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Autocrítica dirigida com artistas-trabalhadores(as): uma proposta metodológica a partir da Psicologia Histórico-Cultural 3 3 Editor responsável: César Donizetti Pereira Leite. https://orcid.org/0000-0001-8889-750X 4 4 Normalização, preparação e revisão textual: Keyla Malfada de Oliveira Amorim. keylamafalda@gmail.com 5 5 Apoio: Esta pesquisa recebeu recursos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)

Resumo

Neste artigo apresentamos uma metodologia de pesquisa e intervenção baseada na Psicologia Histórico-Cultural, denominada Autocrítica dirigida. Destina-se, a priori, ao território artístico, partindo da confrontação do artista frente a(s) sua(s) própria(s) obra(s). Nela identifica-se processos de alienação-emancipação que interferem na Vivência do(a) artista-trabalhador(a) no contexto do sistema capitalista. Elucidamos os fundamentos e aplicabilidade, a partir da unidade sistêmica da Vivência (Perejivânie) e delimitamos o caráter interventivo do método por possibilitar um sujeito mais consciente sob vários aspectos de sua vida laboral artística, no desenvolvimento de estratégias de enfrentamento às limitações e no encontro de matéria criativa para suas obras.

Palavras-chave
Autocrítica dirigida; Psicologia Histórico-Cultural; Vivência (Perejivânie); alienação-emancipação; artista-trabalhador(a)

Abstract

In this article, we present a research and intervention methodology based on Historical-Cultural Psychology, called Directed Self-Criticism. A priori, it is aimed at the artistic territory, starting from the artist's confrontation with their own work(s), which identifies processes of alienation-emancipation that interfere with the artist-worker's living in the context of the capitalist system. We elucidate its foundations and applicability, based on the systemic unity of Living (Perejivanie) and we delimit the method's interventional character, as it enables a subject to become more aware of various aspects of their artistic working life, to develop strategies for coping with limitations and to find creative material for their works.

Keywords
Directed Self-Criticism; Historical-Cultural Psychology; Living (Perejivanie); alienation-emancipation; artist-worker

Nesse artigo, problematizamos a arte como trabalho, no entorno de dilemas profissionais que implicam na sobrevivência do(a) artista-trabalhador(a) e da atividade que realiza. Situados em um sistema produtivo que questiona a utilidade dos bens culturais e condiciona os indivíduos à exploração da força de trabalho, a sociedade se ergue na desigualdade desencadeada pelo favorecimento de uns em detrimento de outros, sejam estes pessoas ou produtos. Esse processo se justifica no desenvolvimento das forças produtivas, rumo a interesses econômicos complexos e, consequentemente, gera-se “a metamorfose do trabalho, [...] cada vez mais explicitada entre valor-de-uso e valor-de-troca, transforma o trabalho concreto sobre um objeto determinado em trabalho abstrato que cria valor, o qual culmina na realidade do trabalho socialmente necessário” (Lukács, 2012Lukács, G. (2012). Para uma ontologia do ser social I. Boitempo., p. 315). Tal aspecto passa a ser determinante na sociedade atual, em que a acumulação de riqueza é formalizada a partir da propriedade privada, suas relações com a divisão do trabalho e a mercantilização, marcos da produção capitalista.

Em meio a tais dilemas, o(a) artista-trabalhador(a) vivencia a fragmentação do trabalho ocasionado pelas contradições do sistema, que tende a seccionar o sujeito do processo e do seu produto, tornando a prática engessada e mecânica, isto é, alienada (Marx, 1932/2004Marx, K. (2004). Manuscritos Econômico-Filosóficos (J. Ranieri, Trad.). Boitempo. (Texto original publicado em 1932)). Podemos conceituar a alienação como um estado de consciência sobre a realidade atrelado ao próprio desenvolvimento do capitalismo, determinada em múltiplos ordenadores socioeconômicos a culminar na complexidade da divisão social do trabalho (Lukács, 2013Lukács, G. (2013). Para uma ontologia do ser social II. Boitempo.). Marx (1932/2004, p. 24-25)Marx, K. (2004). Manuscritos Econômico-Filosóficos (J. Ranieri, Trad.). Boitempo. (Texto original publicado em 1932) pontua que:

O trabalhador tornou-se uma mercadoria e é uma sorte para ele conseguir chegar ao homem que se interesse por ele [...] não tem apenas de lutar pelos seus meios de vida físicos, ele tem de lutar pela aquisição de trabalho, isto é, pela possibilidade, pelos meios de poder efetivar sua atividade.

Na arte, se expressam diversas contradições em torno dessas questões, no seguinte retrato: a atividade artística caracterizada pela autoexpressão e a constituição processual de um objeto denominado obra de arte, se vê no ímpeto de trabalho alienado-explorado a partir dos diversos obstáculos que comprometem esta atividade. As consequências agem diretamente na continuidade e permanência dos(as) artistas na profissão, ao desafiar à criatividade e/ou instâncias psicossociais da relação sujeito-trabalho (Lukács, 2012Lukács, G. (2012). Para uma ontologia do ser social I. Boitempo.; Mészáros, 2009Mészáros, I. (2009). A Teoria da Alienação em Marx (I. Tavares Trad.). Boitempo.). Considerando esta problemática na macroestrutura, tais consequências atingem todo o ordenamento sociocultural, pois um produto alienado pode contribuir para manutenção de ideologias, formando consciências igualmente alienadas (Mészáros, 2009Mészáros, I. (2009). A Teoria da Alienação em Marx (I. Tavares Trad.). Boitempo.).

Numa sociedade cada vez mais capitalizada, a arte dita “criativa”, aquela que segue as vontades do(a) artista, nem sempre coaduna com os interesses de consumo da sociedade, algo que pode gerar a dissolução de uma em detrimento da outra, ou o mais recorrente é a tentativa do artista de manter as duas realidades antagônicas. Se formaliza assim o perfil dos(as) artistas, uma classe que tende a ser constituída por autônomos(as) que produzem arte sob encomenda, dependentes de editais e auxílios governamentais para realizarem suas atividades, e sofrem com as barreiras geográficas culturais que centralizam em regiões as melhores oportunidades de emprego no setor artístico– a exemplo das grandes metrópoles (Buscariolli et al., 2016Buscariolli, B., Carneiro, A. T., & Santos, E. (2016). Artistas de rua: trabalhadores ou pedintes? Cadernos Metrópole, 18(37), 879-898. https://doi.org/10.1590/2236-9996.2016-3713
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; Menger, 2005Menger. P. M. (2005). Retrato do artista enquanto trabalhador: metamorfose do Capitalismo. Editora Roma.).

Ainda temos de considerar que, em um contexto utilitarista, as produções artísticas tornam-se um trabalho precarizado a ponto de os(as) próprios(as) artistas não angariarem os recursos necessários para subsistência de si e de sua atividade criativa apenas com efetivo exercício artístico e, em muitos casos assumem outras funções laborais que não possuem quaisquer relação com a sua prática. Consequentemente, ao assumir dupla e até tripla jornada de trabalho ocorre a diminuição do investimento na própria atividade artística ou sua total supressão – dentre outras situações. Vàsquez (1978, p. 93)Vàsquez, A. S. (1978) As ideias estéticas de Marx. Paz e Terra. contribui para essa compreensão ao dizer que:

Produz-se uma espécie de alienação, já que se desnatura a essência do trabalho artístico. O artista não se reconhece plenamente em seu produto, pois tudo que cria como resposta a uma necessidade exterior é estranho, alheio a ele. Essa estranheza é total quando […] esta atividade deixa de ser fim para se converter em meio de subsistência.

Ao nos aproximar do conceito de alienação para explicar tamanha realidade, nos deparamos com sua referência nas teorias marxistas, sendo amplamente problematizado por pensadores(as) como Marx (1932/2004)Marx, K. (2004). Manuscritos Econômico-Filosóficos (J. Ranieri, Trad.). Boitempo. (Texto original publicado em 1932), Lukács (2013)Lukács, G. (2013). Para uma ontologia do ser social II. Boitempo. e seus comentadores(as) (Alcântara, 2014Alcântara, N. (2014). Lukács: ontologia e alienação. Instituto Lukács.; Lessa, 1992Lessa, S. (1992). Lukács: trabalho, objetivação, alienação. Trans/Form/Ação, 15, 39-51. https://doi.org/10.1590/S0101-31731992000100002
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; Ranieri, 2001Ranieri, J. (2001). A câmara escura: alienação e estranhamento em Marx. Boitempo.). Dentre estes, o filósofo húngaro István Mészáros (2009) nos provoca ao enumerar a ocorrência da alienação na arte, ao dizer que sua expressão está associada aos seguintes aspectos: I) no(a) próprio(a) artista; II) no assunto/tema de seu trabalho; e III) no público. Tal relação pode ser explicada na tríade dialética composta por artista-obra-sociedade, constructos essenciais para existência do fenômeno artístico, a eventual dissolução ou comprometimento, todo ou em parte, desta relação expõe efeitos da alienação.

