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O discurso da prevenção da Aids frente às lógicas sexuais de casais sorodiscordantes: sobre normas e práticas

The speech of Aids prevention in face of sexual logics of serodiscordant couples: on norms and practices

Resumos

O artigo aborda práticas sexuais e representações sociais de casais sorodiscordantes para o HIV/Aids. Argumenta-se que em situação de conjugalidade há uma suspensão do chamado sexo seguro e um processo de rotinização da intimidade. A partir de entrevistas realizadas com homens e mulheres envolvidos em relacionamentos considerados estáveis, destrinça-se o repertório de práticas sexuais exercidas segundo o gênero, investigam-se as representações associadas ao elenco destas práticas e se discute como as mensagens de prevenção muitas vezes não acompanham estas lógicas, forjando-se a partir de discursos normativos e distantes das realidades cotidianas vividas pelos sujeitos.

Gênero; sexualidade; Aids; políticas públicas; sorodiscordância


This paper reflects on sexual practices and social representations of Aids serodiscordant couples. In conjugal situation there is the suspension of "safe sex" and a process of routine of intimacy. The method adopted was in-deep interviews with men and women involved in stable conjugal relationships. The analysis describes male and female sexual scripts so as the social representations related to them. The paper show that prevention messages many times have normative speech, very distant of the daily realities lived by the subjects.

Gender; sexuality; Aids


O discurso da prevenção da Aids frente às lógicas sexuais de casais sorodiscordantes: sobre normas e práticas

The speech of Aids prevention in face of sexual logics of serodiscordant couples: on norms and practices

Ivia Maksud

Cientista social (IFCS-UFRJ), Doutora em Saúde Coletiva (IMS-UERJ). Professora Adjunta do Departamento de Planejamento em Saúde, Instituto de Saúde da Comunidade, Universidade Federal Fluminense. Endereço eletrônico: iviamaksud@gmail.com

RESUMO

O artigo aborda práticas sexuais e representações sociais de casais sorodiscordantes para o HIV/Aids. Argumenta-se que em situação de conjugalidade há uma suspensão do chamado sexo seguro e um processo de rotinização da intimidade. A partir de entrevistas realizadas com homens e mulheres envolvidos em relacionamentos considerados estáveis, destrinça-se o repertório de práticas sexuais exercidas segundo o gênero, investigam-se as representações associadas ao elenco destas práticas e se discute como as mensagens de prevenção muitas vezes não acompanham estas lógicas, forjando-se a partir de discursos normativos e distantes das realidades cotidianas vividas pelos sujeitos.

Palavras-chave: Gênero, sexualidade, Aids, políticas públicas, sorodiscordância.

ABSTRACT

This paper reflects on sexual practices and social representations of Aids serodiscordant couples. In conjugal situation there is the suspension of "safe sex" and a process of routine of intimacy. The method adopted was in-deep interviews with men and women involved in stable conjugal relationships. The analysis describes male and female sexual scripts so as the social representations related to them. The paper show that prevention messages many times have normative speech, very distant of the daily realities lived by the subjects.

Key words: Gender, sexuality, Aids.

Neste artigo pretendo problematizar o discurso oficial da prevenção ao HIV/Aids a partir das práticas sexuais e representações sociais de sujeitos inseridos em relacionamentos considerados de alguma forma estáveis.1 1 Agradecimentos especiais são dirigidos à Professora Dra. Maria Luiza Heilborn, que me orientou durante o doutorado; aos professores Sérgio Carrara, Jane Russo, Veriano Terto, Daniela Knauth e Laura Moutinho, pelos frutíferos diálogos; e aos entrevistados, que compartilharam comigo suas histórias. Este artigo é uma versão revisada da apresentação proferida no GT "Sexualidade, Corpo e Gênero" do 32º Encontro Anual da ANPOCS, em outubro de 2008, ocasião em que me beneficiei dos comentários da professora Adriana Vianna, a quem também agradeço. O argumento central é que, em situação de conjugalidade, há um afrouxamento ou suspensão do chamado sexo seguro e uma rotinização da intimidade. Tomo como foro privilegiado a esfera íntima e o elenco de práticas sexuais no contexto de uma relação considerada "de risco" aos olhos da Saúde Pública e do senso comum: os casais sorodiscordantes (quando apenas um dos parceiros possui o HIV).2 2 Utilizo o termo "casais sorodiscordantes" mais ou menos como fez Salem com os "casais grávidos": como uma espécie de "experiência sintetizadora", 3 um tipo ideal weberiano onde cabem experiências singulares de sujeitos inseridos em diferentes formas de relacionamento ou arranjos conjugais, em tempos (cronológico e subjetivo) distintos.

O panorama atual da epidemia no Brasil: "a heterossexualização da Aids"

Na década de 1980, surgiam os primeiros casos de Aids no Brasil e no mundo. Os homossexuais foram os mais afetados pela enfermidade da qual nada se sabia. Apelidada de peste gay e câncer gay pela mídia (GALVÃO, 1992), a epidemia concentrou-se nos estratos médios e superiores, devido à interação de brasileiros - de camadas médias e altas - com norte-americanos afetados (BASTOS, 2000). A essa época, o conteúdo das matérias jornalísticas e das campanhas governamentais brasileiras polarizava-se em torno da aquisição do vírus pelas "vítimas" e "culpados": as primeiras, os hemofílicos e transfundidos, com um papel "passivo", baseado na infecção por meio de transfusão de sangue, e as segundas (majoritariamente homens homossexuais) com um papel "ativo", resultado de seu comportamento sexual ou do uso de drogas (GALVÃO, 1992). Herlizch e Pierret (1992), na França, chegavam a conclusões equivalentes, demonstrando, a partir da análise de jornais franceses, que a tradução do discurso científico em torno da descoberta do vírus HIV para o público leigo resultou na constituição de um fenômeno social. De uma maneira geral, seja no Brasil ou em outras partes do mundo, a bibliografia socioantropológica aponta vários exemplos que permitem aferir o potencial dos meios de comunicação como importantes agências de socialização, responsáveis em grande parte pela difusão do estigma em torno do HIV/Aids.

