Uma doença no espaço público, a AIDS em seis jornais franceses

Une maladie exposée en public: le SIDA dans six journaux français

A disease within a public spacer AIDS in six French newspapers

Uma doença no espaço público, a AIDS em seis jornais franceses

A disease within a public spacer AIDS in six French newspapers

Une maladie exposée en public: le SIDA dans six journaux français

Claudine Herzlich; Janine Pierret

Socióloga, CERMES - Centre de Recherche Médecine Maladie et Sciences Sociales

RESUMO

Pressupondo que a AIDS coloca novamente na cena social a temática da doença como cataclisma e onde se articulou de maneira incxtrincável as dimensões biológica, política c social, os autores procuram delinear como se construiu a representação deste fenômeno inédito na tradição ocidental, no qual assistimos as múltiplas interferências e retedações entre conhecimento científico e conhecimento comum, Para isso, a AIDS é analisada no espaço público, através da leitura crítica de jornal franceses.

ABSTRACT

AIDS has placed the issue of disease as cataclysm back on the social seneario, where the biological, political, and social dimensions are inextricably interwoven. This article is an effort to outline the conslruction of the repre-sentation of this phenomcnon, previously unknown multiple interferences and retranslations between scicntifie and common knowledge. With this in mind, AIDS is analyzed as approached within a public space, that is, ihrough a criticai reading of French newspapers.

RESUME

Les auteurs de cet article avancent une hypothèse selon laquelle ie SIDA ramène sur la scène sociale la thématique de la maladie-cataclysme au sein de laquelle les dimensions biologique, politique et sociale s'artieulent de façon inextricable. Ils s*efforcent de rctracer la façon dont a eté construite la repré-sentation de ce phénomène inédit dans la tradition occideutale. A travers lui, nous observons les multiples interférences et relations qui unissem la connais-sance scientifique et la connaissance ordinaire. C'est pourquoi le SIDA est ici analysé dans le contexte de 1'espace public par le biais d'une lecture critique de plusieurs journaux français.

Texto completo disponível apenas em PDF.

Full text available only in PDF format.

1 HABERMAS, J. L'espace public. Paris, Payot, 1986.

2 BERGER P., LUCKMAN, T. La cónstruclion sociale de la réalitê. Paris, Meridiens, Klineksieck, 1986, p. 8-9. [A construção social da realidade. Petropolis,Vozes, 1973).

3 VERON E., Construir?I'événemenl. Paris, Ed. tia Minuit. 1981, p. 7-8 Grifo n«w

4 Levantamos sistematicamente os diferentes artigos publicados nos seis jornais diá rios, utilizando como unidade o dia da publicação. Quer dizer que vários 'artigos' publicados no mesmo dia como "dossiê" contam como uma publicação. Em compensação, artigos em "série", publicados em vários dias, são contados como cada um correspondendo a uma publicação.

5 A tiragem indicada em cada um dos jornais, com exceção do Figaro, que forneceu a informação pelo telefone, dá uma idéia disso: o Figaro teve uma tiragem de 557.452 exemplares por dia, em média, no ano de 1986. Nós damos uma idéia da tiragem dos outros cinco em 1987. L'Humanité, 170.000; Libération, 230.000; Le Matin, 105.000; Le Monde, 500.000; Le Quotidien de Paris, 120.000.

6 Somente o Figaro tem uma seção cotidiana intitulada "a vida científica: Ciência~ Medicina-Técnica", que ocupa geralmente uma página do jornal. Jornalistas especializados . e alguns médicos se responsabilizam por essa seção. O Monde dedica uma seção quinzenal de uma página ou duas, às vezes mais, à "Ciências e Medicina", às terças-feiras. Nos outros dias os artigos "Medicina" ficam numa seção abaixo da parte do jornal intitulado "Sociedade". Jornalistas especializados e médicos acompanham esses problema~. Os outros quatro jornais não têm uma seção especial, mas publicam freqüentemente artigos médicos, assinados por jornalistas mais ou meno< especializados.

7 VERON E, op. cit, p. 8.

8 New England Journal of Medecine, 1981,305:1425-1531.

9 GODOY, J. Lu roison grapkique. Paris, Ed. de Minuit, 1979 e B. Latour, "Les véus del'espril", Cttllure technique, nº 14. 1985, p. 4 — 29.

10 La Recherche. março 1982. p. 393.

11 Rm francês, Syndrome d* lmuno-Déficience Acquise ou SIDA.

12 Por exemplo, Liberátion — no seu dossiê de 19 e 20 de março de 1983 — cita a cifra de 4,693 casos recenseados no final de 1982 nos EUA, entre os quais 278 mortes e 44 casos de AIDS na França dos quais 15 estão mortos. Na mesma página num espaço intitulado "Pequena cana geopolítica do déficit imunitário", lê-se; "Final de 1982. mais de 800 casos estão recenseados nos EUA e uns vinte era Paris,"

13 Retomamos atguns aspectos da análise de P. Roqueplo,Lejptuiesacidestíbnsideréescomtne Un acciden! du risque. Paris, CEMS, 1986, relatório mimeo grafado, 35 p.

