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Mulheres guerreiras e mães especiais? Reflexões sobre gênero, cuidado e maternidades no contexto de pós-epidemia de zika no Brasil

Strong women and special mothers? Reflections on gender, care and motherhood in the context of post-zika epidemic in Brazil

Resumo

O objetivo deste ensaio é ampliar o debate acerca das maternidades e do cuidado promovido por mulheres-mães de crianças com a síndrome congênita da zika (SCZ), no contexto atual de pós-epidemia no Brasil, através de uma análise teórica e política, mediada pelo diálogo com a literatura científica na área das Ciências Sociais e Humanas. A partir de um enfoque interseccional, que considera vulnerabilidades e desigualdades sociais, raciais e de gênero, discute-se como essas relações influenciam na organização do cuidado e na construção da maternidade dessas mulheres. Constatamos que as mulheres são as principais cuidadoras da criança, resultado de uma ideologia de maternidade, situada na divisão sexual e social do trabalho no âmbito de uma sociedade capitalista, que impõe responsabilidades e deveres diferentes para mulheres e homens no cuidado e no cuidar, reforçando opressões e explorações. No contexto da infecção congênita, da precarização da vida e do desmantelamento de políticas públicas, há uma sobrecarga de responsabilidades sobre as mães-guerreiras-especiais que podem comprometer seu bem-estar físico e mental, que tanto agrava a situação de desproteção social em que essas mulheres se encontram quanto as impulsionam em busca de coletivos que as fortaleçam como sujeitos políticos e de direitos.

Palavras-chave:
maternidade; cuidado; gênero; zika vírus; interseccionalidade

Abstract

This essay aims to expand the debate about maternity and care provided by women-mothers of children with congenital Zika syndrome (SCZ), in the current post-epidemic context in Brazil, through a theoretical and political analysis, mediated through dialogue with scientific literature in the area of Social and Human Sciences. From an intersectional approach, which considers social, racial and gender vulnerabilities and inequalities, it discusses how these relationships influence the organization of care and the construction of motherhood for these women. We note that women are the main caregivers of the child, the result of an ideology of motherhood, situated in the sexual and social division of labor within a capitalist society, which imposes different responsibilities and duties for women and men in caring, reinforcing oppression and exploitation. In the context of congenital infection, the precariousness of life and the dismantling of public policies, there is an overload of responsibilities on special warrior-mothers who can compromise their physical and mental well-being, which so much aggravates the situation of social unprotection in which these women meet when they push them in search of collectives that strengthen them as political and rights subjects.

Keywords:
gender; care; motherhood; zika virus; intersectionality

Introdução

No atual cenário brasileiro, cinco anos após o surto de zika, torna-se essencial analisar de que modo as crianças e suas famílias afetadas pela infecção congênita, em especial as mulheres-mães, estão convivendo com essa problemática em seu cotidiano social e familiar, e de que forma suas demandas estão sendo atendidas. Os casos de zika continuam, embora com frequência menor, desvelando alguns problemas estruturais do país e da vulnerabilidade social, racial e de gênero da população brasileira, reproduzindo estratégias antigas e ineficazes no combate ao mosquito, sem mudanças nas políticas públicas essenciais para o suporte da população.

De acordo com estudos sobre o impacto do vírus da zika na vida das famílias acometidas (MENEZES et al., 2019 OLIVEIRA et al., 2019; FREITAS et al., 2019; HAMAD; SOUZA, 2019; DUARTE et al., 2019DUARTE, J. dos S. et al. Necessidades de crianças com síndrome congênita pelo Zika vírus no contexto domiciliar. Cadernos de saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 27, n. 3, p. 249-256, 2019.; ALVES; SAFATLE, 2019ALVES, R. L. da C.; SAFATLE, Y. B. dos R. Mães de “micro”: perspectivas e desdobramentos sobre cuidado no contexto da síndrome congênita do zika vírus (sczv) em Recife-PE. Áltera, João Pessoa, v. 1, n. 8, p. 115-145, 2019.; SÁ et al., 2020; VALE; ALVES; CARVALHO, 2020), as principais cuidadoras das crianças com a síndrome congênita são predominantemente as mães, corroborando outros estudos sobre o cuidado de crianças com múltiplas deficiências (NEVES; CABRAL, 2008; DANTAS et al., 2019DANTAS, K. O et al. Repercussões do nascimento e do cuidado de crianças com deficiência múltipla na família: uma metassíntese qualitativa. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro , v. 35, n. 6, e00157918, 2019.), em que historicamente a mulher é responsável pelo cuidado. Os estudos são enfáticos ao afirmarem o caráter impactante da SCZ na vida dessas mulheres, ao demonstrarem as exigências do cuidar de um filho com necessidades especiais de saúde e uma rotina exaustiva, com constantes visitas a hospitais, médicos e outras terapias, podendo gerar repercussões negativas na saúde física e mental da mulher, bem como em suas relações sociais e familiares.