A mobilização social em torno da epidemia de Aids teve início quando alguns grupos gays organizados, à frente de reivindicações, impulsionaram o surgimento do primeiro programa de Aids brasileiro, nascido no Estado de São Paulo na década de 1980, antes mesmo da constituição de um Programa Federal (TEIXEIRA, 1987; TERTO JR., 1997). O cenário político brasileiro formado em torno da luta contra a Aids envolve vozes - por vezes dissonantes - de gestores e tomadores de decisões governamentais, militantes e ativistas (inseridos ou não em organizações não-governamentais), redes e outras instâncias políticas, profissionais de saúde, intelectuais e artistas, e vem sendo denominado como a resposta brasileira ao HIV/Aids (UNAIDS, 1998; BRASIL, 1999; CHEQUER, 2000).

De 1992 em diante, ocorreram descobertas científicas no âmbito biomédico mundial e muitas mudanças nas políticas públicas brasileiras de prevenção e tratamento das DST/Aids (GALVÃO, 2000). Em 1996 noticiou-se a possibilidade de tratamento com antirretrovirais na Conferência de Aids em Vancouver (GALVÃO, 2000). Nesse mesmo ano, o Governo brasileiro anunciou a disponibilização universal desses medicamentos pelo então recém-constituído Sistema Único de Saúde (SUS). Esse quadro macroestrutural mudaria decisivamente o panorama epidemiológico brasileiro. A partir de então se ampliam a expectativa e a qualidade de vida das pessoas soropositivas, quando a Aids passa a ser considerada doença crônica tratável, e a letalidade da epidemia diminui sensivelmente no Brasil. No entanto, no panorama das representações sociais, não obstante os avanços políticos e médicos, as pesquisas sociológicas seguem desde o início apontando um processo de discriminação dos que adquirem o vírus da Aids (PARKER e AGGLETON, 2001). Em quase duas décadas de epidemia e de pesquisa, muitos trabalhos demonstraram, direta ou indiretamente, o violento estigma construído em torno da pessoa soropositiva (vulgarmente denominada aidética).

Segundo dados e textos oficiais, a epidemia de Aids no Brasil encontra-se em patamares elevados, tendo atingido, em 2006, 19,5 casos por 100 mil habitantes. Observa-se entre os homens uma tendência de estabilização e o crescimento da epidemia em mulheres. Ao longo dos anos, os boletins epidemiológicos divulgados pelo Ministério da Saúde mostram que a razão entre os sexos vêm diminuindo de forma progressiva. Se em 1985 havia 15 casos da doença em homens para 1 em mulher, atualmente a relação é de 1,5 para 1, e em algumas faixas etárias, há inversão na razão de sexo (BRASIL, 2008). A transmissão heterossexual continua a crescer e a epidemia vem atingindo, também, de maneira importante, os indivíduos com menor escolaridade. Cabe destacar, portanto, três tendências atuais apresentadas pelo governo brasileiro em relação à epidemia de Aids: a) o aumento da doença em mulheres; b) o espraiamento da doença para classes sociais menos favorecidas; c) o aumento proporcional de casos entre os heterossexuais.

Parker e Camargo Jr. (2000) ressaltam que várias epidemias de HIV/Aids coexistem em um mesmo espaço,3 3 Os autores apoiam-se na ideia desenvolvida por Jonathan Mann, a respeito das "dezenas, talvez centenas, de epidemias ocorrendo em paralelo, acometendo segmentos diversos da sociedade com padrões de disseminação e velocidades variadas, dependentes de uma série de fatores" (PARKER; CAMARGO JR., 2000). refletindo as profundas desigualdades da sociedade brasileira, a despeito da generalização realizada pelo Governo brasileiro a partir dos dados epidemiológicos do Brasil, que categoriza as tendências à "feminização", "pauperização", "juvenilização" e "interiorização". Essa discussão é feita após a modificação do perfil epidemiológico da epidemia que, nos anos 80, registrava a maioria de notificações de casos de Aids entre homens de orientação homossexual (KNAUTH, 1996, 1997 e 1998). Parker e Camargo Jr. destacam que a feminização da epidemia não é motivada simplesmente por questões de renda, mas pela posição subalterna de gênero das mulheres na hierarquia social. Para os autores,

embora as mulheres venham sendo incorporadas ao mercado de trabalho em proporções sem precedentes nas últimas décadas (ao menos, em parte, através de famílias de classe média, nas quais a presença de um segundo membro com fonte de renda tornou-se necessária como estratégia de manutenção do padrão de vida em contexto de crescente polarização econômica e salários reais declinantes), a face da pobreza e, em particular, da miséria, tem-se tornado, de modo crescente, a face das mulheres excluídas não apenas devido à opressão baseada em classe e etnia, mas também à

opressão baseada em gênero.

(PARKER; CAMARGO JR., 2000, p. 93 - grifos meus).

Além disso, de acordo com Fry et al. (2007), é importante assinalar que a epidemia de Aids se estende para outras camadas sociais: moradores de comunidades pobres, mulheres de camadas populares, pessoas menos escolarizadas e com ocupações com baixa remuneração ou excluídas do mercado formal de trabalho, o que faz notar que a epidemia reflete os padrões brasileiros de desigualdade (FRY et al., 2007).

A "heterossexualização" da epidemia vem trazendo também um desafio às pesquisas realizadas no âmbito das Ciências Sociais. A heterossexualidade e suas múltiplas formas de expressão são ainda pouco estudadas em pesquisas contemporâneas no âmbito do que já se configura como um destacado campo antropológico e sociológico (a sexualidade).

Sorodiscordância e medicalização da sexualidade

Em algumas revistas especializadas da área de Saúde Pública, os cuidados médicos com a prevenção do HIV/Aids entre pessoas com sorologias diferentes deram origem à produção de uma categoria - a sorodiscordância. O termo, ao lado de outros como sorodivergência e sorodiferença, vem sendo utilizado desde meados da década de 1990 na literatura biomédica norte-americana e, com menor frequência, na francesa. Trata-se de uma produção direcionada a cientistas e médicos, que se dedica prioritariamente a temas clínicos mas também aborda a vida íntima dos sujeitos, com uma leitura sobre um fenômeno social específico (conjugalidade e Aids), interessada sobretudo nas consequências do relacionamento sexual entre parceiros sorodiscordantes. O prisma da psicologia social ou da epidemiologia social é dominante nessa produção.

