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Indicador composto estadual de inovação (ICEI): uma metodologia para avaliação de sistemas regionais de inovação

State Composite Innovation Indicator (SCII): a methodology for evaluating regional innovation systems

Resumo

A sistematização metodológica de levantamento de dados, compilação e agregação de Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação tem se mostrado um componente importante na formulação e avaliação de políticas públicas. Assim, o objetivo deste artigo é apresentar uma metodologia de construção do Indicador Composto Estadual de Inovação que permita avaliar o desempenho inovativo dos sistemas regionais de inovação. Os procedimentos utilizados foram: investigação por materiais bibliográficos, adaptação da metodologia proposta pelo European Innovation Scoreboard e apuração das bases de dados disponíveis no sistema estatístico brasileiro. A metodologia do Indicador Composto Estadual de Inovação revelou potencialidades e fragilidades nas distintas dimensões dos sistemas regionais de inovação brasileiros. Entre elas, em São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de Janeiro, constataram-se forças em recursos humanos e sistema de pesquisa, no Amazonas, por outro lado, há fragilidades nessas mesmas dimensões e destaque em inovadores e ocupações.

Palavras-chave:
Dispêndio em ciência; tecnologia e inovação; atividade inovativa; impacto

Abstract

The methodological systematization of data collection, compilation and aggregation of Science, Technology and Innovation Indicators has proved to be an important component in the formulation and evaluation of public policies. Thus, the aim of this article is to present a methodology for the construction of the State Composite Innovation Indicator that allows evaluating the innovative performance of regional innovation systems. The procedures used were: research by bibliographic materials, adaptation of the methodology proposed by the European Innovation Scoreboard and calculation of the databases available in the Brazilian statistical system. The methodology of the State Composite Innovation Indicator revealed strengths and weaknesses in the different dimensions of Brazilian regional innovation systems. Among them, in São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná and Rio de Janeiro, there were strength in human resources and research system, in the Amazon, on the other hand, there are weaknesses in these same dimensions and highlighting innovators and occupations.

Keywords:
Expenditure on Science; Technology and Innovation; Innovative Activity; Impact

1 Introdução

Há consenso na literatura sobre a complexidade do fenômeno que cerca a ocorrência da inovação e de sua importância para o desenvolvimento socioeconômico dos países. Ao longo do século XX, avanços conceituais e teóricos contribuíram para melhor compreensão dos diversos elementos constitutivos desse fenômeno sistêmico, envolvendo esforços inovativos internos aos diversos atores e entre eles, além de incorporar conhecimentos científicos mais avançados, bem como outros tipos de aprendizado, baseados na experiência do desenvolvimento das atividades inovativas.

Os estudos sobre indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) acompanharam esses avanços. No período pós-Segunda Guerra Mundial, a sistematização conceitual e os princípios metodológicos se iniciaram pelos indicadores de insumo ao processo inovativo, com ênfase na mensuração dos recursos humanos e financeiros em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Nesse período, as atuações da Fundação Nacional da Ciência dos Estados Unidos e da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foram decisivas para internacionalização do levantamento padronizado dos indicadores de C&T, que passaram, a partir dos anos de 1980, a ampliar seu escopo ao propor quantificar resultados e impactos que atividades de C&T poderiam promover na sociedade. Assim, outros indicadores se consolidaram, entre eles: patentes, balanço de pagamentos tecnológico, bibliométricos e recursos humanos em C&T (Godin, 2005GODIN, B. The linear model of innovation: the historical construction of an analytical framework, Project on the History and Sociology of STI Statistics, Working Paper no. 30, 2005.; Godin, 2007).

Nos anos de 1990, as atuações da OCDE junto à Comissão Europeia inauguraram a fase da emergência de indicadores de inovação voltados para coleta e publicações de informações sobre as atividades de inovações realizadas pelas empresas. Nesse período, a Comissão Europeia iniciou a primeira pesquisa (survey) de inovação aplicada em âmbito internacional, denominada Community Innovation Survey (CIS), (Arundel, 2007), e colocava em prática as metodologias de coleta de dados de inovação sugeridas na primeira edição do Manual de Oslo, publicado em 1993 pela OCDE. Com esses avanços, a partir dos anos 2000, OCDE e Comissão Europeia já levantavam diversos indicadores de CT&I, publicando-os em relatórios que, em comum, buscavam construir um painel de avaliação dos sistemas inovativos. Também passaram a praticar o benchmarking, pelo qual comparam sistematicamente o desempenho com “o melhor do mundo” como forma de obter informações que contribuam na definição de medidas para melhorar a própria atividade. (Barré, 2004). Não obstante, Grupp e Mogee (2004GRUPP, H.; MOGEE, M. H. Indicators for national science and technology policy: how robust are composite indicators? Research Policy, v. 33, p. 1373-1384, 2004.) identificaram um traço distinto na trajetória da Comissão Europeia, que passou a desempenhar papel ativo no desenvolvimento de metodologias de agregação desses indicadores, sintetizando-os num indicador composto de inovação, pelo qual a prática de benchmarking também passou a ser utilizada para respaldar o cumprimento de metas de longo prazo de políticas públicas de inovação.

Como resposta a essas políticas, a Comissão Europeia lançou o European Innovation Scoreboard (EIS), visando monitorar o alcance das metas de inovação estabelecidas em março de 2000 pela Estratégia de Lisboa, que depois foi substituída pela Europe 2020 em 2010. No ano 2000, um piloto do EIS foi proposto pela compilação de dezesseis indicadores e, no ano seguinte, novos indicadores foram incorporados e depois agregados, resultando no Summary Innovation Index (SII). Com base no SII, cada país foi classificado em relação à média obtida pelos países membros da União Europeia. Desde então, com exceção do piloto de 2000 e da insuficiência de dados em 2002, o SII tem sido apresentado anualmente, com o objetivo de criar uma série histórica que permita acompanhar o desempenho das forças e fragilidades dos sistemas nacionais de inovação (European Comission, 2001; European Comission, 2003).

À luz das experiências internacionais, contata-se que países mais comprometidos com políticas de CT&I tendem a monitorar seus avanços na área utilizando-se também dos indicadores de CT&I (Grupp; Mogee, 2004GRUPP, H.; MOGEE, M. H. Indicators for national science and technology policy: how robust are composite indicators? Research Policy, v. 33, p. 1373-1384, 2004.).

O mapeamento dos indicadores sinaliza como o Brasil está aquém nesse monitoramento. O MCTI sistematiza um conjunto amplo de indicadores de CT&I (Hollanda, 2003; Mugnaini, Jannuzzi, Quoniam, 2004), entre eles: dispêndio em C&T e P&D, estimativa dos dispêndios das instituições com cursos de pós-graduação stricto sensu, recursos humanos em ciência, bolsas de graduação e pós-graduação concedidas no país e no exterior, bibliométricos, patentes e inovação (MCTI, 2018).

No entanto, percebe-se o enfoque na cobertura nacional, apresentando para o recorte subnacional apenas os indicadores de dispêndios em C&T. Para coleta de outros indicadores estaduais de CT&I, é necessário acessá-los pelos portais dos ministérios e institutos públicos, como Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Instituto Nacional de Propriedade Nacional (INPI), nos quais constam dados associados à CT&I. Já no portal da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) há relatórios e tabelas previamente sistematizadas de indicadores de CT&I, restritos ao Estado de São Paulo, mas com propostas metodológicas consistentes, atreladas às diretrizes internacionais e às particularidades regionais (Beneli, 2019BENELI, D. S. O Indicador Composto de Inovação: proposta metodológica para os estados brasileiros. 2019. 272 f. Tese (Doutorado) - Departamento de Política Científica e Tecnológica, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2019. 1 1 Este artigo foi elaborado a partir da tese de doutorado defendida por Daniela Scarpa Beneli. Todos os dados apresentados foram produzidos na pesquisa que resultou na referida tese e na qual pode ser encontrada, em maiores detalhes, a descrição e o mapeamento dos dados utilizados na construção dos indicadores de CT&I para o nível estadual e os passos metodológicos aplicados na construção do Indicador Composto Estadual de Inovação (ICEI). ).

