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O diário invertido como possibilidade de variação pedagógica intensiva 1 1 Editor responsável: Alexandre Filordi de Carvalho. https://orcid.org/0000-0003-4510-9440 2 2 Normalização, preparação e revisão textual: Ailton Junior – revisao@tikinet.com.br 3 3 Revisão (inglês): Andreza Aguiar - andreza@tikinet.com.br

The inverted diary as a possibility of intensive pedagogical variation

Resumo

O presente artigo trata do diário invertido, uma ação pedagógica feita junto aos alunos do 3º ano de graduação de uma universidade pública. A iniciativa dos professores de enviar diários de campo aos estudantes visava horizontalizar, intensificar e qualificar a comunicação entre ambos. A proposta foi desenvolvida em uma disciplina prática com mulheres em situações de vulnerabilidade em Santos e, considerada como variação pedagógica, discutiu sobre uma prática de ensino-aprendizagem que pudesse promover relações de confiança, respeito e composição no contexto da universidade. Dar linha a um tempo melhor cadenciado alçou a qualidade dos encontros a novos ares, reconciliando a confiança e o cuidado como sentidos primevos da relação pedagógica.

Palavras-chave
diário; métodos didático-pedagógicos; processo de ensinoaprendizagem; ensino superior

Abstract

This article approaches the inverted diary, a pedagogical action developed with 3rd year students at a public university. The teacher’s initiative, which consisted in sending field diaries to the students, had the goal of “horizontalizing”, intensifying and qualifying communication between them. The proposal was developed along a practice discipline with women in vulnerable situations in the municipality of Santos, state of São Paulo, wich was considered as a pedagogical variation that allowed discussing new teaching-learning practices and actions that can promote relations of trust, respect and composition in the university context. Working with a more controlled time raised the quality of meetings to a new degree, thus reconciling trust and care as the early meanings of the pedagogical relationship.

Keywords
diary; didactic-pedagogical methods; teaching-learning process; higher education

Contexto da experiência

Fico pensando se falta desejo, interesse, curiosidade ou paixão. Ou se é só o “tempo de chegada” e eu estou me afobando. Pensando se foi a “educação formal” que amordaçou nossos corpos e nos colocou em lugar de passividade. Espera-se o quê? Pra mim, o único sentido de esperança é o de esperançar, esse infinitivo. “Se animar, ir à luta”. Então, vamos?!

(Trecho de um diário invertido).

O artigo analisa alguns aspectos do processo formativo que utilizou os chamados diários invertidos como proposta pedagógica com alunos do 3º ano de graduação da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), campusBaixada Santista. Este processo fez parte de uma prática realizada com um grupo de mulheres4 4 O trabalho foi iniciado em 2009 e já foram realizadas muitas pesquisas e produções científicas sobre esta experiência. Para saber mais sobre as publicações e caminhos desse projeto acessar: https://delicadascoreo.wixsite.com/delicadas/o-projeto com quem eles trabalharam no semestre e na relação pedagógica construída entre docentes e estudantes. A iniciativa emergiu em meio a tentativas de variação pedagógica no eixo comum “Aproximação ao trabalho em saúde”, clínica integrada: produção do cuidado, da grade curricular dos estudantes de educação física, nutrição, psicologia, fisioterapia e terapia ocupacional. O objetivo geral deste eixo é formar uma clínica comum aos vários campos profissionais, avançando na produção e gestão do cuidado individual e coletivo em saúde. Na prática, são organizados grupos compostos por estudantes dos diferentes cursos de graduação para atuarem em conjunto num equipamento de saúde ou de arte e cultura localizados em território específico da cidade, durante um semestre do ano letivo.

O grupo dos estudantes é composto em média por dez integrantes dos diferentes cursos de graduação em uma primeira aproximação mais contínua e intensa com a prática de intervenção. Trata-se de uma equipe relativamente grande com pessoas trazendo diversos saberes, práticas e referências, e buscando construir um trabalho interprofissional e transdisciplinar, com toda complexidade e riqueza que essa construção implica.

A ideia de borrar fronteiras entre os saberes e as profissões, ainda que seja uma proposta um tanto contra hegemônica, é uma busca viva e ativa no fazer do cotidiano pedagógico desta universidade, motivada pelo movimento mais amplo em torno das formações na área da saúde5 5 Acompanha-se contextualmente, portanto, os preceitos da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2010, p. 7) em seu Marco para Ação em Educação Interprofissional e Prática: “A educação interprofissional ocorre quando estudantes de duas ou mais profissões aprendem sobre os outros, com os outros e entre si para possibilitar a efetiva colaboração e melhorar os resultados na saúde”. . O projeto pedagógico do campus é direcionado pela educação interprofissional, que implica o desenvolvimento de uma proposta formativa interdisciplinar e interprofissional de modo a romper com a estrutura tradicional centrada nas disciplinas e na formação específica de cada perfil profissional. A convivência entre os alunos dos diferentes cursos promove curiosidade, aproxima diferentes práticas e futuras profissões, numa construção compartilhada dos saberes. Deste modo, o trabalho interprofissional vai sendo experimentado já na formação e a ideia de interdisciplinaridade se efetua em ato, para além apenas do plano conceitual.

A “Aproximação ao trabalho em saúde” que tratamos neste artigo se dá com um grupo de mulheres em uma Organização Não-Governamental chamada Arte no Dique6 6 Ver site Arte no Dique: https://www.artenodique.org/ . Trata-se de um instituto com mais de 15 anos de atuação na Zona Noroeste, grande área da cidade de Santos/SP, com vulnerabilidades significativas e de diversas ordens que permanecem por trás e bem distante dos cartões postais7 7 Anthropos Filmes. (2016, 15 de setembro). Por Trás do Cartão Postal – Documentário [Arquivo de vídeo]. Recuperado de https://www.youtube.com/watch?v=CS2PNwTYrHA da cidade litorânea. O local promove oficinas artísticas e pedagógicas para crianças no período do contraturno escolar, além de formação aberta à comunidade em computação, percussão, teatro, dança de rua, entre várias outras.

No Arte no Dique os estudantes experimentam um lugar de coordenação de atividades e intervenções junto às mulheres a partir de diversos recursos, dentre eles: dança, música, filmes, saídas pelo território (ida à praia, parques, museus etc. ); realização de atividades plásticas, escritos, desenhos; compartilhamento de histórias, desafios, necessidades e desejos em suas vidas; comemorações de aniversários nas casas das próprias mulheres; lanches comunitários etc.

Em dado momento nos parecia que o trabalho, da perspectiva das mulheres, andava bem, era nítido como o grupo se constituiu como lugar de pertencimento, afeto e vínculo explicitado pelas presenças significativas das mesmas nos encontros. A maioria delas apresentava quadro estável em relação a sofrimentos psíquicos e questões relacionadas a deficiências e envelhecimento, apesar de ainda terem frágeis redes de apoio. Neste sentido, o grupo do Arte no Dique se configura como espaço efetivo de convivência, criação e cuidado, bem como um ponto de apoio na construção de redes e processos de participação social e cultural.

