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“Por que aprender a ler?”: afeto e cognição na Educação Infantil

Why learn how to read? Affection and cognition in Early Childhood Education

Resumo

O presente artigo tem como objetivo analisar os sentidos e os significados atribuídos à linguagem escrita na trajetória de duas crianças de 5 anos em uma turma de Educação Infantil. Para a investigação e a análise dos dados, foi realizado um estudo de caso e a observação participante, como anotações em caderno de campo, entrevista com os participantes e videogravação. Fundamentam essa investigação os pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural e da Etnografia em Educação. A análise dessas trajetórias permitiu argumentar que os processos de apropriação da linguagem escrita envolvem aspectos cognitivos e afetivos, interação com artefatos culturais e vivências socioculturais.

Palavras-chave
Educação Infantil; afetividade; cognição

Abstract

This article aims to analyze the meanings attributed to written language in the journey of two five-year-old children in Early Childhood Education. A participant observation, comprising interviews, notes and video recording, was conducted to investigate and analyze data. The research was guided by the ontological and epistemological perspectives of Cultural-Historical Psychology and Educational Ethnography. The analysis of these children’s journeys makes it possible to claim that the processes of appropriation of the written language involve cognitive and affective aspects, the interaction with cultural artifacts and people, and lived experiences.

Keywords
Early Childhood Education; affection; cognition

Introdução

Eu quero aprender a ler e escrever / pra quando eu ficar adulto / eu não ficar / sem saber ler e escrever Diego – 5 anos

O presente artigo tem como objetivo analisar os sentidos e os significados atribuídos à linguagem escrita por duas crianças de 5 anos em uma turma de Educação Infantil. As falas e as ações delas nos possibilitam compreender aspectos essenciais das relações entre as vivências socioculturais, o afeto e a cognição no processo de apropriação da linguagem escrita. Temos como pressuposto que tais aspectos são indissociáveis e que constituem o sujeito e o seu desejo (ou não) de aprender.

A análise é realizada a partir da trajetória dessas crianças, especialmente em dois eventos de letramento, (i) “Por que aprender a ler e a escrever”?, inspirado na fala de Diego, apresentada na epígrafe deste texto, e (ii) “Eu sei escrever meu nome”, inspirado nas ações de Débora2 2 Diego e Débora são nomes fictícios utilizados para preservar a identidade das crianças. , ao escrever no caderno de campo da primeira autora deste texto. Esses eventos fazem parte de uma pesquisa realizada em uma turma do último ano da Educação Infantil, de uma Unidade Municipal de Educação Infantil (UMEI) de Belo Horizonte, ao longo do primeiro semestre de 2013 (Dominici, 2014Dominici, I. C. (2014). A Educação Infantil e os eventos de letramentos em uma turma de 5 anos. Dissertação de Mestrado, Faculdade de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.). Os resultados nos instigam a questionar as dicotomias entre práticas letradas e não letradas; entre linguagem oral e linguagem escrita (Street, 1995/2014Street, B. (1995/2014). Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação (Marcos Bagno, Trad.). São Paulo: Parábola.); entre afeto e cognição.

Nesse sentido, procuramos refletir sobre alguns questionamentos, tais como: o que as crianças dizem, pensam e sentem sobre a escrita e sobre a escola? O que querem aprender? É possível e/ou desejável o trabalho sistemático com a leitura e a escrita em turmas de crianças menores de 6 anos? O que seria esse trabalho sistemático? Como as crianças constroem e se apropriam da linguagem escrita? Como o afeto e as vivências socioculturais contribuem para que elas se apropriem do processo da escrita? Essas e outras questões relacionam-se com as tensões que permeiam o campo da Educação Infantil já há algum tempo (Baptista, 2009Baptista, M. C. (2009). A linguagem escrita e o direito à educação na primeira infância. Currículo em movimento. Recuperado em 05 de fevereiro de 2012, de http://goo.gl/wVe31Z.
http://goo.gl/wVe31Z...
; Kramer, 2010Kramer, S. (2010). O papel da educação infantil na formação do leitor: descompassos entre as políticas, as práticas e a produção acadêmica. In A. Dalben, J. Diniz, L. Leal, & L. Santos, Coleção didática e prática de ensino (pp.11-133). Belo Horizonte: Autêntica.), bem como os campos da Psicologia, da Antropologia e da Linguística.

Interessa-nos compreender aspectos essenciais na relação entre afeto, cognição e as vivências socioculturais na apropriação da linguagem escrita. Dessa forma, é necessário ressaltar a importância que essas relações vêm conquistando nas pesquisas da área da Educação e da Psicologia da Educação3 3 Investigamos nos portais Scielo e no site da ANPED nos GTs 07, 10 e 20, artigos publicados cujos temas e palavras-chave eram afeto, cognição e vivências socioculturais. No site da ANPED, especificamente no GT 20 é possível encontrar trabalhos que discutem o afeto, com diversas abordagens. .

Cacheffo e Garms (2011)Cacheffo, V. A. F. F., & Garms, M Z. (2011). A afetividade nas produções do GT 20. In Congresso Nacional de Psicologia Escolar e Educacional. Universidade Estadual de Maringá, Maringá. realizaram uma pesquisa no portal da Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação (ANPEd), no GT 20, e encontraram 11 trabalhos, entre os anos de 2000 e 2010, que tinham como temática principal a afetividade, os sentimentos e as emoções. Um traço comum nos trabalhos pesquisados é o fato de a afetividade imprimir qualidade aos processos de ensino e aprendizagem, uma vez que é considerada, pelos professores investigados, como indissociável à cognição. No entanto, uma maior discussão sobre o que seria essa qualidade não é desenvolvida nesses trabalhos.

Nessa mesma direção, alguns autores (Gomes, 2014Gomes, C. A. V. (2014). A relação sujeito-objeto e a unidade afetivo-cognitivo: contribuições para a Psicologia e para a Educação. Psicologia Escolar e Educacional. 18(1), 161-167.; Leme, 2011Leme, M. I. da S. (2011). As especificidades humanas e a aprendizagem: relação entre cognição, afeto e cultura. Psicologia USP. 22(4), 703-724.; Loss & Sant’ana, 2007Loss, H., & Sant’Ana, R. S.(2007). Cognição, afeto e desenvolvimento humano: a emoção de viver e a razão de existir. Educar. 23(30), 165-182.; Tassoni & Leite, 2010Tassoni, E. C. M., & Leite, S. A. da S. (2010). A relação afeto, cognição e práticas pedagógicas. In 33ª Reunião da Anped (pp. 1-17). Caxambu-MG., entre outros), baseando-se nos pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural, reiteram que a constituição da subjetividade perpassa por um processo educativo, pela atividade do sujeito e pelas relações sociais e de poder na sociedade e nas escolas. Nesse entrelaçamento, Gomes (2014)Gomes, C. A. V. (2014). A relação sujeito-objeto e a unidade afetivo-cognitivo: contribuições para a Psicologia e para a Educação. Psicologia Escolar e Educacional. 18(1), 161-167. considera que os aspectos afetivos, especialmente as emoções, são históricos e sociais e que, no contexto educativo, não devem ser considerados empecilhos à aprendizagem e, sim, o contrário. Concordamos com Gomes que essa é uma questão fundamental, apesar de pouco investigada.