Então, indagamos: como podemos identificar e compreender os processos de consciência na Vivência do(a) artista-trabalhador(a)? Considerando que uma atividade alienada pode comprometer a efetividade e o desenvolvimento de processos criativos, seria possível compreender essa situação por metodologias convencionais de pesquisa?

Em uma breve pesquisa de referências para esse assunto encontrou-se uma gama de estudos que versam sobre o(a) artista como trabalhador(a); dentre eles, há os que tendem para uma explanação da sua realidade tratando aspectos sociais, econômicos, políticos e o contexto cultural (Buscariolli et al., 2016Buscariolli, B., Carneiro, A. T., & Santos, E. (2016). Artistas de rua: trabalhadores ou pedintes? Cadernos Metrópole, 18(37), 879-898. https://doi.org/10.1590/2236-9996.2016-3713
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; Silva, 2018Silva, R. F. (2018). Arte e trabalho em São Luís do Maranhão: perspectivas e impressões de atores e atrizes sobre a atividade teatral [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Maranhão]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da UFMA. https://tedebc.ufma.br/jspui/handle/tede/2368
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), majoritariamente em áreas das Ciências Sociais, políticas públicas e produção cultural. São propostas de pesquisa coerentes, visto que a arte se configura como uma relação construída do indivíduo para o social e vice-versa; isto é, Vigotski (1925/1999b, p. 9)Vigotski, L. S. (1999b). Psicologia da arte. Martins Fontes. (Texto original publicado em 1925) diz que “a arte só poderá ser objeto de estudo científico quando for considerada uma das funções vitais da sociedade, em relação permanente com todos os outros campos da vida social e no seu condicionamento histórico concreto”.

Com isso, neste campo de investigação, encontramos diversas publicações que tendem a fazer uso de recursos metodológicos convencionais, tais como entrevistas e observação. No entanto, “a lógica ‘pergunta-resposta’ que está por trás das ferramentas metodológicas tradicionalmente utilizadas pela psicologia não funcionam para o estudo da subjetividade ou para o estudo de outras questões sociais como discursos sociais e representações sociais” (González Rey & Mitjans Martínez, 2017, p. 204).

Essa perspectiva foi evidenciada por Lev Vigotski6 6 Por uma questão de tradução o nome do autor recebe diferentes grafias: Vigotski, Vygotski, Vygotsky. Neste artigo adotamos a tradução brasileira em Vigotski, respeitando as variações adotadas pelos livros referenciados em parênteses. (2004b) – psicólogo russo – em O significado histórico da crise da Psicologia, quando relata os principais problemas das pesquisas psicológicas do seu tempo, questões que vigoram até os nossos dias, a saber: práticas que desvinculam o sujeito do seu entorno social, o isolam em sua subjetividade; ou ainda, aquelas que tendem a reduzir o sujeito a determinações biológicas, pautadas em estímulo-resposta – por exemplo. Promove-se com esses princípios dicotomias, explicações abstratas ou reducionista sobre os fenômenos humanos. Por conseguinte, para se contrapor, Vigotski reage à problemática da Psicologia de forma epistêmico/metodológica na defesa de um sujeito histórico e cultural (Zanella et al., 2007Zanella, A. V., Reis, A. C., Titon, A. P., Urnau, L. C., & Dassoler, T. R. (2007). Questões de método em textos de Vygotski: contribuições à pesquisa em Psicologia. Psicologia & Sociedade, 19(2), 25-33. https://doi.org/10.1590/S0102-71822007000200004
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).

Se erige diante destas inquietações a abordagem da Psicologia Histórico-Cultural, desenvolvida pelo próprio Vigotski. A partir de ideais marxistas apresenta um sujeito como agente e produto da sociedade, nesta dialética é sustentada a importância do desenvolvimento interpsíquicos do sujeito com o mundo. Ou seja, a abordagem busca o alcance do ser em sua totalidade, consciente de si e de seu meio, visando isso que pesquisa psicológica deveria, na perspectiva vigotskiana, se interessar pelo desenvolvimento de novas relações entre as funções e sistemas psicológicos, sobretudo em metodologias não desvinculadas das práticas sociais (Somekh & Nissen, 2011Somekh, B., & Nissen, M. (2011). Cultural-Historical Activity Theory and Action Research. Mind, Culture, and Activity, 18, 93-97. https://doi.org/10.1080/10749039.2010.523102
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).

Entendemos, portanto, que um artifício para acessar a realidade, em sua constituição histórica e concreta, só pode advir dialeticamente: da materialidade decorrente da ação humana do trabalho que age e é transformada pelo meio (Marx, 1932/2004Marx, K. (2004). Manuscritos Econômico-Filosóficos (J. Ranieri, Trad.). Boitempo. (Texto original publicado em 1932)). Em nosso campo investigativo partilhando da perspectiva marxista, a obra de arte se constitui como uma materialidade7 7 Ao manter a base marxista como fundamentação das discussões propostas, defende-se o conceito materialidade, e suas variações, aplicada ao contexto artístico ao se referir à obra de arte. De acordo com verbete do dicionário do pensamento marxista, Bottomore (2001, p. 254) define que o “Materialismo afirma que tudo o que existe é apenas matéria, ou, pelo menos, depende da matéria”. Reconhece-se que tal conceito apresenta diversas conotações aliadas às discussões terminológicas no interior do próprio marxismo. A obra de arte consiste em matéria/materialidade de mediação e que se consolida na relação sujeito-mundo, conforme também assinala L. Vigotski, em Psicologia da arte (1925/1999b). , pois se configura como objetivação realizada pelo ser humano – uma práxis. Assim, em uma relação mediada materialmente, o indivíduo se afirma no mundo deixando os rastros do seu desenvolvimento (ou sua alienação), processo este que não difere do que ocorre entre o(a) artista e a obra de arte (Mendes et al., 2017Mendes, C., Frison, C. F., & Superti, T. (2018). A arte como técnica social para a humanização: objeto cultural mediador para o desenvolvimento e transformação das funções psíquicas superiores (sentimento e emoção). Akrópolis - Revista de Ciências Humanas da UNIPAR, 25(2), 139-151. https://doi.org/10.25110/akropolis.v25i2.6415
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). Complementa-nos Vigotski (2004b, p. 47)Vigotski, L. S. (2004b). Teoria e método em psicologia (3a ed.). Martins Fontes. ao dizer:

A elaboração do problema e do método se desenvolvem conjuntamente, ainda que não de modo paralelo. A busca do método se converte em uma das tarefas de maior importância na investigação. O método, nesse caso, é ao mesmo tempo premissa e produto, ferramenta e resultado da investigação.

Então, diante da problemática exposta, apresentamos neste artigo o método inicialmente denominado Autocrítica (Lima, 2016Lima, E. B. (2016). Arquivos censurados de Nelson Rodrigues: uma leitura crítica nas redes da criação [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte]. Repositório Institucional da UFRN. https://repositorio.ufrn.br/jspui/handle/123456789/21727
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) que tem a intenção primeira de situar artista-obra-sociedade como unidade, da qual possam ser problematizadas as particularidades do ofício (estética e técnica) e/ou atravessamentos psicossociais de forma dialética, em coerência com os ideais da Psicologia Histórico-Cultural (Vigotski, 1915-16/1999aVigotski, L. S. (1999a). A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca (1a ed.). Martins Fontes., 1925/1999bVigotski, L. S. (1999b). Psicologia da arte. Martins Fontes. (Texto original publicado em 1925), 1931-33/2004aVigotsky, L. S. (2004a). Teoría de las emociones: Estudio histórico-psicológico. Akal Universitaria. (Texto original publicado em 1931-33)). Tendo em vista a articulação estabelecida entre pesquisador(a) e participante para condução do procedimento, o qual será sistematicamente diluída nos próximos tópicos deste artigo, nos referiremos ao método como Autocrítica dirigida.

