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A toxidez da escrita como um destino da sublimação em David Foster Wallace

The toxicity of writing as a vicissitude of sublimation in the work of David Foster Wallace

La toxicité de l´écriture comme un destin de la sublimation dans l´oeuvre de David Foster Wallace

La toxicidad de la escritura como un destino de la sublimación en David Foster Wallace

Resumos

A autora discute o conceito de sublimação sob a luz da segunda teoria freudiana do conflito pulsional, a fim de examinar os aspectos funcionais e disfuncionais na criação literária, tomando como exemplo o caso de alguns escritores suicidas para destacar, dentre eles, o autor americano David Foster Wallace.

Sublimação; Conflito pulsional; Suicídio; David Foster Wallace


The author discusses the concept of sublimation in view of Freud's second theory of drive conflict, exemplified in the cases of various suicidal writers, including David Foster Wallace, for the purpose of examining the functional and dysfunctional aspects of sublimation in the creation of literature.

Sublimation; Drive conflict; Suicide; David Foster Wallace


L´auteur discute le concept de sublimation sous la lumière de la deuxiémme théorie freudiènne du conflit pulsionale, tout en examinent les aspects functionaux et disfunctionaux de la création littéraire. Ils sont pris des exemples de quelques écrivains suicides, pour détacher l´oeuvre de l´auteur américain David Foster Wallace.

Sublimation; Conflit pulsionale; Suicide; David Foster Wallace


La autora discute sobre el concepto de sublimación bajo la luz de la segunda teoria freudiana del conflicto pulsional, afin de examinar los aspectos funcionales y disfuncionales en la creación literaria. Ella toma, como ejemplo, el caso de algunos escritores suicidas para destacar, entre ellos, el autor Americano David Foster Wallace.

Sublimación; Conflicto pulsional; Suicídio; David Foster Wallace


Dossiê Sublimação

A toxidez da escrita como um destino da sublimação em David Foster Wallace

The toxicity of writing as a vicissitude of sublimation in the work of David Foster Wallace

La toxicité de l´écriture comme un destin de la sublimation dans l´oeuvre de David Foster Wallace

La toxicidad de la escritura como un destino de la sublimación en David Foster Wallace

Ana Cecília Carvalho

Universidade Federal de Minas Gerais

RESUMO

A autora discute o conceito de sublimação sob a luz da segunda teoria freudiana do conflito pulsional, a fim de examinar os aspectos funcionais e disfuncionais na criação literária, tomando como exemplo o caso de alguns escritores suicidas para destacar, dentre eles, o autor americano David Foster Wallace.

Palavras-chave: Sublimação. Conflito pulsional. Suicídio. David Foster Wallace.

ABSTRACT

The author discusses the concept of sublimation in view of Freud's second theory of drive conflict, exemplified in the cases of various suicidal writers, including David Foster Wallace, for the purpose of examining the functional and dysfunctional aspects of sublimation in the creation of literature.

Keywords: Sublimation. Drive conflict. Suicide. David Foster Wallace.

RÉSUMÉ

L´auteur discute le concept de sublimation sous la lumière de la deuxiémme théorie freudiènne du conflit pulsionale, tout en examinent les aspects functionaux et disfunctionaux de la création littéraire. Ils sont pris des exemples de quelques écrivains suicides, pour détacher l´oeuvre de l´auteur américain David Foster Wallace.

Mots-clés: Sublimation. Conflit pulsionale. Suicide. David Foster Wallace.

RESUMEN

La autora discute sobre el concepto de sublimación bajo la luz de la segunda teoria freudiana del conflicto pulsional, afin de examinar los aspectos funcionales y disfuncionales en la creación literaria. Ella toma, como ejemplo, el caso de algunos escritores suicidas para destacar, entre ellos, el autor Americano David Foster Wallace.

Palabras-clave: Sublimación. Conflicto pulsional. Suicídio. David Foster Wallace.

Se me mato, não é para me destruir, mas para me reconstituir.

(Antonin Artaud)

No livro Escrever, um dos seus últimos textos, Marguerite Duras disse que o escritor vive “uma contradição absurda, pois escrever é também não falar. É se calar”. Para a autora francesa, a escrita permite ao escritor dizer para si mesmo que “não é preciso se matar todos os dias, visto que é possível se matar todos os dias” (Duras, 1994, pp. 26-30).

Se acatarmos a ponderação de Duras, que não parece ser um mero jogo de palavras, não estaremos longe de formular a ideia de que existe algo no processo da escrita criativa que coloca o escritor diante de uma escolha terrível: escrever ou morrer – possibilidade surpreendente, pois indicadora da presença de forças destrutivas no horizonte do processo criativo. Nosso assombro diante disso torna-se maior quando nos defrontamos com a escrita de alguém que, em meio a uma intensa produção criativa, decidiu interromper a vida por meio do suicídio. Este é o caso do escritor americano David Foster Wallace, que se matou aos 46 anos, no dia 12 de setembro de 2008, data a partir da qual ele passou a ser incluído em uma espécie de cânone sinistro de escritores suicidas, ao lado de Virginia Woolf, Florbela Espanca, Paul Celan, Anne Sexton, Izabel Marie, Ana Cristina César e Sylvia Plath, dentre outros.

Antes, uma ressalva. A respeito desse “cânone” – no qual criatividade e autoextermínio parecem estar associados de modo enigmático –, devo dizer que é preciso evitar a tentação de usá-lo para estabelecer um parentesco entre os autores suicidas. O fato de que todos esses escritores tiveram o mesmo destino trágico não significa que, no afã de traçarmos um perfil do autor suicida, devêssemos negligenciar as diferenças entre eles. Como psicanalistas, estamos sempre atentos às singularidades e não há razão pela qual deveríamos mudar essa posição quando voltamos nosso olhar (ou nossa escuta) para fora das quatro paredes do consultório. Nesse sentido, quando as comparamos, logo veremos que as histórias pessoais, as vozes, formas e filiações literárias desses autores revelar-se-ão muito diversas. Assim, se é preciso recolocar em outros termos a questão do suicídio e sua relação com a escrita; se esta associação de fato existe, nada nos autoriza a ligá-la de modo extensivo a todo o universo dos autores suicidas. Mas talvez não fosse equivocado pensar que, resguardada a diversidade dos casos, o suicídio do escritor criativo permite levantar questões que interessam ao psicanalista, pois elas apontam para a possibilidade de um envolvimento significativo entre o processo criativo e o autoextermínio.