Procuramos contribuir com este debate a partir do nosso objeto de pesquisa, qual seja, a atribuição de sentidos e significados à leitura e escrita por crianças menores de 6 anos de idade. Organizamos este artigo em quatro seções. Inicialmente, apresentamos os pressupostos teórico-metodológicos que sustentam a argumentação da reflexão proposta. A seguir, fazemos a apresentação das crianças e analisamos os eventos de letramentos na turma observada. Ao final, tecemos algumas considerações sobre a indissociabilidade entre o afeto, as vivências socioculturais e a cognição no processo de apropriação da linguagem escrita.

Pressupostos teórico-metodológicos

É por meio do diálogo entre os pressupostos da Etnografia em Educação (Castanheira, Crawford, Dixon, & Green, 2001Castanheira, M. L.; Green, J. L.; Dixon, C. N. (2007). Práticas de letramento em sala de aula: uma análise de ações letradas como construção social. Revista Portuguesa de Educação, 2(20), 7-3.; Heath, 1982Heath, S. B. (1982). Ethnographic in education: Defining the essentials. In P. Gilmore, & A. Glathorn, Children in and out of school: ethnography and education (pp. 31-55). Washington: Center for Applied Linguistics.; SBCDG, 1992Santa Barbara Classroom Discourse Group. Constructing literacy in classrooms: literate action as social accomplishment (1992). In H. Marshall (Ed.), Redefining student learning: roots of educational change (pp.119-150). Norwood, NJ: Ablex.) e da Psicologia Histórico-Cultural (Vigotski,1934/1993Vigotski, L. S. (1934/1993). Obras Escogidas, II. Madrid: Visor Distribuciones., 1983/1997Vigotski, L. S. (1983/1997). Obras Escogidas, III. Madrid: Visor Distribuciones.) que compreendemos o sujeito como ser social, histórico e cultural. O sujeito não nasce “pronto e acabado”, tampouco é produto do meio em que vive. É sim, um ser que se modifica e transforma a cultura em que vive. A construção do conhecimento pelo sujeito é, da mesma forma, social, mediada pela linguagem e demais artefatos culturais. Tal construção acontece por meio da atribuição de sentidos e significados, que se entrelaçam na relação dialética entre o interpessoal e o intrapessoal.

É a partir dessa concepção que o diálogo entre a Psicologia Histórico-Cultural e a Etnografia em Educação auxilia-nos na realização da análise microgenética da sala de aula, não apenas como metodologia, mas principalmente como princípios para análise e compreensão da indissociabilidade entre afeto, cognição e vivências socioculturais.

Os sentidos atribuídos pelas crianças investigadas à escrita, especialmente por Diego e Débora, foram construídos ao longo do tempo por meio das interações sociais vivenciadas dentro e fora da escola, as quais foram mediadas por artefatos e práticas culturais. Durante o semestre de observação participante na turma investigada, nos aproximamos do que as crianças traziam para este espaço. Foram folhetos de propagandas diversas, cadernos antigos de familiares, blocos de anotações já utilizados, além de vários relatos sobre as práticas de leitura e escrita que aconteciam no ambiente familiar. Assim sendo, as relações entre as culturas familiar e escolar tornaram-se fundamentais em nossa investigação.

Diante do entendimento da relação dialética entre o interpessoal e o intrapessoal, argumentamos que cada criança da turma construiu os sentidos para o aprendizado da linguagem escrita de forma peculiar, indicando-nos a presença e a contribuição de suas vivências socioculturais, entrelaçando seus contextos familiares e o contexto da turma observada. Assim, pontuamos que, à medida que as práticas culturais da sala de aula eram construídas pela professora e pelos alunos, os sentidos e os significados atribuídos à linguagem escrita tornavam-se mais presentes no cotidiano da sala de aula, principalmente nas falas e nos desenhos das crianças.

Portanto, os diversos momentos da rotina daquela turma permitiram a organização do trabalho das professoras e da escola, assim como proporcionaram às crianças momentos de interação entre elas e entre elas e as professoras.

Corsaro (2005)Corsaro, W.A. (2005). The Sociology of childhood (2nd ed.). London: Sage Publications, Inc. ressalta a importância das rotinas culturais, uma vez que elas podem fornecer aos membros o sentimento de pertencimento a um grupo, assim como o entendimento partilhado das ações cotidianas. Esse autor afirma que a rotina sistematizada e previsível indica a construção do conhecimento cultural, e um padrão de práticas culturais. Além disso, as rotinas culturais também têm a possibilidade de propiciar mudanças na forma de participação das crianças, criando oportunidades de elaboração e transformação das atividades cotidianas.

Da mesma forma que as práticas culturais se constituem em um contexto, em uma perspectiva histórica, mediadas por instrumentos e signos, a cognição e o afeto também se constituem social e historicamente. Segundo Vigotski (1983/1997)Vigotski, L. S. (1983/1997). Obras Escogidas, III. Madrid: Visor Distribuciones., a cognição e o afeto, assim como as demais funções psicológicas superiores, se desenvolvem dialeticamente nas e pelas interações sociais, sendo que suas origens são culturais. Para esse autor, é na relação entre os planos social e individual que encontramos a gênese da constituição do ser humano. Por essa relação não ser gradual e ascendente, Vigotski argumenta que não há apenas evoluções, mas também involuções e revoluções.

Assim é que, quando a criança faz um gesto em direção a algum objeto, quem dá o significado ao ato é o adulto. Posteriormente, a criança, ao compreender o significado da ação, atribui sentido ao apontar: pedir algo a alguém. A relação entre o ato e o significado se constitui no plano social, com a atribuição de sentido inicial pelo adulto e, na sequência, pela criança. Em diferentes momentos, a criança pode atribuir outros sentidos ao gesto, diferentes do que lhe foi apresentado inicialmente.

Vigotski (1983/1997)Vigotski, L. S. (1983/1997). Obras Escogidas, III. Madrid: Visor Distribuciones. discute a relação entre o ato e a atribuição de significado e sentido como princípio do desenvolvimento cultural da criança. Wallon (1941/2007)Wallon, H.(1941/2007). A evolução psicológica da criança (Claudia Berliner, Trad.) São Paulo: Martins Fontes., por sua vez, analisa essa mesma relação como princípio do desenvolvimento do afeto e da cognição, que perpassa pela emoção na constituição da pessoa.

Para o autor francês, o ato pode ser motivado por uma necessidade biológica, voluntária ou involuntária. Para a ação motivada voluntariamente, Wallon (1941/2007)Wallon, H.(1941/2007). A evolução psicológica da criança (Claudia Berliner, Trad.) São Paulo: Martins Fontes. destaca a sensação afetiva do sujeito ao apontar, por exemplo, um objeto do seu desejo.

A resposta de receber o objeto apontado pode provocar a sensação de satisfação ou insatisfação na criança; portanto, ela pode ou não repetir sua ação. A relação entre o ato e o efeito é, para Wallon (1941/2007)Wallon, H.(1941/2007). A evolução psicológica da criança (Claudia Berliner, Trad.) São Paulo: Martins Fontes., o princípio daquilo que afeta e toca o sujeito. Para Wallon (1941/2007)Wallon, H.(1941/2007). A evolução psicológica da criança (Claudia Berliner, Trad.) São Paulo: Martins Fontes., a emoção concretiza o real, ou seja, as atitudes, os efeitos sonoros e visuais que são significados via o afeto. A afetividade se constitui, assim, do ato e do efeito daquilo que o sujeito vivencia e das emoções sentidas.

