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Identificação de efeitos de dispersão em experimentos fatoriais 2K e 2K-p

Identifying dispersion effects in 2K e 2K-p factorial experiments

Resumos

Este artigo apresenta uma estratégia para identificar efeitos de locação e efeitos de dispersão em experimentos fatoriais não-replicados, fracionados ou não. A estratégia é adaptada para projetos experimentais com poucas replicações, sendo ilustrada em um exemplo prático. Além da estratégia proposta, outros métodos típicos de experimentos com replicações foram aplicados nesse exemplo e os resultados encontrados foram bastante parecidos.

Efeitos de dispersão; projeto de experimentos; melhoria da qualidade


This paper comments on a strategy for analyzing location and dispersion effects in unreplicated factorial experiments, concentrating especially on methods for identifying dispersion effects. The strategy is adapted for designs of experiments with few replications. An example is presented. Other methods for replicated experiments are applied in the example and the results found were very similar.

Dispersion effects; experimental design; quality improvement


Identificação de efeitos de dispersão em experimentos fatoriais 2K e 2K-p

Identifying dispersion effects in 2K e 2K-p factorial experiments

Viviane Leite Dias de MattosI; Pedro Alberto BarbettaII; Robert Wayne SamohylIII

IProf.ª na Universidade Católica de Pelotas e Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção/UFSC; e-mail: vldm@atlas.ucpel.tche.br

IIProf. no Departamento de Informática e Estatística/UFSC. e-mail: barbetta@inf.ufsc.br

IIIProf. no Departamento de Engenharia de Produção/UFSC. e-mail: samohyl@deps.ufsc.br

RESUMO

Este artigo apresenta uma estratégia para identificar efeitos de locação e efeitos de dispersão em experimentos fatoriais não-replicados, fracionados ou não. A estratégia é adaptada para projetos experimentais com poucas replicações, sendo ilustrada em um exemplo prático. Além da estratégia proposta, outros métodos típicos de experimentos com replicações foram aplicados nesse exemplo e os resultados encontrados foram bastante parecidos.

Palavras-chave: Efeitos de dispersão, projeto de experimentos, melhoria da qualidade.

ABSTRACT

This paper comments on a strategy for analyzing location and dispersion effects in unreplicated factorial experiments, concentrating especially on methods for identifying dispersion effects. The strategy is adapted for designs of experiments with few replications. An example is presented. Other methods for replicated experiments are applied in the example and the results found were very similar.

Key words: Dispersion effects, experimental design, quality improvement.

INTRODUÇÃO

Reduzir a variabilidade de um produto ou processo produtivo é fundamental para a obtenção da melhoria da qualidade. Embora Shewhart e Deming já tivessem salientado a necessidade da redução da variabilidade, foi Taguchi quem sugeriu uma metodologia de projeto robusto, por meio da qual produtos e processos tornam-se pouco sensíveis às fontes de variação. De acordo com esta metodologia, realizam-se experimentos planejados, procurando-se identificar os fatores que afetam a média (fatores com efeito de locação) e os fatores que afetam a variabilidade (fatores com efeito de dispersão) do processo. Em muitos casos, também se busca encontrar uma combinação ótima, que aproxima ao máximo a média do processo ao valor-alvo e, ao mesmo tempo, minimiza a variabilidade.

Na indústria, durante as últimas décadas, tem sido dada muita importância à identificação de efeitos de dispersão em experimentos, principalmente em experimentos não-replicados ou com poucas replicações, por serem mais rápidos e econômicos.

De acordo com Montgomery (1997, p.1), um experimento é um teste ou uma série de testes nos quais as variáveis de entrada (fatores controláveis) de um sistema são manipuladas para que sejam identificadas as razões das mudanças nas variáveis de saída (características funcionais do produto ou processo). As variáveis de saída também são chamadas de respostas.