Assim, algumas indagações que devemos ter em mente nesta abordagem poderiam ser colocadas da seguinte maneira: por que será que, para alguns, a criatividade constitui uma via de transformação e prazer em que antes havia sofrimento, enquanto, para outros, essa mesma via não só não liquida o sofrimento como também parece alimentá-lo? A que se devem, afinal, o êxito e o fracasso do processo criativo? Existem limites nesse processo?

Intrigada pelo fenômeno do suicídio do escritor – que parece interpelar a opinião comum sobre o caráter supostamente terapêutico do processo criativo literário –, realizei, nos últimos anos, pesquisas na interface da psicanálise com a literatura, a fim de examinar a vida e a obra de escritores que se mataram em pleno período de produtividade literária.1 1 Os resultados dessas pesquisas, conduzidas na Universidade Federal de Minas Gerais, serão apresentados em um livro, atualmente em preparação, cujo título será “A sublimação e seus destinos”, em coautoria com o professor Guilherme Massara Rocha.

Nesse campo de investigação, é comum termos de lidar com um curioso efeito de leitura: a impossível dissociação que se é levado a fazer entre o fantasma da biografia do escritor (cujo suicídio funciona como uma presença inarredável) e a construção do texto. Parafraseando a descrição feita por Freud (1917/1974, p. 281), eu diria que nesse ponto se produz algo como se a sombra do suicídio do escritor tivesse caído sobre o texto, de maneira que o pesquisador se vê à procura dos anúncios desse destino trágico em meio às linhas que lê, como em um solo onde estariam inscritas as pegadas que, se seguidas, poderiam mostrar o caminho que levou o escritor ao suicídio.

Talvez não sem razão, encontramos, nesse campo de pesquisas, aqueles que, em nome da psicanálise, utilizam o texto para compor um diagnóstico da personalidade do autor. O equívoco desse tipo de abordagem está em ver o texto como uma espécie de teste projetivo da mente supostamente doentia do escritor e, assim, terminar por negligenciar os aspectos que compõem o complexo da construção textual. Por outro lado, tentando escapar à fascinação paralisante que a escrita do autor suicida desperta, alguns estudiosos costumam realizar uma análise puramente formal, ignorando a importância de um elemento como o suicídio, como se fosse possível ignorar a densidade afetiva que mobilizou a escrita e o sofrimento emocional que antecedeu a morte do escritor.

Contudo, podem-se evitar essas dificuldades aparentemente insuperáveis2 2 Num outro trabalho, discorri sobre os problemas de uma pesquisa psicanalítica do literário, a fim de apresentar algumas soluções. (Carvalho, 2007). Sugiro também o livro Vida escrita, de Ruth Silviano Brandão, uma excelente contribuição ao campo da pesquisa em literatura e psicanálise. recorrendo à mediação de teorias que, privilegiando a enunciação, impedem o mergulho do pesquisador no imaginário especular do texto. Ao mesmo tempo, esse instrumental teórico deve também levar em consideração a via de mão dupla que existe entre a vida do escritor suicida e sua obra, uma vez que o suicídio parece colocar em questão a função e os limites da escrita criativa.

Neste artigo, tentarei jogar alguma luz, ainda que modesta, sobre esse problema complexo, esperando esclarecê-lo um pouco, com o que for possível, a partir da teoria freudiana da sublimação.

Sem nunca ter tido a pretensão de esclarecer completamente o enigma do processo criativo, Freud o relacionava, como sabemos, ao conceito de sublimação, um dos “destinos pulsionais”, como ele a descreveu (Freud, 1915a/1974, pp. 129-162). Observem que, aqui, os termos “sublimação” e “criatividade” não estão sendo usados como sinônimos. O termo sublimação é um conceito com o qual examinamos o processo criativo, entre outros fenômenos que resultam do trabalho de transformação dos elementos presentes no campo da pulsão. Neste ponto é importante lembrar a advertência feita por Sarah Kofman, em seu livro A infância da arte, quando afirma que devemos pensar na sublimação não como um conceito moral, mas, sim, como um conceito metapsicológico (Kofman, 1996, p. 186)3 3 Lembro ao leitor que Kofman se matou em 1995. Infelizmente, até a conclusão deste artigo, não consegui informações que pudessem esclarecer sobre as circunstâncias do seu suicídio. .

Vista desta maneira, a noção de sublimação nos possibilita examinar o processo criativo do mesmo modo que faríamos para analisar qualquer formação relativa ao campo pulsional, levando em conta a dinâmica nela envolvida, sua determinação inconsciente e sua economia. Esta perspectiva permite pensarmos no que estaria envolvido na metapsicologia do processo criativo em geral e na escrita literária em particular, destacando os elementos que se relacionam às suas funções e limites. Na dimensão da escrita literária, podemos descrever esses limites em extremos que ora se distanciam ora se aproximam e se misturam em uma espécie de fertilização cruzada, para produzir o texto: o polo da vida e o polo da obra; o polo do transbordamento pulsional e o polo da simbolização; o polo do excesso e o polo da contenção, o polo funcional e o polo disfuncional.