Os estudos de Vigotski e Wallon acerca da relação entre o ato e o efeito, consequentemente sobre cognição e afeto, podem nos ajudar a compreender a fala de Diego: Eu quero aprender a ler e escrever / pra quando eu ficar adulto / eu não ficar / sem saber ler e escrever4 4 As falas das crianças foram transcritas em unidades de mensagem (Gumperz, 2002), separadas por “/”, dando visibilidade às pausas do falante e nos permitindo reconstruir o que estava disponível ao ouvinte no momento da enunciação. Segundo Bloome et al.(2005), as unidades de mensagem não são sentenças; e seus limites não seguem as regras gramaticais. A delimitação das unidades de mensagem se dá quando participantes precisam construir limites de unidades, para estabelecer sua comunicação e construir significados. . Ou seja, Diego nos mostra que seu desejo foi motivado por uma realidade à qual ele atribuiu sentidos. Voltaremos a este evento mais adiante.

González Rey (2009)González Rey, F. L. (2009). La significación de Vygotsky para la consideración de ló affectivo em la educacción: las bases para la cuestión de la subjetividad. Actualidades Investigativas em Educación, 9(num. esp.), 1-24, assim como Wallon, propõe que a relação entre o ato e o efeito não acontece de forma direta e unidirecional, mas de forma complexa e dialética, sendo fator fundamental na constituição da emoção e, então, da afetividade pelo sujeito. Diego e Débora nos demonstraram, pelas suas falas e ações que, de fato, a relação entre o ato e o efeito daquilo que se vivencia é significativo para a apropriação do conhecimento. O autor ainda pondera que nossas vivências afetam a formação, a transformação e a construção dos nossos pensamentos. Portanto, se as vivências afetam o pensamento, elas afetarão a ação, a fala e, por conseguinte, a aprendizagem. Assim, devemos considerar o aspecto emocional como um fator decisivo na atribuição de sentidos e significados à palavra. Em particular, a aprendizagem da linguagem escrita tem estreita relação com aquilo que afeta e interessa às crianças, ou seja, está intimamente relacionada com suas práticas sociais e culturais.

Vigotski (1934/1993)Vigotski, L. S. (1934/1993). Obras Escogidas, II. Madrid: Visor Distribuciones. argumenta ainda que o desenvolvimento da linguagem escrita tem relação com o desenvolvimento biológico, social, cultural e histórico do sujeito. Do ponto de vista cultural e histórico, “a aprendizagem da escrita antecede a entrada na escola e é caracterizada por um processo complexo que se inicia quando aparecem os primeiros sinais visuais e gráficos, como o gesto e, posteriormente, o desenho” (p.186). Portanto, a apropriação do sistema de escrita não acontece a partir do momento do ensino sistemático do alfabeto, por exemplo.

Para esse autor, a apropriação cultural está inserida na atividade humana e acontece mediada por instrumentos e signos culturais. Isto é, o manuseio e a utilização de jornais, revistas, livros, cartazes, embalagens, entre outros, mediante as interações entre as crianças e os adultos, e também entre as crianças, inspira a atribuição de sentidos e significados ao que se escreve e se lê, dentro e fora da escola. A relação entre as representações simbólicas e as vivências socioculturais é dialética e envolve o processo de interação entre o plano imagético e sua produção no real.

Os sinais visuais e gráficos são, para Vigotski (1934/1993)Vigotski, L. S. (1934/1993). Obras Escogidas, II. Madrid: Visor Distribuciones., representações simbólicas. Ou seja, ao desenhar, a criança narra uma história, dá nome àquilo que está representando, com ou sem palavras escritas. Essa produção da criança é baseada naquilo que foi vivenciado por ela dentro e fora da escola e naquilo que despertou seu interesse, ou seja, no que a afetou e a transformou.

Argumentamos que as crianças precisam construir significações para a escrita, mesmo antes de aprender a escrever. Tais significações atrelam-se às vivências sobre a língua escrita e seus usos sociais e, também, às representações simbólicas, que, por sua vez, se relacionam com o que afeta o sujeito.

Prosseguimos, na seção a seguir, com a apresentação das crianças, protagonistas dos eventos de letramento que vamos analisar.

As crianças e o contexto da pesquisa

Green, Dixon e Zaharlick (2005)Green, J. L., Dixon, C. N. E, & Zaharlick, A. (2005, dezembro). A etnografia como uma lógica de investigação. Educação em Revista, 42, 13-79. defendem que, para fazer uma boa prática (grifo das autoras) etnográfica, é necessário representar o grupo pesquisado a partir do que ele é, e não do que ele deveria ser. Para tanto, permanecemos 65 dias em uma turma de crianças com 5 anos de idade em uma Unidade Municipal de Educação Infantil (UMEI) em Belo Horizonte, durante o primeiro semestre de 2013. Coerentes com as perspectivas da Etnografia em Educação e da Psicologia Histórico-cultural, o longo tempo de observação participante se deve à necessidade de acompanhar e vivenciar a construção das práticas culturais na escola e na sala de aula, para que pudéssemos compreender os sentidos e os significados atribuídos pelas crianças à linguagem escrita.

Assim, foi a partir dos pontos de vista delas e da professora que construímos nosso material empírico e nossas análises. Para isso, utilizamos os recursos da videogravação, de fotografias, entrevistas e conversas com a professora e com as crianças.

Durante esse período de observação participante, vivenciamos 121 eventos de letramentos. É importante salientar que os eventos de letramento são visíveis e fazem parte das práticas de letramento (Street, 1995/2014Street, B. (1995/2014). Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação (Marcos Bagno, Trad.). São Paulo: Parábola.) daquela sala de aula e da escola. Tais práticas nos possibilitam compreender os sentidos e os significados construídos pelos participantes da pesquisa, uma vez que elas são mais amplas e sem elas não compreenderíamos os eventos de letramento.

Os eventos foram categorizados de acordo com os participantes das interações. Assim sendo, 29 eventos aconteceram entre as crianças e as professoras da turma, e 31 deles, exclusivamente mediante interações entre as crianças. Finalmente, ocorreram 61 eventos entre a pesquisadora e as crianças.

Cabe-nos refletir: o que há em comum entre esses eventos de letramento? Em todos eles é possível perceber a interação das crianças, marcada por sua iniciativa, no processo de apropriação da linguagem escrita. Vemos, no entanto, que houve apenas 29 deles em que a professora participou ativamente do interesse das crianças. Sendo assim, podemos nos perguntar: como as crianças afetaram as práticas sociais de leitura e escrita naquela turma?

Os 61 eventos de letramento dentro da escola aconteceram em momentos de desenho no quadro, de escrita e desenhos no caderno de campo, em momentos de brincadeiras e em conversas entre as crianças e a pesquisadora. A utilização do caderno de campo pelas crianças, para desenhos e escritas, acontecia cotidianamente. Com essas interações entre as crianças e a pesquisadora, notamos que, aos poucos, o caderno de campo não era apenas da pesquisadora, mas de toda a turma.

Assim, selecionamos eventos de letramento em que duas crianças – Diego e Débora – foram protagonistas por serem representativos do conjunto dos eventos de letramento observados no sentido de salientar o desejo das crianças dessa turma em se apropriarem da linguagem escrita.

