ou 6 do dado) significativamente mais vezes do que seria previsto por um cálculo de probabilidade. Também a incidência de resultados alinhados foi superior à que seria estatisticamente esperada.

Vale a pena notar que, embora a mentira envolvesse custos para ambos os participantes, esses custos não eram simétricos. O jogador A podia montar o cenário, inflando o número obtido na rolagem do dado, mas a conclusão do “negócio” cabia sempre a B, que podia ou não ajustar seu resultado de tal forma a coincidir com o de A.

Na segunda fase do experimento os incentivos monetários de A e B foram propositalmente desalinhados (Weisel; Shalvi, 2015WEISEL, O.; SHALVI, S. The collaborative roots of corruption. PNAS, v. 112, n. 34, p. 10.651-10.656, 2015.). Em um desses cenários, o de ganho fixo, o jogador B recebia 1 euro por jogada, havendo ou não alinhamento de resultados. Nesse cenário o jogador B não tinha incentivo para mentir, mas mesmo assim ele o fez algumas vezes, ou seja, aceitou colaborar em condições nas quais apenas o jogador A se beneficiava.

Outro resultado interessante é que a frequência com que o jogador B mentia sobre seu desempenho era significativamente mais elevada quando o jogador A informava ter tirado a face 6 do dado. A mentira “descarada” de A funcionava, assim, como um convite à mentira por parte de B.

Em que condições as pessoas mentem mais, quando trabalham em equipe ou quando trabalham sozinhas? Em outro tratamento Weisel e Shalvi (2015WEISEL, O.; SHALVI, S. The collaborative roots of corruption. PNAS, v. 112, n. 34, p. 10.651-10.656, 2015., pp. 10.653) recrutaram novos participantes para desempenhar os papéis de A e B simultaneamente, sendo que a incidência reportada de alinhamentos diminuiu um pouco, porém manteve-se superior à esperada. Conclui-se que o comportamento de colaboração na mentira é mais frequente quando as pessoas trabalham juntas do que quando trabalham sozinhas.

4.2 Equidade e reciprocidade

A reciprocidade na corrupção é também objeto de pesquisa de Johann Graf Lambsdorff e Björn Frank (2011LAMBSDORFF, J. G.; FRANK, B. Corrupt reciprocity - experimental evidence on a men’s game. International Review of Law and Economics, v. 31, n. 2, p. 116-125, 2011.), mas com um enfoque diferente. Os autores idealizam um jogo de ultimato para mensurar a incidência de colaboração corrupta, opondo equidade (fairness) em geral a reciprocidade, que definem como equidade limitada a parceiros de transação. Como diz o artigo, o pagamento de uma propina é um negócio que comporta riscos, pois não existem garantias de que aquele que a recebe agirá de forma recíproca. Apesar disso, mesmo quando a interação entre os agentes transcorre em uma única jogada, não havendo a possibilidade de retaliação, propinas são pagas, e a retribuição corrupta de favores ocorre (Lambsdorff; Frank 2011, p.117).2 2 O objetivo principal do artigo de Lambsdorff e Frank (2011) era comparar homens e mulheres em contextos nos quais existe a possibilidade de corrupção. Seus dados mostram que em quase todos os cenários as mulheres são mais resistentes à corrupção. Não é este, porém, o aspecto que queremos discutir aqui.

Um resultado interessante desse experimento diz respeito à propina recebida pelos participantes que desempenhavam o papel de servidores públicos. O pagamento era feito pela empresa Alpha, que prestava serviços de baixa qualidade e que havia se candidatado a fornecer esse serviço ao poder público. Nesse cenário, o servidor podia reagir denunciando a empresa, reação que configuraria uma delação (whistle-blowing). Como não havia possibilidade de retaliação, o negócio se encerrava nesse ponto.

