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Ouvindo imagens: ensaio sobre uma oficina audiovisual inclusiva de cinema e educação1 1 Apoio: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) 2 2 Normalização, preparação e revisão textual: Aline Maya (Tikinet) – revisao@tikinet.com.br

Resumo

Este ensaio reflete sobre a produção de um vídeo resultante de uma oficina de cinema realizada com estudantes surdos e ouvintes do ensino médio de uma escola pública do Rio de Janeiro. A oficina integrou o projeto Ouvindo imagens, realizado pelo Laboratório de Vídeo Educativo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LVE/Nutes/UFRJ), cujo objetivo era promover a aproximação e a integração entre esses dois grupos de estudantes por meio da prática cinematográfica. Nosso trabalho destaca o lugar de existência das minorias linguísticas em relação à escola, ao cinema e aos endereçamentos sociais que a este grupo são dirigidos. A partir do conceito de modos de endereçamento, analisamos o desenvolvimento da oficina, especificamente o processo de produção do filme. Como resultado, identificamos que a experiência da oficina propiciou formas potentes de relação entre os participantes, como fica evidente no próprio vídeo e no sistema colaborativo da sua produção, acionado pela força de um descontentamento social vivido por eles no contexto escolar.

Palavras-chave
oficina audiovisual; surdez; modos de endereçamento; inclusão; cinema e educação

Abstract

This essay reflects on the production of a video resulting of a cinema workshop held with deaf and hearing students of a public high school in Rio de Janeiro. The workshop integrated the project Ouvindo imagens, conducted by Laboratório de Vídeo Educativo of Universidade Federal do Rio de Janeiro (LVE/Nutes/UFRJ), whose objective was to promote the approximation and integration between deaf and listening groups of students through the practice of cinema. Our work highlights the place of existence of linguistic minorities in relation to the school, the cinema, and the social addresses that target this group. With the support of the concept of modes of address, we analyze the development of the workshop, specifically the process of film production. As a result, we identified the experience of the workshop provided powerful forms of relationship between the participants, as evident in the video itself and in the collaborative system of its production, triggered by the social discontent experienced by the students in the school context.

Keywords
video workshop; deafness; modes of address; inclusion; cinema and education

Introdução

No âmbito da interface entre cinema e educação, uma série de práticas vêm sendo estudadas e interrogadas por pesquisadores e pelos próprios sujeitos dessas ações, de forma que a relação entre esses dois campos mostra-se cada vez mais legitimada como um campo único de estudos, dada a complexidade e os efeitos que se depreendem dessa aproximação em direção ao campo social.

Na esteira da consolidação desse campo, uma reflexão que permanece e nos ajuda a compreender a construção dessa trajetória, ainda que de forma didática e ampla, expressa a interface entre cinema e educação a partir de dois principais referenciais: um mais clássico, voltado para práticas de um “cinema educativo”, e outro mais contemporâneo, voltado para práticas de um “cinema como arte” nas escolas. Seja por adesão ou por contestação, as diversas práticas desenvolvidas no âmbito da interface entre cinema e educação vão se posicionar, inevitavelmente, na direção de um, de outro ou de um misto entre esses dois referenciais.

O primeiro, como dito, inscreve-se de forma mais sistemática nos processos voltados para uma “dimensão educativa” dos filmes, vinculados ao uso de diversos gêneros de filmes em sala de aula, juntamente com a interação do professor; ou vinculados diretamente a produções especiais denominadas “filme educativo”3 3 “… que supostamente se estrutura como ato comunicativo que apresenta, de um modo ou de outro, uma demarcação, uma metodologia de ensino, um princípio pedagógico, voltados para um domínio específico do conhecimento ou para o adestramento para uma prática” (Xavier, 2008, p. 15). (Xavier, 2008Xavier, I. (2008). Um cinema que “educa” é um cinema que (nos) faz pensar: Entrevista com Ismail Xavier. Educação & Realidade, 33(1), 13-20., p. 15). Do conjunto de práticas que compõem a chamada “dimensão educativa” dos filmes, vale ressaltar os possíveis vínculos herdados do pensamento proposto a partir dos anos 1930 e até os anos 1960 pelo Instituto Nacional de Cinema Educativo (Ince) que, “entre outros instrumentos pedagógicos, elegeu o cinema educativo como forma de renovar as práticas escolares e garantir o acesso ao conhecimento escolar a um maior número de pessoas” (Catelli, 2010Catelli, R. (2010). Coleção de imagens: o cinema documentário na perspectiva da Escola Nova, entre os anos de 1920 e 1930. Educação & Sociedade, 31(111), 605-624. https://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302010000200016
https://doi.org/10.1590/S0101-7330201000...
, p. 606).

O segundo referencial se inscreve em processos voltados para o que Ismail Xavier (2008)Xavier, I. (2008). Um cinema que “educa” é um cinema que (nos) faz pensar: Entrevista com Ismail Xavier. Educação & Realidade, 33(1), 13-20. nomeia de “dimensão formadora do cinema”, este entendido como ação humana vinculada a arte, valores, visão de mundo, conhecimento, ampliação de repertório, e também como linguagem mobilizadora e desestabilizadora de certezas. Para esse autor,

o cinema que “educa” é o cinema que faz pensar, não só o cinema, mas as mais variadas experiências e questões que coloca em foco. Ou seja, a questão não é “passar conteúdos”, mas provocar reflexão, questionar o que, sendo um constructo que tem história, é tomado como natureza, dado inquestionável.

(Xavier, 2008Xavier, I. (2008). Um cinema que “educa” é um cinema que (nos) faz pensar: Entrevista com Ismail Xavier. Educação & Realidade, 33(1), 13-20., p. 15)

Anita Leandro (2001)Leandro, A. (2001). Da imagem pedagógica à pedagogia da imagem. Comunicação & Educação, 21, 29-36. Recuperado de http://www.revistas.usp.br/comueduc/article/view/36974
http://www.revistas.usp.br/comueduc/arti...
também reforça o que seria essa distinção entre as dimensões “educativa” e “formadora” do cinema quando propõe uma reflexão sobre as diferenças entre “imagens pedagógicas” e “pedagogias da imagem”. De acordo com a autora, a “pedagogia da imagem” está na imagem que pensa e faz pensar, que contém uma pedagogia intrínseca; está no “trabalho do filme, o filme como local de trabalho, local de realização do ato criador do homem e, portanto, de transformação do mundo” (Leandro, 2001Leandro, A. (2001). Da imagem pedagógica à pedagogia da imagem. Comunicação & Educação, 21, 29-36. Recuperado de http://www.revistas.usp.br/comueduc/article/view/36974
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, p. 31, grifos da autora). As “imagens pedagógicas”, por sua vez, estariam voltadas para o que Ismail Xavier (2008)Xavier, I. (2008). Um cinema que “educa” é um cinema que (nos) faz pensar: Entrevista com Ismail Xavier. Educação & Realidade, 33(1), 13-20. chama de “dimensão educativa”, ou seja, uma imagem cujo conteúdo (pronto, acabado) precisa ser transmitido e compreendido como tal por aqueles que assistem a elas.

Balizado por esses dois principais referenciais, este ensaio busca refletir sobre a produção de um filme realizado com estudantes surdos e ouvintes do ensino médio de uma escola pública no Rio de Janeiro, por ocasião de uma oficina de cinema proposta pelo projeto Ouvindo imagens (Laboratório de Vídeo Educativo do Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro – LVE/Nutes/UFRJ). Esse projeto tem como objetivo a integração de estudantes surdos e ouvintes da educação básica por meio da prática do cinema. Respeitando as especificidades culturais tanto do aluno surdo quanto do ouvinte, o projeto parte da premissa segundo a qual o cinema, como uma experiência a ser compartilhada por ambos os grupos, pode ser um recurso de grande potencialidade para sua efetiva integração e aproximação, já que trabalha com algo a que os dois grupos têm acesso: a imagem.

