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Ama teu próximo como a ti mesmo: intolerância religiosa sob uma perspectiva psicanalítica

Love thy neighbor as thyself: religious intolerance from a psychoanalytic perspective

Aime ton prochain comme toi-même : l’intolérance religieuse dans une perspective psychanalytique

Amarás a tu prójimo como a ti mismo: intolerancia religiosa desde una perspectiva psicoanalítica

Resumo

Este trabalho aborda a problemática da intolerância religiosa sob a concepção de sujeito da psicanálise. Buscaremos investigar, com o sistema conceitual psicanalítico, como o fenômeno da intolerância se articula com a construção de identidade do sujeito. Para tal, faremos uma breve revisão da ideia de narcisismo, das considerações freudianas sobre o envolvimento religioso e das contribuições lacanianas à discussão acerca da religião. Pretendemos demonstrar como as elaborações teóricas se materializam ao longo da história, assim como suas ressonâncias no contemporâneo. Nesse sentido, apontaremos a relação entre a identificação religiosa e a possibilidade de um posicionamento político.

Palavras-chave:
intolerância religiosa; psicanálise; identificação; política

Abstract

Based on psychoanalysis’ concept of subject, this paper investigates the articulations between religious intolerance and the construction of the subject’s identity. For this purpose, the article reviews the idea of narcissism, Freud’s considerations on religious involvement and Lacan’s contributions to the discussion of religion, demonstrating how theoretical elaborations materialize throughout history and their resonances in the contemporary. In this regard, the text highlights the articulation between religious identification and political position.

Keywords:
religious intolerance; psychoanalysis; identification; Politics

Résumé

Basé sur le concept de sujet de la psychanalyse, cet article étudie les articulations entre l’intolérance religieuse et la construction de l’identité du sujet. À cette fin, l’article passe en revue l’idée de narcissisme, les considérations de Freud sur l’engagement religieux et les contributions de Lacan à la discussion sur la religion, tout en montrant comment les élaborations théoriques se matérialisent à travers l’histoire et leurs résonances dans le contemporain. A cet égard, le text souligne l’articulation entre identification religieuse et position politique.

Mots-clés :
intolérance religieuse; psychanalyse; identification; politique

Resumen

Este trabajo aborda el tema de la intolerancia religiosa bajo el concepto de sujeto del psicoanálisis. A partir de conceptos psicoanalíticos, buscaremos investigar cómo la intolerancia se articula con la construcción de identidad del sujeto. Para ello, revisaremos la idea de narcisismo, las consideraciones freudianas sobre la participación religiosa y las contribuciones lacanianas a la discusión de la religión. Además, pretendemos demostrar cómo las elaboraciones teóricas se materializan a lo largo de la historia, así como sus resonancias en lo contemporáneo. En este sentido, señalaremos la articulación entre la identificación religiosa y la posibilidad de un posicionamiento político.

Palabras clave:
intolerancia religiosa; psicoanálisis; identificación; política

Introdução

Ainda que vivamos em um Estado laico, que tenta assegurar constitucionalmente o exercício, a prática e a diversidade de crenças e religiões no campo social, somos frequentemente confrontados com nosso histórico de profunda intolerância religiosa e suas continuidades no contemporâneo. Assim como os demais conflitos sociais, a intolerância religiosa não se trata simplesmente de um desvio ético praticado por indivíduos, um rompante de preconceito e irracionalidade. Ela é, também, reproduzida e mantida institucionalmente por meio de mediações que carregam consigo lógicas discriminativas no intuito de estabelecer determinada “ordem” de coisas ao invés de outra (Nogueira, 2020Nogueira, S. (2020). Intolerância Religiosa. São Paulo, SP: Pólen.).

Em nosso país, um dos aspectos de tal lógica que permeia nosso campo social é a da colonização, herdada desde as primeiras campanhas evangelizadoras dos jesuítas. Não é, todavia, a única, e mesmo ela se apresenta de diferentes formas conforme o contexto. A proeminência de casos de crimes de intolerância direcionados às religiões de matrizes africanas remonta uma lógica de higienização da cultura preta, etnocêntrica, racista e que, mais uma vez, reflete nossa constituição histórica (Nogueira, 2020Nogueira, S. (2020). Intolerância Religiosa. São Paulo, SP: Pólen.). A predominância da religião católica vinculada às instituições e agentes governamentais, por exemplo, fez com que o Brasil só tivesse condições de materializar sua laicidade após a Constituição de 1988 (Mariano, 2011Mariano, R. (2011). Laicidade à brasileira: Católicos, pentecostais e laicos em disputa na esfera pública. Civitas, 11(2), 238-258. doi: 10.15448/1984-7289.2011.2.9647
https://doi.org/10.15448/1984-7289.2011....
). Até aquele momento, o espiritismo, a umbanda e o candomblé, entre outras religiões, raramente encontravam amparo e defesa no Estado.

Ainda que hoje existam recursos jurídicos que denunciem mais assertivamente crimes de intolerância, não vemos um movimento de diminuição em sua ocorrência. Recentemente, crimes desse tipo atingiram um pico de registros durante as eleições presidenciais de 2018 no Brasil. Os dados do Disque 100 - rede de denúncias do governo federal - mostram que as religiões mais atacadas foram as de matrizes africanas, quase 35% dos casos que ocorreram no primeiro semestre de 2018 (Schwarcz, 2019Schwarcz, L. M. (2019). Sobre o autoritarismo brasileiro. São Paulo, SP: Companhia das Letras .).

Partindo de uma leitura psicanalítica e reconhecendo a condição estrutural dos conflitos sociais, nosso manuscrito terá como foco as motivações subjetivas que conduzem o sujeito a um posicionamento de intolerância religiosa. Ademais, a concepção de sujeito da psicanálise é intrinsicamente ligada às condições sócio-históricas que o envolvem e ao seu referencial simbólico (Rosa, 2004Rosa, M. D. (2004). A pesquisa psicanalítica dos fenômenos sociais e políticos: metodologia e fundamentação teórica. Revista Mal-Estar e Subjetividade, 6(2), 329-348. Recuperado de https://bit.ly/3PeT4MI
https://bit.ly/3PeT4MI...
). Trata-se, portanto, de uma tentativa de compreensão de como as mediações institucionais e estruturais de nossa ordem social encontram sua âncora afetiva na subjetividade dos indivíduos. Investigaremos, então, os mecanismos psíquicos que permitem um posicionamento intolerante, focando nossa atenção na construção de saber que molda os ideais dos sujeitos. Posteriormente, também, pretendemos observar alguns efeitos da intolerância religiosa em interface com o campo político, ilustrando sua articulação em eventos históricos e seus reflexos contemporâneos.