Nesse contexto, também chama atenção a ausência de informação e orientação sobre o papel dos homens na prevenção da doença (HUMAN RIGHTS WATCH, 2017), reforçando a ideia de que as mulheres são as únicas ou principais responsáveis pela prevenção da zika durante a gravidez. Soma-se a isso a pouca visibilidade dos homens no cuidado, na criação dos filhos e na divisão das responsabilidades domésticas, o que aponta a necessidade de discutir gênero e formas de incorporar esse pai também como referência de cuidado, para além de provedor da família (RIBEIRO; GOMES; MOREIRA, 2015).

Pinheiro (2018), em estudo sobre as representações que a maternidade assume em mulheres no contexto da SCZ, em Pernambuco, aponta três caminhos em que essas “maternidades” (p. 139) podem ser entendidas, as quais serão retomadas nas reflexões do ensaio proposto: 1) na forma de dom e benção divina; 2) ligada à questão do cuidado como característica inerente à maternidade, do “mãe é quem cuida” (p. 145); e 3) como discurso de legitimidade da dedicação do cuidado integral a seus filhos. Nesse sentido, Finamori e Ferreira (2018) nos chamam atenção sobre a importância de questionarmos a reconfiguração do cuidado, que entrelaça obrigações associadas às noções de família e maternidade às questões de gênero, raça e trabalho.

Para tal questionamento sobre sua reconfiguração, o cuidado será aqui concebido como transversal e multidimensional, compartilhando equivalência com o termo “care” utilizado na literatura nacional e internacional (GUIMARÃES; HIRATA; SUGITA, 2011). As autoras apontam que o termo em inglês é polissêmico e, para a realidade brasileira, a palavra “cuidado” é mais identificada para designar uma atitude e o verbo “cuidar” traduziria melhor o sentido do care, assumindo formas no Brasil, como: “tomar conta da casa”, “tomar conta das crianças” ou “cuidar do marido” (p. 153). Logo, o cuidado pode ser entendido tanto como um conjunto de práticas, atitudes e valores relacionados com o afeto, o amor e a compaixão envolvidos nas relações intersubjetivas (HIRATA; DEBERT, 2016), quanto por um trabalho doméstico feminino, não valorizado e não reconhecido, podendo ser remunerado ou não (HIRATA, 2014).

Este ensaio faz parte das reflexões iniciais de uma pesquisa de doutorado, que visa compreender a experiência de maternidade e cuidado de mulheres-mães-cuidadoras no contexto da SCZ. Propõe-se promover a ampliação do debate, a partir de um enfoque interseccional, que considera vulnerabilidades e desigualdades sociais, raciais e de gênero no processo de determinação social em saúde, através de reflexões críticas e diálogo com os achados sobre a epidemia de zika realizados por levantamento bibliográfico da literatura científica, composto por artigos publicados entre os anos 2016 e 2020, na área das ciências sociais e humanas. Partimos de três questões norteadoras, a saber: 1) a perspectiva interseccional de gênero, classe e raça na abordagem do problema do ZIKV: o que temos?; 2) quais são as experiências de maternidade vivenciadas pelas mulheres que tiveram seus filhos com a SCZ?; e 3) quais seriam os impactos sobre a dinâmica familiar de ter um filho com uma síndrome congênita e as demandas em termos de políticas públicas? Assim, considerando o objetivo da discussão proposta e os resultados da literatura consultada, o ensaio está organizado em três categorias temáticas, as quais serão apresentadas e discutidas a seguir.1 1 Este ensaio compõe a pesquisa de doutorado de Fernanda Monteiro Dias, no Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC/UFRJ), com bolsa de pesquisa CAPES, cujo apoio agradecemos.

