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Quarta aula: a questão do meio na pedologia , Lev Semionovich Vigotski

Dossiê Vigotski

Quarta aula: a questão do meio na pedologia , Lev Semionovich Vigotski1 1 Este trabalho teve como objetivo preservar, da forma mais fiel possível, o sentido do texto no original, evitando assim a possibilidade de uma tradução interpretativa. A elaboração do texto em português envolveu, inicialmente, uma primeira versão direta do russo que, após ser revista e cotejada tanto com o original quanto com a tradução para o inglês, de autoria de Teresa Prout (Vygotsky, 1994), foi submetida à análise criteriosa dos termos escolhidos, resultando nesta versão final. Para justificar determinadas escolhas, inserimos notas de rodapé nas opções que poderiam levantar dúvidas , 2 2 Tradução revisada por Max Welcman, mestre pelo Instituto de Estudos da Linguagem, UNICAMP

Márcia Pileggi Vinha (Trad.); Max Welcman

Hoje, o tema de nossa aula é a questão do meio3 3 Segundo o Pequeno Dicionário Enciclopédico Brockhaus e Efron, o termo sredá [ c реда ] refere-se tanto ao "meio ambiente em que se dá determinado processo" como ao "ambiente psíquico ou cultural e mental no qual o homem se insere". Essa segunda acepção, que possui um sentido psicológico e cultural, ganhou força na segunda metade do século XVIII, pelos filósofos Moritz Lazarus (1824-1903) e Heymann Steinthal (1823-1899), que o utilizavam como "a totalidade das condições culturais em meio às quais vivem os indivíduos". Em russo, ainda é bastante usada a conotação científica de sredá enquanto "meio", no sentido de "conjunto de elementos materiais e circunstanciais que influenciam um organismo vivo" (Houaiss, 2009). Em português, o termo que melhor parece coadunar as acepções é "meio", por aludir tanto à soma de circunstâncias que são objeto de estudo, quanto a um "grupo social, como aquele estabelecido pela família, profissão, classe econômica, contexto geográfico etc., a que pertence uma pessoa" (Houaiss, 2009) na pedologia. Tal como ocorre com a questão da hereditariedade, que a pedologia estuda a partir de sua própria perspectiva, interessando-se não por suas leis enquanto tais, mas pelo papel que a hereditariedade desempenha no desenvolvimento da criança, ocorre também com o meio. A pedologia não estuda o meio enquanto tal, pois isso é objeto de outras ciências - de ciências mais próximas à pedologia, como as ciências sanitárias, que estudam o meio especialmente a partir de sua relação com doenças e com a preservação da saúde.

Tal como na questão da hereditariedade, o pedólogo estuda não o meio e as regras4 4 O termo zakón [закон], segundo Brockhaus e Efron, expressa tanto um ato normativo de valor legal, que regula a relação entre os cidadãos, como uma "relação geral e necessária (de ordem e consequência) entre fenômenos" da natureza, mecânicos, físico-químicos, lógicos, psicológicos e morais, sociais e históricos, entre outros. Dessa maneira, o termo pode ser traduzido tanto por "lei" como por "regra", ou até mesmo, "norma", de acordo com o contexto que o constituem, mas seu papel e significado, sua participação e sua influência no desenvolvimento da criança. Por isso, exatamente como se dá com a questão da hereditariedade, também aqui nós devemos, antes de tudo, esclarecer algumas regras elementares, alguns conceitos que caracterizam esse significado ou esse papel do meio no desenvolvimento da criança.

Em primeiro lugar, gostaria de colocar algo que já foi observado de maneira superficial: que para compreender corretamente o papel do meio no desenvolvimento da criança é sempre necessário abordá-lo não a partir de, creio ser possível formular dessa maneira, parâmetros absolutos, mas, sim, a partir de parâmetros relativos. Além disso, deve-se considerar o meio não como uma circunstância do desenvolvimento, por encerrar em si certas qualidades ou determinadas características que já propiciam, por si próprias, o desenvolvimento da criança, mas é sempre necessário abordá-lo a partir da perspectiva de qual relação existe entre a criança e o meio em dada etapa do desenvolvimento. Pode-se falar disso como se fala de uma regra geral que frequentemente se repete na pedologia - a de que é necessário migrar dos indicadores absolutos do meio para os indicadores relativos, ou seja, para esses mesmos indicadores, mas tomados no que concernem à criança.

Duas considerações permitem-nos defender essa ideia. A primeira é que o papel de quaisquer elementos do meio se distingue de acordo com as diferentes faixas etárias. Por exemplo: a fala das pessoas ao redor pode perfeitamente ser sempre a mesma tanto quando a criança tem seis meses, como um ano e seis meses e também três anos e seis meses, isto é, a quantidade de palavras que a criança percebe, o caráter da linguagem, no que se refere a seu nível cultural, ao vocabulário, à correção, à erudição de estilo podem permanecer sempre os mesmos, mas qualquer um entende que esse fator, inalterado ao longo do crescimento, possui um significado diferente quando a criança entende a fala, quando ela não a entende em absoluto e quando ela se situa entre ambos os estágios e está apenas começando a entendê-la.

Dessa forma, só se pode elucidar o papel do meio no desenvolvimento da criança quando nós dispomos da relação entre a criança e o meio.

Antes de tudo, o meio, no sentido imediato dessa palavra, modifica-se para a criança a cada faixa etária. Alguns autores dizem que o desenvolvimento da criança consiste na gradativa ampliação de seu meio. A criança que ainda não nasceu dispõe do útero da mãe como meio, já a criança que acaba de vir ao mundo também dispõe de um espaço muito pequeno na qualidade de seu meio mais próximo. Como se sabe, o mundo distante não existe para o recém-nascido. Para tal criança existe apenas o mundo que se refere precisamente a ela, ou seja, um mundo que se une em torno de um espaço estreito, formado por aparecimentos5 5 No russo, iavlienie [ явлени e ], oriundo do verbo iávit, mostrar, manifestar, segundo Voinova (1989). No contexto apresentado por Vigotski, o termo convém ser traduzido por "aparecimento", muito embora em outras acepções também possa ser compreendido como "fenômeno", como na filosofia e objetos ligados ao seu corpo. Aos poucos o mundo distante começa a se ampliar para a criança, mas no começo também se trata de um mundo muito pequeno, o mundo do quarto, o mundo do parque mais próximo, da rua. Com os passeios, seu mundo aumenta e, cada vez mais, novas relações entre a criança e as pessoas que a circundam se tornam possíveis. Depois, o meio se modifica por força da educação, que o torna peculiar para a criança a cada etapa de seu crescimento: na primeira infância, a creche; na idade pré-escolar, o jardim de infância; na escolar, a escola. Cada idade possui seu próprio meio, organizado para a criança de tal maneira que o meio, no sentido puramente exterior dessa palavra, se modifica para a criança a cada mudança de idade.

Mas isso é pouco. Até mesmo quando o meio se mantém quase inalterado, o próprio fator de que a criança se modifica no processo de desenvolvimento conduz à constatação de que o papel e o significado dos elementos do meio, que permaneceram como que inalteráveis, modificam-se, e o mesmo elemento que possui um significado desempenha um papel numa determinada idade, mas dois anos depois começa a possuir outro significado e a desempenhar um outro papel por força das mudanças da criança, isto é, pelo fato de a relação da criança para com aquele elemento do meio ter se modificado.

