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Formulação estratégica da manutenção industrial com base na confiabilidade dos equipamentos

Strategic formulation of industrial maintenance supported by equipment's reliability

Resumos

Este trabalho relata o uso da confiabilidade e da manutenibilidade na formulação de estratégias de manutenção industrial. O método utilizado foi o estudo de dois casos. Inicia-se revisando conceitos ligados a variáveis e processos aleatórios como base para definir conceitos e características de estudos de confiabilidade e de modelagem aplicados na gestão da manutenção industrial. A seguir se descrevem os casos estudados, em que se aplicam técnicas de modelagem de tempos até a falha e até o reparo no estabelecimento de estratégias de manutenção em fábricas do setor metal-mecânico. Com base nos resultados, discute-se o caso, estabelecendo condições para o uso da confiabilidade na formulação estratégica da manutenção, principalmente quanto ao sistema de informações necessárias.

Formulação estratégica na manutenção industrial; sistemas de informação em manutenção; confiabilidade na manutenção industrial; modelagem em manutenção industrial


This paper reports the use of reliability and maintainability assessments in the strategic formulation of industrial maintenance. The method was a double case study. The paper begins by a theoretical review of related concepts of stochastic variables and processes as a basis to address concepts and features from reliability studies and modeling, suited to use in managing the industrial maintenance. One then describes the two studied cases, in which the reliability techniques were applied, in modeling the times to failure and times to the repair for the sake of settling the strategic formulation of industrial maintenance in metal-mechanic plants. Supported by results, this paper discusses the cases, arising requirements to the use of the reliability, mainly related to the information system.

Strategic formulation in industrial maintenance; information system in industrial maintenance; reliability in industrial maintenance; modeling in industrial maintenance


Formulação estratégica da manutenção industrial com base na confiabilidade dos equipamentos

Strategic formulation of industrial maintenance supported by equipment´s reliability

Miguel Afonso Sellitto

Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos

RESUMO

Este trabalho relata o uso da confiabilidade e da manutenibilidade na formulação de estratégias de manutenção industrial. O método utilizado foi o estudo de dois casos. Inicia-se revisando conceitos ligados a variáveis e processos aleatórios como base para definir conceitos e características de estudos de confiabilidade e de modelagem aplicados na gestão da manutenção industrial. A seguir se descrevem os casos estudados, em que se aplicam técnicas de modelagem de tempos até a falha e até o reparo no estabelecimento de estratégias de manutenção em fábricas do setor metal-mecânico. Com base nos resultados, discute-se o caso, estabelecendo condições para o uso da confiabilidade na formulação estratégica da manutenção, principalmente quanto ao sistema de informações necessárias.

Palavras-chave: Formulação estratégica na manutenção industrial, sistemas de informação em manutenção, confiabilidade na manutenção industrial, modelagem em manutenção industrial.

ABSTRACT

This paper reports the use of reliability and maintainability assessments in the strategic formulation of industrial maintenance. The method was a double case study. The paper begins by a theoretical review of related concepts of stochastic variables and processes as a basis to address concepts and features from reliability studies and modeling, suited to use in managing the industrial maintenance. One then describes the two studied cases, in which the reliability techniques were applied, in modeling the times to failure and times to the repair for the sake of settling the strategic formulation of industrial maintenance in metal-mechanic plants. Supported by results, this paper discusses the cases, arising requirements to the use of the reliability, mainly related to the information system.

Key words: Strategic formulation in industrial maintenance, information system in industrial maintenance, reliability in industrial maintenance, modeling in industrial maintenance.

INTRODUÇÃO E OBJETIVO

A função manutenção industrial tem incorporado às suas estratégias usuais de gerenciamento alguns conceitos originados na confiabilidade. Para Moubray (1996), a manutenção tem procurado novos modos de pensar, técnicos e administrativos, já que as novas exigências de mercado tornaram visíveis as limitações dos atuais sistemas de gestão. Uma das modificações apontadas por Moubray (1996) é a incorporação de elementos da confiabilidade às estratégias usuais de manutenção encontradas nas empresas de fabricação e de serviços tecnológicos.

Autores divergem quanto à classificação das estratégias de manutenção. Neste artigo seguir-se-á a tipologia proposta pela escola nipo-americana (NSC, 1987 apud OLIVEIRA; SELLITTO e VERDI, 2002; HIGGINS, 2001): (i) a emergência opera até a falha, reparando o item que falhou; (ii) a corretiva opera até a falha, reforçando ou corrigindo o item que falhou; (iii) a preditiva executa intervenções baseadas em diagnósticos; e (iv) a preventiva, executa intervenções incondicionais constantes de um programa pré-agendado.

Ao menos três dissertações de mestrado recentes já exploraram a incorporação de elementos de confiabilidade pela manutenção. Santos (2003) estima o intervalo ótimo entre manutenções preventivas em chaves elétricas. Hiraiwa (2001) apresenta uma metodologia para determinar o período em que deve ser realizada a manutenção preventiva em equipamentos eletromédicos. Motta (1999) desenvolveu um modelo de análise de confiabilidade de equipamentos reparáveis, aplicado na definição da periodicidade de intervenção em relés de proteção de sistemas elétricos. Tais relés podem apresentar falhas ocultas. O modelo fornece os riscos de falhas de relés, associados aos possíveis intervalos entre manutenções preventivas e também foi publicado em Motta e Colosimo (2002). Sheu e Chien (2004) propõem uma política generalista de reposição por idade de sistemas sujeitos a impactos que ocorrem em quantidades aleatórias por unidade de tempo. Os autores enumeram outras obras e autores que os antecederam neste tema e que propõem políticas de manutenção específicas que consideram o custo e o risco para os equipamentos enfocados. Estes objetivos se relacionam com este artigo, justificando a citação desses trabalhos.