Para os indicadores compostos, o MCTI não adota a prática de agregar os indicadores de CT&I, as iniciativas de agregação são provenientes de estudos realizados por pesquisadores de universidades e de organizações públicas associadas à pesquisa. Com recorte nacional, há os estudos de Furtado et al. (2007) e do CGEE (2015) e no âmbito subnacional observam-se propostas metodológicas de Rocha e Ferreira (2004ROCHA, E. M. P.; FERREIRA, M. A. T. Indicadores de ciência, tecnologia e inovação: mensuração dos sistemas de CTeI nos estados brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 33, n. 3, p.61-68, 2004.), Santos (2011SANTOS, E. C. C. Índice estadual de ciência, tecnologia e inovação como contribuição à melhoria da capacidade de gerência pública. Nova Economia, p. 399-421, 2011.) e Collet (2012COLLET, L. Mensuração das Inovações: construção de um Índice de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICT&I) para os estados brasileiros. 2012. 111f. Dissertação (Mestrado em Economia do Desenvolvimento) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012.). No caso subnacional, os estudos apresentaram deficiências na coleta e agregação dos indicadores de CT&I, no geral, relacionadas à ausência de transparência metodológica e de determinadas técnicas estatísticas (Beneli, 2019BENELI, D. S. O Indicador Composto de Inovação: proposta metodológica para os estados brasileiros. 2019. 272 f. Tese (Doutorado) - Departamento de Política Científica e Tecnológica, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2019.).

A escassez de indicadores e suas falhas de cobertura são ainda mais evidentes ao nível dos estados da federação. No entanto, em um país de dimensão continental como o Brasil, em que estados possuem dimensão geográfica e populacional semelhante a países de porte médio, faz todo o sentido desenvolver indicadores de CT&I em nível estadual. Essa escala do fenômeno regional no caso brasileiro permite inferir que no nível subnacional constituem-se sistemas regionais de inovação (SRI), cujas características precisam ser melhor entendidas por meio de indicadores de CT&I.

Isso posto, o objetivo deste artigo é apresentar uma metodologia de construção do Indicador Composto Estadual de Inovação (ICEI) e, por ela, avaliar o desempenho inovativo dos SRIs, apontando forças e fragilidades do processo inovativo. Essa metodologia se desenvolveu através da investigação por materiais bibliográficos, adaptação da metodologia proposta pelo EIS e apuração das bases de dados disponíveis no sistema estatístico brasileiro. Entre os materiais bibliográficos utilizados, a construção do ICEI seguiu recomendações sintetizadas no relatório Handbook on Constructing Composite Indicators: Methodology and User Guide, que propõe a aplicação de dez passos metodológicos, abrangendo a descrição do modelo teórico que fundamenta a seleção dos indicadores (passo 1) e a aplicação de procedimentos estatísticos que substituam as decisões arbitrárias aplicadas nas metodologias do indicador composto (passos 2 a 10). Entre esses procedimentos, recomenda-se a utilização de uma metodologia de seleção dos dados, aplicação de diferentes técnicas de imputação de dados, análise multivariada, normalização, agregação e análise de incerteza e de sensibilidade. São procedimentos científicos que tornam o indicador composto mais robusto e representativo do fenômeno que se pretende medir. E, assim, associando a fundamentação teórica com as técnicas estatísticas, o processo de construção do indicador se torna mais transparente evitando a manipulação e o uso inadequado do mesmo (OECD, 2008).

Este artigo está divido em quatro seções, incluída esta introdução. A segunda demonstra a longa trajetória de construção da metodologia do ICEI, que seguiu as dez recomendações mencionadas anteriormente. A terceira seção avalia o desempenho dos SRIs, apontando forças e fragilidades das UFs do Brasil. Por fim, a última seção apresenta as considerações finais.

2 O processo de construção do indicador composto estadual de inovação (ICEI)

O detalhamento metodológico do processo de construção do ICEI salienta as dificuldades de compilação de dados e a falta de sistematização das informações que, muitas vezes, já demonstram as fragilidades de nosso SNI e, assim, exige que sejam consideradas as especificidades do país e de maturidade de sua estrutura de inovação no desenvolvimento da metodologia do indicador composto.

2.1 Caracterização das fontes bibliográficas e de dados

O ICEI originou de uma trajetória metodológica processual, em que cada etapa de construção foi retroalimentada por materiais bibliográficos e pelo mapeamento da disponibilidade de estatísticas para recorte estadual brasileiro.

Pela pesquisa bibliográfica, foi possível apontar a emergência dos indicadores de CT&I no âmbito internacional como elemento de políticas públicas. Adicionalmente, foram identificadas metodologias de elaboração de indicadores de CT&I e de sua agregação, sobretudo, em diretrizes conceituais e metodológicas desenvolvidas pela OCDE, como o Manual de Frascati (OECD, 2015), o Manual de Oslo (OECD, 2005) e o Handbook on Constructing Composite Indicators (OECD, 2008).

Normalmente, os indicadores compostos são construídos e publicados por organizações internacionais ou por instituições públicas (Iizuka; Hollanders, 2017), mas, no Brasil, as práticas de construção de indicador composto de inovação foram desenvolvidas por pesquisadores.

A análise detalhada dos estudos com recorte estadual revelou avanços importantes. Rocha e Ferreira (2004ROCHA, E. M. P.; FERREIRA, M. A. T. Indicadores de ciência, tecnologia e inovação: mensuração dos sistemas de CTeI nos estados brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 33, n. 3, p.61-68, 2004.), Santos (2011SANTOS, E. C. C. Índice estadual de ciência, tecnologia e inovação como contribuição à melhoria da capacidade de gerência pública. Nova Economia, p. 399-421, 2011.) e Collet (2012COLLET, L. Mensuração das Inovações: construção de um Índice de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICT&I) para os estados brasileiros. 2012. 111f. Dissertação (Mestrado em Economia do Desenvolvimento) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012.) desenvolveram alguns passos metodológicos que inspiraram a construção do ICEI, entre eles: seleção de indicadores, normalização e agregação. Todavia, as distintas bases de dados e seleções dos indicadores, além da detecção de dificuldades metodológicas nesses estudos, refletem o estágio ainda incipiente na prática de compilação e agregação de indicadores de CT&I no nível estadual.

Sobre as dificuldades metodológicas, Rocha e Ferreira (2004ROCHA, E. M. P.; FERREIRA, M. A. T. Indicadores de ciência, tecnologia e inovação: mensuração dos sistemas de CTeI nos estados brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 33, n. 3, p.61-68, 2004.) não aplicaram técnicas de imputação, alguns indicadores são de 1996 e outros de 2002, fato que comprometeu a interpretação dos resultados do indicador composto estadual. No indicador estadual de inovação proposto por Santos (2011SANTOS, E. C. C. Índice estadual de ciência, tecnologia e inovação como contribuição à melhoria da capacidade de gerência pública. Nova Economia, p. 399-421, 2011.) há problemas de acessibilidade nos dados extraídos da Pesquisa de Inovação (PINTEC). Collet (2012COLLET, L. Mensuração das Inovações: construção de um Índice de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICT&I) para os estados brasileiros. 2012. 111f. Dissertação (Mestrado em Economia do Desenvolvimento) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012.) enfrentou as mesmas dificuldades de imputação levantadas por Rocha e Ferreira (2004), além de inconsistência metodológica por dupla contagem ao incluir os indicadores dispêndio estadual em C&T e dispêndio estadual em P&D, já que C&T decorre da soma de ACTC e P&D. A metodologia desenvolvida na construção do ICEI superou essas dificuldades.