De forma mais precisa, mais exata, o que nós podemos dizer a respeito dos exemplos que vimos quando discutimos as crianças é que os elementos existentes para determinar a influência do meio no desenvolvimento psicológico, no desenvolvimento de sua personalidade consciente é a vivência. A vivência de uma situação qualquer, a vivência de um componente qualquer do meio determina qual influência essa situação ou esse meio exercerá na criança.

Dessa forma, não é esse ou aquele elemento tomado independentemente da criança, mas, sim, o elemento interpretado pela vivência6 6 O dicionário Psicologia Clínica ( Tvorogov, 2007) define o termo perejivánie [ переживание ] como uma "condição mental, evocada por fortes sensações e impressões. P. não é apenas uma realidade direta à consciência, de seus conteúdos e de suas condições, não é apenas algo experimentado, mas também um trabalho interior, um trabalho mental." Constituído pelo prefixo pere- (através) e - jit' (viver), etimologicamente o termo significa "viver através" de algo. O vocábulo que melhor corresponde a tais acepções, em português, parece-nos "vivência", no sentido daquilo "que se viveu" ou de "conhecimento adquirido no processo de viver ou vivenciar uma situação ou [no processo] de realizar alguma coisa" (Houaiss, 2009) da criança que pode determinar sua influência no decorrer de seu desenvolvimento futuro.

Tomemos um exemplo simples dentre os casos de nossa clínica.

Nós estamos lidando com três crianças trazidas s da mesma família. As circunstâncias7 7 O termo обстановка (leia-se "abstanôvka") indica "condição, circunstância, estado", segundo o Dicionário Uchakov. A acepção de "conjuntura", de "circunstância ou estado em que se encontra determinado processo ou pessoa" é a mais próxima do sentido em russo, nesse contexto. exteriores dessa família são as mesmas para todas as três crianças. Em essência, é uma situação muito simples. A mãe bebe e, pelo visto, sofre de transtornos nervosos e psíquicos por causa disso. As crianças se deparam com uma situação extraordinariamente difícil. A mãe, nos momentos de embriaguez ou nas ocasiões em que está tomada por esse transtorno, tenta atirar um filho pela janela, espanca-os, atira-os no chão. Em suma, as crianças vivem num estado de pavor e medo em relação a ela.

Trouxeram-nos as três crianças. Cada uma delas tem um quadro completamente distinto de disfunção de desenvolvimento devido a uma mesma situação. A mesma circunstância resulta num quadro totalmente diferente nas três crianças.

Na menor, nós encontramos um quadro que, em casos como esse, se apresenta com mais frequência junto às crianças pequenas. Ela reage a isso com uma série de sintomas neuróticos, isto é, sintomas defensivos. Ela está oprimida pelo temor do que está acontecendo. E, como resultado, ela desenvolve medos, desenvolve enurese, gagueira, às vezes ela simplesmente silencia ou perde a voz. Em outras palavras, a criança reage a essa situação com absoluto desespero e total indefensibilidade.

O segundo filho desenvolve um estado extremamente atormentado (cujo exemplo nós vimos quando estudamos uma de nossas crianças), mais precisamente um estado, como se diz, de conflito interno, que se encontra com frequência em situações semelhantes, quando na criança surge uma atitude afetiva8 8 "Relação afetiva" [аффективное отношение]: expressão constituída pela palavra otnochienie (leia-se "atnochiênie") que, de acordo com o dicionário Tolkovo Slovoobrazovátelnoe de T. Efremov, consiste numa "ligação mútua na qual se encontram determinadas substâncias ou atributos; caráter e forma dessa ligação; correlação de quaisquer fenômenos ou elementos." O termo pode ser traduzido de duas formas: tanto "relação", enquanto a "vinculação de alguma ordem entre pessoas, fatos ou coisas; ligação, conexão", como por "atitude", no sentido de "comportamento ditado por disposição interior; maneira de agir em relação a pessoa, objeto, situação etc.; maneira, conduta" (Houaiss, 2009). Embora a palavra seja passível de ambas as traduções, optamos pela segunda, já que contempla a "disposição interior" da criança, sentido muito ligado à vivência individual. contraditória para com a mãe - lembram-se de que já falamos disso, da atitude ambivalente. Por um lado, a mãe é para a criança um objeto de muito Apego9 9 O autor utiliza letra maiúscula. , mas por outro, a mãe é para ela a fonte de diversos tipos de medos, das mais pesadas impressões que ela experimenta. Autores alemães denominam tal complexo afetivo que a criança experimenta Mutter-Hexkomplex10 10 Em alemão, no original. , ou seja, "complexo da mãe-bruxa", que é quando o amor pela mãe e o terror da bruxa se fundem. O segundo filho foi trazido com um conflito patente, com contradições internas que se chocam quanto a uma atitude positiva e negativa para com a mãe, de apego terrível para com ela, bem como ódio terrível, além de um comportamento terrivelmente contraditório. Ele queria ser devolvido prontamente para sua casa e expressava pavor quando falavam desse retorno.

Finalmente, o terceiro, o filho mais velho, apresentou um quadro absolutamente inesperado à primeira vista. Acabamos percebendo que se tratava de uma criança de inteligência curta, bastante tímido, mas que ao mesmo tempo apresentou traços de certa maturidade, seriedade e solicitude precoces. Ele já entendia a situação. Ele já entendia que sua mãe era doente e sentia pena dela. Ele já percebia que as crianças mais novas estavam em perigo quando a mãe se enfurecia. E coube-lhe um papel singular. Ele devia levar a mãe para se deitar, cuidar para que ela não fizesse nada com os pequenos, consolar os menores. Ele simplesmente se tornou o chefe da família, o único que devia cuidar dos demais. Como resultado, todo o percurso de seu desenvolvimento mudou-se severamente. Ele não era um garoto de vivacidade correspondente a sua idade, com interesses reais e simples, em vigorosa atividade. Tratava-se de uma criança que se alterara acentuadamente durante seu desenvolvimento, uma criança de outro tipo.

Quando se toma esse exemplo - e a experiência do pesquisador que se debruça sobre um material concreto está repleta desses exemplos -, então se vê facilmente que uma mesma situação do meio, que uma mesma ocorrência num meio de várias pessoas, surpreendendo-as nos diversos níveis etários, possui uma influência diferente sobre o desenvolvimento de cada uma.

O que determina o modo como as mesmas circunstâncias de um meio exercem três influências diferentes em três crianças diferentes? Isso se explica porque a relação de cada uma delas para com os acontecimentos é diferente. Ou também poderíamos dizer que cada uma dessas crianças vivenciou essa situação de maneiras diferentes. Uma a vivenciou como um terror inconcebível e incompreensível, que a levou a uma condição de incapacidade. A outra a vivenciou de maneira concebível, como o choque entre apego intenso e sentimentos intensos de medo, ódio e hostilidade. E a terceira a vivenciou, até determinado ponto, assim como um garoto de dez ou onze anos pode vivenciá-la - como um infortúnio que recaiu sobre a família e que exige dele colocar tudo de lado para, de alguma forma, tentar minimizar esse infortúnio, ajudando a mãe doente e as crianças. Dessa forma, a situação acaba sendo distinta de acordo com aquilo que três diferentes vivências das mesmas condições suscitaram nas três crianças e ainda de acordo com a influência que tal situação exerceu em seu desenvolvimento.