Ao menos duas linhas metodológicas para a modelagem de dados de falhas recorrentes em equipamentos surgem na bibliografia. A primeira linha modela os dados segundo um processo puntual, através da função intensidade l(t) e sua fundamentação teórica surge em Pulcini (2001) e Hokstad (1997). A segunda linha emprega a função taxa de falha (hazard function) h(t) em sistemas reparáveis e sua fundamentação teórica é encontrada em Grosh (1989), Elsayed (1996) e Lafraia (2001). Uma aplicação desta linha metodológica calcula intervalos de manutenção preventiva associados a riscos e custos na operação de ônibus urbanos de passageiros e é encontrada em Sellitto; Borchardt e Araújo (2002).

O objetivo principal deste trabalho é a proposição de um método objetivo para formular estratégias para a manutenção de equipamentos industriais. Os objetivos secundários do trabalho são: (i) revisar brevemente conceitos sobre confiabilidade aplicada à manutenção; (ii) conduzir dois estudos de caso em empresas metal-mecânicas; e (iii) discutir os resultados dos estudos de caso ligando-os teoricamente às estratégias usuais de manutenção. Algumas fundamentações teóricas não serão revisadas, mas serão empregadas: (i) gestão estratégica em Certo e Peter (1993); (ii) estratégias de manutenção em Higgins (2001, seção 2); (iii) análise de Weibull e cálculo do intervalo ótimo de intervenção em Sellitto; Borchardt e Araújo (2002); e (iv) alocação de confiabilidade em Elsayed (1996).

Este trabalho faz parte de um projeto de pesquisa em operações industriais conduzido pela engenharia de produção da Unisinos. Por opção metodológica do projeto, limitar-se-ão os trabalhos à segunda linha metodológica citada, automatizada pelos softwares ProConf98 e ProSis2000. Remete-se a outra linha e estudos comparados à continuidade das pesquisas.

CONFIABILIDADE E MANUTENÇÃO

O conceito de confiabilidade foi introduzido na manutenção por um trabalho seminal sobre falhas em equipamentos eletrônicos de uso militar nos anos 1950, nos Estados Unidos da América. A tarefa foi conduzida por um grupo de estudos da Federal Aviation Administration, cujas conclusões reorientaram os procedimentos de manutenção até então vigentes: (i) se um item não possui um modo predominante e característico de falha, revisões programadas afetam muito pouco o nível de confiabilidade do item; e (ii) para muitos itens, a prática de manutenção preventiva não é eficaz (MOUBRAY, 1996).

Equipamentos de interesse da manutenção industrial são conjuntos de partes que formam sistemas reparáveis. Segundo Ascher e Feingold (1984) apud Lindqvist, Elvebark e Heggland (2003), um sistema reparável pode ser plenamente restaurado após uma perda de desempenho em uma das suas funções. Segundo os autores, a restauração pode ocorrer por qualquer método que não seja a troca total do sistema, podendo se dar por trocas parciais ou por reparos em partes. Após a intervenção, a operação do sistema é retomada em um nível de desempenho tal como se a falha não houvesse ocorrido.

Segundo a norma brasileira NBR 5462-1994, item 2.2.6.4, a confiabilidade de um item é a probabilidade de que este item desempenhe a função requerida, por um intervalo de tempo estabelecido, sob condições definidas de uso. Segundo Elsayed (1996), a confiabilidade R(t) é a probabilidade que um produto ou serviço opere adequadamente e sem falhas sob as condições de projeto, durante um tempo especificado, a vida de projeto. A função confiabilidade varia entre 0 e 1 e pode ser usada como uma medida parcial do sucesso de um projeto industrial.

Se o tempo até a falha do projeto Xt é uma variável aleatória, a função confiabilidade R(t) é dada pela equação (1). Se f(t) é a densidade de probabilidade de Xt, sua R(t) é dada pela equação (2) (ELSAYED, 1996).

A função risco ou taxa instantânea de falha h(t) (hazard function ou hazard rate) é a probabilidade de falha no intervalo [t;(t+Dt)], dado que não houve falha até t. Esta função é o limite da probabilidade que uma unidade não-reparável falhe pela primeira e única vez, ou que uma unidade renovável falhe em um intervalo que tende a zero, dado que sobreviveu até o início do intervalo. A função h(t) é uma probabilidade condicional expressa por (3) e relacionada à R(t) por (4) (ELSAYED, 1996; LAFRAIA, 2001).

Alguns modelos para explicar o comportamento de tempos até a falha surgem na literatura: (i) h(t) constante, o modelo exponencial, que explica o comportamento de componentes eletrônicos; (ii) h(t) linear crescente, o modelo de Rayleigh, que explica o comportamento de componentes mecânicos; e (iii) h(t) exponencial, o modelo de Weibull, que explica o comportamento de sistemas cuja falha nasce da competição entre diversos modos de falha. Neste último caso, o tempo até a falha de um equipamento é uma variável aleatória T = min(1®i)[ti], em que ti é o tempo até a falha de cada modo de falha. T segue uma distribuição de Weibull se os modos de falha atuarem em série, competindo pela falha (primeiro a ocorrer, ocorre a falha), como nos equipamentos industriais (LEWIS, 1996).