Este tipo de abordagem, no qual centros médicos se empenham em compreender fatos biomédicos à luz do viés qualitativo, foi muito utilizado no início da epidemia de HIV/Aids. Os estudos sobre Aids e sexualidade constituíam interesse da medicina preventiva, e muitas vezes foram realizados por médicos e epidemiólogos, que se detinham sobre o comportamento e as práticas sexuais a partir da noção de risco no sentido epidemiológico do termo. Nesses estudos, a sexualidade estava associada à dimensão comportamental, e as ciências sociais foram referência metodológica (LOYOLA, 1994). O tema da sorodiscordância, por seu potencial risco de transmissão da epidemia, acentua a tendência a enfatizar as óticas da medicina, da psicologia e da saúde pública.4 4 Nessa perspectiva, Rogers e colaboradores (1998) conduziram uma pesquisa sobre a notificação de parceiros de usuários de drogas injetáveis infectados por HIV, com a finalidade de desenvolver intervenções efetivas para essa população na cidade de Nova Iorque. Williams e colaboradores examinaram o uso de uma substância na terapia antirretroviral para avaliar a possibilidade de soroconversão de casais com sorologias diferentes para o HIV. Kippax e colaboradores (2003), a partir de um estudo de caso-controle numa coorte de homens gays de Sydney, valem-se de variáveis demográficas, contextuais e de conhecimento, para discutir a incidência de soroconversão naquela população. Safer sex and long term relationships é um tema bastante presente nos artigos publicados em periódicos como o Aids CARE.

Estudos que se situam entre a Psicologia Social e a Saúde Pública, como o de Remien (2002), questionam as possibilidades de intervenção na área da Saúde Pública, ao referirem que a maioria das transmissões do HIV ocorre num contexto de relacionamentos estáveis, seja por desconhecimento da condição, seja por recusa à crença da transmissão. De acordo com Remien (2002), há um aumento cada vez maior do número de casais sorodiscordantes. Para o autor, as razões para este crescimento podem ser explicadas pela crença nos resultados das terapias, com uma melhoria da saúde das pessoas, que começam a buscar relações com parceiros estáveis e mais relações sexuais. Partindo do referencial das pessoas soronegativas, estas também teriam acesso, segundo o autor, a mais informações sobre a eficácia de medicamentos, engajando-se, conscientemente, em relacionamentos com pessoas soropositivas.

No que se refere às Ciências Sociais, chama a atenção que, embora a sexualidade esteja sob os olhares vigilantes e curiosos de uma forte produção acadêmica (FOUCAULT, 1988), e que a sexualidade frente ao HIV/Aids venha sendo discutida desde o início da epidemia de HIV/Aids (LOYOLA, 1994), não se verifique uma expressiva produção socioantropológica sobre os temas da soropositividade e da sexualidade. Compreender os significados dos comportamentos, os critérios de seleção dos parceiros, os sentidos do desejo e prazer é importante mas, como ressaltam Parker, Herdt e Carballo (1995), raramente estas questões estão presentes nas pesquisas sociais sobre sexo e HIV/Aids. A maioria dos estudos trata da prevenção, abordando especificamente a negociação do uso de preservativo. Neles a preocupação central refere-se à não-infecção dos sujeitos soronegativos e a expressão da sexualidade não se configura como tema de destaque.

François Delor (1999) discute a noção de discordância sorológica e os modos de adaptação ao risco de Aids na relação do casal ou no contexto de um relacionamento, quando se dá o diagnóstico positivo de um dos parceiros. O autor considera o evento da sorodiscordância um elemento processual. Se a soropositividade pode ser definida como um evento biográfico, que demanda um processo de adaptação, a situação de sorodiscordância conhecida também se apresenta como um evento social que intervém na trajetória de um relacionamento. O anúncio da soropositividade cria condições para uma sorodiscordância potencial e até o conhecimento dos resultados dos exames pelos parceiros há uma fase de distanciamento. O anúncio da soronegatividade corresponde ao evento da sorodiscordância efetiva, um processo de adaptação à doença no qual se confundem emoções e há um clima de tensão.

A ideia de casamento representa, para o senso comum, um ideal simbólico de compartilhamento no qual se tem o outro como extensão de si (HEILBORN, 2004). O casamento dos dias de hoje, por sua vez, constitui uma instituição formada a partir do ideal do amor romântico, e, via de regra, o sexo ocupa nele posição central (BOZON, 2001 e 2004). Casamentos ou namoros estáveis possibilitam uma permanente exposição ao coito, e, portanto, aos riscos - de gravidez (LOYOLA, 2003) ou de transmissão de doenças sexualmente transmissíveis, entre as quais o HIV/Aids. No entanto, nos arranjos conjugais formados por casais sorodiscordantes, a intervenção médica se faz presente em algumas situações: na prescrição do uso de medicamentos antirretrovirais para o tratamento da doença; pela submissão frequente a exames de rotina pela medicalização da sexualidade; na recomendação expressa do uso regular de preservativos.

Neste artigo, restrinjo-me à discussão do último ponto: a recomendação do chamado "sexo seguro" em situação conjugal.5 5 A submissão frequente a exames de rotina pela medicalização da sexualidade e a recomendação expressa do uso regular de preservativos dão margem a outras discussões, que enfatizam os cuidados em situação conjugal, e que desenvolvi em minha tese de doutorado (MAKSUD, 2007). Na tentativa de compreender os significados do comportamento sexual e os sentidos sociais do desejo, se assim podemos dizer, questiono se "sentimentos conjugais", que via de regra são percebidos como essência da natureza humana, como "erotismo", "paixão", "atração", "tesão", "desejo" etc. - estão sujeitos (e de que forma) à medicalização.6 6 Dado o limite de espaço, optei por proceder a uma redação que abordasse os significados sobre as práticas sexuais sem ilustrar o texto com as falas propriamente ditas, optando, portanto, por uma estratégia de generalização que certamente implica perda de ricos detalhes da fala etnográfica.