Enquanto as mulheres pareciam bem, algumas questões na construção do trabalho formativo com os estudantes envolveram nossa atenção no primeiro semestre do ano letivo de 2017. A saúde mental no ambiente acadêmico, principalmente dos estudantes, mostrava indícios da necessidade de maior cuidado. Nos perguntávamos: havia sentido pleno em nossos encontros? Como fazer deslocar a desvirtuada acepção do aprendiz como mero executor de tarefas dadas por outrem, para uma compreensão do estudante com postura ativa, em formação por meio de uma prática de trabalho, que se experimenta, cria e inventa no contato com as novas tarefas e práticas, e que se corresponsabiliza na construção conjunta das ações? O estudante como um sujeito com experiências prévias de vida e que, neste contexto, se aventura em percorrer novos caminhos e descobrir modos de agir e trabalhar com a população e com a equipe?

Movidos por estas inquietações, o trabalho pedagógico e as variações produzidas neste semestre buscavam fomentar processos de emancipação e promover novos sentidos para o trabalho em equipe a partir do respeito, da escuta e da corresponsabilização. Buscava-se renascer junto para outros mundos acadêmicos possíveis. De modo geral, interessava-nos construir um ambiente propício para o trabalho coletivo e colaborativo, permeado pela troca e pelo diálogo. Mas estudantes e professores têm experiências prévias, muitas vezes com costumes já impermeabilizados, calos, resistências e, por que não dizer, desgastes. Então, como acreditar e fazer acreditar que a variação e/ou superação de hábitos pudesse ser algo que valesse a pena ser investido? Como incitar a dimensão criativa e apostar em outros modos de se relacionar, de fazer e de aprender, coletivamente?

Ações semeadoras da experiência

Sabemos que cooperar não é imperativo. Então, como criar um espaço em que nos importamos em construir algo juntos? Em que estejamos todos implicados, engajados? Como criar esse convite, ativar esse desejo?

(Trecho de um diário invertido).

Movidos pela inquietação com tais questionamentos e compreendendo o lugar do docente como “apenas” mediador na construção do conhecimento, buscamos desenvolver propostas que suscitassem modos de trabalho colaborativos e emancipatórios, em consonância com Capozzolo, Casetto e Henz (2013, p. 188)Capozzolo, A. A., Casetto, S. J., & Henz, A. O. (Orgs.). (2013). Clínica comum: itinerários de uma formação em saúde. São Paulo: Hucitec.:

O processo de ensino-aprendizagem, nessa perspectiva, é constituído pela circulação em áreas diversas do saber, e tem no protagonismo dos alunos o aspecto essencial de uma trajetória focada na experiência, ao mesmo tempo coletiva e singular. O papel docente se exerce na mediação das relações do aluno com os contextos de aprendizado, promovendo-lhe o suporte para a construção de seu caminho na trajetória profissional. Formar-se profissional, assim, torna-se formar-se sujeito, sendo a universidade um laboratório de novas relações sociais.

Iniciamos com propostas de aproximação e troca entre os estudantes, e entre os estudantes e nós – docentes também de diferentes formações profissionais. Trabalhamos com o corpo, os sujeitos em relação, deslocando e ocupando o espaço, aproximando e distanciando uns dos outros. Trabalhamos com o olhar, com o que víamos e deixávamos de ver, e com os olhos nos olhos em silêncio.

Naquele semestre em particular, intensificamos a proposta de nos escutarmos. Ao início de cada encontro propúnhamos uma troca de escuta em duplaque durava alguns minutos. Uma das pessoas perguntava à outra “como você está?”, e escutava a resposta buscando não interferir, interpretar ou analisar a fala do outro. A ideia era promover aproximação e conexão, de modo que quem escutasse não estivesse preocupado em responder ou aconselhar o outro, mas ouvi-lo empaticamente. Desse modo, praticávamos também nossa atenção e presença.

Escutar as experiências anteriores dos estudantes e suas expectativas e desejos com relação ao módulo também era um de nossos interesses. Com isso pretendíamos planejar o semestre de modo coletivo, buscando construir sentido compartilhado e engajamento. Perguntamos a eles o que havia sido positivo na experiência anterior com o módulo Trabalho em Saúde (TS), e solicitamos que propusessem pontos de melhoria a partir daquilo que não havia sido bom. As respostas apresentavam pontos como: importância de supervisão; necessidade de organização das atividades; desejo de horizontalidade; autonomia para os estudantes planejarem as ações; respeito entre a equipe de estudantes; importância do compromisso e comprometimento de todos envolvidos. Necessidades que, aliás, também são observadas na prática de trabalho em diferentes equipamentos e equipes de saúde: respeito, compromisso, autonomia, horizontalidade e supervisão. Ao planejarmos as ações em conjunto com os estudantes, buscamos criar estratégias para responder essas questões que permaneceram vivas entre nós durante o semestre.

A partir desta escuta inicial, foi preciso tempo para refinamento de nossas ações no campo e para o acompanhamento dos processos dos estudantes (questão que tem retornado com frequência ao longo dos anos de trabalho no eixo). Aliado a isto, já vínhamos percebendo a necessidade de uma pausa no trabalho em campo para que pudéssemos também nós – docentes – elaborarmos e refletirmos sobre as nossas ações, sensações e desafios neste trabalho que se faz no cotidiano das pessoas, colocando-nos cotidianamente frente aos imprevistos da vida de cada um, das condições do território (por vezes a região sofre com as enchentes ou problemas relativos à violência, ao tráfico de drogas, entre outros) e da própria organização do serviço que nos acolhia (relações com os profissionais que ali atuam, problemas para ocuparmos uma sala no local, eventos paralelos que exigiam flexibilidade etc. ). Buscando responder a tais necessidades, naquele semestre organizamos o trabalho de modo que estivéssemos quinzenalmente em campo com o grupo de mulheres, e quinzenalmente em um espaço de supervisão na universidade.

No decorrer do módulo, como de costume, os estudantes seguiram sendo convidados a construir conjuntamente a proposta a ser desenvolvida com o grupo de mulheres no Dique. Além disso, sempre tínhamos o momento do lanche coletivo, em que cada um era convidado a colaborar como pudesse (rico momento de comensalidade, em que conhecíamos também as habilidades culinárias das pessoas e trocávamos receitas). As relações de troca e confiança foram se intensificando e criando uma equipe que trabalhava com respeito, compromisso e comprometimento com o fazer coletivo, com a tarefa, com as mulheres e com o alimento partilhado.

Aos poucos, notávamos que os modos de relação e de trabalho em conjunto também foram instaurando ambientes propícios para o cuidado de si e para desenvolver ferramentas que buscassem cuidar melhor do outro. O espaço e, sobretudo, a maior disponibilidade de tempo em ambiente mais “protegido” da supervisão foi importante para esse processo. As supervisões passaram a ser feitas na universidade e não em campo, permanecendo em um ambiente mais familiar a todos, diminuindo a exigência de deslocamento para outro território, por vezes desconhecido e bastante mobilizador8 8 A este respeito, sugerimos a leitura do artigo de Liberman e Maximino (2016). .

