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Estratégias de Consagração e de Valorização da Matemática por meio da OBMEP

Strategies for the Consecration and Appreciation of Mathematics through OBMEP

Resumo

Neste artigo apresentamos alguns resultados de pesquisa sobre a Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas, a OBMEP. Trata-se da maior olimpíada de Matemática do mundo, promovida e organizada por matemáticos de formação, abrangendo escolas de mais de 99% dos municípios do Brasil. O objetivo do artigo é apresentar uma visão sociológica desta competição, de acordo com o referencial teórico-metodológico de Pierre Bourdieu (1930-2002). Com base em um desenho do campo da matemática é possível interpretar a OBMEP como uma estratégia dos matemáticos para valorizar, consagrar e legitimar o seu modo de fazer e de ver a Matemática, impondo essa visão à escola. São analisados documentos, como cartazes, sites de divulgação, artigos e outros materiais de domínio público. Por meio dessa análise, compreendemos que existem práticas de inculcação de crenças, de valorização e de legitimação de uma Matemática, a acadêmica. Veicula-se também, por meio da OBMEP, que é essa Matemática que é base e alavanca para o desenvolvimento científico e tecnológico do País.

Olimpíada de Matemática; Campo da Matemática; Matemática Escolar; Matemática Acadêmica; Campo Científico

Abstract

It is presented in this article some research results on the Brazilian Public Schools Mathematics Olympiads, OBMEP (Portuguese acronym). It is the largest Mathematics Olympiads worldwide, promoted and organized by trained mathematicians, covering schools in more than 99% of the municipalities in Brazil. The article aims to present a sociological view of this competition, according to the theoretical-methodological framework of Pierre Bourdieu (1930-2002). Based on a design in the mathematics field, it is possible to interpret OBMEP as a strategy for mathematicians to value, enshrine, and legitimize their way of doing and seeing mathematics, imposing it on the school. Documents such as posters, dissemination sites, articles, and other materials in the public domain are analyzed. The analysis shows that there are practices of inculcating beliefs, valuing, and legitimizing academic mathematics. It is also conveyed, through OBMEP, that academic mathematics is the basis and lever for the scientific and technological development of the country.

Mathematics Olympiads; Field of Mathematics; School mathematics; Academic Mathematics; Scientific field

1 A OBMEP e a consagração do campo da Matemática: introduzindo o tema

A Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) é realizada desde 2005 e tem como objetivo estimular o estudo da Matemática entre alunos e professores do Brasil e, ainda, identificar, motivar e encaminhar jovens talentos para a área de ciência e tecnologia, como indicado em seu regulamento 1 1 Disponível em: http://www.obmep.org.br/regulamento.htm . Acesso em: 15 set. 2021. e em diversos documentos de divulgação desta competição.

Competições matemáticas já ocorriam desde 1885, em Bucareste, na Romênia. No Brasil, a primeira olimpíada de conhecimento aconteceu em 1967, com a realização da Olimpíada de Matemática do Estado de São Paulo, promovida pelo Grupo de Estudo do Ensino de Matemática, cujo objetivo era coordenar e divulgar a Matemática Moderna no Brasil ( SOUZA NETO, 2013SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. ). Apesar de as olimpíadas de Matemática serem as mais antigas e estarem em um conjunto de outras olimpíadas de conhecimento que ocorrem atualmente no Brasil (de Matemática, de Física, de Língua Portuguesa, nos níveis federais, estaduais, municipais etc.), nos ateremos à OBMEP, que se tornou modelo para essas competições ( FARIAS, 2017FARIAS, J. V. O Profmat e as relações distintivas no campo da matemática. 2017. 295 p. Tese (Doutorado em Educação) - Centro de Educação e Ciências Humanas, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2017. ).

As provas da OBMEP são aplicadas em duas fases: uma é seletiva, em que podem participar todos os estudantes de escolas que estejam inscritas; a outra é classificatória, pois depende do desempenho obtido na fase anterior e é limitada a 5% dos alunos participantes de cada escola. As provas são organizadas em níveis: Nível 1 (alunos de 6 o e 7 o anos), Nível 2 (alunos do 8 o e 9 o anos) e o Nível 3 (alunos do Ensino Médio). Em 2018, foi acrescentado o Nível A (alunos do 4 o e 5 o anos). Com o sucesso de participação, a OBMEP tornou-se a maior olimpíada de Matemática do mundo 2 2 Disponível em: http://www.obmep.org.br/noticias.DO?id=467 . Acesso em: 15 set. 2021. .

Até 2016, participavam dela exclusivamente alunos de escolas públicas (municipais, estaduais e federais) conforme seu nome sugere. Em 2017, no entanto, foi incluída a participação de estudantes do ensino privado. Embora a participação destes alunos nas Olimpíadas das Escolas Públicas cause estranhamento, este não será o foco de nossa discussão. Assim, em 2017, participaram 18,2 milhões de alunos, de quase 53 mil instituições de ensino, representando 99,6% dos municípios brasileiros. Isto ilustra a dimensão geográfica do evento e, proporcionalmente, do orçamento necessário que, até 2018, era cerca de 53 milhões de reais.

Segundo o site oficial 3 3 Disponível em: http://www.obmep.org.br/apresentacao.htm . Acesso em: 30 ago. 2021. , a OBMEP é um projeto nacional “realizado pelo [...] IMPA, com o apoio da [...] SBM, e promovida com recursos do Ministério da Educação e do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações [...]”. Assim, entre outras responsabilidades, cabe aos matemáticos, membros da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM) e do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), elaborar as provas, definir as regras e os critérios das competições.

Segundo os matemáticos que protagonizam essa Olimpíada, deve-se valorizar o conteúdo específico de Matemática. Isso é explícito desde o Projeto-Piloto (não publicado, apud SOUZA NETO, 2013SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. ) 4 4 O Projeto-Piloto na íntegra pode ser consultado nos anexos da dissertação de mestrado de Souza Neto, 2013 . , que afirmava a necessidade de ampliar o domínio do conteúdo específico de Matemática dos alunos e dos professores, com uma Matemática fortemente referenciada à acadêmica.

Pesquisas em Educação como Tardif (2002)TARDIF, M. Saberes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002. , Shulman (2005)SHULMAN, L. S. Conocimiento y enseñanza: fundamentos de la nueva reforma. Profesorado, Granada, v. 9, n. 2, p. 1-30, 2005. Disponível em: http://www.ugr.es/~recfpro/?p=235 . Acesso em: 22 jun. 2022.
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, Gatti (2009)GATTI, B. A. Formação de professores para o ensino fundamental: estudo de currículos das licenciaturas em pedagogia, língua portuguesa, matemática e ciências biológicas. São Paulo: FCC/DPE, 2009. 158p. , Moreira et al. (2012)MOREIRA, P. C.; FERREIRA, E. B.; JORDANE, A.; NÓBRIGA, J. C. C.; FISCHER, M. C. B.; SILVEIRA, E.; BORBA, M. C. Quem quer ser professor de matemática? Zetetiké, Campinas, v. 20, n. 1, p. 11-33, 2012. entre outros, defendem um ensino para além do conteúdo específico e que considere outros elementos das ciências humanas que não são levados em conta pelos matemáticos envolvidos na organização e promoção da OBMEP, conforme esclareceremos na seção 3. Do ponto de vista da Educação Matemática, questionamos o fato de a OBMEP, entendida como uma política educacional, ser organizada e executada apenas por Instituições cujos pesquisadores têm formação em Matemática Pura ou em Matemática Aplicada e cujas produções acadêmicas não estejam voltadas à educação ou à Matemática escolar, conforme apontado por Farias (2017)FARIAS, J. V. O Profmat e as relações distintivas no campo da matemática. 2017. 295 p. Tese (Doutorado em Educação) - Centro de Educação e Ciências Humanas, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2017. .

Outro aspecto a ser considerado diz respeito à Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM) não estar envolvida na OBMEP. Se esta competição é um programa educacional, seria esperado que associados da SBEM participassem dele, pois atuam diretamente na área educacional e promovem discussões sobre problemas sociais, políticos, éticos e de inclusão envolvidos na educação escolar.

Diante da dimensão e do público-alvo da OBMEP, a compreendemos como um espaço formativo e, portanto, questionamos o protagonismo dos matemáticos, alinhados à Matemática Pura, em detrimento à participação efetiva dos profissionais relacionados à Educação Matemática.

