Acessibilidade / Reportar erro

Brincar na perspectiva psicoetológica: implicações para pesquisa e prática

Approche psycho-éthologique du jeu: de la recherche à la pratique

El juego desde una perspectiva psicoetológica: implicaciones para la investigación y la práctica

Resumo

Este ensaio trata do brincar a partir da perspectiva psicoetológica e examina implicações para a pesquisa e a prática. Ao longo das últimas décadas, crianças vêm ganhando oportunidades de escolarização e atividades dirigidas por adultos, mas perdendo oportunidades de brincadeira livre autogerenciada. Isto é preocupante, considerando as indicações de modelos animais de que a brincadeira social autogerenciada é importante para o desenvolvimento do cérebro social e da capacidade de autorregulação de emoções. Este estudo representa um convite-justificativa para que as crianças recuperem oportunidades de brincadeira natural das quais vêm sendo privadas. Quanto mais conhecermos sobre o brincar, mais adequados seremos nas oportunidades que poderemos oferecer a elas. Precisamos de mais pesquisa sobre este tema na academia, num ambiente intelectual que facilite a colaboração entre etólogos, psicólogos, educadores e neurocientistas, promovendo interação bidirecional entre teoria e prática.

Palavras-chave:
brincar; cérebro social; desenvolvimento; emoções; natureza

Résumé

Cet article se concentre sur le jeu dans la perspective psycho-éthologique et examine les implications pour la recherche et la pratique. Au cours des dernières décennies, les enfants reçoivent plus de possibilités d‘éducation et activités dirigées par des adultes, mais souffrent d‘un grave déficit de jeu autogéré. Cette situation est particulièrement préoccupante compte tenu des indications de modèles animaux que le jeu social autogéré est très important pour le développement du cerveau social et d‘autorégulation émotionnelle. Ce texte est une invitation/justification pour promouvoir des occasions de jeu naturel pour les enfants. Plus on connaît les fondamentaux de jeu, le plus approprié seront les opportunités que nous pouvons offrir à nos enfants. Nous avons besoin de toute urgence davantage de recherches sur ce sujet, dans un environnement intellectuel qui facilitent les collaborations entre les éthologues, les psychologues, les éducateurs et les neuroscientifiques, et la promotion d‘une interaction bidirectionnelle entre la théorie et la pratique.

Mots-clés:
jouer; cerveau social; développement; émotion; nature

Resumen

Este ensayo trata del juego desde el punto de vista psicoetológico y examina implicaciones para la investigación y la práctica. A lo largo de las últimas décadas, los niños han recibido oportunidades de escolarización y actividades dirigidas por adultos, pero han perdido oportunidades para el juego libre y autogestionado. Lo que resulta preocupante, teniendo en cuenta las sugerencias de los modelos animales de que el juego social autogestionado es importante para el desarrollo del cerebro social y de la capacidad de autorregulación emocional. Este artículo es una invitación/justificación para que los niños recuperen oportunidades para el juego natural del que han sido privados. Cuánto más sepamos acerca del juego, más éxito tendremos. Necesitamos más investigación sobre este tema en la academia, en un ambiente intelectual que facilite la colaboración entre los etólogos, psicólogos, educadores y neurocientíficos, para promover una interacción bidireccional entre la teoría y la práctica.

Palabras clave:
juego; cerebro social; desarrollo; emociones; naturaleza

Abstract

This study focuses on play from a psychoethological perspective and examines the implications for research and practice. Over the past decades, children are provided with more educational opportunities and more access to adult-led activities, albeit suffering a severe lack of self-directed play. This fact is worrying when we consider the indications in animal models that self-directed play is important for the development of the social brain and emotional self-regulation. This essay represents an invitation-justification for children to recover opportunities for natural play, of which they have been deprived. The more we know about play, the more suitable the opportunities we can offer them will be. We need to conduct further research on this topic, in an intellectual environment that enables collaboration between ethologists, psychologists, educators, and neuroscientists, promoting a bidirectional interaction between theory and practice.

Keywords:
playing; social brain; development; emotion; nature

Introdução

Este ensaio trata do brincar a partir da perspectiva psicoetológica e examina as implicações desta abordagem para pesquisa e prática relativas a um tema que considero negligenciado na área acadêmica. O termo “abordagem psicoetológica” foi cunhado por Walter Hugo de Andrade Cunha, pioneiro da etologia no Brasil (Cunha, 1965Cunha, W. H. D. A. (1965). Convite justificativa para o estudo naturalístico do comportamento animal. Jornal Brasileiro de Psicologia, 1(2), 37-57., 2004Cunha, W. H. D. A. (2004). Sobre as respostas de pânico de formigas diante de uma coespecífica esmagada: contribuição para uma psicoetologia do medo. Revista de Etologia, 6(2), 133-140.) e difundido pelos que seguiram sua proposta inspiradora (Arcieri, 1995Arcieri, J. B. C. (1995). As práticas da neonatologia sob o enfoque psicoetológico das relações pais-bebê. Pediatria, 17(4), 170-173.; Ardans, 1996Ardans, O. (1996). A perspectiva etológica do estudo do comportamento. Psicologia Revista, (2).; Ades, 1998Ades, C. (1998). Psicoetologia do cuidado paterno. In M. J. R. P. Costa & V. U. Crornberg, Comportamento materno em mamíferos: bases teóricas e aplicações dos ruminantes domésticos (pp. 31-51). São Paulo: Sociedade Brasileira de Etologia.; Lencastre, 2010Lencastre, M. P. A. (2010). Etologia e psicologia evolutiva: perspectivas evolutivas para a psicologia clínica. Psychologica, 1(52), 149-192.; Lucena & Pedrosa, 2014Lucena, J. M. F. D., & Pedrosa, M. I. (2014). Stability and change in the construction of shared routines in playgroups. Psicologia: Reflexão e Crítica, 27(3), 556-563.). Lencastre (2010) destaca que a psicoetologia consiste na busca de conciliação do estudo biológico do comportamento com a atividade psicológica. Ades (1986, 1987) via a psicoetologia como abordagem integrada aos processos comportamentais básicos, aproximando a etologia (e a ecologia comportamental) da psicologia experimental, que se desenvolveram historicamente por caminhos apartados, tendo essa abordagem os seguintes pontos programáticos: escolha de comportamentos ecologicamente relevantes (sistemas funcionais) como foco inicial de análise; aprendizagem como fenômeno adaptativo a ocorrer dentro de sistemas funcionais; estudo das diferenças interespecíficas dentro de um quadro ecológico de referência; e papel complementar de estudos de campo e de laboratório numa heurística recíproca. Fundamentada nesta abordagem, concordando com Ades (1986Ades, C. (1986). Uma perspectiva psicoetológica para o estudo do comportamento animal. Boletim de Psicologia, 36(85), 20-30., 1987Ades, C. (1987). Notas para uma análise psicoetológica da aprendizagem. Boletim de Psicologia, 37(86), 24-35.) sobre suas vantagens enquanto geradora de pesquisa e fonte de subsídios para uma teoria geral do comportamento animal, e inspirada no manifesto da etologia brasileira (Cunha, 1965), apresento um convite-justificativa para o estudo do comportamento de brincar.

A razão da etóloga, fascinada pela observação do comportamento

Por que convidar a estudar o comportamento de brincar dos animais? A resposta mais simples que poderia dar é o fascínio pela observação do comportamento espontâneo, livre de limites artificiais. É divertido observar e pensar sobre o comportamento. É instigante ler relatos de observações naturalísticas que muitas vezes prosseguem durante vários anos. Escolhi dois exemplos para convidar os leitores a pensar no assunto com base em relatos de observações feitas por etólogos: brincadeira de galho e brincadeira com pedregulhos.

O primeiro exemplo foi extraído de um artigo de Kahlenberg e Wrangham (2010Kahlenberg, S. M., & Wrangham, R. W. (2010). Sex differences in chimpanzees’ use of sticks as play objects resemble those of children. Current Biology, 20(24), R1067-R1068.), tomando como ponto de partida a questão: “chimpanzés usam galhos como se fossem bonecas?”. Neste estudo, ao longo de catorze anos de observação do comportamento de chimpanzés no Parque Nacional de Kibale, em Uganda, foram reunidos mais de cem episódios de carregar galhos como se fossem “bonecas”. É interessante notar que este comportamento não foi observado em outras comunidades, levantando a possibilidade que os chimpanzés estejam copiando uma tradição comportamental local. Alguns episódios eram breves e duravam apenas alguns minutos, mas outros eram longos, chegavam a durar mais de uma hora. Os pedaços de galhos escolhidos para carregar eram diferentes - maiores e mais largos - que os pedaços estreitos e finos usados como instrumentos, em contexto de forrageamento, na pescaria de térmitas. Observações qualitativas a ser apresentadas: alguns juvenis carregavam galhos para o ninho e dormiam com eles e, numa ocasião, foi observada construção de um ninho separado para o galho. Kakama (8 anos), deslocando-se com sua mãe grávida, pegou um pedaço de galho e o carregou por horas, tratando-o como se fosse um bebê (fez um ninho e colocou o galho nele). Quatro meses depois, dois assistentes de pesquisa, que não conheciam o incidente, observaram comportamento semelhante do mesmo indivíduo, que coletou outro pedaço de galho, que foi chamado de o “bebê de brinquedo de Kakama”. Em outra oportunidade, a chimpanzé foi observada carregando um galho, inclusive batendo nele como se estivesse “batendo nas costas de um bebê”, enquanto sua mãe carregava seu irmão doente. Os pesquisadores observaram também filhotes brincando de uma versão de “avião”, deitados de costas com seu galho, balançando-o com os braços levantados. Mães fazem esta brincadeira com filhotes.