Para tal estudo, procuramos mobilizar a teoria psicanalítica como instrumental metodológico de pesquisa. Sendo um estudo teórico, envolve a submissão da teoria psicanalítica a uma análise crítica, possibilitando, dessa forma, a averiguação de sua coesão estrutural, de seus conceitos e das condições de sua efetivação como teoria (Couto, 2010Couto, L. F. (2010). Quatro modalidades de pesquisa em psicanálise. In F. Kyrillos Neto, & J. O. Moreira (Orgs.). Pesquisa em psicanálise: Transmissão na universidade (pp. 59-80). Barbacena, MG: UEMG.). Nosso recorte busca a articulação dos conceitos e da concepção de sujeito em psicanálise com as temáticas debatidas em sua contextualização histórica. A atenção às estruturas subjetivas que englobam os indivíduos de uma época, como aponta Birman (1994Birman, J. (1994). Psicanálise, ciência e cultura. Rio de Janeiro, RJ: Zahar.), podem gerar significativas contribuições na compreensão de problemáticas sociais como o poder, a crença, a ética e a violência, entre outras disciplinas. Essa abordagem psicanalítica reafirma a incompatibilidade do inconsciente freudiano com a ilusão individual, de sua independência e autonomia, de modo que, na dependência simbólica e nos laços sociais em que se constituem os sujeitos, encontramos os reflexos de um horizonte sociocultural (Rosa, 2004Rosa, M. D. (2004). A pesquisa psicanalítica dos fenômenos sociais e políticos: metodologia e fundamentação teórica. Revista Mal-Estar e Subjetividade, 6(2), 329-348. Recuperado de https://bit.ly/3PeT4MI
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).

Assim, para desenvolvermos nosso trabalho, faremos, primeiramente, a exposição de algumas das funções que a religião desempenha no campo social sob a ótica psicanalítica. Em seguida, introduziremos o conceito de narcisismo na obra freudiana buscando fundamentar nossa análise. Posteriormente, ao localizarmos algumas contribuições no pensamento lacaniano referente ao envolvimento religioso, faremos a articulação entre a teoria exposta e a problemática da intolerância religiosa. Ao fim, proporemos a reflexão de como os processos de identificação e intolerância podem atuar em campos sociais políticos, inclusive em nosso contemporâneo.

O esforço civilizatório e a agressividade como ódio

Antes de introduzirmos a problemática da intolerância, consideramos relevante a exposição de algumas elaborações gerais no campo psicanalítico a respeito da religião. Desde Freud, o estudo das religiões se apresenta como um meio de compreensão de temáticas mais gerais e amplas, como o surgimento da lei, das instituições e, principalmente, do esforço civilizatório. O foco, então, se dá mais na crença e no sujeito que crê do que no estudo dos objetos religiosos em si (Julien, 2010Julien, P. (2010). A psicanálise e o religioso: Freud, Jung e Lacan. Rio de Janeiro, RJ: Zahar .). A partir dessa abordagem, para nosso estudo, mostra-se importante a exposição de como a religião desempenha funções civilizatórias primordiais na sociedade e quais as possíveis consequências que derivam desse processo.

O movimento do progresso civilizatório, para Freud (1930/2010Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930), 1913/2012Freud, S.. (2012). Totem e Tabu. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.11, pp.14-244). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1913)), não é uma linearidade na qual o ser humana alcança cada vez mais emancipação e satisfação. A vida em sociedade demandaria certas condições afetivas e psicológicas para seu surgimento além de um preço bastante caro na limitação dos desejos dos indivíduos. Nesse ponto, a religião desempenharia um papel fundamental relacionado à diminuição do sofrimento na vida civilizada.

Para Freud (1930/2010)Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930), o sofrimento humano não provém apenas de percalços da natureza ou da nossa dificuldade em dominar os recursos que provêm nossa sobrevivência, mas também da convivência em sociedade, no se relacionar com o outro. Isso devido ao fato de que, para que seja possível a reunião de pessoas em uma civilização, seriam necessários o recalque e a inibição de uma série de pulsões. Na concepção psicanalítica, existem tanto pulsões libidinais quanto pulsões destrutivas que impedem o convívio perfeitamente harmônico entre os sujeitos, demandando meios de contenção.

Aqui, vale ressaltarmos, de forma breve, a concepção de agressividade na psicanálise freudiana. Em um primeiro momento (Freud, 1915/2010Freud, S. (2010). Os instintos e seus destinos. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 12, pp. 51-81). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1915)), o caráter agressivo e destrutivo das pulsões se caracterizava como parte das pulsões sexuais. Em oposição às pulsões de autoconservação, Freud via, no par sadismo-masoquismo, as tendências destrutivas constituintes do sujeito. Desse modo, o ato agressivo seria uma possível fonte de descarga da energia contida. Mais do que isso, o ódio seria, nesse sentido, mais arcaico do que o amor, pois revelaria o antagonismo entre um Eu que busca prazer e o mundo externo, representando inicialmente fonte de desprazer.

Tais pressupostos são desenvolvidos em “Além do princípio do prazer” (1920/2010Freud, S. (2010). Além do princípio do prazer. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 14, pp. 161-239). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1920)), no qual Freud estabelece uma distinção entre a satisfação pulsional e a busca pelo prazer. Isso porque, no âmbito psíquico, o equilíbrio da economia libidinal seria prioritário em relação à obtenção de prazer do eu. A ambivalência entre amor e ódio, portanto, é ressaltada à medida que representa descargas pulsionais que buscam a baixa tensão de energia libidinal. Sendo, então, a agressividade uma tendência possível de satisfação, cabe à cultura criar mecanismos que a contenham, a recalquem ou a direcionem para objetos que não comprometam a harmonia civilizatória.

Ao mesmo passo, uma exigência de recalque acarreta alguma insatisfação psíquica. Isso nos leva a pressupor que quanto mais nos afastamos do estilo de vida de nossos antepassados, caminhando em direção à civilização, mais aumenta nosso mal-estar. Nas palavras de Freud (1930/2010)Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930): “O homem civilizado trocou um tanto de felicidade por um tanto de segurança” (p. 82).