Para continuar respondendo às perguntas que coloquei no início, precisamos ter em mente três das noções mais conhecidas sobre a sublimação. Vou retomá-las rapidamente para ver em que medida elas nos ajudam aqui. A primeira dessas noções segue as primeiras formulações de Freud e atribui a esse peculiar destino pulsional a capacidade de promover uma espécie de apaziguamento do sofrimento psíquico, organizando-o numa direção construtiva e benéfica. Segundo essa visão, ali onde os sintomas são o resultado de um arranjo conciliatório - nem sempre condenado ao fracasso, é verdade - entre as forças antagônicas que fazem parte do psiquismo, a sublimação, não sendo propriamente uma conciliação, seria uma alternativa mais “saudável” do que as defesas desgastantes que possuímos para lidar com nossos conflitos. É verdade que, desde cedo, em um texto como “Moral sexual ‘civilizada’ e doença nervosa moderna” (Freud, 1908/1976a), Freud já se questionava sobre a capacidade da sublimação para evitar a produção de sintomas, e até mesmo relacionou o excesso de sublimação ao sofrimento psíquico. De qualquer modo, as primeiras formulações freudianas sobre a sublimação não deixam de descrevê-la como um processo que transforma o mundo interno daquele que cria, em algo organizado senão prazeroso, geralmente pelas modificações efetuadas no mundo externo. Não custa lembrar que, segundo Freud, o artista obteria, com sua arte, “honras, poder e o amor das mulheres” (Freud, 1917/1976, p. 439).

Segundo outra concepção, de inspiração lacaniana, pelo menos para alguns indivíduos, a criatividade, não se opondo à formação dos sintomas e de outros fenômenos, permite também alguma forma de inscrição subjetiva. Na medida em que, por meio da criação, o sujeito, digamos, firma a singularidade da sua assinatura fazendo, assim, um ponto de amarração em seu posicionamento subjetivo - como nos mostrou Lacan em “Joyce, o Sintoma” (Lacan, 1975/2003, pp. 560-566) -, o sofrimento psíquico encontraria na via da criação uma expressão diferente dos sintomas da neurose e das manifestações da psicose, naquilo que os caracteriza como expressão cifrada, repetida e não compartilhável.

Uma terceira formulação, derivada dessa última concepção, entende que a especificidade da sublimação talvez tenha muito mais a ver com o efeito que resulta na transformação compartilhável de uma experiência subjetiva singular, ou seja, no tipo de laço social estabelecido por meio do produto artístico, do que com uma suposta interioridade de onde provém o impulso criativo.

Ninguém pode negar que tais possibilidades existem, e certamente é incontável o número de pessoas que conseguiram encontrar outra via de expressão e de transformação de seus problemas, por meio da arte e da criação literária, ainda que isso não tivesse sido o principal motivo que os levou nessa direção.

Contudo, existem situações, tal como parece ser o caso de alguns escritores suicidas, em que tudo dá a impressão de acontecer de outro modo, e é então que essas concepções que acabei de rever deixam de nos ajudar. Não só porque mantêm inexplicado o fato óbvio de que o indivíduo criativo não está livre de desenvolver sintomas ou outros tipos de manifestação de sofrimento psíquico (mesmo tendo adquirido uma sustentação com seu trabalho criativo), como também, se nos ampararmos nessas concepções pensando que a sublimação constitui uma saída menos sofrida, logo veremos que não adianta recomendar que alguém pinte um quadro ou escreva um poema, em vez de ficar confinado no sofrimento, mesmo se esse indivíduo possui talento. Além disso, embora essas formulações sobre a sublimação aludam à via de mão dupla que parece existir entre o sofrimento emocional e o processo criativo, elas apenas nos mostram o que, dentro e fora da psicanálise, todos pensam sobre a criatividade, que é o seu lado funcional. Quanto ao seu lado disfuncional, pressentido no suicídio do escritor criativo, elas não nos ajudam muito.

Para irmos um pouco além, é preciso destacar uma importante noção sobre a sublimação que Freud apresentou três anos depois da introdução do conceito de pulsão de morte em sua teoria. Nessa formulação mais tardia que, curiosamente, aparece apenas uma vez em toda a sua obra, Freud pensará que, da sublimação, resulta uma liberação das pulsões agressivas no supereu, pulsões que lutam contra a libido, ficando o eu exposto “ao perigo de maus tratoSs e morte” (Freud, 1923/1976, p. 73).

O fato de que essa formulação4 4 Julia Kristeva trabalha com essas mesmas citações em seu ensaio L’amour de soi et ses avatars _ démesure et limites de la sublimation. (Kristeva, 2005, p. 12). O psicanalista Nelson da Silva Júnior também tem utilizado, de modo bastante fecundo, essas concepções em seus trabalhos. (cf. Silva Júnior, 2003). não viria a se repetir nas outras menções à sublimação feitas por Freud pode fazer o leitor incauto negligenciar sua importância, o que seria lamentável. A meu ver, o que faz esta noção ser pouco citada – eu diria mesmo: ser recalcada – é o fato de que ela contém algo inquietante para aqueles que se apegam à ideia de que a arte e a literatura constituem algo sagrado que deveria ser mantido intacto, protegido da profanação perpetrada pelo olhar da metapsicologia.5 5 “E se não for legítimo buscar na arte se não um paraíso, ao menos uma promessa de felicidade, então, onde será?”, é a pergunta que se lê na matéria “O deus da cor”, escrita por Carlos Graieb e Marcelo Martins sobre o pintor Matisse, em artigo publicado na revista Veja (02/09/2009, p. 131), revelando o temor ao qual aludo, aqui. Se de todo já não era fácil, para alguns, admitir a linha de continuidade que Freud estabeleceu entre a sublimação e a sexualidade infantil perversa polimorfa, mais difícil ainda será, para muitos, concordar em acompanhá-lo quando, em O ego e o id, ele ressaltar a característica desfusão pulsional envolvida na sublimação, aspecto que, em decorrência da dessexualização, coloca o eu a serviço de objetivos opostos aos das pulsões de vida (Freud, 1923/1976, p. 73).