Porém, duas outras escolhas estavam disponíveis para o servidor. Na primeira delas, denominada de oportunismo, ele embolsava a propina, mas contratava outra empresa, Beta, para prestar o serviço desejado. Essa alternativa garantia ao servidor o maior ganho possível. Finalmente, na terceira alternativa, denominada de reciprocidade, o servidor escolhia a empresa Alpha e dividia a propina com ela. O experimento mostrou, para o conjunto da amostra, uma incidência de 28% de delação, 58% de oportunismo e 15% de reciprocidade.

Lambsdorff e Frank (2011LAMBSDORFF, J. G.; FRANK, B. Corrupt reciprocity - experimental evidence on a men’s game. International Review of Law and Economics, v. 31, n. 2, p. 116-125, 2011., p. 121) concluem afirmando que, embora a reciprocidade não fosse a melhor escolha, ela foi adotada em uma parcela não desprezível dos casos. Seria o famoso “toma lá dá cá” da linguagem popular, a ancestral troca de favores que caracteriza a negociação política corrompida, e que vigora mesmo em casos nos quais não corresponde à opção mais vantajosa para o servidor que decide adotá-la.

4.3 O efeito da carona ética

O estabelecimento de cumplicidade permite que o infrator inflacione seus ganhos graças a “parceiros de crime” com os quais cria vínculos. Ora, como as pessoas escolhem esses parceiros, e como essa escolha afeta a emergência e a continuidade da corrupção colaborativa? Essas perguntas nortearam o experimento de Jörg Gross e coautores (2018GROSS, J.; LEIB, M.; OFFERMAN, T.; SHALVI, S. Ethical free riding: when honest people find dishonest partners. Psychological Science, v. 29, n. 12, p. 1.956-1.968, 2018.).

O desenho desse experimento foi semelhante ao de Weisel e Shalvi (2015WEISEL, O.; SHALVI, S. The collaborative roots of corruption. PNAS, v. 112, n. 34, p. 10.651-10.656, 2015.), sendo que os participantes foram combinados em pares e chamados a relatar a face do dado que obtinham a cada rodada. Entretanto, uma diferença importante é que os jogadores do experimento de Gross et al., não sabiam de antemão o número exato de rodadas que o jogo teria, o que trazia alguma incerteza à sua árvore de decisões. Ao mesmo tempo, os pesquisadores tinham acesso, no final do experimento, aos resultados efetivos dos lançamentos de dado, o que permitia que as fraudes fossem detectadas e punidas.

Depois de uma primeira etapa de lançamento de dados por parte das duplas, foi oferecida a um subgrupo dos jogadores a possibilidade de manifestar-se em relação ao parceiro com o qual haviam interagido: manteriam a dupla ou escolheriam novos parceiros? O desempenho desse subgrupo, em que a escolha do parceiro era voluntária, foi confrontado com o de dois grupos de controle, o de “manutenção forçada”, em que o jogador era obrigado a manter o mesmo parceiro, e o de “troca forçada”, em que era obrigado a trocar de parceiro a cada três rodadas.

Os resultados experimentais corroboram a hipótese central da pesquisa, segundo a qual pessoas desonestas procuram por parceiros semelhantes. Quando houve a oportunidade de escolher novos parceiros elas tenderam a trocar de parceiros até serem emparelhadas com um jogador igualmente desonesto. Outro resultado notável é o caráter contagioso da desonestidade, que tornava os participantes mais dispostos a mentir quando seu parceiro de dupla havia mentido no bloco anterior.

Que malfeitores gostam de interagir com seus semelhantes não é segredo nem para o mais desatento observador. A novidade na pesquisa de Gross et al., (2018GROSS, J.; LEIB, M.; OFFERMAN, T.; SHALVI, S. Ethical free riding: when honest people find dishonest partners. Psychological Science, v. 29, n. 12, p. 1.956-1.968, 2018.) é o comportamento dos jogadores honestos quando lhes foi oferecida a possibilidade de escolher seus parceiros. Observou-se aí a presença de um fenômeno apelidado de “caronismo ético”. O jogador honesto ao qual se oferecia a possibilidade de trocar de parceiro tendia a manter sua parceria com um B desonesto, ou a trocar de parceiro quando era emparelhado com um jogador B honesto.