Em paralelo à pesquisa bibliográfica, realizaram-se esforços de mapeamento por fontes estatísticas regulares, que garantissem a transparência metodológica do ICEI e sua replicação em estudos futuros. Ainda assim, foram necessários esforços na forma de proposição metodológica e solicitação de tabulação especial, permitindo captar indicadores de CT&I que representassem a inovação estadual de forma ampla, incorporando dados sobre insumos, resultados e impactos das atividades inovativas. Como os dados provêm de fontes distintas, como os Ministérios da Economia, da Educação e da Ciência, Tecnologia e Inovação, além das fontes internacionais de produção científica, como a Web of Science, cujas diretrizes temporais e de coleta são definidas de forma particular, houve obstáculos para a coleta temporal para abranger todas as UFs. O caso emblemático ocorreu com os dados coletados pela PINTEC, na qual a regionalização da coleta se define naquelas UFs que possuem um valor agregado estadual representativo.

Por essa razão, no ICEI, foram agregadas somente as empresas do setor industrial, pois o setor de serviços apresentou baixa representatividade. Adicionalmente, determinadas UFs só puderam ser analisadas de forma agregada, como as regiões Norte e Nordeste, cujos dados individuais estavam ausentes. No caso do Distrito Federal, decidiu-se excluí-lo como uma unidade de pesquisa, em razão de suas características estarem mais associadas ao sistema político e levarem os dados, da PINTEC e das outras fontes, a enviesarem a análise das demais UFs. Dessa forma, os critérios do desenho amostral da PINTEC acabaram por determinar a composição das UFs analisadas pelo ICEI, que contemplou dezessete recortes geográficos, formados por Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Amazonas, Pará, Bahia, Ceará, Pernambuco, com o restante das UFs, com exceção do Distrito Federal (DF), sendo agregadas nas unidades Demais Norte e Demais Nordeste.

No que se refere ao ano analisado, definiu-se 2014 como ano de coleta pela disponibilidade de dados em todas as bases mapeadas. Mais uma vez, a PINTEC foi determinante, pois, como sua coleta é trienal, no momento da coleta de dados do ICEI o último dado publicado era do ano de 2014. Mas, nesse caso, outra restrição temporal foi colocada pelos dados sobre exportações de serviços que só estão discriminados a partir de 2014.

2.2 O processo de escolha da estrutura de indicadores de CT&I: aplicando os passos um a três

A metodologia de construção do ICEI embasou-se nos dez passos sugeridos em OCDE (2008). Como primeiro passo, optou-se pelo SRI como referencial teórico. O SRI representa um conceito multidimensional, foi desenvolvido por Cooke (2001COOKE, P. Regional innovation systems, clusters, and the knowledge economy. Industrial and Corporate Change, Oxford University Press, v. 10, n. 4, p. 945-974, 2001.) e apresenta cinco características: regional, inovação, rede, aprendizado e interação. O regional considera a unidade política de nível meso, que pode ser estabelecida no nível estadual, capaz de intervir e suportar o desenvolvimento econômico, sobretudo fomentando a inovação. A inovação compreendida como a comercialização de novos conhecimentos relacionados a produtos, processos e organizacionais, que são testados de forma empírica pelas empresas. As redes se apresentam nas relações de cooperação entre os atores que em conjunto habilitam seus membros a buscarem interesses em comum. O aprendizado, sobretudo o institucional, quando novos níveis e tipos de conhecimento, habilidades e capacidades podem ser enraizadas nas rotinas e convenções das firmas e nas organizações que suportam a inovação. A interação é constituída por formas regulares de encontros formais e informais ou pelo estabelecimento de formas de comunicação voltadas para a inovação.

Como forma de analisar o SRI, Autio (1998AUTIO, E. Evaluation of RTD in regional systems of innovation, European Planning Studies, [s.l.], pp. 131-140, 1998.) e Tödtling e Trippl (2005TÖDTLING, F.; TRIPPL, M. One size fits all? Research Policy, [s.l.], v. 34, n. 8, p.1203-1219, out. 2005. Elsevier BV. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2005.01.018. Acesso em: 11 fev. 2022.
http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2005....
) propõem representá-lo por um esquema (Figura 1), estruturado sob dois subsistemas que, por sua vez, estão inseridos num ambiente socioeconômico.

O primeiro subsistema é composto por instituições associadas à geração e difusão do conhecimento, constituindo uma infraestrutura de apoio regional, basicamente composta por quatro tipos de organizações: I) as instituições mediadoras tecnológicas, provendo padrão regulatório, viabilizando testes, normalização, metrologia e licenciamento de propriedade industrial, configurando, em cada UF, o Instituto Nacional de Propriedade Industrial e o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial; II) os institutos de pesquisa federais e estaduais em campos de conhecimento distintos, como o Instituto de Pesquisa Tecnológico do Estado de São Paulo e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária; III) as instituições de ensino superior, com destaque para as universidades que, além de ofertarem recursos humanos qualificados, cumprem função importante no desenvolvimento de pesquisas científicas; IV) por último, estão as diversas instituições atuantes no marco jurídico, que regulam as relações trabalhistas e contratuais.

Figura 1
Esquema representativo do conceito de sistema regional de inovação

Já o segundo subsistema, em que predomina a aplicação e exploração do conhecimento, é formado pela estrutura produtiva estadual, considerando sua capacidade de apropriar-se dos fluxos de conhecimentos interno e externos às empresas. A apropriação pode ocorrer via laboratórios empresariais internos de P&D e/ou pelas formas de interação com o entorno, via concorrência ou cooperação, que se pode estabelecer entre clientes, fornecedores, contratantes e competidores. Essa estrutura produtiva pode se revelar na forma de um ou mais clusters, associados a indústrias distintas (Tödtling; Trippl, 2005TÖDTLING, F.; TRIPPL, M. One size fits all? Research Policy, [s.l.], v. 34, n. 8, p.1203-1219, out. 2005. Elsevier BV. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2005.01.018. Acesso em: 11 fev. 2022.
http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2005....
).

Fluxos contínuos de recursos, capital humano e conhecimentos dentro dos subsistemas e entre eles potencializam a criação e difusão de conhecimentos, tornando o SRI mais propenso a inovar. O caráter sistêmico do SRI se apresenta na realização desses fluxos, estabelecidos por algum grau de interdependência entre as instituições, voltadas para geração e colaboração de conhecimento (Tödtling; Trippl, 2005TÖDTLING, F.; TRIPPL, M. One size fits all? Research Policy, [s.l.], v. 34, n. 8, p.1203-1219, out. 2005. Elsevier BV. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2005.01.018. Acesso em: 11 fev. 2022.
http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2005....
). Ao mesmo tempo, todo esse conjunto é influenciado pelas medidas de incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento científico e tecnológico promovidas pelas políticas estaduais e federais. O SRI, assim, está constituído por todas as relações que se estabelecem entre os subsistemas, os fluxos de conhecimento e de pessoas e as políticas estaduais.

Mas o SRI não é autossuficiente, o processo inovativo estadual é influenciado pelas interações entre os atores nacionais e internacionais, conforme retratado pelos fluxos interativos externos ao SRI. Num contexto de intensa competitividade internacional e de rápidas mudanças tecnológicas, muitas vezes, as empresas locais precisam sustentar sua capacidade inovativa, inserindo-se em redes de inovação que viabilizem o acesso a novas ideias, conhecimentos e tecnologias não disponíveis no espaço estadual. Dessa forma, muitas empresas locais se mantêm competitivas sustentadas por complementaridades viabilizadas por relações externas, que extrapolam aquelas inerentes ao SRI (Tödtling; Trippl, 2005TÖDTLING, F.; TRIPPL, M. One size fits all? Research Policy, [s.l.], v. 34, n. 8, p.1203-1219, out. 2005. Elsevier BV. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2005.01.018. Acesso em: 11 fev. 2022.
http://dx.doi.org/10.1016/j.respol.2005....
).