Segundo essa formulação, a meu ver imprescindível para uma análise do processo criativo e seus destinos disfuncionais, a sublimação não pode deixar de se referir à angústia ou à dor psíquica (mesmo se pensarmos na criatividade como um destino “mais nobre”, mais feliz ou menos defensivo para o sofrimento). Além disso, em seu interior, a possibilidade – senão a necessária participação – dos elementos desintegradores da pulsão de morte sentidos implica um risco que a própria noção de “destino menos defensivo” ressalta ainda mais. Se nada disso impede que, por meio da produção artística e literária, alguém canalize, ligue e transforme, em diferentes níveis, os derivados do campo pulsional – já que é por meio dessas ligações e dessas transformações que o psiquismo tenta dominar a intensidade dos elementos presentes nesse campo – não parece, porém, que o indivíduo esteja protegido por meio da sublimação, já que, como nos adverte Freud, ela própria é potencialmente desorganizadora.

Esses aspectos apontam para a existência de limites na economia da sublimação (limites não do conceito, que a meu ver permanece sendo um bom conceito, mas na função dos processos psíquicos descritos sob esse nome). Talvez fosse interessante considerarmos que a maior ou menor proximidade dos arranjos sublimatórios em relação aos elementos que eles buscam dominar ou transformar (isto é, dar forma), é que darão conta dos vários destinos da criatividade, tenham eles êxito ou caminhem para o fracasso. Os destinos desses arranjos devem ser entendidos, descritivamente, como variações na distância da sublimação em relação às fontes pulsionais.

Se considerarmos esses aspectos, estaremos mais preparados para abordar o fenômeno intrigante da morte trágica daqueles escritores – sobretudo daqueles que, confessadamente, acreditavam na função organizadora, senão terapêutica de seu trabalho – que se suicidaram durante um período produtivo de seus projetos literários.

Como mencionei no início, mesmo se mantivermos em mente a singularidade de cada um dos casos de autores suicidas que pudéssemos aqui evocar, talvez seja possível avaliar o tipo de envolvimento existente entre a sublimação e o sofrimento emocional, se examinarmos de perto a relação entre a escrita literária e o autoextermínio. Portanto, nós nos vemos aqui obrigados a pensar no que haveria além do caráter funcional e prazeroso do processo criativo, se voltarmos nossa atenção para os elementos que circunscrevem os limites da sublimação e indicam a presença de aspectos disfuncionais no interior desse campo.

É por esta razão que precisamos recorrer à formulação freudiana de 1923, que destaquei, porque ela nos ajuda a esclarecer a natureza desses limites que dizem respeito à função da escrita como sublimação e à destrutividade potencial que existe entre a ordem pulsional e os recursos disponíveis para a sua contenção e eventual transformação.

Surgindo no esforço literário de certos autores suicidas, essa destrutividade faz coro com seus destinos trágicos e aponta para a predominância dos elementos que, mobilizados pela escrita, são os mesmos que levaram os escritores em questão a renovar interminavelmente o sofrimento psíquico. Seus textos parecem se construir sobre a dupla faceta da escrita: de um lado, uma escrita com fim, com finalidade, escrita de contenção (esta mais defensiva e distanciada), e, de outro lado, uma escrita sem fim, sem finalidade, escrita de excesso (que não oferece nenhuma proteção), mostrando a maior e também a menor das distâncias das ligações efetuadas sob o regime da sublimação. O que se perfila na interação da escrita com a vida, na obra de um autor suicida é, enfim, o limite da escrita como sublimação, mais precisamente aquilo que acena para o ponto de indizibilidade no coração da linguagem.

Sylvia Plath, por exemplo, dizia suspeitar que a “inundação” (deluge) não poderia ser inteiramente contida pelo “polegar da palavra no buraco do dique” (Plath, 2000, p. 318), mas procurou fazer com que o fluxo das palavras jorrasse com a mesma intensidade da hemorragia psíquica. Curiosamente, em um poema de Paul Celan escrito em 1967, lemos que o “dique de palavras, vulcânico” é “afogado pelo rugir do mar” (Celan, 1999, p. 113),6 6 Recomendo a leitura de A dor dorme com as palavras: a poesia de Paul Celan nos territórios do indizível e da catástrofe de Mariana Camilo de Oliveira (2008). ao passo que, sete anos antes, em seu famoso discurso de recebimento do “Prêmio Georg Büchner”, afirmara: “O poema é solitário. Quem o escreve, a ele fica entregue.” (Celan, 1999, p. 179).

Nesse tipo de empreendimento literário, a palavra, ao ser colocada à altura – ou melhor, nas profundezas – do inominável pulsional, não é buscada para curar: “O jato de sangue é poesia,/ Não há nada que o detenha” lemos no poema “Kindness” [“Bondade”], de Sylvia Plath (Plath, 1981, p. 269), escrito poucos dias antes de seu suicídio. É muito notável a convergência dessas enunciações com as de Ana Cristina Cesar em seu poema “Contagem regressiva”, escrito nas últimas semanas de sua vida, no qual se lê: “Os poemas são para nós uma ferida” (César, 1985, pp. 160-164). Anne Sexton diria ainda que “o suicídio é, afinal, o oposto do poema” (Sexton, 1970, pp. 174-181). É interessante lembrar que Virginia Woolf, não sem razão, procurava alternar a escrita de livros muito carregados de experiência pessoal, que abalavam seu estado emocional, com a escrita de textos que ela chamaria de “livros de férias” ou “livros que descansam de outros livros” (Lehmann, 1989, p. 60).

A escrita de David Foster Wallace também parece marcada por uma tensão potencialmente destrutiva que, no seu caso, era alimentada por dois horrores: o horror de nada dizer e o de tudo dizer. Em seus depoimentos, ele confessou sua preocupação quando tinha de passar muito tempo escrevendo ensaios ou textos não ficcionais. Quando se ocupava em escrever textos relativamente afastados da experiência pessoal, ele sentia que perdia contato com algo importante e logo precisava voltar a essa experiência para criar – diferente do que acontecia com Virginia Woolf e seus “livros que descansavam de outros livros”. Contudo, uma vez imerso no trabalho da escrita ficcional, já não era possível encontrar uma medida para a intensidade das emoções provenientes, seja do seu mundo interno, seja do próprio trabalho de escrita. As vozes de suas personagens, superpondo-se muitas vezes com a do narrador, falam, sem parar, de uma perspectiva ao mesmo tempo irônica e sombria. Nessa perspectiva, a autorreferência, a autocontemplação (que acompanha o recurso constante à metalinguagem), a ruminação (expressa nas longas notas de rodapé que nos obrigam a uma leitura circular) e o negativismo (ou a denúncia constante da impostura da linguagem) mimetizam o tempo parado e lento do discurso melancólico em sua litania.7 7 Para um exame desses aspectos, típicos da expressão melancólica, sugiro a preciosa contribuição de Marie- Caude Lambotte (1997) em seu livro O discurso melancólico: da fenomenologia à metapsicologia.