O segundo exemplo foi extraído de um conjunto de artigos de Michael Huffman (Huffman, 1984Huffman, M. A. (1984). Stone-play of Macaca fuscata in Arashiyama B troop: transmission of a non-adaptive behavior. Journal of Human Evolution, 13(8), 725-735.; Huffman & Quiatt, 1986Huffman, M. A., & Quiatt D. (1986). Stone handling by Japanese macaques (Macaca fuscata): implications for tool use of stones. Primates, 27(4), 413-423.; Nahallage & Huffman, 2007Nahallage, C. A., & Huffman, M. A. (2007). Age-specific functions of stone handling, a solitary-object play behavior, in Japanese macaques (Macaca fuscata). American Journal of Primatology, 69(3), 267-281., 2012Nahallage, C. A., & Huffman, M. A. (2012). Stone handling behavior in rhesus macaques (Macaca mulatta), a behavioral propensity for solitary object play shared with Japanese macaques. Primates, 53(1), 71-78.) sobre brincadeira com pedregulhos em quatro grupos de Macaca fuscata em cativeiro e em onze grupos provisionados em vida livre. Essa forma de brincadeira consiste em manipulação repetitiva de pedregulhos: espalhar e reunir, rolar de uma mão para outra, bater um pedregulho no outro produzindo som, bater contra o substrato, esfregar, jogar, colocar na água, lavar na água, envolver com folhas, catar outro indivíduo com pedregulho, correr e atirar. Alguns episódios eram breves (menos de um minuto), mas outros eram longos (vinte minutos). O comportamento foi observado pela primeira vez em Arashiyama, Japão, como inovação de uma fêmea juvenil, que então se espalhou para outros jovens e filhotes do grupo. A difusão do comportamento foi observada ao longo de 25 anos, à medida que os indivíduos se tornaram adultos e tiveram seus próprios filhotes.

Estes são apenas dois exemplos para introduzir o assunto e convidar os leitores a refletir sobre o comportamento de brincar dos animais, sobre porque estudá-lo e sobre o possível valor de uma abordagem comparativa.

Ciência “Dura” versus Ciência “Leve”: Desqualificação do brincar como um tema de pesquisa pelo homem “sério”

Embora etólogos estudem o brincar e suas conclusões sejam sistematizadas em vários livros (Bateson & Martin, 2013Bateson, P., & Martin, P. (2013). Play, playfulness, creativity and innovation. Cambridge University Press.; Bekoff & Byers, 1998Bekoff, M., & Byers, J. A. (Eds.). (1998). Animal play: evolutionary, comparative, and ecological perspectives. Cambridge: Cambridge University Press.; Burghardt, 2005Burghardt, G. M. (2005). The genesis of animal play: testing the limits. Cambidge, MA: Mit Press.; Pellegrini & Smith, 2005Pellegrini, A. D., & Smith, P. K. (Eds.). (2005). The nature of play: great apes and humans. New York: Guilford Press.) e artigos de revisão (Burghardt, 2010Burghardt, G. M. (2010). The comparative reach of play and brain: perspective, evidence, and implications. American Journal of Play, 2(3), 338-356.; Graham & Burghardt, 2010Graham, K. L., & Burghardt, G. M. (2010). Current perspectives on the biological study of play: signs of progress. The Quarterly Review of Biology, 85(4), 393-418.), comparativamente constata-se negligência deste tema de estudo em relação a outros em obras de referência na área. Apesar da universalidade do brincar nos animais e no homem, observada em crianças em diferentes culturas (Gosso, Otta, Morais, Ribeiro & Bussab, 2005Gosso, Y., Otta, E., Morais, M. L. S., Ribeiro, F. L., & Bussab, V. S. R. (2005). Play in hunter-gatherer society. In A. D. Pellegrini & P. K. Smith (Eds.), The nature of play: great apes and humans (Cap. 11, pp. 213-253). New York: The Guilford Press.; Meirelles, 2007Meirelles, R. (2007). Giramundo e outros brinquedos e brincadeiras dos meninos do Brasil. São Paulo: Terceiro Nome.), há quem considere o ato como atividade frívola e até prejudicial. Uma revisão dessas representações pode ser encontrada em Burghardt (2005), que, em seu livro, cita como exemplo de interpretações negativas do brincar a perda de tempo, que pode ter como consequência negligenciar estudo e trabalho e até levar à delinquência, ao jogo e ao crime.

Em relação ao comportamento animal, constata-se que livros-texto como o clássico Animal Behavior de John Alcock (2013Alcock, J. (2013). Animal behavior: an evolutionary approach. Massachusetts: Sinauer Associates.), que se encontra em sua décima edição, não incluem capítulos sobre brincadeira, embora discorram sobre desenvolvimento. Uma razão para a relativa negligência da brincadeira na academia é a aparente falta de seriedade do comportamento, nas suas manifestações proximais ou na sua função. Talvez os cientistas, incluindo etólogos, psicólogos evolucionistas e neurocientistas, vejam a brincadeira como assunto não sério e, portanto, não importante para estudo.

O renomado neurocientista Jaak Panksepp, que cunhou o termo “neurociência afetiva” em 1992, comenta a reação da audiência a uma apresentação do seu trabalho sobre brincadeira em ratos e vocalizações ultrassônicas exibidas em contexto lúdico (Panksepp, Siviy, & Normansell, 1985Panksepp, J., Siviy, S., & Normansell, L. (1985). The psychobiology of play: theoretical and methodological perspectives. Neuroscience & Biobehavioral Reviews, 8(4), 465-492.; Panksepp & Burgdorf, 2003Panksepp, J., & Burgdorf, J. (2003). “Laughing” rats and the evolutionary antecedents of human joy? Physiology & Behavior, 79(3), 533-547.; Panksepp, 2007b):

Quando apresentei pela primeira vez nosso trabalho sobre “riso” em ratos . . . num simpósio do National Institute of Mental Health (NIMH) em 1998, . . . não houve uma única pergunta de uma gélida audiência de neurobehavioristas. Um dos organizadores do evento me puxou para um lado depois da minha sessão e, em síntese, disse “Essa pesquisa é maravilhosa. Poderia fornecer um modelo simplificado para emoções positivas, assim como o condicionamento clássico de imobilização e intensificação de sobressalto é usado para estudar medo… mas, por favor, não chame de riso.” Repliquei, “Sim, eu poderia fazer isto, mas então estaria mentindo, porque acredito que esta resposta pode ser a fonte ancestral do riso infantil.” É uma pena quando cientistas dedicados são desencorajados a considerar as dimensões afetivas de funções cerebrais no seu estudo do comportamento animal e são fortemente encorajados a restringir suas discussões a mera descrições comportamentais e terminologias da teoria de aprendizagem. (Panksepp, 2005Panksepp, J. (2005). Affective consciousness: core emotional feelings in animals and humans. Consciousness and cognition, 14(1), 30-80., p. 67)