O esforço civilizatório seria, de fato, tamanho e não poderia abrir mão de compensações que o amparassem. Ao ceder possibilidades de satisfação pulsional em prol de maiores chances de sobrevivência, conforto e segurança, inicia-se, também, a busca por fontes alternativas de felicidade. A colaboração com outros sujeitos irá implicar a necessidade de uma ligação libidinal entre eles, algo que os mantenha minimamente unidos e identificados a favor de seus objetivos em sociedade (Freud, 1930/2010Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930)). Caso contrário, estariam em acordo apenas à medida que seus interesses imediatos convergissem. É nesse ponto que, para Freud, não só em seu tempo, como também nos primórdios da civilização, a religião teve seu papel fundamental.

Em “Totem e Tabu” (1913/2012Freud, S.. (2012). Totem e Tabu. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.11, pp.14-244). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1913)), Freud investiga a origem da civilização, da religião e das instituições de modo geral. No texto, uma das questões investigadas é a seguinte: qual elo estabelece a relação entre totemismo e exogamia? Na época em que foi escrito, antropólogos e sociólogos debatiam sobre o porquê de a exogamia estar presente na maioria das sociedades totêmicas apesar de não existir indício de causalidade alguma entre as duas instituições. Não coincidentemente, segundo o autor, as duas instituições dizem respeito às duas dificuldades fundamentais do processo civilizatório: a coesão social entre os indivíduos e a conciliação das pulsões recalcadas.

Os afetos ambivalentes de amor e ódio seriam direcionados para o totem, um substituto metafórico para a figura do pai, deslocando a agressividade para os ritos ao invés do ato. E, para a harmonia entre os indivíduos prevalecer, seria instituída a proibição do relacionamento sexual entre os familiares e os membros do clã. Paralelamente, a identificação entre eles é intensificada pelo compartilhamento da culpa e do ideal paterno simbolizado no totem. A culpa seria, também, condição para o cumprimento da civilização, uma vez que, para a psicanálise, está intimamente ligada à contenção das pulsões (Freud, 1913/2012Freud, S.. (2012). Totem e Tabu. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.11, pp.14-244). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1913)). Resumidamente, conforme Freud, esse sistema social, que seria o precursor dos demais sistemas religiosos, é uma tentativa de contenção da agressividade, ao mesmo tempo em que atua como construção auxiliar no amparo de sofrimentos e impasses da vida em sociedade.

Vemos, pois, que a religião é capaz de cumprir uma dupla função subjetiva para os membros de uma sociedade: compensar a felicidade renunciada pela não satisfação de nossas pulsões e ligar-nos subjetivamente pelo compartilhamento de ideias e afetos. Pretendemos concentrar nossa investigação, pois, nesta segunda função descrita, o laço afetivo e social entre os indivíduos produzido a partir do envolvimento religioso, e como, em certos casos, a constituição desse laço pode derivar traços relacionados à intolerância. Para tal, faremos, antes, uma exposição sobre a ideia de narcisismo em Freud e sobre o processo de construção do Eu na psicanálise.

Narcisismo e laço social

Seguindo os desdobramentos de algumas ponderações feitas em seu “Totem e Tabu”, Freud (1913/2012)Freud, S.. (2012). Totem e Tabu. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.11, pp.14-244). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1913) iria investigar mais a fundo, em textos posteriores, quais eram as condições necessárias para que o sujeito estabelecesse um laço afetivo com o outro. Essa investigação, com grande proximidade ao tema do processo civilizatório, iria colocar em debate o tema da identificação; e, como um norteador das articulações teóricas, o conceito de narcisismo ganharia destaque, principalmente em “Introdução ao narcisismo” (1914/2010Freud, S. (2010). Introdução ao narcisismo. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 12, pp. 13-50). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1914)) e “Psicologia das massas e análise do eu” (1921/2011d). A conceituação da ideia de narcisismo surgiu na tentativa de compreender fenômenos clínicos que parecem resgatar, em adultos, traços de um estado psíquico característico do desenvolvimento infantil: o investimento pulsional direcionado ao próprio eu (Freud, 1914/2010Freud, S. (2010). Introdução ao narcisismo. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 12, pp. 13-50). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1914)).

Nos primórdios da formação do aparelho psíquico, para Freud, não haveria uma distinção clara e precisa entre o que é o eu e o que é o outro de modo que as sensações de satisfação acometidas ao recém-nascido são percebidas como pertencentes e provenientes de si. O bebê lactante não localiza o estímulo que sacia sua fome como vindo de fora: “No início, tudo é Eu, depois separa de si um mundo externo” (Freud, 1930/2010Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930), p. 19). Esse estágio, no qual não haveria delimitação subjetiva entre o indivíduo e o mundo, de forma que a satisfação e as pulsões vêm de si para si, é denominado de narcisismo primário (Freud, 1914/2010Freud, S. (2010). Introdução ao narcisismo. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 12, pp. 13-50). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1914)). Há, por isso, um trabalho de separação das fronteiras entre o interior e o exterior a ser feito no desenvolvimento do sujeito. À medida que os estímulos externos são devidamente localizados, o investimento pulsional se desloca do Eu para os objetos, o que permite afirmar um enfraquecimento do narcisismo descrito até aqui.

Contudo, o que Freud afirmou posteriormente foi a existência de um segundo momento do narcisismo, presente também nos estados mais maduros do desenvolvimento psíquico. Simultâneo ao processo de desinvestimento do Eu, ocorre, em um segundo plano, a construção de um ideal de Eu. Tal ideal consistiria em uma série de modelos provenientes dos pais, da escola e das normas socioculturais, entre outros ideais, internalizados ao longo da história do indivíduo. Nas palavras de Freud (1914/2010)Freud, S. (2010). Introdução ao narcisismo. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 12, pp. 13-50). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1914):

Para o Eu, a formação do ideal seria a condição para a repressão. A esse ideal do Eu dirige-se então o amor a si mesmo, que o Eu real desfrutou na infância. O narcisismo aparece deslocado para esse novo Eu ideal, que como o infantil se acha de posse de toda preciosa perfeição. Aqui, como sempre no âmbito da libido, o indivíduo se revelou incapaz de renunciar à satisfação que uma vez foi desfrutada. Ele não quer se privar da perfeição narcísica de sua infância, e se não pôde mantê-la, perturbado por admoestações durante seu desenvolvimento e tendo seu juízo despertado, procura readquiri-la na forma nova do ideal do Eu. O que ele projeta diante de si como seu ideal é o substituto para o narcisismo perdido na infância, na qual ele era seu próprio ideal. (p. 40)

Podemos dizer, então, que a inserção do homem na relação social com o outro implica, já em sua infância, um distanciamento do narcisismo primário. Já temos aqui um aspecto gerador de mal-estar no processo de pertencer a uma civilização: a necessidade de abandonar o estado inicial onde o Eu é “todo-abrangente” (Freud, 1930/2010Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930)). Mal-estar que, como toda perda de satisfação, demanda uma compensação. E interessa-nos observar como, segundo Freud, a mesma operação que busca resgatar esse sentimento primordial perdido também será o que possibilitará a construção de identificações entre as pessoas e o laço social.