Métodos

Para travar esta reflexão, utilizo os dados da minha pesquisa de doutorado (MAKSUD, 2007): 26 entrevistas realizadas com homens e mulheres de 13 casais heterossexuais sorodiscordantes. Os membros dos casais não foram entrevistados simultaneamente, para minimizar o bias e a interferência de um informante sobre o outro. Esta estratégia de abordagem também permitiu enxergar distintas formas de percepção e significação dos fatos segundo o gênero do entrevistado e segundo sua sorologia, positiva ou negativa.

Para este artigo, devo enfatizar um dado curioso sobre os entrevistados: as entrevistas foram coletadas em dois campos que guardam diferenciações entre si: primeiro, oito entrevistas foram feitas com casais que tinham trajetórias plurais e distintas, e tinham em comum apenas a própria situação de sorodiscordância. Eles não conformavam um "grupo" e tinham capitais culturais diferenciados. Além disso, esse conjunto de entrevistas evidencia a formação de casais heterogâmicos: um casal no qual a mulher soropositiva era mais velha, possuía ocupação e escolaridade mais altas que seu companheiro soronegativo; um casal em que o homem soropositivo possuía duas faculdades e era casado com uma mulher soronegativa que possuía o ensino fundamental e tinha ocupação informal no setor de serviços; um homem soropositivo, branco, comerciante, com nível superior, casado com uma negra, soronegativa e mais jovem. Por fim, no quarto casal, os parceiros tinham escolaridade, ocupações e renda aproximadas, no entanto diferiam acentuadamente em relação às suas idades (a mulher soropositiva tinha dez anos a menos que seu namorado soronegativo).7 7 Para uma discussão acerca da conjugalidade e heterogamia, consultar Moutinho (2003) e Ortner e Whitehead (1981).

No segundo campo de pesquisa, um serviço de referência para HIV/Aids,8 8 O trabalho de campo foi realizado com pacientes (e seus parceiros) do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas/FIOCRUZ, após aprovação do Comitê de Ética de Pesquisa local. Agradecimentos a toda a equipe são dirigidos em nome dos Drs. Valdileia Veloso, Beatriz Grinstejn e Nilo Fernandes. 18 pessoas foram identificadas e entrevistadas. A composição deste grupo reflete um perfil de usuários do sistema público de saúde. Diferentemente do primeiro conjunto de entrevistados, compunham um "grupo" com perfil sociodemográfico mais homogêneo sobre o qual é possível traçar algumas generalizações: renda familiar média de dois a três salários-mínimos e moradia em zonas populares. Em três dos nove casais as mulheres não exerciam qualquer atividade profissional e não possuíam renda. As ocupações eram majoritariamente de empregados dos setores de serviço e trabalhadores excluídos do mercado formal. A escolaridade variava do ensino fundamental ao médio e em sete de nove casais os homens tinham mais anos de estudo. Havia também a tendência de o homem ser mais velho que sua companheira. Por fim, um instigante dado sobre o pertencimento religioso dos entrevistados: apenas uma mulher soronegativa denominava-se católica ("não praticante"), e um homem soronegativo nunca teve religião. Os demais entrevistados pertenciam ou pertenceram a várias denominações da Igreja Evangélica (Batista, Universal, Assembleia de Deus e outras).

De fato, a religião é um dos primeiros domínios que se tenta igualar no casal: muitas mulheres criadas na religião católica se converteram à religião do parceiro e em um dos casos, a influência da sogra foi relatada como decisiva no processo. Há, em menor proporção, relatos que indicam que os homens converteram-se para a igreja evangélica frequentada pela parceira. Em alguns casos, a própria igreja havia servido como palco para as uniões afetivas. Pertencer a uma religião, no entanto, não quer dizer frequentar assiduamente a Igreja. Muitos entrevistados do sexo masculino disseram que vão esporadicamente ao espaço religioso ("estando meio afastados" ou "indo vez por outra"). Outra situação comum se dá entre os homens que têm pais evangélicos e foram criados nesta religião. Por considerar suas regras muito estritas, alguns homens se afastam do exercício religioso na idade adulta. Por fim, cabe salientar a sobreposição de dois episódios: a conversão religiosa e o diagnóstico da soropositividade. Este fato foi relatado apenas por um homem, mas, de acordo com pesquisas atuais, já se mostra recorrente entre uma parcela de soropositivos. Não é possível, portanto, desprezar a religião como uma esfera que confere sentido e coerência prática à existência, orientando os atos e a visão de mundo dos sujeitos, incluindo-se aí o exercício sexual.

Descompasso entre normas e representações

A maioria dos casais entrevistados já estava formada antes do diagnóstico e apenas três não coabitavam.9 9 O contato progressivo com o sistema de saúde é acompanhado por um complexo sistema de sugestões à pessoa soropositiva, que conforma, pouco a pouco, uma carreira moral soropositiva (GOFFMAN, 2005). Este processo comporta uma intensa articulação entre vida pública e privada, com mudanças subjetivas que resultam numa reorganização biográfica. Esta passagem contém a experiência do adoecimento e do sofrimento. Os serviços de saúde passam a desempenhar papel relevante na vida do sujeito. Sua rotina transforma-se com as consultas e exames, uso de medicamentos e, por fim, com a recomendação expressa de prática de "sexo seguro". Estas reformulações, no entanto, não adquirem um estatuto identitário, pois, para muitos entrevistados, a condição soropositiva não se torna pública. Os dados exemplificam que, nesse contexto conjugal, a revelação da soropositividade ao parceiro se impõe como um desafio, constituindo-se esta condição como um segredo que se mantém de modo tenso, entre a vontade ou necessidade de confissão, e o desejo de ocultamento do fato, dificultado pela proximidade dos atores envolvidos (SIMMEL, s/d). Nessa ocasião está em jogo a continuidade ou a ruptura do casal. As condições que acarretaram a contaminação tornam-se objeto de diálogo, quando podem surgir acusações ou dúvidas sobre a conduta do parceiro. A continuidade da aliança é considerada por muitos soropositivos, sobretudo mulheres, como o único vínculo conjugal possível. O parceiro passa a ter um significado supremo na vida do sujeito soropositivo: passa a ser "tudo", porque o "aceitou". Reforça-se o vínculo conjugal como relevante agência de socialização e suporte para os sujeitos. Esta é uma questão velada entre o casal e, para alguns entrevistados soronegativos, significa uma situação de extrema responsabilidade. Logo após a descoberta da soropositividade há um período de suspensão de beijos, carícias, contatos íntimos e atividade sexual, como também observou Delor (1999), e inicia-se um processo de adaptação ao risco da doença, que é repleto de emoções, dúvidas e resistências.