Com a ajuda desse exemplo eu gostaria apenas de esclarecer a ideia de que se a pedologia, à diferença de outras ciências, estudar não o meio enquanto tal, sem referência à criança, mas sim estudar o papel e a influência do meio ao longo do desenvolvimento infantil, então ela deverá sempre saber encontrar aquele prisma que reflete a influência do meio na criança, isto é, a pedologia deverá saber encontrar a relação existente entre a criança e o meio, a vivência da criança, isto é, de que forma ela toma consciência e concebe, de como ela se relaciona afetivamente para com certo acontecimento. Esse é o prisma que determina o papel e a influência do meio no desenvolvimento do - digamos - caráter da criança, do seu desenvolvimento psicológico e assim por diante.

No que diz respeito a esse exemplo, eu gostaria de chamar a atenção dos senhores para apenas mais um ponto. Caso recordem, quando nós falamos sobre o método de nosso estudo, eu tentei defender a ideia de que, na ciência, a análise que se ocupa de elementos deve ser substituída pela análise que funde unidades num todo complexo. Além disso, dissemos que as unidades representam, à diferença dos elementos, aqueles produtos de análise que não perdem as propriedades inerentes ao conjunto, mas que preservam, de forma primária, essas propriedades próprias do conjunto.

Hoje eu gostaria de, fazendo uso de um objeto concreto de estudo, demonstrar-lhes algumas dessas unidades que a pesquisa psicológica opera. A vivência pode ser um exemplo dessas unidades. A vivência é uma unidade na qual, por um lado, de modo indivisível, o meio, aquilo que se vivencia está representado - a vivência sempre se liga àquilo que está localizado fora da pessoa11 11 Em russo, человек (leia-se "tchilaviék"), que se pode traduzir tanto por "homem" como por "pessoa". - e, por outro lado, está representado como eu vivencio isso, ou seja, todas as particularidades da personalidade e todas as particularidades do meio são apresentadas na vivência, tanto aquilo que é retirado do meio, todos os elementos que possuem relação com dada personalidade, como aquilo que é retirado da personalidade, todos os traços de seu caráter, traços constitutivos que possuem relação com dado acontecimento. Dessa forma, na vivência, nós sempre lidamos com a união indivisível das particularidades da personalidade e das particularidades da situação representada na vivência. Por isso, parece apropriado conduzir de maneira sistemática a análise do papel do meio no desenvolvimento da criança, conduzi-la do ponto de vista das vivências da criança, porque na vivência, como já coloquei, são levadas em conta todas as particularidades que participaram da determinação de sua atitude frente a uma dada situação. Por exemplo, será que todas as minhas peculiaridades constitutivas, dos mais diversos tipos, participam inteiramente e também em bases iguais de todas as situações? Claro que não. Em certa situação, algumas de minhas particularidades constitutivas desempenham papel principal, em outra, outras desempenham o papel principal, enquanto, no primeiro caso, elas podem estar absolutamente ausentes. Para nós é importante saber, não de maneira geral, quais são as peculiaridades da criança, mas é importante saber quais dessas peculiaridades constitutivas desempenharam um papel determinante para definir a atitude da criança frente a uma dada situação, enquanto em outra situação, outras particularidades constitucionais desempenharam seu papel.

Assim, também a vivência nos ajuda a destacar quais são essas particularidades que desempenharam papel para determinar a atitude frente a dada situação. Imaginem que eu, pela minha constituição, sou dotado de certas peculiaridades - é claro que eu vou vivenciar essa situação de uma maneira. Já se sou dotado de outras peculiaridades - claro que vou vivenciá-la de outra maneira. Por isso, fala-se sobre as singularidades constitutivas das pessoas diferenciando as excitáveis, as sociáveis, as animadas, as agitadas das pessoas mais indolentes, refreadas, obtusas. É claro que se nós tivermos em vista duas pessoas de dois padrões constitutivos diferentes, então um mesmo acontecimento suscita vivências distintas em cada uma dessas pessoas. Consequentemente, as singularidades constitutivas da pessoa, de modo geral, as particularidades pessoais da criança, como que se mobilizam sob a forma de uma dada vivência e vão se acumulando para se cristalizarem nessa vivência, mas, ao mesmo tempo, tal vivência consiste não apenas na totalidade dessas particularidades pessoais da criança que, por sua vez, determinam como ela vivenciou esse acontecimento, mas se constitui também nos diferentes acontecimentos vivenciados de diferentes maneiras pela criança. Uma mãe embriagada ou uma mãe psiquicamente doente é o mesmo que uma babá psiquicamente doente, não o mesmo que um pai embriagado ou um vizinho embriagado. Significa que o meio, nesse caso configurado como uma situação concreta, também sempre se encontra representado numa certa vivência. Por isso, nós temos o direito de estudar a vivência como uma unidade de elementos do meio e de elementos da personalidade. E justamente por isso a vivência consiste num conceito que nos permite, na análise das regras do desenvolvimento do caráter, estudar o papel e a influência do meio no desenvolvimento psíquico da criança.

Tomaremos mais um exemplo que também nos ajudará a esclarecer como a pedologia estuda concretamente o papel do meio no desenvolvimento da criança, estudando essas relações que existem entre a criança e o meio que a rodeia. Eu penso que vocês concordam comigo que uma ocorrência qualquer no meio ou uma situação qualquer influenciará a criança de formas diferentes, dependendo de como a criança compreende seu sentido e significado. Por exemplo, imaginem essa situação: morre uma pessoa na família. É claro que a criança que entende o que é a morte irá reagir a isso de uma maneira diferente do que a criança que não entende em absoluto o que ocorreu. Ou então, uma família em que os pais se separam. Nessas famílias, frequentemente nós nos deparamos com isso como um elemento relacionado a crianças difíceis de serem educadas. Mais uma vez, a criança que entende o que ocorre, que entende o significado do que se passa, irá reagir a isso de uma forma diferente da criança que não entende.

De maneira mais reduzida e simples, eu poderia dizer que a influência do meio no desenvolvimento da criança será avaliada juntamente com demais influências, bem como com o nível de compreensão, de tomada de consciência, da apreensão daquilo que ocorre no meio. Se as crianças tomarão consciência disso de formas distintas, então uma mesma ocorrência terá para elas sentidos completamente diferentes. Nós sabemos que, muitas vezes, acontecimentos tristes têm um significado feliz para a criança, porque ela não tem clareza daquilo que se passa, pois ocorre de permitirem a ela algo que comumente não permitem; por exemplo, dão-lhe doces para que ela se cale e não atrapalhe, e assim, a criança concebe uma doença grave da mãe como um acontecimento que lhe é alegre, prazeroso e, quando você vê - ela está se comportando como um aniversariante. Tudo se resume ao fato de que a influência de uma situação ou outra depende não apenas do conteúdo da própria, mas também do quanto a criança entende ou apreende a situação.