Falando na quebra da hierarquização na relação professor/aluno, sem dúvidas nesse semestre isso ocorreu como nunca antes na minha graduação. Éramos tratados de igual para igual, todos empenhados e trabalhando juntos. Durante o semestre contava para outros colegas como era o meu TS e eles ouviam chocados e com inveja, diferente de tudo que imaginávamos. Foi nos mostrado desde o início que cuidaríamos de nós para poder cuidar do outro. Voltando ao meu primeiro diário, faço o relato: “Saí da aula com um sentimento de que iremos ter muitos momentos como esses, e dessa forma, criaremos intimidade, cumplicidade e poderemos cuidar de nós mesmos e do próximo. Para mim foi muito importante esse momento de sair da rotina, foi uma aula que quebrou todas as minhas expectativas de que seria uma aula normal, na sala de aula. São poucos os momentos como esse que temos durante a graduação e eles fazem toda a diferença no cuidado de nós mesmos

(Trecho de relatório final – Beatriz).

Uma variação intensiva: o diário invertido

Nas primeiras semanas do módulo, buscamos um dispositivo de diálogo entre nós, professores, e os alunos, que buscasse interferir com maior intensidade nos encontros presenciais semanais com o grupo de mulheres. O tempo que passávamos juntos e, sobretudo, os estados de presença de todos, eram insuficientes para os rearranjos que pareciam necessários e para a aproximação aos objetivos da prática no módulo da formação curricular. Lançamos mão dos diários invertidos, feitos pelos docentes e endereçados semanalmente aos estudantes – além disso, seguia-se a prática de diários de campo dos estudantes, atribuição que compunha seu processo de avaliação ao longo da disciplina.

A intenção era criar mais um espaço de interlocução, pela escrita à distância e solitária, em que pudesse prevalecer ao menos o desejo de maior honestidade em relação às sensações vividas presencialmente. De certa forma, interessava também “humanizar” o lugar da docência e a figura mesmo do professor, que é também habitada por dúvidas, incertezas e inquietações, sobretudo em relação ao início de um processo que buscávamos construir de outras maneiras.

Escrevo este diário-tentativa buscando acionar, pelo lado do avesso, o mesmo dispositivo requerido aos alunos: quem sabe possa ser este um mecanismo de elaboração recíproca e, por que não, de ação pedagógica. Espero também que seja dado retorno, por meio de comentários, observações, críticas e sugestões acerca das linhas que se seguem

(Trecho de diário invertido).

Conceitualmente, o diário de campo origina-se como ferramenta de pesquisa da antropologia e tem na etnografia sua raiz epistemológica. Surge como um instrumento básico de registro de dados das visitas in loco e tem como marco a obra Um diário no sentido estrito do termo”, de Bronisław Malinowski, de 1967 (Roese et al., 2006Roese, A. et al. (2006). Field Diary: construction and utilization in scientific researches. Bibliographic analysis. Online Brazilian Journal of Nursing, 5(3), 1676-4285. doi:10.5935/1676-4285.2006598
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). A publicação póstuma do material produzido no início do século XX possibilitou em determinadas áreas da academia a emergência da noção de influência recíproca entre o observador e o observado.

Este recurso tem encontrado maior disseminação entre métodos de pesquisa qualitativa, em abordagens majoritariamente observacionais, servindo como fonte de dados observados e coletados diretamente em campo e a serem analisados a posteriori. Contemporaneamente, relativiza-se a ideia de “coleta de dados” em campos específicos do saber, uma vez que se admite que há interferência plena do pesquisador em seus temas e sujeitos de pesquisa. Daí a ideia de produção de dados (Kastrup & Escóssia, 2015Kastrup, V., & Escóssia, L. (Orgs.). (2015). Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.) em vez de coleta, mais ligada à pressuposição de que os dados já estariam prontos em campo, somente à espera.

O recurso da escrita de diários ou notas de campo acompanha a ideia da implicação inerente ao pesquisador na observação e produção teórica e/ou reflexiva sobre a realidade, o que vem sendo metodologicamente reconhecido como um importante apoio na observação participante e na pesquisa-intervenção, em cujo contexto é denominado por diário de pesquisa (Pezzato, Mendes, Oliveira, & Azevedo, 2019Pezzato, L. M., Botazzo, C., & L’Abbate, S. (2019). O diário como dispositivo em pesquisa multicêntrica. Saúde e Sociedade, 28(3), 296-308. doi:10.1590/s0104-12902019180070
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).

Teoricamente, o diário de campo deve dar conta de dois componentes principais: “O primeiro é descritivo, em que a preocupação é a de captar uma imagem por palavras do local, pessoas, acções e conversas observadas. O outro é reflexivo – a parte que apreende mais o ponto de vista do observador, as suas ideias e preocupações. (Bogdan et al., 1994Bogdan, R. C., & Biklen, S. K. (1994). Investigação qualitativa em educação – uma introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora., p. 152).

No trabalho que fazemos no eixo comum Trabalho em Saúde (TS) (Capozzolo et al., 2013Capozzolo, A. A., Casetto, S. J., & Henz, A. O. (Orgs.). (2013). Clínica comum: itinerários de uma formação em saúde. São Paulo: Hucitec.), temos por hábito a produção de diários com notas descritivas e intensivas, com reflexões e associações. As notas descritivas abarcam a caracterização do local, dos sujeitos presentes, dos aspectos mais concretos dos espaços e tempos vividos, das características marcantes das pessoas, seus gestos, estilos e falas. As notas intensivas, por sua vez, direcionam-se para os sentimentos, sensações, dificuldades encontradas, especulações, palpites e hipóteses do próprio estudante, partindo da premissa básica de que “para perceber o outro, é preciso perceber-se a si mesmo na situação” (Henz et al., 2013Henz, A. O. et al. (2013). Orientações para o trabalho de campo (Anexo 2). In A. A. Capozzolo, S. J. Casetto, & A. O. Henz (Orgs.), Clínica comum: itinerários de uma formação em saúde (pp. 287-288). São Paulo: Hucitec.). Permanecia, portanto, a composição entre duas direções complementares da escrita. No entanto, percebemos que a separação formal entre ambas resultava em textos burocráticos que pouco contribuíam para a finalidade principal do processo como um todo: a reelaboração dos acontecimentos.

A prática da escrita de diários de campo pelos estudantes no campustornou-se hábito em visitas domiciliares e demais trabalhos em campo que fazem parte das atividades do eixo comum Trabalho em Saúde desde o primeiro ano de formação. Os estudantes, portanto, já vinham experimentando a proposta de redação e o estímulo para a leitura dos diários dos colegas. Mas não haviam, até então, recebido sistematicamente diários de campo dos professores.

Ao todo, foram enviados 16 diários invertidos durante os quatro meses letivos, mantendo, portanto, a frequência e regularidade quinzenal, com a qual os alunos já estavam habituados. Neste sentido, o modo pelo qual o recurso foi introduzido não representou uma novidade na prática usual, mas um suplemento ao que já se fazia. Consideramos que esta periodicidade foi de grande importância para o acolhimento dos diários invertidos como parte da construção do processo singular do grupo.

É possível admitir que procedemos como cartógrafos-pesquisadores, considerando a escrita de diários como um expediente não premeditado, cuja potência foi percebida quando o processo já estava em curso. Ele dava conta de associar e beneficiar os professores, o grupo de estudantes e o grupo de mulheres, todos recém encontrados e com suas infinitas experiências de vida.