Esse método foi desenvolvido em sua integridade no âmbito de uma pesquisa de doutoramento intitulada Autocrítica do artista: alienação e vivência da arte como trabalho, de autoria de Erickaline Lima (2022)Lima, E. B. (2022). Autocrítica do artista: alienação e vivência da arte como trabalho. [Tese de Doutorado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte]. Repositório Institucional da UFRN. https://repositorio.ufrn.br/handle/123456789/50054
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que apresenta o estudo sobre a alienação e emancipação na realidade dos(as) artistas-trabalhadores(as), reconhecendo as contradições do sistema produtivo vigente e como se estabelecem o que identificamos, por meio da Autocrítica dirigida, de processos de alienação que limitam e reduzem a objetivação – ação do sujeito sobre o meio; e também evidencia-se os processos de emancipação que expressam zonas de deslocamento do estado alienante inicial para outras instâncias de ação do sujeito.

A partir desse ideal, nos direcionamos à unidade sistêmica denominada Vivência – que advém do russo Perejivânie8 8 O termo russo Perejivânie pode ter diferentes variações a depender da tradução adotada. Neste artigo mencionamos em sua forma mais comum adotada nos trabalhos brasileiros. Os verbos russos se agrupam em pares de significado praticamente idêntico, diferenciando-se pelo seu aspecto: perfectivo ou imperfectivo. Um desses pares seria (perejit) e (perejivát), ambos originários do verbo (jit). No seu sentido amplo, tanto “jit” quanto “perejit” significam viver” (Toassa, 2010, 759) não por acaso é relacionada diretamente por Vigotski (1925/1999b)Vigotski, L. S. (1999b). Psicologia da arte. Martins Fontes. (Texto original publicado em 1925) à experiência estética ao promover a conexão sujeito-meio, tornando possível reconhecer sua influência no processo de desenvolvimento (Blunden, 2016Blunden, A. (2016) Translating Perezhivanie into English. Mind, Culture, and Activity, 23(4), 274-283. https://doi.org/10.1080/10749039.2016.1186193
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). Esta unidade, carrega uma complexa polissemia conceitual demonstrada em estudos que surgem recorrentemente nos últimos anos no entorno da Psicologia Histórico-Cultural, como aponta Andrade e Campos (2019)Andrade, L. R. M., & Campos, H. R. (2019). Perejivânie: uma aproximação ao estado da arte das pesquisas. Obutchénie: Revista de Didática e Psicologia Pedagógica, 3(2), 1-17. https://doi.org/10.14393/OBv3n2.a2019-51558
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. Identifica-se também que a unidade sistêmica Vivência é entendida como experiência, como se ambas fossem sinônimos e partissem da mesma condição. Porém, para Toassa (2019)Toassa, G. (2019). Uma definição indefinida: contribuições recentes ao conceito de vivência na Psicologia vigotskiana. In G. Toassa, T. M. C. Souza, & D. J. S. Rodrigues (Eds.), Psicologia sócio-histórica e desigualdade social: do pensamento à práxis (pp. 107-133). Imprensa Universitária. a palavra experiência vem do russo opit, algo que deixa em evidência uma distinção que significa experiência imediata, portanto, não sendo a mesma coisa. De acordo com a autora (2019, p. 113), os conceitos são:

pólos tensionados de uma relação dialética: as vivências podem existir como fragmentos isolados na consciência – esta sim, a síntese psíquica mais complexa que conhecemos – flutuando na trajetória vital do sujeito sem serem atribuídas de sentido, nem plenamente integradas à experiência acumulada.

Considera-se ainda que a Vivência engloba tanto a experiência imediata como a acumulada, no sentido de mobilizar a consciência do sujeito em ação, porém a Vivência não se reduz aos tipos e formas da experiência. Ao nos referirmos à experiência artística, por exemplo, consideramos como parte da Vivência e, esta, por sua vez, interconecta as diversas nuances psicológicas envolvidas na atribuição do sentido (Vigotski, 1926/2006Vigotski, L. S. (2006). La Crisis de los siete años (Obras escogidas. Tomo IV). Visor. (Texto original publicado em 1926)), motivo pelo qual atribuímos à Vivência o título de unidade sistêmica de análise. A margem de compreensão acerca do conceito torna-se maior se expormos o fato que Vigotski, devido sua morte prematura, não conseguiu concluir suas teorizações sobre ela, o que contribui para que surjam diversas conjecturas e confirmações a respeito.

Veresov (2017)Veresov, N. (2017). The Concept of Perezhivanie in Cultural-Historical Theory: Content and Contexts. In M. Fleer, F. González Rey, & N. Veresov (Eds.), Perezhivanie, Emotions and Subjectivity: Advancing Vygotsky’s Legacy (pp. 47-70). Springer. relata ao menos duas circunstâncias que podem ser conduzidas na/pela Vivência (Perejivânie) que seria: 1) como fenômeno psicológico que pode empiricamente ser observado e estudado; 2) e, como conceito teórico, uma lente de análise. Aspectos que geram a possibilidade de fomentar a Vivência como fenômeno psicológico durante a aplicação da metodologia da Autocrítica dirigida, em face dos processos e experiências subjacentes, como também, a posteriori, situando-a como ferramenta analítica.

Tais aspectos são centrais para compreender a Autocrítica dirigida no campo artístico, em seus fundamentos e aplicabilidade – detalhes que serão expostos adiante neste artigo. Sumariamente, reconhecemos o(a) profissional artista como um sujeito que, mediado(a) pela materialidade da sua obra de arte, interfere na organização do mundo por conduzir a si próprio(a), sua prática, e outros indivíduos em um curso de desenvolvimento que pode ser mútuo e autêntico. Constata-se a necessidade de (re)estabelecer a dialética presente na tríade artista-obra-sociedade, a fim de que “ao adaptar os meios de mediação e os modos de organização envolvidos na realização de certas ações como plano social [...] o indivíduo desenvolve não apenas novos meios de realizar ações específicas, mas também qualitativamente novos tipos de funções psicológicas” (Minick, 1987Minick N. (1987). The Development of Vygotsky’s Thought: An Introduction. In: R. W. Rieber & A. S. Carton (Eds.), The Collected Works of L. S. Vygotsky: Cognition and Language (pp. 17-36). Springer. https://doi.org/10.1007/978-1-4613-1655-8_2
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, p. 34, tradução nossa).

Ao desdobrar essas questões, levanta-se um horizonte de aplicabilidade da Autocrítica na ordem de pesquisa de natureza interventiva (Teixeira & Megid Neto, 2017Teixeira P. M. M., & Megid Neto, J. (2017). Uma proposta de tipologia para pesquisas de natureza interventiva. Ciência & Educação (Bauru), 23(4), 1055-1076. https://doi.org/10.1590/1516-731320170040013
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). Pela metodologia, criamos uma situação que suscita no(a) artista participante vislumbrar a continuidade da atividade, ao distinguir possíveis elementos criativos que podem ser explorados em novos trabalhos e/ou reconhecer os entraves que comprometem o percurso profissional, eventualmente, descobrindo estratégias de enfrentamento. Entender esse processo como uma Vivência (Perejivânie) no sentido expressado por Vigotski (1915-16/1999aVigotski, L. S. (1999a). A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca (1a ed.). Martins Fontes., 1925/1999b)Vigotski, L. S. (1999b). Psicologia da arte. Martins Fontes. (Texto original publicado em 1925), contribui para a afirmação de um instrumento que pode, em sua ação interventiva, promover e auxiliar a ação consciente e criativa.

A problemática em torno da Vivência do(a) artista-trabalhador(a) e o conflito entre alienação-emancipação no desenvolvimento global da atividade, sugere meios adequados para que estes conceitos sejam identificados e analisados na realidade. Mediante isso, é importante esclarecer que não se trata de dizer que o(a) artista é desprovido(a) da dimensão Autocrítica em sua atividade, tampouco que iremos ensinar ou guiá-lo(a) na construção de sua obra. Quando introduzimos a Autocrítica como procedimento metodológico, ou seja, dirigido, estamos considerando os efeitos da intervenção provocados sobre o(a) artista e os elementos extraídos que poderão ser analisados, a partir de certos critérios discernidos pelo(a) pesquisador(a).

Fundamentos da Autocrítica dirigida: convergências epistemológicas e metodológicas

A Autocrítica dirigida possui ordenadores que participam dos seus fundamentos. Adiante, neste tópico, iremos destacar seus preceitos epistêmico-metodológicos, dentre os quais destaca-se, sua relação com a Crítica de arte, que em linhas gerais pode ser entendida como uma atividade analítica, até então exclusiva do(a) espectador(a) e dependente da obra artística produzida pelo(a) artista. A crítica, ao se alimentar do fenômeno artístico vivenciado, se concretiza no compartilhamento desta experiência que ocorre geralmente em forma de texto discursivo, sempre direcionado ao outro. Nela estão evidenciados aspectos objetivos e subjetivos, que demarcam as impressões do sujeito sobre a experiência estética.