Os experimentos normalmente envolvem vários fatores. Uma maneira eficiente de combinar os níveis dos diversos fatores consiste em cruzá-los de tal forma que cada nível de um fator seja combinado com todos os níveis dos outros fatores, caracterizando os chamados projetos fatoriais. Com a realização de um único projeto fatorial, podem-se avaliar os efeitos sobre a resposta de cada fator e das interações entre fatores.

Quando cada um dos K fatores de um projeto fatorial é ensaiado em apenas dois níveis, o projeto experimental é dito do tipo 2K. Esse tipo de projeto exige um número relativamente pequeno de ensaios e é adequado quando a quantidade de fatores é elevada. Um projeto 2K costuma servir de base para outros projetos mais complexos.

Quando se têm muitos fatores, mesmo que eles sejam ensaiados em apenas dois níveis, o número de ensaios necessários ainda pode ser muito grande. Nesse caso, pode-se fazer uso dos projetos fracionários do tipo 2K-p, onde K é o número de fatores e p é o número de fracionamentos, resultando em 2K-p combinações de níveis dos fatores efetivamente ensaiados. A idéia dos projetos fracionados é ensaiar apenas parte das possíveis combinações de níveis, sendo planejados de tal forma que garantam a possibilidade de se estimar os efeitos principais (de cada fator isoladamente) e, às vezes, as interações entre dois fatores. Esse tipo de projeto é particularmente importante quando se pretende fazer uma triagem de fatores para serem usados em estudos posteriores.

Na análise dos dados de um experimento, bons resultados podem ser obtidos se as técnicas clássicas da experimentação incorporarem as idéias de Taguchi, que relacionam qualidade com variabilidade. Neste contexto, procuram-se identificar os fatores que apresentam efeitos de dispersão por afetar a variabilidade da resposta, além dos tradicionais fatores com efeitos de locação, que afetam o valor esperado da resposta (a Figura 1 ilustra os dois tipos de efeito).


Diz-se que um fator tem efeito de locação ativo se o valor esperado da resposta for diferente em seus níveis superior e inferior. Um fator apresenta efeito de dispersão ativo se a variância da resposta em seu nível superior for diferente da variância da resposta em seu nível inferior.

Em experimentos com replicações (mais de um ensaio em cada ponto experimental), a identificação dos efeitos de locação pode ser feita através de técnicas estatísticas formais, como o teste t de Student ou o teste F da análise de variância. Em experimentos não-replicados é comum usar métodos menos formais, como o gráfico de Pareto e o gráfico de probabilidade normal, pois não existe uma estimativa confiável da variância do erro experimental, que é essencial para a aplicação de um teste estatístico. Nestes processos gráficos, identificam-se efeitos aparentemente significativos.

Embora o método de Taguchi seja bastante controverso, elogiado por uns e criticado por outros, ele foi muito importante para a Engenharia da Qualidade (Kackar, 1986; Box, 1988; Montgomery, 1997). Ele conseguiu, com grande objetividade e precisão, detectar e delimitar alguns problemas desta área. Contudo, aparentemente, não teve o mesmo sucesso com algumas técnicas propostas para operacionalizar e buscar a solução dos problemas.

Uma das maiores contribuições de Taguchi foi a redefinição de qualidade, relacionando-a com a idéia de perda imposta por um produto à sociedade, descrita matematicamente por meio de uma função quadrática. Dada uma característica funcional y e o seu valor ideal , a função perda mede a qualidade em termos da variação de y em relação a . Usando uma expansão em série de Taylor, Taguchi et al. (1990, p.18) justificam o uso da função perda quadrática, definida da seguinte forma:

onde k é uma constante de proporcionalidade, fazendo com que a função L assuma valores em termos monetários, e é o intervalo de especificação da característica y.

A equação (1) representa um tipo de característica funcional conhecida como nominal-é-melhor, pois existe um valor real ideal. Taguchi também definiu a função perda para características funcionais em que se deseja o maior resultado possível (maior-é-melhor) ou o menor resultado possível (menor-é-melhor) (ver Taguchi et al., 1990).