Além disso, se a Matemática escolar já é fortemente meritocrática, conforme Silva (2013)SILVA, A. Meritocracia, educação e matemática: um estudo relacional. 2013. 230p. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, Campinas, 2013. Disponível em: http://www.repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/254091 . Acesso em: 29 set. 2021.
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, a OBMEP reforça esse aspecto que pressupõe hierarquias e valorização de méritos pessoais em detrimento do desenvolvimento do coletivo e de abordagens sociais. A porcentagem de medalhistas da OBMEP ilustra a desigualdade e a meritocracia: em 2018, 575 medalhistas de ouro representaram o aclamado “Brasil do futuro” 5 5 Disponível em: http://www.obmep.org.br/noticias.DO?id=646 . Acesso em: 15 set. 2021. , ou seja, nesta edição da OBMEP, apenas cerca de 3 estudantes a cada 1.000 foram diretamente beneficiados com ações mais concretas (como cursos e bolsas de estudo) e isso contradiz o fato de a OBMEP ser inclusiva.

Nesse sentido, problematizamos esta Olimpíada que se coloca como um Programa que incentivaria o estudo da Matemática e que promoveria a “melhoria da qualidade da Educação Básica”, da inclusão social e o “aprimoramento do ensino da matemática” 6 6 Entrevista da diretora acadêmica do IMPA, concedida ao Jornal da Unicamp, Edição 277 - 14 a 27 de fevereiro de 2005. Disponível em: https://www.unicamp.br/unicamp/unicamp_hoje/ju/fevereiro2005/ju277pag06.html . Acesso em: 5 out. 2021. e levantamos o seguinte questionamento: A OBMEP pode ser entendida como um programa educacional que visa à melhoria da Educação no País, ou está mais relacionada a uma estratégia de valorização do polo dominante do campo da Matemática? Mostraremos que há uma tensão, entre matemáticos e educadores, sobre o que pode ser considerado uma Matemática de qualidade na Educação.

Outra visão da OBMEP, como a sociológica aqui proposta, também justifica a presente abordagem. Em levantamento bibliográfico, observa-se que a maioria das pesquisas sobre a OBMEP se limitam a reproduzir o discurso de sucesso ou a reforçar o tipo de conteúdo abordado. Pinheiro (2014)PINHEIRO, J. M. Estudantes forjados nas arcadas do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA): "novos talentos" da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP). 2014. 229 f. Tese (Doutorado em Educação) - Instituição de Ensino, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2014. e Freitas (2007)FREITAS, L. C. Eliminação adiada: o ocaso das classes populares no interior da escola e a ocultação da (má) qualidade do ensino. Educação & Sociedade, Campinas, v. 28, n. 100, p. 965-987, out. 2007. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302007000300016&lng=en&nrm=iso . Acesso em: 29 set. 2021.
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, ao contrário, apontam para uma tendência de se criar um nível alto de competitividade e de reprodução das diferenças sociais: os alunos oriundos das camadas com melhor nível socioeconômico obtêm melhores rendimentos.

Dessa maneira, buscamos pensar alguns dos fundamentos ocultos da dominação de um tipo tradicional de Matemática, com base em Catani (2007CATANI, A. M. Compreendendo os fundamentos ocultos da dominação. Revista Educação, São Paulo, v. 5, p. 74-83, 2007. , p. 75-76):

A sociologia de Bourdieu estuda a lógica da dominação social nas sociedades de classe e os mecanismos pelos quais ela se constitui, se disfarça e se perpetua [...]. [...] [Bourdieu] descreve e analisa quem é quem e as respectivas estratégias utilizadas pelos agentes em cada espaço social específico – quer dizer, desenvolve uma sociologia da prática em que a movimentação dos agentes e as posições ocupadas indicam quem tem o poder de estabelecer a agenda do que é legítimo ou não nesse domínio.

Este artigo tem como fundamentação documentos e informações levantados para uma pesquisa a respeito da OBMEP ( SOUZA NETO, 2013SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. ), e sua permanente atualização a partir do site desta Olimpíada. A pesquisa seguiu os ditames de uma abordagem qualitativa, com claras vantagens para pesquisas educacionais na medida em que possibilita apreender o caráter complexo e multidimensional dos fenômenos ( ANDRÉ, 1983ANDRÉ, M. E. D. A. Texto, contexto e significados: algumas questões na análise de dados qualitativos. Caderno de Pesquisa, São Paulo, v. 45, p. 66-71, mai. 1983. ). Além disso, teve natureza de pesquisa exploratória, no sentido de almejar a compreensão do fenômeno em estudo e desenvolver, esclarecer e aprimorar conceitos e ideias ( GIL, 1987GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1987. ).

Para o desenvolvimento do trabalho foi dado, essencialmente, um delineamento de pesquisa documental ( GIL, 1987GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1987. ), uma vez que se trabalhou com materiais que não haviam recebido um tratamento analítico, tais como documentos oficiais, reportagens de jornais e discursos de agentes do campo político (como o discurso de presidentes do Brasil em cerimônias de premiação dos medalhistas) e de agentes do polo da Matemática acadêmica (como diretores acadêmicos do IMPA). A lista dos materiais analisados consta na dissertação de Souza Neto (2013)SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. .

Os conceitos de Bourdieu que subsidiam, teórica e metodologicamente, nossa análise encontram-se referenciados, mas não são, neste artigo, abordados em separado e sim articulados com o objeto da pesquisa. Para a análise dos dados foi adotado o processo de “ emparelhamento (ou associação )”, que consiste em uma estratégia de análise de informações mediante um modelo teórico prévio ( FIORENTINI; LORENZATO, 2006FIORENTINI, D.; LORENZATO, S. Investigação em educação matemática: percursos teóricos e metodológicos. Campinas: Autores Associados, 2006. , p. 138-9). Portanto, as análises estarão presentes a todo o momento, em um processo que visa relacionar a teoria com as informações obtidas da OBMEP, em um inseparável intercâmbio, entre teoria e prática, metodologia e conceitos, típico do referencial teórico-metodológico de Pierre Bourdieu. Queremos “fazer aparecer as pinceladas, os toques e os retoques do trabalho de construção” ( BOURDIEU, 2001BOURDIEU, P. O poder simbólico. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. , p. 19) dessa Olimpíada.

Para além do senso comum, a proposta é analisar a OBMEP com base na teoria de Bourdieu (1977BOURDIEU, P. Os jogos olímpicos. In: BOURDIEU, P. Sobre a televisão. Tradução de Matia Lúcia Machado. Rio de Janeiro: Jorge Zahar (ed.), 1977. p. 123-8. , 1983BOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (org.) Pierre Bourdieu: Sociologia. São Paulo: Ática, 1983. p. 122-55. , 2001BOURDIEU, P. O poder simbólico. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. , 2003BOURDIEU, P. Alta costura e alta cultura. In: BOURDIEU, P. Questões de sociologia. Lisboa: Fim de século, 2003. p. 205-16. , 2011BOURDIEU, P. Razões práticas: sobre a teoria da ação. 11. ed. Campinas: Papirus, 2011. , 2013aBOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (org.). A sociologia de Pierre Bourdieu. São Paulo: Olho d’Água, 2013a. p. 112-143. , 2013bBOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. 2. ed. Porto Alegre: Zouk, 2013b. 560 p. ), principalmente com as noções de campo, habitus, capital, consagração, alianças, produção da crença, formulando uma compreensão da Olimpíada como um mecanismo de legitimação e de valorização de uma prática matemática: a Matemática acadêmica. Buscamos explicitar crenças e valores implícitos na OBMEP que resultam na valorização da Matemática acadêmica e em estratégias de manutenção dessa valorização por meio de discursos ortodoxos e de alianças entre os campos científico e político.

É possível a percepção de que a Matemática acadêmica, própria do polo dominante do campo da Matemática, como o desenharemos na seção 2, parece se inserir no espaço escolar como promessa de mobilidade social, como símbolo de nacionalismo e de progresso e como a única possível, universalmente válida e superiormente legítima. É significativo entender o funcionamento do campo, para identificar quem determina o que deve fazer parte da Matemática escolar.

A seguir, retrataremos as noções centrais da teoria a serem articuladas com o caso empírico escolhido, a OBMEP.

2 A OBMEP e os capitais em circulação no campo da matemática

Para versar sobre a noção de campo da matemática , apoiamo-nos no conceito de campo de Bourdieu (2003)BOURDIEU, P. Alta costura e alta cultura. In: BOURDIEU, P. Questões de sociologia. Lisboa: Fim de século, 2003. p. 205-16. . O campo , sendo um espaço social, integra elementos fundantes e invariantes que o definem, pois, como afirma Bourdieu (2003BOURDIEU, P. Alta costura e alta cultura. In: BOURDIEU, P. Questões de sociologia. Lisboa: Fim de século, 2003. p. 205-16. , p. 119), “Há leis gerais dos campos: campos tão diferentes como o campo da política, o campo da filosofia, o campo da religião, têm leis de funcionamento invariantes”.