Interessa o modelo de Weibull a três parâmetros: (i) t0, que indica o tempo isento de falhas; (ii) g, o fator de forma, que indica taxa de falhas decrescente (g<1), constante (g=1) ou crescente (g>1); e (iii) q, o fator de escala, que indica o quanto a distribuição se espalha no tempo (autores também usam os símbolos b e h para os fatores de forma e de escala). O modelo de Weibull é expresso por (5) e (6) e o tempo médio entre falhas, o MTBF, é dado por (7). Caso também se tenha o tempo médio até o reparo, o MTTR, a disponibilidade A(t) é dada por (8) (ELSAYED, 1996).

Em sistemas, a confiabilidade depende da confiabilidade intrínseca das partes e da natureza das conexões entre elas. Duas conexões básicas descrevem a maioria dos sistemas industriais: série e paralela. Sejam dois itens A e B. A conexão série ocorre quando a entrada do conjunto é a entrada de A, a saída de A é ligada à entrada de B e a saída de B é a saída do conjunto. A conexão paralela ocorre quando a entrada do conjunto é ligada às entradas de A e de B e a saída do conjunto é ligada às saídas de A e de B. O raciocínio se estende a n itens, cujo cálculo é dado em (9) e (10). Conexões mistas podem ser calculadas decompondo o arranjo em suas conexões básicas (ELSAYED, 1996).

Em manutenção se associa uma taxa de falhas decrescente ao período de mortalidade infantil ou falhas prematuras do equipamento. Neste período as falhas são atribuídas mais a deficiências iniciais do projeto e dos componentes, sendo sanadas à medida em que são identificadas. A uma taxa de falhas constante se associa o período de maturidade do equipamento. Neste período ocorrem falhas pouco previsíveis, puramente aleatórias, que obedecem a um processo de Poisson homogêneo. Finalmente, a uma taxa de falhas crescente se associa o período de mortalidade senil, por desgaste dos materiais. Neste período as falhas se tornam inevitáveis por perda na resistência dos materiais, indicando-se uma política de reposição preventiva. A Figura 1 sintetiza estas informações em um formato genérico da função h(t) ao longo do ciclo de vida, a curva da banheira (bath-tube curve). A curva da banheira é uma construção abstrata que expressa a expectativa de falha de um item ao longo do tempo, dado que ainda não falhou até este tempo: é o valor esperado da taxa de falha ao longo de todo o tempo de observação (LAFRAIA, 2001).


VARIÁVEIS E PROCESSOS ALEATÓRIOS EM MANUTENÇÃO

As funções de confiabilidade dizem respeito a variáveis aleatórias, também referenciadas na literatura como variáveis randômicas ou estocásticas. Interessa revisar brevemente este tipo de variável e seus processos subjacentes. Adotar-se-á exclusivamente o termo aleatório.

Variáveis aleatórias não possuem valores firmes: seus valores variam sob a influência de fatores casuais. Conhecer uma variável aleatória não é conhecer seu valor numérico nem enumerar seus valores possíveis. Conhecer uma variável aleatória é conhecer as probabilidades da variável assumir cada valor possível de saída de um experimento associado à variável (GNEDENKO e JINCHIN, 1965). A saída de um tal experimento é toda observação na qual se pode especificar (PAPOULIS, 1984):

  • o conjunto

    S de todas as

    n saídas possíveis, os eventos elementares z

    i;

  • o campo de Borel F de

    S, composto do evento certo, evento impossível, eventos elementares z

    i e de todas as uniões e interseções de z

    i em S;

  • as probabilidades de todo z

    i em S, das quais resultam as probabilidades em F;

  • para um evento A composto pela união de

    r saídas,

    r£

    n, a probabilidade de A, dada por (11); e

  • a probabilidade condicional de A, dado que antes ocorreu M, dada por (12).

Uma variável aleatória é um número x(z) associado à saída z de um experimento. É uma função cujo domínio é o conjunto S das saídas possíveis e o contradomínio são os valores gerados por uma lei de formação x(s) aplicada ao domínio. O símbolo x(z) indica o número associado à saída z e o símbolo x indica a lei de formação. As variáveis aleatórias são: (i) discretas, se os valores possíveis xi forem enumeráveis e finitos, tais que aiºP{x=xi}>0 e åai=1; ou (ii) contínuas se aiºP{x=xi}=0 xi, lim[Dx®0][P{xi £ x£xi+D x}=ai.Dx e lim[Dx®0,i®¥]ai.[(xi +Dx)-xi]]=1. Em ambos os casos (i) {x΃} é o conjunto de todas as saídas z do experimento tais que x(z)΃; e (ii) P{x=¥} = P{x=-¥}=0 (KARLIN e TAYLOR, 1997; PAPOULIS, 1984).

A operação e o reparo de uma máquina em ambiente fabril são experimentos. O tempo até a falha, a produção até a falha e o tempo até o reparo são algumas das saídas do experimento. São variáveis aleatórias, entre outras, as: (i) horas entre falhas; (ii) unidades produzidas entre falhas; e os (iii) minutos até o reparo. Estas variáveis são conseqüências de outras variáveis aleatórias, tais como o tempo alocado para operação, a resistência dos materiais e a carga exigida pelo serviço. Como não se consegue conhecer e controlar todos os fatores ativos, usam-se técnicas probabilísticas para prever o comportamento das variáveis (LEWIS, 1996).