O caronista ético conseguia assim manter seus pés em duas canoas. Ao relatar fielmente a face do dado obtida, preservava sua honestidade e sua reputação; ao mesmo tempo, extraía proveito da desonestidade de seu parceiro.

4.4 A força da natureza recíproca da corrupção

Até aqui os experimentos relatados mostram em que circunstâncias se dá a colaboração corrupta. Klaus Abbink, Bernd Irlenbusch e Elke Renner (2002ABBINK, K.; IRLENBUSCH, B.; RENNER, E. An experimental bribery game. Journal of Law Economics and Organisation, v. 18, n. 2, p. 428-454, 2002.) deram um passo diferente, ao construírem um jogo simulado de oferta de propina aplicado a uma amostra de agentes públicos para caracterizar três mecanismos subjacentes ao comportamento corrupto: a) as relações de reciprocidade entre agentes públicos e ofertantes de propina; b) as considerações sobre os efeitos negativos para o bem-estar de um conjunto de pessoas; 3) os julgamentos acerca das altas penalidades aplicadas à corrupção descoberta.

No tratamento mais simples, de reciprocidade pura, uma empresa dispunha-se a transferir dinheiro para o servidor público em troca de uma decisão favorável à sua contratação. No segundo tratamento, o de externalidade negativa, foi incorporada a possibilidade de uma punição aplicada coletivamente a todo o grupo envolvido na fraude. Nesses dois primeiros tratamentos os autores de infrações permaneciam sob sigilo. Já no terceiro tratamento, de “morte súbita”, algumas transações, definidas por sorteio, eram tornadas públicas. Nesse caso a empresa que oferecia propina e o servidor que a aceitava eram impedidos de prosseguir no experimento.

Abbink e coautores (2002ABBINK, K.; IRLENBUSCH, B.; RENNER, E. An experimental bribery game. Journal of Law Economics and Organisation, v. 18, n. 2, p. 428-454, 2002.) reforçam que, aliada à confiança presente nas parcerias, a reciprocidade pode gerar acordos corruptos. Um resultado interessante diz respeito ao papel das externalidades negativas. A aplicação de penalidades coletivas ao conjunto de jogadores não inibiu a fraude de forma significativa. Tudo mudou de figura, porém, quando o experimento introduziu a possibilidade de morte súbita para aqueles cujas fraudes viessem a público. Nesse cenário a frequência com que a empresa oferecia propina bem como a aceitação do suborno por parte do agente público reduziram-se drasticamente.

Abbink e coautores (2002ABBINK, K.; IRLENBUSCH, B.; RENNER, E. An experimental bribery game. Journal of Law Economics and Organisation, v. 18, n. 2, p. 428-454, 2002., pp. 14-15) concluem afirmando que a eficácia de campanhas anticorrupção que apelem à consciência das pessoas é pequena comparativamente a mecanismos que permitem desmascarar os infratores, submetendo-os a penalidades severas.

4.5 Despachantes como transmissores da corrupção

Até aqui os experimentos descritos são simulações feitas em laboratório das escolhas que as pessoas fariam diante de estímulos para agir de forma desonesta. O experimento descrito a seguir é um experimento de campo, ou seja, uma pesquisa conduzida em ambiente da vida real (Levitt; List, 2009LEVITT, S. D.; LIST, J. Field experiments in economics: the past, the present, and the future. European Economic Review, v. 53, n. 1, p. 1-18, 2009.; List, 2011).