Quando nós lidamos com crianças com retardo mental, em particular aquelas com retardo severo, frequentemente estamos certos de que elas não possuem compreensão suficiente e isso muitas vezes as protege e as priva de situações nas quais uma criança normal sofreria severamente. Vocês sabem, é comum a situação em que a criança é disforme. Um caso que há pouco ocorreu em nossa clínica - uma criança tinha uma malformação severa. As demais a provocavam e ela mesma sabia que era muito deformada e falava sobre isso. Para a criança com intelecto normal, essa situação poderia se tornar uma fonte de trauma infinito, porque constantemente e em qualquer lugar, ela se defronta com sua deformidade e com o fato de que ela não é como todas as outras crianças que riem dela, que a provocam, que se colocam acima dela, que se recusam a brincar com ela; a humilhação frequente com a qual ela se depara a leva repetidamente para uma vivência dolorida, para a neurose, para desordens funcionais ou para alguma desordem psicogênica, enfim, desordens que surgem a partir da vivência. Mas, para essa criança da qual estou falando, nada disso acontece. Xingam-na, humilham-na e, de fato, ela se encontra em uma posição excepcionalmente difícil, mas nela isso não tem efeito nenhum, porque ela não é apta a generalizá-la. Hoje, sempre que a provocam, é algo muito desagradável para ela, mas faltam-lhe recursos para generalizar isso, chegar àquilo a que chega qualquer criança normal para que nela surja o sentimento de menos-valia, o sentimento de inferioridade, o sentimento de amor-próprio ferido, porque ela não entende inteiramente o sentido e o significado do que ocorre com ela.

Esse é um exemplo expressivo de como a concepção insuficiente de um acontecimento ou uma situação qualquer junto a crianças com deficiência mental frequentemente protege tais crianças de doenças, de reações patológicas e de distúrbios de crescimento, aos quais outras crianças estão sujeitas.

Então, o que ocorre? No meio há uma situação que levaria uma criança normal a um trauma, a uma desordem. Mas não essa nossa criança. Por quê? Porque a criança não a concebe inteiramente. E isso que eu apresentei na qualidade de exemplo de uma ocorrência patológica, de fato, ocorre em cada uma das idades. Uma mesma situação, se desencadeada quando a criança tem um ano, três, sete anos ou quando tem treze anos, terá um significado totalmente diferente para ela. Um mesmo acontecimento recaindo em crianças com idades diferentes, refletindo-se na sua consciência de modo absolutamente diferente, tem para a criança um significado diferente.

Com relação a isso, nós temos um interesse já conhecido, que se trata de uma concepção bastante complexa, mas muito importante para compreender a influência do meio no desenvolvimento. Tal concepção está ligada ao que constitui o significado de nossa palavra. Vocês sabem, é claro, que nos comunicamos com as pessoas em torno de nós, principalmente, com a ajuda da fala. Esse é um dos recursos fundamentais, com a ajuda do qual a criança possui contato psíquico com as pessoas ao seu redor. A pesquisa da fala mostrou que o significado das palavras para as crianças não coincide com nosso significado da palavra, ou seja, o significado das palavras para crianças em diferentes faixas etárias possui uma construção diferente. Isso eu tentarei esclarecer agora com a ajuda de exemplos.

Perguntemo-nos antes o que é o significado da palavra. Eu creio que vocês concordarão comigo se eu disser que o significado de uma palavra representa sempre, do ponto de vista psicológico, a generalização. Peguemos uma palavra qualquer. Tomemos aquelas palavras como "rua", "pessoa", "clima". Elas se referem não a um objeto único, mas a uma classe conhecida e a um grupo de objetos. O significado de toda palavra sempre consiste na generalização, do ponto de vista psicológico. Creio que isso está compreendido. Essa é nossa primeira colocação.

Nas crianças, essa generalização é construída de maneira diferente do que em nós. Pois a criança não inventa sua própria língua, mas encontra palavras já prontas, asseguradas por coisas prontas, e assimila nossa língua e o significado das palavras das quais é portadora na nossa língua. Então, a criança relaciona essas palavras àqueles mesmos objetos aos quais relacionamos. Quando a criança fala "clima" ou "pessoa", ela tem em vista as mesmas coisas, os mesmos objetos que nós temos em mente, mas ela generaliza tais coisas de outra maneira que nós o fazemos, com a ajuda de outra ação mental. Ela ainda não possui as generalizações superiores que nós chamamos de conceito, de modo que para ela a generalização tem um caráter mais concreto, mais evidente. E dizem que essas generalizações da criança que se encontra nos primeiros estágios de desenvolvimento lembram as que nós temos diante dos sobrenomes. Para nós, o sobrenome também representa não uma única pessoa, mas um grupo de pessoas. Mas como é a generalização desse grupo de pessoas de um mesmo sobrenome? Ela é feita tendo por base a filiação autêntica, não uma relação lógica, como uma certa categoria de pessoas, mas tendo por base o parentesco legítimo entre essas pessoas. Pela pessoa, eu não posso dizer se ela é Petrov ou Ivanov12 12 No caso, o sufixo -ov é marca de sobrenome. . Se eu souber que ela é filho de um Petrov ou Ivanov, isto é, se eu souber sua relação legítima com outras pessoas, eu saberei seu parentesco com relação a esse ou aquele sobrenome. Tal como em nós a generalização de sobrenomes é construída, como mostra a pesquisa, na criança de idade pré-escolar o que se constrói é a generalização de diversos objetos, ou seja, a criança determina com as palavras os mesmos objetos que nós, só que ela os generaliza de forma diferente da nossa, de maneira mais concreta, mais visual, mais factual.

Por força disso, as generalizações da criança são diferentes de nossas generalizações e surge um fato conhecido de todos nós - que a criança concebe a realidade, compreende os acontecimentos que se dão ao redor dela não inteiramente, como nós compreendemos. Nem sempre o adulto pode transmitir à criança toda a plenitude de significado de determinada ocorrência. A criança compreende por partes, não integralmente; compreende um aspecto do assunto, não compreende outro; entende, mas entende à sua maneira, processando, recortando de seu próprio jeito, retirando apenas parte daquilo que lhe explicaram. E dessa forma, como resultado disso, a criança em diversos níveis de desenvolvimento não possui correspondência perfeitamente adequada às ideias de um adulto. O que significa que a criança em diversos níveis de desenvolvimento não generaliza de modo equivalente, e como resultado, ela concebe, imagina a realidade circundante e seu meio ambiente de modo distinto. Consequentemente, o próprio desenvolvimento do pensamento infantil, o próprio desenvolvimento da generalização infantil também se liga à influência do meio sobre a criança.

E então a criança começa a entender melhor dentro de alguns anos. Aquilo que antes ela não entendia, agora entende. Será que, agora, a influência de alguns acontecimentos na família se modificou? Sim. Antes eles poderiam ter sido mais neutros, já agora eles desempenham o papel de elementos básicos do desenvolvimento infantil. Então, o desenvolvimento do pensamento por si próprio, o significado das palavras das crianças determina uma nova relação que pode existir entre o meio e os processos individuais de desenvolvimento.

Se nós quiséssemos generalizar o que foi dito antes, então poderíamos formular deste modo: dizendo que a pedologia estuda, como eu já disse, mais do que o meio enquanto tal, considerando seus indicadores absolutos, também o papel e a influência do meio no desenvolvimento infantil, pois nesse estudo acerca do papel do meio para o desenvolvimento tem significado prioritário a relação entre determinada situação do meio e a criança, e o que essa relação pode revelar com a ajuda de exemplos concretos. Uma mesma situação em família, como eu já comentei, pode exercer três influências diferentes no desenvolvimento das crianças. O meio exerce uma ou outra influência, influência diferente em idades diferentes, porque a própria criança se modifica, assim como se modifica sua relação para com aquela situação. O meio exerce essa influência, como colocamos, pela vivência da criança, ou seja, de acordo com o que a criança elaborou na sua relação interior para com um ou outro elemento, para com essa ou aquela situação no meio. O meio determina um ou outro desenvolvimento, de acordo com o grau de compreensão do meio que a criança possui. E poderíamos ainda enumerar uma série de aspectos que, decididamente, demonstrariam que cada aspecto do desenvolvimento determinará a maneira pela qual o meio influenciará nesse desenvolvimento, isto é, a relação entre o meio e a criança fica sempre no centro e não unicamente o meio, nem unicamente a criança, em separado.