A oficina de cinema desenvolvida pelo projeto previu ações voltadas tanto para a formação do espectador quanto para uma abordagem das técnicas de filmagem em um ambiente que possibilitasse a troca de experiências, a horizontalidade e o diálogo entre os participantes. Neste ensaio, remetemos essa experiência ao pensamento de Alain Bergala (2008)Bergala, A. (2008). A hipótese­cinema: Pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola (M. Costa & S. Pimenta, trads.). Rio de Janeiro: Cinead­Lise-FE/UFRJ., autor que nos permite compreender a prática do cinema na escola como arte e ação humana. Bergala considera a arte como um gesto da experiência, algo que não se ensina nem se aprende simplesmente: arte se experimenta. Esta é, portanto, uma prática que vai de encontro ao sentido mais tradicional da escola, pois a escola é, indubitavelmente, um lugar reservado a processos de ensino e avaliação.

Outro ponto a partir do qual este ensaio toma forma se refere aos estudos da recepção. A ideia de uma recepção ativa, conforme diz Stam (2003, p. 281)Stam, R. (2003). Introdução à teoria do cinema. Campinas: Papirus., nos mostra que “o cinema oferece ao espectador uma posição e um papel específicos, mas o espectador pode negociar tal posição em razão de gosto, ideologia e contexto cultural individuais”. Também Stuart Hall (2003aHall, S. (2003a). Codificação/decodificação. In Da diáspora: Identidades e mediações culturais (pp. 387-404). Belo Horizonte: UFMG., 2003b)Hall, S. (2003b). Reflexões sobre o modelo de codificação/decodificação: Uma entrevista com Stuart Hall. In Da diáspora: Identidades e mediações culturais (pp. 353-386). Belo Horizonte: UFMG., ao desenvolver um modelo não linear e multidirecional do processo comunicativo, nos mostra que as leituras que fazemos dos códigos hegemônico-dominantes são, na maior parte do tempo, leituras negociadas, ou seja, interpretações e leituras críticas que seguem lógicas e objetivos específicos segundo enquadramentos socioculturalmente localizados. De acordo com esse autor, a leitura negociada compõe uma decodificação que mistura elementos de concordância, adaptação e oposição. Ao mesmo tempo que reconhece as definições hegemônicas, dotadas das grandes significações, reconhece suas próprias regras em um nível mais local, contestatório, travando o que ele chama de “política da significação – a luta no discurso” (Hall, 2003aHall, S. (2003a). Codificação/decodificação. In Da diáspora: Identidades e mediações culturais (pp. 387-404). Belo Horizonte: UFMG., p. 402).

Nessa direção, tomamos o conceito de “modos endereçamento”, cuja referência é Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica., para refletir sobre as escolhas feitas pelos jovens durante o processo da oficina. Essa autora fala do endereçamento como algo que ocorre em algum lugar entre o “social” e o “individual”, propondo um olhar “que deixa de localizar o modo de endereçamento no interior do texto de um filme e passa a compreendê-lo como um evento” (Ellsworth, 2001Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica., p. 13). Sob essa perspectiva, buscamos refletir sobre o filme realizado pelos estudantes na referida oficina de cinema e as conquistas pessoais adquiridas durante esse processo como efeito das experiências de espectador trazidas por cada participante.

Destacam-se ainda, nessa experiência, reflexões sob a perspectiva da educação inclusiva e das minorias linguísticas, vistas como um processo de garantia de direitos em que todos possam aprender a viver com as diferenças. De acordo com Díez (2010)Díez, A. M. (2010). Traçando os mesmos caminhos para o desenvolvimento de uma educação inclusiva. Inclusão: Revista de Educação Especial, 5(1), 16-25., falar de escola inclusiva significa mudança das práticas pedagógicas, para que tenhamos cada vez menos práticas segregadoras e mais práticas humanizadoras.

Por que uma oficina com surdos numa escola inclusiva?

A partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, da Conferência Mundial de Educação para Todos, na Tailândia, em 1990, e da Declaração de Salamanca, em 1994, vêm se consolidando as propostas de escolas inclusivas como forma de garantia de se alcançar a educação para todos (Loureiro, 2006Loureiro, V. R. (2006). A política de inclusão escolar no Brasil: Pensando o caso da surdez. Revista Espaço Informativo Técnico Científico do Ines, (25/26), 12-28.). No contexto escolar, a concretização dessa prática tem implicado uma série de intervenções que têm como objetivo dar visibilidade e colocar na cena educacional sujeitos que de alguma maneira sempre viveram à margem do processo educacional.

Na área da educação, as políticas públicas estão orientadas pelo princípio da inclusão, e aos gestores das escolas caberá a elaboração de projetos político-pedagógicos que valorizem o desenvolvimento profissional e o envolvimento de todos os membros da comunidade escolar nessa proposta. A escola passa a ser, então, o lugar onde as crianças e os jovens iniciam, a partir da convivência, uma possibilidade de transformação social (Pletsch & Glat, 2010Pletsch, M. D., & Glat, R. (2010). Pesquisa-ação; estratégias de formação continuada de professores para favorecer a inclusão escolar. Revista Espaço, 33, 50-57.).

Nesse cenário, a singularidade do processo educacional dos surdos levou a comunidade acadêmica e a própria comunidade surda a defender uma proposta diferenciada de trabalho, por meio da oferta de uma educação bilíngue, isto é, uma proposta que pressupõe a utilização de duas línguas em sua escolarização: a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e a língua portuguesa. Além disso, nas últimas décadas ganharam ainda maior impulso os processos de comunicação constituídos pela visualidade (Campello, 2008Campello, A. R. S. (2008). Pedagogia visual na educação de surdos­mudos. Tese de Doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.). Destaca-se, assim, a presença de novos discursos, não somente o verbal, oral ou escrito, mas discursos imagéticos que medeiam a produção do conhecimento por meio de tecnologias e recursos visuais.

Nesse sentido, uma oficina que acolhesse estudantes surdos e ouvintes nos pareceu uma proposta adequada a tais reflexões. Contudo, vale ressaltar que ainda é raro o desenvolvimento de trabalhos teóricos e práticos voltados para a relação que se interpõe entre o campo cinema e educação e as questões imanentes às práticas inclusivas na escola. O escasso compartilhamento de experiências vividas nesse contexto, ao mesmo tempo que nos obrigou a improvisos e desvios no percurso do projeto, fortaleceu a necessidade da realização desse estudo e do compartilhamento dessa experiência, ainda que incipiente e inconclusiva. Quando o estudante surdo chega à escola, a sua falta de linguagem ou o uso de uma língua não compreendida pela maioria das pessoas da comunidade pode resultar em sua exclusão, mesmo em uma escola inclusiva. Assim, um fazer pedagógico que compreenda a necessidade do surdo a partir de abordagens essencialmente imagéticas pode abrir para esses sujeitos não só possibilidades de aprendizado escolar, mas também a possibilidade de relacionamentos mais igualitários com seus pares.

O campo cinema e educação

De modo geral, desde o fim dos anos 1990, quando as camadas populares começaram a acessar de forma mais intensa os equipamentos de gravação e edição de imagem e som, a ideia de “oficina de vídeo”4 4 Entre os anos 1990 e 2009, o termo referente a “oficina de vídeo” variava de acordo com publicações da mídia e dos próprios agentes (Toledo, 2010). foi assumida sob uma perspectiva de realização cuja orientação era ter um filme (inteiro) realizado pelos participantes ao final dos cursos, a fim de obter uma certa comprovação do “aprendizado”.

Com a ampliação do acesso aos equipamentos de vídeo e a inevitável chegada dessa experiência ao ambiente da escola nos anos mais recentes, reflexões mais aprofundadas vêm orientando outras práticas, dentre elas as que resultam do pensamento dedicado a consolidar a relação entre cinema e educação como campo cada vez mais legítimo de estudos, que particularmente interessa a este ensaio.

Embora o suporte técnico utilizado nas oficinas da atualidade seja o vídeo, e não a película, a aplicação do termo “cinema” na relação que vem sendo pensada mais recentemente com a educação parece ter sido fundamental para sugerir outros pensamentos às práticas adotadas.