Até o momento, de sua obra, apenas um livro de contos (Brief interviews with hideous men) [Breves entrevistas com homens hediondos] está traduzido para o português. Contudo, com exceção de Oblivion [Esquecimento], todos os seus livros estão traduzidos

para o espanhol, entre os quais se incluem The broom of the system [A vassoura do sistema], seu primeiro livro, publicado quando ele tinha apenas 25 anos, Girl with curious hair [Garota com cabelo esquisito] Consider the lobster [Considere a lagosta], A supposedly fun thing I’ll never do again [Uma coisa supostamente engraçada que eu nunca farei novamente] e Infinite Jest [Zombaria infinita].

Formado em literatura inglesa e em filosofia, com ênfase em lógica modal e matemática, David Foster Wallace tinha 34 anos, quando publicou o romance Infinite Jest8 8 O título é uma alusão ao nome do filme que o pai de Hal Incandenza (o personagem principal do livro), antes de se matar dentro de um forno de microondas, deixa para o filho, na esperança de que o filme fosse “um brinquedo magicamente divertido que ficasse balançando na frente da criança que talvez ainda se encontrasse vivo dentro do rapaz, para fazer seus olhos brilharem e sua boca sem dentes se abrir espontaneamente, numa gargalhada. Para trazê-lo ‘para fora de si mesmo’, como dizem.” [ Infinite jest, p. 5, tradução minha]. O título do romance deriva também de uma fala de Hamlet ao crânio de Yorick, o bobo da corte: "Alas, poor Yorick! I knew him, Horatio: a fellow of infinite jest, of most excellent fancy: he hath borne me on his back a thousand times; and now, how abhorred in my imagination it is!" ( Hamlet, Ato V, Cena I). Essa fala melancólica expõe, em sua amarga ironia, o caráter inexorável da morte, reconhecido por Hamlet. Qualquer humor sobre essa certeza não apenas é inútil, mas também um grande escárnio, o que se mostra no riso da caveira. – “uma história de pessoas em estado de dor” (Max, 2009) – com o qual se tornaria famoso. Nesse romance espantoso, 388 notas de rodapé ocupam 96 das suas 1079 páginas. Na época da sua morte, Wallace estava tentando terminar outro livro, deixado inacabado, intitulado The pale king [O deus pálido], perto de cujas páginas cuidadosamente empilhadas ele se enforcou.

São inúmeros os depoimentos em que Foster Wallace nos conta sobre a função da escrita, sobre os temores em relação ao que a linguagem não pode alcançar e em relação ao ponto em que ele poderia considerar um texto terminado. Nesse sentido, falou frequentemente sobre os vários níveis de modificação que o material literário tem de sofrer a partir da experiência pessoal. Na sua opinião, o texto final infelizmente nunca mostra o montante do esforço que o escritor tem de fazer para escolher, no meio de uma massa de elementos infinitamente maior, aqueles que aparecerão no texto publicado. Como mencionei há pouco, mais de uma vez Wallace falou sobre a necessidade de utilizar o mundo emocional (sobretudo a experiência melancólica) para canalizá-la no texto. Um dos efeitos da medicação antidepressiva que ele tomou durante mais de vinte anos, foi a supressão dos afetos. Segundo ele, a medicação “emudecia” suas emoções, e ele via isso com preocupação, na medida em que sua escrita precisava delas para se processar.

A leitura que venho fazendo de sua obra tem-me permitido confirmar a pertinência de um conceito que forjei, a partir do estudo que fiz sobre a vida e a obra de Sylvia Plath e que desde então passei a usar para compreender o caráter potencialmente disfuncional do processo criativo, sobretudo se o relacionarmos ao suicídio de alguns escritores. É o conceito de toxidez da escrita (Carvalho, 2003), que mostra a predominância de elementos destrutivos na sublimação, elementos que agem como se estivessem infiltrados pelo “conhecimento endopsíquico”9 9 A ideia de um “conhecimento endopsíquico” é utilizada por Freud no texto sobre a Gradiva, para mostrar o acesso do escritor criativo aos processos psíquicos: “Os escritores criativos são aliados muito valiosos, cujos testemunhos devem ser levados em alta conta, pois costumam conhecer toda uma vasta gama de coisas entre o céu e a terra com as quais a nossa filosofia ainda não nos deixou sonhar. Estão bem adiante de nós, gente comum, no conhecimento da mente, já que se nutrem em fontes que ainda não tornarmos acessíveis à ciência” (Freud, 1908b/1976, p. 18). que esses autores provavelmente tinham do caráter insuficiente da linguagem para conter a força pulsional que alimenta a própria escrita.

Cada um a seu modo, os textos desses autores suicidas dão testemunho da qualidade da mobilização exigida diante da ameaça de transbordamento dos elementos destrutivos que agem em silêncio, no sentido do desligamento e da não representação, e que a escrita ao mesmo tempo veicula e elabora. Esses elementos pertencem ao campo da pulsão de morte. O véu que essa escrita tece é esgarçado, “véu de buracos” [cloak of holes], “manto de impossíveis” [sheath of impossibles], como Sylvia Plath escreveu em um poema de outubro de 1962 (Plath, 1981, pp. 242-244) – para melhor deixar transparecer, sem disfarces, o que não pode ser colocado sob nenhuma metáfora, não podendo, por isso, ser elevado a nenhuma posição sublime.