A perspectiva de gênero nas relações sociais e nas políticas públicas frente à SCZ: interseccionalidades e vulnerabilidades

Para situar historicamente a perspectiva crítica de gênero, com a qual os fatos e argumentos aqui desenvolvidos se alinham, vale resgatar brevemente o modo como, a partir do movimento de mulheres, distintos campos de lutas e práticas na produção de conhecimento foram se articulando até que a elaboração conceitual da categoria gênero ganhasse visibilidade e status acadêmico. Nesse caminho, nos planos epistemológico e pedagógico, conforme destacam Berger et al (2014BERGER, S. M. D. et al. Formação de agentes comunitárias de saúde para o enfrentamento da violência de gênero: contribuições da Educação Popular e da pedagogia feminista. Interface. Botucatu, v. 18, p. 1241-1253, 2014.), a elaboração conceitual e política da categoria gênero partiu da reflexão coletiva de mulheres sobre seus corpos, vivências e emoções. Essa trajetória levou as mulheres a questionarem a própria racionalidade dicotômica e androcêntrica do conhecimento ocidental, que separa razão e emoção, sujeito e objeto, cultura e natureza. Segundo Giffin (1995, p. 29), “nos estudos de gênero, o corpo foi identificado como âncora conceitual da definição sociocientífica da mulher” e, portanto:

O conceito de gênero, fruto de uma década de investigações, expressa a rejeição do destino biológico anunciado no discurso sociocientífico dominante. Dando ênfase à construção social de feminino/masculino, e à dimensão de poder nas relações entre homens e mulheres, o desenvolvimento deste conceito acompanhou, historicamente, a simultânea recusa ideológica ao papel de reprodutora, confinada à esfera familiar (GIFFIN, 1995, p. 30).

Conforme aponta Louro (1997), ao se discutir gênero enfatiza-se a importância da construção social e histórica sobre as características biológicas de cada sexo. A autora pretende explicar que as desigualdades entre homens e mulheres precisam ser entendidas não nas suas diferenças biológicas, mas na sua história, nas condições de acesso aos recursos da sociedade, nas formas de socialização dos papéis sexuais e na influência cultural e social sobre o indivíduo. Diante disso, podemos entender que tanto a identidade de homem quanto a de mulher é construída socialmente e independe do sexo ou sexualidade, dependendo mais de suas relações cotidianas e dos papéis que são atribuídos a ambos os gêneros (LOURO, 1997).

De acordo com Birolli (2018), as mulheres também são diferentemente marcadas e oneradas por essa divisão de papéis sociais de acordo com sua classe e raça. Para Carneiro (2016CARNEIRO, S. Mulheres em movimento. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. O. (Orgs.). Problemas de Gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 149-168.), o emergente movimento de mulheres negras no Brasil tem provocado a discussão sobre outras formas de opressão que foram inicialmente não problematizadas pelo movimento feminista, colocando em cena uma perspectiva que “emerge da condição específica de ser mulher, negra e, em geral, pobre” (CARNEIRO, 2016CARNEIRO, S. Mulheres em movimento. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. O. (Orgs.). Problemas de Gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 149-168., p. 150). Diante disto, torna-se essencial discutir gênero a partir de uma dimensão transversal entre raça e classe e a complexidade das desigualdades sociais, em que gênero por si só não determina a condição de vulnerabilidade da mulher (GIFFIN, 2002). Neste sentido, a presente discussão leva em consideração as especificidades que definem o ser mulher em diferentes raças, classes e condições de vida, sob um enfoque interseccional que, para além do reconhecimento dos múltiplos sistemas de opressão, dominação e exploração, busca por meio dele entender como se produzem e reproduzem as desigualdades sociais (CRENSHAW, 2002CRENSHAW, K. Documento para o encontro de especialistas em aspectos da discriminação racial relativos ao gênero. Revista de Estudos Feministas, Florianópolis, v. 7, n. 12, p. 171-88, 2002.; HIRATA, 2014).

A zika tornou-se um “problema de gênero” (NUNES; PIMENTA, 2016, p. 29) ao ter sua comprovada associação com a infecção congênita nos bebês, colocando as mulheres gestantes ou em idade fértil como população vulnerável e trazendo à tona questões como a saúde e os direitos reprodutivos das mulheres. Autoridades públicas chegaram a aconselhar que as mulheres não engravidassem durante a epidemia (ESTADÃO, 2015) e, em seu ápice, o então ministro da Saúde reforçou a sugestão com a seguinte frase: “Sexo é para amador, gravidez é para profissional” (EXTRA, 2015), demonstrando a responsabilização das mulheres por órgãos públicos que deveriam estar atuando para protegê-las.