Como ferramenta de transformação social, o acesso aos meios de produção do vídeo fortaleceu, no final da década de 1970 e nos anos 1980, o movimento do Vídeo Popular, que teve forte expressão na experiência das TVs de Rua5 5 Ver Toledo (2010). , e também a produção do documentário, reforçando uma perspectiva mais imediata do ato de olhar, nomeada por Philippe Dubois (2004)Dubois, P. (2004). Cinema, vídeo, Godard (M. A. Silva, trad.). São Paulo: Cosac Naify. “imagem-ato”. Do processo de ativação das “câmeras abertas” das TVs de Rua, que davam “voz” a pessoas comuns, foi preciso avançar para um outro estágio: não mais dar voz, mas entregar de vez a câmera a essas pessoas para que elas também pudessem criar suas imagens do mundo. Nesse sentido, o desenvolvimento de oficinas e a promoção do domínio técnico dos equipamentos de gravação tornou-se fundamental, além de outros aspectos que envolviam a apropriação da linguagem do vídeo naquele momento.

Na pesquisa realizada por Toledo (2010)Toledo, M. (2010). Educação audiovisual popular no brasil: Panorama, 1990-2009. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, São Paulo., observa-se nas estratégias pedagógicas das oficinas pesquisadas entre os anos 1990 e 2009 a orientação pela realização de um “vídeo” (inteiro) ao final dos cursos. Tudo indica que a urgência nos anos 1980 centrava-se na apropriação das técnicas para dar conta de um fazer alternativo e de enfrentamento à televisão e ao cinema hegemônico. A partir dos anos 1990, propostas voltadas para a profissionalização e o empreendedorismo foram agregadas às práticas, impondo outros sentidos para a produção de vídeos em oficinas.

Como dito, nos anos recentes um olhar mais atento às potências do cinema na educação vem sugerindo práticas menos imediatistas para pensar essa e outras dimensões políticas do ato de filmar. Na perspectiva de alguns projetos, não é mais necessariamente de um suporte ou técnica (equipamentos) que a escola precisa para se aproximar das práticas do cinema, mas de um pensamento sobre o lugar que a experiência do cinema e da arte deve ocupar nesses espaços. Com isso, a ideia da realização de um filme (inteiro) vem aos poucos cedendo espaço a experiências com fragmentos do fazer cinematográfico – o que é nomeado “pedagogia dos fragmentos” –, dispensando, muitas vezes, as tecnologias eletrônicas6 6 Ver Cadernos do Inventar (www.inventarcomadiferenca.com.br). . Inicialmente proposta por Alain Bergala (2008)Bergala, A. (2008). A hipótese­cinema: Pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola (M. Costa & S. Pimenta, trads.). Rio de Janeiro: Cinead­Lise-FE/UFRJ., tal prática retoma, de forma amena, o antigo conflito sobre a dualidade “processo versus resultado”, nos permitindo assumir, decididamente, o “processo” como “produto”, ainda que este não apresente uma narrativa convencional ou uma aparência de “filme”, tal como é frequente ver nos meios de exibição mais comuns.

Embora a oficina com os surdos não tenha adotado a pedagogia dos fragmentos no seu desenvolvimento, esse deslocamento das relações entre processo e produto mostra-se potente para a análise que aqui buscaremos fazer. A experiência com fragmentos rompe, em alguma medida, o compromisso tácito do fazer cinematográfico com o referencial da narrativa clássica, ou seja, com a necessidade de contar histórias, de encadear sentidos e causalidades perceptíveis segundo regras gerais, tal como nos mostra Rancière.

Rancière (2012)Rancière, J. (2012). A frase, a imagem, a história. In T. Capistrano (Org.), O destino das imagens (M. C. Netto, trad., pp. 43-78). Rio de Janeiro: Contraponto. defende que é o processo de subordinação da “imagem” ao “texto” no pensamento do poema que funda, sob essa mesma legislação, o processo de correspondência nas artes; e que o rompimento dessa conjunção tem como efeito a autonomia de todas as artes, desde a palavra até as formas visíveis. Essa disjunção é, segundo o autor, o núcleo comum da teorização “modernista”, chamado por ele de “regime estético da arte” (Rancière, 2012Rancière, J. (2012). A frase, a imagem, a história. In T. Capistrano (Org.), O destino das imagens (M. C. Netto, trad., pp. 43-78). Rio de Janeiro: Contraponto., p. 50), sobre o qual falaremos mais adiante.

Cabe notar, contudo, que a prática dos fragmentos não abandona a realização de filmes (inteiros) nas escolas, mas exige outros tempos e objetivos para essas práticas. Esse é o caso dos projetos Cine en curso7 7 Ver https://www.ambulante.org/cine-en-curso-nuria-aidelman. , coordenado por Núria Aidelman, em Barcelona; do Cinema para Aprender e Desaprender (Cinead)8 8 Ver http://cinead.org/escolas-de-cinema/. , coordenado por Adriana Fresquet, no Rio de Janeiro; e do Inventar com a diferença: cinema, educação e direitos humanos, realizado no Brasil e em países da América do Sul, entre outros9 9 Ver também trabalhos (teóricos e práticos) desenvolvidos por Mônica Fantin e Gilka Girardello, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); pelo Programa de Alfabetização Audiovisual da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); por Rosália Duarte, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio); por Inês Teixeira, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); além de Fabiana Marcello e Rosa Fischer, na UFRGS; Milene Gusmão, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), entre outros. . Cezar Migliorin (2015)Migliorin, C. (2015). Inevitavelmente cinema: Educação, política e mafuá. Rio de Janeiro: Beco do Azougue., coordenador do projeto Inventar com a diferença, mostra uma clara preocupação com o tempo da escola na elaboração dessas práticas:

Nos dispositivos que formulamos, havia sempre uma abertura para o improviso, para a relação com o outro e para a criação com elementos propriamente cinematográficos sem que necessariamente houvesse a necessidade de chegarmos a um filme. Era com um certo temor que cogitávamos levar à escola a ideia de que um filme seria realizado pelos alunos. A possibilidade dessa proposta ocupar um lugar excessivo nas práticas, com resultados frustrantes, era grande. (p. 155)

A principal referência para essa reelaboração das possibilidades do cinema na educação é o já mencionado Alain Bergala (2008)Bergala, A. (2008). A hipótese­cinema: Pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola (M. Costa & S. Pimenta, trads.). Rio de Janeiro: Cinead­Lise-FE/UFRJ., que traçou as bases metodológicas para uma pedagogia do cinema como arte nas escolas francesas. Como nos lembra Leandro (2010)Leandro, A. (2010). Posfácio: Uma questão de ponto de vista. Revista Contemporânea de Educação, 5(10), 80-86., a proposta de Bergala:

Deveria possibilitar uma experiência espectatorial bem mais aprofundada do que aquela proveniente da decodificação de signos ou do estudo da narrativa … em vez de submeter à imagem um arcabouço teórico já existente, como o da linguística, professores e alunos adotariam uma atitude heurística em relação às obras, descobrindo, juntos, os conhecimentos que os filmes produzem. (p. 81)

Um ponto importante da obra de Bergala para este ensaio é o que se refere ao cinema como um “bloco de alteridade” – uma espécie de “outro”, objeto estranho e invasor do controlado ambiente escolar, a ser abordado como um espaço de produção de conhecimentos específicos. Ao se referir aos processos de transmissão do cinema, Bergala (2008)Bergala, A. (2008). A hipótese­cinema: Pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola (M. Costa & S. Pimenta, trads.). Rio de Janeiro: Cinead­Lise-FE/UFRJ. propõe o seguinte:

Trata-se de uma diferença de exigência entre ensinar, no sentido clássico, e iniciar. Sempre faltará algo ao iniciador que nunca teve a experiência íntima do gesto de criação e do que ele implica para o sujeito. Pois é de uma experiência de sujeito a sujeito que se trata na transmissão de um gesto de criação.

(p. 171, grifo do autor)

Adriana Fresquet (2013)Fresquet, A. (2013). O cinema como arte na escola: Um diálogo com a hipótese de Alain Bergala. In A. Fresquet (Org.), Currículo de cinema para escolas de educação básica (pp. 39-62). Rio de Janeiro: Cinead/Lecav/UFRJ. compartilha dessa ideia quando diz que nada é mais “estrangeiro do que a arte no contexto escolar. Arte não obedece, não repete, não aceita sem questionar. Arte reclama, desconstrói, resiste com certa irreverência. Tome-se o cuidado de ler arte e não ensino da arte” (p. 70).