Diego tinha 5 anos e era aluno da UMEI desde os 3 anos de idade. Ele era filho único, e seus pais eram divorciados. No período da manhã, ele ficava com sua babá; durante a tarde, frequentava a UMEI; e, à noite, ficava com sua mãe. Seu pai o visitava nos finais de semana. Quem o levava à escola era um funcionário do transporte escolar, já que sua mãe estava em tratamento médico devido a uma doença cardíaca.

Débora também tinha 5 anos e era aluna da UMEI desde os 3 anos de idade. Seus pais eram divorciados e, ao contrário de Diego, ela residia com o pai, e a mãe visitava-a nos finais de semana. Débora chegava à escola acompanhada do pai.

Tanto Diego quanto Débora eram crianças assíduas e, durante o período de observação, foi possível observar que as poucas faltas dessas crianças foram devido a questões de saúde. As duas crianças construíram laços estáveis de amizade na turma.

O interesse de Diego pela linguagem escrita manifestava-se quando ele tentava produzir, sozinho, gêneros textuais como o convite e o bilhete e, em alguns momentos, quando solicitava auxilio de colegas, da professora e até da pesquisadora, para produzir tais gêneros. O interesse de Débora era percebido quando levava, para alguma colega, cartas realizadas com o auxílio de um membro da família, ou quando imitava a pesquisadora escrevendo no caderno de campo.

Com a observação participante realizada nesta turma, foi possível perceber o quanto essas crianças e seus colegas manifestavam, nos diversos momentos de interação na sala de aula, interesse em escrever e produzir narrativas sobre personagens infantis mesclando desenho e escrita de gêneros discursivos, como convites de aniversário, cartas, bilhetes, entre outros (Bakhtin, 1979/2006Bakhtin, M. (1979/2006). Marxismo e filosofia da linguagem (12a ed.). São Paulo: Hucitec.).

Segundo Wallon (1945/1976)Wallon, H. (1945/1976). Los origens del pensamiento en el niño (Colección Psicologia Contemporánea). Buenos Aires: Nueva Visión., é entre os 4 e 5 anos de idade que a criança está em pleno desenvolvimento afetivo, cognitivo, motor, social e cultural e é capaz de aprimorar suas exigências com o meio social. Esse autor argumenta que os questionamentos das crianças nessa faixa etária são oriundos de suas vivências e, principalmente, da curiosidade. Isto é, elas questionam sobre aquilo que as afeta e as interessa.

A trajetória de Débora e Diego, nesse período de observação participante, pode ser visualizada no Quadro 1.

Quadro 1
Trajetória dos eventos de letramento vivenciados por Débora e Diego

Por meio dessa trajetória, é possível visualizar, em diversos momentos, a interação das duas crianças com a linguagem escrita. No dia 19/06/2013, Débora conversou com João sobre as razões de os nomes dos colegas estarem escritos no quadro da professora. Essa conversa aconteceu no momento da entrada, às 13 horas. Débora percebeu que, desde o dia anterior, já havia dois nomes dos colegas da sala escritos no quadro da professora. João, então, disse a Débora que esses colegas não poderiam ir ao parquinho, pois haviam feito bagunça. Contudo, uma das crianças, cujo nome estava escrito no quadro, não estava presente naquele dia. Logo, Débora perguntou ao colega o que aconteceria, ao que João deduziu que aquele castigo, “ficar sem ir ao parquinho”, seria transferido para o próximo dia em que o colega estivesse presente.

Essa conversa entre as crianças demonstra o quanto elas compreenderam a cultura da sala e os padrões de comportamento esperados do grupo. Outra pessoa, que não estivesse familiarizada com as normas e expectativas e nem com os usos sociais da leitura e da escrita do grupo, ao entrar naquela sala de aula e visualizar os nomes no quadro, possivelmente, não compreenderia o significado de tal escrita. O fato de ter o nome no quadro significava, naquele grupo, que a criança ficaria sem ir ao parquinho. O significado foi construído pelos participantes, contudo, o sentido particular no dia 19/06/13 foi diferente para João e Débora. O sentido construído por essas crianças emergiu de um questionamento: se o nome foi escrito no dia anterior e ainda permanecia ali era porque o castigo permaneceria também, mesmo que a criança não estivesse presente? Pontuamos, muito rapidamente, a inadequação de formas de punição das crianças na construção de práticas educativas democráticas.

Essa construção de sentido nos permite inferir sobre o poder da escrita de legitimar as regras, as punições, os combinados, entre outros. Mas também o poder da fala ao se fazer uso dela para questionar o que estava escrito no quadro. Isto é, as duas crianças procuraram avidamente entender não apenas o que estava escrito (os nomes convencionalmente grafados em um artefato cultural), mas igualmente o uso social feito desta escrita por meio de um diálogo entre elas.

Outros pontos da trajetória dos eventos de letramento vivenciados por Débora e Diego nos permitem perceber o lugar do desenho, da utilização do caderno de campo da pesquisadora, da relação entre os pares e da cultura de desenhos animados, na construção e na atribuição de sentidos e significados à linguagem escrita (Quadro 1).

O evento do dia 18/06/2013 é uma demonstração sobre a presença do desenho animado na cultura de pares e no cotidiano infantil. Nesse dia, Diego pediu o caderno de campo para desenhar. Quando questionado pela pesquisadora sobre o que estava desenhando, ele respondeu: “Adivinha/ o que é! ” Ressaltamos que a criança se recusou a responder diretamente à pergunta feita, ao mesmo tempo em que a elaborou criativamente e sustentou a interação com a pesquisadora, provocando-a em uma brincadeira. Logo, a pesquisadora tentou adivinhar: “monstro/ dinossauro/ robô”, mas sem sucesso. Enquanto isso, outra criança que observava a brincadeira disse: “Esse/ é o Ben 10”. Diego sorriu e concordou.

A partir de uma análise pormenorizada pelo olhar etnográfico, passamos a compreender o lugar do desenho animado para as crianças na construção de sentidos e significados para as vivências sociais, para a linguagem escrita, enfim, para o mundo em que se vive. A partir do interesse e do gosto pelo desenho animado e pelos super-heróis, Diego busca aprender a escrever os nomes dos personagens, a desenhá-los e a utilizá-los na produção de gêneros textuais como cartazes e convites.

As crianças utilizaram muitas páginas do caderno de campo da pesquisadora, como pode ser percebido pelos quatro eventos em que Débora ou Diego escreveram e desenharam nele (Quadro 1). Um dos motivos para esse intenso uso foi o estabelecimento de uma relação afetiva com a pesquisadora. Outro motivo se relaciona com o fato de não haver um suporte de escrita oficialmente definido para tal prática cultural na sala de aula. Isto nos indica que a escola pautava-se na concepção de que não era tempo de se aprender a escrever naquela sala de aula. Também nos faz pensar que as crianças não pediam licença para que esse aprendizado ocorresse, pois aproveitaram as brechas da presença da pesquisadora e de seu caderno de campo para manifestar seus desejos e concretizar suas escritas e desenhos. Ou seja, por meio da ajuda da pesquisadora e de seu caderno de campo, elas questionaram e ultrapassaram as relações de poder estabelecidas dentro das escolas e do contexto da Educação Infantil de que não se deve ensinar a ler e escrever às crianças de menos de 6 anos.