Nos diários escrevíamos como foi a experiência do dia, como fomos afetados e o que nos fez pensar, e levantávamos ideias de como poderíamos seguir a partir dali. Neles, era como se pudéssemos fazer transparecer nossos acordos e afirmar como e porque estávamos fazendo aquilo que estávamos fazendo. Weber traz à tona uma interessante diferenciação entre ao menos três formas principais de diários: o diário propriamente etnográfico, o de pesquisa e aquele chamado “diário íntimo”, do qual, ao que parece, nos aproximávamos mais:

[o diário íntimo] nada mais é, em realidade, que um resíduo não trabalhado, inutilizável porque insuficientemente analisado. Os materiais íntimos subsistem como não publicáveis na medida em que a autoanálise é incompleta, isso porque não se pode ou não se quer levá-la a termo

(Weber, 2009Weber, F. (2009). A entrevista, a pesquisa e o íntimo, ou por que censurar seu diário de campo? Horizontes Antropológicos, 15(32), 157-170. doi:10.1590/S0104-71832009000200007
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, p. 167).

Se aceitos como “diários íntimos” nessa concepção, é possível que neles se reconheça a expressão de nossas vulnerabilidades, fator decisivo para sua escolha diante das demais variações. Por conta de seu conteúdo mais “cru”, eram capazes ainda de carregar nossos humores e emoções, nas palavras de Weber (2009)Weber, F. (2009). A entrevista, a pesquisa e o íntimo, ou por que censurar seu diário de campo? Horizontes Antropológicos, 15(32), 157-170. doi:10.1590/S0104-71832009000200007
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, aproximando-nos da mesma experiência dos estudantes, vivida em primeira mão conjuntamente.

Definimos o diário invertido como um recurso pedagógico, fruto do processo pelo qual os professores produziram e enviaram escritas periodicamente aos alunos, processo diferente da ordem tradicional o percurso formativo do campus, na qual eles ocupariam a posição de destinatários ao invés de remetentes. Apesar da denominação, o teor das escritas do diário invertido extrapolava a referida composição entre descrição e reflexão, avançando paulatinamente no desnudamento do próprio dispositivo9 9 Para um aprofundamento no conceito de dispositivo do diário, ver Pezzato, Botazzo e L’Abbate (2019). , que era estabelecer um canal comunicativo de maior qualidade entre as duas posições ativas, professores e estudantes, na dinâmica de ensino.

Admitindo um hiato entre as distintas realidades de estudantes e professores, ainda que com características mais pessoais do “diário íntimo”, o recurso do diário invertido conservou, analogamente, o conceito inicial da produção de diários de campo da etnografia, partindo da ideia de que apenas por meio de uma imersão no cotidiano do território alheio poderia suscitar uma maior compreensão recíproca (Mónico et al., 2017Mónico, L. S. et. al. (2017). A observação participante enquanto metodologia de investigação qualitativa. In VI Congresso Ibero Americano de Investigação Qualitativa (vol. 3, pp. 724-733). CIAIQ, Salamanca., p. 725). Os aspectos da relação contemporânea entre professores e alunos serão discutidos mais adiante em suas relações com hierarquização e a saúde mental acadêmica.

Os diários invertidos foram despachados sem aviso prévio após o primeiro encontro com o grupo. Quando os alunos receberam nossos escritos, houve uma reação de interesse e surpresa, nos encontros seguintes observamos que algo do relacionamento havia sido sutilmente modificado. Brotara uma ruptura serena, catalisadora de outras formas de estar junto. Este pequeno deslocamento parece ter sido suficiente para uma variação significativa. Parecia que estávamos próximos do que Kastrup (2005)Kastrup, V. (2005). Políticas cognitivas na formação do professor e o problema do devir-mestre. Educação & Sociedade, 26(93), 1273-1288. doi:10.1590/S0101-73302005000400010
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chama de “aprendizagem inventiva”, uma aprendizagem que inclui a invenção de problemas e expande a compreensão corrente do termo “solução de problemas”. Trata-se de uma aprendizagem que surge como processo de produção de subjetividade, como invenção de si e do mundo. Para Kastrup (2005, p. 1277)Kastrup, V. (2005). Políticas cognitivas na formação do professor e o problema do devir-mestre. Educação & Sociedade, 26(93), 1273-1288. doi:10.1590/S0101-73302005000400010
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, essa noção de invenção, que demarcamos aqui, é a invenção ex-nihilo, que cria o novo a partir do nada.

Trata-se de dotar a aprendizagem da potência de invenção e de novidade. Tomemos como exemplo a experiência com a arte, evocando Varela quando aborda o problema da aquisição da habilidade musical. A aprendizagem de tocar um instrumento revela uma dimensão que ultrapassa aquela de solução de problemas e de adaptação a um mundo preexistente, indicando a invenção recíproca e indissociável de si e do mundo como, no caso, do músico e da música (Varela, Thompson & Rosch, 1993). Aprender resta sendo antes uma questão de invenção que de adaptação.

A invenção ex-nihilo cria uma certa “perturbação”, uma rachadura, uma bifurcação no fluxo recognitivo habitual. A iniciativa dos diários pode ter tido, inicialmente, esse efeito perturbador, e ainda pode ter colocado em funcionamento uma espécie de fetiche pela intimidade, um desejo de conhecer mais a fundo o outro (como o que se opera no Facebook): a ideia de que o professor estaria se expondo, da mesma forma como o estudante sempre fora cobrado institucional e desigualmente, pode ter acionado uma empatia outrora não acontecida no processo formativo.

… foi quando fizeram o primeiro diário de campo invertido e nos enviaram. É isso, estavam tentando propor que construíssemos um grupo de trabalho independente de posições e títulos. Eles deram um passo na direção de sair da posição cristalizada de professores-proponentes, para que déssemos um passo para romper com a posição de alunos-passivos. Para mim, isso foi de extrema importância, intensificou todo o sentimento que já estava desenvolvendo por esse módulo. Esses diários invertidos não significaram só isso. Também foram responsáveis por trazer para o grupo a humanidade dos professores. Através deles, tivemos acesso às inseguranças, angústias, satisfações e realizações, podendo trabalhar a partir disso e cuidar desses processos. Além disso tudo, com a confecção de diários invertidos, esse registro saiu do lugar de forma de avaliação, eu não fazia mais apenas porque valia nota, percebi o sentido que havia em produzir diários semanais. Voltando a reflexão sobre a participação ativa, os diários invertidos deixaram o ambiente mais propício, confortável e seguro para o desenvolvimento da autonomia. Nos encontros que se seguiram, cada vez mais os alunos se colocavam e propunham coisas, sentia que os professores estavam contentes com o processo. E nós, estudantes, também. Eu, particularmente, me sentia pertencente e responsável por tudo que estávamos fazendo, o que me animava e motivava

(Trecho de relatório individual final – Priscilla).

As trocas de diários foram se mostrando um importante recurso de interlocução intensiva e invenção de uma porosidade possível, talvez não facilmente admitida no meio acadêmico como pré-requisito básico para o encontro entre professores e alunos. Pode-se pensar que houve uma chance de exposição dialogada de vulnerabilidades, que se relacionavam diretamente com os objetivos e conteúdos pedagógicos do módulo. Ao ser correspondido, foi possível que o formato “diário de campo” pudesse ser ressignificado e revitalizado.

Justifica-se a escolha do diário invertido pela aceitação e percepção inicial de que escrever e compartilhar constituíam gestos de cuidado e prazer legitimados por todos.