Assim, com este ensaio, buscamos reflexões acerca de uma experiência de cinema e educação vivida com estudantes surdos e ouvintes de uma escola pública durante o processo de produção do vídeo10 10 Os termos “filme” e “vídeo” aqui têm o mesmo significado. Embora vídeos resultem de uma técnica diferente da experimentada pelos filmes (película cinematográfica), a designação do termo aqui se referirá sempre à obra, e não à técnica. intitulado por eles e elas de Cinema para todos?. No contexto do desenvolvimento da referida oficina, encontraremos referências ancoradas tanto em perspectivas mais atuais (cinema como arte) quanto clássicas (cinema educativo), conforme vimos descrevendo neste estudo, bem como a obtenção de um filme (inteiro) ao final do trabalho, como produto da aprendizagem, em lugar do exercício com fragmentos do fazer cinematográfico.

Compreendendo o conceito de modos de endereçamento

O circuito comunicacional proposto por Hall (2003a)Hall, S. (2003a). Codificação/decodificação. In Da diáspora: Identidades e mediações culturais (pp. 387-404). Belo Horizonte: UFMG. difere da ideia linear de transmissão de uma mensagem, pois considera que estão presentes nesse circuito as etapas de produção, circulação, distribuição, consumo e reprodução como momentos distintos, cujas características próprias não impedem uma interrelação. Essa proposta de Hall difere do modelo tradicional de comunicação, pois considera que o processo comunicacional não termina no ato comunicativo. Ele defende que as posições assumidas pelo espectador no momento da leitura de um produto audiovisual irão interferir na produção e vice-versa, dando ao circuito comunicacional um movimento dinâmico de circularidade. Nesse sentido, conhecer a audiência desejada, diz Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica., torna-se fundamental para a construção de uma obra audiovisual, mas ainda assim o espectador pode não se identificar com o lugar construído para ele. Para que a obra atinja seu objetivo, Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica. considera que, ao pensar o público desejado, os produtores precisam fazer ajustes no texto audiovisual, assim como os espectadores também farão ajustes no momento da sua leitura. Assim, a partir de como o sistema narrativo será apresentado ao espectador, o lugar de visualidade será construído.

Utilizando-se de narrativa, cenário, vestuário, imagem, sons e posicionamento de câmera, por exemplo, o filme será construído para atrair e convocar o espectador a compartilhar de uma visão de mundo, a ver determinados valores, a perceber e vivenciar determinadas experiências e permitir que algumas leituras possam ser feitas em lugar de outras. No entanto, não podemos esquecer que a experiência de assistir a filmes implica sempre uma diversidade e subjetividade de categoriais sociais, motivo pelo qual Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica. chama atenção para o fato de que mesmo que um filme seja endereçado a um público idealizado previamente, o espectador pode não ser exatamente o que o “filme pensa que ele é” (p. 13), ou o lugar que foi construído para ele pode não o atrair, por não se sentir representado. Podemos concluir, então, que o modo de endereçamento é um espaço social entre o filme e o espectador que não está visível e nem explicitado totalmente. O espectador olhará o produto midiático a partir de suas experiências, crenças, posicionamento político etc. Isso significa dizer que o evento do endereçamento ocorre num espaço que é social, psíquico ou ambos. Portanto, também deve ser pensado sob o ponto de vista de um evento individual (Ellsworth, 2001Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica.).

Modos de endereçamento e minoria linguística

Os aspectos culturais serão sempre possibilidades ou não de negociações que nos constituem por meio de estratégias de poder associado, por vezes, a algumas ideias deterministas presentes em diferentes espaços da sociedade. Hall (2003b)Hall, S. (2003b). Reflexões sobre o modelo de codificação/decodificação: Uma entrevista com Stuart Hall. In Da diáspora: Identidades e mediações culturais (pp. 353-386). Belo Horizonte: UFMG. aponta a cultura como espaço de significação social e lugar de coexistência da diversidade humana. Ela pode ser considerada algo vivo, contemporâneo, lugar de construção de sujeitos, de modos de subjetividade. Expressa-se ainda, segundo o autor, em diferentes artefatos culturais (mídia, arte, música, filmes, livros, currículos, entre outros), que possibilitam a construção de sujeitos e também podem promover e/ou reforçar estereótipos e desigualdades sociais (Hall, 2003aHall, S. (2003a). Codificação/decodificação. In Da diáspora: Identidades e mediações culturais (pp. 387-404). Belo Horizonte: UFMG.).

Para Stuart Hall (2003a)Hall, S. (2003a). Codificação/decodificação. In Da diáspora: Identidades e mediações culturais (pp. 387-404). Belo Horizonte: UFMG., fazem parte do grupo denominado “minorias” os indivíduos que se unem em prol não mais de uma questão individual ou de classe social, mas que buscam trazer à vista de todos discussões sobre a pluralidade de identidades que existe numa sociedade. Staiger (2005)Staiger, J. (2005). Minorities and media. In Media reception studies (pp. 165-185). New York: New York University Press. considera que a ruptura existente entre grupos numa sociedade relaciona-se na maioria das vezes com o lugar de submissão ou de opressão construído socialmente para cada um dos grupos. Nesse sentido, quando falamos de minorias, não estamos nos referindo ao aspecto quantitativo desses grupos, mas nos apoiamos numa visão sociológica de sujeitos que vivem a exclusão e a desigualdade social. Estes encontram-se expostos a pré-conceitos representados por diferentes enunciados (Bakhtin, 2003Bakhtin, M. (2003). Os gêneros do discurso. In Estética da criação verbal (P. Bezerra, trad., pp. 261-306). São Paulo: Martins Fontes.), que na maioria das vezes banalizam ou criminalizam os movimentos que dão visibilidade a esses mesmos grupos na sua luta por ideais como respeito e cidadania, e na possibilidade de ocuparem diferentes espaços, seja territorial, cultural, religioso, educacional e das artes, entre outros. Grupos como os de homossexuais, negros, indígenas, deficientes e sem-terra podem ser considerados minorias dentro de um mundo cada vez mais globalizado, onde as culturas estão sofrendo alterações (Staiger, 2005Staiger, J. (2005). Minorities and media. In Media reception studies (pp. 165-185). New York: New York University Press.; Hooks, 1992Hooks, B. (1992). The oppositional gaze: Black female spectators. In Black looks: Race and representation (pp. 115-131). Boston: South End Press.).

Dentre os diferentes enunciados presentes no ambiente social, este ensaio tem interesse em pensar as produções cinematográficas que, segundo Staiger (2005)Staiger, J. (2005). Minorities and media. In Media reception studies (pp. 165-185). New York: New York University Press., podem ser consideradas como mediadores sociais que educam os indivíduos e/ou reforçam as visões sociais e as práticas educativas com seu potencial de transformação social ou reforço de discursos hegemônicos. Assim, uma dimensão a ser questionada por este estudo é: que sentidos têm sido operados por filmes, comerciais ou não, para a construção de olhares sobre os surdos? E a escola, como pode também ser transformadora desses discursos?

Para Freire Filho (2004)Freire Filho, J. (2004). Mídia, estereótipo e representação das minorias. Revista Eco-Pós, 7(2), 45-71., “os meios de comunicação de massa constituem-se em uma grande fonte de difusão e legitimação de rótulos” (p. 49). O mesmo autor aponta as análises críticas vindas dos Estudos Culturais sobre a sub-representação ou representação distorcida do que estamos chamando aqui de grupos minoritários. Na maioria das vezes as narrativas cinematográficas constroem um universo simbólico marcado por estereótipos, preconceitos, violência etc., que apontam para as relações de poder estabelecidas a partir de uma subordinação aos grupos dominantes ou da não representação, que pode ser considerada como uma outra forma de marginalização (Escudero & Saraiva, 2016Escudero, C., & Saraiva, A. G. (2016). A representação das minorias sociais em narrativas cinematográficas: Uma análise a partir da perspectiva de Appadurai. Artigo apresentado no XXXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação da Intercom, São Paulo. Recuperado de http://portalintercom.org.br/anais/nacional2016/resumos/R11-0758-1.pdf
http://portalintercom.org.br/anais/nacio...
).

