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Um Retrato de uma Licenciatura em Matemática a Distância sob a Ótica de seus Alunos Iniciantes

SANTOS, S. C.. Um Retrato de uma Licenciatura em Matemática a Distância sob a Ótica de seus Alunos Iniciantes. 2013. 208f. Tese (Doutorado em Educação Matemática). Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro: 2013. Orientador: Marcelo de Carvalho Borba

Em sua tese, Silvana Claudia dos Santos teve por objetivo principal investigar de que modo um curso de Licenciatura em Matemática a distância se mostra a seus alunos iniciantes, dentro de um contexto dos polos presencias. De maneira mais específica, Santos teve como foco o CEDERJ** ** Centro de Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro. e utilizou uma abordagem qualitativa de pesquisa, fundamentando-se no estudo das narrativas coletadas durante sua pesquisa. Para tal, a autora realizou visitas de campo a alguns polos, em diferentes regiões do Estado do Rio de Janeiro, realizando entrevistas junto aos alunos iniciantes, tutores presenciais e diretores desses polos. Ao estruturar sua tese, Santos optou por fugir do modelo tradicional de tese, pensando na ideia de um livro, onde inicialmente contextualizou sua pesquisa e os capítulos seguintes abordavam temas específicos, com Referencial Teórico, Dados e Análise próprios para cada um desses temas.

No capítulo 1, a autora apresenta uma caracterização do contexto de sua pesquisa, inicialmente justificando a escolha pelo CEDERJ devido ao seu pioneirismo na oferta de cursos para formação de professores de Matemática a distância no Brasil. Segundo a autora, a metodologia adotada pelo CEDERJ é semipresencial, sendo o polo, muitas vezes, a única referência física para que os alunos possam realizar atividades presenciais obrigatórias do curso. Outro aspecto identificado foi a pouca interação entre alunos e professores responsáveis pelas disciplinas, tanto como com alunos de outros polos.

A autora lembra que o CEDERJ possuía, no momento de sua coleta de dados, trinta e três polos de apoio presencial espalhados em todo o Estado, dessa forma inviabilizando a visita a todos, ou seja, Santos optou por realizar sua pesquisa nos polos de Angra dos Reis, Itaperuna e Bom Jesus do Itabapoana, apresentando a estrutura física e a dinâmica de cada um desses polos.

Para o registro das entrevistas foram utilizados recursos de áudio e vídeo. O método de entrevista escolhido foi o semiestruturado, possibilitando aos seus entrevistados discorrerem sobre um tema, verbalizando seus pensamentos, tendências e reflexões, sendo que a autora relata algumas dificuldades enfrentadas durante as entrevistas, como por exemplo, a falta de tempo dos alunos devido ao desenvolvimento de outras atividades pelos mesmos.

No segundo capítulo, Santos nos apresenta os sujeitos de sua pesquisa, alunos iniciantes do curso. A pesquisadora entrevistou trinta alunos, sendo vinte ingressantes. O contato com os estudantes se deu durante sua imersão na pesquisa, ou seja, não houve um contato inicial entre pesquisadora e alunos, sendo que o único critério de seleção para a participação foi o fato de serem alunos iniciantes no curso. Além de entrevistas, a pesquisadora utilizou procedimentos de observação e aplicação de questionário, consolidando assim um perfil dos licenciandos dos polos visitados.

A pesquisadora, entre outras coisas, argumenta que durante as entrevistas todos os estudantes “mencionaram gostar de Matemática” (p.42), mas que nem todos tinham o interesse em seguir uma carreira docente ao fim do curso, alguns relataram o interesse pela Licenciatura em Matemática para aprimorarem seus conhecimentos nessa área, aumentando assim, as chances de aprovação em concursos públicos.

Além disso, a autora discute as perspectivas dos alunos com relação ao curso de Licenciatura em Matemática do CEDERJ e suas visões para o futuro. Segundo ela, além de uma formação docente, alguns alunos demonstraram interesse em uma formação para a pesquisa, além de uma abertura para o trabalho em outras nas quais a Matemática esteja presente, ampliando assim as possibilidades para o mercado de trabalho.