À medida que o sujeito abre mão do narcisismo primário e desloca seu investimento afetivo no ideal erguido para si, surge a possibilidade da sobreposição e da assemelhação entre o ideal de si e o do outro. Afinal, tais ideais apenas são construídos segundo elementos externos, presentes nas mediações da cultura que envolve o sujeito, desde a família, primeira instância mediadora, até padrões sociais mais amplos. Desse modo, surge a possibilidade de que os objetivos de múltiplos indivíduos convirjam não somente na ordem prática das necessidades de sobrevivência, como também na ordem subjetiva através do reforçador narcísico que liga libidinalmente as pessoas por meio de um ideal de Eu que é compartilhado. Uma vez que o investimento narcísico deixa de ser em direção a ele próprio para tomar como alvo um Eu “de acordo” com os outros, a coesão entre os membros de um grupo passa a ser consolidada afetivamente pela identificação. Nas palavras de Freud (1921/2011d), “o amor tem atuado como fator de cultura, no sentido de transpor egoísmo em altruísmo” (p. 98).

Encontramos a ressonância de tal ideia em “Totem e Tabu” (Freud, 1913/2012Freud, S.. (2012). Totem e Tabu. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.11, pp.14-244). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1913)) quando observamos o papel da religião no esforço civilizatório. Se o processo descrito pode ser observado no ideal de Eu construído a partir da imagem de um líder de grupo, no mito de “Totem e Tabu” vemos o mesmo efeito no ressurgimento do Pai que morre e retorna como ideal. É a igualdade do ideal compartilhado que possibilita a ligação narcísica entre os membros do clã. Em outras palavras, os indivíduos foram capazes de tratar os outros membros de seu grupo como iguais à medida que cada qual se identificou com um ideal de si, que também foi compartilhado pelos outros. Ao investir amor em seu ideal, gerando a satisfação narcísica, investe, também, afetivamente em seu grupo e ideal social. A religião seria, pois, o recurso simbólico com o qual tal operação é realizada além de desempenhar outras funções no amparo do mal-estar social.

Um ponto de significativa importância para nosso estudo é determinarmos o conteúdo de tal identificação. Na perspectiva psicanalítica, o afeto é concebido como uma ligação ambivalente, podendo assumir a forma ora de amor, ora de ódio; algo proposto na elaboração do complexo de Édipo e observado por Freud (1913/2012)Freud, S.. (2012). Totem e Tabu. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.11, pp.14-244). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1913) em fenômenos clínicos e na relação dos membros da tribo totêmica com seu totem. A identificação estabelecida entre os sujeitos, da forma como descrita, carrega não somente o amor em seu conteúdo, como também o ódio.

Vale lembrarmos a ambivalência entre as pulsões de vida e de morte. No âmbito pulsional, há uma volatilidade que permite a passagem de um ao outro no sentido de que ambas se referem à regulação do equilíbrio libidinal. A inserção social promove uma contenção da agressividade na forma de suas leis. O ódio, portanto, demanda mecanismos que o direcionem a objetos que não comprometam a ordem social (Freud, 1915/2010Freud, S. (2010). Os instintos e seus destinos. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 12, pp. 51-81). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1915), 1920/2010Freud, S. (2010). Além do princípio do prazer. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 14, pp. 161-239). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1920)). Um dos caminhos possíveis, indicado por Freud, é o da internalização, representado pela instância do Supereu. A agressividade aqui se voltaria para o próprio Eu, direcionando o ódio em interditos e punições a si próprio. Entretanto, também é possível a canalização das pulsões agressivas em objetos que não comprometam diretamente o ordenamento social e as identificações estabelecidas.

Desse modo, a formação dos grupos pode acarretar a expiação do volume de ódio que compõe os laços interiores em uma figura exterior. Em um impulso de proteção, o grupo toma a diferença como ameaçadora, direcionando seu ódio aos grupos e indivíduos nos quais essa diferença é reconhecida (Freud, 1921/2010Freud, S. (2010). Psicologia das massas e análise do eu. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 15, pp. 14-113). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1921)). Nesse contexto, produz-se uma dinâmica na qual o ideal precisa ser constantemente reforçado, enquanto elementos que se distanciem dele devem ser segregados, atacados ou eliminados.

Antes de prosseguirmos para outras implicações do conteúdo exposto até aqui, faremos uma breve introdução à perspectiva lacaniana a respeito do envolvimento religioso. A fim de empreendermos em nossa investigação conceitos formulados pelo autor, faz-se essencial compreendermos quais as descontinuidades entre seu pensamento e o de Freud a respeito do tema da religião. A diferença do contexto cultural e do instrumental teórico apropriado por Lacan, seus pressupostos epistemológicos e antropológicos, gera reverberações importantes na maneira como a psicanálise concebe e articula seus conceitos ao debruçar-se sobre a religião.

Da ilusão ao discurso: Lacan e a religião

A dedicação de Freud na análise do envolvimento religioso permeia diferentes fases de sua produção teórica. Duas chaves de interpretação surgem referentes à temática: a da neurose e a da ilusão. Em ambas, a religião é tratada como fruto de um desejo; um desejo ambivalente que procura reconciliar a culpa pelas pulsões recalcadas, retomar a proteção paterna da infância, aliviar o desamparo dos sofrimentos cotidianos e prescrever normas de comportamentos sociais (Freud, 1927/2010Freud, S.. (2010). O futuro de uma ilusão. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.17, pp.231-301). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1927)). A interpretação freudiana, entretanto, ao colocar o amparo religioso para os conflitos psíquicos como semelhantes aos modelos neuróticos em sua “natureza ilusória”, aponta para sua possível superação em detrimento do saber científico.