Diego e Débora, ao participarem das diversas interações sociais, tanto no contexto familiar quanto na UMEI, construíram significados sociais e sentidos pessoais para os eventos de letramento, transformando a si mesmos e a sala de aula, como veremos a seguir.

Os eventos de letramento

Iniciamos esta seção apresentando os conceitos de letramento, eventos de letramento e práticas de letramento. Consideramos como letramento o “estado ou condição de indivíduos ou de grupos sociais de sociedades letradas que exercem efetivamente as práticas sociais de leitura e de escrita, participam competentemente de eventos de letramento” (Soares, 2003Soares, M. B. (2003). Letramento e escolarização. In V. M. Ribeiro (Org.), Letramento no Brasil: reflexões a partir do INAF (pp. 89-113). São Paulo: Global., p. 2).

Os eventos de letramento caracterizam-se por um conjunto de atividades que têm princípio, meio e fim, são situações que envolvem a leitura e/ou escrita como parte integrante da natureza das interações entre os participantes e de seus processos de interpretação (Heath, 1983Heath, S. B. (1983). Ways with words: Language, life, and work in communities and classrooms. New York: Cambridge University Press.). Já as práticas de letramento permitem situar e interpretar os eventos de letramento em contextos institucionais e culturais a partir dos quais os participantes atribuem sentidos e significados à leitura e à escrita (Street, 1995Street, B. (1995/2014). Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação (Marcos Bagno, Trad.). São Paulo: Parábola./2014).

Nesta seção, analisamos os eventos de letramento apresentados na introdução e os contrastaremos com aqueles apresentados no Quadro 1.

Esses eventos foram selecionados para análise pormenorizada, porque caracterizam a relação das crianças com a linguagem escrita, e, principalmente, indicam o que buscamos compreender: o afeto, a cognição e as vivências socioculturais na atribuição de sentidos e significados à linguagem escrita no contexto da turma investigada.

O primeiro evento, Por que aprender a ler e a escrever aconteceu no dia 05/07/2013, quando Diego manifestou interesse em desenhar no caderno de campo. Seu interesse é contextualizado e evidenciado no Quadro 2, que apresenta o conjunto de eventos que aconteceram nesse dia. Essa contextualização é fundamental, uma vez que os eventos são construídos ao longo da história da turma investigada e se relacionam com contextos mais amplos (Green, Dixon, & Zaharlic, 2005Green, J. L., Dixon, C. N. E, & Zaharlick, A. (2005, dezembro). A etnografia como uma lógica de investigação. Educação em Revista, 42, 13-79.) e também porque nos permite uma análise das interlocuções entre as partes e o todo (Vigotski, 1983/1997Vigotski, L. S. (1983/1997). Obras Escogidas, III. Madrid: Visor Distribuciones.).

Quadro 2
Eventos do dia 05/07/2013

Percebemos, no Quadro 2, os momentos que constituíram as práticas culturais padronizadas, ou seja, a rotina que acontecia cotidianamente e que marcava os horários de utilização dos espaços coletivos para cada turma na escola: a entrada, o lanche, o parquinho e a saída. Os outros momentos variavam de acordo com o planejamento das professoras, das demandas e dos acontecimentos na escola: filme, apresentação cultural, atividade em sala, brinquedo em sala e a massinha de modelar.

É possível também refletir sobre a utilização do tempo na Educação Infantil especificamente nesta escola, ou seja, a partir do Quadro 2 verificamos que os 40 minutos iniciais foram dedicados a um filme que não havia sido objeto de planejamento pela professora. Entretanto, como a regente da turma estava ausente, a coordenação optou por essa atividade. Assistir a um filme em função da falta de professores, de forma improvisada, é recorrente tanto em escolas de Educação Infantil quanto nas de Ensino Fundamental e remete a questões internas e externas às escolas. As razões e as consequências dessas escolhas para a aprendizagem e o desenvolvimento das crianças fogem aos objetivos imediatos deste artigo, mas não podemos nos furtar de pontuá-las devido à importância desta discussão para a construção de práticas educativas de qualidade em nossas escolas. Em seguida, as crianças lancharam uma fruta, aproximadamente às 13h40.

Todo mês, uma turma da escola era responsável pela apresentação cultural. Assim, após o lanche, as crianças uniram-se às demais para assistir à apresentação de um teatro, cujo tema foi brincadeiras com cantigas infantis5 5 Nesse ano, todas as turmas tinham temas de brincadeiras. A turma onde foi realizada a pesquisa teve como tema a brincadeira a partir da música “A linda rosa juvenil”. . Na sequência, elas tiveram um momento para desenhar. O desenho partiu da proposta da professora substituta, que orientou as crianças a desenharem uma capa para o relatório de avaliação discente semestral6 6 Esse relatório trata de uma avaliação do processo de desenvolvimento e aprendizagem das crianças. . Durante essa atividade, a turma estava organizada em grupos de quatro crianças que utilizaram canetas hidrocor e giz de cera. Nesse momento, não houve muita movimentação das crianças pela sala, pois a professora havia explicado anteriormente a importância do relatório e do desenho que eles deveriam fazer. Posteriormente, após a finalização do desenho, elas pediram mais folhas brancas para continuar a desenhar. Nesse momento, as crianças andavam pela sala, enquanto desenhavam, conversavam e pediam auxílio dos colegas para realizar os desenhos.

O momento do parquinho acontecia cotidianamente às 15h30 e tinha duração de 30 minutos. As crianças brincavam de casinha, de correr, andavam em pequenos triciclos. Logo após o parquinho, as crianças retornavam à sala de aula onde brincavam ou começavam alguma atividade no caderno, em folha fotocopiada. No dia em questão, as crianças pegaram os brinquedos da sala para brincar e não os que haviam trazido de casa.

Às 16h20, a turma se dirigiu ao refeitório para o jantar7 7 Para o jantar, era servido arroz enriquecido, canjiquinha, sopa de legumes ou caldo de feijão. . Após o jantar, às 16h40, a turma retornou à sala e as crianças foram brincar de massinha até o momento da saída.

A interação de Diego com o grupo de crianças da sua turma acontecia em todos os momentos. Contudo em alguns momentos de brinquedos, Diego solicitava folha e lápis para desenhar e escrever e, com isso, ele se afastava das outras crianças.

O evento de letramento que analisamos aconteceu nesse dia, às 16h20, enquanto as crianças lanchavam no refeitório. Esse evento de letramento iniciou-se com a solicitação de Diego para utilizar o caderno de campo da pesquisadora: Você deixa/eu fazer um desenho/no seu caderno? A partir da aproximação de Diego, foi possível conversar com ele e, principalmente, questioná-lo sobre seu interesse de aprendizagem na escola.

  • Pesquisadora: O que/você quer aprender na escola?

  • Diego: A ler/e a escrever.

  • Pesquisadora: Você quer/aprender na escola/ a ler e a escrever? Por quê?

  • Diego: Você deixa/ eu fazer um desenho/ no seu caderno?

  • Pesquisadora: Deixo.

  • Diego: Eu quero aprender a ler e escrever/ Pra quando eu ficar adulto/ eu não ficar/ sem saber ler e escrever.

  • Pesquisadora: Você conhece/ alguém que não sabe escrever?

  • Diego: Conheço.

  • Pesquisadora: Você não quer ficar igual essa pessoa?