Como evidencia a literatura antropológica, os significados atribuídos ao que é considerado "risco" são relativos e estão relacionados às trajetórias sociais e à interação social entre os parceiros. A literatura mostra que na adaptação ao risco da Aids devem ser consideradas as características sociais e sexuais dos indivíduos e a interação entre os parceiros, incluindo relações de poder ligadas às diferenças de status social, idade, experiência sexual e sentimentos amorosos (BAJOS, 1998; MARQUET, 1999; PETO et al., 1992). Os dados da pesquisa reforçam estas argumentações e revelam que a convivência cotidiana é um dos fatores responsáveis pela naturalização da doença, que passa de "perigo" a "mal menor" (termos nativos). Esta situação que permite relativizar o risco, no caso dos casais sorodiscordantes, relaciona-se, a meu ver, a pelo menos três pontos. E estes três pontos falam da unidade casal sobrepondo-se a de indivíduo.

O primeiro ponto tem a ver com a própria situação de conjugalidade, como expressa no início da argumentação. Os fatos sociais são constituídos de passagens e deslocamentos: as fases da vida social são substituídas por outras, em um movimento de alternância, permitindo que, em certo período de tempo, o mundo social retome seu curso rotineiro. No terreno das práticas sexuais, por exemplo, a situação de conjugalidade impõe como um dos limites a imprevisibilidade do ato sexual (desconsiderada pela lógica racional de prevenção). Nos relacionamentos estáveis, o sexo pode ocorrer em distintas situações (por exemplo: de madrugada, ao acordar ou no banho) e os casais relatam a dificuldade de utilizar preservativos nesses momentos, pois sua utilização rompe com a imagem de espontaneidade do ato. O preservativo evoca a doença, um evento "que se quer esquecer".

O segundo ponto é trazido pelos soronegativos e diz respeito à relação sexual com o parceiro soropositivo a despeito de sua própria possibilidade de soroconversão (potencial de tornar-se também soropositivo). Há várias explicações para esta que para a Saúde Pública é considerada uma situação de exposição a risco. É bastante recorrente uma representação na qual os parceiros relativizam a doença do outro, e, em contraste à sua própria trajetória anterior - muitas vezes marcada por outras doenças, tragédias pessoais ou familiares, mortes ou ainda dificuldades de sobrevivência - avaliem o HIV como "fichinha" ou "detalhe". Em pequena proporção, a transmissão do HIV é consentida ou até mesmo desejada pelos entrevistados (esta situação foi mencionada por dois casais, num deles pelo homem positivo, que considera "mais fácil" quando os dois têm a doença; e noutro, por uma mulher negativa, que, ao referir fazer sexo desprotegido, por sua iniciativa, apontou falando: "o armário está cheio de camisinhas"). Segundo os relatos desses dois entrevistados, esta concepção estaria associada a um ideal de compartilhamento, proporcionado pela esfera conjugal, no qual haveria uma idealização do parceiro e talvez da própria doença; a uma ideia religiosa/missionária de que é possível aguentar máximos sofrimentos e também que a doença atualmente, por ser controlável, não constituiria exatamente um problema. Nestas situações, o não-uso do preservativo pode conferir/atribuir mais importância ao par do que a um dos parceiros (ou à sua possibilidade de infecção).

Um terceiro ponto passível de relativizar o risco relaciona-se às diferenças de gênero no que concerne aos cuidados com a prevenção e aos simbolismos ligados à ameaça da transmissão, e incide diretamente sobre as práticas sexuais. Para analisar a sexualidade conjugal, utilizo como inspiração a teoria dos scripts sexuais de Simon e Gagnon (1999). Os roteiros mostram que o comportamento social e sexual se dá a partir de sequências ritualizadas de hábitos e de prescrições e normas coletivas que classificam "o permitido" e "o proibido" em termos sexuais.

No segundo campo de pesquisa, de um conjunto de nove casais, quatro pares formados por homens soropositivos e mulheres soronegativas afirmam utilizar preservativo no intercurso vaginal, enquanto que em cinco casais formados por mulheres soropositivas e homens soronegativos, apenas um refere o uso da camisinha. Se olhado como resultado em si, este dado pode levar a uma análise simplista: as mulheres soropositivas, em situação de casal, apresentam baixo uso do preservativo. Mas, se isto é verdade para os dados desta pesquisa, interessa-nos perguntar: quais as razões para este comportamento?