Segundo Bourdieu (2003)BOURDIEU, P. Alta costura e alta cultura. In: BOURDIEU, P. Questões de sociologia. Lisboa: Fim de século, 2003. p. 205-16. , alguns elementos constituintes do campo são: os capitais específicos; um espaço de posições hierarquizadas; os polos dos dominantes e dos dominados onde estão posicionados os agentes; uma luta concorrencial e um objeto de disputa; e as estratégias para manter ou alcançar posições privilegiadas. Foi calcado nesses elementos que desenhamos o campo da Matemática posto para a presente caracterização.

O campo define-se pela distribuição desigual daquilo que Bourdieu (2001)BOURDIEU, P. O poder simbólico. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. denomina de capitais específicos do campo em suas diferentes formas: social, científico, econômico e cultural. Capital é o montante de recursos, valorizados em determinado espaço social, de que dispõe aquele que participa do campo, para submetê-lo às trocas, conversões e reconversões com a finalidade de obter prêmios e posições, isto é, obter rendimentos simbólicos.

Na estrutura geral de um campo, os dominantes são aqueles que detêm maior volume de capital específico e ocupam “[...] uma posição tal que a estrutura age em seu favor” ( BOURDIEU, 2013aBOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (org.). A sociologia de Pierre Bourdieu. São Paulo: Olho d’Água, 2013a. p. 112-143. , p. 53) e, portanto, são os que detêm o monopólio do poder de constituir verdades sobre seu objeto e de determinar aquilo que deve e o que não deve ser valorizado (como a cultura legítima, a ciência verdadeira, a griffe de maior preço, a arte mais autêntica, a verdadeira matemática etc.).

O campo científico , com sua autonomia relativa e suas leis próprias, é visto como o lócus onde se trava a luta entre agentes com interesses específicos, ou seja, situações em que se manifestam as relações de poder em torno da autoridade ou legitimidade científicas. É necessário verificar quem tem o poder de impor uma definição de ciência e estabelecer quais procedimentos são válidos.

De uma definição rigorosa de campo científico enquanto espaço objetivo de um jogo onde compromissos científicos estão engajados resulta que é inútil distinguir entre as determinações propriamente científicas e as determinações propriamente sociais das práticas essencialmente sobredeterminadas ( BOURDIEU, 1983BOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (org.) Pierre Bourdieu: Sociologia. São Paulo: Ática, 1983. p. 122-55. , p. 124).

No campo científico, os dominantes são aqueles que tendem a perpetuar a ordem científica por meio de estratégias de conservação e de práticas ortodoxas. No outro polo do campo estão os dominados, os quais, segundo Bourdieu (1983)BOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (org.) Pierre Bourdieu: Sociologia. São Paulo: Ática, 1983. p. 122-55. , ou apostam em estratégias de sucessão (em que as inovações estão circunscritas aos limites autorizados pelos dominantes) ou, com discursos heterodoxos, em estratégias de subversão (que são mais arriscadas por romperem o contrato econômico das trocas simbólicas que engendram toda a dinâmica do campo).

Ao polo dominante correspondem às práticas de uma ortodoxia que pretende conservar intacto o capital social acumulado; ao polo dominado, as práticas heterodoxas que tendem a desacreditar os detentores reais de um capital legítimo. Os agentes que se situam junto à ortodoxia devem, para conservar sua posição, secretar uma série de instituições e de mecanismos que assegurem seu estatuto de dominação ( ORTIZ, 1983ORTIZ, R. A procura de uma sociologia da prática. In: ORTIZ, R. (org.) Pierre Bourdieu: sociologia. São Paulo: Ática, 1983. p. 7-31. , p. 22).

No campo da matemática , considerado a seguir por meio de critérios bourdiesianos mencionados no início da seção, o que estaria em disputa é o monopólio da autoridade para poder dizer o que se deve ensinar e como se deve ensinar. Nesse sentido, o que deve ser valorizado, segundo os matemáticos que protagonizam a OBMEP, é o conteúdo específico de Matemática, como aponta Souza Neto (2013)SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. . Pelos investimentos, abrangência e apoios institucionais concedidos à OBMEP podemos perceber o sucesso desse discurso dos matemáticos ao fazer valer e fazer crer no discurso sobre o ensino de Matemática e, como efeito teoria, fazer acontecer.

Para desenhar o campo da matemática , de acordo com Farias e Vilela (2019)FARIAS, J. V.; VILELA, D. S. Desenhando o campo da matemática: Aplicação dos conceitos de Pierre Bourdieu na educação matemática. Revista Estudos de Sociologia, Araraquara, v. 24, n. 47, p. 207-232, 2019. , situamos os matemáticos como pertencentes ao polo dominante e os educadores matemáticos ao polo dominado. Essa compreensão justifica-se, inicialmente, por dois aspectos: em primeiro lugar, a justificativa dos polos pelas distinções entre a Matemática escolar e a acadêmica. De acordo com Moreira, Cury e Vianna (2005MOREIRA, P. C.; CURY, H. N.; VIANNA, C. R. Por que análise real na licenciatura? Zetetiké, Campinas, v. 13, n. 23, p. 11-42, jan./jul. 2005. , p. 39), a Matemática científica ou acadêmica é aquela que é objeto de estudo dos matemáticos: “A Matemática como aquela que é vista pelos matemáticos profissionais”. A Matemática escolar se situa como um fenômeno social não só determinado pela Matemática acadêmica ( MOREIRA; DAVID, 2003MOREIRA, P. C.; DAVID, M. M. M. S. Matemática escolar, matemática científica, saber docente e formação de professores. Zetetiké, Campinas, v. 11, n. 19, p. 57-80, jan./jun. 2003. ).

Em segundo lugar, justificamos os matemáticos como dominantes pelo efeito teoria, isto é, os dominantes são aqueles que fazem ver e fazem crer nas verdades do seu discurso. Neste caso, as verdades do discurso sobre a Matemática e o seu ensino. O dominante é aquele que tem o poder para impor as verdades do discurso, poder simbólico para dizer o que é e o que deve ser, resultado da luta, no campo, “pelo monopólio da performatividade” ( BOURDIEU, 2020BOURDIEU, P. Sociologia geral: lutas de classificação: curso no College de France (1981 - 1982). Petrópolis: Vozes, 2020. v. 1. , p. 106). Os dominantes estabelecem verdades e os critérios para verificação dessas verdades. Ao implantar uma olimpíada (OBMEP), veículo discursivo das suas verdades, com todo o apoio já mencionado – financeiro, institucional (público e privado), governamental, em todas as esferas (federal, estadual e municipal) – os matemáticos fazem acontecer o que enunciam.

Outro elemento importante, na representatividade dos polos considerados no desenho do campo da matemática , é o fato de possuírem sociedades disciplinares próprias. Segundo Bourdieu (2004BOURDIEU, P. Para uma sociologia da ciência. Lisboa: Edições 70, 2004. , p. 69):

Uma sociedade disciplinar indica a condição de um grupo reconhecido como socialmente distinto e de uma identidade social e “poderá contribuir para fazer funcionar, no seio do campo disciplinar, algo como uma comunidade que gere parte dos interesses comuns, para funcionar.

A SBM, criada em 1969, tem por finalidade o desenvolvimento da própria Matemática. No que tange à formação de professores de Matemática, veremos que se restringe ao conteúdo propriamente, como indicado no site da Sociedade:

[...] congregar os matemáticos e professores de Matemática do Brasil, estimular a realização e divulgação de pesquisa de alto nível em Matemática, contribuir para a melhoria do ensino de Matemática em todos os níveis, estimular a disseminação de conhecimentos de Matemática [...]. 7 7 Disponível em: https://www.sbm.org.br/institucional/quem-somos/natureza-e-missao . Acesso em: 15 set. 2021.

Já a SBEM, criada em 1988, tem uma missão mais ampla e diretamente envolvida com questões da educação, como sinalizado no site dessa Sociedade:

[...] buscar meios para desenvolver a formação matemática de todo cidadão de nosso país. Para isso, ela congrega profissionais e alunos envolvidos com a área de Educação Matemática e com áreas afins [...]. É também objetivo da SBEM a difusão ampla de informações e de conhecimentos nas inúmeras vertentes da Educação Matemática. 8 8 Disponível em: http://sbem.iuri0094.hospedagemdesites.ws/sbembrasil/index.php/a-sociedade/missao . Acesso em: 15 set. 2021.

A tensão entre os dois polos em questão pode ser ilustrada por meio do fato de a OBMEP ser realizada pelo IMPA, com o apoio, somente, da SBM, instituições que representam ou que estão alinhadas à Matemática acadêmica, deixando de lado o apoio da SBEM, notadamente mais alinhada à Educação.

Ao comparar as finalidades da SBM e da SBEM, depreende-se que os agentes pertencentes ao polo dominante do campo da Matemática (os matemáticos: pesquisadores em Matemática Pura ou Aplicada) e os pertencentes ao polo dominado (os educadores matemáticos) defendem seus próprios interesses agindo, contudo, no mesmo espaço.