“A pessoa deprimida estava com uma dor terrível e incessante e a impossibilidade de repartir ou articular essa dor era em si um componente da dor e fato de contribuição para o seu horror essencial” – dirá o narrador no primeiro parágrafo do conto “A pessoa deprimida”, de Wallace (2005, p. 50). Nesse conto de 35 páginas, mais ou menos 12 páginas são ocupadas por longas notas de rodapé, duas das quais chegando a ocupar oito páginas inteiras. Colocadas no conto aparentemente para esclarecer ou aprofundar algum aspecto, em “A pessoa deprimida” essas notas de rodapé obrigam o leitor a voltar, a cada vez, aos pontos em que elas se iniciam (tal como fariam em um texto acadêmico em que elas servem também para apontar novas direções). Contudo, ocorre no conto um efeito curioso: o leitor não apenas constata que nada mudou na situação descrita pelo narrador, como também a narrativa circular e repetitiva termina por mimetizar justamente o aspecto de que a personagem da pessoa depressiva tanto se queixa: a impossibilidade de mudança pela palavra. Em resumo: as palavras não levam a nada a não ser à constatação de sua insuficiência.

Também encontramos longas notas de rodapé, num total de 18, no conto “Octeto” (Wallace, 2005, pp. 155-187). Escrito como se fossem partes de um exame (um “quizz”, como se diz em inglês), ali as cinco partes – e não oito, como seria de esperar em um octeto – estão colocadas numa sequência cujos títulos se repetem em uma numeração que não é rigorosamente sequencial. A parte 6, por exemplo, se desdobra em “Quizz 6” e “Quizz 6 (A)”, entremeadas pela parte intitulada “Quizz 7”), o que sugere uma circularidade entre as partes 6 e 6 (A), já que os acontecimentos narrados em ambas são retomados a partir de perspectivas cada vez mais sombrias. Na quinta e última parte do conto, intitulada “Quizz 9”, o narrador descreve o processo da construção textual do próprio conto e o faz apenas para denunciar o caráter manipulativo, falso, mentiroso e, finalmente, insuficiente das palavras e dos meios simbólicos para se transmitir uma intenção de modo genuíno e para estabelecer uma conexão real com o mundo externo. Diga-se de passagem, essa é uma queixa comum no melancólico.10 10 Apoio-me, aqui, nas concepções de Lambotte (1997) sobre as características do discurso melancólico.

Fracassa ali o aspecto, digamos, defensivo da linguagem – e Wallace mostra saber isso –, sendo a linguagem o único meio que poderia oferecer a matéria com a qual o sujeito poderia construir a escada que o retiraria do poço da melancolia.

Esse tipo de escrita se constrói, praticamente sem distância, da destrutividade que ali se encontra, permitindo concluir que a aproximação entre o eu que escreve, o eu que sofre e o sujeito da enunciação implica um risco, cujos dois lados são, como disse um crítico, “o triunfo da literatura e a derrota do autor” (Davison, 1984, p. 41). Sobre isso Wallace assim se expressou:

Parece que a grande distinção entre a boa arte e a arte ruim reside no desejo que o escritor tem de morrer para emocionar o leitor. Toda a atenção, dedicação e trabalho que [você como escritor] precisa obter do leitor, não pode ser para o seu próprio benefício; tem de ser em benefício do leitor. (Wallace, n.d., citado por Max, 2009)

Ou seja, o que é eficiente do ponto de vista estético nem sempre é bem sucedido do ponto de vista psíquico. O cenário da criação literária é cercado de riscos, não apenas porque o que se pretende, ao que tudo indica no caso de Wallace, é ir além dos limites da linguagem, denunciando-os, mas também por causa da natureza do afeto que, se não mobiliza essa criação, é mobilizado imprevisivelmente por ela. No seu caso, como parece ter sido também o caso de Sylvia Plath, o afeto em questão é a dor, que em seus textos ressoa como que para dar a impressão de que provém de um centro ferido que sangra psiquicamente sem cessar.

No entanto essa dor – que Freud (1915b/1974, p. 169) definiu como uma “pseudopulsão” (Pseudotrieb) – consome o eu, que se sente compelido a contê-la. Nesse ponto, a escrita pode levar o eu a se aproximar perigosamente desse centro mortífero, onde não existem garantias para encontrar a “palavra-dique” que detenha o fluxo e onde o eu pode ficar no lugar do jorro e do fluxo das “palavras de água” (Castello Branco, 1994, p. 136) – palavras que aglutinam, mas liquefazem o eu; e que são fusão, mas também separação. Quando a sublimação aproxima-se demais desse centro, ele “se torna silencioso. Cala-se”, lembra-nos André Green (1992, pp. 251-252). Vê-se como esse fundo de silêncio, nunca inteiramente apreensível pelas referências simbólicas às quais o escritor se agarra para distanciar-se, é, ao mesmo tempo, fonte das palavras e razão mesma de sua insuficiência. Não deve ter sido sem razão que o título do último poema escrito por Sylvia Plath (1981, pp. 272-273) intitula-se, significativamente, “Edge” [“Limite”], pois ele aponta para o ponto limite do processo criativo: “Chegamos até aqui, acabou-se.” O sujeito da enunciação no último poema de Anne Sexton (intitulado “Carta de amor escrita em um edifício incendiado”) diz estar escrevendo “debaixo de uma máscara” e que “guardará [suas] últimas palavras na geladeira”, onde “talvez elas se conservem” ao abrigo do “incêndio” que tomou conta do texto, da “caixa” em que ele se confinou (Sexton, 1981, p. 614).

Nessa poética do suicídio, haveria como que uma espécie de nostalgia por algo que desse conta do tamanho incomensurável do arrombamento ocorrido na trama dos significantes. Essa talvez seja a razão pela qual Lacan (1985, p. 155) chegou ao extremo de dizer que toda criação é por si mesma nociva e só engendra as consequências positivas e negativas que ela mesma comporta. O escritor faz uso das palavras para proteger-se de algo que, em algum nível, é precipitado por nada mais do que a própria linguagem.