Aguiar e Araújo (2016AGUIAR, R.; ARAUJO, I. S. A mídia em meio às “emergências” do vírus zika: questões para o campo da comunicação e saúde. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação e Inovação em Saúde, v. 10, n. 1, p. 1-15, 2016.) discutem as questões da zika no campo da comunicação e saúde e dão destaque à declaração de uma gestante de Pernambuco, publicada na primeira página de um grande jornal, sobre a causa da microcefalia em seu bebê - “Foi alguma coisa que eu fiz? Algo que eu comi e fez mal?” - parecendo apostar no desconhecimento da mãe, em sua condição de “nordestina e pobre” (p. 11) como principal justificativa para a ocorrência da SCZ. Essa declaração vai de encontro à discussão sobre as práticas médicas recorrentes, de responsabilização das mulheres, eximindo a responsabilidade do Estado e retirando outros fatores determinantes nesse processo, com o apoio da mídia que endossa e amplifica tal prática. De acordo com Costa (2016COSTA, A. M. A determinação social da microcefalia. Revista desafios do desenvolvimento, ano 13, n. 87, 2016. Disponível em: http://desafios.ipea.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=3267&catid=29&Itemid=34. Acesso em: 25 out. 2019.
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), todo o discurso oficial sobre a doença está centrado no âmbito da reprodução biológica, no campo das práticas biomédicas, o que é reiterado pelas referências aqui levantadas (AGUIAR; ARAÚJO, 2016AGUIAR, R.; ARAUJO, I. S. A mídia em meio às “emergências” do vírus zika: questões para o campo da comunicação e saúde. Revista Eletrônica de Comunicação, Informação e Inovação em Saúde, v. 10, n. 1, p. 1-15, 2016.; DINIZ; BRITO, 2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48.) e confirmada pelas campanhas de combate ao mosquito organizadas pelo Ministério da Saúde.

Em março de 2016, o Ministério da Saúde publicou suas diretrizes relacionadas ao vírus da zika através do Protocolo de Atenção à Saúde e Resposta a Ocorrência de Microcefalia (BRASIL, 2016). Segundo Baum et al. (2016BAUM, P. et al. Garantindo uma resposta do setor de saúde com foco nos direitos das mulheres afetadas pelo vírus Zika. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 32, n. 5, e00064416, 2016.), embora o protocolo forneça recomendações para cuidados nos contextos de planejamento familiar, por meio do acompanhamento pré-natal e do recém-nascido, ele falha em atender de maneira adequada os desafios que as mulheres que vivem nas áreas mais afetadas pela epidemia enfrentam para obter e usar métodos contraceptivos. Além disso, também ignora que o aborto inseguro é uma realidade da saúde pública no Brasil e que provavelmente se agravará tendo em vista as consequências da zika. Para os autores, o protocolo deve reconhecer as restrições legais e socioeconômicas que afetam a saúde das mulheres e orientar os profissionais quanto à melhor maneira de auxiliá-las em um contexto de escolhas difíceis, além de merecer uma atualização.

Em tempos de zika, a carga imposta às mulheres pelo diagnóstico da infecção congênita de seus filhos evidencia injustiças e desigualdades sociais apontadas em dados epidemiológicos, na imprensa e nas declarações dos órgãos oficiais. Enquanto isso, as mulheres mais pobres e residentes nas áreas mais carentes no Brasil sofrem de forma mais acentuada as deficiências de recursos da saúde e das garantias de direitos, como bem discutido no artigo de Ventura e Camargo sobre direitos reprodutivos e aborto:

Se é verdade que o acesso à contracepção é precário e que o aborto é ilegal, também é verdade que as mulheres brancas e ricas ainda assim têm acesso a alternativas contraceptivas e a abortos seguros, enquanto às negras, pobres e periféricas são negados os recursos necessários para o exercício da autonomia reprodutiva. A epidemia de zika adiciona outra dimensão a esse contexto. As mesmas mulheres que têm menos recursos para controlar sua reprodução são as mais vulneráveis à epidemia. Áreas pobres e periféricas, com saneamento básico precário, concentram os casos de zika. Essas mesmas mulheres também dificilmente terão acesso aos recursos necessários para criar filhos com deficiências graves, como é o caso das crianças com microcefalia associada à zika. Se considerarmos que os direitos reprodutivos incluem não só o direito de não ter filhos, como também o direito de os ter, vemos mais uma vez como as várias desigualdades se combinam para gerar uma situação em que apenas um grupo de mulheres tem de fato a possibilidade de exercer seus direitos ao escolher ter e criar seus filhos (VENTURA; CAMARGO, 2016, p. 633).