Todavia, é no trabalho de Lacan que o saber produzido pela religião é reposicionado em sua função subjetiva. Ao retomar os estudos de Freud na temática, os referenciais teóricos apropriados pelo autor, como a antropologia estrutural e a fenomenologia, possibilitaram a localização da problemática religiosa na relação estrutural do sujeito com a verdade (Drawin & Kyrillos Neto, 2018Drawin, C. R., & Kyrillos Neto, F. (2018). Psicanálise e religião: O deslocamento da problemática filosófica, de Freud a Lacan. Tempo Psicanalítico, 50(1), 143-173. Recuperado de https://bit.ly/3NYwqaa
https://bit.ly/3NYwqaa...
). Nesse aspecto, o cientificismo freudiano, que aponta para a superação da religião pelo desenvolvimento da ciência, é problematizado com a ideia de diferentes formas de produção de saber. É em tal conjuntura que Lacan (1974/2005)Lacan, J. (2005). O triunfo da religião precedido de discurso aos católicos. Rio de Janeiro, RJ: Zahar . (Trabalho original publicado em 1974) afirma a força do discurso religioso como uma fonte quase inesgotável de sentido, pronta para explicar os mais diversos dilemas que surgirem e de aliviar as diferentes formas de mal-estar e sofrimento do sujeito.

Em seu seminário “Livro 17: O avesso da psicanálise” (Lacan, 1992Lacan, J. (1992). O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise, 1969-1970. Rio de Janeiro, RJ: Zahar .), ao utilizar a categoria conceitual “discurso”, o autor ressalta sua capacidade em proporcionar construções de sentido que façam a mediação simbólica do sujeito com o mundo. Reformulando, então, a oposição iluminista entre verdade e ilusão, o pensamento teológico e o envolvimento religioso são conceituados em suas formas discursivas. Isso significa, ao invés de pressupor uma verdade e medir qual conhecimento a alcança da melhor maneira, observar quais efeitos subjetivos as diferentes construções de saber produzem nos sujeitos e quais verdades produzem. Tal conceituação leva Lacan à investigação das características específicas do discurso religioso.

Um dos pontos nodais no qual Lacan (1966/1998a)Lacan, J. (1998a). A ciência e a verdade. In Escritos (V. Ribeiro, Trad., pp.869-892). Rio de Janeiro, RJ: Zahar . (Trabalho original publicado em 1966) o situa é o de causa final. Buscando dialogar com as teorias filosóficas a respeito de como o conhecimento é construído, o autor retoma a ideia de causalidade em Aristóteles. Na concepção do filósofo grego, o saber não seria nada mais do que o conhecimento das causas em seus diferentes níveis: a causa material (do que as coisas são feitas), a causa formal (o que faz as coisas serem como de fato são), a causa eficiente (o que transforma a matéria) e a causa final (o objetivo para que as coisas são feitas). Aristóteles pontua que todo o conhecimento se firma na possibilidade de investigar essa variedade de porquês das coisas, sendo que o saber sobre a causa final corresponde ao saber último sobre a verdade dos objetos e seres no mundo (Lalande, 1985Lalande, A. (1985). Vocabulário técnico e crítico da filosofia. Lisboa, Portugal: Rés.).

Com base nessa noção, articulada a outros conceitos, Lacan (1966/1998a)Lacan, J. (1998a). A ciência e a verdade. In Escritos (V. Ribeiro, Trad., pp.869-892). Rio de Janeiro, RJ: Zahar . (Trabalho original publicado em 1966) propõe que o indivíduo religioso delega a Deus a tarefa da causa final, impedindo o seu acesso à verdade. Ou seja, o saber fornecido pela religião abrange desde questões fundamentais como a origem da humanidade, passando pela recomendação cotidiana de costumes, até aos acontecimentos previstos acerca de um juízo do fim do mundo. Portanto, ao se organizarem como uma doutrina para o final dos tempos, abrangendo uma cosmovisão do início e do meio, as elaborações teológicas são capazes de oferecer uma construção de saber totalizante.

Construções de sentido dessa natureza são capazes de subtrair o real em meio às suas elaborações, ocultando a falta existente em todo discurso. Lacan, inclusive, traça um paralelo entre o discurso religioso e o discurso político. Ambos estão baseados na relação de mestria. Seu caráter totalizante permite “transmitir a ideia de satisfação e completude” (Lacan, 1992Lacan, J. (1992). O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise, 1969-1970. Rio de Janeiro, RJ: Zahar ., p. 29), situando a causa que movimenta os sujeitos que compartilham dessa subjetividade como a causa “final”, o propósito último de tudo o que há.

Dessa breve exposição, podemos depreender uma série de possíveis efeitos subjetivos derivados do envolvimento religioso a serem debatidos adiante no texto. Antes, porém, buscando abordá-los com a fundamentação devida, apresentaremos a seguir algumas considerações sobre a constituição do sujeito na perspectiva psicanalítica lacaniana.

Dos discursos que formam um “eu”

A maneira como a psicanálise concebe o sujeito desde Freud vai na contramão da ideia de uma unidade, de um “eu” bem delimitado e centralizado. “É uma suposição necessária, a de que uma unidade comparável ao Eu não existe desde o começo do indivíduo; o Eu tem que ser desenvolvido”, já disse Freud (1914/2010Freud, S. (2010). Introdução ao narcisismo. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol. 12, pp. 13-50). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1914), pp. 18-19). Ao levar em conta os efeitos do inconsciente na clínica, o desconhecimento do próprio indivíduo sobre si indica uma ruptura do ego. À procura de uma localização conceitual na obra lacaniana que dialogue com a proposta investigativa do texto, direcionamos a atenção para o aspecto imaginário do “eu”, para a miragem de sua integralidade e para seu processo de construção em meio às mediações que o cercam.

Em um de seus primeiros textos psicanalíticos, “O estádio do espelho como formador da função do eu”, Lacan (1966/1998b)Lacan, J. (1998b). O estádio do espelho como formador da função do eu. In Escritos (V. Ribeiro, Trad., pp.96-103). Rio de Janeiro, RJ: Zahar . (Trabalho original publicado em 1966) demarca o direcionamento de sua conceituação sobre o sujeito. Para o autor, o “eu” se constituiria a partir da implicação de um outro, pelo qual sua imagem seria apresentada. A ideia do estágio do espelho se refere a esse processo. A criança, ao ver sua imagem refletida e ao ouvir outra pessoa apontando e indicando “aquela imagem é você”, inaugura a construção imaginária do que chamamos de “eu”; algo que remete ao olhar de narciso sob sua imagem refletida e a consequente paixão que o arrebata. Vale ressaltarmos: paixão não por si, mas pela imagem.