Chegamos à conclusão de que o meio não pode ser analisado por nós como uma condição estática e exterior com relação ao desenvolvimento, mas deve ser compreendido como variável e dinâmico. Então o meio, a situação de alguma forma influencia a criança, norteia o seu desenvolvimento. Mas a criança e seu desenvolvimento se modificam, tornam-se outros. E não apenas a criança se modifica, modifica-se também a atitude do meio para com ela, e esse mesmo meio começa a influenciar a mesma criança de uma nova maneira. Esse é um entender dinâmico e relativo do meio - é o que de mais importante se deve extrair quando se fala sobre o meio na pedologia. Então concordemos que é importante estudar a relação com o meio, concordemos que se a relação é diferente, o meio influencia de maneira diferente. Mas, ainda assim, o mais importante não foi dito: qual é, afinal, o papel principal do meio no que diz respeito ao desenvolvimento da criança. A essa pergunta eu gostaria de responder agora.

Antes de tudo, quando estudamos o meio, mais uma vez nos deparamos com a mesma situação com que nos deparamos quando estudamos a hereditariedade. Se recordam, nós falávamos que não há e não pode haver nenhuma determinação sumária no que concerne à influência da hereditariedade sobre todos os aspectos do desenvolvimento e, ainda, dizíamos que a hereditariedade exige, impreterivelmente, se queremos estudar não as leis da hereditariedade enquanto tais, que basicamente são uniformes, mas a influência da hereditariedade sobre o crescimento, nós devemos tomar a hereditariedade de maneira diferenciada, de acordo com os diversos aspectos do desenvolvimento. Os senhores se lembram quando eu tentava demonstrar resultados de pesquisa com gêmeos que revelam que a hereditariedade não desempenha para as funções psicológicas superiores o mesmo papel que ela desempenha para as funções psicológicas básicas. Na ocasião, afirmei o seguinte: deve-se tomar a hereditariedade de forma diferenciada, de acordo com os diferentes aspectos do desenvolvimento.

No que se refere ao meio, o mesmo também ocorre. Tomemos a influência do meio sobre um processo de desenvolvimento, digamos, o crescimento e o raciocínio lógico da criança. Seria difícil esperar que, além da lei geral, que continua válida, a atitude do meio para com dado aspecto do desenvolvimento influencie tanto o crescimento como o raciocínio lógico da criança. À exceção dessa lei geral, seria difícil esperar que o meio possuísse uma mesma influência e manifestasse essa influência de um mesmo modo no que se refere a todos os aspectos do desenvolvimento. Isso não é verdadeiro. Junto com uma compreensão dinâmica do meio, nós começamos a entender que a relação de diversos aspectos do desenvolvimento para com o meio é diferente. E por isso nós devemos estudar a influência do meio de forma diferenciada, tal como o crescimento da criança, em que se vê a influência do meio sobre o crescimento de partes específicas e sistemas específicos do seu organismo, ou como se dá a influência do meio sobre o crescimento das funções sensório-motoras da criança, ou, ainda, como ocorre a influência do meio sobre o desenvolvimento das funções psicológicas, e assim por diante.

Mais conveniente, quando se deseja formular um estudo sobre o meio, seria tomar, por um lado, não um aspecto estreito qualquer do desenvolvimento, mas sim um aspecto mais ou menos central, essencial do desenvolvimento e, por outro lado, tomar um aspecto do desenvolvimento para com o qual a influência do meio se mostra em máxima plenitude.

Tomemos o desenvolvimento da personalidade da criança, o desenvolvimento da consciência, o desenvolvimento de sua relação para com a realidade circundante e observemos em que consiste o papel específico do meio no desenvolvimento da personalidade da criança, de sua consciência e de sua relação [atitude] para com o meio.

Se tomarmos todas as qualidades da personalidade que são específicas ao homem, qualidades que se formaram num período de desenvolvimento histórico do homem, então nós chegamos a uma conclusão extraordinariamente simples, mais precisamente esta: de que aqui, entre o meio e o desenvolvimento da criança, existem certas relações que são inerentes somente ao desenvolvimento da criança e a mais nenhum outro desenvolvimento.

Em que consistem essas relações específicas entre o meio e o desenvolvimento, se falamos sobre o desenvolvimento da personalidade da criança, sobre as qualidades específicas do homem? A mim me parece que essa particularidade consiste no seguinte: no desenvolvimento da criança, naquilo que deve resultar ao final do desenvolvimento, como resultado do desenvolvimento, e que já está dado pelo meio logo de início. E não somente dado pelo meio logo de início, mas, também, influente nas etapas mais primevas do desenvolvimento da criança. Esclarecerei isso com um exemplo.

Uma criança apenas começou a falar, pronuncia palavras separadamente, como geralmente fazem as crianças que começam a dominar a fala. Mas será que, no meio onde está essa criança, já existe uma fala desenvolvida, que deverá vir à tona somente ao final do desenvolvimento? Existe. A criança fala frases monossilábicas, mas a mãe fala com a criança já com uma linguagem gramatical e sintaticamente formada, com um bom vocabulário, é claro, organicamente relacionado ao bebê, mas, em todos os casos, ela já se comunica utilizando uma forma desenvolvida da fala. Combinemos que essa forma desenvolvida, que deverá aparecer no final do desenvolvimento infantil, será chamada, assim como fazem na pedologia contemporânea, de forma final ou ideal - ideal no sentido de que ela consiste em um modelo daquilo que deve ser obtido ao final do desenvolvimento - ou final - no sentido de que é esta a forma que a criança, ao final de seu desenvolvimento, alcançará. Chamemos a forma da fala da criança de primária, de forma inicial. A maior particularidade do desenvolvimento infantil consiste em se tratar de um desenvolvimento que ocorre em condições de interação com o meio, quando a forma ideal, a forma final, esta que deverá aparecer ao final do desenvolvimento, não somente existe no meio e concerne à criança logo desde o início, mas realmente interage, realmente exerce influência sobre a forma primária, sobre os primeiros passos do desenvolvimento infantil, ou seja, em outras palavras, há algo, algo que deve se construir bem ao final do desenvolvimento, e que, de alguma maneira, influencia logo o início desse desenvolvimento.

O mesmo também ocorre com todas as outras coisas. Como, por exemplo, a noção de quantidade se desenvolve na criança? Como se dá o raciocínio aritmético? A criança, como se sabe, no início, digamos que na idade pré-escolar, ainda possui uma noção muito limitada e obscura de quantidade. Mas essas formas iniciais do raciocínio aritmético infantil se encontram em interação com o raciocínio aritmético já desenvolvido de um adulto, ou seja, novamente, a forma final, que deverá surgir como resultado de todo o desenvolvimento infantil, já está presente logo no início desse desenvolvimento e não apenas está presente, mas de fato norteia, orienta os primeiros passos que a criança dá rumo ao desenvolvimento nesse sentido.

Para que fique claro aos senhores em que grau isso estabelece condições peculiares, exclusivas e únicas, inerentes ao desenvolvimento infantil, eu lhes pergunto o seguinte: os senhores imaginam, por exemplo, como é a evolução biológica?