Entrei em contato em 1998, e passei a rever e acompanhar deste então (por exemplo, Panksepp, 1992Panksepp, J. (1992). A critical role for “Affective Neuroscience” in resolving what is basic about basic emotions. Psychological Review, 99(3), 554-560., 1998; Panksepp & Biven, 2012Panksepp, J., & Biven, L. (2012). The Archaeology of mind: neuroevolutionary origins of human emotion. New York: W. W. Norton & Company.) o trabalho de Jaak Panksepp, professor emérito do Departamento de Psicologia da Bowling Green State University e da Washington State University. Li com muito interesse o livro Affective Neuroscience: The Foundations of Human and Animal Emotions, que usamos na disciplina Motivação e Emoção, que ministrei durante mais de trinta anos em conjunto com César Ades no curso de graduação em Psicologia do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, na medida em que vem ao encontro da abordagem psicoetológica que nos norteia. Lembro-me das conversas com César (Otta, 2012Otta, E. (2012). In Memory of César Ades (1943-2012): the legacy of psycho-ethology. Revista de Etologia, 11(1), 3-10., 2015Otta, E. (2015). Reflections on a footnote: implications for the study of emotions in animals. Psicologia USP, 26(2), 286-295.) sobre as pesquisas mostrando que ratos “dão risada” - emitem vocalizações ultrassônicas de 50 kHz, rápidas (<0,3 s), que o ouvido humano não é capaz de identificar, mas que podem ser registradas por meio de equipamentos e submetidas à análise sonográfica - em circunstâncias afetivas positivas como brincadeira (Burgdorf & Panksepp, 2001Burgdorf, J., & Panksepp, J. (2001). Tickling induces reward in adolescent rats. Physiology & behavior, 72(1), 167-173.; Burgdorf; Burgdorf, Kroes, Moskal, Pfaus, Brudzynski, & Panksepp, 2008Burgdorf, J., Kroes, R. A., Moskal, J. R., Pfaus, J. G., Brudzynski, S. M., & Panksepp, J. (2008). Ultrasonic vocalizations of rats (Rattus norvegicus) during mating, play, and aggression: behavioral concomitants, relationship to reward, and self-administration of playback. Journal of Comparative Psychology, 122(4), 357-367.; Knutson, Burgdorf, & Panksepp, 1998Knutson, B., Burgdorf, J., & Panksepp, J. (1998). Anticipation of play elicits high-frequency ultrasonic vocalizations in young rats. Journal of Comparative Psychology, 112(1), 65-73.; Brudzynski & Pniak, 2002Brudzynski, S. M., & Pniak, A. (2002). Social contacts and production of 50-kHz short ultrasonic calls in adult rats. Journal of Comparative Psychology, 116(1), 73-82.), acasalamento (Burgdorf et al., 2008), em resposta a drogas de abuso, como anfetamina (Burgdorf, Knutson, Panksepp, & Ikemoto, 2001Burgdorf, J., Knutson, B., Panksepp, J., & Ikemoto, S. (2001). Nucleus accumbens amphetamine microinjections unconditionally elicit 50-kHz ultrasonic vocalizations in rats. Behavioral Neuroscience, 115(4), 940-944.; Thompson, Leonard, & Brudzynski, 2006Thompson B., Leonard K. C., & Brudzynski, S. B. (2006). Amphetamine-induced 50 kHz calls from rat nucleus accumbens: a quantitative mapping study and acoustic analysis. Behavior and Brain Research, 168(1), 64-73.) e antecipação de recompensas (Burgdorf, Knutson, & Panksepp, 2000Burgdorf, J., Knutson, B., & Panksepp J. (2000). Anticipation of rewarding electrical brain stimulation evokes ultrasonic vocalization in rats. Behavioral Neuroscience, 114(2), 320-327.). E também choramingam - emitem vocalizações ultrassônicas de 22 kHz, longas (>0,3 s), - em circunstâncias afetivas negativas, como encontro com um predador (Blanchard, Blanchard, Agullana, & Weiss, 1991Blanchard, R. J, Blanchard, D. C., Agullana, R., & Weiss S. M. (1991). Twenty-two kHz alarm cries to presentation of a predator, by laboratory rats living in visible burrow systems. Physiology and Behavior, 50(5), 967-972.), derrota por um conspecífico (Thomas, Takahashi, & Barfield, 1983Thomas, D. A., Takahashi, L. K, & Barfield, R. J. (1983). Analysis of ultrasonic vocalizations emitted by intruders during aggressive encounters among rats (Rattus norvegicus). Journal of Comparative Psychology, 97(3), 201-206.), durante a retirada de drogas como álcool, benzodiazepínicos, opiáceos e psicoestimulantes (Covington & Miczek, 2003Covington, H. E. III, & Miczek, K. A. (2003). Vocalizations during withdrawal from opiates and cocaine: possible expressions of affective distress. European Journal of Pharmacology, 467(1-3), 1-13.; Vivian et al., 1994Vivian, J. A., Farrell, W. J., Sapperstein, S. B., & Miczek, K. A. (1994). Diazepam withdrawal: effects of diazepam and gepirone on acoustic startle-induced 22 kHz ultrasonic vocalizations. Psychopharmacology, 114(1), 101-108.) e antecipação de estimulação aversiva (Choi & Brown, 2003Choi, J. S., & Brown, T. H. (2003). Central amygdala lesions block ultrasonic vocalization and freezing as conditional but not unconditional responses. Journal of Neuroscience, 23(25), 8713-8721.; Lee, Choi, Brown, & Kim, 2001Lee, H. J., Choi, J. S., Brown, T. H., & Kim, J. J. (2001). Amygdalar NMDA receptors are critical for the expression of multiple conditioned fear responses. Journal of Neuroscience, 21(11), 4116-4124.). As vocalizações ultrassônicas de 50 kHz expressam estado positivo, apetitivo e servem como sinais sociais afiliativos, enquanto as vocalizações ultrasônicas de 22 kHz expressam estado negativo, aversivo, e servem como sinal de alarme. Tendo a possibilidade, ratos se autoadministram playback de vocalizações de 50 kHz e evitam playback de vocalizações de 22 kHz (Burgdorf et al., 2008). Parsana e Brown (2012Parsana, A. J., Li, N., & Brown, T. H. (2012). Positive and negative ultrasonic social signals elicit opposing firing patterns in rat amygdala. Behavioural Brain Research, 226(1), 77-86.) mostraram que vocalizações ultrassônicas de 22 kHz e 50 kHz estão associadas a respostas comportamentais opostas e à ativação ou desativação da amígdala.

Brincar como um tema de pesquisa à luz dos porquês da etologia: adição de um quinto nível de análise

Lembro que, além de ser um etólogo renomado, César Ades gostava de brincar. No Centro de Memória do IPUSP, hoje Museu de Psicologia, guardamos várias fotografias do professor (Figura 1), que trazia seu espírito lúdico para a sala de aula e para todas as suas atividades. Exploração e brincadeira foram temas de suas aulas e pesquisas (Ades, 2000Ades, C. (2000). Os bichos também brincam. Ciência Hoje das Crianças, 13(100), 17-19., 2012Ades, C. (2012). Notas sobre o brincar. TransFormações em Psicologia (Online), 4(1SPE), 65-77.; Gomide & Ades, 1989Gomide, P. I. C., & Ades, C. (1989). Effects of reward and familiarity of reward agent on spontaneous play in preschoolers: a field study. Psychological Reports, 65(2), 427-434.). Nas fotografias a seguir, Ades aparece dando uma entrevista no seu escritório, num congresso científico, e também, numa semana de calouros dos alunos do curso de graduação em psicologia da USP, com o boneco símbolo da Atlética e durante uma corrida de saco.

Figura 1
Lembranças de César Ades, professor, pesquisador e parceiro de brincadeira

Tendo o modelo de César, foi com surpresa que entrei em contato com a recomendação “Não sorria até o Natal!” (Ryan, 1972Ryan, K. (Ed.). (1972). Don’t smile until Christmas: accounts of the first year of teaching. Illinois: University of Chicago Press.). Professores deveriam começar o ano letivo com expressão grave e pouco convidativa à interação próxima, com o objetivo de manter a disciplina em sala de aula. Com César aprendi que, ao contrário, é possível sorrir e rir em sala de aula e também aprendi que brincar é tema digno de investigação na academia. Penso que incentivou também alguns dos meus colegas que estudaram a brincadeira de macacos-prego (Resende & Ottoni, 2002Resende, B. D., & Ottoni, E. B. (2002). Brincadeira e aprendizagem do uso de ferramentas em macacos-prego (Cebus apella). Estudos de psicologia, 7(1), 173-180.), de golfinhos (Spinelli, Nascimento, & Yamamoto, 2002Spinelli, L. H. P., Nascimento, L. F., & Yamamoto, M. E. (2002). Identificação e descrição da brincadeira em uma espécie pouco estudada, o boto cinza (Sotalia fluviatilis), em seu ambiente natural. Estudos de Psicologia, 7(1), 165-171.), de ratos e hamsters (Vieira & Sartorio, 2002Vieira, M. L., & Sartorio, R. (2002). Análise motivacional, causal e funcional da brincadeira em duas espécies de roedores. Estudos de Psicologia, 7(1), 189-196.) e de biguás e socozinhos (Sazima, 2008Sazima, I. (2008). Playful birds: cormorants and herons play with objects and practice their skills. Biota Neotropica, 8(2), 259-264.). No entanto, ainda há poucos estudos de comportamento animal sobre brincadeira no Brasil, que não é tópico usual em cursos de comportamento animal nem em congressos da área. Trata-se de um tema a ser (re)descoberto!