Como se dá a corrupção que se assenta na cumplicidade entre burocratas no exercício de sua função e despachantes, definidos como intermediários entre eles e a população que busca um serviço público? Marianne Bertrand e coautores (2007BERTRAND, M.; DJANKOV, S.; HANNA, R.; MULLAINATHAN, S. Obtaining a driver´s license in India: an experimental approach to studying corruption. The Quarterly Journal of Economics, v. 122, n. 4, p. 1.639-1.676, 2007.) conduziram uma pesquisa na Índia com o objetivo de investigar o caminho percorrido pelos candidatos a uma carteira de motorista para obter sua certificação.

Os autores fizeram um levantamento preliminar desse processo, cuja dificuldade e morosidade frequentemente implicavam a contratação de um despachante, recurso a que apelaram mais de 70% dos candidatos (Bertrand et al., 2007BERTRAND, M.; DJANKOV, S.; HANNA, R.; MULLAINATHAN, S. Obtaining a driver´s license in India: an experimental approach to studying corruption. The Quarterly Journal of Economics, v. 122, n. 4, p. 1.639-1.676, 2007., p. 1.662). Nesse caso os custos eram substancialmente maiores, mas o candidato era quase sempre aprovado, mesmo que fosse um mau motorista. Isso ficou evidente na etapa final da pesquisa, quando um teste de direção realizado por uma empresa independente foi aplicado aos candidatos.

As severas distorções do processo se acentuavam quanto maior era a disposição que os candidatos tinham para pagar privadamente pelos serviços de um despachante. Aqueles que não o fizeram compareceram mais vezes aos escritórios regionais, gastaram mais tempo nos guichês de atendimento e tiveram de falar com um maior número de burocratas. Além disso, 94% dos candidatos sem despachantes foram submetidos a um teste prático de direção, procedimento pelo qual passaram apenas 12% dos candidatos que contrataram esse serviço.

É importante dizer que os pesquisadores não testemunharam diretamente episódios em que despachantes contratados tivessem repassado dinheiro para os burocratas do serviço público (Bertrand et al., 2007BERTRAND, M.; DJANKOV, S.; HANNA, R.; MULLAINATHAN, S. Obtaining a driver´s license in India: an experimental approach to studying corruption. The Quarterly Journal of Economics, v. 122, n. 4, p. 1.639-1.676, 2007., pp. 1.659-1.660). Por outro lado, porém, houve sinais claros de um acordo entre as partes, devido à alta correlação observada entre a contratação de um despachante e a obtenção da licença por motoristas reprovados no teste de direção. Isso levou os pesquisadores a concluírem que os despachantes são um veículo de corrupção ineficiente, seja por onerarem os custos do processo de tramitação, seja por inibirem a reprovação dos maus motoristas.

Os cinco experimentos aqui revistos destacam a contribuição da economia comportamental para o estudo e o combate da corrupção, ao salientar a importância de preferências sociais e disposições recíprocas na explicação do comportamento corrupto. Eles nos dão pistas para aprofundar o debate sobre o lado sombrio da corrupção, como faremos na próxima seção.

5. Implicações para o debate anticorrupção e observações finais

As seções anteriores revisaram as bases teóricas e empíricas do argumento de que a economia comportamental contribui para enriquecer nossa compreensão acerca dos mecanismos subjacentes aos julgamentos e decisões a favor de condutas corruptas. A corrupção tem uma dimensão de crime de cálculo, mas esse traço por si só não a define. Para dar conta de sua complexidade é preciso situá-la em um quadro teórico que dá espaço às limitações da racionalidade e do autointeresse, das quais decorrem as heurísticas e vieses do pensamento automático e as preferências sociais.

Apesar de a evidência experimental acumulada ser insuficiente para a formulação e implementação de políticas mais eficazes, ela oferece novas pistas para expandir a agenda anticorrupção. De todo modo, não podemos subestimar a necessidade de complementar os resultados da pesquisa comportamental com outras abordagens, que consideram as transações corruptas mais como sintomas do que como causas das lacunas existentes nos ambientes de instituições políticas e econômicas (Acemoglu; Robinson, 2012ACEMOGLU, D.; ROBINSON, J. A. Why nations fail: the origins of power, prosperity and poverty. Nova York: Crown Business, 2012.).