A importância dessa atividade para o conhecimento artístico também foi discernida por Vigotski em seus primeiros escritos, neles abordava suas inquietações sobre o universo literário-teatral e incluía análises críticas sobre obras (Marques, 2015Marques, P. N. (2015). O Vigotski incógnito: escritos sobre arte (1915-1926) [Tese de Doutorado, Universidade de São Paulo]. Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP. https://teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8155/tde-06102015-161300/pt-br.php
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). A mais conhecida delas foi sua análise Hamlet: o príncipe da Dinamarca (1915-16/1999a), referência à obra de William Shakespeare. Vigotski proferia suas análises partindo da própria obra em questão, sem recorrer a outros meios para entendê-la, na condição de que a obra em si mesma já fornecia elementos para compressão da experiência. Essa consideração nos remete ao impacto que a experiência estética causa sobre o sujeito, subsidiando a compreensão da sinestesia provocada, ou de si em relação ao mundo.

Para tanto, Walter Benjamin (1999, p. 74) complementa nossa compreensão ao dizer que a “Crítica é, então como que um experimento na obra de arte, através do qual a reflexão desta é despertada e ela é levada à consciência e ao conhecimento de si mesma”. Assim ocorre uma espécie de sistematização da experiência estética provocada pela obra, seja qual for a sua natureza (cênica, musical, pictórica, literária etc.) e a abertura para considerar esse mesmo processo independente do lugar que se ocupa na apreciação, seja como autor(a) ou espectador(a) da obra. Na intenção de ampliarmos esses pressupostos da crítica de arte, nos perguntamos: como seria esse processo crítico ao considerar o(a) olhar do próprio artista sobre sua criação?

Embora a Autocrítica dirigida detenha dos mesmos princípios, diferencia-se da prática convencional da crítica de arte, devido, justamente, a sua característica autorreferente que pressupõe o confronto do(a) artista frente a(s) sua(s) própria(s) obra(s). Então, essencialmente, a Autocrítica é uma condição reflexiva autorreferente, o que implica dizer que ela é acionada em determinados momentos do processo de trabalho realizado por este(a). Porém, não podemos generalizar ao dizer que todo(a) artista é essencialmente autocrítico(a). Como visto, a alienação é a única forma de consciência que podemos pressupor que existe na realidade social humana, seja qual for a condição (Lukács, 2012). E a eventual emancipação não pode ser considerada como algo permanente, mas sim, como processo (de emancipação), um estado de devir, justificado no deslocamento do sujeito do estado de latência - comum da alienação – para um estado de atividade que admite novas condições alienadoras.

Sobre a consciência, Toassa (2006)Toassa, G. (2006). Conceito de consciência em Vigotski. Psicologia USP, 17(2), 59-83. https://doi.org/10.1590/S0103-65642006000200004
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destaca três aspectos presentes nos estudos vigotskianos que podem ser relacionados aos processos de alienação-emancipação, que são: a tomada de consciência da realidade (externa e interna); o atributo para designar a condição de certos processos psicológicos; e, como sistema psicológico – em relação ao meio e ao próprio sujeito ao conectar outras estruturas em sua atividade. Seguindo essa referência, a consciência é uma estrutura que gera no sujeito a compreensão e domínio do contexto; pode ser estudada porque se conecta com a realidade concreta e, por fim, consiste em um sistema complexo que pode ser fomentado. Todas as instâncias podem ser comprometidas pela alienação, bem como adquirida no território emancipatório.

A sistematização da Autocrítica dirigida se apresentará adiante, em suas etapas, como um instrumento de pesquisa e intervenção sobre o(a) artista-trabalhador(a), o(a) colocando como principal agente reflexivo do processo, em um espaço-tempo compartilhado, premissa que pode ocasionar eventuais transformações nos(as) participantes. Por possuir um arcabouço metodológico fundamentado na Psicologia Histórico-Cultural, prevê um sujeito no contexto em que se situa, ou seja, no campo histórico social composto por elementos que agem dialeticamente (Vigotsky, 2004b).

Além disso, é fundamental para a validação de uma metodologia ser coerente ao objeto de estudo, algo que expõe o processo autorreflexivo e a unidade artista-obra-sociedade. Sullivan e McCarthy (2007)Sullivan, P., & McCarthy, J. (2007). The Relationship Between Self and Activity in the Context of Artists Making Art. Mind, Culture, and Activity, 14(4), 235-252. https://doi.org/10.1080/10749030701623698
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fazem referência à condição de autoconhecimento do(a) artista amparado pela sua própria obra. Segundo os autores, a partir dessa relação dialógica é possível discernir sentimentos, responsabilidade pelas ações, reconhecimento de possibilidades e potencialidades para ação futura.

Também destacamos o artigo de Mello (2012)Mello, R. L. S. (2012). Processos criativos de artistas visuais. Revista Trama Interdisciplinar, 3(1). https://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/tint/article/download/5004/3819
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, que discorre expressamente sobre a relação artista-obra. A autora reconhece que estudos envolvendo Arte e Psicologia se tornam imprescindíveis para facilitar o flow e a criatividade. Nesta pesquisa, chama-nos a atenção o foco no desenvolvimento da obra artística pela percepção do(a) artista, tendo efeitos importantes no reconhecimento da Psicologia como área potencial nos estudos sobre esses(as) profissionais.

Inteiramo-nos que uma das missões de Vigotski (2004b)Vigotski, L. S. (2004b). Teoria e método em psicologia (3a ed.). Martins Fontes. era desenvolver uma metodologia em Psicologia que priorizasse a totalidade do sujeito, o entendendo como um ser formado e formador das relações sociais, dialeticamente mediado pelos signos dos quais interage para desenvolvimento das funções psicológicas superiores (Pino, 2000Pino, A. L. B. (2000). O social e o cultural na obra de Lev S. Vigotski. Educação & Sociedade, 71, 45-78. https://doi.org/10.1590/S0101-73302000000200003
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; Smolka, 1993Smolka, A. L. B. (1993). Construção de conhecimento e produção de sentido: Significação e processos dialógicos. Temas em Psicologia, 1(1), 7-15. http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-389X1993000100003
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; Zanella, 2005Zanella, A. V. (2005). Sujeito e alteridade: reflexões a partir da Psicologia Histórico-Cultural. Psicologia & Sociedade, 17(2), 99-104. https://doi.org/10.1590/S0102-71822005000200013
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). Por isso, a partir desse ideal constitui-se os interesses da Autocrítica dirigida na conexão dialética da tríade artista-obra-sociedade, em que se unificam as relações com o trabalho exercido, em um plano espaço-temporal próprio, provocando conexões entre o interno e externo, o vivenciado (realidade) e o não vivenciado (projeção).

A partir desses ideais, a proposta se insere no contexto da pesquisa de natureza interventiva, com a intenção do(a) pesquisador(a) escolher como vias metodológicas a articulação entre investigação e produção de conhecimento, com ação e/ou processos interventivos (Teixeira & Megid Neto, 2017). No âmbito do território da pesquisa de aplicação, pretende-se não somente compreender o território investigativo, mas lançar mão de um recurso concedido ao sujeito participante que ao se apropriar age sobre a realidade (Vigotski, 1931-33/2004aVigotski, L. S. (2004b). Teoria e método em psicologia (3a ed.). Martins Fontes.).

Em termos laborais, a continuidade do fazer artístico contribui para o desenvolvimento do próprio campo em um sentido mais amplo, uma vez que a obra de arte de um(a) artista pode ser influência criativa para outros(as) profissionais do ramo. Para o(a) trabalhador(a) artista, a materialidade da obra é imprescindível para o autorreconhecimento profissional, pois, em cada obra realizada, novos aspectos de seu trabalho tornam-se conscientes, aspectos que culminam em uma experiência artística viva, objeto de transformação para aquele sujeito. Possibilidade esta que ratifica o fato de que “[...] a verdadeira arte sempre implica algo que transforma, que supera o sentimento comum, e aquele medo, aquela mesma dor, aquela mesma inquietação, quando suscitados pela arte, implicam o algo a mais acima daquilo que nelas está contido” (Vigotski, 1925/1999b, p. 307).

A consciência provocada se configura essencialmente como conexão e relação das atividades, que nessa discussão expandiremos como parte do território da Vivência em direção a um devir e ao entendimento. Expandir os horizontes deste trabalho ao inserir o construto de Vivência – do russo Perejivânie – como unidade de consciência, assegura que haja um amplo espaço para interconectar o sujeito às possibilidades; assim, a função da consciência é apreender os processos psicológicos e destacar o que se configura como sentido (González Rey, 2018).