Em pesquisa realizada com Paula Gomide, César mostrou que atividades tenderão a ser percebidas com maior probabilidade como brincadeira do que como trabalho se crianças se engajarem voluntariamente. Se pré-escolares receberem recompensas por brincar com brinquedos no playground, passarão menos tempo engajadas nestas atividades do que se a única motivação for o prazer intrínseco da atividade (Gomide & Ades, 1989). Paradoxalmente, a disposição para brincar é reduzida por recompensas externas, se a criança escolher livremente, seu engajamento com a atividade aumenta, especialmente se a sua habilidade numa tarefa desafiadora melhorar com a prática (Bateson, 2005Bateson, P. (2005) The role of play in the evolution of great apes and humans (2005). Play in hunter-gatherer society. In A. D. Pellegrini & P. K. Smith (Eds.), The nature of play: great apes and humans (Cap. 11, pp. 13-253). New York: The Guilford Press.; Deci & Ryan, 1980Deci, E. L., & Ryan, R. M. (1980). The empirical exploration of intrinsic motivational processes. Advances in Experimental Social Psychology, 13, 39-80.).

Segundo Spinka, Newberry e Bekoff (2001Spinka, M., Newberry, R. C., & Bekoff, M. (2001). Mammalian play: training for the unexpected. Quarterly Review of Biology, 76(2), 141-168.), o comportamento lúdico permite aos animais desenvolverem respostas motoras e emocionais a eventos inesperados em que experimentam perda repentina de controle, tornando-se mais versáteis. Para obter “treino para o inesperado”, sugerem que os animais buscam ativamente e criam situações inesperadas na brincadeira por meio de autoincapacitação;1 1 self-handicapping. isto é, colocam-se ativamente em posições e situações desvantajosas. A brincadeira é formada por sequências em que os envolvidos alternam rapidamente entre movimentos bem controlados, como os usados no comportamento “sério”, e movimentos que resultam na perda temporária de controle. Esta alternância entre ter controle e perdê-lo, que caracteriza a autoincapacitação, gera demandas cognitivas e estado emocional complexo chamado por Spinka, Newberry e Bekoff (2001) de “divertir-se”.2 2 having fun. Evidentemente esta é uma inferência de estado emocional indicada pelo uso de aspas. Os leitores interessados podem encontrar discussão sobre inferências de estados afetivos a partir de observações comportamentais que incluem propostas de substituição de antroponegação por antropomorfismo crítico (Bekoff, 2006Bekoff, M. (2006). Animal emotions and animal sentience and why they matter: blending “science sense” with common sense, compassion and heart (pp. 27-40). London: Earthscan.; Burghardt, 2005Burghardt, G. M. (2005). The genesis of animal play: testing the limits. Cambidge, MA: Mit Press.; Waal, 1997Waal, F. B. M. (1997). Are we in anthropodenial? Discover, 18(7), 50-53., 1999Waal, F. B. M. (1999). Anthropomorphism and anthropodenial: consistency in our thinking about humans and other animals. Philosophical Topics, 27(1), 255-280., 2011Waal, F. B. M. (2011). What is an animal emotion? Annals of the New York Academy of Sciences, 1224(1), 191-206.; Panksepp, 2011Panksepp, J. (2011). Cross-species affective neuroscience decoding of the primal affective experiences of humans and related animals. PLoS One, 6(9), e21236.).

Os porquês da Etologia podem ser formulados em relação ao brincar norteando a pesquisa, com a proposta mais recente de adição de um quinto nível de análise (Burghard, 2005), além dos quatro porquês originalmente formulados por Tinbergen (1963Tinbergen, N. (1963). On aims and methods of ethology. Zeitschrift für Tierpsychologie, 20, 410-433.): causa (quais são os processos internos e externos que levam ao desempenho de comportamento lúdico?); ontogênese (como o brincar se desenvolve durante a vida do indivíduo?); função adaptativa (quais são as consequências da brincadeira para um animal?); e filogênese (como a brincadeira evoluiu da não brincadeira e qual foi sua história evolutiva?). Um quinto nível de análise (Tabela 1) foi acrescentado por Burghard (2005):

Tinbergen deixou de lado um grupo de fenômenos dos seus quatro porquês: os aspectos emocionais, vivenciais ou fenomenológicos do comportamento. Ele fez isto em virtude . . . do Zeitgeist behaviorista na psicologia acadêmica americana e européia . . . A negação de fatores subjetivos não teve um efeito negativo sobre a maior parte da pesquisa etológica e provavelmente foi salutar: havia tanta pesquisa básica a ser feita. No que diz respeito à descrição e análise da diversidade de padrões comportamentais envolvidos no cortejamento, predação e organização social. Uma consequência, contudo, foi assegurar que o brincar continuasse sendo um assunto em larga medida negligenciado por pesquisadores que queriam ser considerados cientistas “duros” em vez de cientistas “leves”. A fim de corrigir a omissão da “experiência privada” no estudo do comportamento, acrescentei um quinto porquê para complementar os quatro porquês de Tinbergen . . . . Não vou repetir aqui as razões para isso, mas novos métodos, incluindo imageamento cerebral, neuroendocrinologia, neuroquímica e farmacologia . . . tem levado a uma maior necessidade de incorporar estas questões na etologia e na psicologia. (pp. 13-14)

Tabela 1
Cinco níveis de análise da etologia aplicados ao brincar

Burghardt (2005Burghardt, G. M. (2005). The genesis of animal play: testing the limits. Cambidge, MA: Mit Press.) propõe cinco critérios para caracterizar o brincar: funcionalidade incompleta - o comportamento não é completamente funcional na forma ou no contexto em que se expressa, incluindo elementos que não contribuem para a sobrevivência atual (de fato é difícil visualizar funcionalidade quando se observa um indivíduo de Macaca fuscata que gasta vinte minutos espalhando e juntando pedregulhos) (Huffman, 1984Huffman, M. A. (1984). Stone-play of Macaca fuscata in Arashiyama B troop: transmission of a non-adaptive behavior. Journal of Human Evolution, 13(8), 725-735.); estado motivacional - o comportamento é espontâneo, voluntário, prazeroso, recompensador por si mesmo e autotélico; o brincar difere das expressões estritamente funcionais de comportamento - é estruturalmente ou temporalmente diferente dos comportamentos sérios relacionados: incompleto (com os elementos finais inibidos ou ausentes), exagerado, desajeitado, precoce. Ou seja, envolve comportamentos modificados quanto à forma, à sequência ou ao alvo, considerando-se suas contrapartidas sérias; o comportamento é repetido - é realizado repetidamente, de forma semelhante, mas não rigidamente estereotipado, durante pelo menos parte do período de vida do animal; e campo motivacional - o comportamento é iniciado quando o animal está num “campo relaxado”, por exemplo, quando não está sob estresse de perigo físico, doença, condições meteorológicas adversas, instabilidade social ou sistemas competitivos intensos (como medo).

Há evidências de que risco de predação indicado por cheiro de gato suprime brincadeira em filhotes de ratos (Hubbard, Blanchard, Yang, Markham, Gervacio, Chun-I, & Blanchard, 2004Hubbard, D. T., Blanchard, D. C., Yang, M., Markham, C. M., Gervacio, A., Chun-I, L., & Blanchard, R. J. (2004). Development of defensive behavior and conditioning to cat odor in the rat. Physiology & Behavior, 80(4), 525-530.; Siviy, Harrison, & McGregor, 2006Siviy, S. M., Harrison, K. A., & McGregor, I. S. (2006). Fear, risk assessment, and playfulness in the juvenile rat. Behavioral neuroscience, 120(1), 49-59.). Panksepp (1998Panksepp, J. (1998). Affective Neuroscience: the foundations of human and animal emotions. New York: Oxford University Press.) mostrou que a supressão era específica, sendo encontrada quando colocou pelos de gato no espaço onde os filhotes brincavam, mas não quando colocou pelos de cachorro. Siviy (2010Siviy, S. M. (2010). Play and adversity: how the playful mammalian brain withstands threats and anxieties. American Journal of Play, 2(3), 297-314) conclui que a brincadeira parece ser resiliente face à adversidade nos filhotes de ratos. É como se o cérebro tivesse evoluído para ver uma vantagem adaptativa em parar de brincar diante do risco de predação, mas, passado o risco, os filhotes voltam a brincar, como se o cérebro não visse razão adaptativa em continuar a manter sentimentos de medo e ansiedade. Contudo, podemos nos equivocar em relação ao que é uma ameaça e prever supressão de brincadeira quando não ocorre. É o que evidencia Stuart Brown (2009Brown, S. L. (2009). Play: how it shapes the brain, opens the imagination, and invigorates the soul. New York: Avery.) com uma sequência notável de fotos de brincadeira entre um urso e um cão, numa época de escassez de alimento. Em vez de tornar-se presa, o cão, muito menor do que o urso, revelou-se parceiro de uma longa e aparentemente relaxada brincadeira. Predominou um “estado de espírito lúdico” em vez de um “estado de espírito sério”. O urso se comportou de acordo os princípios descritos por Mark Bekoff e Jessika Pierce (2010Bekoff, M., & Pierce, J. (2010). The ethical dog. Scientific American Mind, 21(1), 16-17.) no seu artigo intitulado “O cão ético”, levou em conta a capacidade do seu parceiro, criando e mantendo uma relação de igualdade, o que envolve: inversão de papéis - o animal dominante realiza uma ação durante a brincadeira que não ocorreria normalmente durante a agressão real e o animal mais fraco pode “atacar”; autocontenção3 3 Self-handicapping. - o animal mais forte não morde seu parceiro de brincadeira tão fortemente quanto seria capaz, nem brinca tão vigorosamente quanto poderia; metacomunicação - um animal parece reconhecer que seu parceiro está simulando e indica que ele próprio também está representando. Além de posturas, há uma cara de brincadeira que sinaliza que uma particular sequência é lúdica e não agressiva.