É nesse contexto que podemos considerar os discursos que se encaminham do Outro não como mera comunicação, mas como significantes formadores. Eles participam da formação do sujeito, oferecem elementos de identificação e influenciam na maneira como o indivíduo irá se posicionar frente ao mundo, a si mesmo e nas relações estabelecidas com os outros. E a partir das mediações simbólicas que nos rodeiam, construímos uma narrativa que possibilitará identificarmos os contornos do que chamamos de Eu.

Essas identificações, contudo, não correspondem perfeitamente ao sujeito pelo fato mesmo de este não ser uma unidade autônoma, mas dividido e dotado do inconsciente. O que chamamos de “eu”, portanto, se refere mais a uma imagem ideal da qual procuramos nos aproximar e sob a qual nossa vinculação libidinal busca reforçar e, sobretudo, amar. Amamos o que é o espelho não de mim, mas do meu Eu, como afirma Lacan (1974/2005)Lacan, J. (2005). O triunfo da religião precedido de discurso aos católicos. Rio de Janeiro, RJ: Zahar . (Trabalho original publicado em 1974):

Mas o que amo, na medida em que existe um eu a que me vinculo por uma concupiscência mental, não é esse corpo cujo batimento e pulsação escapam mais evidentemente ao meu controle, mas uma imagem que me engana ao me mostrar meu corpo em sua Gestalt, sua forma. (pp. 38-39)

Encontramos, então, nas formulações lacanianas expostas, os ecos e desdobramentos da ideia de identidade narcísica estudada por Freud. Tal ressonância se torna ainda mais clara quando abordamos os ideais de Eu do sujeito relacionados ao fenômeno da intolerância.

O amor ao “eu” mais próximo

Ao dissertar sobre o papel da religião na sociedade e sua função na contenção das pulsões agressivas e destrutivas do indivíduo, Freud (1930/2010)Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930), em “O mal-estar na civilização”, empreende uma análise do popular ensinamento “Ama teu próximo como a ti mesmo”. Como o autor ressalta, essa máxima remonta tempos e culturas anteriores à sua consolidação enquanto mandamento cristão. Ela é, em última instância, uma recomendação direcionada na tentativa de harmonizar os indivíduos em sociedade, contornar seus conflitos e buscar a coesão social.

A exigência da tarefa prescrita pelo ensinamento retoma a questão da ambivalência dos afetos humanos na identificação. Debruçando-se na temática, Freud (1930/2010)Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930) ressalta a hostilidade natural por meio da qual nossos afetos se manifestam quando desprovidos de identificação e direcionados a um outro que não consideramos como semelhante:

Esse desconhecido não apenas não é digno de amor em geral; tenho de confessar, honestamente, que ele tem mais direito à minha hostilidade, até ao meu ódio. Ele não parece ter qualquer amor a mim, não me demonstra a menor consideração. Quando lhe traz vantagem, não hesita em me prejudicar, não se perguntando mesmo se o grau de sua vantagem corresponde à magnitude do dano que me faz. (pp. 74-75)

Retomamos aqui a potência da pulsão como elemento de agressividade, o que permite compreendermos o amor como um mecanismo que busca sua contenção, mas que também carrega consigo a possibilidade da conversão em ódio. A dificuldade existente em amar o próximo esbarra na questão de até onde é possível nos identificarmos com o outro. Há a condição de que enxergamos no outro algo nosso ou de que amamos o outro nos nossos termos. Aqui, a ideia do “como a ti mesmo” remete ao ideal de eu narcísico do laço social:

Quando amo a outrem, este deve merecê-lo de algum modo. Ele o merece, se em importantes aspectos semelha tanto a mim que posso amar a mim mesmo nele; ele o merece, se é tão mais perfeito do que eu que posso amar nele o meu ideal de mim; eu tenho que amá-lo se ele é filho de meu amigo, pois a dor do amigo, se algo lhe acontecesse ao filho, seria também minha dor, eu teria de compartilhá-la. Mas se ele me é desconhecido e não me pode atrair por nenhum valor próprio, nenhuma significação que tenha adquirido em minha vida emocional, dificilmente o amarei. (Freud, 1930/2010Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930), p. 74)

A questão nos revela, pois, a existência de uma alteridade irredutível do tal próximo, que impossibilita nossa identificação para além de nossa própria imagem no outro. A condição em que estou sujeito a amar o outro, então, é a de que nosso ideal de eu seja compartilhado em alguma medida. O altruísmo se revela mais uma vez em egoísmo. Assim, nessa forma de amor, existe a suposição de um saber universal sobre o que é bom para o outro. “Consequentemente, o ‘eu quero o teu bem’ repousa sobre o ‘eu sei o que é bom para ti’ porque ‘eu te amo como a mim mesmo’” (Julien, 2010Julien, P. (2010). A psicanálise e o religioso: Freud, Jung e Lacan. Rio de Janeiro, RJ: Zahar ., p. 29). Nesse aspecto, em nome de determinado discurso adotado pelo sujeito, procura-se submeter o outro à sua vontade, uma obediência determinada pelo “bem maior”, norteado não por uma razão universal, mas por uma universalização narcísica do eu (Rosário, 2014Rosário, A. B. do. (2014). Ética e subjetividade: Juventude no Ethos capitalista (Tese de Doutorado). Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte.). Mais ainda, quando esse amor narcísico é recusado, questionado ou se vê frustrado por algum motivo, é o ponto onde vemos a passagem do amor ao ódio; em nosso caso, o ódio na forma de intolerância religiosa.

Ao observar aspectos coletivos da identificação grupal, Freud (1921/2011d), em “Psicologia das massas e análise do eu”, descreve tipos de relacionamentos em que podemos observar a prática da intolerância. Segundo o autor, principalmente em ocasiões nas quais a unidade imaginária do grupo é confrontada, questionada, o medo da desintegração grupal poderia manifestar impulsos severamente hostis contra outras pessoas. Quanto mais consolidadas e inflexíveis forem as exigências do ideal de Eu existente no grupo, maiores serão os esforços direcionados no objetivo da afirmação desses ideais. Isso porque, como vimos, a economia libidinal do sujeito está vinculada ao próprio ideal compartilhado pelo grupo de modo que, caso algo atinja esses ideais, ou ameace atingir, também o fere subjetivamente.