É possível imaginar que ela teria se realizado porque uma forma ideal, superior, aquela que somente apareceu em virtude do desenvolvimento, já estava presente no período inicial, quando havia apenas as formas inferiores, as mais primárias, e que essas formas se desenvolveram sob a influência direta dessa forma final? Claro que não é possível imaginar nada semelhante. É possível imaginar, no campo do desenvolvimento histórico, uma sociedade em que existisse uma forma primária de economia e de sociedade humana quando já existisse uma forma superior, digamos, a economia e a sociedade comunista, e que essa forma realmente orientasse os primeiros passos do desenvolvimento histórico da humanidade? É impossível imaginar isso.

Com relação ao desenvolvimento humano, será possível imaginar que, ao mesmo tempo em que o homem mais primitivo acabou de surgir na terra, com essa forma inicial, existia uma forma superior final, como o homem do futuro, e que essa forma ideal, de alguma forma, influenciou diretamente os primeiros passos dados pelo homem primitivo? É impossível imaginar isso. Assim, nenhum processo de qualquer tipo de desenvolvimento de que se tem notícia ocorre dessa maneira, na qual, no momento quando a forma inicial está sendo elaborada, já exista uma forma superior, ideal, que surge ao final do desenvolvimento, e que essa forma interaja diretamente com os primeiros passos que a criança dá rumo ao desenvolvimento da forma inicial ou primária. Nisso consiste a maior particularidade do mundo infantil, diferentemente de outros tipos de desenvolvimento, em cujos meios nunca poderemos descobrir nem encontrar conjuntura semelhante.

O que isso significa? Parece-me que, a partir daqui, pode-se concluir algo de grande importância, que pode nos esclarecer objetivamente o papel específico do meio no desenvolvimento da criança. De qual maneira se desenvolve na criança essa forma ideal ou final, digamos, da fala? Nós vimos que a criança domina no início de seu desenvolvimento apenas uma forma primária, ou seja, digamos que no campo da fala ela pronuncia apenas palavras em separado. Mas essas palavras consistem, em parte, no diálogo da criança com a mãe, que já domina a forma ideal, aquela forma que deverá surgir na criança ao final de seu desenvolvimento. Poderia a criança de um ano ou de um ano e meio de vida dominar essa forma ideal, ou seja, simplesmente assimilá-la, simplesmente copiá-la? Não poderia. Poderia a criança dessa idade, apesar disso, movimentar-se do primeiro passo ao segundo progressivamente, de modo a ajustar sua forma primária a essa forma final? Sim, pesquisas indicam que é assim que acontece na realidade.

Isso, consequentemente, denota que o meio desempenha no desenvolvimento da criança, no que se refere ao desenvolvimento da personalidade e de suas características específicas ao homem, o papel de uma fonte de desenvolvimento, ou seja, o meio, nesse caso, desempenha o papel não de circunstância, mas de fonte de desenvolvimento.

O que isso significa? Antes de tudo, isso indica algo muito simples, indica que se no meio não há forma ideal correspondente e o desenvolvimento da criança, por força de quaisquer motivos, toma seu curso sem perpassar essas características específicas, sobre as quais já lhes falei, ou seja, sem interagir com a forma final, então a forma correspondente na criança também não se desenvolve até o fim.

Imaginem uma criança que cresce entre pessoas surdas, entre pais e parentes surdos-mudos. Sua fala irá se desenvolver? Não. E a lalação, irá? Sim. Mesmo em crianças surdas-mudas a lalação se desenvolve. Isso significa que a lalação pertence a um número de funções que está mais ou menos diretamente enraizado nas próprias inclinações hereditárias. Já a fala dessa criança nunca irá se desenvolver. Para que ela se desenvolva é imprescindível que haja no meio essa forma ideal que, interagindo com a forma primária da criança, a conduza rumo ao desenvolvimento da fala.

Então, nesse sentido, deve-se considerar em primeiro lugar que o meio consiste em fonte de todas as propriedades humanas específicas da criança - se não há no meio uma forma ideal correspondente, então, na criança, não se desenvolverá a ação, a propriedade correspondente, a qualidade correspondente.

Em segundo lugar, imaginemos que no meio da criança não haja essa forma ideal, ou seja, que o desenvolvimento da criança não se submeta àquela lei sobre a qual eu acabei de falar, em que falta justamente a forma final para interagir com a forma inicial, mas a criança se desenvolve entre outras crianças, ou seja, num meio composto de coetâneos portadores de uma forma inferior, primária. Nesse caso, a ação correspondente, a ação correspondente na criança, iria se desenvolver? Pesquisas mostram que iriam, mas de forma extraordinariamente singular, isto é, as ações sempre irão se desenvolver de modo muito lento, muito particular e nunca atingirão aquele nível que atingiriam quando existe no meio uma forma ideal correspondente.

Tomemos dois exemplos. Este é o primeiro: tomando uma criança surda-muda, vê-se que o desenvolvimento da fala em crianças surdas-mudas seguirá dois cursos distintos, dependendo se esse surdo-mudo for o único filho da família ou se ele irá se desenvolver com outras crianças surdas-mudas. Pesquisas demonstram que crianças surdas-mudas desenvolvem sua própria fala, a mímica, uma língua de sinais, muito rica e desenvolvida. A criança desenvolve uma outra linguagem, uma linguagem particular. Juntas, em parceria, em sociedade, as crianças constroem essa linguagem. Mas seria possível comparar o desenvolvimento dessa língua de sinais com o desenvolvimento da fala na criança que se desenvolve submetida à interação com a forma ideal? Claro que não. Então, se nós estamos lidando com a ausência de uma forma ideal no meio, então estamos lidando apenas com o fato de que as formas primárias interagem entre si e o desenvolvimento geralmente carrega um caráter extremamente delimitado, condensado, unificado.

Tomemos agora o segundo exemplo. Nós, evidentemente, já ouvimos que as crianças em creches possuem uma série de vantagens, no sentido de sua educação, sobre as crianças educadas apenas em família - já cedo elas se acostumam à independência, aos cuidados consigo próprias, à disciplina. Mas, ao mesmo tempo, há uma série de aspectos desvantajosos ligados à educação em creche, e não em casa, e um deles - que consiste num objeto de preocupações sérias para todos que trabalham com essa idade - é o desenvolvimento tardio da fala. Como regra, em comparação com a criança que passa a primeira infância na creche, a fala se desenvolve antes, melhor e com vocabulário mais rico na criança de mesma idade que é educada em casa. Por quê? Pelo simples motivo de que a criança, em casa, tendo uma mãe ou uma figura que a substitui, digamos, a babá, ouve o tempo todo a fala a ela dirigida, e todo o tempo ela se encontra em processo de interação com a forma ideal da fala. E nas creches, onde há uma educadora para um grupo de crianças, a criança possui muito menos possibilidade de ser diretamente influenciada por essa forma ideal. Mas, ao mesmo tempo, as crianças podem falar umas com as outras. No entanto, elas falam erradamente, falam pouco, de maneira que a conversa entre elas não se torna uma fonte de grande desenvolvimento para elas. Para que o desenvolvimento de suas propriedades humanas específicas possa ocorrer de forma auspiciosa e boa, é obviamente imprescindível que essa forma final ideal guie justamente - se é possível dizer dessa maneira - o desenvolvimento infantil desde o início.