Diniz e Brito (2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48.) também reconhecem que as mulheres são afetadas de maneiras diferentes pelos riscos do mosquito e pela transmissão sexual da zika e, por isso, o acesso aos métodos de planejamento familiar ou mesmo ao aborto seguro são estratégias de cuidado que, se não garantidas, deixam algumas pessoas mais suscetíveis ao adoecimento que outras.

Uma das grandes estudiosas sobre o assunto, a antropóloga Débora Diniz (2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48.) aponta o atravessamento de várias vulnerabilidades na vida das mulheres mais afetadas pela zika, que além de pouco escolarizadas e da pouca inserção no mundo do trabalho, precisam dar conta do cuidado de crianças com múltiplas necessidades que nem sempre têm a proteção do Estado. Em seu artigo “Vírus da zika e mulheres”, a antropóloga segue denunciando o esquecimento das mulheres pela biopolítica das doenças: "não podemos naturalizar esse fato; ao falar em casos e números, estamos ignorando histórias e sofrimentos, angústias e desamparos" (DINIZ, 2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48., p. 1).

A literatura reunida até aqui nos mostra que o acesso à informação, ao planejamento familiar e aos direitos reprodutivos são preceitos de saúde e direitos previstos pela Constituição, mas ofertados de maneira desigual. Neste sentido, é fundamental pensar que tipo de políticas públicas têm sido priorizadas diante deste cenário, e se tais políticas estão pensadas de modo a reduzir as vulnerabilidades dessa população. Por outro lado, cabe ainda apontar alguns limites na defesa dos direitos reprodutivos, de todas as diferentes mulheres, dentro do próprio movimento feminista hegemônico. Tendo esse movimento o êxito de ter revelado e rejeitado a noção de mulher como restrita à condição de reprodutora e do lar, acabou por deixar em segundo plano, por algum tempo (não sem resistência de um grupo minoritário), a análise das condições concretas para que muitas delas exercessem a maternidade (GIFFIN, 2002), o que se torna emblemático no caso das mulheres afetadas pela zika.

A demanda por informações e conhecimento por parte das mulheres atingidas pelo vírus é ilustrada por Diniz e Brito (2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48.) a partir de uma família que viveu a medicalização da gravidez e da recém-nascida com a síndrome congênita, que depende da mediação de diferentes poderes e saberes para que possam ser acessadas. Além desse fato, as autoras também reconhecem a vulnerabilidade dessas mulheres em relação à zika. Para as autoras, se considerarmos somente o vírus, todas estariam igualmente em risco de adoecer, mas somente algumas mulheres têm a vida assombrada pela epidemia: mulheres nordestinas, pobres, de regiões rurais em que há intensa circulação do mosquito, dependentes dos serviços públicos de saúde. Das crianças nascidas com a síndrome congênita no início da epidemia, 88% eram da Região Nordeste (DINIZ; BRITO, 2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48.).

As autoras nos alertam que a demanda por conhecimento de pessoas que são historicamente negligenciadas pelo Estado é mais do que um pedido de participação em um regime de poder específico; é uma demanda por reconhecimento de que os mais suscetíveis ao adoecimento pela epidemia são vidas já previamente precarizadas por amplos regimes de desigualdade, em que região, classe e gênero são alguns dos mais marcantes (DINIZ; BRITO, 2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48.). É preciso considerar as mulheres como sujeitos situados em meio a diferentes formas de desigualdades, que se combinam e condicionam o acesso à informação, à contracepção, ao aborto seguro, bem como as possibilidades de negociação do uso da contracepção com parceiros e a vulnerabilidade à violência sexual (VENTURA; CAMARGO, 2016).