O que podem então as imagens, os sons, os planos e as narrativas dos filmes nos dizer sobre as diferentes identidades que compõem a sociedade globalizada em que vivemos? O lugar para o espectador que pertence ao grupo minoritário estará sempre marcado pelo discurso hegemônico sobre suas subjetividades? Hooks (1992)Hooks, B. (1992). The oppositional gaze: Black female spectators. In Black looks: Race and representation (pp. 115-131). Boston: South End Press. afirma que é sempre possível que o espectador resista a essa marcação com um olhar opositivo. Na sua experiência como espectadora negra, Hooks confirmava na tela do cinema o que, na vida real, já havia vivenciado desde criança – o olhar oprimido e proibido dos negros. Não se sentia representada na imagem da mulher negra atrelada à submissão, a aspectos cômicos, à falta de inteligência ou como objeto do olhar masculino. No entanto, diz ela, outras mulheres se deixam seduzir pela magia do cinema, esquecendo o racismo presente naquelas narrativas. Para Hooks (1992)Hooks, B. (1992). The oppositional gaze: Black female spectators. In Black looks: Race and representation (pp. 115-131). Boston: South End Press., cada narração coloca o espectador em uma posição, e sua classe, etnia, língua e sexualidade influenciam o modo como cada subjetividade é preenchida ao assistir ao filme.

Com relação ao surdo, os estudos na área da surdez apontam uma representação social desses sujeitos como imperfeitos, doentes, deficientes ou retardados (Thoma, 2011Thoma, A. S. (2011). Possibilidades de leitura da diferença surda no cinema. In L. B. Karnopp, M. Klein, & M. L. Lunardi-Lazzarin (Orgs.), Cultura surda na contemporaneidade: Negociações, intercorrências e provocações (pp. 205-220). Canoas: Editora da Ulbra.). Foi a partir de 1960, com os estudos de William Stokoe sobre a língua de sinais americana, que os gestos ganharam o status de língua própria do surdo (Castro Junior, 2015Castro Junior, G. (2015). A cultura surda contra o discurso médico: Uma filosofia da linguagem, em Barthes. In G. W. Almeida (Org.), Educação de surdos, formação, estratégia e prática docente (pp. 14-23). Ilhéus: Editora da Uesc.). Esse movimento permitiu que a comunidade surda tivesse cada vez mais voz e espaço para falar de si e de suas necessidades. Os surdos não aceitam e lutam para mudar as representações que os colocam como um “sujeito deficiente e a ser corrigido” (Thoma, 2011Thoma, A. S. (2011). Possibilidades de leitura da diferença surda no cinema. In L. B. Karnopp, M. Klein, & M. L. Lunardi-Lazzarin (Orgs.), Cultura surda na contemporaneidade: Negociações, intercorrências e provocações (pp. 205-220). Canoas: Editora da Ulbra., p. 220). Castro Junior (2015)Castro Junior, G. (2015). A cultura surda contra o discurso médico: Uma filosofia da linguagem, em Barthes. In G. W. Almeida (Org.), Educação de surdos, formação, estratégia e prática docente (pp. 14-23). Ilhéus: Editora da Uesc. descreve a língua de sinais como

um artefato cultural carregado de significação social sendo assim uma das especificidades mais importantes da manifestação e produção da cultura surda. Desta forma, o uso de sinais pelos Surdos ultrapassa os objetivos de uma simples comunicação, constituindo-se no meio pelo qual se expressam as subjetividades e as identidades desses indivíduos. (p. 16)

No campo do cinema, o estudo de Thoma (2011)Thoma, A. S. (2011). Possibilidades de leitura da diferença surda no cinema. In L. B. Karnopp, M. Klein, & M. L. Lunardi-Lazzarin (Orgs.), Cultura surda na contemporaneidade: Negociações, intercorrências e provocações (pp. 205-220). Canoas: Editora da Ulbra., ao pesquisar sobre a representação de surdos em filmes hollywoodianos, verificou que a construção da narrativa e dos personagens surdos reafirma, na grande maioria das vezes, a representação social hegemônica sobre esse grupo. Na análise do endereçamento, a autora considerou que a maioria dos filmes foram endereçados aos ouvintes, pois buscavam apresentar o “drama” da surdez, além de enfatizar a marca da surdez como patologia. O grupo de surdos que participou do estudo não se identificou com os personagens surdos dos filmes, já que se consideram sujeitos com uma identidade cultural, e não como possuidores de uma patologia. A língua de sinais deveria ser apresentada como sua língua materna, instrumento de uma comunicação mais efetiva, de acesso ao conhecimento e de construção de subjetividade, e não como algo que se ensina ao surdo como último recurso quando ele não consegue adquirir a língua falada pela maioria.

Como espectadores, estudos apontam que os surdos frequentam as salas de cinema, mas apenas para os filmes estrangeiros, já que estes possuem legenda em português. Mesmo assim, a acessibilidade não acontece de forma plena, já que o português não se configura como uma língua de domínio para a maioria dos surdos. Além disso, falta nas legendas uma parte mais descritiva da trilha sonora que, segundo os surdos, pode ajudar na compreensão do texto fílmico (Melo, 2015Melo, J. V. (2015). Percepções do público surdo sobre acessibilidade no cinema. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas, Campinas.; Souza, 2015Souza, S. M. M. (2015). Sinais lexicais dos termos cinematográficos: A perspectiva da língua de sinais no cinema. Dissertação de Mestrado, Universidade de Brasília, Brasília.).

A oficina de cinema, metodologias e resultados

O projeto nasceu de encontros no Laboratório de Vídeo Educativo (LVE/Nutes/UFRJ), onde as discussões sobre estudos de recepção, análise fílmica e formação de espectadores são temas de interesse dos pesquisadores. Com o desafio de trabalhar esses temas na área da educação e inclusão, surgiu o projeto Ouvindo imagens: produção e recepção audiovisual em uma proposta de educação inclusiva. O objetivo era trabalhar especificamente com crianças surdas incluídas em classes regulares. O projeto Ouvindo imagens traz a visão do grupo sobre essas pessoas, entendendo que a surdez levará o sujeito a se constituir não como deficiente, mas como parte de uma minoria linguística que tem a língua de sinais como a primeira língua, e a língua portuguesa como segunda. Isso, na maioria das vezes, impede o surdo de acessar o bem social maior: a cultura. Trabalhar com cinema, portanto, é possibilitar a esses estudantes o acesso ao mundo da cultura e da criatividade, caminhos importantes para a formação de qualquer pessoa.

Como dito, a realização da oficina de produção de vídeo teve forte inspiração no trabalho de Alain Bergala (2008)Bergala, A. (2008). A hipótese­cinema: Pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola (M. Costa & S. Pimenta, trads.). Rio de Janeiro: Cinead­Lise-FE/UFRJ., para quem a arte não pode ser concebida pelo estudante sem a experiência prática e sem o contato com o artista, o profissional, este que se apresenta como corpo “estranho” à escola, “como elemento felizmente perturbador do seu sistema de valores, de comportamentos e de suas normas relacionais” (Bergala, 2008Bergala, A. (2008). A hipótese­cinema: Pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola (M. Costa & S. Pimenta, trads.). Rio de Janeiro: Cinead­Lise-FE/UFRJ., p. 30).

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Participaram da oficina estudantes ouvintes e surdos, que souberam da nossa proposta quando divulgada pela professora responsável pela “sala de recursos”. Entre os alunos surdos havia um com implante coclear11 11 Dispositivo eletrônico, parcialmente implantado, que visa proporcionar aos usuários sensação auditiva próxima à fisiológica. ; dois com pouco conhecimento de Libras, muita dificuldade de leitura labial e fala comprometida; e dois com mais conhecimento de Libras, além de uma oralização razoável e boa leitura labial. Entre os ouvintes havia um com autismo, uma com deficiência motora e outro com alteração neurológica. Havia também ouvintes que aparentemente não apresentavam nenhuma necessidade especial. Estes últimos, no entanto, desistiram do trabalho após alguns encontros, provavelmente por efeito do ritmo assumido pela oficina em função dos outros estudantes. Assim, a oficina teve início com onze alunos, e sete participaram efetivamente. Nesta análise, centramos maior atenção na relação com estes últimos, o grupo de estudantes com necessidades especiais. A oficina contou com uma equipe formada por duas intérpretes, duas bolsistas de extensão e uma técnica do LVE/Nutes, além da fonoaudióloga Maria Inês Barbosa, do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), e do profissional de cinema Geraldo Pereira (sendo os dois últimos autores deste texto).