Eis por que, quando a criança cresce em meio a outras crianças, como nas creches, a linguagem se desenvolve mais parcamente. E, se compararmos um material volumoso - tomem crianças de três anos, fisicamente saudáveis, crescidas em condições favoráveis - e confrontarmos os dados de crianças que se desenvolveram em creche e em casa, os senhores verão que, na média, no que diz respeito ao desenvolvimento da linguagem, o grupo domiciliar acabará tendo tais habilidades superiores às do grupo da creche, mas ao mesmo tempo, numa série de outros aspectos, tais como a independência, a disciplina, o cuidado consigo próprio, entre outros, as crianças da creche acabarão tendo essas habilidades significativamente superiores em relação às das crianças educadas em casa.

Há ainda mais um exemplo simples e fictício. Imaginem que uma criança irá desenvolver sua noção de quantidade, seu raciocínio aritmético, sem a escola e o jardim de infância, ou seja, sem a interação com a forma ideal dos adultos, e que as próprias crianças terão apenas a si próprias e que, no meio, não há nenhuma forma desenvolvida de raciocínio aritmético. O que vocês acham: nessas condições, as crianças irão longe com seu raciocínio aritmético? Não, mesmo que haja entre elas crianças muito dotadas. O desenvolvimento delas será sempre extraordinariamente limitado, extraordinariamente estreito.

Então, a partir de todos esses exemplos, nós podemos chegar à conclusão de que, nesses casos, quando por força de motivos externos ou internos, desse ou daquele motivo, se rompe a interação entre a forma final, que existe no meio, e a forma primária, que a criança porta, nesse caso, o desenvolvimento da criança se torna extraordinariamente limitado e ocorre o subdesenvolvimento, maior ou menor, das propriedades correspondentes.

O rompimento dessa interação pode ocorrer por diversas razões. Ou por motivos externos - a criança ouve, mas vive entre pais surdos e que não falam -, ou por motivos internos - ela vive com pais que falam, mas ela própria é surda. Tanto nesse como no outro caso, o resultado é sempre o mesmo - a criança se exclui da interação entre a forma primária e a ideal e todo o desenvolvimento se frustra.

Tal posição, penso eu, a respeito da interação entre a forma ideal e a inicial e esses exemplos que eu mencionei elucidam a ideia que trouxe no início, mais precisamente, a de que o meio desempenha, com relação ao desenvolvimento das propriedades específicas superiores do homem e das formas de ação, o papel de fonte de desenvolvimento, ou seja, a interação com o meio é justamente a fonte a partir da qual essas propriedades surgem na criança. E se essa interação com o meio for rompida, só por força das inclinações encerradas na criança as propriedades correspondentes nunca surgirão por conta própria.

Agora eu gostaria de, em breves palavras, tentar avaliar o significado teórico disso e esclarecer aos senhores essa posição que, por si própria, é suficientemente convincente e clara, se apresentada não do ponto de vista da pedologia, mas do ponto de vista do que nós conhecemos acerca do desenvolvimento e da natureza humanos.

O que significa essa lei que eu acabo de expor aos senhores? Ela significa algo muito simples: que o homem é um ser social, que fora da interação com a sociedade ele nunca desenvolverá em si aquelas qualidades, aquelas propriedades que desenvolveria como resultado do desenvolvimento sistemático de toda a humanidade.

Como a fala se desenvolveu em mim ou nos senhores? Pois não fomos nós que construímos essa fala. A humanidade a construiu ao longo de todo o seu desenvolvimento histórico. Meu desenvolvimento consiste em, no curso de meu desenvolvimento geral, dominar a fala, seguindo as leis históricas do meu desenvolvimento e o processo de interação com a forma ideal. Mas, imaginem que eu seja colocado nessas condições como uma criança surda e que eu mesmo devesse criar uma língua, sem poder tirar proveito dessa forma humana, já elaborada durante o processo de desenvolvimento. Eu não iria longe. Eu construiria uma linguagem das mais primitivas proporções, das mais elementares e medíocres. Isso significa que, realmente, essa condição - na qual o homem é um ser social pela sua própria natureza, na qual seu desenvolvimento consiste em, entre outras coisas, dominar as formas de ação, as formas de consciência que, por sua vez, foram trabalhadas pela humanidade no processo de desenvolvimento histórico - em essência, também está nas bases dessa interação entre a forma ideal e a forma primária.

O meio consiste numa fonte de desenvolvimento dessas propriedades e qualidades humanas específicas e, sobretudo, no sentido de que é justamente no meio que existem, desenvolvidas ao longo da história, tanto essas propriedades como as qualidades humanas, que são inerentes aos homens também por força de sua composição orgânica hereditária, mas existem em cada pessoa, porque essa pessoa é membro de um certo grupo social, é uma certa unidade da história, vive numa determinada época histórica e em determinadas condições históricas. E, consequentemente, no desenvolvimento da criança, essas propriedades e qualidades humanas específicas emergem por diversos caminhos, assim como surgem outras propriedades e qualidades que estão, em maior ou menor grau, diretamente condicionadas ao curso do desenvolvimento histórico do homem precedente. No meio existem essas formas ideais desenvolvidas, elaboradas pela humanidade, aquelas que deverão surgir ao final do desenvolvimento. Essas formas ideais influenciam a criança desde os primeiros passos que ela dá rumo à dominação da forma primária. E, no decorrer de seu desenvolvimento, a criança se apropria, transforma em suas aquisições interiores aquilo que, a princípio, era sua forma de interação externa com o meio.

Quero apenas terminar com a elucidação dessa última lei acerca da influência do meio sobre o desenvolvimento da criança, pois cabe explicar o que eu tenho em mente quando falo sobre o meio enquanto fonte de desenvolvimento. Durante o desenvolvimento da criança (ainda nos deteremos mais nessa questão ao falarmos sobre o desenvolvimento psicológico infantil), uma lei básica se sobressai perante os pesquisadores, a qual eu me permito formular apenas em linhas gerais e explicar com um exemplo.

Essa lei consiste no fato de que as funções psicológicas superiores da criança, as propriedades superiores específicas ao homem, surgem a princípio como formas de comportamento coletivo da criança, como formas de cooperação com outras pessoas, e apenas posteriormente elas se tornam funções interiores individuais da própria criança.

E tomo apenas mais um exemplo que elucidará isso para os senhores. Como sabem, na fase inicial a fala aparece como um meio de contato entre as pessoas. A criança, com a ajuda da fala, dirige-se às pessoas ao redor e as pessoas ao redor conversam com ela. Mas tomem agora cada um de nós. Os senhores sabem que em cada um de nós existe a assim chamada fala interior e que ela, ou melhor, aquilo que nós conseguimos formular em silêncio, para nós próprios, as mensagens das palavras, tem grande importância em nosso raciocínio. Essa importância é tão grande que alguns pesquisadores, na verdade, de maneira incorreta, até identificaram os processos da fala com os processos do raciocínio. Mas, realmente, a fala interna a cada um de nós consiste em uma das funções mais importantes de que nós dispomos. Quando, por força de uma doença qualquer se destrói a fala interna da pessoa, isso resulta na mais profunda desordem de todo o seu raciocínio.