No capítulo 3, o papel do tutor e da tutoria na formação dos futuros professores de Matemática é discutido pela autora da pesquisa. Santos inicia o capítulo afirmando a consolidação e a eficácia do ensino a distância, além de afirmar que não cabe mais a discussão sobre prós e contras dessa modalidade de ensino, mas sim “encará-la como uma realidade já concretizada, realizando pesquisas que possam, de alguma forma, apontar caminhos visando à qualidade dos cursos que vêm sendo oferecidos” (p.78).

Sobre o tutor, a autora lembra que uma ampla discussão já foi iniciada sobre o tema e que algumas pesquisas vêm discutindo aspectos ligados à prática desse profissional. Entre essas pesquisas, um tema muito abordado, segundo a autora, é a questão do papel desse sujeito na formação do aluno na EaD. Outro debate polêmico seria se o tutor poderia ou não ser considerado um professor ou docente.

Em seguida, a autora da pesquisa nos traz informações sobre o sistema de tutoria do CEDERJ. Segundo ela, a equipe de tutoria do CEDERJ é responsável por planejar, gerenciar e organizar todo o processo de tutoria dos cursos do consórcio. Apesar de existirem tutoria presencial e a distância no curso, as entrevistas revelaram que o segundo tipo pouco foi abordada pelos alunos. Segundo a autora,

Ao que parece, os alunos atribuem uma grande importância às tutorias presenciais e, de modo geral, veem na figura desse tutor a principal, ou talvez a única, referência no curso do que seria um docente (p.87).

Santos também realiza uma discussão acerca de tutoria e aula dentro do contexto do CEDERJ. De acordo com a autora, o sistema de tutoria não prevê aulas, e sim encontros presenciais, que se tornam momentos promotores do ensino e da aprendizagem, sendo considerados de extrema importância pelos alunos. A autora observa que o tutor não possui as mesmas atribuições de um professor universitário, mas atua diretamente em uma de suas funções, no caso o ensino. Santos ainda reflete sobre uma discussão inesgotável sobre se o tutor deve ou não ser considerado professor e que tal discussão deve ser retomada à luz do conceito de polidocência (MILL, 2010MILL, D. Sobre o Conceito de Polidocência ou Sobre a Natureza do processo de Trabalho Pedagógico na Educação a Distância. In.: MILL, D.; RIBEIRO, L. R. C.; OLIVEIRA, M. R. G. (Org.). Polidocência na Educação a Distância: múltiplos enfoques. São Carlos: EdUFSCAR, 2010. p. 23-40.).

Outro ponto importante mencionado no capítulo é a grande quantidade de ex-alunos do CEDERJ que optou por continuar como tutores, pois, segundo os estudantes, conseguem oferecer uma tutoria mais próxima de suas realidades.

No capítulo que segue, os métodos e concepções quanto ao sistema de avaliação proposto pelo CEDERJ é o foco da discussão da autora. Segundo Santos, quando o assunto é avaliação da aprendizagem, o debate tem se mostrado inesgotável e essa discussão não é privilégio do ensino a distância.

A visão punitiva e seletiva de avaliação não tem favorecido ou contribuído com a formação dos estudantes, segundo a autora. Além disso, pouco se pode traduzir aos professores em termos do que se está realmente sendo aprendido pelos alunos ou se sua prática docente tem tido algum reflexo nessa aprendizagem.

Citando Viel (2011)VIEL, S. R. Um Olhar Sobre a Formação de Professores de Matemática a Distância: o caso do CEDERJ/UAB. 2011. 218f. Tese (Doutorado em Educação Matemática) – Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2011., a autora escreve que a avaliação no CEDERJ ocorre através de um processo contínuo englobando três procedimentos: “Exercícios Avaliativos (EAs), Avaliações a Distância (ADs) e Avaliações Presenciais (APs)” (p.121), sendo que os tutores presenciais são os responsáveis pelas correções das avaliações a distância e, contraditoriamente, não tem participação nenhuma nas avaliações presenciais, sendo que essa participação dos tutores é defendida pelos alunos entrevistados na pesquisa.