O esquema, quando retrata a atuação conjunta dos diversos atores no SRI, constitui uma forma de abstrair as dimensões dos processos inovativos das UFs, com o intuito de identificar potencialidades e deficiências organizacionais e/ou institucionais, além da presença ou não de fluxos de conhecimentos dentro e entre os subsistemas, utilizando-se, para isso, dos sinais a serem captados pelos indicadores de CT&I.

O segundo passo metodológico envolveu a seleção dos indicadores de CT&I para conformar a estrutura do ICEI, incorporando as recomendações da OECD (2008) e da UNCTAD (2010), além da experiência da Comissão Europeia e as especificidades do sistema estatístico brasileiro, resultando numa estrutura formada por quatro pilares, dez dimensões e dezessete indicadores de CT&I, conforme discriminado no Quadro 1.

O primeiro pilar corresponde às Condições Estruturais, refere-se ao primeiro subsistema do SRI e reflete, predominantemente, a infraestrutura de apoio estadual à CT&I, com destaque para atuação das universidades e institutos de pesquisa públicos. Esse pilar é composto pelas dimensões Recursos Humanos (RH) em C&T e Excelência do Sistema de Pesquisa, cujos indicadores representam os insumos ao sistema inovativo e captam a intensidade com que as UFs atuam na geração e difusão de conhecimento. A dimensão RH em C&T está subdividida nos indicadores doutores, mestres e graduados e mensura a capacidade das IES, localizadas nas UFs, de ofertarem recursos humanos qualificados aos múltiplos atores do SNI. A dimensão Excelência do Sistema de Pesquisa está representada pelo indicador produção de artigos científicos publicados na Web of Science.

O segundo pilar representa os Dispêndios em CT&I e abrange os investimentos público e privado, discriminando-os em duas dimensões: a primeira corresponde ao Dispêndio público estadual em C&T e mensura os gastos públicos oriundos do orçamento estadual e executados pelas instituições estaduais associadas ao sistema de C&T, discriminando-os em P&D e Atividades Científicas e Técnicas Correlatas (ACTC), nos quais estão incluídos, por exemplo, os recursos com bolsas de pesquisa de graduação e de pós-graduação concedidas pelas fundações de amparo e os investimentos aplicados na manutenção de universidades, museus, institutos de pesquisa, pesos e medidas e estatística. Essa dimensão capta unicamente os esforços financeiros do orçamento estadual e realizados pelas instituições de C&T presentes em cada UF, não incluindo os investimentos oriundos do orçamento federal. Destaca-se que, em virtude de sua natureza pública, essa dimensão também reflete indiretamente as políticas públicas estaduais, as quais definem a magnitude desses valores destinados à C&T, como ocorre com o orçamento destinado à concessão de bolsas de pesquisa pelas fundações de amparo à pesquisa.

A segunda dimensão desse segundo pilar quantifica o Dispêndio Empresarial nas Atividades Inovativas, desdobrando-o em P&D interna e em outras Atividades Inovativas que não P&D interna, os quais revelam os esforços financeiros em inovação realizados pela indústria estadual, atores presentes no segundo subsistema do SRI. Assim, os dois primeiros pilares captam parte da infraestrutura de apoio à CT&I e constituem insumos potencializadores dos fluxos de conhecimento e de capital humano entre os dois subsistemas do SRI.

O terceiro pilar representa as Atividades Inovativas de geração, difusão, exploração e aplicação do conhecimento, refletindo amplamente os esforços e o desempenho dos atores presentes nos dois subsistemas. A dimensão Inovadores capta a capacidade de inovar da estrutura produtiva industrial presente em cada UF por quantificar as empresas que realizam inovações, com ou sem cooperação com outras organizações. Essa dimensão é formada por três indicadores, os dois primeiros captam a Taxa de Inovação, subdivididos nos tipos de inovação de produto e/ou processo e organizacional e/ou de marketing. O terceiro indicador corresponde à Taxa de Cooperação, que mensura quanto das empresas inovadoras pesquisadas pela PINTEC realizaram atividades inovativas em cooperação com empresas ou instituições. Sob o olhar do esquema do SRI, esses três indicadores revelam os resultados auferidos pela indústria estadual e as relações sistêmicas entre os atores do primeiro e segundo subsistemas.

Ainda no terceiro pilar, a segunda dimensão mensura a intensidade com que as empresas e instituições efetivam a proteção dos resultados decorrentes de suas atividades inovativas e inclui três indicadores: patentes, marca e desenho industrial, que quantificam os registros dos instrumentos formais utilizados para proteger a propriedade industrial. Esses indicadores constituem uma proxy dos resultados das atividades inovativas realizadas pelos atores do SRI, considerando, assim, aqueles presentes nos dois subsistemas. Por último, o quarto pilar representa os impactos das atividades inovativas e também está subdividido em duas dimensões: i) Ocupações em CT&I revela como os atores empregam trabalhadores em ocupações que demandam nível elevado de educação formal, como engenheiros e físicos, e/ou capacitações tácitas e específicas; ii) Exportações Intensivas em Tecnologia e em Conhecimento, formada por dois indicadores que mensuram as exportações de bens e serviços agregados por conteúdo científico e tecnológico. No esquema do SRI, esses indicadores revelam a capacidade da estrutura produtiva estadual (segundo subsistema) de gerar receitas com vendas no comércio internacional.

Quadro 1
Os pilares, as dimensões e os indicadores do Indicador Composto Estadual de Inovação

Ainda no processo de escolha dos Indicadores de CT&I, o terceiro passo propõe analisar a necessidade de imputação de dados. No ICEI optou-se por fonte de dados regulares e, no caso dos dados especificamente derivados da PINTEC, a indisponibilidade de informações para algumas UFs exigiu a aplicação de duas estimativas: I) os dados de Mato Grosso do Sul estavam somados com os do DF e, para separá-los, foi estimado o valor adicionado pela indústria em 2014 naquele estado; II) devido à inexistência de dados para algumas UFs que não compunham critérios para composição da amostra, foram utilizadas estimativas regionais, determinadas pela PINTEC, o que levou à necessidade de agrupamento nas unidades denominadas Demais Norte (Acre, Amapá, Rondônia, Roraima e Tocantins) e Demais Nordeste (Alagoas, Maranhão, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe).

2.3 Metodologia de cálculo do ICEI e análise estatística da robustez da estrutura de Indicadores de CT&I: aplicação dos passos quatro a dez

À medida que os indicadores e seus dados foram mapeados e definidos (passos um a três), cada estrutura resultante foi testada pela aplicação da análise multivariada, que corresponde ao passo quatro proposto pela OECD (2008). O intuito dessa análise foi avaliar o comportamento dos dados e definir pela melhor composição de indicadores de CT&I. O resultado dos dois primeiros componentes da análise dos componentes principais explicaram 57,21% da variabilidade dos indicadores, demonstrando o bom ajuste dos dados. Na correlação de Spearman foram realizadas dois tipos de associações, a primeira associou cada indicador com o indicador composto calculado para o respectivo pilar, já a segunda associou cada indicador com o ICEI. Nos resultados das associações, grande parte dos indicadores apresentaram correlações positivas e acima de 0,5 e naqueles indicadores de correlação negativa os valores não foram representativos por apresentarem p-valor elevado, revelando um comportamento direcionador capaz de avaliar o SRI de cada UF (Beneli, 2019BENELI, D. S. O Indicador Composto de Inovação: proposta metodológica para os estados brasileiros. 2019. 272 f. Tese (Doutorado) - Departamento de Política Científica e Tecnológica, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2019.).