A agenda anticorrupção, fortemente inspirada na perspectiva beckeriana de crime e no modelo do agente-principal, tem gerado reformas institucionais interessantes em diversos países e inspirado a adoção de esquemas de controle, transparência e responsabilização nas esferas das empresas e dos governos (Hough, 2013HOUG, D. Corruption, Anti-corruption and Governance. Nova York: Palgrave Macmillan, 2013.). Porém, o alcance limitado dos programas anticorrupção é que justifica os esforços de pesquisa inter e multidisciplinar, dos quais a guinada comportamental é parte integrante (OECD, 2018).

Nesse caso, a primeira lição que a economia comportamental traz para o debate é que a qualidade do diagnóstico do fenômeno multifacetado da corrupção e seu eventual combate dependem da compreensão dos contextos específicos em que os indivíduos estão inseridos e dos mecanismos de reciprocidade que se perpetuam para a consolidação de comportamentos cooperativos. Infelizmente nem sempre a divulgação das consequências perversas da corrupção mostra-se suficiente para convencer os agentes sobre as vantagens de combatê-la. O experimento de Abbink e coautores (2002ABBINK, K.; IRLENBUSCH, B.; RENNER, E. An experimental bribery game. Journal of Law Economics and Organisation, v. 18, n. 2, p. 428-454, 2002.) reforça a conclusão de que a existência de externalidades negativas não tem efeito significativo para a redução das práticas corruptas.

Parte das enormes dificuldades associadas ao enfrentamento da corrupção deve-se ao fato de que ela pode ser interpretada como um problema ou armadilha de ação coletiva (Marquette; Peipper, 2017MARQUETTE, H.; PEIFFER, C. Grappling with the real politics of systemic corruption; theoretical debates versus "real-world functions". Governance, vol.1, no.1, p.1-16, 2017). O próprio combate à corrupção pode ser interpretado como um bem público (Gonçalves; Srinivasan, 2018). Isso é assim porque os ganhos de se viver em uma sociedade livre de corrupção podem ser compartilhados por todos os indivíduos; por outro lado, os custos individuais de embarcar na luta contra a corrupção são mais elevados do que os benefícios de tomar carona nos esforços alheios e ainda preservar uma reputação ilibada. O problema é que se cada indivíduo pensar dessa forma a corrupção persiste. O experimento de Gross e coautores (2018GROSS, J.; LEIB, M.; OFFERMAN, T.; SHALVI, S. Ethical free riding: when honest people find dishonest partners. Psychological Science, v. 29, n. 12, p. 1.956-1.968, 2018.), apresentado na seção anterior, jogou luz sobre o efeito da carona ética.

Uma segunda lição da abordagem comportamental para o debate sobre corrupção é que componentes do pensar rápido e social influenciam a percepção dos incentivos colocados pelo ambiente institucional. Subestimar a interação entre mente e contexto, operando juntos na produção e perpetuação de padrões de comportamento, restringe nossa compreensão sobre por que vários programas de combate à corrupção com políticas one size fits all fracassam e acabam fortalecendo as redes de nepotismo, propina e clientelismo que persistem em inúmeras sociedades (Mungiu-Pippidi, 2006; Hough, 2013HOUG, D. Corruption, Anti-corruption and Governance. Nova York: Palgrave Macmillan, 2013.). Por isso, políticas anticorrupção, informadas pelas contribuições da pesquisa comportamental, devem examinar traços do contexto institucional que incentivam a aceitação e banalização das práticas que desejam coibir. Em determinados contextos caracterizados por grande ambiguidade, perda e privação de recursos (dinheiro, tempo e atenção), os agentes automaticamente exibem comportamentos de curto prazo associados aos ganhos rápidos da desonestidade e corrupção. Em resposta a isso, políticas anticorrupção mais eficazes precisam envolver reformas organizacionais promotoras de maior simplificação, autonomia, transparência e responsabilização dos agentes públicos e privados. Para viabilizar tais transformações, treinamentos de funcionários, gestores e membros da sociedade civil podem ser úteis. Lembretes recorrentes sobre os objetivos compartilhados das organizações e suas aspirações sociais e morais ajudam a coordenar intenções e ações comprometidas com honestidade, impessoalidade e eficiência.