Por exemplo, seja uma máquina fabril que iniciou sua missão às 8:00 h de 02/01/2003, operou cinco dias por semana, das 8:00 às 18:00 h, produzindo 400 peças, das quais 380 são aproveitáveis, até parar por quebra de um componente às 10:00 h de 12/02/2003. A saída do experimento é um período de quarenta e um dias e dez horas de calendário sem quebras e 400 peças produzidas. As variáveis aleatórias "dias até a falha", "horas até a falha" e "peças até a falha" assumem os valores de 29 dias, 234 horas e 380 peças. Se o reparo se iniciou às 11:00 h e se encerrou à 22:15 h, com duas horas de interrupção para refeições, a variável "minutos até o reparo" assume o valor 555 minutos. Funções transformaram as saídas dos dois experimentos em variáveis aleatórias. A produção média por hora até a quebra é uma função de uma função com uma variável aleatória.

As funções de confiabilidade já apresentadas são manifestações específicas de funções genéricas que tratam de variáveis aleatórias: (i) função distribuição de probabilidade ou cumulativa F(x), que informa a probabilidade de que a variável seja menor do que um dado valor, F(x0) = P{x £ x0}; e (ii) sua derivada, se existir, a função densidade de probabilidade f(x) que informa a probabilidade da variável se encontrar em um intervalo (x+Dx) quando Dx tende a zero. Se f(x) existir, x necessariamente é contínua, se bem que haja variáveis contínuas que não possuem f(x) (KARLIN e TAYLOR, 1997; HAHN e SHAPIRO, 1967).

São algumas das propriedades de F(x) e de f(x) (PAPOULIS, 1984):

  • F(¥)=1;

    F(-¥)=0;

  • F é uma função monótona não-decrescente, ou seja, se

    x

    1<

    x

    2,

    F(

    x

    2

    F(

    x

    2);

  • Se

    F(

    x

    0)=0, então

    F(

    x)=0

    x<

    x

    0;

  • P{

    x>

    x}= 1-

    F(

    x);

  • P{

    x

    1<

    x£

    x

    2}=

    F(

    x

    2)-

    F(

    x

    1);

  • f(

    x)³0,

    x;

  • ò(-¥; +¥)

    f(

    x).

    dx=1;

  • P{

    x

    1<

    x£

    x

    2}= ò(

    x

    1;

    x

    2)

    f(

    x).

    dx; e

  • f(

    x)=lim

    [Dx®0] [

    P{

    x£

    x£(

    x +D

    x)}]/[D

    x]

Mesmo que a distribuição de uma variável não seja conhecida, é possível sumarizar informações através de descritores obtidos dos dados disponíveis. Características como o centro da distribuição, o espalhamento, a simetria e a agudeza podem ser sumarizadas pelos k-ésimos momentos da distribuição contínua x, dados por (13). Se k=1 resulta o primeiro momento de x, a média ou valor esperado mx, dado por (14) (HAHN e SHAPIRO, 1967). Os valores esperados das f(x)|x= tempo entre falhas, x= tempo até o reparo são o MTBF e o MTTR.

As distribuições normal, gamma, beta, lognormal, Cauchy, Rayleigh, exponencial, Weibull e valor extremo, contínuas, e as distribuições binomial e de Poisson, discretas, são úteis na manutenção. Suas formas analíticas, seu uso em modelos de engenharia e a estimação de seus parâmetros se encontram em Hahn e Shapiro (1967).

Processos aleatórios em manutenção

Um processo aleatório x(t,z), tÎT é uma coleção de variáveis aleatórias: para cada tÎT, z é uma variável aleatória. Se uma variável aleatória é uma regra para associar a cada saída de um experimento um número z um processo aleatório x(t) é uma regra para associar a cada saída z do experimento uma função x(t,z). O domínio de z é o conjunto S das saídas possíveis do experimento e o domínio de t é T, o conjunto dos números reais. Se T é o eixo real, x(t,z) é um processo contínuo. Se T é um conjunto finito, x(t,z) é um processo discreto: uma seqüência de variáveis aleatórias. Geralmente t = [0, 1, 2, ...] é uma variável de tempo ou uma contagem e x(t)= z é o estado do processo em t. Se o processo x(t,z) pode assumir um número finito de valores, é dito a estados discretos. Do contrário é dito a estados contínuos. Uma realização, caminho ou função amostral de um processo aleatório x(t,z), tÎT é a associação a cada t de T de um valor possível de z. Usa-se a notação x(t) para o processo, sendo implícita a dependência de z (PAPOULIS, 1984; ROSS, 1996).

Para um t específico, x(t) é uma variável aleatória com função de distribuição de primeira ordem dada por (15). Esta função depende de t e corresponde à probabilidade de que as amostras x(t,z) do processo não excedam ao valor numérico x. Sua derivada parcial em relação a x é a densidade de primeira ordem de x(t), dada por (16). As funções de distribuição e de densidade de segunda ordem, (17) e (18), consideram a distribuição conjunta de duas variáveis aleatórias x1(t1) e x2(t2). Funções de enésima ordem são extensões de (17) e (18) (PAPOULIS, 1984; ROSS, 1996).