Observações comparativas interessantes foram feitas por Palagi e Cordoni (2012Palagi, E., & Cordoni, G. (2012). The right time to happen: play developmental divergence in the two Pan species. PLoS ONE, 7(12), e52767.), mostrando que a brincadeira social de bonobos (Pan paniscus) e de chimpanzés comuns (Pan troglodytes) é semelhante quando são filhotes. No entanto, no período juvenil, a brincadeira dos bonobos transforma-se com menor frequência em agressão, dura mais e pode envolver mais de dois parceiros simultaneamente. Quando adultos, os bonobos continuam brincando, mas os chimpanzés comuns não, o que provavelmente se deve à diferença em tolerância social das duas espécies (Palagi, 2006Palagi, E. (2006). Social play in bonobos (Pan paniscus) and chimpanzees (Pan troglodytes): implications for natural social systems and interindividual relationships. American Journal of Physical Anthropology, 129(3), 418-426.; Palagi & Cordoni, 2012).

PEXE OXEMOARAI: convite-justificativa para reavaliarmos nossas prioridades

Convido-os agora a pensar sobre a nossa própria espécie, a partir do contexto de perspectiva psicoetológica apresentado acima. Partilho o ponto de vista de Peter Gray (2011Gray, P. (2011a). The evolutionary biology of education: how our hunter-gatherer educative instincts could form the basis for education today. Evolution: Education and Outreach, 4(1), 28-40.a) de que as crianças humanas foram desenhadas pela seleção natural para adquirir a cultura por meio da brincadeira e exploração autogerenciadas. Se pensarmos nas crianças caçadoras-coletoras (Gosso, 2004Gosso, Y. (2004). Pexe oxemoarai: brincadeiras infantis entre os índios Parakanã (Tese de Doutorado). Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo.; Gosso et al., 2005), constatamos que elas têm que adquirir uma quantidade enorme de conhecimento para tornar-se adultos eficientes em sua cultura. No entanto, os adultos não dirigem a educação das crianças ou lhes dizem o que fazer. As crianças estão livres para brincar e para explorar por si próprias de manhã até o entardecer, adquirem as competências da sua cultura e consolidam esse conhecimento brincando, em grupos de várias idades, de atividades culturalmente valorizadas. Os meninos Parakanã da aldeia de Paranowaona, no Pará, brincam de Tekatawa, reunião noturna em que os homens discutem os assuntos da tribo. O seguinte exemplo foi retirado da tese doutorado de Yumi Gosso (2004), desenvolvida sob minha orientação, o título desta tese PEXE OXEMOARAI, que significa “vamos brincar?” em Parakanã, foi usado como subtítulo da seção final deste artigo. “Tapiawa (quatro anos, M) usa um pedaço de bambu para fumar e diz que é petyma (cigarro). Traga e passa o cigarro para Suruapa (quatro anos, M). Cruza as pernas e pede o cigarro para seu colega.” (Gosso, 2004, pp. 63-64).

Embora os adultos não supervisionem suas atividades como ocorre nas cidades, as crianças Parakanã sabem o que os mais velhos fazem, e reproduzem o modelo nas suas brincadeiras imaginativas. Espelham e reconstroem ativamente os valores e hábitos do grupo social em que estão inseridas (Morais & Carvalho, 1994Morais, M. L. S., & Carvalho, A. M. A. (1994). Faz-de-conta: temas, papéis e regras na brincadeira de crianças de quatro anos. Boletim de Psicologia, 44(100-101), 21-30.). Segundo Gosso, Morais e Otta (2007Gosso, Y., Morais, M. D. L. S., & Otta, E. (2007). Pretend play of Brazilian children: a window into different cultural worlds. Journal of Cross-Cultural Psychology, 38(5), 539-558.), por comparação com as crianças Parakanã, que têm a oportunidade de observar o que seus pais fazem, as atividades dos adultos são mais desconhecidas pelas crianças urbanas. Na sua pesquisa de mestrado, baseada na observação de crianças pré-escolares numa escola particular em São Paulo, Morais (1980Morais, M. L. S. (1980). O faz-de-conta e a realidade social da criança. Dissertação de Mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo.) relata que os meninos brincam de pegar o carro, sair para trabalhar e voltar em seguida.

Recomendo a TED Talk de Peter Gray intitulada “Declínio do Brincar”,4 4 Decline of Play. Recuperado de <https://goo.gl/wJAGA3>. em que trata da diminuição das oportunidades de brincar de crianças em ambientes urbanos. Mesmo sem ter todas as oportunidades de uma criança num modo de vida caçador-coletor, ele próprio, nos anos 1950 nos Estados Unidos, reconhece que teve uma infância com muito mais liberdade para brincar do que as crianças têm hoje. Nas últimas décadas, a brincadeira livre diminuiu notavelmente e aumentou o tempo e a prioridade dada à escolarização e às atividades dirigidas por adultos. Isto se deve ao medo maior que os pais têm de deixar as crianças brincando sozinhas fora de casa. Além disso, destaca-se uma política educacional com foco em leitura, escrita e aritmética, em detrimento de educação física e artes, que rouba oportunidades naturais de brincadeira das crianças (Panksepp, 2007Panksepp, J. (2007b). Can PLAY diminish ADHD and facilitate the construction of the social brain? Journal of the Canadian Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 16(2), 57-66.b).

Gray (2011Gray, P. (2011b). The decline of play and the rise of psychopathology in children and adolescents. American Journal of Play, 3(4), 443-463.b) argumenta que a diminuição das oportunidades para brincar está associada ao aumento do risco de patologia em crianças, adolescentes e jovens adultos: ansiedade, narcisismo, sentimentos de desamparo, depressão e suicídio. Isto pode estar correlacionado com a falta de sentimento de controle que as crianças desenvolvem em relação às suas vidas.

Podemos distinguir locus de controle interno - o indivíduo percebe uma relação causal entre o seu próprio comportamento e as recompensas que obtém - e locus de controle externo - o indivíduo não vê relação entre suas ações e as consequências (Lefcourt, 2014Lefcourt, H. M. (2014). Locus of control: Current trends in theory & research. Abingdon: Psychology Press.; Rotter, 1966Rotter, J. B. (1966). Generalized expectancies for internal versus external control of reinforcement. Psychological Monographs: General and Applied, 80(1), 1-28.). Nesta linha de raciocínio, o locus de controle pode ser modificado pela experiência, e a mudança do modo de vida humano está resultando em mudanças importantes nas crenças que os indivíduos desenvolvem sobre o seu controle sobre eventos da sua vida. A redução da brincadeira e da exploração autogerenciadas tem um papel importante nesse sentido, aumentando a incidência de indivíduos com locus de controle externo.

Outro problema sobre o qual devemos refletir neste contexto é o aumento do diagnóstico de TDAH em ritmo alarmante, associado à prescrição de psicoestimulantes, altamente eficientes em aumentar o foco da atenção e em diminuir problemas de comportamento em sala de aula, mas cujos efeitos sobre o cérebro em crescimento não são adequadamente caracterizados (Barbaresi et al., 2002Barbaresi, W. J., Katusic, S. K., Colligan, R. C., Pankratz, V. S., Weaver, A. L., Weber, K. J., . . . Jacobsen, S. J. (2002). How common is attention-deficit/hyperactivity disorder? Incidence in a population-based birth cohort in Rochester, Minn. Archives of Pediatrics & Adolescent Medicine, 156(3), 217-224.; Breggin, 1999Breggin, P. R. (1999). Psychostimulants in the treatment of children diagnosed with ADHD: Part II: adverse effects on brain and behavior. Ethical Human Sciences and Services, 1(3), 213-241.; Faraone, Sergeant, Gillberg, & Biederman, 2003Faraone, S. V., Sergeant, J., Gillberg, C., & Biederman, J. (2003). The worldwide prevalence of ADHD: is it an American condition. World Psychiatry, 2(2), 104-113.; Panksepp, 1998Panksepp, J. (1998). Affective Neuroscience: the foundations of human and animal emotions. New York: Oxford University Press., 2008Panksepp, J. (2008). Play, ADHD, and the construction of the social brain: should the first class each day be recess? American Journal of Play, 1(1), 55-79.; Visser, Bitsko, Danielson, Perou, & Blumberg, 2010Visser, S. N., Bitsko, R. H., Danielson, M. L., Perou, R., & Blumberg, S. J. (2010). Increasing prevalence of parent-reported attention-deficit/hyperactivity disorder among children-United States, 2003 and 2007. Morbidity and Mortality Weekly Report, 59(44), 1439-1443.).