Nesse caso, a Vivência se apresenta como o ponto de convergência principal em discussão, se consolidando como unidade sistêmica em diferentes eixos, a saber: I) no método da Autocrítica dirigida; II) no atravessamento dos processos de alienação-emancipação; e, III) no trabalho artístico. Ou seja, não abarca somente a metodologia, em seu processo e resultado, como também a problemática que evidenciamos acerca do(a) artista-trabalhador(a) e suas obras. Em síntese, pesquisadores(as) que têm estudado essa unidade emblemática a discernem como algo que evidencia a dialética entre o meio social e o individual, no que diz respeito aquilo que é vivenciado (González Rey, 2016; Liberali & Fuga, 2018Liberali, F. C., & Fuga, V. P. (2018). A importância do conceito de perejivanie na constituição de agentes transformadores. Estudos de Psicologia (Campinas), 35(4), p. 363-373. https://doi.org/10.1590/1982-02752018000400004
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; Veresov, 2016Veresov, N. (2016). Perezhivanie as a phenomenon and a concept: Questions on clarification and methodological meditations. Cultural-Historical Psychology, 12(3), 129-148. https://doi.org/10.17759/chp.2016120308
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). Vigotski (2010, p. 686)Vigotski, L. S. (2010). Quarta aula: a questão do meio na Pedologia (M. P. Vinha & Welcman, M. Trad.). Psicologia USP, 21(4), 681-701. https://doi.org/10.1590/S0103-65642010000400003
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ressalta que:

A vivência é uma unidade na qual, por um lado, de modo indivisível, o meio, aquilo que se vivencia está representado – a vivência sempre se liga àquilo que está localizado fora da pessoa – e, por outro lado, está representado como eu vivencio isso, ou seja, todas as particularidades da personalidade e todas as particularidades do meio são apresentadas na vivência, tanto aquilo que é retirado do meio, todos os elementos que possuem relação com dada personalidade, como aquilo que é retirado da personalidade, todos os traços de seu caráter, traços constitutivos que possuem relação com dado acontecimento.

A unidade encontrada na Vivência é constituída por aspectos pessoais e situacionais – personalidade e meio na relação interna com a realidade (Veresov, 2017Veresov, N. (2017). The Concept of Perezhivanie in Cultural-Historical Theory: Content and Contexts. In M. Fleer, F. González Rey, & N. Veresov (Eds.), Perezhivanie, Emotions and Subjectivity: Advancing Vygotsky’s Legacy (pp. 47-70). Springer.). Implica dizer que, amparado em Vigotski (1926/2006), a Vivência é suscitada sempre em relação a alguma coisa, a qual é manifestada como uma unidade dinâmica real da consciência – sendo assim, a consciência é formada e formadora da Vivência (Perejivânie). A relação dessa unidade com a experiência estética é uma possibilidade iminente se partimos dessas considerações, uma vez que, tanto no ato de construção da obra de arte como em sua fruição se mobilizam aspectos vivenciais do sujeito. Para termos uma ideia da relação Vivência e arte, mencionamos o teatrólogo russo Constantin Stanislavski (1863-1938), contemporâneo e conterrâneo de Vigotski. Em seus estudos sobre Teatro, Stanislavski trouxe-a como meio que auxiliaria os(as) atores(atrizes) na criação dos(as) seus(suas) personagens (Capucci, 2017Capucci, R. R. (2017). Perejivanie: um encontro de Vigotski e Stanislavski no limiar entre Psicologia e Arte [Dissertação de Mestrado, Universidade de Brasília]. Repositório Institucional da UnB. http://dx.doi.org/10.26512/2017.03.D.23604
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).

Especificamente em seu escrito O trabalho do ator sobre si mesmo: processo criador das vivências (1938/1980), Stanislavski desvela um processo em que o(a) ator(atriz) se propõe a encontrar material de criação, a partir da percepção acerca de si, indo ao alcance de uma consciência psicofísica favorável para criação cênica. Nessa teoria do teatrólogo, destaca-se a importância da Vivência para o(a) artista, algo que presume como os aspectos vivenciais podem se tornar material criativo, e, em alguns casos, como o teatrólogo defende em sua estética, a principal fonte (Copeliovitch, 2016Copeliovitch, A. (2016). O trabalho do ator sobre si mesmo: memória, ação, linguagem e silêncio. Conception, 5(2), 76-89. https://doi.org/10.20396/conce.v5i2.8648046
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).

Vigotski, em Psicologia da Arte (1925/1999b), encontra no campo artístico suas primeiras fundamentações sobre a Vivência (Perejivânie), no que a arte pode evocar no sujeito, quanto à reação estética, trazendo elementos importantes para elucidar a criatividade e as emoções (González Rey & Martinez, 2017). De acordo com Ferholt e Nilsson (2016)Ferholt, B., & Nilsson, M. (2016). Perezhivaniya as a means of creating the aesthetic form of consciousness. Mind, Culture, and Activity, 23(4), 294-304. https://doi.org/10.1080/10749039.2016.1186195
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, além da dinamicidade da emoção e cognição para efeito da Vivência, o sujeito se confronta com sua memória autobiográfica ao revivê-las, em que fatos são trazidos à luz em um outro momento da vida podendo, assim, auxiliar no processo de consciência.

Vigotski também nos traz uma aproximação da Vivência com a arte do(a) ator(atriz), inclusive menciona o sistema de criação de Stanislavski, em seu texto Sobre a questão da Psicologia da criação pelo ator (1932/2023). No texto, é evidenciado o paradoxo do(a) ator(atriz), em que questiona o envolvimento ou não do sentimento projetado no(a) personagem. A discussão consolida a Vivência na arte, no caso quando o(a) ator(atriz) trabalha os sentimentos e a que ponto ele(a) vivencia o papel. Esse aspecto surge como uma premissa elucidativa importante por conectar a realidade do sujeito às ações criativas. Seja na condição de artista ou de espectador(a), a arte se constituirá como um território em que é possível compreender as próprias Vivências e possuir novas (González Rey, 2018).

Como visto, a Vivência como unidade sistêmica constitui um território com diversos ordenadores; por isso se faz possível promover o diálogo entre Vivência e o que explicitamos inicialmente, processos de alienação-emancipação na realidade do(a) artista-trabalhador(a). Ambas são formas de consciência dialeticamente construídas na vida social, podendo limitar as ações dos sujeitos e torná-los alheios à sua força de trabalho e do que dela resulta (obra de arte) – algo que representa certa ameaça às características essenciais da atividade artística. É importante destacar que a emancipação total dos processos de alienação é questionável, visto que sua ocorrência necessitaria da dissolução das estruturas do sistema produtivista. Vislumbra-se, somente mecanismos que desloque o sujeito de sua condição de inércia e o coloque em outra posição em relação a alienação que o domina, podemos chamar essa situação de processos de emancipação.

Diante disso, infere-se que os(as) artistas não estão imunes aos efeitos que o sistema capitalista provoca, das atitudes mecanizadas que fragmentam e dissipam a relação do sujeito consigo mesmo, com sua atividade e com o mundo (Marx, 1932/2004Marx, K. (2004). Manuscritos Econômico-Filosóficos (J. Ranieri, Trad.). Boitempo. (Texto original publicado em 1932)). Assim constata-se o seguinte fato: a Vivência do(a) artista-trabalhador(a) está sujeita a interferências das diferentes nuances de alienação; porém, somente pela Vivência no trabalho que também ocorrerá eventuais processos de emancipação.

A arte se torna provocativa e tensionadora, pois não se reduz apenas a uma identificação das questões do(a) artista que a criou, mas uma reação que é própria do sujeito em face da superação do que lhe é oferecido como realidade. A Vivência, portanto, não é uma contemplação passiva perante os acontecimentos, mas expressa “o trabalho ativo que as pessoas conduzem para superar estados psicológicos de impossibilidade” (Clarà, 2016Clarà, M. (2016). Vygotsky and Vasilyuk on Perezhivanie: Two notions and one word. Mind, Culture, and Activity, 23(4), 284-293. http://dx.doi.org/10.1080/10749039.2016.1186194
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, p. 2, tradução nossa).