Num programa de melhoria da qualidade, sendo esta medida em termos da função perda quadrática, torna-se natural o objetivo de minimizar seu valor esperado. Fazendo-se a extensão do domínio de L(y) para todos os reais, tem-se a seguinte expressão para a perda esperada:

onde µy e são o valor esperado e a variância de y, respectivamente. Fica evidente, pela expressão (2), que a menor perda esperada é obtida quando se ajusta a média do processo (µy) ao valor-alvo () e, simultaneamente, se minimiza a variância do processo ().

Taguchi também chamou a atenção para a necessidade da preocupação com a qualidade iniciar durante a fase de projeto, enfatizando a importância de um trabalho preventivo, além de conscientizar a indústria das vantagens da utilização de projetos de experimentos, bem como do controle, pelo menos indireto, de fatores de ruído para obtenção de produtos e processos robustos.

O objetivo deste artigo é apresentar diversos métodos para identificar efeitos de dispersão, dando ênfase a uma estratégia originalmente proposta por Brenneman (2000) e Brenneman e Nair (2001) para experimentos fatoriais não-replicados. Na segunda seção estão apresentados os principais métodos utilizados para identificar efeitos de dispersão, assim como a estratégia anteriormente mencionada. A terceira seção apresenta um exemplo prático, estendendo a estratégia para a situação de experimentos com poucas replicações. Finalizando, na última seção estão as considerações finais.

MÉTODOS PARA INDENTIFICAÇÃO DE EFEITOS DE DISPERSÃO

Os primeiros métodos para identificar efeitos de dispersão foram desenvolvidos para experimentos com replicações, sendo a variabilidade avaliada por meio da variância amostral, calculada em cada ponto experimental. Embora estes métodos apresentem a vantagem de não depender do ajuste de algum modelo para a média do processo, suas eficiências são baixas em experimentos com poucas replicações, conforme mostra o artigo clássico de Bartlett e Kendall (1946). Por outro lado, o uso de muitas replicações (acima de nove, como sugerido por Bartlett e Kendall, 1946) aumenta demasiadamente o custo do projeto experimental.

Taguchi propôs a utilização de uma estatística de desempenho, denominada razão sinal/ruído, para mensurar a variabilidade provocada por fatores de ruído. Se a situação analisada for do tipo nominal-é-melhor, a estatística, de acordo com Vinning e Myers (1990), é calculada pela expressão:

onde é a razão sinal/ruído e e são, respectivamente, a média e a variância das observações de cada ponto experimental.

Para a exposição de outros métodos descritos na literatura, considere os dados do experimento, yij(i = 1, 2,..., N e j = 1, 2,..., J), satisfazendo o seguinte modelo linear:

onde e são vetores de parâmetros; xi' e zi' são as linhas das matrizes de planejamento; eij é o erro experimental associado à observação yij; g é uma função de ligação para a variância; N é o número de pontos experimentais ensaiados e J é o número de replicações. Supostamente eij tem distribuição normal com média nula e variância unitária. A equação (4), quando vista em termos do valor esperado, é chamada de modelo da média ou modelo de locação; e a equação (5) de modelo da variância. A função g pode ser a função identidade (modelo linear), mas é mais comum ser a logarítmica (modelo log-linear). A transformação logarítmica na equação (4) induz aditividade e estabiliza a variância (Nair e Pregibon, 1988).

Em experimentos replicados (J > 1), além dos procedimentos já apresentados, podem ser usados os métodos denominados S e R por Nair e Pregibon (1988), baseados no modelo log-linear para a variância. No método R é calculado o logaritmo da razão entre médias aritméticas de variâncias amostrais nos diferentes níveis de cada fator, enquanto que no método S, calcula-se o logaritmo da razão entre médias geométricas das variâncias amostrais. Assim, o efeito do k-ésimo fator é calculado pelas seguintes expressões (métodos R e S, respectivamente):

onde: é a variância amostral no i-ésimo ponto experimental (i =1, 2, ..., N); i(k +)indica ensaios realizados no nível superior do k-ésimo fator;i(k -)indica ensaios realizados no nível inferior do k-ésimo fator (k = 1, 2, ..., K).