Neste desenho do campo da Matemática, apesar de haver interesses aparentemente divergentes, ambos os polos orbitam, valorizam e alimentam o mesmo objeto: a Matemática.

Podemos retratar o campo da Matemática com seus elementos característicos relativamente invariantes. Pressupondo que “no interior de cada um dos campos há uma hierarquia social dos objetos [...]” ( BOURDIEU, 2013aBOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (org.). A sociologia de Pierre Bourdieu. São Paulo: Olho d’Água, 2013a. p. 112-143. , p. 118), vamos expor alguns dos capitais específicos constituintes do campo da Matemática. Para isso, focamos em duas espécies principais do capital específico: o capital científico e o capital político-social ( FARIAS, 2017FARIAS, J. V. O Profmat e as relações distintivas no campo da matemática. 2017. 295 p. Tese (Doutorado em Educação) - Centro de Educação e Ciências Humanas, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2017. ).

Argumentamos a seguir que, tendo em conta os capitais em jogo, o polo dominante fica associado à Matemática acadêmica, enquanto o polo dominado, à Educação Matemática. Pode-se entender que a hierarquia coloca-se desse modo, por exemplo, pelo maior valor dado às Ciências Exatas do que às Ciências Humanas, inclusive à Educação, como nas políticas públicas voltadas à reforma do Ensino Médio e à BNCC que, de acordo com Ramos (2019)RAMOS, M. N. Políticas e história da educação profissional: onde estamos, como chegamos e para onde vamos. Cadernos de Pesquisa, São Luís, v. 6, n. 4, p. 45-59, out./dez. 2019. , dilui todas as disciplinas diferentes de Matemática e Português, em áreas do conhecimento; pela OBMEP ser modelo para olimpíadas de outras áreas do conhecimento; pelo discurso ortodoxo (sempre reafirmando o conteúdo matemático) e heterodoxo de cada um dos polos (VILELA; FARIAS, 2019).

Antes de detalharmos aspectos do capital, lembremos que o envolvimento do IMPA também corrobora o desenho do campo da matemática aqui proposto. De acordo com Silva (2009SILVA, C. M. S. O Impa e a comunidade de matemáticos no Brasil. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, v. 39, n. 138, p. 897-917, set./dez. 2009. , p. 915), é distinto quem faz parte do IMPA, pois, “pertencer ao quadro de pesquisadores desse instituto é quase uma garantia de se alcançar entre a comunidade de matemáticos do país um lugar de destaque”. O IMPA é uma instituição reconhecida pela qualidade de suas pesquisas e dos seus pesquisadores.

Para o capital científico, definimos os seguintes objetos: artigos publicados em revistas de circulação internacional de alto padrão e bolsa de produtividade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); prêmios e títulos recebidos; a formação acadêmica inicial, ou seja, os cursos de graduação (engenharia, medicina, matemática, licenciatura etc.); a formação em nível de pós-graduação; e a atuação profissional em instituições reconhecidas nacional e internacionalmente. Nesse sentido, e de acordo com o que consta no Relatório de Gestão Anual do IMPA (RGA), de 2019, é altíssimo o capital científico dos matemáticos profissionais, pesquisadores consagrados:

A pesquisa do IMPA é desenvolvida atualmente por 43 pesquisadores [...]. Nos últimos dez anos, os pesquisadores do IMPA publicaram um total de 1.028 artigos em revistas científicas de alto nível, […] [isso] coloca o IMPA entre as melhores instituições de pesquisa matemática a nível mundial. 9 9 Relatório de Gestão Anual do IMPA 2019. Disponível em: https://impa.br/sobre/acesso-a-informacao/relatorios-de-gestao-e-atividades/ . Acesso em: 29 set. 2021.

Os pesquisadores do IMPA, de acordo com o RGA, superam todas as metas estabelecidas em relação à produção de artigos, inclusive o quantitativo de artigos por pesquisador, e ao quantitativo de bolsas produtividade CNPq.

Para demarcar o capital político-social, tomamos como referência: a participação em conselhos, diretorias, coordenadorias e secretarias em reconhecidas instituições como CNPq, Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), MEC, MCTIC; a atuação profissional no exterior, estabelecendo assim alianças internacionais; o reconhecimento materializado por meio de prêmios concedidos pelas renomadas instituições brasileiras e estrangeiras; e a relação com as mídias, por exemplo, o fato de o diretor do IMPA, Marcelo Viana, ganhar espaço no jornal Folha de S. Paulo.

No campo, a posição ocupada pelos agentes está diretamente vinculada à posse desses capitais, ou seja, com a quantidade e a qualidade dos capitais possuídos: “a estrutura de distribuição do capital determina a estrutura do campo, ou seja, as relações de força entre os agentes [...]” ( BOURDIEU, 2004BOURDIEU, P. Para uma sociologia da ciência. Lisboa: Edições 70, 2004. , p. 53). É mobilizando os capitais, no mercado das trocas simbólicas, que os matemáticos conseguem implantar programas nacionais, com financiamentos públicos e privados.

Interpretamos a OBMEP como uma estratégia dos dominantes do campo da Matemática de impor uma Matemática na Educação Básica. Outro elemento constituinte do campo são as estratégias e os interesses: estratégias para manter os privilégios dos dominantes de definir os capitais mais valorizados e de definir os critérios de classificação, classificando a si e aos outros de acordo com os capitais que detêm e com aquilo que são e fazem:

Está sempre em jogo o poder de impor uma definição de ciência [...], mas de acordo com seus interesses específicos. A definição mais apropriada será aquela que lhe permita ocupar legitimamente a posição dominante e a que assegure aos talentos científicos de que ele é detentor ( BOURDIEU, 2013aBOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (org.). A sociologia de Pierre Bourdieu. São Paulo: Olho d’Água, 2013a. p. 112-143. , p. 117).

Também há o reconhecimento mútuo entre os polos opostos ou, no caso do campo da Matemática, entre educadores e matemáticos, os quais, mesmo quando disputam o espaço na elaboração de currículo para o Ensino Básico ou na formação de professores, quase sempre o fazem em relação à Matemática acadêmica, reafirmando-a ou questionando a Matemática específica imposta: ainda que as estratégias de subversão visem inverter os próprios princípios do jogo, isso se dá em nome do jogo ( BOURDIEU, 2003BOURDIEU, P. Alta costura e alta cultura. In: BOURDIEU, P. Questões de sociologia. Lisboa: Fim de século, 2003. p. 205-16. ).

É importante assimilar que esse desenho do campo da Matemática, aqui proposto, é uma entre muitas possibilidades de interpretação da relação entre os matemáticos e os educadores. O campo é relacional e, portanto, outros desenhos são possíveis: “as posições, aparentemente privilegiadas ou desprivilegiadas, podem sempre estar relacionadas a outras posições, assim como os agentes ocupantes dessas posições em relação a outros agentes no campo” ( FARIAS, 2017FARIAS, J. V. O Profmat e as relações distintivas no campo da matemática. 2017. 295 p. Tese (Doutorado em Educação) - Centro de Educação e Ciências Humanas, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2017. , p. 41). É possível considerar relações internas a cada polo, pois a “dominação não é o efeito direto e simples da ação exercida por um conjunto de agentes (“a classe dominante”) investidos de poderes de coerção, mas o efeito indireto de um conjunto complexo de ações que se engendram” ( BOURDIEU, 2011BOURDIEU, P. Razões práticas: sobre a teoria da ação. 11. ed. Campinas: Papirus, 2011. , p. 52).

Com base nesse desenho, tendo em mente a Matemática acadêmica associada ao polo dominante, podemos inferir que os valores defendidos e perseguidos por essa instituição, IMPA, espelham os valores do polo dominante do campo da Matemática.

3 A verdade dos dominantes: o conteúdo matemático como finalidade e solução

O polo dominante do campo da Matemática, com sua autoridade, enfatiza que o conteúdo matemático é a finalidade da Educação assim como a solução para a melhoria da Educação Básica, e isso também se dá por meio da OBMEP, pois com essa competição “defende-se que o domínio do conteúdo deveria preceder qualquer tipo de discussão metodológica ou que as diferenças sociais, culturais e econômicas não têm qualquer relação com o desempenho em matemática” ( SOUZA NETO, 2013SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. , p. 50-51).

Isso pode ser compreendido por meio de diferentes manifestações. Por exemplo, no Projeto-Piloto da OBMEP afirmava-se que “com a [...] OBMEP, pretende-se fomentar um campeonato nacional anual de Matemática entre as escolas públicas, premiando a Escola pelo nível alcançado por seus alunos no domínio da Matemática” (PROJETO-PILOTO, p. 3, não publicado, apud SOUZA NETO 2013SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. ).