As variáveis entre professores e alunos

A fragilidade da saúde mental dos estudantes da área da saúde não se constitui em um campo de investigação novo, apesar de crescente (Lantyer, 2013Lantyer, A. S. (2013). Avaliação e manejo do estresse entre estudantes universitários da Unifesp – campus baixada santista. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de São Paulo, Santos.; Oliveira & Padovani, 2014Oliveira, N. R. C., & Padovani, R. C. (2014). Saúde do estudante universitário: uma questão para reflexão. Ciência & saúde coletiva, 19(3), 995-996.; Paro & Bittencourt, 2013Paro, C. A., & Bittencourt, Z. Z. L. C. (2013). Qualidade de vida de graduandos da área da saúde. Revista Brasileira de Educação Médica, 37(3), 365-375. doi:10.1590/S0100-55022013000300009
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). As demandas acadêmicas são características da vida universitária, tais como:

… o excesso de carga horária de estudo, o nível de exigências em relação ao processo de formação, a adaptação a um novo contexto, novas rotinas de sono, novas demandas de organização de tempo e estratégias de estudo, etc. Tais aspectos podem se constituir como estressores, pois demandam do estudante um repertório comportamental para se organizar e conseguir enfrentar tais exigências. Quando há um déficit neste conjunto de habilidades e competências, é provável que estes estressores sejam vivenciados com maior intensidade pelo aluno

(Ariño & Bardagi, 2018Ariño, D. O., & Bardagi, M. P. (2018). Relação entre fatores acadêmicos e a saúde mental de estudantes universitários. Psicologia em Pesquisa, 12(3), 44-52. doi:10.24879/2018001200300544
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).

Ignorar esse contexto nas situações da própria formação que vivenciávamos seria uma incoerência explícita e já impossível de não ser problematizada e, sobretudo, zelada. Mas, ainda assim, somos constituídos pela instituição na qual nos encontramos e, por isso, era preciso levar em conta alguma desarticulação de nossos papeis e fazê-lo em composição com os estudantes parecia-nos profícuo com aquele grupo específico.

Acompanhamos Freire (1996, p. 61)Freire, P. (1996). Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra. na sensação instável inerente ao papel do professor quando se relaciona com os estudantes, uma vez que é perceptível que “Não resolvemos bem, ainda, entre nós, a tensão que a contradição autoridade-liberdade nos coloca e confundimos quase sempre autoridade com autoritarismo, licença com liberdade”. Em nosso campus, como possivelmente em todas as instituições educacionais, a oscilação entre estes dois polos destacados confunde-se e mistura-se às características identitárias dos indivíduos, perdendo relevo e simplificando-se em benevolências ou tiranias pessoais.

Docentes e estudantes habitam lugares diferentes na dinâmica educacional e, neste sentido, a troca de escritos entre eles levavam e traziam notícias imprescindíveis a ambos. Portanto, a ideia funcionou bem como um vai e vem, ainda que o trajeto entre as duas posições distintas não fosse sempre o mesmo. A via dos estudantes aos professores vinha sendo a principal, com sentido único. Ao assumi-la como uma possibilidade em seu formato de escrita, provocamos o deslocamento para um processo participativo, meio na contramão de tantos outros vivenciados pelos estudantes ao mesmo tempo. Em outras palavras, os estudantes foram expostos a dinâmicas contraditórias de, por um lado, a permanência de situações de ensino-aprendizagem fortemente hierarquizadas e, por outro, o risco da nossa experiência, que se pretendia mais horizontal. Esta dualidade nem sempre é possível de ser vivida conscientemente e com a flexibilidade que imputa.

Essa comunicação por parte dos professores, porém, não era isenta de conflitos internos e desconfortos. Expor-se exige coragem, há inevitavelmente um desnudamento nesta escrita, provavelmente parecido com o que convidávamos os alunos a fazerem semestre após semestre. Os diários pareciam colocar em movimento o “suposto saber” e as convicções que a ideia de mestre-monumento carrega. Com o tempo e a prática fomos percebendo que o que estava em jogo era também o próprio poder que, muitas vezes de modo conveniente, a ideia de mestre implica. Foi imperativo aceitar que nosso não-saber e nossas vulnerabilidades poderiam ser admitidos como símbolos expressivos de uma marca, de uma variação pedagógica, em relação aos modos de relação entre nós. A carga institucional que carregávamos, enfim, conquistava ocasião de se diluir por meio da escrita.

No processo de escrita, alguns receios eram comuns aos docentes: vou escrever tudo que penso? Isso poderia me expor demais? Devo colocar minhas dúvidas e incertezas? Como isso poderá impactar nossa relação? E outros tantos, correlatos, eram comuns aos estudantes: posso escrever tudo ao meu professor, uma vez que sou avaliado por ele? Sinto-me em condições de comentar algo que o meu professor escreveu? Estou autorizado a questionar o saber do professor? E o tempo para fazer isto? Estou disposto?

De algum modo, mesmo que sutilmente, a variação produzida pretendia tensionar a ideia de desigualdade das inteligências entre professor e aluno, colocada na relação pedagógica desde muito cedo de modo a afirmar uma distância intransponível entre eles. Para Joseph Jacotot, pedagogo francês do início do século XIX, a identidade de causa e efeito está no cerne desta lógica embrutecedora e o que o aluno deve aprender é aquilo que o mestre o faz aprender. Nas palavras de Rancière (2012)Rancière, J. (2012). O espectador emancipado (I. C. Benedetti, trad.). São Paulo: Martins Fontes., trata-se de um protocolo de transmissão direta e fiel do saber, como se houvesse “alguma coisa, um saber, uma capacidade, uma energia que está de um lado – num corpo ou numa mente – e deve passar para o outro” (Rancière, 2012Rancière, J. (2012). O espectador emancipado (I. C. Benedetti, trad.). São Paulo: Martins Fontes., p. 18). Em contraposição a isso, Jacotot convoca a prática da emancipação intelectual e da igualdade da manifestação de nossas inteligências, que ignora a distância embrutecedora entre aluno e mestre, “a distância transformada em abismo radical que só um especialista pode ‘preencher’” (Rancière, 2012Rancière, J. (2012). O espectador emancipado (I. C. Benedetti, trad.). São Paulo: Martins Fontes., p. 15), e a considera como condição normal de toda comunicação.

A distância que o ignorante precisa transpor não é o abismo entre sua ignorância e o saber do mestre. É simplesmente o caminho que vai daquilo que ele já sabe àquilo que ele ainda ignora, mas pode aprender como aprendeu o resto, que pode aprender não para ocupar a posição do intelectual, mas para praticar melhor a arte de traduzir, de pôr suas experiências em palavras e suas palavras à prova, de traduzir suas aventuras intelectuais para o uso dos outros e de contratraduzir as traduções que eles lhe apresentam de suas próprias aventuras

(Rancière, 2012Rancière, J. (2012). O espectador emancipado (I. C. Benedetti, trad.). São Paulo: Martins Fontes., p. 15).

Ressignificar essa distância parecia fundamental em nossa iniciativa, afinal, naquele campo de reconhecimento mútuo não parecia ser possível qualquer dispositivo de mão única, que insistisse em afastamento e desnivelamento. Deste modo, arriscamos pensar que alguma subversão na disposição dos corpos pudesse ocorrer, sutis subversões dos lugares, das identidades estereotipadas e das funções pré-estabelecidas de corpos tidos como “alunos” e “professores” no contexto da universidade.