  • Diego: Não/ É porque/ eu quero ensinar pra ela.

  • Pesquisadora: Entendi/ E quem é essa pessoa?

  • Diego: É a minha babá.

Estávamos no refeitório e, como era um momento de refeição, esse ambiente estava com muitos ruídos, o que dificultou a escuta da pesquisadora. Assim, a pergunta foi repetida para que ela confirmasse seu entendimento inicial da resposta dessa criança. A aproximação e a solicitação de Diego permitiram que a pesquisadora conversasse sobre o que ele esperava da escola e o que ele queria aprender. Ao afirmar que gostaria de aprender “a ler/ e a escrever”, Diego nos possibilitou refletir sobre sua compreensão acerca da aprendizagem da linguagem escrita em uma sociedade letrada. Contudo, ele manifestou desejo de aprendizagem acerca de algo que é tão polêmico entre os pesquisadores e educadores da Educação Infantil (Baptista, 2009Baptista, M. C. (2009). A linguagem escrita e o direito à educação na primeira infância. Currículo em movimento. Recuperado em 05 de fevereiro de 2012, de http://goo.gl/wVe31Z.
http://goo.gl/wVe31Z...
; Campos et al., 2011Campos, M. M., Bhering, E. B., Esposito, Y., Gimenes, N., Abuchaim, B., Valle, R., & Unbehaum, S. (2011, janeiro/abril). A contribuição da educação infantil de qualidade e seus impactos no início do ensino fundamental. Educação e Pesquisa. 37(1), 15-33; Kramer, 2010Kramer, S. (2010). O papel da educação infantil na formação do leitor: descompassos entre as políticas, as práticas e a produção acadêmica. In A. Dalben, J. Diniz, L. Leal, & L. Santos, Coleção didática e prática de ensino (pp.11-133). Belo Horizonte: Autêntica.) e que ficou refletido no quadro da rotina do dia – a ausência de eventos de letramento iniciados pela professora da turma. Nesse sentido, defendemos que, se ouvíssemos mais as crianças, e se suas práticas culturais de fato fizessem parte das práticas de letramento das escolas, possivelmente essa polêmica não teria sentido de existir. Notamos, também, ao longo da pesquisa, que outras crianças tinham, por diversas razões, o mesmo desejo de Diego.

O evento de letramento do dia 06/03/2013, apresentado no Quadro 1 demonstra o grande interesse de Diego pela linguagem escrita. Em uma análise contrastiva entre os eventos do dia 06/03/2013 e 05/07/2013, é possível ressaltar a construção de hipóteses sobre a escrita de palavras, quando Diego demonstrou que, ao longo dos dias tem pensado, questionado e construído explicações sobre a linguagem escrita, seus usos e funções, bem como hipóteses sobre a escrita de palavras. As palavras de interesse dessa criança estão relacionadas à nomenclatura de familiares (como pai, mãe e outros) e, também, aos nomes de desenhos animados e personagens, como Batman, super-herói, Ben 10 e outros.

Além de afirmar que gostaria de aprender a ler e a escrever, Diego nos surpreendeu ao se referir à sua babá. Ele gostaria de ensinar algo que considera importante a ela, um adulto com o qual ele tem uma relação de afeto e cuidado. Diego se posiciona como alguém que não apenas aprende, mas que também pode ensinar. Mais além, ele quer aprender para ensinar algo a alguém que lhe é afetivamente importante.

A resposta de Diego nos instiga a pensar nas proposições de Vigotski e Wallon sobre a apropriação da linguagem escrita pelas crianças e sobre o desenvolvimento das pessoas e a contribuição das vivências socioculturais e do afeto nessa apropriação. A fala de Diego também nos remete a Bakhtin (1979/2006)Bakhtin, M. (1979/2006). Marxismo e filosofia da linguagem (12a ed.). São Paulo: Hucitec., ao referir-se às esferas de atividade e de circulação do discurso como a família e a escola. Bakhtin (1979/2006)Bakhtin, M. (1979/2006). Marxismo e filosofia da linguagem (12a ed.). São Paulo: Hucitec., em seu estudo sobre a palavra e a consciência, afirma que existe uma cadeia ideológica constituída por signos que se manifesta pela interação entre sujeitos e que permite a tomada de consciência. Entendemos que a fala de Diego faz parte dessa cadeia ideológica.

Quando o signo se torna um meio para a realização de uma atividade cultural, entendemos que o sujeito se apropriou desse signo, o qual faz parte da sua consciência. Assim, para Diego a linguagem escrita deixou de ser um sinal sem definição e tornou-se uma representação simbólica, um signo e uma prática carregados de conteúdo ideológico e afetivo. Algo que começa a fazer parte de sua vida, não só dentro, mas também fora da escola.

Ao dizer o que deseja fazer com o aprendizado da linguagem escrita, Diego nos confirma o papel e a importância da palavra e suas relações com a linguagem escrita. Vigotski (1934/1993Vigotski, L. S. (1934/1993). Obras Escogidas, II. Madrid: Visor Distribuciones., 1983/1997)Vigotski, L. S. (1983/1997). Obras Escogidas, III. Madrid: Visor Distribuciones. nos explica que a palavra é carregada de sentidos e significados e que o seu significado faz a unidade entre o pensamento e a fala. Bakhtin (1979/2006)Bakhtin, M. (1979/2006). Marxismo e filosofia da linguagem (12a ed.). São Paulo: Hucitec. acrescenta, por sua vez, que “a palavra funciona como elemento essencial que acompanha toda a criação ideológica, e, como signo cultural é a unidade da consciência verbalmente constituída” (p. 36). Nesse sentido, Bakhtin (1979/2006)Bakhtin, M. (1979/2006). Marxismo e filosofia da linguagem (12a ed.). São Paulo: Hucitec. explora a representatividade da palavra e seu caráter ideológico e de transformação das pessoas no uso e na manipulação da linguagem escrita.

O objetivo de Diego, de aprender a ler e a escrever para ensinar à sua babá, está carregado de sentidos e significados afetivos e ideológicos, pois vive em uma sociedade que supervaloriza a leitura e a escrita sem a devida consideração dos seus diversos usos e funções sociais. O que indica que tais sentidos e significados foram construídos na sua vivência em casa, na escola, com outras crianças e, principalmente com sua babá, ou seja, nas esferas de atividades da família e da escola, assim como pela imaginação e criatividade dessa criança. As vivências nesses diferentes contextos, dentro e fora da escola, possibilitaram a tomada de consciência sobre o papel da leitura e da escrita em nossa sociedade.

Nas interações com o outro, as relações de afeto são construídas e, para nós, são vistas como fator essencial na atribuição de sentidos e significados e na organização do pensamento infantil. Assim, concordamos com Galvão (1995)Galvão, I. (1995). Henri Wallon: uma concepção dialética do desenvolvimento infantil. Petrópolis: Vozes., ao explicitar que as crianças na faixa etária de 5 anos, apoiam-se em critérios afetivos na seleção de temas que ocupam suas atividades mentais.

Wallon (2008)Wallon, H. (2008). Do ato ao pensamento: ensaio de psicologia comparada (G. A. Torres, Trad.). Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes. nos propõe que a afetividade tem íntima relação com a atividade cognitiva e, mais além, que a afetividade é constitutiva do desenvolvimento da inteligência. No caso desse evento de letramento, a afetividade de Diego em relação à sua babá e as práticas culturais de letramento familiares possibilitaram o seu processo de imaginação e criação, quando justificou seu desejo de aprender a ler e escrever.