Processos aleatórios distinguem-se pelas relações existentes entre as sucessivas variáveis aleatórias xi(t), tÎT. Tais relações podem ser especificadas por uma função de distribuição conjunta para toda família finita x1(t),x2 (t),...,xn(t) de variáveis aleatórias do processo, F(x1,x2,..., xn:t1,t 2,...,tn) xi,ti ,n (PAPOULIS, 1984; KARLIN e TAYLOR, 1997; ROSS, 1996). Para o objetivo deste artigo é suficiente definir o espaço de estados S, os índices em T e a função de distribuição conjunta. Por exemplo, sejam dez máquinas idênticas, S = [1,2,...,10], sujeitas a cargas de trabalho similares, monitoradas por trinta dias, T = [1,2,...,30]. Ao fim de cada dia associa-se ao número de dias já decorridos o número de máquinas que apresentaram ao menos uma falha no dia, em um processo a índice discreto e a estados discretos. Como outro exemplo, seja uma máquina cuja operação é monitorada e a cada interrupção por quebra anotam-se o resultado obtido e o tempo decorrido desde a última quebra, em um processo a índice discreto e a estados contínuos. Em ambos os casos é possível associar uma função x(t,z) ao processo. No segundo caso o índice t não é o tempo decorrido, mas a ordinalidade da quebra. À variável z pode-se associar uma produção, uma quilometragem ou o tempo entre quebras, segundo a natureza do processo aleatório subjacente ao fenômeno em estudo.

Tipos clássicos de processos aleatórios e sua relação com a manutenção

Os processos aleatórios podem ser classificados segundo as relações entre as variáveis aleatórias intervenientes xn(t) (KARLIN; TAYLOR, 1997):

(i) a incrementos independentes e estacionários, se as variáveis [x1(t1)-x 0(t0)], [x2(t2)-x 1(t1)],...,[xn (tn)-xn-1(t n-1)] são independentes n, t0<t1<...< tn;

(ii) martingales, se E{xn+1(tn+1 )|x1(t1) = a1,...,xn(t n)=an}=an , ou seja, é um processo acumulativo cuja expectativa da próxima execução é zero;

(iii) markovianos, se P{a<xn+1(t n+1)£b|x1(t 1)= x1,...,xn(t n)=xn} = P{a<xn+1(t n+1)£b|xn(t n)=xn}, ou seja, o estado da próxima execução depende exclusivamente da execução corrente: um processo markoviano a estados discretos é chamado uma cadeia de Markov; uma cadeia de Markov a tempos contínuos é um processo de Poisson;

(iv) estacionários, que podem ser estritamente estacionários, se as funções de distribuição conjuntas da família de variáveis [(x1(t1+h ),x2(t2+h ),...,xn(tn+ h)] e [(x1(t1),x 2(t2),..., xn(tn)] são as mesmas, h>0,tÎT, ou seja, o intervalo de tempo em que o processo é amostrado é irrelevante, ou amplamente estacionário ou de covariância estacionária, se possuir momentos de segunda ordem finitos e se sua covariância cov[x(t),x(t+h)]= E[x(t).x(t+h)]-E[ x(t)].E[x(t+h)] depender apenas de h

h>0,tÎT;

(v) renováveis (renewal), se um componente falha em t1, é reparado ou substituído imediatamente, opera até falhar em t2 e assim por diante, a enésima renovação ocorre em Sn= t1+...+tn; e

(vi) puntuais, se pontos contidos em S puderem ser contados por N(A) em A, um subconjunto amostral em S, de modo que: (a) AÌS, N(A) segue uma distribuição de Poisson; e (b) {A1,...,An}disjuntos ÌS, as variáveis N(A1),...,N(An) são independentes.

Um processo aleatório a tempo contínuo de interesse da manutenção é o processo de Poisson. Seja uma contagem{N(t),t³0} do tipo degrau não-decrescente no intervalo [0,¥]. Esta contagem é um processo de Poisson de taxa l>0, se (ROSS, 1996; GROSH, 1989):

(i) N(0)=0 ou P0(0)=1;

(ii) P{N(t+h)-N(t )=1}=lh, se h®0: a probabilidade de uma ocorrência em um pequeno intervalo de tempo depende da taxa do processo e do tamanho do intervalo, fazendo com que o processo tenha incrementos estacionários;

(iii) P{N(t+h)-N(t )³2}®0, se h®0: a probabilidade de mais de uma ocorrência simultânea é nula;

(iv) P{N(t+h)-N(t )=n}=P{N(t1+ h)-N(t1)=n}, t,t1,h : o processo é estacionário, sendo irrelevante o instante de tempo em que a contagem comece;

(v) cov{N(t+h)-N( t),N(t1+h1 )-N(t1)}=0, t,t1,h ,h1,t1³ (t+h): a contagem é independente em intervalos disjuntos e o que ocorre em um intervalo não afeta os demais intervalos, fazendo com que o processo tenha incrementos independentes;

(vi) a probabilidade de haver n contagens no intervalo de tempo t é dada pela distribuição de Poisson, Pn(t) = (n!)-1.e-lt .(lt)n, cuja E[N(t)]=var[N( t)]=lt, a densidade de probabilidade é dada por f(t) = le-lt, cuja m=s2=l. e a densidade de probabilidade condicional é h(t)=l; e

(vii) como a h(t) independe do instante de tempo amostral, o processo de Poisson não tem memória: o comportamento atual não depende do comportamento passado.

Todas as classes de processo apontadas são encontráveis na manutenção. Para a linha metodológica remetida à continuidade das pesquisas interessam mais os processos puntuais. Para a linha ora adotada interessam mais os processos renováveis. Estes surgem ao se amostrarem em T os intervalos entre substituições ou reparos de um item. Testando hipóteses, descobre-se se há uma taxa de falhas. Se esta não variar ao longo de T, o processo é descrito por uma lei de falha exponencial e é do tipo CFR (taxa de falha constante). Se as taxas de falha forem variáveis, estas podem ser crescentes (IFR) ou decrescentes (DFR), exigindo outras distribuições, como a distribuição de Weibull. Esta distribuição é capaz de descrever os três processos pela estimativa de seu parâmetro de forma, conforme esta seja respectivamente igual a 1, maior do que 1 ou menor do que 1 (ELSAYED, 1996; GROSH, 1989).