Ao buscar o fortalecimento e a manutenção dos laços dentro de um determinado espaço de identificações, pode existir a tentação de projetar no outro o ódio existente nos afetos ambivalentes que circulam internamente. A suposta solidez do grupo dificilmente é livre de conflitos internos, os quais, em momentos de crise, quando seus ideais se mostram frustrados, se tornam mais suscetíveis à expiação do ódio no outro. No âmbito da religião, enquanto provedora de recursos simbólicos quase inesgotáveis, podemos observar movimento semelhante tanto em tendências históricas quanto em conflitos e acontecimentos atuais.

O conflito entre o cristianismo e as crenças e costumes dos povos originários do Brasil segue gerando, em alguns núcleos, ações intolerantes, violência material e simbólica, que remontam os tempos de nossa colonização. Temos recentemente o caso de Perpera, um pajé da tribo Paiter Suruí1 1 O povo Paiter tem seu contato oficial com a sociedade ocidental datado no ano de 1969. Desde então, as aproximações entre os povos vêm trazendo profundas mudanças sociais; entre elas, a dinâmica entre a cultura religiosa original e a tensão com diferentes tipos de “missões evangelizadoras”. , que deixou o posto de autoridade espiritual da tribo depois que seus conhecimentos, ritos e sensibilidade com as entidades da floresta foram rotulados como diabólicas por um pastor evangélico neopentecostal que atua na região (Bodanzky & Bolognesi, 2018Bodanzky, L. (Produtora), & Bolognesi, L. (Diretor). (2018). Ex-Pajé [Filme]. Brasil: Buriti Filmes.).

A atribuição da figura do diabo às religiões distintas do cristianismo no Brasil também afeta historicamente e de maneira profunda as religiões de matrizes africanas. São conhecidos os recorrentes crimes cometidos em relação aos centros religiosos, como no recente ataque a um terreiro de Umbanda em Ribeirão Preto/SP2 2 Em 3 de fevereiro de 2020, um grupo de pelo menos 30 pessoas atacou um terreiro de umbanda em Ribeirão Preto/SP durante uma reunião na casa com uma bomba caseira. Um dos umbandistas foi espancado. Vários dos presentes, ao tentarem deixar o local, foram atacados com socos, chutes e pauladas. (Averbuck, 2020Averbuck, C. (2020, 6 de fevereiro). Terreiro é alvo de ataque com bomba em Ribeirão Preto. Revista Fórum. Recuperado de https://bit.ly/3yvoEig
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). Além disso, temos a intolerância no âmbito discursivo. O orixá Exu, que é frequentemente demonizado em discursos do sincretismo cristão, ganha a atribuição das mais diversas mazelas que assolam os indivíduos. Sobre isso, eis uma comparação feita por Freud (1913/2012)Freud, S.. (2012). Totem e Tabu. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.11, pp.14-244). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1913): “O Diabo seria o melhor expediente para desculpar Deus, teria a mesma função econômica de descarga que têm os judeus no mundo ideal ariano” (p. 88).

Ao mesmo tempo em que existe uma narrativa que caracteriza o diferente como um inimigo, a missão de combatê-lo é tomada como um benefício a ambos; justificam e compreendem a submissão natural do outro como um “bem maior”, um favor e dever que estão cumprindo. É o que embasa o fundamento teológico, por exemplo, das missões evangelizadoras. Levar a salvação para o próximo, nesse caso, significa submeter o outro à minha vontade, amá-lo como a mim mesmo segundo meu campo de valores e ideais (Freud, 1930/2010Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930)). Dessa maneira, o bem ao próximo pode tornar-se, em uma configuração de intolerância religiosa, o apagamento ou enfrentamento do próximo em detrimento do meu bem, ou do bem segundo meu ideal de mundo, mesmo que para isso seja preciso violentar e eliminar o outro.

Das universalizações, do eu, do todo

O recurso de atribuir características monstruosas ao que é apenas diferente é muito comum em diversos conflitos sociais. Algo que Dunker (2019Dunker, C. I. L. (2019). Psicologia das massas digitais e análise do sujeito democrático. In S. Abranches et al. (Eds.). Democracia em risco? 22 ensaios sobre o Brasil hoje (pp. 116-135). São Paulo, SP: Companhia das Letras.) chama, no campo político, de “retóricas da divisão”: a tentativa de transformar o outro em um inimigo que precisa ser derrotado; novamente, o fortalecimento das identificações do ideal pelo direcionamento da parcela do ódio a um elemento externo. Como aponta Freud (1930/2010)Freud, S. (2010). O mal-estar na civilização. In Obras completas de Sigmund Freud (P. C. L. Souza, Trad., Vol.18, pp.13-123). São Paulo, SP: Companhia das Letras . (Trabalho original publicado em 1930), “Sempre é possível ligar um grande número de pessoas pelo amor, desde que restem outras para que se exteriorize a agressividade” (pp. 80-81).

A religião, nesse contexto, possui recursos simbólicos poderosos que servem à retórica de divisão na construção da identidade de uma nação e na desqualificação do “outro”. No Brasil, alguns exemplos ao longo da história ilustram bem tal fenômeno. Fausto (2001Fausto, B. (2001). O pensamento nacionalista autoritário. Rio de Janeiro, RJ: Zahar .) cita o manejo de Vargas na instrumentalização da religião durante o Estado Novo. Atos como a inauguração da estátua do Cristo Redentor no Corcovado - um grande espetáculo simbólico - e a introdução do ensino religioso facultativo nas escolas públicas e da Liga Eleitoral Católica são algumas das ações do governo que insistiam na “recuperação de valores perdidos”.

Também, podemos citar, nas vésperas da ditadura militar, a “Marcha pela Família com Deus pela Liberdade”. A manifestação católica de 1964, em repúdio ao governo de João Goulart e seu suposto viés comunista, afirmava que os valores religiosos, patrióticos e morais da sociedade brasileira estavam prestes a serem destruídos pela tendência “comunizante” do, à época, presidente. Até então uma das maiores manifestações públicas da história do país, a marcha acabou legitimando o golpe de 1964 por meio de sua ressignificação: tratava-se, para os manifestantes, de um pedido às Forças Armadas por uma intervenção que salvasse as instituições (Guisolphi, 2009Guisolphi, A. J. (2009). As Marchas da Família com Deus pela Liberdade: Ideologias e práticas católicas no golpe militar de 1964. Cadernos do CEOM, 22(31), 453-458. Recuperado de https://bit.ly/3IvsgFC
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).