Para Vigotski (2009)Vigotski, L. S. (2009). Imaginação e criação na infância: ensaios psicológicos (Zoia Prestes, Trad, Ana Luiza Smolka, Com.) São Paulo: Ática., “a primeira forma de relação entre imaginação e realidade consiste no fato de que toda a obra da imaginação constrói-se sempre de elementos tomados da realidade e presentes na experiência anterior à pessoa” (p. 8). Nesse caso, Diego não vivenciou a experiência de ser o adulto que não sabia ler e escrever, mas tornou-se ciente dessa realidade, ao conviver com um adulto que não sabia ler e escrever. Por isso, destacamos que Diego imaginou-se ensinando à sua babá por compreender o papel do ler e do escrever com base nas práticas culturais da sala de aula, e também pelas suas vivências socioculturais em que a escrita e a leitura estão muito presentes. Vigotski (2009)Vigotski, L. S. (2009). Imaginação e criação na infância: ensaios psicológicos (Zoia Prestes, Trad, Ana Luiza Smolka, Com.) São Paulo: Ática. pontua que:

Quanto mais a criança viu, ouviu e vivenciou mais ela sabe e assimilou; quanto maior a quantidade de elementos da realidade ela dispõe em sua experiência – sendo as demais circunstâncias da mesma –, mais significativa e produtiva será a atividade de sua imaginação.

(p. 22)

Contudo, entendemos que não basta vivenciar aspectos da realidade cultural, social e histórica, bem como isso não é apenas uma questão da “quantidade” de vivências. É necessária a atribuição de sentidos e significados pela criança a essa realidade, para que seu desenvolvimento intelectual, biológico, cultural e social se realize. Para Vigotski, a emoção faz com que a criança selecione impressões, ideias e imagens de suas experiências e vivências, de acordo com o sentimento associado a elas. Podemos inferir que Diego percebeu o desejo da babá de aprender a ler e a escrever e tomou este desejo para si, apoiando-se em sua relação afetiva com ela. Assim, a criança seleciona elementos da realidade, combinando-os numa relação que se determina internamente pelas nossas emoções (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). Imaginação e criação na infância: ensaios psicológicos (Zoia Prestes, Trad, Ana Luiza Smolka, Com.) São Paulo: Ática.).

Como pontuado anteriormente, aconteceram muito eventos de letramento que foram vivenciados pelas crianças e, como Diego, Débora também participou de outro evento de letramento, Eu sei escrever meu nome, que analisamos a seguir.

No dia 19/04/2013, Débora solicitou o caderno de campo para escrever e desenhar. Enquanto desenhava, ela disse: Eu sei escrever meu nome/quer ver? A pesquisadora respondeu afirmativamente e a observou. Em seguida, a pesquisadora perguntou: Você sabe/escrever mais alguma/palavra? Débora respondeu que sim e escreveu a palavra OVO. Ela contou que seu irmão foi quem lhe havia ensinado a escrita dessa palavra. Nesse momento, a pesquisadora decidiu perguntar o que mais o irmão lhe havia ensinado e, imediatamente Débora respondeu: A escrever/a fazer pontinho, e continuou: quer ver?/eu faço meu nome de pontinho. Apresentamos na Figura 1 8 8 Colocamos uma tarja em seu nome verdadeiro, para preservar sua identidade. o que foi escrito e desenhado por Débora. Ela escreveu seu nome com pontinhos e, em seguida, passou a caneta por cima dos pontinhos para mostrar como seu irmão havia ensinado. Ela fez o mesmo com a palavra OVO.

8 Colocamos uma tarja em seu nome verdadeiro, para preservar sua identidade.

Figura 1
A escrita da palavra OVO

O ensino da leitura e da escrita por meio de treinos de grafia, como o uso dos pontilhados, não é, ou não deveria ser, utilizado nas escolas por diversas razões. Contudo, a relação que Débora estabeleceu com essa prática de cobrir pontilhados nos demonstra a apropriação, pelas crianças, de práticas culturais significativas em seus contextos sociais, atribuindo a elas um sentido afetivo relacionado à aprendizagem da linguagem escrita. Ou seja, mesmo sendo consideradas por nós, a princípio, como práticas inadequadas, elas foram ressignificadas pela criança. Tais práticas, contextualizadas afetivamente, tornaram-se motivo de orgulho para Débora: ela se esforçou para demonstrar à pesquisadora o que já sabia escrever.

O irmão de Débora lhe ensinou escrever seu nome e outras palavras por meio dos pontilhados, o que a motivou saber uma das formas de se aprender a escrita. Esse aprendizado pode ter lhe possibilitado ver as letras e palavras escritas como algo mais do que um sinal sem significado e perceber a escrita como a representação do simbólico, do que se pensa, do que se sente e do que e com quem se deseja comunicar.

A aprendizagem da linguagem escrita e a atribuição de sentidos e significados aos sinais gráficos podem acontecer no ambiente familiar antes de ocorrer na escola, como é apresentado na pesquisa de Castanheira (1991)Castanheira, M. L. (1991). Entrada na escola, saída da escrita. Dissertação de Mestrado, Faculdade de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.. Um importante aspecto levantado por essa autora é o fato de as famílias prepararem as crianças para a 1ª série. Vários são os relatos de que irmãs ou irmãos mais velhos, como no caso do irmão da Débora, pais e mães ministram aulas e propõem exercícios de caligrafia para as crianças nos poucos pedaços de papel disponíveis, com o uso coletivo dos cadernos. Muitas vezes, segundo a autora, o exercício era feito, apagado e o papel reutilizado para novos exercícios até que eventualmente ele acabasse.

No dia 24/05/2013, Débora escreveu no caderno de campo, imitando o que a pesquisadora fazia: colocou a data no cabeçalho da folha e começou a “registrar” o que as crianças faziam na sala de aula. Esse registro foi feito por meio da escrita de diversas linhas em uma tentativa de imitar a forma de escrita cursiva da pesquisadora. Assim, escrever com pontilhados (imitando o irmão mais velho) e escrever em linhas (imitando a letra cursiva da pesquisadora) são formas culturais de escrita apropriados pela criança. Portanto, o processo de apropriação e atribuição de sentidos e significados à linguagem escrita de Débora perpassa pelas experiências pessoais no ambiente escolar e familiar, bem como pela imitação do que os adultos fazem com essa linguagem.

As vivências socioculturais se constituem naquilo que toca e que impulsiona o sujeito, mas também podem ser aquilo que proporciona questionamentos e repulsas. A ação de Débora, ao mostrar seu conhecimento sobre a escrita, faz parte das convergências e dos questionamentos entre as experiências pessoais no ambiente familiar e aquilo que é oferecido no ambiente escolar.

As práticas e os eventos de letramento vivenciados nas escolas deveriam estar em consonância com as práticas e os eventos de letramento cotidianos, pois, concordando com Street (1995/2014)Street, B. (1995/2014). Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação (Marcos Bagno, Trad.). São Paulo: Parábola., “os professores poderiam, com proveito, partir do conhecimento e das práticas letradas que as crianças trazem consigo de casa” (p.203).