Vale discutir algumas propostas de neutralização dos efeitos deletérios das normas de reciprocidade, entre elas as que favorecem pessoas com base no seu grau de parentesco, amizade, laços de gratidão e identidade de grupo. Os sistemas de reciprocidade, que emergem para baixar os custos elevados das transações em ambientes com falhas de governança, trazem também consequências não pretendidas perversas, como o favoritismo, o clientelismo e até mesmo a corrupção sistêmica.

Mesmo pequenos incentivos monetários colocam as pessoas diante da tentação de uma conduta desonesta exercida de forma cooperativa. Um dos resultados mais significativos do trabalho de Weisel e Shalvi (2015WEISEL, O.; SHALVI, S. The collaborative roots of corruption. PNAS, v. 112, n. 34, p. 10.651-10.656, 2015.) é a constatação de que o participante de seu experimento mentia mesmo quando apenas seu parceiro lucrava com isso. Sendo assim, a desonestidade se retroalimenta, no sentido de que observar um comportamento desonesto torna o indivíduo mais propenso a comportar-se de forma desonesta, com frequência e intensidade maiores.

As pessoas mentem mais quando estão em grupo do que quando estão sozinhas. A identidade de grupo e as expectativas que se criam sobre os tipos de conduta socialmente aceita moldam a percepção e o comportamento dos indivíduos. Além disso, a corrupção corrompe (Fisman; Miguel 2007FISMAN, R.; MIGUEL, E. Cultures of corruption: evidence from diplomatic parking tickets. Journal of Political Economy, v. 115, n. 6, p. 1020-1048, 2007.; Gächter; Schulz, 2016GÄCHTER, S.; SCHULZ, J.F. Intrinsic honesty and the prevalence of rule violations across societies. Nature, v. 531, p. 496-499, 2016.).

Em determinadas sociedades, operadores financeiros, despachantes e lobistas, entre outros intermediários, facilitam as práticas corruptas ao diminuírem as incertezas associadas a elas, reduzindo assim não apenas os custos de fazer determinados negócios como também os custos morais ou psicológicos dos indivíduos que recebem e pagam propinas (Drugov et al., 2013DRUGOV, M.; HAMMAN, J.; SERRA, D. Intermediaries in corruption: an experiment. Working Paper, Florida State University, 2013. Disponível em: http://myweb.fsu.edu/jhamman/doc/Intermediaries.pdf. Acesso em: 20 abr. 2020.
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). A identidade de grupo também pode servir de desculpa ou justificativa para infrações aos códigos de conduta no mundo da administração pública e privada (OECD, 2018).

A literatura de economia comportamental destaca que os indivíduos são seres cooperativos condicionais e por isso preferem escolher seus parceiros sempre que possível. O problema é que isso pode ativar mecanismos de transmissão de condutas transgressoras. Como consequência disso, a corrupção torna-se mais institucionalizada e socialmente aprovada. Fugir de tal armadilha está longe de ser trivial.

Com o propósito de enfraquecer os mecanismos de colaboração recíproca, que dão sustentação para transações corruptas, a agenda anticorrupção deve promover um amplo debate sobre a prerrogativa de denúncia (whistleblowing) e o controverso instituto legal de colaboração premiada (plea bargaining). Ambos dependem de um sistema judicial capaz de minorar de modo transparente e objetivo potenciais conflitos de interesses, com o intuito de evitar que inocentes sejam colocados em risco e impedir que culpados acabem indevidamente beneficiados. Não se pode subestimar o fato de que o delator, em determinados contextos de negociação entre os advogados de defesa e a promotoria pública, pode agir oportunisticamente e dar um testemunho falso (Hollander-Blumoff, 2007).