Quem sabe esses gestos pudessem afirmar ações que vão na contramão de uma ordem que concebe a comunidade como estrutura estável, onde os grupos se caracterizam pelo lugar que ocupam, a função que desempenham e o modo como se adequam a esse lugar e a essa função. Rancière (2012)Rancière, J. (2012). O espectador emancipado (I. C. Benedetti, trad.). São Paulo: Martins Fontes. chama esse funcionamento rígido de “ordem policial”, na qual cada parte é compelida a manter-se fiel ao lugar, função e identidade estabelecidos, e em oposição a isso sugere a “lógica política”, caracterizada por ações que embaralham a distribuição dos lugares e das identidades.

A intenção de construir em conjunto com os estudantes uma lógica mais política que policial teve ainda outras consequências. Pôde-se observar posturas mais ativas e participativas por parte dos estudantes na construção do trabalho com as mulheres do Arte no Dique. Notava-se o envolvimento, engajamento e a autonomia que se construía no processo de realização das tarefas e de invenção das proposições feitas ao grupo de mulheres. Aos poucos, observávamos uma equipe trabalhando com corresponsabilização e de modo colaborativo.

Noto que essa tentativa tem produzido um efeito interessante nos alunos. Presença, curiosidade, colaboração, emancipação. Abertura para o outro e disponibilidade para o encontro. Abertura para o risco. Ousaria dizer que são consequências de um sentimento de confiança que começa a nascer no grupo, do fato de nos sentirmos mais em companhia. Será que é isso?

(Trecho de um diário invertido).

Semear relações de confiança parece um dos grandes desafios dos trabalhos em grupo, em equipe e em rede. Confiar no outro, nas relações, confiar em nossas ações, confiar no grupo, nos efeitos do nosso trabalho etc. E ainda tínhamos um deflagrador de nossas experiências com esta turma, um certo cansaço e adoecimento “de base”: antes mesmo das relações e vínculos terem chance de se formar, pairava uma aparente resistência, talvez uma desconfiança, ensinada e aprendida durante os anos na universidade e em outros espaços, tempos e com pessoas que não faziam parte daquela conformação coletiva ora inédita para nós. Enfim, o conceito de experiência10 10 Bondía, J. L. (2002). Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, (19), 20-28. , tão em voga nos círculos atuais da educação, mostrava também uma outra face, bem menos virtuosa: a da memória sobre maus encontros e suas consequências. Desse modo, confiar ficava mais difícil e apostar que havia outros modos de se relacionar, de aprender e de trabalhar era desafiador.

Como variação primordial, arriscamos propostas em torno da ideia de que para cuidar e produzir cuidado ao outro, seria necessário fazê-lo, antes, consigo mesmo. Conosco. Por isso as práticas de escuta, o exercício da escuta empática, o espaço da supervisão e a valorização de momentos coletivos como o lanche. Além disso, a relação franca que estabelecemos entre nós – principalmente através dos diários, mas também do modo como nos relacionávamos e o que trocávamos no cotidiano real do trabalho – concorria para o desmonte de posturas mais rígidas.

O exercício de falar a verdade e criar relações de transparência gerava surpresa e, com o tempo, trazia a possibilidade de se confiar. Articula-se com este exercício o conceito de parresía11 11 Para um aprofundamento do tema, ver Foucault (2006, p. 427-499). , entendida dentro de um conjunto de procedimentos, técnicas e objetivos de cuidados de si, localizados na pesquisa de Michel Foucault. O termo traduz-se por um “franco-falar”, em seu contexto de origem na antiguidade greco-romana. De acordo com o filósofo: “A parrhesía, traduzida em geral por ‘franqueza’, é uma regra de jogo, um princípio de comportamento verbal que devemos ter para com o outro na prática da direção de consciência” (Foucault, 2006Foucault, M. (2006). Hermenêutica do sujeito (M. A. Fonseca e S. T. Muchail, trad.). São Paulo: Martins Fontes., p. 202). Havia desejo de coerência entre o que e como dizíamos e as ações simples que propúnhamos.

Etimologicamente, parrhesía é o fato de tudo dizer (franqueza, abertura de coração, abertura de palavra, abertura de linguagem, liberdade de palavra). Os latinos traduzem geralmente parrhesía por libertas. É a abertura que faz com que se diga o que se tem a dizer, com que se diga o que se tem vontade de dizer, com que se diga o que se pensa dever dizer porque é necessário, porque é útil, porque é verdadeiro

(Foucault, 2006Foucault, M. (2006). Hermenêutica do sujeito (M. A. Fonseca e S. T. Muchail, trad.). São Paulo: Martins Fontes., p. 440).

Junto do grupo, jogamos francamente com esta alegação, de origem socrática, de que a verdade dos encontros que se iniciavam implicava um conhecimento prévio de si, para um conhecimento – e melhor governo – do outro e da cidade. Parecia germinar, portanto, um importante fundamento do cuidado como gesto político. O conhecimento/cuidado de si aconteceria, necessariamente, sob o risco do sentido dos encontros ser esvaziado, ou atropelado pelo ritmo acelerado e os automatismos das relações cotidianas desalinhadas. As supervisões quinzenais estariam destinadas a este objetivo.

Como avanço principal no processo formativo do grupo, é possível destacar a natureza mais desarmada nas devolutivas feitas pelos estudantes. Ocorreram encontros muito interessantes e os diários por eles escritos puderam atestar e expressar como as aproximações estavam germinando:

Venho escrever por meio deste, aquilo que vivo constantemente durante as minhas quartas-feiras… O “novo”! E é exatamente essa a direção para onde vou, para onde quero estar e ser presente. Estou flutuando, a vitalidade faz-se presente, onde a vida se transforma em um oceano de emoções …. É difícil encontrar uma explicação palpável do porque esses encontros semanais fazem me sentir melhor comigo mesmo

(Trecho de um diário – Lucas).

De forma crescente, semana após semana, a implicação do grupo como um todo ganhava aspectos adensados. Era possível perceber que ler e escrever sobre as experiências vividas representava mesmo um conforto, conforme os seguintes fragmentos de diários das estudantes: “Então pude concluir que as aulas não serão tão maçantes quanto a dos outros termos, por ter sido estabelecida uma relação de troca sem posições mais ou menos importantes e sim o engajamento de todos nas atividades que serão elaboradas” (Melissa); “Foi uma aula diferenciada, à qual, não só eu, mas todos os alunos sentiram a necessidade de que fosse feito diário” (Beatriz); “Foi muito bom esse momento para mim. O tempo designado para a atividade passou muito mais depressa do que imaginava” (Izabel).

De modo explícito, os estudantes acolheram a necessidade de um esforço diferente para que os encontros fizessem realmente sentido mútuo, testemunhando nos textos os desafios sentidos com os diários invertidos:

Confesso que foi muito interessante ler o seu diário, é bom para o aluno sentir com mais clareza aquilo que o professor tem a dizer sobre suas angústias e confortos.

Sinto uma preocupação latente sobre a produção de cuidado interna do grupo, assim como as relações externas do grupo com as pessoas e suas devidas possibilidades que ainda estão por vir

(Devolutiva de um diário invertido – Lucas).