A prerrogativa à saúde sexual e reprodutiva defende que todas as mulheres tenham o poder social, político e econômico, assim como o acesso aos recursos necessários e a informações, para viveram uma sexualidade segura e terem liberdade de escolher se querem ter filhos ou não. É importante destacar que a prática de aborto no Brasil é permitida somente em três situações: 1) risco materno; 2) quando a gestação for resultado de estupro; e 3) casos de anencefalia. Não há consenso moral atualmente sobre a questão do aborto no Brasil (BERNARDES; ARAUJO, 2018BERNARDES, L. C. G.; ARAUJO, T. C. Aborto e deficiência: percepção de pessoas com deficiência, gestores públicos e bioeticistas no contexto da epidemia de zika. Rev Bras Bioética, v. 13, n. e2, p. 1-17, 2018.). Os autores apontam que muitos ativistas dos direitos das pessoas com deficiência referem-se a esse tipo de aborto como a “nova eugenia” (p. 2), mas ao discutir a descriminalização no contexto de zika, Diniz (2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48.) sinaliza que o que está em cena é o sofrimento mental da mulher durante a gestação e que políticas como estas são também consideradas de inclusão e proteção social tanto da maternidade quanto da infância.

A antropóloga foi uma das responsáveis pela ação junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), há mais de três anos, para que mulheres afetadas pelo vírus pudessem interromper a gravidez caso essa lhe causasse sofrimento mental, entre outras demandas. A ação foi proposta pela Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos (ANADEP), com suporte técnico do Instituto Anis, a qual Diniz é uma das fundadoras, julgada no final de abril deste ano, durante a pandemia da Covid-19 e rejeitada por unanimidade (VIVAS; FALCÃO, 2020). A ação foi julgada frente a uma crise sanitária mundial e a força do negacionismo presente no Brasil, frente ao discurso em defesa “da família” e “da vida”.

A maternidade como uma missão feminina e o cuidado como um trabalho

Historicamente descrita como parte inseparável da natureza e do desejo feminino, o conceito de maternidade tem sido questionado como resultado das transformações ocorridas na vida das mulheres nas últimas décadas. Badinter (1985BADINTER, E. Um amor conquistado: o mito do amor materno. 5ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.) descreve o amor materno como um sentimento comum, que não é inato e nem inerente à natureza feminina e que vai depender de comportamentos socialmente definidos, variáveis de acordo com o período histórico e costumes da sociedade, uma vez que o interesse e a dedicação à criança não existiram da mesma forma em todas as épocas e em todos os meios sociais. Para a autora, o mito do amor materno como algo instintivo serviu para definir os papéis de homens e mulheres e, principalmente, demarcar um lugar exclusivo da mulher; para os homens o poder, o domínio do mundo do exterior e para as mulheres a casa, o cuidado com as crianças e o trabalho doméstico. Tal divisão sexual dos papéis sociais e no trabalho serviu ao interesse do Estado, baseado em um modelo de sociedade capitalista e patriarcal, reconhecida hoje pela literatura como divisão sexual do trabalho.

A divisão sexual do trabalho é a forma de divisão do trabalho decorrente das relações de sexo, historicamente adaptada a cada sociedade, que tem por características a destinação prioritária dos homens à esfera produtiva (trabalho assalariado com um valor social) e das mulheres à esfera reprodutiva (trabalho doméstico). É um conceito utilizado também para se falar do trabalho invisível e não valorizado realizado pelas mulheres, sendo que, na esfera doméstica, ele é ideologicamente reconhecido em nome da natureza, do amor e do dever materno (HIRATA; KERGOAT, 2007). As mulheres são oneradas pelo cotidiano de trabalho prestado gratuitamente em casa, do qual os homens são isentos (BIROLI, 2018BIROLI, F. Gênero e desigualdades: os limites da democracia no Brasil. 1.ed. São Paulo: Boitempo, 2018.). Para a autora, as percepções e representações que as mulheres têm de quem elas são e de seu papel na sociedade estão relacionadas a essa divisão de responsabilidades e papéis sociais.

A transição do modelo tradicional de maternidade, como a mulher definida exclusivamente como mãe, para um modelo contemporâneo, no qual a mulher passa a ter outras escolhas de vida, se deu com a inserção das mulheres no mercado de trabalho, sobretudo após a revolução industrial (SCAVONE, 2001). No entanto, a autora nos chama atenção que tal inserção foi marcada por grandes desigualdades sociais e sexuais, gerando um impacto na experiência de maternidade dessas mulheres que, ao mesmo tempo que começaram a ter acesso à educação formal e ao espaço público, mantiveram a responsabilidade do trabalho doméstico e da criação dos filhos, consequência das representações tradicionais de maternidade que ainda são percebidas na sociedade atual.