Veicula-se a crença em uma suposta necessidade de ampliar o domínio do conteúdo específico de Matemática dos alunos e dos professores, com uma Matemática fortemente referenciada à Matemática acadêmica.

Pesquisadores como Tardif (2002)TARDIF, M. Saberes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002. , Shulman (2005)SHULMAN, L. S. Conocimiento y enseñanza: fundamentos de la nueva reforma. Profesorado, Granada, v. 9, n. 2, p. 1-30, 2005. Disponível em: http://www.ugr.es/~recfpro/?p=235 . Acesso em: 22 jun. 2022.
http://www.ugr.es/~recfpro/?p=235...
, Gatti (2009)GATTI, B. A. Formação de professores para o ensino fundamental: estudo de currículos das licenciaturas em pedagogia, língua portuguesa, matemática e ciências biológicas. São Paulo: FCC/DPE, 2009. 158p. , Moreira et al. (2012)MOREIRA, P. C.; FERREIRA, E. B.; JORDANE, A.; NÓBRIGA, J. C. C.; FISCHER, M. C. B.; SILVEIRA, E.; BORBA, M. C. Quem quer ser professor de matemática? Zetetiké, Campinas, v. 20, n. 1, p. 11-33, 2012. entre outros, defendem uma postura e um discurso, acerca da formação do professor de Matemática, que vão de encontro a esse discurso dos matemáticos. Para esses autores, o conhecimento específico não é suficiente, sendo imprescindível uma formação que contemple outros conhecimentos. Segundo Tardif (2002TARDIF, M. Saberes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002. , p. 39), “o professor ideal é alguém que deve conhecer sua matéria, sua disciplina e seu programa, além de possuir certos conhecimentos relativos às ciências da educação e à pedagogia e desenvolver um saber prático baseado em sua experiência cotidiana com os alunos”.

O conhecimento matemático, mesmo sendo importante, não é suficiente como apontam Moreira et al. (2012MOREIRA, P. C.; FERREIRA, E. B.; JORDANE, A.; NÓBRIGA, J. C. C.; FISCHER, M. C. B.; SILVEIRA, E.; BORBA, M. C. Quem quer ser professor de matemática? Zetetiké, Campinas, v. 20, n. 1, p. 11-33, 2012. , p. 12), que defendem que a preparação do professor “precisa mobilizar, em tese, diferentes tipos de conhecimentos [...] em diferentes campos do saber”.

Em sua pesquisa relacionada à grade curricular dos cursos de licenciatura em Matemática, Gatti (2009)GATTI, B. A. Formação de professores para o ensino fundamental: estudo de currículos das licenciaturas em pedagogia, língua portuguesa, matemática e ciências biológicas. São Paulo: FCC/DPE, 2009. 158p. destaca a importância das disciplinas ligadas ao conhecimento dos sistemas educacionais. Para essa autora, essas disciplinas tratam de aspectos imprescindíveis para a formação de profissionais que vão atuar nas escolas de Ensino Fundamental e Médio.

Propor para formação do professor e para a Matemática escolar abordagens mais amplas, geralmente discutidas no âmbito da Educação Matemática, que dialoguem com outras áreas das Ciências Humanas, manifesta um tipo de tensão no campo da Matemática: a disputa pela legitimação do capital específico possuído pelos grupos tensionados, de um lado os matemáticos e de outro os educadores matemáticos, como se ambos atuassem na mesma direção, mas em sentidos contrários: e, nesse caso, o polo dos matemáticos defendendo que o domínio do conteúdo deveria preceder qualquer tipo de discussão metodológica, como ilustrado no excerto a seguir, que parece ignorar as diferenças sociais, culturais e econômicas quando se trata do desempenho em Matemática.

[...] [Mediante a baixa qualidade do ensino da matemática] encontramos o discurso [...] de que falta boa didática aos professores de matemática. Todavia, pouco se menciona que o conhecimento do conteúdo a ser transmitido precede qualquer discussão acerca da metodologia de ensino.

(Entrevista da diretora acadêmica do IMPA, Jornal da Unicamp, Edição 277, 2005).

Ainda nessa direção, por ocasião da recolocação da Matemática brasileira no ranking internacional no grupo V, o mais alto e prestigiado da International Mathematical Union , a então diretora acadêmica da SBM explica aquilo que ela, em nome dos matemáticos, considera um descompasso entre a Matemática profissional e a Matemática na escola: o distanciamento dos “profissionais com boa formação matemática” do ensino, como indicado no trecho a seguir:

A política de descaso com a educação no país afastou muitos profissionais com boa formação matemática das questões do ensino da disciplina. Parte importante deste espaço foi ocupada por grupos que, por falta de boa formação matemática, não se debruçam sobre o ensino da matemática de forma consistente. O resultado foi que a definição de políticas sobre o ensino da matemática passou a ser feita com pouca – ou nenhuma – interferência de pesquisadores em matemática. Assim, as diretrizes que têm orientado o ensino da matemática nas últimas décadas vêm sendo formuladas sem o necessário suporte de conteúdo matemático.

(Entrevista da diretora acadêmica do IMPA, Jornal da Unicamp, Edição 277, 2005).

Ressaltamos que esses discursos, de agentes do polo dominante do campo da Matemática, sugerem que se os matemáticos atuassem no Ensino Básico este alcançaria um patamar de excelência, tal como alcançou a pesquisa acadêmica. É como se o domínio do conteúdo específico de Matemática fosse solução para os problemas educacionais. Nesse mesmo sentido, segundo o site oficial da OBMEP, considera-se que a “melhoria da qualidade da Educação Básica”, ou “aprimoramento do ensino da Matemática”, está fortemente relacionada ao conteúdo a ser trabalhado na sala de aula.

Produz-se um discurso de que a falha no ensino de Matemática está vinculada à falta de incentivo e ao despreparo dos professores de Matemática, que não seriam devidamente qualificados durante sua formação. Em outras palavras, um discurso de que a Matemática acadêmica não é satisfatoriamente abordada nas escolas e, por isso, a necessidade de promovê-la amplamente por meio de ações como a OBMEP. Valoriza-se, de certa maneira camuflada, não só a Matemática pura, mas também, e principalmente, seus praticantes, os matemáticos e os participantes da OBMEP, sejam eles alunos ou professores. Estes últimos desfrutam dos privilégios adquiridos no campo da Matemática pelos matemáticos, isto é, os professores são reconhecidos na medida de sua proximidade com os matemáticos e de seu distanciamento das questões de Educação Matemática próprias do polo dominado.

Esse discurso centrado no conteúdo matemático pode ser percebido, também, por meio do material didático utilizado nessas competições e pela formação acadêmica dos seus organizadores. Em relação à bibliografia, nos livros e revistas produzidos para o treinamento olímpico da Olimpíada Brasileira de Matemática (OBM) e da OBMEP, podemos apurar aspectos de uma abordagem fundamentada no conteúdo específico e em exercícios: Introdução à Matemática: um curso com problemas e soluções , o Banco de questões da OBMEP e a Revista Eureka .

A seguir discutiremos sobre outras questões envolvendo a OBMEP, tais como as premiações, o material de divulgação e o material didático, que possibilitam a reprodução da crença, do discurso e da crença no discurso dos dominantes do campo da Matemática.

4 Alianças e crenças: suporte material e simbólico da OBMEP

Ressalvaremos as crenças que circulam por meio da OBMEP configurada como um programa educacional abrangente em todo o País e praticamente obrigatório ou imposto a todos os alunos do Ensino Básico. De início, observamos que há uma inter-relação e uma retroalimentação entre: a participação de quase todas as escolas; o poder daqueles que detêm os capitais científicos, materiais e simbólicos; as crenças dominantes e a reprodução das crenças. A retroalimentação dessa economia refere-se aos processos em que o efeito de uma resposta gera outra resposta que, novamente, gera aquele primeiro efeito, resultando em um fluxo de realimentação de sistema socialmente complexo.

Por meio das análises realizadas, sublinhamos as seguintes crenças dos dominantes do campo da Matemática: valorização da Matemática acadêmica em detrimento de outras práticas matemáticas; neutralidade da Matemática; importância da Matemática acadêmica para o avanço do País; Matemática acadêmica como um conhecimento destacadamente importante e necessário e, portanto, mais fundamental que outros.

Outras crenças, tais como a ideia de dom e de genialidade, serão apenas mencionadas. Como detalhado por Souza Neto (2013) os “talentos” (medalhistas da OBMEP), segundo se propaga, podem participar do desenvolvimento científico, gerar progresso e tecnologia e, ainda, atender à necessidade iminente do País de mão de obra qualificada. Isso pode ser ilustrado por meio do trecho do Projeto-Piloto da OBMEP, indicado a seguir:

A Matemática contribui, de modo determinante, para a formação do indivíduo consciente e oferece múltiplas oportunidades para seu desempenho na sociedade; o talento para a Matemática e Ciências está aleatoriamente distribuído pelo País, não dependendo de cor, sexo ou classe social; premiar a competência e o esforço de alunos e professores é a forma mais eficiente de motivá-los e de resgatar a qualidade como valor na Educação pública; aproveitar o potencial científico de nossos jovens talentos é estratégico para o desenvolvimento do País (PROJETO-PILOTO, não publicado, apud SOUZA NETO, 2013SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. ).