Tais considerações podem ser úteis na compreensão do aumento no registro de denúncias relacionadas à intolerância durante o período eleitoral brasileiro de 2018. Um dos candidatos na disputa, reconhecidamente apoiado por vários líderes religiosos de vertentes neopentecostais, não se furtou de construir a imagem de sua campanha com recursos simbólicos vindos da religião. “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”, seu lema de campanha, reflete o posicionamento de que, para ele, “não tem essa de estado laico não” (Rocha, 2018Rocha, P. da (2018, 27 de outubro). Umbandista Paulo da Rocha: “Eleições como provação para o crescimento espiritual”. Revista Fórum. Recuperado de https://bit.ly/3uGUPKK
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). Conhecido, ainda, por demonstrar publicamente discursos e atitudes autoritários como a defesa da ditadura, sua campanha eleitoral teve como uma das estratégias a tal retórica da divisão mencionada. Em meio a vídeos eleitorais sendo transmitidos durante cultos nas igrejas por pastores neopentecostais (“Em culto”, 2018Em culto, Bolsonaro aparece em vídeo e pastores pedem votos: “17 é outra coisa e precisa estar lá também” (2018, 3 de outubro). Revista Fórum. Recuperado de https://bit.ly/3IxizGE
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), podemos perceber um movimento semelhante ao descrito: a construção e o fortalecimento de identificações que transformam o diferente em inimigo da pátria, do cristianismo, dos bons costumes, da moral e de uma série de elementos de identificação que constroem a imagem de um “cidadão de bem”.

Claro, não se trata de generalizarmos os tipos de envolvimento religioso possíveis. Existe a possibilidade de uma produção de saber, como a religiosa, buscar não o laço pela identificação, mas em uma relação de alteridade. Nas palavras de Lacan (1966/1998c)Lacan, J. (1998c). Kant com Sade. In Escritos (V. Ribeiro, Trad., pp. 776-803). Rio de Janeiro, RJ: Zahar . (Trabalho original publicado em 1966), uma relação que busque tornar-se “suficientemente vizinho da própria maldade para nela reconhecer o próximo” (p. 801); considerar que é possível que estejamos mais próximos do que nos causa náusea no outro do que do ideal de eu que buscamos nos aproximar. Nesse caminho, Zizek (2003Zizek, S. (2003). O real da ilusão cristã: Notas sobre Lacan e a religião. In V. Safatle (Org.), Um limite tenso: Lacan entre a filosofia e a psicanálise (pp. 169-188). São Paulo, SP: Unesp.), por exemplo, ressalta o abandono de Cristo por Deus, que o aproxima da dimensão humana, tornando visível a dimensão divina do homem mortal. Dessa perspectiva, a própria religião pode também ser a base para um reconhecimento dessa alteridade do outro, um saber que proponha o diálogo com a diferença, subvertendo a dimensão narcísica de amar ao próximo como a si mesmo.

Todavia, quando se trata da construção de narrativas mitológicas que disputam o campo da interpretação histórica, a fim de mobilizar as massas em direção a um posicionamento autoritário, o envolvimento religioso, como vimos, possui recursos significativos para construir laços de identificação entre os sujeitos e moralizar os objetivos políticos. Trata-se de uma conhecida e explorada manobra de engajamento das massas, uma forma de envolver os indivíduos em uma causa que diga respeito aos discursos e ideais que constituem sua subjetividade, seus valores e sua visão de si e do mundo.

Considerações finais

Sob a ótica de Lacan (1966/1998a)Lacan, J. (1998a). A ciência e a verdade. In Escritos (V. Ribeiro, Trad., pp.869-892). Rio de Janeiro, RJ: Zahar . (Trabalho original publicado em 1966), ao se referir ao discurso religioso como um discurso da causa final, fica nítida a força subjetiva com a qual tais discursos afetam o sujeito. Sua crença não é apenas um discurso em que acredita, mas passa a se constituir, subjetivamente, como o elemento último que norteia suas ações no mundo e o sentido de todas as coisas. Ao assumir o discurso em que se crê como uma causa final, o sujeito assume também o risco de não ser jamais confirmado pelos fatos provenientes da realidade, provocando nele um cerceamento subjetivo (Kyrillos Neto & Drawin, 2019Kyrillos Neto, F., & Drawin, C. R. (2019). Crença religiosa e final de análise: O sujeito frente à elaboração de saber. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 71(2), 99-113. doi:10.36482/1809-5267.ARBP2019v71i2p.99-113
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).

Não por coincidência, Lacan (1992Lacan, J. (1992). O Seminário, livro 17: O avesso da psicanálise, 1969-1970. Rio de Janeiro, RJ: Zahar .) situa os discursos políticos na mesma categoria que a religião, tomando em conta que seu aspecto totalizante seria “imanente ao político como tal. Essa noção é sempre usada na pregação dos partidos políticos para transmitir a ideia de satisfação e completude” (p. 29). A história, infelizmente, não contraria o fato de que uma das interfaces entre religião e política é o totalitarismo. É nesse sentido que a segregação, o estigma e a intolerância podem operar como fortalecedores dos ideais com os quais nos identificamos. Por consequência, investimos ainda mais no nosso próprio ideal de Eu, obtendo a recompensa narcísica em nossa economia subjetiva.

É possível que, dessa forma, os discursos religiosos, assim como sua interface político-ideológica, encontrem sua âncora afetiva nos sujeitos, o ponto onde a economia libidinal permite a internalização dos valores de uma tradição. Temos, pois, a potência do discurso religioso reverberando na história como elemento de identificação, organização e orientação de grupos sociais em confluência com os mais diversos conflitos históricos. Podemos aferir que aquilo que permitiu primordialmente que nos relacionássemos como uma civilização, a identificação, tem em sua ambivalência uma contrapartida sintomática: a intolerância.

Referências

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  • 1
    O povo Paiter tem seu contato oficial com a sociedade ocidental datado no ano de 1969. Desde então, as aproximações entre os povos vêm trazendo profundas mudanças sociais; entre elas, a dinâmica entre a cultura religiosa original e a tensão com diferentes tipos de “missões evangelizadoras”.
  • 2
    Em 3 de fevereiro de 2020, um grupo de pelo menos 30 pessoas atacou um terreiro de umbanda em Ribeirão Preto/SP durante uma reunião na casa com uma bomba caseira. Um dos umbandistas foi espancado. Vários dos presentes, ao tentarem deixar o local, foram atacados com socos, chutes e pauladas.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    23 Set 2020
  • Aceito
    28 Jun 2022
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