A escola está situada no Tanque, bairro de classe média da região de Jacarepaguá, Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro. O espaço geral da escola apresentava dificuldades de natureza arquitetônica, cuja estrutura vertical era acessada via escadas e corredores estreitos que levavam a salas de aula lotadas.

A oficina ocorreu na chamada “sala de recursos” da escola, onde os alunos com necessidades especiais recebem reforço das disciplinas estudadas e onde também funciona a biblioteca – com atividades típicas desse espaço – o que acarreta a circulação de alunos surdos e ouvintes em atividades diversas, inclusive durante o referido processo de trabalho. A sala de recursos era pequena, com muitos móveis, iluminação precária, mesas e cadeiras que dificultam a movimentação no espaço, além de um número considerável de computadores dispostos nas bancadas laterais – a maior parte deles sem uso, à espera de conserto.

Assim, nesse espaço e com esse público, desenvolvemos a oficina em sete encontros de três horas, com atividades que se dividiram entre visionamento de filmes curtos (em todos os encontros houve exibição e debate) e três experiências práticas com imagem: duas breves (fotografia e produção gráfica – imagem/texto e técnicas de stop-motion) e outra que ocuparia o maior tempo da oficina, centrada propriamente na produção do filme.

Para as exibições previstas para os encontros, selecionamos curtas-metragens sem fala, mas nos deparamos com o fato de que grande parte deles, embora apresentasse uma narrativa ancorada na imagem, tinha no áudio (trilha e efeitos sonoros) um forte elemento da sua constituição. Passamos então a assistir/escolher filmes com o som desligado.

A infraestrutura de projeção (projetor, som e telão) e os equipamentos utilizados para os exercícios de filmagem e fotografia (câmeras fotográficas digitais e tripé de câmera) foram oferecidos pelo projeto. Também foram utilizados alguns computadores da própria “sala de leitura” e um computador pessoal (notebook) para a edição final do vídeo.

Na análise que segue, nos deteremos apenas na experiência da produção do vídeo, pois pode-se dizer que esta era a atividade principal da oficina. Em certo sentido, todas as ações giravam em torno do filme que faríamos. A convocação dos alunos feita pela escola tinha o filme como promessa, e as outras duas atividades foram elaboradas para dar suporte à atividade central.

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Compreender a produção do vídeo que fizemos significa considerar, entre outros elementos, as condições em que se deu o trabalho. Como dito, tínhamos predefinido sete encontros para realizar uma oficina que previa a produção de um vídeo (inteiro) em uma turma de ouvintes e surdos do ensino médio de uma escola pública. O nosso pouco conhecimento sobre a cultura surda, as condições inadequadas do espaço e a ausência da intérprete de Libras/português em grande parte dos encontros quase inviabilizou o trabalho. Foi preciso compreender e acolher o tempo daquelas pessoas, de forma que, dos sete encontros reservados para a oficina, somente dois foram dedicados propriamente à produção do vídeo. Era preciso que houvesse um vídeo pronto ao final dos encontros e que não frustrássemos as expectativas dos participantes. Tal compressão do tempo previsto para a realização do vídeo não minimizou a riqueza da experiência, mas nos obrigou a reorientações metodológicas, efeito do qual deriva o trabalho analisado a seguir.

O filme realizado pelos estudantes, intitulado Cinema para todos?, com duração de 3 minutos e 30 segundos, narra a história de uma menina surda que vai ao cinema assistir a um filme nacional e se depara com a falta de legendas. Ela tenta argumentar com o gerente do cinema, dizendo que é surda e que os surdos precisam de legenda para entender filmes nacionais, mas ele, sem entender o que ela diz, ri da situação, e o filme termina com ela olhando para a câmera e buscando alguém que a compreenda. Sobre o seu rosto, uma cartela se sobrepõe com o seguinte texto: “Cinema para todos?”.

Não por coincidência, “Cinema para todos” (sem a interrogação) é o nome de um projeto realizado pelo governo do estado do Rio de Janeiro, o qual, por meio da distribuição gratuita de vales-ingressos para filmes nacionais, “estimula e democratiza o acesso dos alunos da rede estadual às salas de cinema, provocando debates e reflexões dentro e fora da sala de aula” (Cinema para todos, 2012Cinema para todos (2012). O programa: Você gosta de cinema? [Website]. Recuperado de http://www.cinemaparatodos.rj.gov.br/programa/o-que-e/
http://www.cinemaparatodos.rj.gov.br/pro...
). No filme dos estudantes, a cartela que se interpõe ao final reproduz a logomarca do mencionado projeto, ganhando (ironicamente) uma interrogação: “Cinema para todos?”.

A proposta do roteiro veio de uma das participantes e teve adesão imediata do grupo, que a essa altura já não contava mais com o mesmo número de participantes do início. O argumento dos integrantes do grupo centrava-se na sua experiência como espectadores de filmes nacionais sem legendas, condição que impede o surdo de compreender os filmes do seu próprio país. A falta desse recurso os limita a uma cultura cinematográfica formada por filmes estrangeiros, porque estes dispõem de legendas. Cabe lembrar, contudo, que o recurso da legenda atende somente àqueles que dominam a língua portuguesa, o que corresponde a uma minoria dos surdos (Melo, 2015Melo, J. V. (2015). Percepções do público surdo sobre acessibilidade no cinema. Dissertação de Mestrado, Universidade Estadual de Campinas, Campinas.) – e essa não era uma realidade para todo o grupo com o qual trabalhávamos.

Nos exercícios prévios à realização do filme, foi pedido aos participantes que escrevessem pequenas histórias vividas por cada um para depois elaborarmos composições com fotografias que faríamos na escola. A atividade nos impôs um primeiro desvio: passar para o português escrito aquilo que é pensado e organizado pelo surdo em Libras não é uma tarefa simples. A Libras não é um recurso (da língua portuguesa) que facilita a comunicação entre surdos e ouvintes no Brasil, mas uma língua que precisa ser respeitada com toda a complexidade e singularidade que um idioma exige, inclusive na sua forma escrita. A sensação de perda de referência nesse momento para nós não foi pequena. Foi preciso acionar a colaboração do grupo para dar andamento a tal atividade. Com a participação dos próprios surdos e da equipe do LVE/Nutes, ajudamos uns aos outros na construção dos textos, respeitando, no caso dos surdos, o seu modo de pensamento e escrita, com adequações mínimas à gramática portuguesa. Assim, uma revisão aprofundada sobre a demanda de legendas nos filmes nacionais precisaria considerar a identidade cultural do surdo para compreender qual tipo de legenda seria adequada aos filmes em vez de assumir a legenda em português como o recurso de acessibilidade.

No processo de elaboração do filme com o grupo, somava-se à questão das legendas uma evidente insatisfação com o nome do projeto do governo do estado. “Como assim, ‘para todos’?”, questionavam. O grupo tinha acabado de viver na escola uma situação parecida com a proposta do roteiro. O projeto governamental havia distribuído vales-ingressos na escola para o filme Gonzaga: de pai pra filho (2012), de Breno Silveira – um drama que conta a história do cantor e sanfoneiro Luiz Gonzaga. A indignação mostrava-se ainda maior ante o entendimento equivocado de que “todos” da escola iriam ao cinema, ou seja, em alguma medida a dinâmica de distribuição coletiva dos vales-ingressos potencializava a exclusão quando defendia que “todos” teriam o mesmo direito.

A situação dos estudantes remete a uma pergunta feita por Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica. no âmbito dos estudos da recepção: “como as minorias leem filmes que nunca lhes são endereçados?” (p. 32). Ao falar em “leitura”, a autora está se referindo à trama dos filmes, às formas de representação das minorias nos filmes e, portanto, às formas de inclusão ou exclusão implícitas nos filmes. O caso trazido pelo grupo de estudantes, entretanto, não se refere à trama de um filme, propriamente, mas a algo mais amplo, que pode ser entendido como um evento ou, mais especificamente, um endereçamento político-educacional de uma certa cultura cinematográfica (aquela aderida pelo governo) em direção às minorias. Tal gesto implica pensar que o governo do estado, entre outras questões, ao elaborar o projeto Cinema para todos, ou naturalizou a ideia de que surdos e outras minorias podem, por algum motivo, ser ignorados nos projetos culturais abertos à população, ou seja, não fazem naturalmente parte desse grupo chamado de “todos”; ou naturalizou a ignorância que geralmente se interpõe nas necessidades específicas desses estudantes, as quais permitiriam, se não ignoradas, que estes de fato pertencessem ao grupo chamado de “todos” e então pudessem, entre outras coisas, assistir a filmes nacionais. Assim, dada a complexidade dos elementos aí envolvidos, pode-se compreender que o gesto do governo é, portanto, mais que a oferta de um projeto passível de crítica pelos participantes da oficina. Trata-se de um discurso que forja uma cultura cinematográfica de exclusão. Neste ensaio, buscamos compreender esse discurso também como um endereçamento, o qual nos permite expandir a análise das tramas dos filmes, conforme propõe Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica., para um contexto mais amplo e mais complexo, no qual se incluem os próprios filmes.