[Nome do professor], gostei muito do que escreveu no primeiro diário, bem contra as formas ABNT, organizando as palavras do outro lado. Muito legal, mudar de lado! Simbólico! … percebi a ênfase que deu no texto para demonstrar o tamanho da importância das relações humanas, achei isso bonito!

[Nome da professora], gostei de ler o seu diário, foi muito legal ver que assim como eu e qualquer ser humano, temos dúvidas, questionamentos, ansiedade, … Tira o professor do pedestal do saber, das certezas, da via de mão única. Achei isso muito simbólico também!

(Devolutiva de um diário invertido – Izabel).

Enfim, o engajamento do grupo ganhou contornos favoráveis ao aprofundamento e das questões relacionais na formação dos profissionais de saúde, e a abordagem deste processo vinha sendo realizada em ato e não anunciada e especulada teoricamente. O diário invertido cumpria o papel de avançar ao terreno do saber-fazer não como exemplo ideal a ser perseguido pelo estudante, mas como experiência conjunta.

Processo de formação e tempo presente

As experiências vividas junto aos alunos deram visibilidade para questões inerentes ao processo formativo e às relações de poder-saber-vincular entre professores e alunos que vêm também ocorrendo em diversas outras experiências no campus e neste eixo de modo geral. Foi possível perceber a passagem delicada de uma forma de relação de poder – institucionalizada, herdada e muitas vezes cristalizada – para uma relação de cuidado. É possível também que tenha significado uma sutil transformação entre uma desigualdade “de raiz” presente na formação acadêmica para maior igualdade de cuidados comuns a todos. Com a iniciativa, interessava-nos diminuir dinâmicas de dominação dentro de nós, entre nós e sistemicamente, uma vez que as ações se davam num contexto acadêmico que tende, comumente, semear, germinar e reforçar tantas relações de poder que alimentam e reproduzem as bases desiguais da nossa sociedade.

É relevante evidenciar uma dificuldade explícita dos alunos em dar devolutivas aos nossos diários. Era trabalhoso, e manter a regularidade semanal também não era fácil. Abertamente, preferiam até não receber devolutiva alguma pelos próprios diários a ter a implicação recíproca de dá-las, autorizando o estado de imobilidade propiciado por diários de campo semanais mais burocráticos. Não foi simples aos estudantes e também aos docentes aceitar os deslocamentos propostos diante do “conforto” de métodos mais tradicionais. Outros corpos eram convocados, outros estados de atenção e envolvimento eram necessários e havia implicações éticas postas em variação permanente.

Em uma avaliação semestral sobre as variações produzidas, junto a outros colegas docentes do mesmo eixo de trabalho, emergiu uma primeira forma de captura dos “métodos” de trabalho que iam se desenhando. Em relação aos diários invertidos, ocorreu um movimento mais instantâneo de idealização e desejo de replicação de “experiências de êxito” nesta formação em saúde. Foi conjecturada a ideia de se fazer o mesmo em outros territórios, mas refutou-se imediata e prudentemente pela suspeita do acúmulo de mais uma tarefa aos cotidianos saturados de todos. Uma segunda forma de captura operou conosco mesmo: também nós fomos conduzidos pela aparência de potência do recurso, caindo na “armadilha” de continuá-lo automaticamente no semestre seguinte, sem, no entanto, a devida necessidade e sem ter sido “inventado” junto com a nova turma.

Estas ingenuidades pedagógicas mereceriam atenção incessante, uma vez que o apelo à reprodução de fórmulas exitosas é frequente, mesmo em meio à vontade de engendramento de variações bem-intencionadas.

O presente artigo pretende levar em conta os limites do diário invertido como variação pedagógica ao entendê-lo circunscrito às singularidades em jogo.

A maturidade do grupo de mulheres assistido, sem dúvida, foi determinante na experiência. A maior parte delas integra e sedimenta um trabalho coletivo de praticamente nove anos de existência. Este tempo de vida junto deu a condição necessária à partilha do cuidado com os alunos que, a cada semestre, se renovam.

A escrita dos diários invertidos durou apenas um semestre letivo e teve um caráter experimental, sem planejamento ou organização prévia, ocorrendo graças a um bom encontro circunstancial. Com uma “energia concentrada” foi possível de ser mantido, o que, imaginamos, não se sustenta em qualquer situação e com qualquer grupo.

Uma outra debilidade importante de ser destacada é que a iniciativa pode ter sido dependente de uma maior implicação de alguns alunos aparentemente mais interessados em meio à heterogeneidade da turma. Tal fato expõe-nos o óbvio: há sempre maior chance de uma experiência pedagógica ter êxito quando professores e estudantes “combinam”. Esta brecha levanta dúvidas: e se houvesse indiferença dos alunos também em relação aos diários invertidos? E se houvesse resistências por parte deles, como questionamentos acerca da invenção de mais uma tarefa para casa? E se houvesse críticas destrutivas diante de nossas exposições?

Os deslocamentos produzidos com o diário invertido tiveram alcance relativo. Resvalaram em permanências já consolidadas do sistema educacional, como a ideia de papéis fixos de professores e alunos, e os comportamentos esperados de cada um nestes papéis. Destacamos que houve bastante esforço no sentido de viver junto algo que pudesse se distanciar desta desvirtude da educação, o que não foi fácil.

O semestre acabou e não foi possível realizar uma avaliação específica sobre os propósitos do diário invertido. Os depoimentos transcritos neste artigo foram garimpados dos relatórios finais dos estudantes, cujo formato é mais genérico, sobre as aprendizagens do módulo como um todo. Daí que a nossa compreensão acerca do alcance do recurso é, como ele próprio, intensiva e atravessada pelas sensações mais particulares.

Um outro limite possível de ser abordado refere-se à inerente impossibilidade de acesso às muitas e simultâneas camadas de conhecimento que as visitas a campo propiciam, e a acuidade com que o diário invertido era capaz de lidar no tempo exíguo do processo como um todo. Os assuntos tratados nas escritas eram de ordens muito variadas (angústias particulares, dificuldades de presença, dúvidas conceituais sobre o fazer clínico) e, para que chegássemos com abrangência suficiente a todos eles, seria preciso mais tempo, o que era insustentável.

A experiência do sensível no tempo do cuidado

O que haveria de relevante nesta prática de ensino e aprendizagem? Por que investir em uma tentativa de variação e aproximação-distinta da batida mais homogênea e homogeneizante no cotidiano acadêmico atual? Seriam disposições apenas reativas às tristezas das novas gerações somadas às saturações das mais antigas?

Parece-nos que o anseio principal do diário invertido repousava naquilo que permanece como invariável na relação pedagógica: a necessidade de dar sentido, animar – dar alma – e vitalizar o encontro humano. Em tempos de virtualidades, cuidar da qualidade dos encontros era o mínimo a ser feito e dava vazão a manifestações de potência.

Escrevendo francamente, penso que os encontros que virão não caberão perfeitamente em nenhuma experiência que já tivemos, pois não as tivemos juntos. E é disso que se trata. Eu tento sinceramente interferir com esta escrita, pois sinto que com o tempo que temos para nos encontrar não será nunca possível e sempre faltará, tamanha a força da inércia que nos foi ensinada e, apesar de tudo, aprendemos

(Trecho de um diário invertido).