Além disso, é importante destacar que a análise multivariada também contribuiu para se chegar na estrutura de indicadores de CT&I definitiva, fundamentando escolhas iniciais e conduzindo ajustes estatisticamente consistentes com o objetivo de mensurar de forma mais adequada o SRI. Entre aqueles estudos apontados na Introdução, apenas o desenvolvido pelo CGEE (2015) se valeu da análise multivariada para conduzir a contrução do indicador composto de inovação. Por isso, a metodologia do ICEI demonstra melhor fundamentação estatística em comparação, por exemplo, aos estudos de Rocha e Ferreira (2004ROCHA, E. M. P.; FERREIRA, M. A. T. Indicadores de ciência, tecnologia e inovação: mensuração dos sistemas de CTeI nos estados brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 33, n. 3, p.61-68, 2004.), Santos (2011SANTOS, E. C. C. Índice estadual de ciência, tecnologia e inovação como contribuição à melhoria da capacidade de gerência pública. Nova Economia, p. 399-421, 2011.) e Collet (2012COLLET, L. Mensuração das Inovações: construção de um Índice de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICT&I) para os estados brasileiros. 2012. 111f. Dissertação (Mestrado em Economia do Desenvolvimento) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012.).

Os passos cinco e seis envolveram, respectivamente, a normalização e agregação, procedimentos que resultaram no cálculo do ICEI. Seguindo experiências nacionais e internacionais na construção de indicadores compostos de inovação (Rocha; Ferreira, 2004ROCHA, E. M. P.; FERREIRA, M. A. T. Indicadores de ciência, tecnologia e inovação: mensuração dos sistemas de CTeI nos estados brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 33, n. 3, p.61-68, 2004.; Santos, 2011SANTOS, E. C. C. Índice estadual de ciência, tecnologia e inovação como contribuição à melhoria da capacidade de gerência pública. Nova Economia, p. 399-421, 2011.; Collet, 2012COLLET, L. Mensuração das Inovações: construção de um Índice de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICT&I) para os estados brasileiros. 2012. 111f. Dissertação (Mestrado em Economia do Desenvolvimento) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2012.; CGEE, 2015), optou-se pelo método mínimo e máximo na normalização e pela atribuição de pesos iguais no que se refere à agregação.

Para ilustrar, no caso do Indicador Novos Doutores, as UFs pertencentes à Demais Norte e ao Rio Grande do Sul apresentaram valores, respectivamente, mínimos e máximos de 0,000011 e 0,000413. A partir desses valores, a normalização foi aplicada pelo valor específico no indicador de cada UF, subtraído do valor mínimo, depois o resultado foi dividido pela amplitude entre os valores máximo e mínimo. Amazonas, por exemplo, obteve o valor de 0,000052, então, a normalização ocorreu da forma como se apresenta na Fórmula 1.

Fórmula 1 - Normalização aplicada no Indicador Composto Estadual de Inovação

N o r m a l i z a ç ã o A m a z o n a s = V a l o r A m a z o n a s V a l o r M í n i m o V a l o r M á x i m o V a l o r M í n i m o = 0,000052 0,000011 0,000413 0,000011 = 0,102 (1)

A fórmula foi aplicada nas demais UFs e em todos os indicadores, levando ao escalonamento dentro desse intervalo. Além das dezessete unidades amostrais, a normalização e o escalonamento foram aplicados para o Brasil, representado pelos valores do país em cada indicador de CT&I, incluindo, no caso, o DF. Depois de normalizados os indicadores de CT&I, cada UF obteve um desempenho médio correspondente ao ICEI, determinando dezoito posições, por ordem decrescente de desempenho do SRI.

Após o cálculo do ICEI e da classificação do desempenho inovativo dos SRIs, seguiu-se com a análise de incerteza e de sensibilidade, representando o passo sete. Para essa análise, foram criados catorze novos cenários, envolvendo compilações distintas dos Indicadores de CT&I e, em seguida, foram calculados novamente os respectivos indicadores compostos, classificando-os novamente entre a primeira e a décima oitava posição. Para analisar a proximidade dessas posições com o ICEI, bem como a variabilidade com que ocorriam nos catorze cenários, foram calculadas a mediana e a moda das posições (Beneli, 2019BENELI, D. S. O Indicador Composto de Inovação: proposta metodológica para os estados brasileiros. 2019. 272 f. Tese (Doutorado) - Departamento de Política Científica e Tecnológica, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2019.).

Nos catorze cenários, a moda e a mediana das posições de cada UF se igualaram à sua respectiva posição auferida no ICEI, demonstrando robustez metodológica diante da baixa sensibilidade às mudanças. Mato Grosso do Sul, por exemplo, considerando todas as posições obtidas nos cenários, obteve mediana e moda igual a dez, que corresponde exatamente àquela posição determinada no ICEI, mas essa UF também se posicionou em nono e em décimo segundo (Beneli, 2019BENELI, D. S. O Indicador Composto de Inovação: proposta metodológica para os estados brasileiros. 2019. 272 f. Tese (Doutorado) - Departamento de Política Científica e Tecnológica, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2019.).

O passo oito envolve a decomposição analítica, ou seja, propõe explorar a metodologia definida para o ICEI e elaborar resultados de forma mais discriminada. A primeira decomposição seguiu a experiência e os critérios propostos pela Comissão Europeia na elaboração do EIS, que consistiu em avaliar o sistema de inovação em grupos: líderes, seguidores, moderados e modestos. Como critério de composição desses grupos, adotou-se como referência a média do Brasil, correspondente a 0,482, e classificou-se o SRI de cada UF da seguinte forma: inovadores líderes compondo valores acima de 20% da média (maior que 0,58); seguidores, com valores no intervalo de 120% e 90% da média (0,58 e 0,43); moderados, valores abaixo de 90% e 50% da média (0,43 e 0,24); e, por fim, os modestos, com desempenho abaixo de 50% da média (menor que 0,24) (Figura 2).

A Figura 2, além de apresentar a classificação, destaca os grupos em escalas de cinza distintas, com o intuito de identificar como as UFs estão alocadas entre líderes, seguidores, moderados e modestos. O preto destaca a média para o Brasil.

Com os critérios de desempenho por grupos, aplicou-se a segunda forma de composição análitica, reunindo as UFs por cada grupo de desempenho e agregando-as por peso igual nos indicadores de CT&I pertencentes a cada uma das dimensões, resultando em médias de desempenho (Figura 3). Percebe-se que as UFs dos grupos líderes e seguidores apresentaram desempenho mais uniforme em todas as dimensões, nas quais obtiveram valores médios entre 0,5 e 0,9. Já as UFs do grupo moderados apresentaram índices entre 0,1 e 0,4, enquanto o grupo dos inovadores modestos obteve desempenho aquém, apresentando valores entre 0,03 e 0,27.

Figura 2
Classificação do Indicador Composto Estadual de Inovação: 2014

Figura 3
Desempenho médio dos grupos de inovadores nas dimensões do Indicador Composto Estadual de Inovação: 2014

O passo nove sugere relacionar o ICEI com outros indicadores. Para aplicá-lo optou-se por correlacionar os valores obtidos no ICEI com o PIB per capita e com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), auferindo valores de 0,7 em cada correlação. Pelas Figuras 4 e 5 percebe-se que as UFs melhor classificadas no ICEI também tendem a apresentar maior PIB per capita e melhor IDH. Diante da coerência nessas correlações, é possível ratificar a robustez da metodologia do ICEI que, além de estatisticamente consistente, revelou aderência com outros índices reconhecidos.