A Matemática dos dominantes do campo da matemática e as crenças destes são difundidas ao mesmo tempo que seus discursos ortodoxos são capitalizados pela importância atribuída à Matemática para o País. Na contramão do multiculturalismo, a OBMEP contribui para homogeneização do ensino de Matemática no Brasil, colocando-se como a norma de Matemática, em termos da meritocracia. A OBMEP, sendo fruto de uma parceria entre o Ministério da Ciência e da Tecnologia, o Ministério da Educação e Cultura e a Petrobrás, reafirma a crença da necessidade de desenvolvimento tecnológico nacional, o qual dependeria, intrinsicamente, da Matemática acadêmica.

Propagandas da OBMEP veiculadas em jornais diários, na televisão etc., apontam a Matemática como uma solução para o desenvolvimento do País e fazem passar por verdadeira a ideia de que assimilar a Matemática dos matemáticos é uma maneira de incluir socialmente os jovens brasileiros, dando ensejo a que todos os “interessados” adentrem a universidade e, mais particularmente, em cursos de áreas tecnológicas. D’Ambrósio (2008D’AMBROSIO, U. O Programa Etnomatemática: uma síntese. Acta Scientiae, Canoas, v. 10, n. 1, p. 07-16, 2008. Disponível em: http://www.periodicos.ulbra.br/index.php/acta/article/view/74 .
http://www.periodicos.ulbra.br/index.php...
, p. 13) afirma que essa crença é uma ilusão:

É ilusório pensar que Matemática é o instrumento de acesso social e econômico, como proclamam os teóricos que defendem conteúdos como sendo os determinantes dos programas escolares. Dificilmente um pobre sai de sua condição porque foi um bom aluno de Matemática. Os fatores de iniquidade e injustiça social são tantos que simplesmente ir bem, em Matemática, pouco tem a ver com o avanço social de cada indivíduo.

Segundo essas propagandas, como sugere Souza Neto (2013)SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. , a associação entre a política, o progresso, a tecnologia e a Matemática dos matemáticos puros, viabilizada por meio da OBMEP, resultaria na valorização da nação e, assim, podemos falar em um tipo de nacionalismo, uma valorização da Matemática com coloração nacionalista. A crença relativa à importância da OBMEP para a nação também decorre da maneira de denominar as competições de Matemática como “olimpíadas” e, desse modo, a Matemática dos matemáticos também se consagra. Essa denominação agrega capital simbólico ao trazer a ideia das olimpíadas esportivas, que existem desde a Grécia clássica. Semelhantemente aos Jogos Olímpicos, às olimpíadas de matemática. Bourdieu (1977)BOURDIEU, P. Os jogos olímpicos. In: BOURDIEU, P. Sobre a televisão. Tradução de Matia Lúcia Machado. Rio de Janeiro: Jorge Zahar (ed.), 1977. p. 123-8. atribui aos jogos olímpicos um caráter simbólico e de valorização de uma nação:

O que entendemos exatamente quando falamos em Jogos Olímpicos? O referencial aparente é a manifestação “real”, isto é, um espetáculo propriamente esportivo, confronto entre atletas vindos de todo o universo que se realiza sob o signo de ideias universalistas, e um ritual, com forte coloração nacional, senão nacionalista, desfile por equipes nacionais, entrega de medalhas com bandeiras e hinos nacionais ( BOURDIEU, 1977BOURDIEU, P. Os jogos olímpicos. In: BOURDIEU, P. Sobre a televisão. Tradução de Matia Lúcia Machado. Rio de Janeiro: Jorge Zahar (ed.), 1977. p. 123-8. , p. 123).

De acordo com Reyes (2007)REYES, K. G. G. Olimpiadas y Copa Mundial de Fútbol: ¿Competencias deportivas o instrumentos políticos?. CONfines, Monterrey, v. 3, n.6, p. 83-94, ago./dic. 2007. , os jogos olímpicos desportivos compõem um cenário próprio para elevar o prestígio das nações. A valorização de competições esportivas pode ser vista como uma extensão da política exterior das nações que permite reafirmar, perante as demais, a soberania, a supremacia e uma “boa imagem” da nação.

A OBMEP difunde sua importância, também, por intermédio dos cartazes de divulgação que agregam capitais simbólicos. Nesses cartazes, as imagens remetem a elementos valorizados pelos brasileiros, como o esporte, a música, a arte, a natureza, a diversidade cultural etc.

Os cartazes de divulgação da OBMEP de 2005 e de 2010 ( Figura 1 ), por exemplo, associavam a matemática ao futebol, que é o esporte nacional de valor notável para a publicidade almejada. De maneira semelhante, no cartaz utilizado em 2007, aparecia a imagem da bandeira do Brasil e do pandeiro, que pode denotar uma relação entre Matemática, música e política. Em relação à música, vale salientar que o pandeiro nos remete ao samba, que é um dos símbolos culturais do País – esse ritmo faz, em certo sentido, parte da identidade do povo brasileiro.

Figura 1
Cartazes de divulgação da OBMEP de 2010 (à esquerda) e de 2005 (à direita)

Os cartazes e imagens usados na divulgação da OBMEP também valorizam a própria Matemática, trazendo símbolos matemáticos específicos, como o número pi , o símbolo de somatório e diversos outros números. Esses símbolos podem ser representativos da sofisticação de um conhecimento que é compreendido por poucos: por aqueles que são mais talentosos, inteligentes e raros. A composição do logotipo presente nos cartazes, que retrata uma cabeça composta de traços associados a símbolos matemáticos, é marcante para expressar um ser mais que racional, um ser matematicamente inteligente.

Uma interpretação viável dessas imagens na divulgação da OBMEP é a de que elas explicitam tanto a valorização do capital simbólico do campo da Matemática, como a consagração da Matemática acadêmica, considerando-a como um conhecimento “universal” que estaria presente em diversos contextos e em diferentes atividades, inclusive na música e no esporte. Pode-se, ainda, fazer menção ao patriotismo (bandeira nacional, futebol e samba parecem caracterizar aquilo que o “povo brasileiro” mais valoriza ou o que a ele mais se associa) relacionado ao desenvolvimento do campo da Matemática e do campo científico, decisivos para os interesses políticos e econômicos.

O discurso de que a OBMEP impulsiona o desenvolvimento científico, tecnológico e econômico do país, associado com a coloração nacionalista (sobre o que ressaltamos também o slogan “Somando novos talentos para o Brasil”), transmite a ideia de que esse desenvolvimento, “para o Brasil”, estaria diretamente ligado à melhoria da qualidade de vida dos brasileiros, ou como se cada brasileiro pudesse ser participante direto dos benefícios proporcionados por tal desenvolvimento. Esses elementos parecem tornar uma obrigação de cada jovem, de cada professor, de cada familiar e de cada brasileiro torcer avidamente pelos talentos revelados pela OBMEP, entendendo-se que estes poderão garantir o desenvolvimento do País, que são necessários, supostamente, para o bem de todos, conforme resulta do processo de naturalização.

O campo científico e o político, aliados em prol do desenvolvimento econômico, parecem uma configuração ideal para legitimar os capitais de cada campo. Ao mesmo tempo em que se consagra a Matemática acadêmica (e as áreas científicas sugeridas como “alavancas” para o desenvolvimento científico e tecnológico), também a política nacional de desenvolvimento industrial e econômico do País é valorizada por sua base científica, fundamentada nas ciências exatas:

[...] esse projeto [da OBMEP] teve uma oposição ferrenha dentro do MEC e dentro do MCT, e [foi o presidente da república] quem garantiu a realização [da OBMEP], que agora é um sucesso, mas quando nós começamos, nos dois primeiros anos foi preciso a garantia do presidente [da República, Lula].

(Discurso da diretora acadêmica da OBMEP na Reunião Sobre Educação Científica, não publicado, apud SOUZA NETO, 2013SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. ).

Como ilustrado por meio do “aval do presidente da República”, a OBMEP poderia ser retratada como uma apropriação política do valor do capital matemático, pois, mais do que a crença na melhoria da qualidade da Educação Básica, o apoio à Olimpíada pode ser uma estratégia política de forte impacto, já que inculca a ideologia da superação da pobreza, de oportunidades democráticas (supostamente oferecida a todos que se interessarem) e de inclusão social.