Uma tira do cartunista William B. Watterson (2008Watterson, W. B. (2008). Calvin e Haroldo. Recuperado de http://iconoclastia.org/2013/03/07/brasil-dispara-no-vicio-induzido-pelos-pais-na-droga-da-obediencia-ritalina/
http://iconoclastia.org/2013/03/07/brasi...
), conhecido por sua crítica social, nos faz pensar sobre a infância com Calvin, um garoto de seis anos, e o seu tigre Haroldo. Para as pessoas em geral, Haroldo é só um bicho de pelúcia, mas para Calvin ele é um amigo imaginário, com quem vive suas aventuras. Numa das tiras, no primeiro e no terceiro quadros, Calvin está escrevendo numa folha de papel e dizendo para Haroldo, que aparece grande ao seu lado: ‘Que? Opa, desculpa. Eu não estava escutando. Olha, preciso mesmo acabar isso.’ No segundo e no quarto quadros, o menino continua focado em sua tarefa de escrever, mas Haroldo fica pequeno ao seu lado. Ou seja, o tigre vira um mero bicho de pelúcia. Poderíamos pensar que uma criança sob ação de psicoestimulantes é como Calvin, que não vê o amigo imaginário convidando-o para brincar. Sua atenção fica inteiramente focalizada na tarefa escolar.

Pesquisadores estão usando a brincadeira social turbulenta (BST) em ratos como modelo animal com o objetivo de colaborar para a melhor compreensão do mecanismo de ação de drogas usadas no tratamento de TDAH. Vários pesquisadores, entre eles Beatty, Dodge, Dodge, Whike e Panksepp (1982Beatty, W. W., Dodge, A. M., Dodge, L. J., Whike, K., & Panksepp, J. (1982). Psychomotor stimulants, social deprivation and play in juvenile rats. Pharmacology Biochemistry & Behavior, 16(3), 417-422.), Beatty, Costello e Berry (1984Beatty, W. W., Costello, K. B., & Berry, S. L. (1984). Suppression of play fighting by amphetamine: effects of catecholamine antagonists, agonists, and synthesis inhibitors. Pharmacology Biochemistry & Behavior, 20(5), 747-755.) e Vanderschuren, Trezza, Griffioen-Roose, Schiepers, Van Leeuwen, De Vries e Schoffelmeer (2008Vanderschuren, L. J., Trezza, V., Griffioen-Roose, S., Schiepers, O. J., Van Leeuwen, N., De Vries, T. J., & Schoffelmeer, A. N. (2008). Methylphenidate disrupts social play behavior in adolescent rats. Neuropsychopharmacology, 33(12), 2946-2956.), vêm mostrando que metilfenidato diminui BST em ratos juvenis de forma quase dependente. Roedores tratados com estas drogas fazem menos convites para brincar e são menos responsivos às iniciativas de outros indivíduos, embora a droga não afete sua atividade locomotora ou exploratória.

A tese de Jaak Panksepp (2007Panksepp, J. (2007b). Can PLAY diminish ADHD and facilitate the construction of the social brain? Journal of the Canadian Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 16(2), 57-66.b) é que o uso de psicoestimulantes leva as crianças com TDAH a brincar menos, tornando-se mais parecidas com adultos. Isto se daria porque os medicamentos promovem ativação neocortical, e o neocórtex inibe todos os impulsos emocionais de processo primário (Liotti & Panksepp, 2004Liotti, M., & Panksepp, J. (2004). Imaging human emotions and affective feelings: Implications for biological psychiatry. In: Panksepp, J. Textbook of Biological Psychiatry (pp.33-74). Hoboken: John Willey & Sons.). Impulsos lúdicos primários são um direito subcortical que os animais têm ao nascer e que estaria sendo tirado das crianças (Panksepp, Siviy, & Normansell, 1984Panksepp, J., Siviy, S., & Normansell, L. A. (1984). The psychobiology of play: theoretical and methodological perspectives. Neuroscience and Biobehavioral Reviews, 8(4), 465-492.). Modelos animais vêm mostrando que a brincadeira é essencial para o desenvolvimento do cérebro social (Pellis & Pellis, 2007Pellis, S. M., & Pellis, V. C. (2007). Rough-and-tumble play and the development of the social brain. Current Directions in Psychological Science,16(2), 95-98.; Pellis, Pellis, & Bell, 2010Pellis, S. M., Pellis, V. C., & Bell, H. C. (2010). The function of play in the development of the social brain. American Journal of Play, 2(3), 278-296.) e também que psicoestimulantes usados para tratar TDAH estão entre as drogas mais poderosas de redução do brincar já descobertas (Beatty et al., 1982Beatty, W. W., Dodge, A. M., Dodge, L. J., Whike, K., & Panksepp, J. (1982). Psychomotor stimulants, social deprivation and play in juvenile rats. Pharmacology Biochemistry & Behavior, 16(3), 417-422.; Beatty et al., 1984).

Podemos pensar que muitas crianças com TDAH, atualmente medicadas com psicoestimulantes, sejam simplesmente crianças normais que têm desejos insatisfeitos excessivos para brincar, e indagar se sintomas de TDAH diminuiriam com suplementação de brincadeira. Segundo Jaak Panksepp (2007Panksepp, J. (2007b). Can PLAY diminish ADHD and facilitate the construction of the social brain? Journal of the Canadian Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 16(2), 57-66.b), quanto mais as crianças puderem se engajar em brincadeira natural durante seu desenvolvimento inicial, mais cedo e mais completamente desenvolverão as funções regulatórias dos lobos frontais que lhes permitirão inibir impulsos, permitindo-lhes “parar, ver, ouvir & sentir”. Em outras palavras, desenvolvendo habilidades executivas que promovem foco em metas, previsão e flexibilidade. Panksep (2007b) relata que tem feito esforços informais para avaliar isso. Na Memorial Foundation for Lost Children, em Bowling Green, Ohio, ele vem aconselhando pais de crianças com TDAH a dedicar esforço especial para se engajar em períodos diários de brincadeira turbulenta relaxada e divertida com seus filhos. O feedback dos pais em relação a essa suplementação diária de brincadeira tem sido positivo.

Peter Gray (2011Gray, P. (2011b). The decline of play and the rise of psychopathology in children and adolescents. American Journal of Play, 3(4), 443-463.b) e Jaak Panksepp (2007Panksepp, J. (2007b). Can PLAY diminish ADHD and facilitate the construction of the social brain? Journal of the Canadian Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 16(2), 57-66.b) nos alertam que temos um problema e ambos propõem a mesma solução geral: devolver a brincadeira para a vida das crianças. Gray (2011b) fala da necessidade de reavaliarmos prioridades, desenvolvermos redes de vizinhos, estabelecermos espaços seguros para as crianças brincarem e, ao mesmo tempo, espaços de aventura, e Panksepp (2007b) chama esses espaços de santuários para brincar, inspirado em Platão que, na República [seção IV], tratou da importância da brincadeira livre para as crianças pequenas, essencial para que se transformem em cidadãos virtuosos e de boa conduta. Cabe a nós usar criatividade para trazer para o nosso tempo os santuários para brincar de Platão. Proposta que está de acordo com o convite-justificativa deste ensaio: permitir que as crianças recuperem a natureza que vem sendo retirada das suas vidas. Quanto mais conhecermos sobre o brincar, mais adequados seremos nas oportunidades que poderemos oferecer às crianças. Precisamos de mais pesquisas sobre este tema na academia, num ambiente intelectual que facilite a colaboração entre etólogos, psicólogos, educadores e neurocientistas, promovendo uma interação bidirecional entre teoria e prática, que possa traduzir rapidamente os resultados da pesquisa em prática, que também pode ajudar a estabelecer direções e refinar hipóteses de pesquisas testáveis.