Os efeitos das interações são calculados de forma análoga.

O método S é resultante de uma análise por mínimos quadrados no logaritmo das variâncias amostrais, conforme sugere o procedimento clássico de Bartlett e Kendall (Nair e Pregibon, 1988).

Para experimentos não-replicados (J = 1), os métodos baseiam-se na análise dos resíduos de um modelo ajustado aos dados (modelo da média). Numa fase inicial, geralmente o modelo (4) é ajustado aos dados experimentais através do método dos mínimos quadrados ordinários (MQO).

Sendo o valor predito pelo modelo no i-ésimo ponto experimental e o valor observado neste ponto (i = 1, 2,..., N), calculam-se os resíduos por:

A identificação dos efeitos de dispersão é feita através dos resíduos e, portanto, tem o inconveniente de depender da qualidade da modelagem do valor médio. No que segue, são discutidos métodos baseados nos resíduos.

Harvey (1976) fez uma adequação da abordagem de Bartlett e Kendall (1946) para estudar heterocedasticidade em análise de regressão. Sua idéia pode ser usada em experimentos não-replicados, substituindo as variâncias amostrais por resíduos quadráticos. Sob a suposição de um modelo log-linear para a variância, a avaliação de cada efeito é feita pela razão entre médias geométricas. Mais especificamente, a estatística é dada por:

onde ri (i =1, 2, ..., N) são os resíduos encontrados a partir do modelo da média, conforme equação (8).

Box e Meyer (1986) propuseram estudar os efeitos de dispersão a partir da razão entre médias aritméticas (o que implicitamente supõe o modelo log-linear para a variância). Para o k-ésimo fator, a estatística deste método é dada por:

O método de Box e Meyer (1986) é análogo ao método R de Nair e Pregibon (1988) [vide equação (6)], substituindo as variâncias amostrais por resíduos quadráticos. Com a mesma substituição, o método de Harvey (1976) é análogo ao método S de Nair e Pregibon (1988), [vide equação (7)].

Outro método foi descrito por Wang (1989) para projetos fatoriais em geral. Para projetos dos tipos 2K e 2K-p, a estatística de Wang tem a forma:

onde é uma estimativa da variância, obtida pelo método usual de um modelo linear (supondo variância constante). Sob a hipótese de um modelo log-linear, com apenas um efeito ativo e dados provenientes de uma distribuição normal, a estatística tem distribuição Qui-quadrado com um grau de liberdade. Porém, a suposição de que existe apenas um efeito de dispersão significativo, em geral, não é razoável em termos práticos.

Bergman e Hynén (1997) propuseram uma modificação ao método de Box e Meyer (1986). Para reduzir o viés no cálculo dos efeitos de dispersão, eles propõem utilizar os resíduos sob um modelo expandido de média. Para calcular o efeito de dispersão do fator k, é definido um novo conjunto de fatores. Este conjunto deve ser composto pelos elementos identificados inicialmente pelo método dos mínimos quadrados ordinários (MQO), pelo fator k e pelas iterações do fator k com os fatores identificados como tendo efeito de locação. Por exemplo, suponha que tenha sido identificado o seguinte conjunto de efeitos significativos no modelo da média: L = {I, A, B}. Para calcular o efeito de dispersão do fator C, os resíduos são calculados em relação a um modelo com o seguinte conjunto de efeitos: LE = {I, A, B, C, AC, BC}. A estatística deste método, relativa ao k-ésimo fator, é dada por:

onde (i =1, 2, ..., N) são os resíduos do modelo expandido da média. Sob a hipótese de que os dados provêm de distribuição normal e que todos os demais efeitos são nulos, a estatística segue uma distribuição de Fisher-Snedecor com (m,m) graus de liberdade, onde m é o número de elementos de LE. Alternativamente, pode-se utilizar a transformação logarítmica, conforme expressão (13), e identificar os efeitos ativos considerando a aproximação à distribuição normal.