De acordo com Giffin (2002), a figura atual da mulher moderna e independente, que controla sua reprodução e suas escolhas, esconde o aprofundamento da dupla jornada e da exploração da força de trabalho feminina. A autora alerta sobre esse momento como uma “transição de gênero” (p. 105). Se antes o que caracterizava ser mulher era ser mãe e esposa, hoje as mulheres buscam sua autonomia, liberdade e identidade diante daquilo que também possam produzir e não apenas reproduzir, embora ainda seja esperado que elas sejam mães e tenham a responsabilidade na criação de seus filhos (GIFFIN, 2002).

Nesse contexto, podemos entender o que vem a ser o cuidado na perspectiva de trabalho realizado pelas mulheres no espaço doméstico e na criação dos filhos. De acordo com Kergoat (2016, p. 17), pode ser entendido como um trabalho que “abrange um conjunto de atividades materiais e de relações que consistem em oferecer uma resposta concreta à necessidade dos outros”, conceito trazido pela autora a partir da proposta dada pelo colóquio internacional “Teorias e práticas do cuidado”, realizado em Paris em 2013. O trabalho de cuidado, segundo a autora, pode ainda ser entendido como uma relação de serviço, apoio e assistência, pagos ou não, com implicação com a vida e o bem-estar do outro. Aponta que tanto o trabalho doméstico gratuito quanto o remunerado é considerado não qualificado, mal pago e não reconhecido, sendo historicamente ocupado pelas mulheres, pautado em sua naturalização como cuidadora.

De acordo com Biroli (2018BIROLI, F. Gênero e desigualdades: os limites da democracia no Brasil. 1.ed. São Paulo: Boitempo, 2018.), a literatura acerca do cuidado aponta que as transformações que ocorreram na vida das mulheres não foi acompanhada por uma oferta de serviços públicos e comunitários que pudessem amparar mães e crianças, sendo que a falta de acesso a creches ainda é o maior obstáculo para o retorno da mulher ao mercado de trabalho. Assim, o cuidado encontra-se em entre a autonomia da mulher e a criação dos filhos, sendo a maternidade um fator de tensão entre estes campos. A autora explica que a relação entre paternidade e trabalho remunerado não é vivenciada da mesma forma pelos homens, porque dos “pais se espera menos ou muito pouco no cotidiano da criação dos filhos” (BIROLI, 2018BIROLI, F. Gênero e desigualdades: os limites da democracia no Brasil. 1.ed. São Paulo: Boitempo, 2018., p. 107).

Desse mesmo modo, as mulheres vivenciam essa tensão no cuidado de acordo com sua classe socioeconômica, uma vez que as classes mais altas recorrem a escolas privadas de ensino integral, atividades complementares e/ou trabalhadoras para cuidar de seus filhos enquanto estão trabalhando. Para Biroli (2018BIROLI, F. Gênero e desigualdades: os limites da democracia no Brasil. 1.ed. São Paulo: Boitempo, 2018.), as mulheres das classes menos favorecidas vivenciam uma maternidade “mais coletiva e menos privatizada” (p. 110) em que parentes ou mulheres da própria comunidade assumem o cuidado da criança, podendo ser pago ou não. Giffin (2002) nomeia tal suporte entre famílias de baixa renda na América Latina como “rede de reciprocidade” (p. 105), para ela uma estratégia fundamental de sobrevivência dessas famílias na ausência de políticas públicas efetivas, mas que não resolve a situação, pois quanto maior a pobreza dessas famílias, maior é a necessidade dessas redes.

As diferentes maternidades, o cuidado e o cuidar: algumas ressignificações

O processo de tornar-se mãe envolve inúmeras adaptações na mulher, emocionais e físicas, iniciando-se na gestação. Tais transformações podem adquirir uma dimensão ainda mais difícil em um contexto de má formação congênita da criança, podendo gerar sobrecarga nessas mães, assim como sentimentos de culpa em relação à condição do filho, e grande impacto na vida dessas mulheres em suas relações interpessoais e dinâmica familiar (LINDE; SIQUEIRA, 2018; CARNEIRO; FLEISCHER, 2018CARNEIRO, R.; FLEISCHER, S. R. “Eu não esperava por isso. Foi um susto”: conceber, gestar e parir em tempos de Zika à luz das mulheres de Recife, PE, Brasil. Interface, Botucatu, v. 22, n. 66, p. 709-719, 2018.; WILLIAMSON, 2018; SCOTT et al., 2017 MOREIRA; MENDES; NASCIMENTO, 2018).