Referências

  • Ades, C. (1986). Uma perspectiva psicoetológica para o estudo do comportamento animal. Boletim de Psicologia, 36(85), 20-30.
  • Ades, C. (1987). Notas para uma análise psicoetológica da aprendizagem. Boletim de Psicologia, 37(86), 24-35.
  • Ades, C. (1998). Psicoetologia do cuidado paterno. In M. J. R. P. Costa & V. U. Crornberg, Comportamento materno em mamíferos: bases teóricas e aplicações dos ruminantes domésticos (pp. 31-51). São Paulo: Sociedade Brasileira de Etologia.
  • Ades, C. (2000). Os bichos também brincam. Ciência Hoje das Crianças, 13(100), 17-19.
  • Ades, C. (2012). Notas sobre o brincar. TransFormações em Psicologia (Online), 4(1SPE), 65-77.
  • Alcock, J. (2013). Animal behavior: an evolutionary approach. Massachusetts: Sinauer Associates.
  • Arcieri, J. B. C. (1995). As práticas da neonatologia sob o enfoque psicoetológico das relações pais-bebê. Pediatria, 17(4), 170-173.
  • Ardans, O. (1996). A perspectiva etológica do estudo do comportamento. Psicologia Revista, (2).
  • Barbaresi, W. J., Katusic, S. K., Colligan, R. C., Pankratz, V. S., Weaver, A. L., Weber, K. J., . . . Jacobsen, S. J. (2002). How common is attention-deficit/hyperactivity disorder? Incidence in a population-based birth cohort in Rochester, Minn. Archives of Pediatrics & Adolescent Medicine, 156(3), 217-224.
  • Bateson, P. (2005) The role of play in the evolution of great apes and humans (2005). Play in hunter-gatherer society. In A. D. Pellegrini & P. K. Smith (Eds.), The nature of play: great apes and humans (Cap. 11, pp. 13-253). New York: The Guilford Press.
  • Bateson, P., & Martin, P. (2013). Play, playfulness, creativity and innovation. Cambridge University Press.
  • Beatty, W. W., Costello, K. B., & Berry, S. L. (1984). Suppression of play fighting by amphetamine: effects of catecholamine antagonists, agonists, and synthesis inhibitors. Pharmacology Biochemistry & Behavior, 20(5), 747-755.
  • Beatty, W. W., Dodge, A. M., Dodge, L. J., Whike, K., & Panksepp, J. (1982). Psychomotor stimulants, social deprivation and play in juvenile rats. Pharmacology Biochemistry & Behavior, 16(3), 417-422.
  • Bekoff, M. (2006). Animal emotions and animal sentience and why they matter: blending “science sense” with common sense, compassion and heart (pp. 27-40). London: Earthscan.
  • Bekoff, M., & Byers, J. A. (Eds.). (1998). Animal play: evolutionary, comparative, and ecological perspectives. Cambridge: Cambridge University Press.
  • Bekoff, M., & Pierce, J. (2010). The ethical dog. Scientific American Mind, 21(1), 16-17.
  • Blanchard, R. J, Blanchard, D. C., Agullana, R., & Weiss S. M. (1991). Twenty-two kHz alarm cries to presentation of a predator, by laboratory rats living in visible burrow systems. Physiology and Behavior, 50(5), 967-972.
  • Breggin, P. R. (1999). Psychostimulants in the treatment of children diagnosed with ADHD: Part II: adverse effects on brain and behavior. Ethical Human Sciences and Services, 1(3), 213-241.
  • Brown, S. L. (2009). Play: how it shapes the brain, opens the imagination, and invigorates the soul. New York: Avery.
  • Brudzynski, S. M., & Pniak, A. (2002). Social contacts and production of 50-kHz short ultrasonic calls in adult rats. Journal of Comparative Psychology, 116(1), 73-82.
  • Burgdorf, J., & Panksepp, J. (2001). Tickling induces reward in adolescent rats. Physiology & behavior, 72(1), 167-173.
  • Burgdorf, J., Knutson, B., & Panksepp J. (2000). Anticipation of rewarding electrical brain stimulation evokes ultrasonic vocalization in rats. Behavioral Neuroscience, 114(2), 320-327.
  • Burgdorf, J., Knutson, B., Panksepp, J., & Ikemoto, S. (2001). Nucleus accumbens amphetamine microinjections unconditionally elicit 50-kHz ultrasonic vocalizations in rats. Behavioral Neuroscience, 115(4), 940-944.
  • Burgdorf, J., Kroes, R. A., Moskal, J. R., Pfaus, J. G., Brudzynski, S. M., & Panksepp, J. (2008). Ultrasonic vocalizations of rats (Rattus norvegicus) during mating, play, and aggression: behavioral concomitants, relationship to reward, and self-administration of playback. Journal of Comparative Psychology, 122(4), 357-367.
  • Burghardt, G. M. (2005). The genesis of animal play: testing the limits. Cambidge, MA: Mit Press.
  • Burghardt, G. M. (2010). The comparative reach of play and brain: perspective, evidence, and implications. American Journal of Play, 2(3), 338-356.
  • Choi, J. S., & Brown, T. H. (2003). Central amygdala lesions block ultrasonic vocalization and freezing as conditional but not unconditional responses. Journal of Neuroscience, 23(25), 8713-8721.
  • Covington, H. E. III, & Miczek, K. A. (2003). Vocalizations during withdrawal from opiates and cocaine: possible expressions of affective distress. European Journal of Pharmacology, 467(1-3), 1-13.
  • Cunha, W. H. D. A. (1965). Convite justificativa para o estudo naturalístico do comportamento animal. Jornal Brasileiro de Psicologia, 1(2), 37-57.
  • Cunha, W. H. D. A. (2004). Sobre as respostas de pânico de formigas diante de uma coespecífica esmagada: contribuição para uma psicoetologia do medo. Revista de Etologia, 6(2), 133-140.
  • Deci, E. L., & Ryan, R. M. (1980). The empirical exploration of intrinsic motivational processes. Advances in Experimental Social Psychology, 13, 39-80.
  • Faraone, S. V., Sergeant, J., Gillberg, C., & Biederman, J. (2003). The worldwide prevalence of ADHD: is it an American condition. World Psychiatry, 2(2), 104-113.
  • Gomide, P. I. C., & Ades, C. (1989). Effects of reward and familiarity of reward agent on spontaneous play in preschoolers: a field study. Psychological Reports, 65(2), 427-434.
  • Gosso, Y. (2004). Pexe oxemoarai: brincadeiras infantis entre os índios Parakanã (Tese de Doutorado). Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo.
  • Gosso, Y., Morais, M. D. L. S., & Otta, E. (2007). Pretend play of Brazilian children: a window into different cultural worlds. Journal of Cross-Cultural Psychology, 38(5), 539-558.
  • Gosso, Y., Otta, E., Morais, M. L. S., Ribeiro, F. L., & Bussab, V. S. R. (2005). Play in hunter-gatherer society. In A. D. Pellegrini & P. K. Smith (Eds.), The nature of play: great apes and humans (Cap. 11, pp. 213-253). New York: The Guilford Press.
  • Graham, K. L., & Burghardt, G. M. (2010). Current perspectives on the biological study of play: signs of progress. The Quarterly Review of Biology, 85(4), 393-418.
  • Gray, P. (2011a). The evolutionary biology of education: how our hunter-gatherer educative instincts could form the basis for education today. Evolution: Education and Outreach, 4(1), 28-40.
  • Gray, P. (2011b). The decline of play and the rise of psychopathology in children and adolescents. American Journal of Play, 3(4), 443-463.
  • Hubbard, D. T., Blanchard, D. C., Yang, M., Markham, C. M., Gervacio, A., Chun-I, L., & Blanchard, R. J. (2004). Development of defensive behavior and conditioning to cat odor in the rat. Physiology & Behavior, 80(4), 525-530.
  • Huffman, M. A. (1984). Stone-play of Macaca fuscata in Arashiyama B troop: transmission of a non-adaptive behavior. Journal of Human Evolution, 13(8), 725-735.
  • Huffman, M. A., & Quiatt D. (1986). Stone handling by Japanese macaques (Macaca fuscata): implications for tool use of stones. Primates, 27(4), 413-423.
  • Kahlenberg, S. M., & Wrangham, R. W. (2010). Sex differences in chimpanzees’ use of sticks as play objects resemble those of children. Current Biology, 20(24), R1067-R1068.
  • Knutson, B., Burgdorf, J., & Panksepp, J. (1998). Anticipation of play elicits high-frequency ultrasonic vocalizations in young rats. Journal of Comparative Psychology, 112(1), 65-73.
  • Lee, H. J., Choi, J. S., Brown, T. H., & Kim, J. J. (2001). Amygdalar NMDA receptors are critical for the expression of multiple conditioned fear responses. Journal of Neuroscience, 21(11), 4116-4124.
  • Lefcourt, H. M. (2014). Locus of control: Current trends in theory & research. Abingdon: Psychology Press.
  • Lencastre, M. P. A. (2010). Etologia e psicologia evolutiva: perspectivas evolutivas para a psicologia clínica. Psychologica, 1(52), 149-192.