Por fim, o passo dez propõe apresentar os resultados obtidos de forma clara e precisa, envolvendo diferentes tipos de gráficos (em barra, radar e de dispersão), apresentando o ICEI, os resultados discriminados por dimensões, além da correlação com o PIB per capita e com o IDH.

Figura 4
Relação entre PIB per capita e o Indicador Composto Estadual de Inovação

Figura 5
Relação entre Índice de Desenvolvimento Humano e o Indicador Estadual de Inovação

3 Avaliação do Sistema Regional de Inovação Brasileiro pelo ICEI

Os dez passos explicados definiram a metodologia de construção do ICEI, permitindo avaliar o desempenho dos SRIs das UFs e apontar suas forças e fragilidades.

3.1 A interpretação dos Índices do Sistema Regional de Inovação e do Índice do Brasil

Para avaliar de forma detalhada o SRI, a agregação ocorreu de forma distinta, em vez de aplicá-la aos dezessete Indicadores de CT&I, classificando as UFs pelos valores obtidos no ICEI, optou-se por agregar subconjuntos de indicadores pertencentes a cada uma das dimensões, quando estas eram formadas por pelo menos dois indicadores. Nas dimensões formadas por apenas um indicador, a classificação pode ser feita a partir da normalização, o que possibilitou valorar cada indicador entre 0 e 1, como ocorreu em Excelência do Sistema de Pesquisa e Ocupações em CT&I. Nas demais dimensões, formadas por mais de um indicador, após a normalização foi necessário agregar os indicadores por dimensão.

Com esses resultados, foi possível avaliar o desempenho das UFs e do Brasil, relacionando os valores obtidos entre elas. Assim, naquelas dimensões com um indicador, a UF com valor 0,0 corresponde ao pior desempenho e aquela com 1,0 representa a melhor. Para as dimensões com mais de um indicador, o intervalo pode ou não ocorrer entre 0,0 e 1,0, pois cada valor resulta da média aritmética entre aqueles indicadores que a compõem.

Para se obter uma referência de avaliação dos SRIs, foram utilizados os índices de desempenho no âmbito nacional, cujos valores representam o desempenho mediano do país em cada dimensão do ICEI, conforme valores apresentados na Figura 6. É importante destacar que o primeiro critério analisado foi se o índice da dimensão de cada UF esteve acima, igual ou abaixo da média do Brasil e, depois, analisaram-se os desempenhos pelas posições auferidas nos indicadores e nas dimensões. A partir desses resultados, a próxima subseção traz a avaliação dos SRIs, seguindo a classificação das UFs apresentada no Figura 2.

Figura 6
Desempenho mediano do Brasil nas dimensões do Indicador Composto Estadual de Inovação: 2014

3.2 Avaliação do Sistema Regional de Inovação das Unidades Federativas

As UFs Líderes se caracterizam pelo índice resultar 20% acima do ICEI do Brasil, estão entre a primeira e terceira colocadas, representadas, respectivamente, por São Paulo, Rio Grande do Sul e Paraná. Os SRIs dessas UFs se mostraram homogêneos, pois a maioria das dimensões apresentou índices acima ou próximos àqueles do Brasil (Figura 7).

O SRI de São Paulo apresentou índices acima da média do Brasil nas oito dimensões, foi caracterizado como homogêneo por compor amplamente bons indicadores de insumos, resultados e impactos nas atividades inovativas e por revelar bom desempenho dos diversos atores presentes nos dois subsistemas, o de geração e difusão do conhecimento e o de exploração e aplicação do conhecimento. Compondo o primeiro subsistema, o estado obteve destaque em RH em C&T e em Excelência do Sistema de Pesquisa, representatividade clara dos institutos de pesquisa estadual e das universidades no fornecimento de recursos humanos de qualidade e na produção científica de alcance internacional. O estado liderou também no indicador Dispêndio público em P&D, refletindo os significativos esforços financeiros de origem estadual realizados na manutenção das universidades e dos institutos de pesquisa e nos incentivos à pesquisa científica para graduação e pós-graduação concedidos pela Fapesp. Por outro lado, apresentou baixo desempenho no indicador Dispêndio público em ACTC (décima sexta posição), revelando a baixa aplicação de recursos financeiros na operação, por exemplo, de museus e bibliotecas.

Na atuação dos atores do segundo subsistema, o setor produtivo paulista apresentou posições de destaque das empresas industriais inovadoras em Dispêndio Empresarial nas Atividades Inovativas e Inovadores, sobretudo, nos indicadores de Dispêndio Empresarial em P&D interna e na Taxa de Inovação de Produto e/ou Processo, além da liderança na dimensão Exportações Intensivas em Tecnologia e em Conhecimento, refletindo competência da estrutura produtiva para se inserir no comércio internacional. No entanto, identificou-se menor desempenho no indicador Taxa de Cooperação, apontando deficiências na promoção de relações sistêmicas entre os atores do SRI.

Figura 7
Desempenho nas dimensões das UFs Líderes no Indicador Composto Estadual de Inovação: 2014

O destaque no desempenho em Ativos de Propriedade Intelectual demonstra capacidade do SRI paulista de se apropriar, por mecanismos formais, dos conhecimentos científicos e tecnológicos gerados no estado. Enquanto na dimensão Ocupações de CT&I, em quarta colocação, percebe-se um potencial de ampliação do emprego em ocupações associadas às atividades inovativas ao considerar a ampla diversidade produtiva do estado, pois o envolvimento das tarefas produtivas em rotinas de inovação tende a ampliar a produtividade e a competividade das empresas.

O SRI do Rio Grande do Sul também evidencia um sistema homogêneo. Nas dimensões RH em C&T e Excelência do Sistema de Pesquisa, ele se assemelha ao estado de São Paulo, com ressalva do indicador Novos Graduados, cuja sexta posição revela que há potencial para melhorar a oferta de recursos humanos nesse nível educacional. Já na dimensão Dispêndio Público em C&T, o índice baixo aponta fragilidades e a necessidade de desenvolver uma governança regional através de políticas estaduais de fomento à C&T, principalmente, nas atividades de P&D. Portanto, o desempenho dos atores do primeiro subsistema na oferta de recursos humanos e produção científica comparativamente à média nacional indica boa capacidade de geração e difusão do conhecimento, mas também que há espaço para alavancar mais essas áreas por meio da ampliação dos instrumentos de fomento.

No segundo subsistema do SRI gaúcho, os índices das dimensões superaram a média brasileira. Em Inovadores, o estado se destacou nos indicadores Taxa de Inovação de Produto e/ou de Processo (terceira) e Taxa de Cooperação (segunda), revelando uma estrutura industrial propensa a inovar e interagir. Esse desempenho foi possível mesmo com índices menores nos indicadores Dispêndio Empresarial em Atividades Inovativas e Dispêndio das empresas inovadoras do setor industrial nas atividades internas de P&D. As dimensões que envolvem a atuação conjunta dos atores de ambos os subsistemas revelaram forças do estado, os desempenhos em Ativos de Propriedade Industrial e em Ocupações em CT&I demonstram que os atores possuem capacidade de se apropriar dos conhecimentos gerados e de empregar pessoas nas atividades inovativas, o que contribui com os resultados de destaque obtidos na dimensão Inovadores.

O SRI do Paraná foi caracterizado como homogêneo por se aproximar dos índices nacionais, com destaques no desempenho dos atores pertencentes ao primeiro subsistema, principalmente em RH em C&T, com ênfase em Novos Graduados e em Dispêndio Público em C&T, demonstrando esforços estaduais importantes, sobretudo naqueles direcionados para P&D. Outro destaque se deu na apropriação dos conhecimentos científicos e tecnológicos, com a dimensão Ativos de Propriedade Industrial posicionando-se na terceira posição.