O cálculo de resíduos a partir de um modelo expandido da média também pode ser feito com o método de Harvey (1976), aqui denominado de método HM, conforme sugerem Brenneman (2000) e Brenneman e Nair (2001) [vide equação (14)].

Após o cálculo dos efeitos de dispersão por métodos previamente discutidos, podem-se colocar os valores em um gráfico de probabilidade normal, conforme sugerido por Daniel (1959) apud Montgomery (1997, p.318 e p.335), para identificar efeitos aparentemente significativos (ou ativos). Usando o método de Box e Meyer (1986), Montgomery observou que os fatores e interações que não têm efeito de dispersão apresentam distribuição aproximadamente normal com média zero e variância constante, razão pela qual ficam ao longo de uma linha reta sobre o gráfico de probabilidade normal. Os fatores ou interações que apresentam efeitos de dispersão não têm média zero e, portanto, distanciam-se da linha reta formada pelos outros fatores e iterações.

A partir de uma reflexão teórica e avaliação de resultados por meio de simulações, Brenneman (2000) e Brenneman e Nair (2001) realizaram uma análise crítica dos métodos descritos anteriormente e desenvolveram uma estratégia para identificar efeitos de dispersão em projetos do tipo 2K-p não-replicados.

Sobre os métodos eles concluíram:

  • o método proposto por Box e Meyer (1986) funciona bem apenas quando existe um único fator com efeito de dispersão; caso contrário, apresenta

    viés estrutural e

    viés de estimação. O viés de estimação tende a se reduzir com o aumento do tamanho do experimento (mais pontos experimentais), mas o mesmo não acontece com o viés estrutural;

  • o método proposto por Bergman e Hynén (1997) pode apresentar o mesmo tipo de viés estrutural. Além disso, a estatística criada por estes autores só terá uma distribuição

    F se a hipótese nula considerar todos os efeitos de dispersão nulos e não apenas o efeito do fator analisado;

  • o método proposto por Wang (1989) é viesado para modelos de dispersão log-linear, além de não seguir uma distribuição Qui-quadrado quando existir mais de um efeito de dispersão ativo;

  • o método proposto por Harvey (1976) apresenta viés que depende da estrutura do efeito de dispersão ativo e da adequação do modelo, diminuindo com o aumento do tamanho do experimento. Entretanto, se o conjunto dos fatores com efeito de locação (

    L) for fechado e apresentar menos do que

    N/

    2 elementos, então esta estatística não apresentará viés para fatores que não pertençam ao conjunto fechado (

    D - L), onde

    D representa o conjunto de fatores com efeito de dispersão. Se, por exemplo, (

    D

    L), os estimadores de todos os efeitos de dispersão são não-viesados. Brennemam (2000) mostrou que a estatística utilizada por este método pode subestimar o efeito de dispersão de um fator

    k se este fator e suas respectivas iterações com os fatores que apresentam efeito de locação (

    L) não fazem parte do modelo de locação utilizado;

  • o método de Harvey modificado corrige em parte o viés, ao usar o modelo expandido de locação, empregando o fator analisado (

    k) e suas iterações com os elementos de

    L nas diversas modelagens da média, além dos fatores ativos para efeitos de locação.

  • Nos métodos analisados, os autores constataram a existência de um certo grau de viés, que pode ser decorrente da inadequação do modelo de locação, bem como da presença de múltiplos efeitos de dispersão. Estes métodos podem identificar não apenas falsos efeitos de dispersão, como também podem subestimar os existentes.