Dessa forma, a pesquisadora, a partir dos dados coletados, não sugere grandes objeções com relação à avaliação presencial no curso por parte dos alunos, mas lembra que os mesmos questionam o fato de que esta seja de responsabilidade de um docente que não acompanha de forma contínua o desenvolvimento dos alunos.

O capítulo 5 da tese traz a evasão como foco principal da discussão. Nele a autora faz uma discussão sobre as possíveis causas que têm levado a um alto número de evasão nos cursos oferecidos a distância, apresentando pesquisas que versem sobre a temática e, segundo a autora, havendo uma convergência com os dados analisados em sua pesquisa.

Segundo a autora, três motivos emergiram durante sua pesquisa como causa da evasão no curso de Licenciatura em Matemática do CEDERJ, a saber: a dificuldade na adaptação com a modalidade a distância; a Matemática em si; e situações externas ao curso, como problemas pessoais dos alunos.

A autora recomenda uma discussão mais aprofundada que considere outros aspectos, além da modalidade educacional, de modo a estudar quais as possíveis causas da evasão, avaliando as consequências dessa evasão, além de repensar propostas de ações para serem implementadas, visando buscar mudanças desta realidade e não apenas reiterando os altos índices conhecidos.

Em suas conclusões finais, Santos, além de tecer comentários sobre a EaD no Brasil, as políticas públicas que a regem e situar o CEDERJ dentro desse contexto, nos traz que a EaD no Brasil é uma modalidade em pleno crescimento, principalmente com o advento das Tecnologias da Informação e Comunicação e, dessa forma, as pesquisas relacionadas a EaD têm ganhando grande espaço no meio acadêmico. Algo que chama a atenção da autora é que, apesar da modalidade passar por um grande crescimento, existe uma diminuição da procura por cursos de licenciatura, acompanhando a tendência do ensino presencial.

Outra observação realizada pela autora diz respeito a não pretensão de alguns alunos em seguir a carreira docente após a conclusão do curso, ou seja, mesmo possuindo interesse pela Matemática, esses alunos se sentiam desmotivados pela desvalorização da profissão. Silvana Santos também destaca em suas palavras finais a questão da tutoria no CEDERJ. Ela relembra que o tutor a distância é pouco valorizado em detrimento da tutoria presencial que, segundo os alunos entrevistados, é a principal referência docente no curso, havendo ainda divergências sobre o seu papel.

Considero a tese de Silvana Santos de extrema relevância, já que traz a percepção de alunos iniciantes de um curso de Licenciatura em Matemática a distância. Apesar de sua pesquisa ter sido desenvolvida no CEDERJ, suas contribuições podem ser apreciadas em outros contextos da Educação a Distância, como na Universidade Aberta do Brasil, que ao ser criada, teve como referência o consórcio fluminense.

A tese é rica em discussões teóricas, atende ao seu objetivo e ainda sugere novos caminhos para pesquisas. Acredito que a Matemática poderia ter sido mais explorada pela autora, já que a própria disciplina foi levantada pela autora como uma das dificuldades desses alunos, como por exemplo, discutindo de que forma o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) pode facilitar ou dificultar o aprendizado da Matemática. Aliás, o AVA utilizado no CEDERJ poderia também ter sido discutido por Santos.

De maneira geral, recomendo a leitura da tese aos interessados nas discussões que permeiam a educação a distância, principalmente por nos trazer o olhar dos alunos iniciantes da Licenciatura em Matemática, podendo dessa forma nos apresentar as impressões que os alunos recém-ingressos no curso possuem da Licenciatura em Matemática a distância.

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    Centro de Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro.

Referências

  • MILL, D. Sobre o Conceito de Polidocência ou Sobre a Natureza do processo de Trabalho Pedagógico na Educação a Distância. In.: MILL, D.; RIBEIRO, L. R. C.; OLIVEIRA, M. R. G. (Org.). Polidocência na Educação a Distância: múltiplos enfoques. São Carlos: EdUFSCAR, 2010. p. 23-40.
  • VIEL, S. R. Um Olhar Sobre a Formação de Professores de Matemática a Distância: o caso do CEDERJ/UAB. 2011. 218f. Tese (Doutorado em Educação Matemática) – Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2011.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2016
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