É certo que Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica. também está falando do simbólico ao tratar da recepção nas tramas dos filmes, mas a leitura feita pelos participantes da oficina sobre a oferta de filmes nacionais sem legenda nos leva a responder à pergunta dessa autora com outra questão, que nos parece anterior: que tipo de filme (trama) seria endereçado às minorias (surdas) quando (aqui) nem o acesso aos filmes lhes é garantido? Cabe aqui reforçar que a garantia de legendas nos filmes nacionais é apenas um passo em direção à acessibilidade.

Aceitamos, então, o desafio de realizar a narrativa proposta pelos estudantes. Nota-se que nossa posição, mais que de aceitação, foi de adesão à causa da moçada. Em um dia levantamos a produção e no outro gravamos as cenas. O engajamento na produção foi total. Juntos transformamos a ideia em roteiro de cenas e levantamos as necessidades de produção que o trabalho demandava. Além de participarem como atores, muitos assumiram tarefas ligadas ao figurino – do tipo “eu tenho isso”, “eu posso trazer tal camisa” etc. – e também de outras ordens, como providenciar objetos, maquiagem e adereços. Esse foi o caso do ingresso do cinema. O grupo sugeriu que o ingresso fosse igual ao original. Havia uma necessidade posta pelo grupo de marcar uma relação direta com o projeto do governo. Não faríamos alusão. A resposta ao endereçamento criado pelo projeto precisava ser explícita.

As locações das cenas também foram pensadas em parceria. Precisávamos simular uma bilheteria e uma sala de cinema. A sala de cinema seria gravada na própria sala de recursos, com o telão e projetor usados na oficina e algum escurecimento do ambiente. A cena da bilheteria seria intercalada entre fotos de uma bilheteria real (retiradas da internet), para dar o sentido de plano geral do hall do cinema, e imagens gravadas no corredor da escola, com planos mais fechados, onde colamos o cartaz do filme em exibição e uma placa na qual se lia “Bilheteria”. Com esse truque daríamos conta da narrativa e estaríamos prontos para filmar.

Procuramos dividir ao máximo as tarefas, escolhas e decisões com os participantes. Entretanto, dado o contexto descrito neste trabalho, assumimos uma “mão pesada” no processo de realização do projeto. Essa foi uma expressão bastante usada para questionar quantitativamente a participação de jovens em oficinas entre os anos 1990 e 2000, época em que a legitimidade do vídeo (inteiro) era conferida na proporção em que o vídeo desse pistas de que teria sido realizado (inteiramente) pelos participantes, sem a “mão” do “oficineiro”. Tal exigência, provavelmente, tem origem no mesmo imediatismo das apropriações já descritas para as técnicas vividas naquele período.

No caso da nossa oficina, não tivemos dúvidas de que o que estava em jogo era a experiência e os desdobramentos daquele encontro. Segurar a câmera e apertar um botão são ações que não apresentam novidades para um jovem no mundo atual. O que estava em jogo era o pensamento que poderíamos desenvolver, as possibilidades políticas que a prática do cinema trazia para a escola, as combinações que podiam resultar de cada plano e enquadramento feito. Disso, sim, não abrimos mão. Mas, para que tivéssemos um filme (inteiro) pronto ao final dos encontros, foi preciso assumir, com “mão pesada”, grande parte do ritmo das gravações.

Um detalhe colocado em debate, já que o grupo reunia ouvintes e não ouvintes, foi quanto ao uso ou não de trilha sonora. A decisão veio rápido. O filme não tem som. O espectador viveria uma experiência semelhante à do surdo. Sugerimos então a entrada de uma música de fundo nos créditos finais, com o filme já terminado, de forma a reafirmar que o silêncio era proposital durante a narrativa.

Diferentemente das questões sobre as apropriações técnicas, as escolhas e endereçamentos das ideias foram inteiramente dirigidos pelos estudantes. Não resta dúvida de que o filme tinha como destinatário governantes e produtores de cinema. Estávamos diante de uma carta, ou vídeo-carta, de resposta ao projeto em questão. Contudo, considerando o conceito de endereçamento discutido por Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica., pode-se dizer que o filme não estava endereçado propriamente aos destinatários, mas a qualquer pessoa que, em alguma medida, se identificasse com algum elemento da trama. É nesse sentido que, conforme propõe a autora, a “posição-de-sujeito” dentre os espectadores de um filme pode ser assumida por pessoas diversas, inclusive por aquelas que nada têm a ver com as questões da surdez, juventude, escola pública etc., mas contestem o Estado por um motivo diverso daquele apresentado na trama, como o trabalhista, por exemplo.

De acordo com Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica., ninguém é exatamente o sujeito que o filme imagina e deseja. O que se destaca na relação entre endereçamento e resposta é o fato de que tal “posição-de-sujeito, independentemente de quanto ela seja mítica, está ligada, no filme, a potentes fantasias de poder, domínio e controle” (Ellsworth, 2001Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica., p. 25). E isso funciona tanto para quem produz quanto para quem assiste. O que as pessoas vão fazer com os filmes não é controlável, não há como prever.

Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica. nos mostra que o modo de endereçamento de um filme não é “localizável”, mas pode nos dar pistas, no campo das relações de poder, de efeitos políticos que ele evoca. Para a autora, o modo de endereçamento é um evento que ocorre “na diferença entre o que poderia ser dito – tudo o que é histórica e culturalmente possível e inteligível de se dizer – e o que é dito” (Ellsworth, 2001Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica. p. 47).

De acordo com a autora, a questão central para pensar a recepção está justamente na constituição desse “espaço da diferença” que se dá entre o endereçamento e a resposta (Ellsworth, 2001Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica.). Sua defesa é de que esse “entre” envolve tanto o processo de fazer um filme quanto o processo de ver um filme; são dinâmicas sociais mais amplas que se ancoram em relações de poder, ou seja, a diferença entre o que foi dito e o que poderia ser dito em uma determinada representação é o campo fértil para negociações de sentidos e de poder entre público e produtores de cinema, seja no âmbito profissional ou escolar.

Assim, deslocamentos de público ocorrem em relação aos filmes, nos levando a uma reflexão sobre as formas de resistência. Entretanto, ao falarmos em resistência, não se trata de produzir um dualismo entre aqueles que possuem necessidades especiais e os que não possuem; tampouco de entender a resistência como característica exclusiva das minorias, cuja contestação viria como resposta à escassez de filmes endereçados a esse público, dando forma ao que Mayne (citada por Ellsworth, 2001Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica.) chama de “‘espectadores dominantes’ e ‘espectadores marginais’ (e, portanto, ‘resistentes’)” (p. 34). O que parece estar em jogo no âmbito desses deslocamentos de poder e interessa como ponto de reflexão a este estudo é o caráter político do cinema, sobretudo quando realizado no ambiente escolar.