A maior parte dos homens entrevistados acha que suas mulheres não transmitirão o HIV. Numa "redução analógica" das informações fornecidas pelo serviço de saúde (BOLTANSKI, 1988), afirmam taxativamente que "homem não pega de mulher". Outros autores também têm mostrado que "a relação da conjugalidade está marcada, especialmente sob a ótica masculina, pela ideia de limpeza: a esposa é - e deve ser sempre - limpa" (LEAL; KNAUTH, 2006). Em nossa análise, esta crença se relaciona à avaliação que os homens fazem sobre si mesmos e sobre os corpos masculinos e femininos. Legitimam sua atitude de recusa à prevenção com informações científicas, traduzidas e reinterpretadas à luz da experiência cotidiana. Além disso, a suspensão do uso do preservativo sugerida pelos homens também é justificada a partir do desejo de "sentir a carne e a pele" da parceira. Embora com medo da possibilidade de transmitir o HIV ao homem, esta prática é aceita (não sem tensão e negociação) pelas mulheres, em nome do relacionamento que subsume o indivíduo à lógica do casal. Esta é uma discussão que merece mais e posteriores reflexões. Até que ponto, por exemplo, seria fecundo refletir sobre este dado a partir da discussão empreendida por Pierre Bourdieu sobre violência simbólica? Penso, mais exatamente, sobre as vantagens e limites de refletirmos acerca da doce e sutil dominação que se trava no interior dos relacionamentos intergêneros, que ganha contornos mais dramáticos em alguns contextos sociais. De outra forma, autores como Bajos e Marquet (2000) também demonstram que o comportamento sexual e a conduta preventiva de homens e mulheres estão vinculados às relações de poder que se dão na interação entre o casal.

Algumas observações podem ser feitas em relação aos gêneros dos entrevistados. Independentemente da sua sorologia, as mulheres com frequência descrevem sentimentos como "medo", "receio" e "responsabilidade", seja em relação à transmissão para o parceiro soronegativo, seja quanto à possibilidade de adquirir o vírus do parceiro positivo. Ao fim da relação sexual, algumas mulheres observam o preservativo para certificar-se de sua integridade, sugerindo que o medo da transmissão está presente no ato. No entanto, em geral os homens dizem não temer a infecção. Portanto, é possível afirmar que o medo se constrói socialmente enquanto um sentimento feminino. Nos dois campos de pesquisa, apenas dois homens negativos não corroboram esta hipótese: um dos homens, com elevado capital social, relatou temor em infectar-se e mostrou-se altamente favorável ao discurso da medicalização da sexualidade, chegando inclusive a perguntar ao infectologista de sua parceira de forma pormenorizada que práticas seriam as mais seguras para evitar a transmissão/soroconversão. Outro homem, este de segmento popular, explicou que não deveria infectar-se pois não poderia morrer; caso isto acontecesse, não haveria ninguém para cuidar do filho do casal. O confronto desses dados sugere-nos a importância de considerar diferentes trajetórias, biografias e estilos de vida na análise dos comportamentos face à prevenção do HIV/Aids.

Repertórios modificados: as práticas sexuais

Com a soropositividade, os roteiros sexuais dos casais se alteram. Todos os entrevistados, homens e mulheres, relatam preferência pela realização de sexo sem preservativo. Não utilizavam o insumo antes do diagnóstico da soropositividade e receberam orientações para usá-lo como forma de prevenção. Alguns dizem ter se acostumado com o imperativo, mas a maioria declara certo desconforto - especialmente os homens. "Sentir a pele" é uma das expressões masculinas referidas para explicar o fato de não gostar dos preservativos.

Alguns casais se consideram mais "contidos" e "reservados" sexualmente a partir da notícia da soropositividade. Os encontros sexuais se tornam mais escassos e esporádicos. Para alguns, o sexo passa a ser complementado/substituído pelos sentimentos de "afetividade" e "companhia". No entanto, a diminuição da frequência sexual é elemento de vergonha masculina. A declaração sobre a frequência das relações sexuais tende a ser diferente segundo homens e mulheres: nas entrevistas eles referem um número maior de coitos que elas. Alguns entrevistados dizem que o ato sexual passa a ser realizado mais rapidamente após o diagnóstico de soropositividade. A abolição de "preliminares" foi referida, pois para alguns estas práticas seriam consideradas "arriscadas".10 10 Apesar de o termo "preliminares" ser utilizado no senso comum, não possui o mesmo significado nem abrange as mesmas práticas sexuais para todos os casais. Pode representar, por exemplo, o contato entre os genitais - situação mais citada pelos homens - ou entre genitálias e outras partes do corpo, troca de beijos, mordidas e contato com certos locais do corpo, como boca, pescoço, orelha, nuca, pés (relatos majoritariamente femininos). As mulheres mencionam a expressão de carinho e afeto junto às práticas que levam à penetração, o que não é frequente entre os depoimentos masculinos. Algumas mulheres soronegativas mencionaram a perda de lubrificação quando o homem demora a alcançar o orgasmo. Esses pontos sugerem uma certa apreensão no contato sexual e sugerem ainda que o tempo pode ser pensado como uma categoria de análise, pois a curta duração do ato sexual é imaginada e usada como um método caseiro de prevenção. Dito de outra forma, encontros sexuais ligeiros tenderiam, na concepção dos casais, a um potencial menos eficaz de transmissão sexual do HIV.

Os dados sobre as práticas sexuais permitem refletir, em parte, sobre a cultura sexual dos grupos sociais pesquisados. Quando inquiridos sobre suas atividades sexuais mais recorrentes, os casais citam quatro tipos de contatos sexuais, sobre os quais é possível refletir em termos da relação entre práticas e representações: beijo na boca, penetração vaginal, coito anal e sexo oral. O beijo na boca é um ato que se constitui num tema capaz de provocar confusão entre os casais, em consequência da mensagem pouco elucidativa veiculada pela Saúde Pública. A informação oficial "beijos não transmitem o HIV" é considerada vaga e sucinta: não abrange todas as formas de beijar. O comunicado oficial de que "as substâncias da saliva neutralizam o HIV" contrasta com informações recebidas nos serviços de saúde, que alertam para cuidados com sangramentos na gengiva e ferimentos na boca, alimentando, inclusive, o imaginário popular: muitos casais consideram que beijos muito longos e demorados, com troca abundante de saliva, não devem ser trocados.

A penetração vaginal é relatada como a prática preferida e mais frequentemente realizada. Como foi mencionado anteriormente, muitas vezes este ato é realizado sem preservativo entre casais sorodiscordantes. Alguns pares formados por homens soropositivos que relatam não usar preservativo praticam o "coito interrompido" como forma de minimizar a possibilidade de transmissão do HIV à parceira e, como descrito em um caso, esta prática também permite que o esperma seja visto sobre o corpo da mulher. Em casais nos quais a mulher é soropositiva, a masturbação masculina foi citada algumas vezes como meio de alcançar o orgasmo sem preservativo. Há, pois, uma complexa relação entre a percepção dos aspectos sensoriais e a formulação e/ou, melhor dizendo, conformação, das representações sociais.