    A partir desta análise crítica, Brenneman (2000) e Brenneman e Nair (2001) sugerem um algoritmo para identificar efeitos de locação e efeitos de dispersão em projetos experimentais do tipo 2K-p não-replicados, conforme os seguintes passos:

    1) ajustar um modelo de locação pelo método dos mínimos quadrados ordinários (MQO), identificando o conjunto L de efeitos de locação;

    2) se L contém um conjunto fechado L' com N/2 ou mais elementos, então a identificação dos efeitos de dispersão é difícil, sendo necessário aumentar o número de ensaios (alterar o projeto experimental);

    3) se não, usar o método de Harvey modificado para estimar os efeitos de dispersão e identificar os ativos (por exemplo, por meio do gráfico de probabilidade normal). Seja D0 o conjunto de efeitos de dispersão ativos identificados nesta etapa;

    4) incluir o efeito k no conjunto dos efeitos, mesmo quando foi identificado como não-ativo, mas corresponde à interação de dois outros efeitos, k1 e k2, identificados como ativos, isto é, k = k1 * k2, onde * indica o operador de iteração;

    5) construir uma equação para a variância com os efeitos de dispersão D0 , usando o modelo log-linear [log( ) = ziq], onde as estimativas dos elementos de q podem ser obtidas por MQO;

    6) refazer o modelo de locação usando mínimos quadrados generalizados (MQG), sendo a cada observação atribuído um peso fornecido pelo inverso da variância predita pelo modelo definido no passo (5);

    7) calcular novos resíduos e novos efeitos de dispersão. Efeitos de dispersão não identificados como ativos poderão ser eliminados e as estimativas refeitas;

    8) repetir os passos (5), (6) e (7) até que o processo se estabilize.

    Alguns autores sugerem apenas uma ou duas iterações devido ao problema da convergência na presença de valores discrepantes. De acordo com Hooper (1993), valores muito pequenos como estimativas das variâncias geram pesos muito grandes, o que faz com que as estimativas das iterações seguintes sejam piores.

    Uma discussão mais teórica sobre a construção de modelos para a variância está descrita em Carroll e Ruppert (1988).

    Em experimentos com poucas replicações (2 < J < 4), o método clássico de Bartlett e Kendall é pouco eficiente e este trabalho mostra a possibilidade de usar o procedimento proposto por Brenneman e Nair (2001). Neste caso, têm-se JN observações, produzindo JN resíduos. Sugere-se que sejam calculadas as médias aritméticas, em cada ponto experimental, com os quadrados dos resíduos, resultando em N resíduos quadráticos médios. A justificativa de usar resíduos quadráticos médios é feita por Barbetta et al. (1999). Foi constatado, por meio de simulações de Monte Carlo, que agregar fatores não-significativos e trabalhar com os resíduos quadráticos médios fornece estimadores mais eficientes de efeitos de dispersão do que trabalhar com resíduos quadráticos individuais.

    EXEMPLO

    Para ilustrar a estratégia proposta, foram utilizados dados de um experimento desenvolvido por Silva (2002). Trata-se de uma central de comutação telefônica para serviços especializados, tais como: auxílio à lista, hora certa, teledespertador automático, etc. O experimento foi realizado com a ajuda de um simulador e tinha como objetivo avaliar o efeito dos fatores: número de troncos (A), número de filtros digitais (B), número de canais de máquina de mensagem (C) e número de atendentes (D) no tempo de resposta de uma consulta.

    O número de troncos refere-se à quantidade de linhas ligadas à rede telefônica e determina a quantidade de usuários que podem ser atendidos simultaneamente por qualquer um dos serviços oferecidos. O filtro digital é um dispositivo responsável pelo reconhecimento das cifras que o usuário disca a fim de navegar no menu de um serviço solicitado e só pode ser utilizado por um único usuário. Já os canais de máquina de mensagem são responsáveis pela geração das mensagens requisitadas pelos usuários, só podendo ser utilizado um canal por mensagem. O número de atendentes refere-se à quantidade de posições de atendimento personalizado.

    O tempo de resposta (Y), medido em segundos, é o intervalo de tempo desde que o usuário gerou a chamada até o momento que obteve acesso à informação solicitada.

    Tabela 1 mostra os níveis de cada fator, que foram cruzados de acordo com um projeto fatorial 24, com quatro replicações. Os níveis inferiores de cada fator correspondem às condições atuais de uma certa central no horário de maior movimento, enquanto que os níveis superiores correspondem ao que pode ser feito com determinado investimento. O experimento simulado foi realizado para subsidiar o estudo da capacidade do sistema.