Ademais, dado o reconhecimento do lado sombrio das preferências sociais, o debate sobre combate à corrupção deve examinar e discutir em que contextos as propostas de rodízio de funcionários do serviço público podem promover integridade e penalizar as trocas corruptas. De acordo com o relatório de integridade da OECD (2018), mudanças frequentes de cargos e funções dificultam a formação e consolidação de redes de reciprocidade promotoras de clientelismo.

Como já destacado, é verdade que a evidência acumulada não é ainda suficientemente robusta, em termos qualitativos e quantitativos, para garantir que políticas nela alicerçadas tenham sucesso em sociedades com trajetórias institucionais diversas. Alcançar esse objetivo demanda uma multiplicação de pesquisas com a mesma pretensão, que leve em conta a diversidade dos cenários em que se dá a cumplicidade na corrupção. Permanecemos ainda bem distantes de um arcabouço unificado para analisar empiricamente os distintos tipos de transações corruptas resultantes de falhas de governança e brechas institucionais. Essa diversidade é um obstáculo visível para uma compreensão adequada do fenômeno (Abbink; Serra, 2015ABBINK, K; SERRA, D. Anticorruption policies: lessons from the lab. New Advances in Experimental Research on Corruption, v. 15, n. 1, p. 77-115, 2015., p. 85).

A despeito dessas limitações, acreditamos que, ao simular ambientes nos quais as escolhas corruptas ocorrem e se reproduzem, a pesquisa comportamental inspira debates sobre políticas potencialmente mais eficazes, mais alinhadas com a realidade decisória dos indivíduos. Os experimentos analisados implicam recomendações de reformas institucionais para o combate à corrupção: canais mais simples e impessoais para o acesso aos serviços públicos, transparência nas regras de licitação de projetos e obras, redução dos excessos de burocracia, redução da ambiguidade dos contratos de trabalho de servidores, avaliação objetiva do desempenho de gestores públicos, entre outras.

A corrupção contamina, e contra ela ainda não há vacina disponível. De todo modo, a literatura que integra economia e psicologia está em perfeita sintonia com um entendimento mais amplo do fenômeno, baseado na visão de que “a luz do sol é o melhor desinfetante; e a luz elétrica o policial mais eficiente” (Lagarde, 2018LAGARDE, C. Iluminar os cantos escuros da má governança e da corrupção. International Monetary Fund Blog, 2018. Disponível em: <https://www.imf.org/external/lang/portuguese/np/blog/2018/042218p.pdf>. Acesso em: 10 maio 2020.
https://www.imf.org/external/lang/portug...
).

Agradecimentos

As autoras agradecem as sugestões e comentários detalhados feitos pelos avaliadores da Nova Economia, que contribuíram de modo significativo para o amadurecimento do produto de nossa pesquisa.

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  • 1
    Dado que o conceito de justiça depende das regras tácitas do jogo que governam as interações humanas, a percepção do que é (in)justo é dependente do contexto e é sensível tanto aos níveis de aspiração dos indivíduos quanto à sua identidade de grupo.
  • 2
    O objetivo principal do artigo de Lambsdorff e Frank (2011LAMBSDORFF, J. G.; FRANK, B. Corrupt reciprocity - experimental evidence on a men’s game. International Review of Law and Economics, v. 31, n. 2, p. 116-125, 2011.) era comparar homens e mulheres em contextos nos quais existe a possibilidade de corrupção. Seus dados mostram que em quase todos os cenários as mulheres são mais resistentes à corrupção. Não é este, porém, o aspecto que queremos discutir aqui.
  • JEL Codes:

    B40, B41, D90.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Fev 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2021

Histórico

  • Recebido
    11 Ago 2020
  • Aceito
    15 Mar 2021
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