Assim, chegamos à dimensão da obra de arte como matéria de mediação. Segundo Vigotski (1925/1999b)Vigotski, L. S. (1999b). Psicologia da arte. Martins Fontes. (Texto original publicado em 1925), os efeitos dessa mediação se expandem assumindo a prerrogativa de uma técnica social do sentimento, de expressão, concretização e superação – em suas palavras: “a arte recolhe da vida seu material, mas produz acima desse material algo que ainda não está nas propriedades desse material” (p. 308). Essa reorganização psíquica é resultado da reação estética provocada na relação do sujeito com a obra, que para o autor não é uma mera atitude passiva perante o objeto, pois ocasiona o embate de sentimentos contraditórios que impulsiona o sujeito à ação (Schühli, 2011Schühli, V. M. (2011). A dimensão formativa da arte no processo de constituição da individualidade para-si: a catarse como categoria psicológica mediadora segundo Vigotski e Lukács [Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Paraná]. Acervo Digital da UFPR. https://acervodigital.ufpr.br/handle/1884/26141
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).

Diante do exposto, temos uma base para considerar a Autocrítica dirigida não apenas como um artifício para coleta de dados de cunho qualitativo que pode evidenciar traços dos momentos de criação artística, elementos de sentido e significado, dentre outros. Mas também, considera-se os efeitos interventivos dessa proposta, afirmadas como meio que demonstra ao(à) artista possibilidades materiais para novas criações, recursos que podem ser encontrados em suas próprias obras. Em Vigotski (1931-33/2004a, p. 14), encontramos um fundamento para essa ideia:

[...] este poderá imaginar aquilo que nunca viu, poderá, a partir da descrição do outro, representar para si também a descrição daquilo que na sua própria experiência pessoal não existiu, o que não está limitado pelo círculo de fronteiras estritas da sua própria experiência, mas pode também ir além das suas fronteiras, assimilando, com a ajuda da imaginação, a experiência histórica e social de outros. Sob essa forma, a imaginação é condição absolutamente necessária de quase toda a atividade intelectual do homem.

Vigotski (1931-33/2004a, p. 14)Vigotski, L. S. (2004b). Teoria e método em psicologia (3a ed.). Martins Fontes., nos diz acima outro fator preponderante: a importância da imaginação para toda e qualquer criação artística. A partir dela, é possível projetar as possibilidades antes mesmo de testá-las – podemos dizer que este, é um dos recursos mais utilizado pelo(a) artista. Por isso, acreditamos que Autocrítica dirigida pode favorecer a criatividade do sujeito, em um processo que pode ser aperfeiçoado no próprio ato de criação.

Com a incidência contínua dos processos de alienação, um procedimento que oportunize o retorno (auto)reflexivo sobre a prática propiciará, por exemplo, rever elementos que foram rechaçados num dado momento de um processo, mas que faz sentido resgatá-los como possibilidades de trabalho. Ora, se o artista só se denomina como tal por sua função primeira de fazer/produzir arte, a ausência dessa condição em decorrência de falta de criatividade ou de ideias com que se possa trabalhar é fatal para sua existência laboral.

Estamos diante dos processos interligados de imaginação e criatividade, pensamento-afeto, na co-construção da obra de arte. A partir dos fundamentos apresentados sobre a Autocrítica dirigida, estabelecemos os seguintes pressupostos: I) Por meio de sua realização, identifica-se como se mobilizam na Vivência do trabalho os processos de alienação-emancipação; II) O próprio arcabouço metodológico torna-se uma Vivência, por fomentar a dialética entre artista-obra-sociedade.

O intuito maior de fazer os(as) artistas vivenciarem a Autocrítica dirigida também se baseia na prerrogativa de eles(as) reconhecerem um caminho possível para sustentar a criatividade, de modo que, ao refazer o trajeto histórico-material da sua prática, garantirá a existência da arte no mundo.

Sistematização e aplicabilidade da Autocrítica dirigida

Nos instruímos até esse momento dos substratos teóricos e os relacionamos aos aspectos genéricos que institui a arte como trabalho, tendo em vista que a Autocrítica em seus fundamentos se direciona ao contexto em si, independente de qual seja a linguagem artística. Convém frisar que não quer dizer que desconsideramos a vastidão do campo em suas especificidades, do qual comungam as diversas linguagens, tais como: Artes plásticas (pintura, escultura, fotografia etc.); Música; Literatura (poesia, poemas, contos, romance); Dança; e Teatro – dentre as mais conhecidas e tradicionais. Neste tópico, com a sistematização das etapas, veremos a condução da metodologia. Diante disso, é importante ressaltar que as características das produções artísticas, por exemplo: se efêmera ou concreta, se individual ou coletiva – dentre outras – determinam também as condições de trabalho e, por isso, devem ser consideradas.

A Autocrítica dirigida9 9 As eventuais pesquisas que utilizem da metodologia da Autocrítica dirigida devem ser submetidas ao Comitê de ética das instituições e, com isso, solicitar dos participantes assinaturas de Termos de consentimento e/ou outras declarações. , em termos operacionais, está demonstrada em seu procedimento individual e abarca duas etapas complementares: 1) entrevista semiestruturada breve; 2) confronto artista-obra(s). Para eficácia da metodologia, é imprescindível que o(a) participante seja instruído(a) sobre os detalhes do procedimento em suas etapas, pois terá que selecionar com antecedência os materiais para o segundo momento.

A etapa de entrevista breve traz em evidência informações acerca do(a) artista que irá participar da Autocrítica dirigida, mas também formaliza o vínculo entre pesquisador(a) e participante. Nesta etapa se tem ciência sobre: I) A condição material e social atual: idade, ramo(s) artístico(s), tempo de trabalho; gênero; raça, estado civil – dentre outros; II) Elaboração de perguntas que envolvam a relação do(a) artista com a arte10 10 Não iremos apresentar questões para não limitar o alcance que esta etapa tem, pois ela se molda às perspectivas de estudo dos pesquisadores interessados em utilizar metodologia. : início de carreira; desenvolvimento profissional, situações de continuidade ou ruptura, obras marcantes, ou seja, aspectos determinantes para compreender os desdobramentos da Vivência do trabalho artístico. Já neste momento, o(a) artista organiza o pensamento em torno das Vivências por responder as perguntas. O objetivo é mobilizar a reflexão para que, na etapa seguinte, que consiste no confronto artista-obra, haja o aprofundamento ou acréscimos de outros pontos ainda não compartilhados.

Estas formas expressam a consciência em sua articulação interna e externa, nos termos retratados por Vigotski (1926/2006)Vigotski, L. S. (2006). La Crisis de los siete años (Obras escogidas. Tomo IV). Visor. (Texto original publicado em 1926), uma vez que essa operação é recriada imageticamente e transposta em palavra, na ação de perceber os aspectos da realidade de modos diferentes. Sobre isso:

Toda penetração mais profunda na realidade exige uma atitude mais livre da consciência para com os elementos dessa realidade, um afastamento do aspecto externo aparente da realidade dada imediatamente na percepção primária, a possibilidade de processos cada vez mais complexos, com a ajuda dos quais a cognição da realidade se complica e enriquece.

(Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). A construção do pensamento e da linguagem (2a ed., P. Bezerra Trad.). Martins Fontes., p.129)

Para a etapa de confrontação artista-obra, se mostra indispensável instruir com antecedência o(a) artista participante para trazer os materiais, orientando acerca da possibilidade em diversificar os elementos que serão trazidos, para que ele(a) não necessariamente se atenha a um tipo específico – por exemplo: somente adereços de figurino de personagem ou somente fotos – de forma que essa escolha seja realizada com o propósito consciente de se ater a um tipo ou única obra, e não pela falta de informação do que era ou não possível trazer. Sinaliza-se ainda de que é possível trazer diferentes elementos correspondentes a uma mesma obra e/ou elementos diferentes entre obras, sendo importante deixar claro que não existe delimitação de quantidade de obras/elementos/materiais a serem trazidos à sessão.

A seleção desse material será realizada exclusivamente pelo(a) participante, não somente porque o material, em sua maioria, se encontra em acervo pessoal, mas também porque da ocasião ocorre um contato inicial, em que provém os sentidos que influenciam as escolhas. Esse momento, ainda que não acompanhado pelo o olhar do(a) pesquisador(a), é determinante para reconstituição da Vivência do sujeito, havendo a pré-elaboração dos afetos e situações em face do objeto artístico e/ou vestígios que serão organizados para o procedimento autocrítico, em sua etapa de confrontação.

A efetividade das instruções fornecidas primeira etapa garantirá que a etapa seguinte, de confrontação artista-obra, cumpra seu objetivo de suscitar a Vivência do(a) artista.