    Tabela 2 apresenta os resultados do experimento na ordem natural da seqüência dos níveis dos fatores. (A fonte original não cita se a ordem dos ensaios foi aleatorizada ou não, embora, em experimentos simulados por computador, normalmente a aleatorização não seja fundamental para a validade do experimento.)

    Para identificar possíveis efeitos de locação e dispersão, foi utilizada a estratégia descrita na Seção 2. Como esta estratégia foi originalmente proposta para experimentos não-replicados (Brenneman e Nair, 2001), tornou-se necessária uma adaptação: em cada ponto experimental foram calculados quatro resíduos quadráticos, referentes às quatro replicações, que foram, posteriormente, substituídos pela média aritmética. A avaliação dos efeitos de dispersão foi realizada pelo método Harvey (H) e pelo método Harvey modificado (HM), sendo empregado o gráfico de probabilidade normal para identificação dos efeitos de dispersão ativos.

    Na primeira iteração, buscou-se identificar os efeitos de locação ativos. Da análise da variância na Tabela 3, estão identificados os seguintes fatores com efeitos de locação ativos: A, B e D, além das interações AB, AD e BD. Assim, o conjunto de fatores com efeitos de locação é dado por: L = {I, A, B, D, AB, AD e BD}, onde I representa a média geral.

    Aplicando o método dos mínimos quadrados ordinários (MQO) aos dados, obteve-se o modelo inicial para a média:

    Calculando-se os dezesseis resíduos quadráticos médios e aplicando (9), foi avaliada a existência de efeitos de dispersão pelo método H por meio do gráfico de probabilidade normal [Figura 2 (a)]. Foram sendo identificados os efeitos de dispersão ativos A e AD. Assim, pelo método H, tem-se o conjunto inicial de efeitos de dispersão: D0 ={I, A, AD}, onde I representa a média geral.


    Para o método de Harvey modificado, HM, é necessário expandir o modelo da média. Essa expansão deve ser diferente para cada efeito de dispersão a ser estimado. Entretanto, como foram consideradas apenas as interações de segunda ordem, não houve muita variação entre os termos utilizados nos modelos, que se reduziram a dois tipos, identificados na Tabela 4. Para cada modelo são calculados os dezesseis resíduos quadráticos médios. Aplicando (14), estima-se o efeito de dispersão. A Figura 2(b) apresenta o gráfico de probabilidade normal desses efeitos, o qual sugere o mesmo conjunto D0 ={I, A, AD} obtido pelo método H.

    As diferenças entre os resíduos quadráticos (método H) e os resíduos quadráticos modificados (método HM) foram infinitesimais, assim, adotou-se o método H pela sua relativa simplicidade.

    Os efeitos da interação AD e do fator A foram identificados como ativos. Conforme passo (4) do algoritmo, o efeito do fator D também deve ser incluído ao conjunto, resultando em D0 = {I, A, D e AD}. A partir dele, a modelagem foi feita nos logaritmos neperianos dos resíduos quadráticos médios (aplicando MQO), resultando no modelo:

    A partir da equação (16) é possível estimar a variância em cada uma das condições experimentais. Os modelos podem ser refinados usando o método dos mínimos quadrados generalizados (MQG) para estimar um novo modelo para a média. Cada observação é ponderada pelo inverso da variância estimada pela expressão (16) e os novos resíduos permitem reavaliar os efeitos de dispersão.

    Os resultados desta segunda análise não modificaram a composição do conjunto L (efeitos de locação). Com o refinamento do modelo, parece ser confirmada a não existência de efeito de dispersão no fator D e acentuada a importância do efeito de dispersão da iteração AD e, principalmente, do efeito do fator A, conforme Figura 3(a). Portanto, um novo conjunto dos fatores com efeitos de dispersão foi gerado de acordo com esta estratégia: D1 ={I, A, AD}.