PRIMEIRO ESTUDO DE CASO: UMA EXPLORAÇÃO DE PROCESSOS ALEATÓRIOS EM MANUTENÇÃO

O primeiro estudo de caso teve um objetivo exploratório. O objeto de estudo foi composto por dois equipamentos semelhantes e que executam a mesma função na mesma empresa: duas máquinas de têmpera a indução. A máquina A foi reformada nove meses antes do estudo, o que, para este equipamento, é uma data recente. A máquina B ainda não foi reformada. A empresa dispõe de sistema informatizado de gestão de manutenção, do qual coletaram-se os tempos entre falhas, apresentados na Tabela 1.

Usou-se o software ProConf 98 para a obtenção dos histogramas da Figura 2 e para testar o ajuste dos dados às distribuições exponencial, Weibull, gamma, normal e lognormal. Na Tabela 2 apresentam-se os parâmetros resultantes destes ajustes.


Discussão

Os tempos entre as falhas são variáveis aleatórias relativas ao processo aleatório da quebra. Nas máquinas A e B, em intervalos de 1.002 e 1.277 horas, houve respectivamente vinte e quatro e quatorze contagens de quebra, restando verificar se as taxas são constantes ou se variaram no intervalo. Dentre os ajustes obtidos, adotou-se o modelo de Weibull, pois engloba outros modelos, como o exponencial, Rayleigh e o normal, e porque é o modelo-limite quando muitos modos de falha concorrem para a quebra, como no atual equipamento (LEWIS, 1994).

Inicia-se comparando os histogramas da Figura 2. A máquina A, recém-reformada, apresenta um comportamento de mortalidade infantil, ao passo que a máquina B apresenta um comportamento intermediário entre a maturidade e o desgaste. Prossegue-se verificando a poissonidade do comportamento da máquina B. Grosh (1986, p. 42) cita um teorema e sugere um teste: se um processo de falhas de Poisson é monitorado até que ocorram n falhas, a distribuição acumulada dos tempos destas falhas é igual às observações ordenadas de uma amostra aleatória de tamanho (n-1) oriunda de uma distribuição uniforme no intervalo [0,tn]. O intervalo é [0,252] e (n-1)=13. Faz-se uma verificação inicial com treze números aleatórios retirados de uma distribuição U[0,252] gerada pelo software StatFit. Na Figura 3 regridem-se a amostra e os dados da máquina B, obtendo-se R2=91% e y´»1, o que sugere a poissonidade.


Grosh (1986) sugere o teste de Kolmogorov-Smirnoff (KS), apresentado na Tabela 3. A função F(t) é a função teórica [acumulado(i)/1.277], S(t) é a função empírica [índice/13] e os módulos são as diferenças entre F(t) e S(t) acima e abaixo da linha média. Como a maior distância D=0,335 é menor do que o valor tabelado D0,05 (Grosh, 1986, p. 361), em nível de significância de 5%, não é possível rejeitar a hipótese de que o processo de falha na máquina B é um processo de Poisson e que a máquina se encontra em seu período de maturidade.

A resistência e a carga de um componente são variáveis aleatórias. Uma falha ocorre quando a resistência é momentaneamente menor do que a carga. Na mortalidade infantil uma máquina pode estar equipada com componentes oriundos da parte baixa da distribuição de resistência, que falharão se exigidos na parte alta da distribuição de carga. Se o substituto for de alta resistência, este modo de falha não ocorre mais. À medida que se conhecem as cargas e os componentes frágeis são substituídos por componentes mais fortes, os modos de falha não se manifestam mais e o processo de quebra se aproxima de um processo de Poisson: apenas sobrecargas imprevisíveis e de intensidades extraordinárias, e portanto aleatórias, causarão falhas. O fim da mortalidade infantil pode ser antecipado caso se conheçam a priori as cargas máximas e se selecionem apenas componentes de alta resistência.

Atingida a maturidade, monitora-se o equipamento para que se possa, eventualmente, identificar o início do processo de desgaste. A monitoração pode ser contínua e automatizada, ou periódica, sob a forma de inspeções, constituindo a estratégia de predição, a preditiva. Desse modo, nesta fase só ocorrerão as quebras catastróficas, ligadas a liberações de quantidades extremas de energia em tempos muito curtos ou pequenas ultrapassagens de resistência ligadas a falhas prematuras de manifestação tardia ou mau uso do equipamento.

Ao se examinarem os dois histogramas, pode-se imaginar a maior coluna de falhas migrando da região baixa, característica da mortalidade infantil, para a região alta, característica da mortalidade senil, passando pela exponencial negativa característica do processo de Poisson.

SEGUNDO ESTUDO DE CASO: ESTRATÉGIAS DE MANUTENÇÃO EM UMA LINHA DE PRODUÇÃO

O objetivo do segundo caso e do trabalho como um todo é testar um método capaz de formular objetivamente estratégias de manutenção para uma planta industrial e que possa ser um contraponto às práticas subjetivas observadas nas empresas, tais como: (i) em equipamentos críticos se faz manutenção preventiva; ou (ii) em equipamentos ociosos se admitem emergências. Também se colocaram questões secundárias: (i) métodos objetivos de formulação de estratégias de manutenção, se existirem, são aplicáveis em ambiente industrial? (ii) que requisitos são necessários nas empresas para a adoção destes métodos? e (iii) que evidências são necessárias para a comprovação da eficácia destes métodos?