Os objetivos específicos da disciplina, nomeadamente, eram: possibilitar aos estudantes vivenciar e realizar intervenções em comum na produção do cuidado, avançando na complexidade das intervenções; exercitar a elaboração e a implementação de projetos terapêuticos singulares individuais e coletivos; ampliar as competências para o trabalho em equipe e para o diálogo interprofissional; ampliar as competências para a gestão do cuidado em saúde; ampliar o conhecimento sobre a organização da rede de serviços em saúde; exercitar o raciocínio clínico.

Ainda que bastante desejáveis em inúmeras situações da formação acadêmica, vivenciar, intervir, exercitar, ampliar, ampliar, ampliar, parecia-nos um excesso, ou um “a mais” diante de realidades de vida e convivência que pediam “menos”. A indiferença ou mesmo apatia constatada em tantas circunstâncias acadêmicas são sintomas já praticamente normalizados. Mas como estabelecer uma corresponsabilização pelas escolhas metodológicas a serem feitas? Como encarar com serenidade os imperativos de uma “formação de excelência” e suas consequências menos nobres? Como valorizar e dar sentido às pequenas variações que vivíamos em grupo, de modo que fosse possível emergir as importâncias de nossos encontros e reuniões?

Uma das chaves do processo foi apostar em um tempo mais dilatado. O pulso compassado foi o fio que sustentou a troca de diários no sentido de qualificar os encontros e relações, para que pudessem caber sutilezas e cuidados que rotineiramente passam rápido. Por exemplo, o módulo que sempre fora constituído de visitas a campo semanais, iniciou com a proposição de que a frequência fosse reduzida pela metade, intercalando uma reunião de supervisão quinzenal somente entre alunos e professores. Esta teria o propósito de nos cuidarmos melhor durante o processo. Um tempo para o grupo foi uma tônica subversiva em frente ao automatismo habitual.

Ironicamente, em nossos cursos de formação em saúde, o cuidar de si não havia ainda sido curricular e sistematicamente bem explorado por nós mesmos. Fizemos as coisas com mais calma. Tentamos não atropelar e insistimos na verificação constante de se todos estavam acompanhando. O tempo mais controlado, invariável em relação aos prazos e exigências acadêmicas, ensinou-nos sobre a natureza da duração na qualidade dos encontros. O encontro compromissado também parece ter este fundamento invariável: ele precisa perdurar, manter-se, é contrário à pressa e imediatez.

A experiência com um tempo de cuidado, próprio ao exercício profissional, foi a principal relação produzida entre a perspectiva de abertura de uma fluência das escritas e a formação dos estudantes de saúde. As práticas de cuidado envolvem um estado de presença que lida com o tempo imediato e integral. Em outras palavras, a atenção do profissional da saúde precisa estar concentrada no presente e esta necessidade exige, mais do que nunca, treinamento especializado.

O contato e a responsividade produzidos pelas trocas de diários, deram aos estudantes a possibilidade de habitar esta zona intermediária que não faz questão de afastar os aspectos profissionais daqueles mais pessoais de cada indivíduo, mas cria a prática de levarem em conta ambos. Receber as escritas dos professores, profissionais formados, em forma de diários invertidos, propiciou a participação nos processos de identificação de experiências mais particulares e sua interferência na atuação profissional.

Não seria um excesso pensar que as relações pedagógicas produzidas e aqui relatadas tomaram parte em uma experiência de presença próxima àquela do exercício profissional, em que as capacidades relacionais e expressivas de cada indivíduo são tão importantes quanto os conhecimentos técnicos.

As novas tecnologias de comunicação, tão disseminadas e influentes na vida de todos no contemporâneo, têm jogado fortemente contra este importante aspecto da coexistência: o cuidado com o tempo.

Em suma, ao darmos atenção ao tempo presente, sutil, um ritmo mais confortável pôde ser vivido por cada participante e por todos coletivamente. Em uma perspectiva relacional, parece ter havido mais possibilidades de negociação de saberes e, sobretudo, uma maior interatividade, naquilo que esta palavra ainda guarda de humanidade.

Finalmente, acompanhando o pensamento de Rancière (2009, p. 69)Rancière, J. (2009). A partilha do sensível – estética e política. (M. C. Netto, trad.). São Paulo: Editora 34., arriscaríamos identificar na experiência vivida uma reconfiguração do sensível, “uma recomposição da paisagem do visível, da relação entre o fazer, o ser, o ver e o dizer” na correspondência pedagógica, enfim, um reordenamento das variáveis mínimas em jogo.

De maneira artesanal, dando voz à eloquência das sutilezas, foi possível admitir que resistir às mil formas atuais de padronização do pensamento no ensino superior permanece como algo a ser investido enfaticamente.

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    Normalização, preparação e revisão textual: Ailton Junior – revisao@tikinet.com.br
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    Revisão (inglês): Andreza Aguiar - andreza@tikinet.com.br
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    O trabalho foi iniciado em 2009 e já foram realizadas muitas pesquisas e produções científicas sobre esta experiência. Para saber mais sobre as publicações e caminhos desse projeto acessar: https://delicadascoreo.wixsite.com/delicadas/o-projeto
  • 5
    Acompanha-se contextualmente, portanto, os preceitos da Organização Mundial da Saúde (OMS, 2010Organização Mundial da Saúde. (2010). Marco para ação em educação interprofissional e prática colaborativa. Genebra: OMS., p. 7) em seu Marco para Ação em Educação Interprofissional e Prática: “A educação interprofissional ocorre quando estudantes de duas ou mais profissões aprendem sobre os outros, com os outros e entre si para possibilitar a efetiva colaboração e melhorar os resultados na saúde”.
  • 6
    Ver site Arte no Dique: https://www.artenodique.org/
  • 7
    Anthropos Filmes. (2016, 15 de setembro). Por Trás do Cartão Postal – Documentário [Arquivo de vídeo]. Recuperado de https://www.youtube.com/watch?v=CS2PNwTYrHA
  • 8
    A este respeito, sugerimos a leitura do artigo de Liberman e Maximino (2016)Liberman, F., & Maximino, V. S. (2016). Acessibilidade e experiência estética: um trabalho com mulheres em situação de vulnerabilidade. Cadernos de Terapia Ocupacional, 24(1), 139-146..
  • 9
    Para um aprofundamento no conceito de dispositivo do diário, ver Pezzato, Botazzo e L’Abbate (2019)Pezzato, L. M., Mendes, R., Oliveira, E. C. S., & Azevedo, A. B. (2019b). Diário: uma política de registro. In R. Mendes, M. F. P. Frutuoso, & A. B. Azevedo (Orgs.), Pesquisar com os pés (pp. 32-47). São Paulo: Hucitec..
  • 10
    Bondía, J. L. (2002). Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Revista Brasileira de Educação, (19), 20-28.
  • 11
    Para um aprofundamento do tema, ver Foucault (2006, p. 427-499)Foucault, M. (2006). Hermenêutica do sujeito (M. A. Fonseca e S. T. Muchail, trad.). São Paulo: Martins Fontes..

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Editado por

1
Editor responsável: Alexandre Filordi de Carvalho. https://orcid.org/0000-0003-4510-9440

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Set 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    01 Jun 2020
  • Aceito
    01 Set 2020
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