Como surgiu essa fala interna em cada um de nós? Uma pesquisa mostra que a fala interna surge com base na externa. Inicialmente, a fala para a criança consiste num meio de contato entre as pessoas, apresenta-se em sua função social, em seu papel social. Mas, pouco a pouco, a criança aprende a aplicar a fala para servir a si própria, aos seus processos internos. Logo, a fala já se torna não apenas um meio de contato com as pessoas, mas também um meio de raciocínio interior à própria criança. Então, isso já não será aquela fala que pode ser ouvida, que nós empregamos quando nos dirigimos uns aos outros, mas será uma fala interior, calada, muda. Mas, enquanto um meio de raciocínio, a fala surgiu a partir de quê? Da fala enquanto um meio de contato. Da ação exterior que se dava entre a criança e as pessoas ao redor, surgia uma das mais importantes funções interiores, sem as quais o raciocínio da própria pessoa seria impossível. Esse exemplo ilustra essa posição em geral, no que diz respeito à compreensão do meio como uma fonte de desenvolvimento. No meio existe uma forma ideal ou final que interage com a forma primária da criança e, em resultado, uma dada forma de ação se torna uma aquisição interna da criança, torna-se dela própria, torna-se uma função de sua personalidade.

Referências

Dicionário da Língua Russa Uchakov. (1935). Moscou: Editora Estatal das Línguas Nacionais e Estrangeiras.

Houaiss, A. (Ed.). (2009). Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa [versão eletrônica]. Recuperado de http://biblioteca.uol.com.br/

Pequeno Dicionário Enciclopédico de Brockhaus y Efron. (1890). Moscou: Brockhaus e Efron.

Tvorogov, N. D. (Org.). (2007). Psicologia clínica. Moscou: Novyi Disk.

Voinova, N. (1989). Dicionário russo-português. Moscou: Russki Iazik.

Vigotski L. S. (2001). Problema sredi v pedologuii (A questão do meio na pedologia). In L. S. Vigotski, Lektsii po pedologuii (Aulas de pedologia) (pp. 70-91). Ijiévsk: Udmurtskiy Universitiet.

Vigotski, L. S. (1996). Aulas sobre pedologia - 1933-1934. Iviejsk: Ed. da Universidade de Udmursk.

Vygotsky, L. S. (1994). The problem of the environment. In J. Valsiner (Ed.), The Vygotsky reader (T. Prout, trad., pp. 338-354). Oxford-UK: Blackwell.

Recebido: 27/09/2009

Aceito: 26/08/2010

Márcia Pileggi Vinha , Mestre em Língua e Cultura Russa pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. Endereço para correspondência: - derech hashalom 105, B, 06 - Tel Aviv - Israel - 67192.

Max Welcman, Bacharel e licenciado em Letras pela Universidade de São Paulo, Mestre em Teoria e História Literária pela Universidade Estadual de Campinas.

  • 1
    Este trabalho teve como objetivo preservar, da forma mais fiel possível, o sentido do texto no original, evitando assim a possibilidade de uma tradução interpretativa. A elaboração do texto em português envolveu, inicialmente, uma primeira versão direta do russo que, após ser revista e cotejada tanto com o original quanto com a tradução para o inglês, de autoria de Teresa Prout (Vygotsky, 1994), foi submetida à análise criteriosa dos termos escolhidos, resultando nesta versão final. Para justificar determinadas escolhas, inserimos notas de rodapé nas opções que poderiam levantar dúvidas
  • 2
    Tradução revisada por Max Welcman, mestre pelo Instituto de Estudos da Linguagem, UNICAMP
  • 3
    Segundo o
    Pequeno Dicionário
    Enciclopédico Brockhaus e Efron, o termo
    sredá [
    c
    реда ] refere-se tanto ao "meio ambiente em que se dá determinado processo" como ao "ambiente psíquico ou cultural e mental no qual o homem se insere". Essa segunda acepção, que possui um sentido psicológico e cultural, ganhou força na segunda metade do século XVIII, pelos filósofos Moritz Lazarus (1824-1903) e Heymann Steinthal (1823-1899), que o utilizavam como "a totalidade das condições culturais em meio às quais vivem os indivíduos". Em russo, ainda é bastante usada a conotação científica de
    sredá enquanto "meio", no sentido de "conjunto de elementos materiais e circunstanciais que influenciam um organismo vivo" (Houaiss, 2009). Em português, o termo que melhor parece coadunar as acepções é "meio", por aludir tanto à soma de circunstâncias que são objeto de estudo, quanto a um "grupo social, como aquele estabelecido pela família, profissão, classe econômica, contexto geográfico etc., a que pertence uma pessoa" (Houaiss, 2009)
  • 4
    O termo zakón [закон], segundo Brockhaus e Efron, expressa tanto um ato normativo de valor legal, que regula a relação entre os cidadãos, como uma "relação geral e necessária (de ordem e consequência) entre fenômenos" da natureza, mecânicos, físico-químicos, lógicos, psicológicos e morais, sociais e históricos, entre outros. Dessa maneira, o termo pode ser traduzido tanto por "lei" como por "regra", ou até mesmo, "norma", de acordo com o contexto
  • 5
    No russo,
    iavlienie [
    явлени e ], oriundo do verbo
    iávit, mostrar, manifestar, segundo Voinova (1989). No contexto apresentado por Vigotski, o termo convém ser traduzido por "aparecimento", muito embora em outras acepções também possa ser compreendido como "fenômeno", como na filosofia
  • 6
    O dicionário
    Psicologia Clínica ( Tvorogov, 2007) define o termo
    perejivánie [
    переживание ] como uma "condição mental, evocada por fortes sensações e impressões.
    P. não é apenas uma realidade direta à consciência, de seus conteúdos e de suas condições, não é apenas algo experimentado, mas também um trabalho interior, um trabalho mental." Constituído pelo prefixo
    pere- (através) e -
    jit' (viver), etimologicamente o termo significa "viver através" de algo. O vocábulo que melhor corresponde a tais acepções, em português, parece-nos "vivência", no sentido daquilo "que se viveu" ou de "conhecimento adquirido no processo de viver ou vivenciar uma situação ou [no processo] de realizar alguma coisa" (Houaiss, 2009)
  • 7
    O termo обстановка (leia-se "abstanôvka") indica "condição, circunstância, estado", segundo o Dicionário Uchakov. A acepção de "conjuntura", de "circunstância ou estado em que se encontra determinado processo ou pessoa" é a mais próxima do sentido em russo, nesse contexto.
  • 8
    "Relação afetiva" [аффективное отношение]: expressão constituída pela palavra otnochienie (leia-se "atnochiênie") que, de acordo com o dicionário Tolkovo Slovoobrazovátelnoe de T. Efremov, consiste numa "ligação mútua na qual se encontram determinadas substâncias ou atributos; caráter e forma dessa ligação; correlação de quaisquer fenômenos ou elementos." O termo pode ser traduzido de duas formas: tanto "relação", enquanto a "vinculação de alguma ordem entre pessoas, fatos ou coisas; ligação, conexão", como por "atitude", no sentido de "comportamento ditado por disposição interior; maneira de agir em relação a pessoa, objeto, situação etc.; maneira, conduta" (Houaiss, 2009). Embora a palavra seja passível de ambas as traduções, optamos pela segunda, já que contempla a "disposição interior" da criança, sentido muito ligado à vivência individual.
  • 9
    O autor utiliza letra maiúscula.
  • 10
    Em alemão, no original.
  • 11
    Em russo, человек (leia-se "tchilaviék"), que se pode traduzir tanto por "homem" como por "pessoa".
  • 12
    No caso, o sufixo -ov é marca de sobrenome.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      2010
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