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Carolina M. Bori

CAROLINA M. BORI

Elias Mallet da Rocha Barros

Sociedade Brasileira de Psicanálise

Passados trinta anos dos acontecimentos que envolveram as mudanças do currículo do Curso de Psicologia como parte de um processo de reformulação ampla de toda a política universitária, nossa memória fica marcada pelas peneiras que separam o subsidiário do essencial mais significativo.

Hoje sou psicanalista e dediquei os últimos 25 anos a esta área, convivo com analistas e toda a minha formação se deu longe do campus da Universidade de São Paulo.

Meu primeiro impulso quando me pediram este depoimento foi o de corrigir certa deformações históricas. Em 1967/68 eu estava na liderança dos alunos em um movimento dentro do Curso de Psicologia, junto com algumas pessoas que se tornaram amigos para toda a vida (Maria Clotilde Magaldi, Olgierd Stamirowski - o Jerry -, Laerte Caiuby Coaracy, Liana Pinto Chaves), que objetivava melhorar a qualidade do ensino, dar-lhe coerência, buscar uma formação mais ampla, alcançar maior justiça e seriedade.

Nesse contexto a figura da Professora Carolina Bori ganhou dimensão. A Professora Carolina Bori, com a atitude digna que sempre a caracterizou, nunca se voltou contra pessoas ou campos do conhecimento no processo de reformulação do Curso de Psicologia. Ela tinha uma preocupação fundamentalmente metodológica. Elas nos ajudava - e nunca visou liderar nada, embora sua estatura colocasse suas idéias em posição de liderança - a buscar coerência no campo de conhecimentos a ser ensinado. Em nenhum momento sua intervenção se pautava por impor ou sequer dizer o que se deveria fazer. Ela ouvia a todos e fazia perguntas. A partir destas surgiam sugestões de como articular o conhecimento. Sugeria o que deveria vir antes do que, buscava compatibilizar os recursos existentes, mantinha viva uma preocupação com a pesquisa e procurava acentuar a importância da base experimental. Idéias, para ela, não existiam para serem aceitas sem discussão. Ela demandava evidências para aderir a um pensamento. Mas em nenhum momento a vi como uma pessoa fechada, tomada por um positivismo cego. As evidências poderiam se construir seja num contexto experimental seja a partir de uma articulação coerente. Em nenhum momento presenciei a Professora Carolina se pronunciar contra o ensino da psicanálise e nem contra qualquer dos docentes dessa área, como é as vezes sugerido. Ao contrário, Carolina se posicionou por um ensino que deixasse claro de um lado a abordagem das ciências humanas e de outro aquela mais fundamentada na metodologia das ciências biológicas. Dentro dessa perspectiva Carolina favoreceu a presença do ensino da psicanálise, como uma matéria introdutória, nos primeiros anos do curso. Esta proposta foi recusada por professores de outras áreas.

Passados todos estes anos, não sou capaz de me lembrar de pormenores das sugestões feitas na época. Lembro-me apenas, e isto sempre me marcou ao longo da vida, da posição de Carolina, crítica a qualquer ortodoxia, com suas perguntas argutas exigindo coerência, e de sua atitude contrária à aceitação a-crítica de idéias. Ela sempre buscava coerência, seja aquela fundada na prova experimental, seja aquela que repousa sobre uma articulação epistemologicamente aceitável. A título de nota final, a história deu razão a Carolina. Hoje, dentro da Psicanálise, o movimento pelo desenvolvimento da pesquisa em nossa área torna-se cada vez mais forte.

É um prazer para mim poder contribuir para reafirmar a grandeza histórica da figura da Professora Carolina M. Bori.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Nov 1998
  • Data do Fascículo
    1998
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