  • Liotti, M., & Panksepp, J. (2004). Imaging human emotions and affective feelings: Implications for biological psychiatry. In: Panksepp, J. Textbook of Biological Psychiatry (pp.33-74). Hoboken: John Willey & Sons.
  • Lucena, J. M. F. D., & Pedrosa, M. I. (2014). Stability and change in the construction of shared routines in playgroups. Psicologia: Reflexão e Crítica, 27(3), 556-563.
  • Meirelles, R. (2007). Giramundo e outros brinquedos e brincadeiras dos meninos do Brasil. São Paulo: Terceiro Nome.
  • Morais, M. L. S. (1980). O faz-de-conta e a realidade social da criança. Dissertação de Mestrado, Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo.
  • Morais, M. L. S., & Carvalho, A. M. A. (1994). Faz-de-conta: temas, papéis e regras na brincadeira de crianças de quatro anos. Boletim de Psicologia, 44(100-101), 21-30.
  • Nahallage, C. A., & Huffman, M. A. (2007). Age-specific functions of stone handling, a solitary-object play behavior, in Japanese macaques (Macaca fuscata). American Journal of Primatology, 69(3), 267-281.
  • Nahallage, C. A., & Huffman, M. A. (2012). Stone handling behavior in rhesus macaques (Macaca mulatta), a behavioral propensity for solitary object play shared with Japanese macaques. Primates, 53(1), 71-78.
  • Otta, E. (2012). In Memory of César Ades (1943-2012): the legacy of psycho-ethology. Revista de Etologia, 11(1), 3-10.
  • Otta, E. (2015). Reflections on a footnote: implications for the study of emotions in animals. Psicologia USP, 26(2), 286-295.
  • Palagi, E. (2006). Social play in bonobos (Pan paniscus) and chimpanzees (Pan troglodytes): implications for natural social systems and interindividual relationships. American Journal of Physical Anthropology, 129(3), 418-426.
  • Palagi, E., & Cordoni, G. (2012). The right time to happen: play developmental divergence in the two Pan species. PLoS ONE, 7(12), e52767.
  • Panksepp, J. (1992). A critical role for “Affective Neuroscience” in resolving what is basic about basic emotions. Psychological Review, 99(3), 554-560.
  • Panksepp, J. (1998). Affective Neuroscience: the foundations of human and animal emotions. New York: Oxford University Press.
  • Panksepp, J. (2005). Affective consciousness: core emotional feelings in animals and humans. Consciousness and cognition, 14(1), 30-80.
  • Panksepp, J. (2007a). Neuroevolutionary sources of laughter and social joy: modeling primal human laughter in laboratory rats. Behavioural Brain Research, 182(2), 231-244.
  • Panksepp, J. (2007b). Can PLAY diminish ADHD and facilitate the construction of the social brain? Journal of the Canadian Academy of Child and Adolescent Psychiatry, 16(2), 57-66.
  • Panksepp, J. (2008). Play, ADHD, and the construction of the social brain: should the first class each day be recess? American Journal of Play, 1(1), 55-79.
  • Panksepp, J. (2011). Cross-species affective neuroscience decoding of the primal affective experiences of humans and related animals. PLoS One, 6(9), e21236.
  • Panksepp, J., & Biven, L. (2012). The Archaeology of mind: neuroevolutionary origins of human emotion. New York: W. W. Norton & Company.
  • Panksepp, J., & Burgdorf, J. (2003). “Laughing” rats and the evolutionary antecedents of human joy? Physiology & Behavior, 79(3), 533-547.
  • Panksepp, J., Siviy, S., & Normansell, L. A. (1984). The psychobiology of play: theoretical and methodological perspectives. Neuroscience and Biobehavioral Reviews, 8(4), 465-492.
  • Panksepp, J., Siviy, S., & Normansell, L. (1985). The psychobiology of play: theoretical and methodological perspectives. Neuroscience & Biobehavioral Reviews, 8(4), 465-492.
  • Parsana, A. J., Li, N., & Brown, T. H. (2012). Positive and negative ultrasonic social signals elicit opposing firing patterns in rat amygdala. Behavioural Brain Research, 226(1), 77-86.
  • Pellegrini, A. D., & Smith, P. K. (Eds.). (2005). The nature of play: great apes and humans. New York: Guilford Press.
  • Pellis, S. M., & Pellis, V. C. (2007). Rough-and-tumble play and the development of the social brain. Current Directions in Psychological Science,16(2), 95-98.
  • Pellis, S. M., Pellis, V. C., & Bell, H. C. (2010). The function of play in the development of the social brain. American Journal of Play, 2(3), 278-296.
  • Resende, B. D., & Ottoni, E. B. (2002). Brincadeira e aprendizagem do uso de ferramentas em macacos-prego (Cebus apella). Estudos de psicologia, 7(1), 173-180.
  • Rotter, J. B. (1966). Generalized expectancies for internal versus external control of reinforcement. Psychological Monographs: General and Applied, 80(1), 1-28.
  • Ryan, K. (Ed.). (1972). Don’t smile until Christmas: accounts of the first year of teaching. Illinois: University of Chicago Press.
  • Sazima, I. (2008). Playful birds: cormorants and herons play with objects and practice their skills. Biota Neotropica, 8(2), 259-264.
  • Siviy, S. M. (2010). Play and adversity: how the playful mammalian brain withstands threats and anxieties. American Journal of Play, 2(3), 297-314
  • Siviy, S. M., Harrison, K. A., & McGregor, I. S. (2006). Fear, risk assessment, and playfulness in the juvenile rat. Behavioral neuroscience, 120(1), 49-59.
  • Spinelli, L. H. P., Nascimento, L. F., & Yamamoto, M. E. (2002). Identificação e descrição da brincadeira em uma espécie pouco estudada, o boto cinza (Sotalia fluviatilis), em seu ambiente natural. Estudos de Psicologia, 7(1), 165-171.
  • Spinka, M., Newberry, R. C., & Bekoff, M. (2001). Mammalian play: training for the unexpected. Quarterly Review of Biology, 76(2), 141-168.
  • Thomas, D. A., Takahashi, L. K, & Barfield, R. J. (1983). Analysis of ultrasonic vocalizations emitted by intruders during aggressive encounters among rats (Rattus norvegicus). Journal of Comparative Psychology, 97(3), 201-206.
  • Thompson B., Leonard K. C., & Brudzynski, S. B. (2006). Amphetamine-induced 50 kHz calls from rat nucleus accumbens: a quantitative mapping study and acoustic analysis. Behavior and Brain Research, 168(1), 64-73.
  • Tinbergen, N. (1963). On aims and methods of ethology. Zeitschrift für Tierpsychologie, 20, 410-433.
  • Vanderschuren, L. J., Trezza, V., Griffioen-Roose, S., Schiepers, O. J., Van Leeuwen, N., De Vries, T. J., & Schoffelmeer, A. N. (2008). Methylphenidate disrupts social play behavior in adolescent rats. Neuropsychopharmacology, 33(12), 2946-2956.
  • Vieira, M. L., & Sartorio, R. (2002). Análise motivacional, causal e funcional da brincadeira em duas espécies de roedores. Estudos de Psicologia, 7(1), 189-196.
  • Visser, S. N., Bitsko, R. H., Danielson, M. L., Perou, R., & Blumberg, S. J. (2010). Increasing prevalence of parent-reported attention-deficit/hyperactivity disorder among children-United States, 2003 and 2007. Morbidity and Mortality Weekly Report, 59(44), 1439-1443.
  • Vivian, J. A., Farrell, W. J., Sapperstein, S. B., & Miczek, K. A. (1994). Diazepam withdrawal: effects of diazepam and gepirone on acoustic startle-induced 22 kHz ultrasonic vocalizations. Psychopharmacology, 114(1), 101-108.
  • Waal, F. B. M. (1997). Are we in anthropodenial? Discover, 18(7), 50-53.
  • Waal, F. B. M. (1999). Anthropomorphism and anthropodenial: consistency in our thinking about humans and other animals. Philosophical Topics, 27(1), 255-280.
  • Waal, F. B. M. (2011). What is an animal emotion? Annals of the New York Academy of Sciences, 1224(1), 191-206.
  • Watterson, W. B. (2008). Calvin e Haroldo. Recuperado de http://iconoclastia.org/2013/03/07/brasil-dispara-no-vicio-induzido-pelos-pais-na-droga-da-obediencia-ritalina/
    » http://iconoclastia.org/2013/03/07/brasil-dispara-no-vicio-induzido-pelos-pais-na-droga-da-obediencia-ritalina/
  • 1
    self-handicapping.
  • 2
    having fun.
  • 3
    Self-handicapping.
  • 4
    Decline of Play. Recuperado de <https://goo.gl/wJAGA3>.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    22 Ago 2016
  • Revisado
    26 Jan 2017
  • Aceito
    11 Maio 2017
Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo Av. Prof. Mello Moraes, 1721 - Bloco A, sala 202, Cidade Universitária Armando de Salles Oliveira, 05508-900 São Paulo SP - Brazil - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revpsico@usp.br