A fragilidade do estado pode ser notada na estrutura produtiva industrial que se revelou pouco propensa a realizar esforços inovativos e, associado a isso, apresentou baixos resultados nas dimensões Dispêndio Empresarial nas Atividades Inovativas e em Atividades Inovativas. No segundo subsistema, o único destaque ocorreu no Indicador Exportação de serviço intensivo em conhecimento, que ficou na primeira posição.

O grupo das UFs Seguidoras apresentou o ICEI entre 120% e 90% do ICEI do Brasil, classificando-as entre a quarta e oitava colocada. Santa Catarina e Rio de Janeiro ficaram em quarto e quinto, a média brasileira se posicionou em sexto e, por fim, Amazonas e Minas Gerais ficaram em sétimo e oitavo (Figura 8).

O SRI de Santa Catarina apresentou índices próximos aos do Brasil, caracterizado como homogêneo, porém apresentou maior variabilidade entre os índices. Nos índices associados ao primeiro subsistema, destacam-se RH em C&T, com a ressalva de Novos Doutores, que ficou em sexta posição. O Dispêndio público em C&T reflete uma força do estado, sobretudo, pela proeminência no indicador Dispêndio em ACTC. Nos índices envolvendo os atores do segundo subsistema, despontaram fragilidades do sistema inovativo, principalmente, da estrutura industrial, pois em Dispêndio Empresarial em Atividades Inovativas e em Inovadores o estado apresentou índices baixos. O mesmo ocorreu com Exportações Intensivas em Tecnologia e Conhecimento, apesar de o índice Exportação de bens intensivos em tecnologia ter ficado mais bem posicionado, o baixo desempenho em Exportação de serviço intensivo em conhecimento foi marcante.

É interessante notar que em Ativos de Propriedade Industrial o estado obteve destaque assim como em Ocupações em CT&I. Percebe-se, assim, que apesar das fragilidades no setor produtivo, há atuação importante na apropriação dos conhecimentos científicos e tecnológicos, incluindo os diversos atores do SRI, como as instituições públicas mediadoras que viabilizam a apropriação, além dos agentes que realizam o depósito de patentes e os registros de marcas e desenho industrial, com destaque para as empresas, as universidades e os indivíduos.

O SRI do Rio de Janeiro demonstrou um sistema homogêneo, com índices próximos à média do Brasil e destaques nos índices associados ao primeiro subsistema, que caracterizam a infraestrutura de pesquisa. Em RH em C&T, os destaques foram nos Indicadores Novos Doutores e Novos Mestres, em segunda posição, e mesma colocação em Excelência do Sistema de Pesquisa. Já em Dispêndio público em C&T, atingiu a quarta posição no indicador Dispêndio em P&D, mas em Dispêndio em ACTC ficou em décima quinta colocação. No âmbito dos atores do segundo subsistema, o desempenho foi mediano, com destaques na dimensão Inovadores, especialmente, devido à Taxa de Inovação Organizacional e/ou de Marketing. Nas dimensões Ativos de Propriedade Industrial e Exportações, os destaques foram, respectivamente, Marca registrada e Exportação de serviços intensivas em conhecimento, que ficaram em quarta posição. Em linhas gerais, o SRI fluminense apresenta insumos na forma de recursos humanos, financeiros e de produção científica, mas detém uma estrutura produtiva com espaço para desenvolvimento das atividades e dos resultados inovativos.

O SRI do Amazonas, entre as UFs dos grupos líderes e seguidoras, é aquele com desempenho mais irregular entre as dimensões, configurando um sistema heterogêneo. Em três das oito dimensões revelou índices proeminentes. Os baixos índices ocorreram nas dimensões RH em C&T e em Excelência do Sistema de Pesquisa, revelando fragilidades na atuação dos atores do primeiro subsistema, com insuficiências na oferta de recursos humanos e na geração de conhecimentos científicos e tecnológicos.

Por outro lado, nas dimensões que envolvem os atores do segundo subsistema o desempenho foi mediano em Dispêndio Empresarial em Atividades Inovativas, destacando-se no indicador de Dispêndio das empresas inovadoras nas atividades internas de P&D, e em Inovadores revelou sua força, pois apresentou o maior índice em todos os indicadores, por fim, em Exportações Intensivas em Tecnologia e Conhecimento se destacou no Indicador Exportação de bens intensivos em tecnologia. Nas dimensões que envolvem atores de ambos os subsistemas, constata-se baixo desempenho em Ativos de Propriedade Industrial, colocado em décima quinta posição, mas sua posição melhora em Ocupações em CT&I. Essa discrepância entre o alto desempenho em Inovadores, Ocupações e Exportações, associado ao desempenho aquém em Ativos de Propriedade Industrial, aponta para o fato de as empresas de alta tecnologia instaladas no estado pouco buscarem os instrumentos de apropriação do conhecimento, provavelmente, porque o fazem nas unidades empresariais localizadas em outras UFs, limitando sua atuação à produção, diante dos estímulos fiscais concedidos regionalmente, sobretudo, aos fluxos de exportação e importação.

Figura 8
Desempenho nas dimensões das UFs Seguidoras no Indicador Composto Estadual de Inovação: 2014

Para finalizar o grupo das seguidoras, Minas Gerais apresenta um SRI homogêneo, demonstrando, no geral, desempenho mediano. Fragilidades se mostraram nos baixos índices nas dimensões Dispêndio Público em C&T e Dispêndio Empresarial em Atividades Inovativas, bem como em todos os indicadores que as compõem, ocupando entre oitava e décima primeira colocação e revelando a necessidade de ampliar esforços financeiros de natureza pública e privada no estado. O mesmo comportamento foi observado no indicador Exportação de bens intensivos em tecnologia, em décima posição. O destaque se deu em Inovadores e nos seus indicadores, que se posicionaram entre quarta e quinta colocações, demonstrando uma indústria propensa a inovar e a estabelecer relações sistêmicas em seu entorno. Assim, o SRI de Minas Gerais configura uma estrutura produtiva propensa a inovar, mas seu potencial poderia ser alavancado com maiores esforços financeiros e em recursos humanos, se implementados por seus atores nas atividades inovativas.

As UFs pertencentes aos grupos moderadas e modestas apresentaram índices predominantemente abaixo da média do Brasil, caracterizando-os com SRIs incompletos. É importante ressaltar que a incompletude não representa a inexistência de elementos do processo inovativo, mas se caracteriza pelo baixo nível de desenvolvimento desses elementos (Figuras 9 e 10). A despeito das especificidades estaduais, há diversas deficiências no processo inovativo estadual, associadas às condições estruturais para geração e difusão de conhecimentos científicos e tecnológicos, bem como aos resultados e à realização das atividades inovativas pela indústria e pelos atores envolvidos na apropriação dos conhecimentos científicos e tecnológicos. Contata-se, assim, baixo desempenho inovativo dos atores em ambos os subsistemas.

Os ICEIs das UFs Moderadas apresentaram valores dentro do intervalo 90% a 50% do ICEI do Brasil, com posições entre oitavo e décimo quarto, abrangendo, respectivamente, as UFs: Pernambuco, Mato Grosso do Sul, Bahia, Goiás, Espírito Santo, Ceará e Mato Grosso (Figura 9).

O SRI de Pernambuco apresenta apenas duas dimensões com índices acima da média do Brasil: Dispêndio Empresarial em Atividades Inovativas, que obteve a liderança no indicador Dispêndio das empresas inovadoras nas atividades que não P&D interna; e Exportações Intensivas em Tecnologia e Conhecimento, no qual o destaque decorreu do índice Exportação de bens intensivos em tecnologia em segunda posição. Os índices na dimensão Inovadores e nos indicadores que a compõem foram baixos. Percebe-se, no geral, uma estrutura produtiva com ampla escassez de insumos na forma de fluxos de conhecimentos científicos e tecnológicos e baixos resultados inovativos, mas com destaques pontuais nos dispêndios empresariais e no fluxo internacional de bens.