É preciso levar em conta um último aspecto, que é o da repercussão interna que a escrita pode ter para o escritor, pois o que surge junto à questão da finalidade do processo literário é, precisamente, uma toxidez na própria escrita. Chegamos a um ponto no qual temos de reconhecer que, se existe um lado benéfico na criação literária, existe também um lado nocivo, em um duplo aspecto que Platão, não sem certa ironia, discutiu em Fedro. A escrita como pharmakon, já sabiam disso os gregos: remédio de um lado, veneno de outro. Nessa perspectiva, a escrita, vindo do exterior e não tendo essência ou valor próprio, pode sempre mudar de sentido: jogando no simulacro, serve tanto à vida quanto à morte, residindo aí a fragilidade da sua proteção (Derrida, 1991). Se o júbilo, o lúdico e o prazeroso fazem parte do escrever, contudo não estão ausentes dele o perigo e a angústia. “O texto é uma saída, mas não é o abrigo” (Juhasz, 1979, p. 263).

Esse aspecto é o que permitiu a toda uma tradição romântica em literatura falar do “mal da linguagem”, que na verdade permeia toda a linguagem, incluindo a “linguagem da restauração, que trabalha incessantemente no silêncio” (De Man, 1984, pp. 67-81). É que, quando escrevemos, permanecemos dependentes da linguagem e se esta nos condena a “fazer soar”, também nos condena à mudez. É da simultaneidade da faceta restauradora e desorganizadora da linguagem que parece nutrir-se a criação literária. O primeiro desses aspectos coloca um distanciamento entre o escritor e a experiência sobre a qual ele escreve, e faz com que a escrita cumpra seu papel transformador, inventivo, e mesmo restaurador, para não dizer defensivo. O outro aspecto é aquele que promove a imediaticidade na experiência literária, fazendo com que o texto deixe de ser meramente mimético e apresente o Real, mais do que o represente (Recalcati, 2005). Assim, se a escrita literária resulta da exigência de um trabalho efetuado num momento em que as experiências são recriadas ou re-significadas, é nesse momento posterior que tais vivências deixam de ser o que eram para se transformar em texto, este sempre inaugural, sempre originário de uma subjetividade. Nesse sentido, podemos pensar que as palavras mostram ao escritor algo inesperado, “ensinam o seu pensamento” (Derrida, 1971, p. 24). Não sem razão, a ensaísta americana Susan Sontag11 11 Em entrevista publicada no jornal Estado de Minas em 02 de dezembro de 2002. costumava dizer que só quando escrevia é que descobria o que pensava.

Do jogo entre a movimentação pulsional da escrita e o trabalho das forças defensivas que se lhe contrapõem resulta uma tensão ligada aos limites da sublimação. As marcas dessa tensão estarão presentes na enunciação, embora não se possa dizer que a escrita liquidará o conflito afetivo que ali se produz. Ao veicular o afeto sem, no entanto, o recalcar, a escrita permite que uma presença se inscreva, muito além do nível mimético, nas marcas semióticas que bordejam a pulsão, cada texto testemunhando a constância de um afeto que sustenta um estilo 12 12 Apóio-me aqui em Julia Kristeva, que nos lembra que a verbalização dos afetos não os torna conscientes, mas faz com que eles operem duplamente. Por um lado, redistribuem a ordem da linguagem e dão origem a um estilo. Por outro, mostram o inconsciente em personagens e atos que apresentam as moções pulsionais proibidas e transgressivas (Kristeva, 1992, p. 164). - embora estejamos longe de atribuir essa constância a um traço da personalidade do autor. Por isso não se pode dizer que a angústia da escrita seja um pathos determinado, uma vez que não é essencialmente uma modificação ou um afeto empírico do escritor, mas algo pelo qual a própria escrita seria responsável (Derrida, 1971). Provavelmente é isso que faz surgir um determinado posicionamento subjetivo que, se não é pré-existente, é construído na enunciação. Contudo, isso não impede o impasse que se refere, de um lado, à possibilidade de conexão prometida pelas palavras, e de outro lado, ao drama afetivo de uma experiência desarticuladora propiciada pelo próprio trabalho da escrita, trabalho do qual Foster Wallace terminará por revelar a impostura:

Você é, infelizmente, um escritor de ficção. Está tentando um ciclo de peças beletristas muito curtas.... Difícil descrever como as peças curtas do ciclo devem funcionar.... Você tem certeza, porém, de que as peças narrativas são realmente apenas ‘peças’ e nada mais, i. é, que a maneira como elas se encaixam no ciclo maior que as compreende é que é crucial para a ‘alguma coisa’ que você quer ‘questionar’ numa sensação humana e assim por diante. Então você faz um ciclo de oito partes dessas pequenas peças de porca e parafuso. E resulta num fiasco total.... Mesmo com a mais caridosa interpretação, isso vai parecer desesperado. Possivelmente patético. De qualquer forma, não vai fazer você parecer sábio, nem seguro, nem dotado, nem qualquer das coisas que os leitores geralmente querem fingir que acreditam que o artista literário que escreveu o que estão lendo é, quando sentam para tentar escapar do insolúvel fluxo de si mesmos e entrar em um mundo de significado preestabelecido. (Wallace, 2005, pp. 170-171)

Portanto, se há triunfo na criação literária, há também o perigo constante de um salto para uma morte mortífera que revela a precariedade da rede simbólica – essa “pele simbólica de palavras” que é o texto (Anzieu, 1974, citado por Morel, 1990, pp. 184-185) – com a qual o escritor procura suturar o abismo que se abre entre a experiência afetiva e a simbolização. Ao que tudo indica, portanto, não existe, no processo sublimatório de que resulta a escrita literária, nenhuma garantia para um distanciamento compensador. É por isso que, não sendo possível de ser realizada sem “a força do corpo”, a escrita pode levar ao encontro do que Duras denominava “uma selvageria anterior à vida”. Essa “selvageria”, que não é outra coisa senão o aspecto desorganizado das pulsões, é o que permite Duras afirmar que “a escrita é o desconhecido”, já que, “antes de escrever, nada se sabe do que se vai escrever” (Duras, 1994, pp. 22-47).