14 LITTRE dá a seguinte definição de epidemia: "Doença, contagiosa ou não. que ataca uin grande número de pessoas." A epidemiologia moderna a define como: "A ocorrência, numa comunidade ou região, de casos de uma doença."

15 Retomamos alguns aspectos da análise de P. Roqueplo, Les pluies acides Cúftiidêrées Comme nn accidem du risque, Paris, CEMS, 1986, relatório mimeografado, 35 p.

16 Nota da tradudora: "deviennent, enjeu" a tradução literal de "enjeu" seria aposta. Optei por centro, por achar que nesse contexto aposta não faria sentido.

17 ROQUEPLO, P., Le partage du savoir. Science, culture, vulgarization. Editions du Seuil, 1974, p. 32 -34.

18 ROQUEPLO, P., op. cito p. 20 -22.

19 Science, 20 de maio 1983, v. 220, nE 4599.

20 Trata-se do Human T Ccll Leukemia Vírus, ou HTLV, e do Lymphadenopathy Acqtiired Virus ou LAV, nome dado pelos franceses ao vírus. A imprensa üsa o nome pela primeira vez cm agosto de 1983. A partir do verão de 1986, a denominação "neutra" HIV se imporá como compromisso aceitável para as duas partes.

21 VERON E-, op, cil,

22 Sob a denominação de Instituto Pasteur estão agrupados uma firma industria], o Instituto Pasteur Produção, e um organismo de pesquisa, o instituto Pasteur Fundação. Todos os jornais analisados falaram desse problema vinte vezes em algumas semanas.

23 Pode-se observar que no período recente -fora do contexto deste estudo -as aposta~ econômicas e as rivalidades entre equipes científicas, sobretudo na Africa, são relativamente ocultadas na imprensa cotidiana.

24 GOLDBERG, M., "Cel otiscur objet tio 1'épidémioiogie", Sciences Sociales et Santé ne 1, dezembro de 1982, p. 61,

25 O artigo de M. Pollacke M. A. Schiltz, "Identité sociale et gestion d'un risque de santé: Ies hOll1osexueIs face au Sida:', Actes de la Recherche en Scienreç Sociales, nº 68, junho de 1987, mostra bem a pluralidade dos meÍDs sociais aos quais pertencem os homossexuais, assim como a diversidade de modos de vida pelas quais eles gerem sua identidade.

26 Pode-se observar que tamb ém é no início do verão de 83 que aparecem os primeiros artigos publicados por revistas como Le Poini, L'Express, Le Nouvel Observaieur. Cf. A. Yvcmat, "AIDS, o novo regime da epidemia", DE A de Ciências Sociais, EHKSS-ENS, 1986-1987.

27 SONTAG, S. La maladie comme m étaphore, Paris, Le Seuil, 1980.

28 Liberátion, 10/1 I de setembro de 1983.

29 Durante um período de dez meses, somente 47 artigos serão publicados pelos seis jornais diários.

30 Neste período que dura 15 meses, de abril de 1985 a junho de 1986, 274 artigos são publicados, seja dois terços daqueles que nós recenseamos. O mesmo fenômeno observa-se nas publicações semanais. Le Point, Le Nouvel Observateur, L'Express, publicam 23 artigos ou dossiês durante este período.Cf. A. Yvernat, op. cito

31 HABERMAS. J. op. cit.

32 FOX, R.C., "It's the same but different: A sociological perspective on the case of the Utah Artificial Heart", em M. W. Shaw (ed)After Barney Clark, University of Texas Press, 1984, p. 67-90; e J. Swazey, J. C. Watkins, R.C. Fox, "Assessing the artificial heart: the clinicai moratorium revisited", em International Journal of Technology Assessment in Health Care, 1986, v. 3, n® 2, p. 387-410.

33 BATESON, G ..Steps to an ecology of mind: Ballantine Books, New York, 1972, p. 202-212.

34 AUGÉ, M. HERZLICH, C., Le sens du mal. Anthropologie, histoire, sociologie de la maladie, Paris, Editions des Archives Contemporaines, 1984.

35 HERZLICH, C., PIERRET, J., Malades d'hier, malades d'aujourd'hui. De la mort collective au devoir de guérison. Paris, Payot, 1984.

36 HOLTON. G. Uinvention scienlijlque: themata e.\ int érprétation, Paris, PUF, 1982.

37 ROQUEPLO,op. cit., p. 91-92.

38 SONTAG. S. op. cit., p. 9.

39 FRANKENBERG. ti. "Sickness as cultural performance: drama, trajectory and pÜgrimage, root melaphors and lhe making social ofdisease". Iniemational Journal of Health Services, 1986, vol. 16, n- IV, 603-26.

40 Cf. por exemplo L.Temoshok, D. M.Sweet e J. Zich, "A three citycomparísoti of the public' s knowledge and attitudes about AIDS". Psychology and Health, Vol, 1, n9 J, V. K. Govern-menl Health Eduealion Campaign oti AIDS", íbidem. 61-72,

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  05 Out 2011
• Data do Fascículo
  1992