Como a Matemática é consagrada como a base principal para o desenvolvimento pessoal e nacional (no que se refere à “inclusão social” e ao desenvolvimento econômico), subentende-se que a cultura científica e a Matemática têm suas relevâncias cada vez mais “inquestionáveis”. O resultado é que o campo da Matemática acumula capital simbólico e é sacralizado segundo um arbitrário cultural, assim como é arbitrária a relação entre essa cultura e o desenvolvimento econômico.

Nesse sentido, interpretamos que a OBMEP divulga e consagra a Matemática acadêmica e recruta agentes para o campo científico e da Matemática, com habitus 10 10 Conceito da teoria de Bourdieu que, de acordo com Wacquant (2017 , p. 274), é definido como: “disposições duráveis, ou capacidades treinadas e propensões estruturadas para pensar, sentir e agir de modos determinados, que então as guiam nas suas respostas criativas aos constrangimentos e solicitações do seu meio social existente”. apropriado (senão, lapidado) e suficiente para a manutenção da ordem do campo da matemática. Também pressupomos que isso se dá por meio de um discurso de promoção social entendido pelos agentes da OBMEP, sobretudo, como perspectiva para que os “talentos” tenham acesso facilitado a cursos de graduação das áreas tecnológicas. A seguir, discutiremos esse aspecto relacionado ao valor simbólico conferido à premiação proposta pela OBMEP.

5 As premiações e a produção da crença

Receber um prêmio representa uma distinção conferida a quem se destaca por méritos próprios; uma recompensa por desempenho acima da média; uma condecoração concedida por uma autoridade. Um aspecto que é interessante mencionar sobre os prêmios é a crença na autoridade daquele que concebe e concede o prêmio, a crença no valor do prêmio que desperta o desejo pelo prêmio e que faz com que os agentes mobilizem esforços em sua direção.

Na OBMEP, alunos, professores, escolas e secretarias de educação são premiados de acordo com os resultados obtidos. A premiação oferecida aos alunos, por meio da OBMEP, inicialmente, era composta de: medalhas (de ouro, prata e bronze) e de menções honrosas. Aos professores a premiação abrangia uma capacitação, oferecida no e pelo IMPA, porém, a partir da edição de 2009, os cursos foram substituídos por outros tipos de premiações, como placas de homenagens e coleção de livros (em 2009 e 2010); computador com programas para o ensino de Matemática (em 2011); tablet , placa de homenagem e assinatura anual da Revista do Professor de Matemática (em 2012). As escolas receberam diversos prêmios, desde laboratório de computação (na edição de 2005) a livros e kits de material esportivo; as Secretarias Municipais também tiveram variações nos prêmios, de quadra de esportes (em edição 2005 e 2006) a troféus.

Além dessas premiações, aos alunos são propiciadas oportunidades de participar do Programa de Iniciação Científica Jr. (PIC), tendo como finalidade o estudo de “tópicos interessantes” de Matemática e cujas atividades implicam encontros presenciais e/ou virtuais com estudantes de todo o País que se “interessam” por Matemática. E, ainda, de acordo com informações no site da OBMEP, o aluno, ao entrar na graduação, pode se candidatar ao Programa de Iniciação Científica e Mestrado (PICME):

O PICME é um programa que oferece aos estudantes universitários que se destacaram nas Olimpíadas de Matemática (medalhistas da OBMEP ou da OBM) a oportunidade de realizar estudos avançados em Matemática simultaneamente com sua graduação. Os participantes recebem as bolsas através de uma parceria com o CNPq (Iniciação Científica) e com a CAPES (Mestrado) 11 11 Disponível em: https://picme.OBMEP.org.br/ . Acesso em: ago. 2021 .

No PIC, assim como no PICME, os participantes recebem bolsas de estudo concedidas pelo CNPq e pela CAPES.

Compreendemos que os prêmios estão relacionados com maneiras de ser, de fazer, de reconhecer e de ser reconhecido dentro do campo da Matemática, pois, parafraseando Bourdieu (2013bBOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. 2. ed. Porto Alegre: Zouk, 2013b. 560 p. , p. 31), os prêmios “aparecem como uma garantia da aptidão para adotar a disposição estética porque eles estão associados seja a uma origem burguesa, seja ao modo de existência quase burguês”. Este modo de vida é caracterizado pelas marcas sociais distintivas de uma classificação dentro do campo; quem recebe o prêmio já possui estas marcas, no entanto, o reconhecimento as torna explícitas e as legitima.

O prêmio revela a submissão a esse estilo de vida, ao mesmo tempo que traz consigo os privilégios dessa submissão. Revela a submissão à ordem do campo cumulando de privilégios os submissos. Portanto, a premiação pode ser um bom indicador do quanto o habitus está ajustado, do quão lapidado foi de acordo com as exigências do campo para que se mantenha a ordem e se conservem as posições. Apoiados em Bourdieu (2013b)BOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. 2. ed. Porto Alegre: Zouk, 2013b. 560 p. , podemos fazer um paralelo entre os prêmios e os diplomas:

[...] certos diplomas garantem, sem outras garantias, uma competência que se estende muito além do que, supostamente, é garantido por eles, [...] impõem-se, antes de tudo, aos próprios portadores desses diplomas que [...] são intimados a assenhorear-se realmente dos atributos que [...] lhes são conferidos ( BOURDIEU, 2013bBOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. 2. ed. Porto Alegre: Zouk, 2013b. 560 p. , p. 29).

Os cursos oferecidos pelo IMPA, por exemplo, são um prêmio para quem dá e para quem recebe no que diz respeito a dois aspectos. O primeiro, o sonho dos medalhistas em conhecer o IMPA, esse local tão carregado de valor material e simbólico. Ir ao IMPA é visto como um prêmio, adentrar o “templo”, nesse espaço sagrado, reflete a crença comum na autoridade no campo, além do que, indica que você é ou pode tornar-se um deles. O segundo aspecto é que o IMPA, ao conceder o privilégio da visita somente para os classificados (medalhistas de ouro, que representam menos do que 0,003% dos alunos do Brasil), cria, recria, reforça e reafirma a crença na legitimidade de sua autoridade no campo, inclusive para classificar os agentes, permitindo ou proibindo sua entrada a partir dessas classificações.

Os prêmios também contemplam participação em olimpíadas internacionais, como a Olimpíada do Cone Sul, a Olimpíada Internacional de Matemática, a Olimpíada Iberoamericana e a Competição Internacional de Matemática. Esses prêmios – olimpíadas internacionais, viagens para cursos no IMPA – têm uma circularidade no sentido de garantir público qualificado e honra para outras olimpíadas de outros países e da alimentação da crença na genialidade, no dom e na superioridade da Matemática em relação às outras disciplinas.

Além dessa circularidade, no sentido de se manter a recompensa também como gratificação, podemos pensar em uma espécie de premiação prolongada, ou seja, que não se restringe à ocasião da premiação, mas que favorece o recrutamento de novos agentes. Essa premiação prolongada se dá por meio dos livros, cursos, bolsas de estudo etc. Há, por exemplo, como já mencionado, o PIC, que é um programa em que apenas os alunos medalhistas de ouro participam e tem duração de um ano, os quais podem continuar nos anos seguintes desde que sejam premiados novamente na OBMEP.

O prêmio é revelador do sucesso do processo de inculcação dos valores do campo, do processo de sedução e de inserção na illusio, que “expressa o reconhecimento tácito dos seus participantes no valor do que ali está em jogo”, reforçando “seu sentido de crença, de envolvimento, de empenho no jogo” ( AGUIAR, 2017AGUIAR, A. Illusio. In: CATANI, A. M.; NOGUEIRA, M. A.; HEY, A. P.; MEDEIROS, C. C. C. (org.). Vocabulário Bourdieu. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. p. 231-233. , p. 231), que faz com que os premiados desejem estar na posição dos dominantes ou próximo deles, desejem jogar o jogo; portanto, o prêmio é ainda maior para quem o concede.

Segundo Latour (2011)LATOUR, B. Ciência em ação: como seguir cientistas engenheiros sociedade afora. Tradução de Ivone C. Benedetti. 2. ed. São Paulo: Ed. Unesp, 2011. 460p. , fazem parte do fazer do cientista o recrutamento, alistamento, controle e afastamento das pessoas: recrutar e controlar para que creiam e divulguem as verdades; afastar os crentes do conhecimento do processo de produção dessas verdades, pois o alistamento não objetiva cumular de conhecimento os alistados; e afastar os incrédulos para que não enfraqueçam ou derrotem a crença e a verdade. Pode-se entender que há uma intenção em promover o campo da Matemática de modo a consagrar a ortodoxia deste campo e sustentar sua manutenção, isto é, reproduzir sua estrutura seja ela objetiva (traduzida pela aquisição de recursos materiais, seleção de novos agentes etc.) ou simbólica (enquanto inculcação de crenças e consagração ou acúmulo de capital simbólico, próprio do campo científico).