Considerações finais

Diante do contraste entre os eventos de letramento vivenciados por Diego e Débora, fica evidente que o processo de apropriação da linguagem escrita por essas crianças, bem como o entendimento de usos e funções de tal linguagem, se deu, ao longo do período letivo, pelo questionamento, pela resistência, pela construção de hipóteses, pela interação deles com pais, irmãos, babás, seus pares, professora e pesquisadora.

As motivações para a apropriação da escrita foram diferentes nos casos de Débora e Diego. Entretanto, ambas foram externas à escola e se apoiaram em relações afetivas com pessoas próximas às duas crianças. Reafirmamos, dessa forma, o pressuposto de Vigotski (1934/1993)Vigotski, L. S. (1934/1993). Obras Escogidas, II. Madrid: Visor Distribuciones. sobre o aprendizado de a linguagem escrita ser anterior à entrada na escola, bem como o argumento de Bakhtin (1979/2006)Bakhtin, M. (1979/2006). Marxismo e filosofia da linguagem (12a ed.). São Paulo: Hucitec. sobre as relações entre as esferas de atividades e a circulação do discurso para a tomada de consciência das pessoas, acerca de si mesmas, e do mundo que as cerca.

Diego e Débora demonstraram como as vivências socioculturais, as experiências, o afeto, o sentimento – enfim, as emoções contribuem e desempenham importante papel no processo de atribuição de sentidos e significados, seja à realidade ou à linguagem escrita. Percebemos, ao longo das nossas análises, que as crianças trazem para a escola seus interesses, dúvidas e desejos sobre conhecimentos, sobre a escrita, entre outros, sem pedir licença para os educadores e pesquisadores que discutem se a Educação Infantil deve ou não abrir espaço para a leitura e a escrita para as crianças com menos de 6 anos de idade.

Portanto, as perguntas “a linguagem escrita deve ou não estar presente nas práticas da educação infantil?” e “alfabetizar ou não na educação infantil?” necessitam ser deslocadas para “como a linguagem escrita deve ser estar presente?” e “o que devemos priorizar nas práticas educativas na primeira etapa da educação básica?” (Baptista et al., 2016Baptista, M. C., Corsino, P., Nunes, M. F. R., Neves, V. F. A., & Barreto, A. S. (2016). Um convite. In Ministério da Educação, Caderno de Apresentação (Coleção Leitura e Escrita na Educação Infantil, 1a. ed., pp. 9-15). Brasília: MEC/SEB.). Isso porque a linguagem escrita é um conhecimento histórico e cultural presente nos diversos ambientes sociais, portanto aos olhos e aos contatos das crianças.

Assim como foi proposto por vários autores, a linguagem escrita é um conhecimento histórico, cultural e social que deve ser trabalhado na Educação Infantil, respeitando os limites, as capacidades e os interesses das crianças. É nesse sentido que entendemos a afirmação de Wallon (1941/2007)Wallon, H.(1941/2007). A evolução psicológica da criança (Claudia Berliner, Trad.) São Paulo: Martins Fontes., “os progressos da criança são o resultado de uma contínua ação recíproca entre suas vivências e o surgimento de fatores que nelas ainda não estavam implicados” (p.217).

Tendo como pressuposto que o processo de aprendizagem acontece por meio das relações sociais, podemos avançar e concluir que a aprendizagem da linguagem escrita pelas crianças menores de 6 anos ocorre mediante a forma e o conteúdo das mediações semióticas que poderão proporcionar ou não a aprendizagem dessa prática social. Baseando-nos nas ações das crianças, percebemos que essa relação não pode ser outra, que não o uso real, contextualizado e, portanto, significativo da linguagem escrita. Faz-se necessário respeitar o tempo da criança, sua realidade social e cultural, pois elas vivem em uma sociedade letrada e sabem da necessidade de se apropriar desse conhecimento histórico, social e cultural que é a linguagem escrita.

Por fim, entendemos que as práticas culturais, os trabalhos das professoras, as falas e as vivências das crianças constituem a relação entre os aspectos cognitivos, afetivos, socioculturais e contribuem para a aprendizagem da linguagem escrita. Os processos cognitivos, socioculturais e afetivos na aprendizagem escolar e não escolar são interdependentes e não podem ser analisados separadamente. Assim sendo, concordamos com Street (1995/2014)Street, B. (1995/2014). Letramentos sociais: abordagens críticas do letramento no desenvolvimento, na etnografia e na educação (Marcos Bagno, Trad.). São Paulo: Parábola. e Gomes e Sena (2000)Gomes, M. de F. C., & Sena, M. das G. de C. (2000). Dificuldades de aprendizagem na alfabetização. Belo Horizonte: Ceale/Autêntica., uma vez que isso implica que as escolas e os professores devem se ajustar aos contextos sociais e culturais das crianças ao invés de rejeitá-los.

E finalizamos deixando um questionamento para reflexão sobre o processo de aprendizagem da linguagem escrita: se os progressos intelectuais, sociais e culturais das crianças acontecem mediante a relação entre aquilo que as afeta em suas vivências socioculturais e o processo de cognição, não será preciso mais as crianças e estabelecer íntimas relações entre o que se vive dentro e fora das escolas?

  • 1
    Agradecemos à Capes, FAPEMIG e CNPq pelo apoio e financiamento para a realização da pesquisa.
  • 2
    Diego e Débora são nomes fictícios utilizados para preservar a identidade das crianças.
  • 3
    Investigamos nos portais Scielo e no site da ANPED nos GTs 07, 10 e 20, artigos publicados cujos temas e palavras-chave eram afeto, cognição e vivências socioculturais. No site da ANPED, especificamente no GT 20 é possível encontrar trabalhos que discutem o afeto, com diversas abordagens.
  • 4
    As falas das crianças foram transcritas em unidades de mensagem (Gumperz, 2002Gumperz, J.(2002). Convenções de contextualização. In B.T. Ribeiro, & P. Garcez (Org.), Sociolinguística interacional (pp. 149-182). São Paulo: Loyola), separadas por “/”, dando visibilidade às pausas do falante e nos permitindo reconstruir o que estava disponível ao ouvinte no momento da enunciação. Segundo Bloome et al.(2005)Bloome, D., Carter, S. P., Christian, B. M., Otto, S., & Faris, N. S. (2005). Discourse analysis and the study of classroom language and literacy events: A microethnographic perspective. New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates, Publishers – Mahwah., as unidades de mensagem não são sentenças; e seus limites não seguem as regras gramaticais. A delimitação das unidades de mensagem se dá quando participantes precisam construir limites de unidades, para estabelecer sua comunicação e construir significados.
  • 5
    Nesse ano, todas as turmas tinham temas de brincadeiras. A turma onde foi realizada a pesquisa teve como tema a brincadeira a partir da música “A linda rosa juvenil”.
  • 6
    Esse relatório trata de uma avaliação do processo de desenvolvimento e aprendizagem das crianças.
  • 7
    Para o jantar, era servido arroz enriquecido, canjiquinha, sopa de legumes ou caldo de feijão.
  • 8
    Colocamos uma tarja em seu nome verdadeiro, para preservar sua identidade.

Referências

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  • Wallon, H. (2008). Do ato ao pensamento: ensaio de psicologia comparada (G. A. Torres, Trad.). Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    03 Ago 2016
  • Revisado
    04 Nov 2016
  • Aceito
    15 Maio 2017
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