Ambas as etapas fomentam a dimensão pessoal da consciência em que são refratadas as interações interpsíquicas, tal como um “prisma”11 11 Uma forma geométrica formada por segmentos de retas e suas extremidades formam um polígono. . Essa parcela da ação da consciência humana, sob a qual Vigotski utiliza a metáfora do prisma, é retratada no seguinte fenômeno óptico: quando uma luz branca atravessa o prisma ocorre a dispersão da luz em diferentes cores, representando as possibilidades de sentido que atravessam a consciência do sujeito. As partes e o todo interagem no processo de construção de sentido, se complementando ou ressaltando as diferenças, mudanças e dificuldades – os quais possivelmente se apresentarão no discurso do(a) participante. Isto caracteriza diretamente o território da Vivência, pois nesse lugar a consciência tende a organizar os elementos de sentido (Veresov, 2017Veresov, N. (2017). The Concept of Perezhivanie in Cultural-Historical Theory: Content and Contexts. In M. Fleer, F. González Rey, & N. Veresov (Eds.), Perezhivanie, Emotions and Subjectivity: Advancing Vygotsky’s Legacy (pp. 47-70). Springer.). Essa metáfora nos ajuda na compreensão de que a elaboração das respostas da entrevista, o momento de seleção de material de acervo e o confronto com a(s) obra(s), expõem a situação social de desenvolvimento.

no reconhecimento de que a análise das vivências tem um papel metodológico no campo da investigação o dos fenômenos desenvolvimentais da consciência/personalidade e, neste sentido, trata-se de um “prisma” que refrata aspectos parciais/totais do meio (e não de um espelho cuja função é refleti-lo).

(Toassa, 2019Toassa, G. (2019). Uma definição indefinida: contribuições recentes ao conceito de vivência na Psicologia vigotskiana. In G. Toassa, T. M. C. Souza, & D. J. S. Rodrigues (Eds.), Psicologia sócio-histórica e desigualdade social: do pensamento à práxis (pp. 107-133). Imprensa Universitária., p. 128)

Para entender que os mínimos detalhes interferem na construção do sentido sobre a Vivência, considere a seguinte situação: no processo da Autocrítica dirigida, se há motivos que levaram à escolha de um material (A) ao invés de um material (B) sobre aquela obra, estes são, por si sós, elementos de sentido – é importante que em algum momento essa questão seja levantada pelo(a) pesquisador(a).

Diante dessa prerrogativa, o(a) pesquisador(a) tem liberdade de proferir alguns questionamentos no decorrer do processo da Autocrítica dirigida para auxiliar na efetividade do procedimento. Nesse âmbito o(a) artista pode precisar gerenciar o pensamento e não encontrar meios para isso. Caso o(a) artista sentir falta de alguns elementos que não tenha levado ao encontro, é possível permiti-lo(a) falar sobre esse elemento e sua importância.

Se considerarmos que nem tudo que é experimentado está aparente na obra de arte, chegamos à conclusão de que cada obra de arte ou processo criativo iniciado pelo(a) artista se trata de uma Vivência, porque ele(a) seleciona, define critérios, intenções, compreensão dentro de um certo espectro de possibilidades dispostas pela consciência. Este fato nos traz aos estados de impossibilidade criativa que podem ser provocados pelos processos de alienação (Lukács, 2012Lukács, G. (2012). Para uma ontologia do ser social I. Boitempo.), reduzindo e limitando o alcance das Vivências, isto é, causa impedimento da refração da luz do “prisma”.

A partir daí, o vivenciado será transposto em palavra (construção de narrativa), em que se compartilha os sentidos e significados de todo processo da Autocrítica dirigida, da seleção de materiais em detrimento de outros e ainda sobre a própria experiência de confrontação.

A vivência pode expressar-se em confissões, longas conversações pessoais, ou ações: em escrever uma carta; ou ir ao teatro, a uma loja. Elas também podem não alcançar expressão detectável; desfazer-se em angústias, apresentar-se como sintoma de crises graves, desagregadoras, na vida psíquica.

(Toassa, 2019Toassa, G. (2019). Uma definição indefinida: contribuições recentes ao conceito de vivência na Psicologia vigotskiana. In G. Toassa, T. M. C. Souza, & D. J. S. Rodrigues (Eds.), Psicologia sócio-histórica e desigualdade social: do pensamento à práxis (pp. 107-133). Imprensa Universitária., p. 126)

A metodologia fomenta o encontro, sendo preferível que ocorra no lugar de trabalho do(a) artista: ateliê, sala de ensaio, estúdios – dentre outros. No próprio ambiente, o(a) artista estaria em um novo processo de ressignificação, disposto(a) à ação prática por encadeamento da reação estética provocada. Ao acionar essas Vivências por meio de um método, tal como a Autocrítica dirigida, permitimos que o(a) artista se dê conta do desenvolvimento da sua atividade num trajeto histórico-cultural amplo. Percorrer esse trajeto é se conscientizar das interferências que habitam o cotidiano laboral, para além dos aspectos técnicos e estéticos – importantes para o desenvolvimento da atividade artística –, mas também no alcance de outras particularidades do que é ser um artista numa sociedade capitalista. Vigotski (1915-16/1999a, p. 320)Vigotski, L. S. (1999a). A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca (1a ed.). Martins Fontes. justamente que “A arte é antes uma organização do nosso comportamento visando ao futuro, uma orientação para o futuro, uma exigência que talvez nunca venha a concretizar-se, mas que nos leva e aspirar acima da nossa vida o que está por trás dela”.

Essa abordagem dialética compreende o processo de desenvolvimento do sujeito, porque considera suas fases e mudanças, na situação gerenciada que restabelece a relação artista-obra-sociedade possibilitando proferir uma análise explicativa das relações dinâmicas e/ou causais (Vigotski, 2009Vigotski, L. S. (2009). A construção do pensamento e da linguagem (2a ed., P. Bezerra Trad.). Martins Fontes.). Provocamos a expressão, apreensão, e atribuição de sentidos, podendo desencadear novas Vivências, em um ciclo de desenvolvimento contínuo.

A complexidade da obra de arte também nos leva a outra característica importante do procedimento, a sua adequação à linguagem artística praticada pelo(a) participante. Por exemplo, para as Artes Cênicas, é possível ser incluídos trechos de cena – algum movimento coreográfico ou fala de personagem – que podem ser expostos e encenados em meio ao processo autocrítico, a critério do(a) participante; ou ainda, para as atividades que envolvem diretamente a música, os trechos de composições ou instrumentos podem ser executados durante o processo. Tais ações facilitam o reconhecimento de novas possibilidades criativas e percepções sobre o vivenciado que podem ser apresentadas como dados novos para o(a) pesquisador(a) que acompanha.

Ao ter ciência sobre qual vertente artística o(a) participante desenvolve profissionalmente – seja artes cênicas, artes plásticas, música, literatura ou outras –, o(a) pesquisador(a) consegue perceber as relações em jogo na etapa de confrontação. Algumas diferenças surgem, por exemplo: artistas plásticos(as) e escritores(as) têm acesso facilitado à obra de arte, em sua concreta totalidade, podendo trazer com mais facilidade para a confrontação, embora não seja obrigatório se limitar a ela. Diferente dos(as) participantes das artes cênicas, por sua prática se caracterizar pela efemeridade, lidam com os vestígios das obras (fotos, vídeos, adereços…) para reconstrução das lembranças sobre o vivenciado.

Nesse âmbito, os materiais podem variar significativamente e, inclusive, mesclarem entre linguagens artísticas distintas. O processo criativo tende a ser caótico, não linear e se constitui de referências diversas, algo que também refletirá nos materiais selecionados pelo(a) artista para a etapa de confrontação.

O procedimento fomentado pode ser ampliado para outras questões que sejam do interesse do(a) pesquisador(a), pensando os seguintes eixos: I) aspectos estéticos e técnicos; II) sentidos da trajetória e de permanência na profissão; III) identificação e planejamento de futuros projetos; IV) identidade criativa do(a) trabalhador(a); V) desafios e descobertas em relação à prática cotidiana de seu trabalho; VI) atravessamentos nascentes fora do campo de trabalho que interferem nos processos de criação. Vias que consequentemente contribuem para a construção deste território de pesquisa no que concerne: a) a importância da obra de arte para o entendimento do que é ser artista-trabalhador(a); b) os aspectos que enaltecem, validam ou corrompem a relação artista-obra-sociedade; c) a obra de arte como matéria hermenêutica, ontológica e dialógica. Ou seja, mostram-se vastas as possibilidades que se sobressaem da prática interventiva, por isso a definição mais exata que justifique o uso desse recurso dependerá dos interesses do(a) pesquisador(a).