Nesse sentido, a OBMEP manifesta-se como um fazer do cientista e como um mecanismo de conservação do campo, tanto pelo recrutamento de “talentos” como pela perpetuação da crença de que a Matemática é para poucos, crença que é reforçada, por exemplo, por meio do insucesso de milhões de estudantes na OBMEP, os quais são afastados do campo da Matemática por não terem habitus apropriado para fortalecer a autonomia e a estrutura hierárquica do campo, e, ao serem excluídos, esses alunos fracassados sustentam essa autonomia e essa hierarquia.

Interpretamos que os prêmios recebidos pela participação na OBMEP é a coroação do sucesso dessa competição como estratégia dos matemáticos para valorizar, consagrar e legitimar seu modo de ser, fazer e ver a Matemática. Além de estratégia de valorização da Matemática acadêmica e de inculcação da crença nesse valor, também há a inculcação da crença da Matemática acadêmica como base e alavanca para o desenvolvimento científico e tecnológico do país : “O caminho do Brasil passa pela vida de cada um de vocês” 12 12 Disponível em: http://www.OBMEP.org.br/noticias.DO?id=215 . Acesso em: 30 ago. 2021. , disse a Presidente Dilma Rousseff, na cerimônia de premiação dos alunos da OBMEP em 2011. A participação de autoridades nacionais nas cerimônias de premiação não deixa dúvidas a respeito da importância da Matemática para o País. “A presidente cumprimentou todos os alunos e posou para fotos com cada um deles. Os alunos pentacampeões e hexacampeões da OBMEP receberam suas medalhas das mãos da Presidente da República, Dilma Rousseff” 13 13 Disponível em: http://www.OBMEP.org.br/noticias.DO?id=215 . Acesso em: 30 ago. 2021. .

Como se pode notar, existe uma hierarquia entre os medalhistas, que reflete a estrutura do campo, cuja distinção não se dá somente pela cor do metal recebido, mas sobretudo pelo local em que a cerimônia ocorre (no IMPA, e no Rio de Janeiro/RJ) e das mãos de quem a medalha é recebida (Presidente do Brasil). Essa hierarquia poderia esquematicamente ser vista da seguinte maneira: primeiro alguns talentos notáveis (alguns hexacampeões e pentacampeões), depois algumas centenas de medalhistas (de prata e bronze) e, por último, os quase 20 milhões de eliminados mesmo diante de oportunidades supostamente justas já que, por meio da OBMEP, se faz valer a crença de que “o talento para a Matemática e Ciências não depende de cor, sexo ou classe social” (PROJETO-PILOTO, não publicado, apud SOUZA NETO, 2013SOUZA NETO, J. A. Olimpíadas de matemática e aliança entre o campo científico e o campo político. 2013. 77 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2013. ).

6 Considerações finais: recrutamento pela OBMEP

A OBMEP é uma competição escolar criada com o propósito de incentivar o aprofundamento no estudo da Matemática e de inserir jovens talentos no meio acadêmico. O alcance nacional, o apoio institucional e o investimento na Olimpíada sinalizam a dimensão de seu capital material, político e simbólico. O apoio político e financeiro que este Programa recebe expressa o poder do polo dominante do campo da Matemática que, inclusive por meio da OBMEP, influencia o cotidiano da escola e a formação do professor do Ensino Básico.

Com base na teoria do campo de Bourdieu (2013a)BOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (org.). A sociologia de Pierre Bourdieu. São Paulo: Olho d’Água, 2013a. p. 112-143. , propusemos um desenho do campo da matemática que apresenta seus polos opostos: os matemáticos acadêmicos como agentes do polo dominante, com discurso ortodoxo relativo ao ensino da Matemática; e os educadores matemáticos, acadêmicos da Educação Matemática que se situam no polo dominado e propõem discursos heterodoxos. Este é, como nos guia essa mesma teoria sociológica, somente um modo de ver, um ponto de vista entre outros.

As alianças entre os campos científico, político e econômico propiciam o aumento recíproco e a valorização, também recíproca, dos capitais específicos desses campos. Com isso, dão vez à imposição de um arbitrário cultural consistente na crença da necessidade de desenvolvimento tecnológico nacional que dependeria, necessariamente, da Matemática acadêmica.

A presente análise procurou, a partir de um diálogo com a teoria de Bourdieu, mostrar as alianças entre os campos científico e político e quais são os capitais que circulam e como se valorizam pelas premiações e cerimônias. Crenças e valores implícitos da OBMEP fortalecem a Matemática acadêmica e as estratégias de consagração por meio de discursos ortodoxos e recrutamento de novos agentes.

Nesse sentido, a OBMEP pode ser entendida como uma estratégia para acumular poder à Matemática acadêmica e a seus executores, agentes que proclamam a superioridade da sua própria prática matemática. Ou seja, a OBMEP como um programa educacional funciona melhor como um modo de valorização do polo dominante do campo da Matemática e suas crenças do que para uma Matemática de qualidade na Educação.

Argumentamos que a qualidade esperada para o ensino de Matemática, objetivo da OBMEP, é questionável enquanto protagonizada por um grupo específico que não considera discussões mais amplas no âmbito da Educação Matemática. Os quase 20 milhões de eliminados constituiriam um indicativo de “melhoria da qualidade da Educação Básica”?

A resposta a essa pergunta depende do que se entende por “melhoria da qualidade da Educação Básica”. Essa leitura bourdiesiana mostra a OBMEP como um programa educacional que funciona melhor como um modo de valorização do polo dominante do campo da Matemática e suas crenças do que para uma Matemática de qualidade na Educação.

A OBMEP se coloca como oferecendo oportunidades supostamente justas e iguais a todos os estudantes, pois, como veiculam nos discursos relacionados à competição, todos teriam a mesma chance de concorrer, de fazer as provas, já que sequer precisam se inscrever para a primeira fase. A sociologia abordada neste artigo não concordaria que isso significa promoção social. Como dizem Pereira e Andrade (2007PEREIRA, G. M.; ANDRADE, M. C. L. Coach Carter ou a segunda chance dos excluídos do interior. Revista Educação, São Paulo, v. 1, n. 5, p. 56-65, 2007. , p. 61) e Nogueira e Nogueira (2007NOGUEIRA, M. A.; NOGUEIRA, C. M. M. Um arbitrário cultural dominante. Revista Educação, São Paulo, v. 1, n. 5, p. 36-45, 2007. , p. 36) explicando A Reprodução , de Pierre Bourdieu e Jean Claude Passeron (2009)BOURDIEU, P.; PASSERON, J. C. A Reprodução: Elementos para uma Teoria do Sistema de Ensino. 2. ed. Petrópolis: Vozes, 2009. 266 p.: “os arbitrários pedagógicos são recebidos de forma desigual pelas distintas classes e frações de classes”. Em outras palavras:

[...] para que sejam favorecidos os mais favorecidos, é necessário e suficiente que a escola ignore, no âmbito dos conteúdos do ensino que transmite, e dos critérios de avaliação, as desigualdades culturais entre as crianças das diferentes classes sociais. Tratando todos os educandos, por mais desiguais que sejam, eles de fato, como iguais em direitos e deveres, o sistema escolar é levado a dar sua sanção às desigualdades iniciais diante da cultura ( HEY; CATANI, 2008HEY, A. P.; CATANI, A. M. Bourdieu e a educação. Revista Cult., São Paulo, v. 11, n. 128, p. 63-65, set. 2008. , p. 63).

Ao garimpar “talentos” para o desenvolvimento do País, é selecionado um grupo pequeno de alunos, cerca de 0,003% dos participantes da OBMEP, sendo recrutados aqueles mais adaptados e adaptáveis ao polo dominante do campo da Matemática. Assim, enquanto política educacional que visa a melhoria da Educação, ponderamos como não justificável todo o investimento que envolve a OBMEP, pois se apropriam efetivamente dele apenas alguns poucos alunos. Nossa interpretação é que a exceção (ser medalhista) é necessária para confirmar a ilusão da mobilidade por meio da Matemática.

Os cartazes de divulgação da OBMEP capitalizam a Matemática ao associarem essa Olimpíada ao samba, ao futebol e ao desenvolvimento do País. Alianças viabilizam veicular a Matemática acadêmica como base e alavanca para o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil, contribuindo para a aceitação e a manutenção da dominação que é resultado de um conjunto complexo de ações que se articulam.

A OBMEP, como um processo de fora para dentro da escola, impõe a visão de Matemática dos matemáticos acadêmicos, seus executores, os quais, no desenho do campo da matemática apresentado, representam o polo dominante deste campo. Com isso, torna-se possível ou viável a inculcação de crenças, de valorização e de legitimação da Matemática acadêmica.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    20 Out 2021
  • Aceito
    06 Mar 2022
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