Confunde-se, às vezes, a decisão de abolir determinada prática pela exposição ao risco ou por não ser ela muito apreciada. Este é o caso, por exemplo, do sexo anal, relatado como objeto de desejo por muitos homens e pouco apreciado pelas mulheres. Algumas mulheres se acham "pouco liberadas" e há outras que cedem, dada a "insistência masculina", "apenas para agradar ao homem". Segundo os entrevistados, no serviço de saúde também é explicado que o coito anal é uma prática altamente arriscada. Ao fim e ao cabo, este é o tipo de interação sexual menos praticado pelos casais. Entre os casais praticantes, apenas um é conformado por homem soropositivo e mulher negativa, o que sugere que o sexo anal é ainda mais temido quando o homem é o parceiro positivo do par. Portanto, o HIV acaba sendo uma justificativa feminina legítima para não exercer uma prática pouco apreciada e sob a qual se constroem muitos tabus.

Diferentemente do coito anal, o sexo oral é apreciado tanto por homens quanto por mulheres. Apesar disso, é citado pela maioria dos casais como prática perigosa e é evitado porque os casais conferem ao ato uma crença de grande transmissibilidade do vírus. Para a maioria dos casais pertencentes às "camadas populares", o contato da boca com os órgãos genitais - considerados "impuros" - parece ser mais arriscado do que a aproximação entre genitais femininos e masculinos no sexo vaginal. Este é outro ponto que não encontra correlação com o discurso propagado pela Saúde Pública, que afirma inclusive não haver transmissão documentada por esta via de exposição. As representações sociais incidem sobre os perigos do ato de tocar com a boca partes consideradas impuras (DOUGLAS, 1976). Então, embora apreciado, o sexo oral não se constitui como uma prática recíproca e simétrica para os casais. O sexo oral é realizado pelos parceiros positivos em direção aos negativos mas apenas eventualmente recebido pelas pessoas soropositivas. Estratégias de proteção durante o sexo oral ensinadas pelas mensagens de prevenção - camisinha ou PVC - não são adotadas, pois revestir os órgãos sexuais é engraçado aos olhos dos casais, que, ainda, rejeitam o sabor e a textura do material, em detrimento do paladar e do contato com os órgãos genitais.

Considerações finais

Este artigo procurou trazer algumas questões sociológicas relacionadas ao campo da sexualidade e do HIV/Aids. A primeira conclusão diz respeito ao papel crucial que o gênero desempenha frente à interação sexual e à prevenção.. A descrição da rotina sexual possibilita pistas para entender um complexo quadro de normas e valores sobre sexualidade e doença desconsiderado pelas mensagens tradicionais de prevenção. Estas falam vagamente de sexualidade sem abordar as práticas sexuais e seus significados para os parceiros. A gestão do risco sexual não significa uma simples introdução do preservativo nos encontros sexuais, como talvez imaginem as políticas de prevenção. Esta "negociação" entre desejos e práticas pode resultar em diferentes estratégias e pode ter vários outros significados, como um uso irregular do condom, ou a adoção de outras formas cotidianas de minimizar o risco da transmissão do HIV. Esta gestão do risco sexual leva em conta aspectos de gênero, de conjugalidade, do processo de internalização da doença e outros fatores.

Como discutido no texto, roteiros sexuais modificam-se, de acordo com vários fatores. O evento da Aids não é o único a produzir mudanças nos repertórios sexuais dos indivíduos, à medida que, como mostra Bozon (2001 e 2004), o casal passa por diferentes fases do ciclo conjugal e a dinâmica da relação (sexual, inclusive) se modifica em cada uma delas. Outra mudança a ser mencionada é aquela proporcionada pela conversão religiosa resultante do processo de aceitação da doença, responsável pela abolição de algumas práticas (como sexo oral e anal) de um repertório mais amplo de práticas sexuais. Ao lado dessas, pode haver outras explicações, a depender dos contextos sociocultural e local em questão.

A contabilidade sexual parece estar no centro da construção diária dos relacionamentos afetivo-sexuais de um modo geral. Ainda que se demonstre a diminuição da atividade física e sexual em "casais estabilizados" (BOZON, 2004), também é igualmente verdade uma certa imposição e obrigatoriedade do sexo nas relações ditas estáveis. Deste modo, a atividade sexual passa a ser uma espécie de termômetro e mantenedor dos vínculos afetivo-sexuais (BÉJIN, 1987). No entanto, para casais sorodiscordantes, o sentimento do amor é construído, formado, muitas vezes transformado e ampliado num sentido mais lato que as experiências amorosas cotidianas tradicionais. Agregam-se sentimentos descritos como "cuidado", "apoio", "solidariedade" e "responsabilidade". Tais noções se somam (e muitas vezes substituem) as configurações afetivo-amorosas configuradas e moldadas antes do diagnóstico.

A análise dos dados demonstra que, ao contrário do que se poderia supor, a mulher soropositiva inserida numa relação estável não é um sujeito social desprestigiado. Embora as narrativas femininas enfatizem uma dificuldade em obter parceiros sexuais pelo estigma do potencial "sexo perigoso" a partir do diagnóstico da soropositividade, na relação conjugal este perigo é atenuado ou apagado. Seus parceiros declaram que "não têm medo de nada" e demandam a suas mulheres a prática de sexo sem preservativo, pois conferem ao sexo sem preservativo um significado supremo de intimidade e vinculo conjugal e consideram que "homem não pega Aids de mulher". Ao contrário, as mulheres, tanto soronegativas quanto soropositivas, são as que mais revelam temer a contaminação e a possibilidade de transmitir o HIV ao seu parceiro, reafirmando o aspecto do cuidado com o outro como uma atribuição feminina.