Figura 9
Desempenho nas dimensões das UFs Moderadas no Indicador Composto Estadual de Inovação: 2014

No caso do SRI do Mato Grosso do Sul, apenas a Dimensão Inovadores obteve índice acima da média do Brasil, com liderança em Taxa de Cooperação, porém com baixos índices nos demais indicadores que a compõem. Associados aos atores de ambos os subsistemas, o estado obteve boas posições nos indicadores: Novos Mestres (quinta), Artigos per capita (oitava), Dispêndio estadual em P&D (quinta), e Dispêndio das empresas inovadoras nas atividades inovativas outras que não P&D (terceira). No geral, o SRI também revela baixos resultados e impactos inovativos, mas com desempenho mediano no fomento humano e financeiro, além de ótimo desempenho da indústria na promoção de relações de cooperação.

O SRI da Bahia também demonstrou muitas fragilidades, a única dimensão com índice acima da média do Brasil foi Dispêndio público em C&T, com destaque em Dispêndio Estadual em ACTC (segunda posição), enquanto manteve-se mediano em Dispêndio Estadual em P&D (oitava colocação), Dispêndio das empresas inovadoras nas atividades internas de P&D (sétima), Taxa de Cooperação (sexta) e Exportação de serviço intensivo em conhecimento (sexta). Esses desempenhos revelam que há algum fomento financeiro realizado pelos atores de ambos os subsistemas e, indiretamente, via políticas públicas estaduais, além de sinais de cooperação da indústria com esses atores e do impacto no fluxo internacional de serviços, mas os baixos índices nas demais dimensões enfraquecem seu sistema inovativo, configurando-o como incompleto.

Os SRI de Goiás, Espírito Santo e Ceará apresentaram índices abaixo da média do Brasil em quase todas as dimensões, com algumas especificidades reveladas sobretudo naqueles indicadores associados aos insumos financeiros. No caso do SRI de Goiás, as dimensões Dispêndio Empresarial em Atividades Inovativas e Inovadores se aproximaram da média do Brasil, em virtude, respectivamente, do Dispêndio das empresas inovadoras nas atividades inovativas outras que não P&D e da liderança em Taxa de Inovação Organizacional e/ou de Marketing, demonstrando que há, na indústria, esforços e resultados inovativos pontuais.

As UFs Modestas obtiveram o ICEI menor que 50% do ICEI do Brasil, formadas por ordem de classificação por Demais Nordeste, Demais Norte2 2 Ressalta-se que os SRIs das UFs que pertencem às unidades Demais Nordeste e Demais Norte correspondem apenas a uma avaliação média, diante da ausência de dados para elaboração de todos os indicadores de CT&I. e Pará (Figura 10). A incompletude dos SRIs é generalizada entre as dimensões, nenhum índice ficou acima da média do Brasil e poucos índices ficaram mais bem posicionados entre os indicadores.

O SRI da unidade Demais Nordeste sobressaiu-se no indicador Dispêndio estadual em ACTC, com a terceira posição nesse grupo, além de Dispêndio das empresas inovadoras nas atividades inovativas outras que não P&D interna (sexta), Taxa de Inovação Organizacional e/ou de Marketing (quarta) e Exportação de serviço intensivo em conhecimento (sétima). Constata-se, então, um sistema inovativo frágil, com esforços financeiros singelos e estrutura produtiva com resultados e impactos pontuais.

Figura 10
Desempenho nas dimensões das UFs Modestas no Indicador Composto Estadual de Inovação: 2014

Nos SRIs da unidade Demais Norte, a incompletude é ampla, com alguma relevância, frente aos demais desse grupo, nos desempenhos dos Indicadores Novos Graduados Titulados e Exportação de serviço intensivo em conhecimento, configurando um sistema inovativo muito pouco estruturado diante dos baixos índices nos demais indicadores. Por fim, muitas fragilidades caracterizam o SRI do Pará que apresentou pequena projeção nos Indicadores Dispêndio estadual em ACTC e Dispêndio das empresas inovadoras nas atividades inovativas outras que não P&D.

4 Considerações finais

A longa trajetória empreendida na construção metodológica do ICEI revelou a limitada sistematização dos indicadores de CT&I no Brasil, limitação esta que se intensifica na análise estadual. Nesse sentido, o ICEI representou uma contribuição também quanto à compilação de informações para o espaço estadual, proporcionando uma metodologia replicável em futuros estudos. Mas sua principal contribuição foi construir uma ferramenta de análise da estrutura de CT&I das UF, que, por meio das dimensões distintas dos SRI, categoriza quatro grupos de avaliação do desempenho inovativo, sendo eles líderes, seguidoras, moderadas e modestos.

O ICEI confirma, na área de CT&I, a heterogeneidade estrutural das regiões brasileiras, desequilíbrio já constatado em outras áreas, como a socioeconômica. As dimensões de análise do ICEI permitem avaliar cada ponto da estrutura de CT&I da UF, oferecendo subsídios aos tomadores de decisão na construção de propostas direcionadas a sanar deficiências e aproveitar as potencialidades, assim como buscar o equilíbrio necessário para o desenvolvimento científico e tecnológico do estado, potencializando seu crescimento econômico a médio e longo prazo.

Ao revelar baixos desempenhos em determinadas dimensões dos SRIs, os atores pertencentes a esses sistemas podem desenvolver práticas inovativas mais direcionadas às necessidades daquela localidade, contribuindo na alocação dos recursos públicos e privados com vistas, por exemplo, a fomentar recursos humanos mais qualificados, promover a inserção das estruturas produtivas no mercado internacional e desenvolver a infraestrutura de apoio à geração e difusão de conhecimento. Naquelas de melhor desempenho, contribui para avaliação de políticas públicas e respalda a tomada de decisões dos diversos atores presentes nos sistemas de inovação regional e nacional na definição de novas prioridades para o desenvolvimento local.

Partindo do conceito da inovação como um fenômeno multifacetado, a agregação dos indicadores de CT&I que compõem as oito dimensões do ICEI, propiciaram um panorama do SRI de cada UF, revelando forças e fragilidades inerentes a cada sistema, cuja composição lhe confere um caráter único e próprio. Fica evidente, portanto, que a metodologia de compilação e de agregação dos Indicadores de CT&I no presente estudo contribui para a compreensão das particularidades de cada SRI e constitui uma ferramenta importante na formulação e no monitoramento de políticas públicas mais adequadas a cada localidade. Além disso, os indicadores estaduais de CT&I podem constituir séries estatísticas que permitam análises comparativas e avaliação da evolução ou mudança estrutural de cada SRI, favorecendo o desenvolvimento da economia brasileira.

Agradecimento

O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

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  • Códigos JEL:

    O30, R11, R58, C38.
  • JEL Codes:

    O30, R11, R58, C38.
  • 1
    Este artigo foi elaborado a partir da tese de doutorado defendida por Daniela Scarpa Beneli. Todos os dados apresentados foram produzidos na pesquisa que resultou na referida tese e na qual pode ser encontrada, em maiores detalhes, a descrição e o mapeamento dos dados utilizados na construção dos indicadores de CT&I para o nível estadual e os passos metodológicos aplicados na construção do Indicador Composto Estadual de Inovação (ICEI).
  • 2
    Ressalta-se que os SRIs das UFs que pertencem às unidades Demais Nordeste e Demais Norte correspondem apenas a uma avaliação média, diante da ausência de dados para elaboração de todos os indicadores de CT&I.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    29 Maio 2021
  • Aceito
    04 Jan 2022
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