Migliorin (2015)Migliorin, C. (2015). Inevitavelmente cinema: Educação, política e mafuá. Rio de Janeiro: Beco do Azougue. defende que, “na escola, o cinema se insere como potência de invenção, experiência intensificada de fruição estético/política em que a percepção da possibilidade de invenção de mundos é o fim em si” (p. 46). Esse autor, ao se referir a Jacques Rancière, diz que a política na arte acontece não porque isso ou aquilo é dito em uma obra, ou porque esta expõe uma situação de conflito, mas porque uma instabilidade sensível se instaura na comunidade (Migliorin, 2015Migliorin, C. (2015). Inevitavelmente cinema: Educação, política e mafuá. Rio de Janeiro: Beco do Azougue.). Uma presença perturbadora que é dada pela experiência, e não pelo ensino do fazer cinematográfico, como diz Bergala (2008)Bergala, A. (2008). A hipótese­cinema: Pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola (M. Costa & S. Pimenta, trads.). Rio de Janeiro: Cinead­Lise-FE/UFRJ.. Nesse sentido, retomando Migliorin (2015)Migliorin, C. (2015). Inevitavelmente cinema: Educação, política e mafuá. Rio de Janeiro: Beco do Azougue., o que pode se ensinar com o cinema é um:

não-sei-o-quê de possibilidades … que instaura uma descontinuidade entre obra e fruição …. Não há passagem ideal entre o que um filme quer dizer e a experiência que se faz com esse filme. Tal descontinuidade é própria a um certo regime de imagens que o filósofo francês Jacques Rancière chamou de regime estético das artes. (p. 37)

Em alguma medida, podemos pensar que aquilo que Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica. chama de “espaço da diferença”, ou seja, algo que se dá entre o endereçamento e a resposta, pode encontrar alguma relação com essa descontinuidade entre os filmes e seus efeitos, como descreve Migliorin (2015)Migliorin, C. (2015). Inevitavelmente cinema: Educação, política e mafuá. Rio de Janeiro: Beco do Azougue.. Para esse autor, a descontinuidade entre as imagens e o que o mundo é torna o regime estético algo inseparável da dimensão política, ressaltando que no regime estético não há um mundo pronto ao qual a arte deva nos levar, sendo este precisamente o risco do cinema na escola: “risco de entregarmos às crianças a criação de mundos desejados e possíveis, risco de não dominarmos os efeitos das imagens que elas receberão e farão” (Migliorin, 2015Migliorin, C. (2015). Inevitavelmente cinema: Educação, política e mafuá. Rio de Janeiro: Beco do Azougue., p. 38).

Para finalizar, compreende-se, com base no pensamento de Rancière, que o desenvolvimento de obras de arte (aqui pensadas como obras cinematográficas) no regime estético não pode pedir nada aos seus espectadores, visto que nesse regime não há tal demanda. Sendo assim, o que permanece é a experiência, como diz Bergala (2008)Bergala, A. (2008). A hipótese­cinema: Pequeno tratado de transmissão do cinema dentro e fora da escola (M. Costa & S. Pimenta, trads.). Rio de Janeiro: Cinead­Lise-FE/UFRJ.; ou, como diz Migliorin, as invenções de mundo.

Considerações finais

Pode-se dizer que tanto o conceito de endereçamento de Ellsworth quanto as reflexões sobre cinema e educação nos libertaram da preocupação geralmente prioritária de conferir importância objetiva ao que está dito no filme realizado pelo grupo ou à intensidade do conflito que lá é narrado, assim como de definir seu grau de realidade ou ficção. O que esse referencial teórico-metodológico nos ajudou a reconhecer no trabalho em questão é que o mundo inventado no filme produzido pelos participantes da oficina existe na vida real, porque resulta da experiência que é fazer cinema (na escola).

Os estudos da recepção e os modos de endereçamento de Ellsworth foram fundamentais para nos fazer compreender que endereçar não é controlar a recepção, mas justamente se dar conta da dimensão e da potência social e política contida nesse não controle. Na cultura surda, uma questão central é a metáfora, visto que a linguagem se apoia em imagens concretas. Algumas palavras do português não existem em Libras, por exemplo, as que pertencem ao universo cinematográfico. Foi preciso recorrer a ajustes e/ou criações para que o processo de comunicação avançasse. Foi preciso pensar outros endereçamentos. Também a seleção dos vídeos que exibimos durante o processo nos ensinou muito. Foi preciso pensar outros endereçamentos. Deparamo-nos também com a atenção particular exigida pelo grupo, que bagunçou totalmente o tempo da nossa programação; e mais adiante esbarramos na sua forma da escrita diferenciada. Para cada um desses desvios, houve outros endereçamentos.

Mesmo tendo a oficina se apoiado em um referencial misto, que transita tanto entre propostas mais clássicas quanto contemporâneas das práticas de cinema e educação, o envolvimento desses jovens no processo de produção do vídeo fez emergir uma série de questões, demarcando uma compreensão clara da posição social do surdo não como uma deficiência, mas, sim, como uma cultura que precisa ser reconhecida como tal. O envolvimento dessas pessoas como sujeitos ativos do processo de produção fez aparecer, por exemplo, entre as diversas questões aí implícitas, que as proposições (ou endereçamentos) direcionadas a esse grupo, sobretudo nas políticas públicas e legislações brasileiras voltadas para o cinema, quando existem, são em geral baseadas na limitação (auditiva), e não na diferença cultural (ser surdo). Pode-se inferir, portanto, a partir da experiência relatada, que a prática do cinema na escola tem uma imanência política potente, sobretudo quando articulada às questões da inclusão e das chamadas minorias, geralmente naturalizadas em uma espécie de invisibilidade; e que tal prática é capaz de subsidiar outras experiências que entrelaçam o campo cinema e educação com propostas inclusivas de cinema na escola, enriquecendo práticas e reflexões teórico-metodológicas para esse entrelaçamento, e fortalecendo a participação do surdo no desenvolvimento de soluções que façam sentido para esse grupo cultural.

Se o “espaço da diferença” entre endereçamento e resposta abordado por Ellsworth (2001)Ellsworth, E. (2001). Modos de endereçamento: Uma coisa de cinema; uma coisa de educação também. In T. T. Silva (Org.), Nunca fomos humanos: Nos rastros do sujeito (pp. 9-76). Belo Horizonte: Autêntica., assim como o “regime estético”, proposto por Rancière, podem ser entendidos como dimensões políticas no contexto da prática do cinema na escola, podemos, com isso, compreender que a experiência da oficina, seja no âmbito da produção ou da recepção, propiciou formas potentes de relação entre os participantes, e entre eles e o mundo, cuja expressão mais evidente pode ser vista no próprio vídeo e no sistema colaborativo da sua produção, acionado pela força de um descontentamento social vivido por eles no contexto escolar; uma experiência com a arte cujos desdobramentos, na ordem do conhecimento, são ao mesmo tempo indefiníveis e definidores de outros mundos.

  • 1
    Apoio: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)
  • 2
    Normalização, preparação e revisão textual: Aline Maya (Tikinet) – revisao@tikinet.com.br
  • 3
    “… que supostamente se estrutura como ato comunicativo que apresenta, de um modo ou de outro, uma demarcação, uma metodologia de ensino, um princípio pedagógico, voltados para um domínio específico do conhecimento ou para o adestramento para uma prática” (Xavier, 2008Xavier, I. (2008). Um cinema que “educa” é um cinema que (nos) faz pensar: Entrevista com Ismail Xavier. Educação & Realidade, 33(1), 13-20., p. 15).
  • 4
    Entre os anos 1990 e 2009, o termo referente a “oficina de vídeo” variava de acordo com publicações da mídia e dos próprios agentes (Toledo, 2010Toledo, M. (2010). Educação audiovisual popular no brasil: Panorama, 1990-2009. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, São Paulo.).
  • 5
    Ver Toledo (2010)Toledo, M. (2010). Educação audiovisual popular no brasil: Panorama, 1990-2009. Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo, São Paulo..
  • 6
    Ver Cadernos do Inventar (www.inventarcomadiferenca.com.br).
  • 7
  • 8
  • 9
    Ver também trabalhos (teóricos e práticos) desenvolvidos por Mônica Fantin e Gilka Girardello, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); pelo Programa de Alfabetização Audiovisual da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); por Rosália Duarte, na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio); por Inês Teixeira, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); além de Fabiana Marcello e Rosa Fischer, na UFRGS; Milene Gusmão, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), entre outros.
  • 10
    Os termos “filme” e “vídeo” aqui têm o mesmo significado. Embora vídeos resultem de uma técnica diferente da experimentada pelos filmes (película cinematográfica), a designação do termo aqui se referirá sempre à obra, e não à técnica.
  • 11
    Dispositivo eletrônico, parcialmente implantado, que visa proporcionar aos usuários sensação auditiva próxima à fisiológica.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    03 Maio 2018
  • Revisado
    01 Ago 2018
  • Aceito
    06 Ago 2018
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