Como todos os escritores suicidas que mencionei, também David Foster Wallace ainda escrevia textos literários e cartas até pouco antes de se matar, o que indica na escrita uma função, ainda que precária. Penso que, do mesmo modo que aconteceu com Sylvia Plath, também em Foster Wallace a dor psíquica se tornou excessiva pela impossibilidade de domínio dos elementos desintegradores que são parte do processo sublimatório. Nessa escrita tóxica, a dor não pôde ser diferida, fazendo desmoronar a organização psíquica em busca de outro tipo: de contenção: “Se me mato, não é para me destruir, mas para me reconstituir”, disse Artaud (n.d., citado por Grunberger, 1979, p. 249).

Se esses aspectos provavelmente não abrangem todos os tipos de suicidas, devemos pelo menos levar em conta que existe, paradoxalmente, uma função autoconservadora no autoextermínio. O recurso interminável da escrita pode às vezes encontrar, no suicídio, o seu fim.

Referências

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Recebido em: 16/11/2009

Aceito em: 15/01/2010

Ana Cecília Carvalho, Professora do Curso de Especialização em Teoria Psicanalítica e do Curso de Atualização em Temas Freudianos da Universidade Federal de Minas Gerais. Endereço para correspondência: Rua Califórnia, 729, apto. 401, Sion, CEP 30315-500, Belo Horizonte, MG. Endereço eletrônico: anneoakwood@yahoo.com.br

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  • 1
    Os resultados dessas pesquisas, conduzidas na Universidade Federal de Minas Gerais, serão apresentados em um livro, atualmente em preparação, cujo título será “A sublimação e seus destinos”, em coautoria com o professor Guilherme Massara Rocha.
  • 2
    Num outro trabalho, discorri sobre os problemas de uma pesquisa psicanalítica do literário, a fim de apresentar algumas soluções. (Carvalho, 2007). Sugiro também o livro
    Vida escrita, de Ruth Silviano Brandão, uma excelente contribuição ao campo da pesquisa em literatura e psicanálise.
  • 3
    Lembro ao leitor que Kofman se matou em 1995. Infelizmente, até a conclusão deste artigo, não consegui informações que pudessem esclarecer sobre as circunstâncias do seu suicídio.
  • 4
    Julia Kristeva trabalha com essas mesmas citações em seu ensaio
    L’amour de soi et ses avatars _ démesure et limites de la sublimation. (Kristeva, 2005, p. 12). O psicanalista Nelson da Silva Júnior também tem utilizado, de modo bastante fecundo, essas concepções em seus trabalhos. (cf. Silva Júnior, 2003).
  • 5
    “E se não for legítimo buscar na arte se não um paraíso, ao menos uma promessa de felicidade, então, onde será?”, é a pergunta que se lê na matéria “O deus da cor”, escrita por Carlos Graieb e Marcelo Martins sobre o pintor Matisse, em artigo publicado na revista
    Veja (02/09/2009, p. 131), revelando o temor ao qual aludo, aqui.
  • 6
    Recomendo a leitura de
    A dor dorme com as palavras: a poesia de Paul Celan nos territórios do indizível e da catástrofe de Mariana Camilo de Oliveira (2008).
  • 7
    Para um exame desses aspectos, típicos da expressão melancólica, sugiro a preciosa contribuição de Marie- Caude Lambotte (1997) em seu livro
    O discurso melancólico: da fenomenologia à metapsicologia.
  • 8
    O título é uma alusão ao nome do filme que o pai de Hal Incandenza (o personagem principal do livro), antes de se matar dentro de um forno de microondas, deixa para o filho, na esperança de que o filme fosse “um brinquedo magicamente divertido que ficasse balançando na frente da criança que talvez ainda se encontrasse vivo dentro do rapaz, para fazer seus olhos brilharem e sua boca sem dentes se abrir espontaneamente, numa gargalhada. Para trazê-lo ‘para fora de si mesmo’, como dizem.” [
    Infinite jest, p. 5, tradução minha]. O título do romance deriva também de uma fala de Hamlet ao crânio de Yorick, o bobo da corte: "Alas, poor Yorick! I knew him, Horatio: a fellow of infinite jest, of most excellent fancy: he hath borne me on his back a thousand times; and now, how abhorred in my imagination it is!" (
    Hamlet, Ato V, Cena I). Essa fala melancólica expõe, em sua amarga ironia, o caráter inexorável da morte, reconhecido por Hamlet. Qualquer humor sobre essa certeza não apenas é inútil, mas também um grande escárnio, o que se mostra no riso da caveira.
  • 9
    A ideia de um “conhecimento endopsíquico” é utilizada por Freud no texto sobre a
    Gradiva, para mostrar o acesso do escritor criativo aos processos psíquicos: “Os escritores criativos são aliados muito valiosos, cujos testemunhos devem ser levados em alta conta, pois costumam conhecer toda uma vasta gama de coisas entre o céu e a terra com as quais a nossa filosofia ainda não nos deixou sonhar. Estão bem adiante de nós, gente comum, no conhecimento da mente, já que se nutrem em fontes que ainda não tornarmos acessíveis à ciência” (Freud, 1908b/1976, p. 18).
  • 10
    Apoio-me, aqui, nas concepções de Lambotte (1997) sobre as características do discurso melancólico.
  • 11
    Em entrevista publicada no jornal
    Estado de Minas em 02 de dezembro de 2002.
  • 12
    Apóio-me aqui em Julia Kristeva, que nos lembra que a verbalização dos afetos não os torna conscientes, mas faz com que eles operem duplamente. Por um lado, redistribuem a ordem da linguagem e dão origem a um estilo. Por outro, mostram o inconsciente em personagens e atos que apresentam as moções pulsionais proibidas e transgressivas (Kristeva, 1992, p. 164).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Dez 2010
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Aceito
      15 Jan 2010
    • Recebido
      16 Nov 2009
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