Os dados revelaram que o exercício da sexualidade é objeto de exame por parte das instâncias de saúde e da família, evidenciando uma tutela em torno da sexualidade por terceiros fora do âmbito conjugal, e tornando público um evento privado. A doença é capaz de promover mecanismos de controle ao tornar necessária a solicitação de declarações sobre as atividades sexuais. Na reorganização biográfica dos casais sorodiscordantes, médicos, psicólogos, outros profissionais de saúde passam a desempenhar, aos olhos dos casais, um papel de "fiscalização" da vida cotidiana. Os entrevistados por vezes percebem esta intervenção como invasiva, apesar de insuficiente para esclarecer dúvidas "sobre o que pode ou não ser feito". Os soropositivos permanecem com dúvidas, mas paradoxalmente referem receio de conversar explicitamente com os profissionais de saúde sobre seus desejos e suas práticas.

A sexualidade e as práticas sexuais são, em grande medida, modeladas culturalmente, apresentando-se como hábitos, prescrições e normas coletivas que classificam o permitido e o proibido (e, muitas vezes, podem não coincidir com as lógicas racionais e biomédicas de prevenção).

Notas

Recebido em: 10/01/2009.

Aprovado em: 23/03/2009.

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  • 1
    Agradecimentos especiais são dirigidos à Professora Dra. Maria Luiza Heilborn, que me orientou durante o doutorado; aos professores Sérgio Carrara, Jane Russo, Veriano Terto, Daniela Knauth e Laura Moutinho, pelos frutíferos diálogos; e aos entrevistados, que compartilharam comigo suas histórias. Este artigo é uma versão revisada da apresentação proferida no GT "Sexualidade, Corpo e Gênero" do 32º Encontro Anual da ANPOCS, em outubro de 2008, ocasião em que me beneficiei dos comentários da professora Adriana Vianna, a quem também agradeço.
  • 2
    Utilizo o termo "casais sorodiscordantes" mais ou menos como fez Salem com os "casais grávidos": como uma espécie de "experiência sintetizadora",
    3 3 Os autores apoiam-se na ideia desenvolvida por Jonathan Mann, a respeito das "dezenas, talvez centenas, de epidemias ocorrendo em paralelo, acometendo segmentos diversos da sociedade com padrões de disseminação e velocidades variadas, dependentes de uma série de fatores" (PARKER; CAMARGO JR., 2000). um tipo ideal weberiano onde cabem experiências singulares de sujeitos inseridos em diferentes formas de relacionamento ou arranjos conjugais, em tempos (cronológico e subjetivo) distintos.
  • 3
    Os autores apoiam-se na ideia desenvolvida por Jonathan Mann, a respeito das "dezenas, talvez centenas, de epidemias ocorrendo em paralelo, acometendo segmentos diversos da sociedade com padrões de disseminação e velocidades variadas, dependentes de uma série de fatores" (PARKER; CAMARGO JR., 2000).
  • 4
    Nessa perspectiva, Rogers e colaboradores (1998) conduziram uma pesquisa sobre a notificação de parceiros de usuários de drogas injetáveis infectados por HIV, com a finalidade de desenvolver intervenções efetivas para essa população na cidade de Nova Iorque. Williams e colaboradores examinaram o uso de uma substância na terapia antirretroviral para avaliar a possibilidade de soroconversão de casais com sorologias diferentes para o HIV. Kippax e colaboradores (2003), a partir de um estudo de caso-controle numa coorte de homens gays de Sydney, valem-se de variáveis demográficas, contextuais e de conhecimento, para discutir a incidência de soroconversão naquela população.
  • 5
    A submissão frequente a exames de rotina pela medicalização da sexualidade e a recomendação expressa do uso regular de preservativos dão margem a outras discussões, que enfatizam os cuidados em situação conjugal, e que desenvolvi em minha tese de doutorado (MAKSUD, 2007).
  • 6
    Dado o limite de espaço, optei por proceder a uma redação que abordasse os significados sobre as práticas sexuais sem ilustrar o texto com as falas propriamente ditas, optando, portanto, por uma estratégia de generalização que certamente implica perda de ricos detalhes da fala etnográfica.
  • 7
    Para uma discussão acerca da conjugalidade e heterogamia, consultar Moutinho (2003) e Ortner e Whitehead (1981).
  • 8
    O trabalho de campo foi realizado com pacientes (e seus parceiros) do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas/FIOCRUZ, após aprovação do Comitê de Ética de Pesquisa local. Agradecimentos a toda a equipe são dirigidos em nome dos Drs. Valdileia Veloso, Beatriz Grinstejn e Nilo Fernandes.
  • 9
    O contato progressivo com o sistema de saúde é acompanhado por um complexo sistema de sugestões à pessoa soropositiva, que conforma, pouco a pouco, uma
    carreira moral soropositiva (GOFFMAN, 2005). Este processo comporta uma intensa articulação entre vida pública e privada, com mudanças subjetivas que resultam numa reorganização biográfica. Esta passagem contém a experiência do adoecimento e do sofrimento. Os serviços de saúde passam a desempenhar papel relevante na vida do sujeito. Sua rotina transforma-se com as consultas e exames, uso de medicamentos e, por fim, com a recomendação expressa de prática de "sexo seguro". Estas reformulações, no entanto, não adquirem um estatuto identitário, pois, para muitos entrevistados, a condição soropositiva não se torna pública.
  • 10
    Apesar de o termo "preliminares" ser utilizado no senso comum, não possui o mesmo significado nem abrange as mesmas práticas sexuais para todos os casais. Pode representar, por exemplo, o contato entre os genitais - situação mais citada pelos homens - ou entre genitálias e outras partes do corpo, troca de beijos, mordidas e contato com certos locais do corpo, como boca, pescoço, orelha, nuca, pés (relatos majoritariamente femininos). As mulheres mencionam a expressão de carinho e afeto junto às práticas que levam à penetração, o que não é frequente entre os depoimentos masculinos. Algumas mulheres soronegativas mencionaram a perda de lubrificação quando o homem demora a alcançar o orgasmo.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Nov 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Recebido
      10 Jan 2009
    • Aceito
      23 Mar 2009
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