Definida a unidade de estudo, fez-se o diagrama de blocos da confiabilidade (RBD) e coletaram-se os tempos até a falha e até o reparo de cada bloco. Calcularam-se os fatores de forma g e a conseqüente localização na curva da banheira e a disponibilidade e alocaram-se estratégias de manutenção e objetivos de confiabilidade a cada bloco.

Resultados

O RBD é apresentado na Figura 4. A confiabilidade sistêmica, dada por (19), é apresentada na forma gráfica da Figura 5 pelo software ProSis 2000. Nas Tabelas de 4 a 7 se têm os tempos até a falha dos blocos e as distribuições de probabilidades ajustadas pelo método da máxima verossimilhança no software Proconf98, as estratégias de manutenção formuladas para cada máquina pelos intervalos de confiança das estimativas de g e os intervalos de tempo ótimos entre preventivas, para relações de custo entre emergência e intervenção preventiva REP. Valores de REP abaixo de 2,5 não são factíveis no caso e foram desconsiderados.



Uma dificuldade prevista mas que não se confirmou foi o fato de o sistema de informações da empresa oferecer apenas números inteiros de dias para os intervalos entre falhas e apenas a média aritmética para o tempo até o reparo, pressupondo que esta variável siga um modelo normal ou uniforme. O sistema é incompleto e não foi possível obter dados melhores, mas os resultados obtidos não parecem ter sido comprometidos por esta falta.

A Tabela 8 apresenta os MTBF e MTTR das máquinas e as disponibilidades individuais dadas pela equação 20. Na Tabela 9 se tem as alocações ótimas de confiabilidade às máquinas para um acréscimo requerido na confiabilidade sistêmica propostas pelo software ProSis 2000.

Discussão

O caso aborda as estratégias de manutenção corretiva, preditiva, preventiva e emergência. As duas primeiras já foram abordadas no primeiro caso. A estratégia de emergência opera até a falha com um custo mais baixo do que a preventiva. A estratégia preventiva identifica itens frágeis e agenda trocas em períodos calculados, encontrando uma solução de compromisso que minimize a soma do custo dos itens e o custo da eventual emergência ao longo do ciclo de vida do item. A demonstração do cálculo do intervalo ótimo é encontrada em Monchy (1989). Usou-se uma planilha eletrônica disponível em Sellitto (2004).

Observam-se três classes de máquinas: A e B2 estão na fase de desgaste, C e E estão na maturidade a caminho do desgaste e B1 e D estão em trânsito. Para A e B2 indicam-se estratégias preventivas. Para C e E indicam-se estratégias preditivas e preventivas. Mesmo que o limite inferior do intervalo ainda não tenha ultrapassado g=1, a diferença é pequena e será negligenciada. Já para B1 e D justificam-se estratégias compostas, pois parte do intervalo de confiança ainda cai na mortalidade infantil, parte atravessa a maturidade e, para algumas REP, existe um intervalo ótimo de intervenção. Esta estratégia composta se constitui de ações corretivas para as quebras que ainda se verificarem, ações preditivas e, ao mesmo tempo, preventivas ou emergências conforme o produto, pois para alguns casos de REP£15 não existe intervalo ótimo de intervenção. Para as máquinas A, B1, B2 e C, os intervalos calculados são parecidos e três vezes menores do que o intervalo da máquina E. Um plano de manutenção deve programar uma intervenção na máquina E a cada três ou quatro intervenções nas demais máquinas, unificando as paradas.

A taxa de falhas sistêmica é linear, correspondendo aos modos de falha das máquinas estudadas, basicamente mecânicos. Quanto ao aumento de disponibilidade, os MTBF parecem ser mais relevantes do que os MTTR. O aumento da confiabilidade sistêmica iniciaria pela máquina C, de menor MTBF, conforme a análise do software ProSis 2000. Como não se conhecem os custos, adotaram-se custos iguais em todas as máquinas. Para o acréscimo requerido (0,96 em dois dias), o software ProSis 2000 alocou acréscimos nas confiabilidades individuais conforme a Tabela 9.

CONSIDERAÇÕES COMUNS A AMBOS OS CASOS

Considerações comuns a ambos os casos são possíveis de serem conduzidas.

A Figura 6 apresenta as relações entre as estratégias de manutenção e o ciclo de vida de equipamentos. Pode-se associar a pontos desta figura os instantes de vida das máquinas dos casos 1 e 2. Na figura também se comparam os resultados presumíveis de uma gestão casual e subjetiva da manutenção com os resultados presumíveis de uma gestão estratégica e objetiva. Em uma gestão casual entende-se que o gestor resolva os casos que surgem segundo uma linha de ação aleatória, que se adaptaria às situações emergentes. Em uma gestão estratégica espera-se que o gestor da manutenção possua cursos alternativos de ação previamente estudados e que serão adotados segundo um critério objetivo de escolha, aplicado a cada equipamento ou cenário situacional.


Na gestão estratégica a fase de maturidade se inicia mais cedo, termina mais tarde e o patamar de expectativa de falha é mais baixo. Iniciada a fase de desgaste, pode-se voltar à maturidade através de intervenções preventivas ou reformas, o que também caracterizaria um processo de renovação de mais largo alcance. Ocorre uma nova mortalidade infantil e um novo patamar de expectativa de falha, desta vez mais alto do que o anterior, porém mais baixo do que sem uma estratégia. Programas de gestão, tais como o TQC, TPM, 5S e manutenção autônoma são úteis na maturidade, pois aumentam a interação visual com o operador, evitam o mau uso da máquina, previnem catástrofes e permitem a detecção do início da fase de desgaste. Evitar o mau uso do equipamento e prevenir catástrofes na maturidade pode baixar o patamar de expectativa de falha e retardar a senilidade. Fora da maturidade, a eficácia destes programas cai, pois a causa estrutural das falhas passa a ser intrínseca aos equipamentos e não mais extrínseca, por suas características de projeto ou por características de uso.