    Os resultados de uma terceira iteração não modificaram a composição do conjunto L, além de confirmar a composição do conjunto D, acentuando ainda mais os efeitos de dispersão de A e AD.

    Como o experimento tem replicações, foi realizada uma nova análise, empregando os métodos R e S, de Nair e Pregibon (1988). O método S corresponde à abordagem clássica de Bartlett e Kendall (1946), em que a dispersão é avaliada em cada ponto experimental através da variância amostral. Esse método poderia ser considerado como o método padrão se houvessem 10 ou mais replicações. Os resultados, mostrados na Figura 4, evidenciam que, de acordo com o método R, parece ser ativo apenas o fator A [Figura 4 (a)], enquanto que pelo método S, o fator A e a iteração AD [Figura 4 (b)].


    Considerando o exposto, há fortes evidências de que o fator A (número de troncos) altera a variância do tempo de resposta. Como a interação AD apareceu ativa em alguns dos métodos utilizados, então há uma suspeita que a influência do fator A no o tempo de resposta possa ser diferente, dependendo do nível do fator D (número de atendentes).

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    A metodologia de análise de efeitos de dispersão proposta por Brenneman (2000) e Brenneman e Nair (2001), para experimentos não-replicados, inicia com a identificação de efeitos de locação pelos métodos clássicos. Usa-se, inicialmente, o método de mínimos quadrados ordinários (MQO) para construir um modelo para a média. Sugere o método HM (Harvey modificado) para avaliar a existência de efeitos de dispersão. Como alguns efeitos falsos podem ser detectados, existe necessidade de refinar o modelo através do método dos mínimos quadrados generalizados (MQG).

    O presente artigo mostra a possibilidade de usar esta estratégia em experimentos com poucas replicações. Nesse caso, tem-se vários resíduos quadráticos em cada ponto experimental e uma sugestão é utilizar a média desses resíduos quadráticos, em cada ponto experimental, para identificar o efeito e modelar a variância.

    O procedimento foi ilustrado em um experimento com quatro replicações. Foram usados inicialmente os métodos H (Harvey) e HM (Harvey modificado) para identificação de efeitos de dispersão. Como os resultados encontrados foram praticamente os mesmos, optou-se pelo método H pela sua simplicidade. De acordo com essa estratégia, inicialmente foram detectados o fator A e a interação AD, concordando com o resultado do método S, também denominado por alguns autores de método de Bartllet e Kendall. O refinamento do modelo da média por MQG, confirmou o resultado.

    Identificar efeitos de dispersão é uma tarefa extremamente difícil, principalmente em experimentos não-replicados ou com poucas replicações. Embora não exista ainda uma teoria consagrada a respeito, a estratégia utilizada pareceu eficiente para a situação de experimentos com poucas replicações, pois os resultados do exemplo, com a aplicação de vários métodos, levaram a resultados parecidos. Embora o exemplo apresentado seja um experimento completo (2K), os procedimentos são análogos para projetos fracionados (2K-p), com particular atenção ao problema de confundimentos, tanto entre os efeitos de locação como entre os efeitos de dispersão.

    Salienta-se, ainda, a importância de estudos nesta área, tendo em vista que projetos de experimentos do tipo 2K ou 2K-p, não-replicados ou com poucas replicações, têm grande aceitação na área industrial por apresentarem custo relativamente baixo. Além disso, são muito utilizados como ponto de partida para estudos mais detalhados.

    Agradecimentos

    Este trabalho foi apoiado pelo Núcleo de Normalização e Qualimetria (NNQ) do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção (PPGEP) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) - http://www.qualimetria.ufsc.br e pela Escola de Educação da Universidade Católica de Pelotas - http://www.ucpel.tche.br.

    Artigo recebido em 21/07/2003

    Aprovado para publicação em 02/08/2004

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    Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Out 2006
    • Data do Fascículo
      2004

    Histórico

    • Recebido
      21 Jul 2003
    • Aceito
      02 Ago 2004
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