Todos estes apontamentos estão inseridos dentro do que definimos como Vivência do(a) artista, como fenômeno psicológico e como ferramenta de análise (Veresov, 2017Veresov, N. (2017). The Concept of Perezhivanie in Cultural-Historical Theory: Content and Contexts. In M. Fleer, F. González Rey, & N. Veresov (Eds.), Perezhivanie, Emotions and Subjectivity: Advancing Vygotsky’s Legacy (pp. 47-70). Springer.), em que estão incutidos o desenvolvimento humano, por apresentar um sujeito inseparável do social (Vigotski, 1926/2006Vigotski, L. S. (2006). La Crisis de los siete años (Obras escogidas. Tomo IV). Visor. (Texto original publicado em 1926)). Destacamos, ainda, mediante os apontamentos que enumeramos no parágrafo anterior, que não nos reduzimos aos aspectos criativos do trabalho do(a) artista, o procedimento se expande ao colocar em relação o entorno e outras questões psicossociais que definem o(a) profissional. A partir dessas possibilidades analíticas, refletimos em que momentos do processo autocrítico esses aspectos elencados podem emergir. Os procedimentos de análise ficam a critério do(a) pesquisador(a) mediante seus interesses de pesquisa e referencial teórico adotado, cedendo uma liberdade maior para se apropriar do que emerge como matéria coletada.

Considerações Finais

O(A) artista-trabalhador(a) não somente se confronta com as exigências técnicas e estéticas do seu ofício, mas se encontra atravessado(a) por mecanismos externos baseados na lógica capitalista que tendem a deturpar a Vivência desse(a) trabalhador(a), alienando-o(a) de si, do seu produto, e da relação com outros sujeitos (Marx, 1932/2004). Por não estar imune ao processo de mercantilização, o(a) artista-trabalhador(a) se torna um(a) produtor(a) de mercadorias, subordinado(a) a determinadas exigências do sistema e da relação com quem consome o produto de sua atividade, denominada arte. “A despersonalização dessa relação acarreta, inevitavelmente, o desaparecimento do valor estético, cujo lugar é tomado pelos pseudovalores do tipo do bestseller” (Mészáros, 2009, p. 186). Nessa lógica, considera-se como importante as obras ou artistas que mais alcançaram vendas/público, e não necessariamente, a qualidade e a composição estética da obra.

Por isso, evidenciamos o quanto os processos de alienação podem interferir diretamente no desenvolvimento do(a) artista-trabalhador(a), podendo extrair desses(as) profissionais os seus reais interesses criativos para dar vazão a interesses alheios, algo determinante quando falamos em arte. Para sair desse estado mecanizado e acrítico característico da existência capitalista, é necessário (re)estabelecer a consciência sobre as ações realizadas e retomar a compreensão acerca da realidade concreta para intervir sobre ela, o que permitirá o desencadeamento de eventuais processos de emancipação. Tal retorno não se é gerado de qualquer forma, é preciso meios e acontecimentos para que o sujeito desperte, isto é, a própria Vivência.

Explicitamos ao longo deste artigo os fundamentos e a aplicabilidade do método da Autocrítica dirigida, para pesquisa e intervenção, nascente do campo artístico por ter sua base procedimental derivada da Crítica de arte. A partir de então, desenvolvemos uma forte relação epistêmico-metodológica com a Psicologia Histórico-Cultural de Lev Vigotski, percorrendo um caminho a partir de importantes conceitos que constitui a compreensão sobre a unidade sistêmica de Vivência (Perejivânie).

Ao evidenciar essa problemática no âmbito do(a) artista-trabalhador(a), entende-se o objeto artístico como matéria de mediação por dar continuidade ao plano de objetivação da realidade. O fazer artístico se constitui, portanto, como uma atividade que movimenta a dialética humana – tanto para quem realiza a ação quanto para aqueles(as) que entram em contato com ela (Vigotski, 1915-16/1999aVigotski, L. S. (1999a). A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca (1a ed.). Martins Fontes.). Uma via de mão dupla que contribui para a constituição da consciência e, consequentemente, em um novo arranjo das funções psicológicas superiores (Barroco & Superti, 2014Barroco, S. M. S., & Superti, T. (2014). Vigotski e o estudo da Psicologia da Arte: contribuições para o desenvolvimento humano. Psicologia & Sociedade, 26(1), 22-31. https://doi.org/10.1590/S0102-71822014000100004
https://doi.org/10.1590/S0102-7182201400...
; Toassa, 2006Toassa, G. (2006). Conceito de consciência em Vigotski. Psicologia USP, 17(2), 59-83. https://doi.org/10.1590/S0103-65642006000200004
https://doi.org/10.1590/S0103-6564200600...
). Pelo procedimento autocrítico, tendo em vista que se inicia na arte e retorna a ela, abre-se um caminho para o(a) artista perceber, em uma nova condição, elementos de sua história/trajetória e dar prosseguimento a ela – podendo ser um mecanismo que fomenta eventuais processos de emancipação.

Conclui-se que a arte não é um mero fazer/produzir, mas um fazer que exige uma consciência sobre a ação – da ideia à forma. A conexão dialética entre artista-obra-sociedade é gradativamente restabelecida, de forma que haja o encontro do sujeito não somente com a diversidade de materiais, mas com o conjunto que constitui sua trajetória – ou seja, seu repertório artístico como um todo.

Espera-se, por fim, que a Autocrítica dirigida compreendida pelos pressupostos teóricos da Psicologia Histórico-Cultural sirva de referência para futuras intervenções no contexto artístico ou em outras realidades de trabalho, a fim de que possamos reconhecer novas potencialidades da metodologia e colher os frutos de seus resultados.

  • 1
    Para mais informações, ver: Vigotski (2023)Vigotski, L. S. (2023). Sobre a questão da psicologia da criação pelo ator. (P.N. Marques, Trad.). Pro-Posições, 34, ed0020210085. http://dx.doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0085 (Obra original publicada em 1936).
    https://doi.org/10.1590/1980-6248-2021-0...
    .
  • 2
    Dossiê Temático organizado por: Priscila Nascimento Marques https://orcid.org/0000-0002-7111-6372 eAna Luiza Bustamante Smolka https://orcid.org/0000-0002-2064-3391.
  • 4
    Normalização, preparação e revisão textual: Keyla Malfada de Oliveira Amorim. keylamafalda@gmail.com
  • 5
    Apoio: Esta pesquisa recebeu recursos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
  • 6
    Por uma questão de tradução o nome do autor recebe diferentes grafias: Vigotski, Vygotski, Vygotsky. Neste artigo adotamos a tradução brasileira em Vigotski, respeitando as variações adotadas pelos livros referenciados em parênteses.
  • 7
    Ao manter a base marxista como fundamentação das discussões propostas, defende-se o conceito materialidade, e suas variações, aplicada ao contexto artístico ao se referir à obra de arte. De acordo com verbete do dicionário do pensamento marxista, Bottomore (2001, p. 254)Bottomore, T. (Org.). (1988). Dicionário do pensamento marxista. Jorge Zahar. define que o “Materialismo afirma que tudo o que existe é apenas matéria, ou, pelo menos, depende da matéria”. Reconhece-se que tal conceito apresenta diversas conotações aliadas às discussões terminológicas no interior do próprio marxismo. A obra de arte consiste em matéria/materialidade de mediação e que se consolida na relação sujeito-mundo, conforme também assinala L. Vigotski, em Psicologia da arte (1925/1999b).
  • 8
    O termo russo Perejivânie pode ter diferentes variações a depender da tradução adotada. Neste artigo mencionamos em sua forma mais comum adotada nos trabalhos brasileiros. Os verbos russos se agrupam em pares de significado praticamente idêntico, diferenciando-se pelo seu aspecto: perfectivo ou imperfectivo. Um desses pares seria (perejit) e (perejivát), ambos originários do verbo (jit). No seu sentido amplo, tanto “jit” quanto “perejit” significam viver” (Toassa, 2010Toassa, G. (2019). Uma definição indefinida: contribuições recentes ao conceito de vivência na Psicologia vigotskiana. In G. Toassa, T. M. C. Souza, & D. J. S. Rodrigues (Eds.), Psicologia sócio-histórica e desigualdade social: do pensamento à práxis (pp. 107-133). Imprensa Universitária., 759)
  • 9
    As eventuais pesquisas que utilizem da metodologia da Autocrítica dirigida devem ser submetidas ao Comitê de ética das instituições e, com isso, solicitar dos participantes assinaturas de Termos de consentimento e/ou outras declarações.
  • 10
    Não iremos apresentar questões para não limitar o alcance que esta etapa tem, pois ela se molda às perspectivas de estudo dos pesquisadores interessados em utilizar metodologia.
  • 11
    Uma forma geométrica formada por segmentos de retas e suas extremidades formam um polígono.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    01 Maio 2021
  • Revisado
    17 Nov 2022
  • Aceito
    31 Jan 2023
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