Em resumo, na mortalidade infantil ocorrem falhas prematuras causadas principalmente por má especificação, mau projeto, má instalação ou por má fabricação de componentes. Uma estratégia corretiva identifica e sana estas deficiências.

Na fase de maturidade ocorrem falhas por: (i) ultrapassagens de resistências ainda não manifestadas na fase inicial, o que indica que a mortalidade infantil ainda não estava totalmente encerrada; (ii) falhas ligadas ao mau uso do equipamento; e (iii) grandes ultrapassagens de resistências causadas por catástrofes.

Finalmente, na fase de desgaste, as quebras ocorrem por processos progressivos de falhas, sendo importantes o momento de início da falha e o momento da quebra. O início da falha pode ser detectado e a quebra pode ser predita por técnicas de manutenção preditiva que devem ser adotadas na fase de maturidade, quando ainda não se sabe quando se iniciará o período de desgaste. Após o início deste período, técnicas preditivas continuam sendo úteis, pois podem auxiliar na predição do momento da ruptura, que será prevenida por uma estratégia de manutenção preventiva.

No Quadro 1 se resumem as interligações e os relacionamentos discutidos entre estratégias usuais de manutenção e as fases do ciclo de vida de equipamentos.


CONCLUSÃO

O objetivo principal deste trabalho foi propor um método objetivo para formular estratégias de manutenção em equipamentos industriais. Também foram propostas questões secundárias de estudo. O método utilizado foi o estudo de dois casos, que chegaram a estratégias que parecem coerentes. Os casos devem ser considerados casos-piloto, cujas conclusões são hipóteses de trabalho a explorar em outras aplicações.

O método proposto passa a ser uma hipótese de trabalho: (i) identificar as máquinas de interesse em uma planta industrial; (ii) levantar os dados de tempos entre falhas e até o reparo; (iii) modelar os tempos entre falhas por uma distribuição de Weibull, obtendo intervalos de confiança para g; (iv) formular a estratégia conforme a taxa de falha (DFR: corretiva, CFR: preditiva, IFR: preventiva ou emergência); (v) calcular os intervalos ótimos de intervenção para a estratégia preventiva; (vi) modelar os tempos até o reparo, obter seu valor esperado e calcular as disponibilidades; e (vii) calcular metas de melhoria de confiabilidade ou metas de melhoria de manutenibilidade para o sistema, conforme a dominância no cálculo da disponibilidade.

Respondendo objetivamente às questões secundárias propostas no segundo caso: (i) o método objetivo proposto foi desenvolvido e aplicado em ambiente fabril, mas pode ser estendido para ambientes de serviços com base tecnológica, tais como transportes, energia e telecomunicações; (ii) os requisitos necessários para sua adoção estão ligados basicamente ao sistema de informação e ao conhecimento necessário para ligar a confiabilidade ao ambiente estudado; e (iii) a evidência necessária para a comprovação de eficácia do método é o acompanhamento da expectativa da taxa de falha ao longo do ciclo de vida do equipamento.

Algumas observações finais são pertinentes. Em ambos os casos observaram-se anotações de paradas por falta de material, falta de programação, falta de operadores ou troca de software como se fossem originadas por quebras. Caso estas paradas tivessem permanecido na análise, os resultados teriam sido distorcidos. Finaliza-se realçando que em uma gestão estratégica não importa trabalhar mais, importa trabalhar certo. O objetivo da gestão estratégica é focalizar apenas as ações que têm mais chance de trazer bom resultado com baixo esforço. Ações que exigem alto esforço, como corretiva em toda quebra, ações que oferecem pouco resultado, como preditiva em toda máquina ou ações contraproducentes, como preventiva fora do desgaste devem ser reconhecidas e abandonadas em uma gestão estratégica da manutenção.

Para a continuidade das pesquisas indica-se a exploração da abordagem segundo processos puntuais e a função intensidade, apresentada em Pulcini (2001) e Hokstad (1997). Sugere-se ainda uma revisão comparativa e estudos de casos comparados segundo as duas linhas.

Agradecimentos

Deseja-se reconhecer o papel dos referees anônimos pelo seu meticuloso trabalho, que contribuiu de modo expressivo para a forma final deste artigo. Também se reconhece o papel do MSc Flávio Sperotto pelo estímulo e profícua convivência e os engenheiros César Camargo, Guilherme Hoppe, Valmir Luiz e Sheila Castro e engenheiranda Michele Silva pela coleta e refinamento dos dados de campo.

Artigo recebido em 09/03/2004

Aprovado para publicação em 19/11/2004

Sobre os autores

Miguel Afonso Sellitto

Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos

Professor do curso de Engenharia de Produção

Endereço: Av. Unisinos 950 - 93022-000 - São Leopoldo, RS

Tel.: 51 xx 911.609.74

Fax: 51 xx 590.8172

E-mail:sellitto@euler.unisinos.br

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Out 2006
  • Data do Fascículo
    Abr 2005

Histórico

  • Aceito
    19 Nov 2004
  • Recebido
    09 Mar 2004
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