A SCZ é reconhecida como um conjunto de malformações e um amplo espectro de alterações apresentadas por bebês que tiveram mães infectadas pelo vírus durante a gestação, sendo a microcefalia somente uma das possíveis consequências. As crianças também podem ter o sistema nervoso central afetado, apresentando epilepsia, deficiências auditivas e visuais, prejuízo no desenvolvimento psicomotor, bem como efeitos negativos sobre ossos e articulações (BRASIL, 2016). Não há tratamento específico, mas ações de suporte que podem auxiliar em seu desenvolvimento, e como cada criança desenvolve complicações diferentes, o acompanhamento vai depender das funções que ficarem comprometidas. Como são crianças com múltiplas deficiências, elas necessitam de cuidados intensivos, em tempo integral e ao longo da vida, além de acompanhamento por uma equipe multiprofissional em que nem sempre os profissionais estarão juntos no mesmo serviço de saúde, implicando itinerários desgastantes na busca por tratamento (FLEISCHER, 2017; BULHÕES et al., 2020BULHÕES, C. de S. G. et al. Repercussões psíquicas em mães de crianças com síndrome congênita do zika Vírus. Esc. Anna Nery, Rio de Janeiro, v. 24, n. 2, e20190230, 2020.).

Entre as famílias entrevistadas pela Human Rights Watch (2017), a maioria das mulheres relatou não ter recebido informações ou apoio suficiente após o nascimento de seus filhos, sendo que algumas receberam a notícia da má formação pela primeira vez no momento do parto; a experiência que tiveram da forma como a equipe médica as tratou provocou um profundo impacto negativo em muitas delas. Essas mães relataram que os primeiros momentos com seus bebês foram marcados por uma enorme ansiedade, incerteza e dúvida, e muitas delas não receberam informações completas sobre o diagnóstico. A partir dessas experiências, apresenta-se mais enfaticamente o despreparo dos profissionais em relação às questões de saúde mental e emocional das mulheres, resultando em vivências de violência institucional ou obstétrica (HAMAD; SOUZA, 2020), entendida como uma forma grave de violação de direitos, geralmente relacionada a baixa qualidade e eficácia de serviços de saúde, mais específicos contra determinados grupos populacionais (D'OLIVEIRA; DINIZ; SCHRAIBER, 2002D’OLIVEIRA, A. F.; DINIZ, C. S. G.; SCHRAIBER, L. Violence against women in health-care institutions: an emerging problem. Lancet, v. 359, n. 11, p. 1681-1685, 2002.), reconhecidamente um problema de saúde pública (OMS, 2014) e subestimado no Brasil (LANSKY et al., 2019).

Destacamos o documento Apoio Psicossocial para mulheres grávidas e famílias com microcefalia e outras complicações neurológicas no contexto do Zika vírus, elaborado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2016, como importante marco para o reconhecimento da mulher como alvo de cuidados em saúde mental. O documento preconiza que “todos os provedores de saúde precisam de informações precisas ao proporcionar apoio a mulheres com infecção pelo zika vírus durante a gravidez” (p. 9), e reconhece que o apoio psicossocial a essas famílias se torna fundamental nesse momento. O documento estabelece um manual a ser seguido por equipes de saúde ou qualquer outro prestador de cuidados sobre comunicação de notícias, fortalecimento de suporte social e técnicas de manejo do estresse, mas pouco sabemos sobre o real alcance de tais orientações.

Fleischer (2017) narra em seu artigo sobre a experiência de uma jovem mulher do Recife acometida pela zika que teve seu filho com a síndrome congênita quando as informações sobre tal relação ainda eram inexistentes, trazendo algumas dificuldades vivenciadas pelas “mães de micro” (p. 98), definição feita pelas próprias mulheres do seu estudo. Conta que após ter voltado do parto no hospital, a jovem mãe não sabia o que havia com seu filho embora tenha escutado a palavra “microcefalia” sem grandes explicações; somente procurando e trocando telefone com outras mulheres, que encontrava pelas clínicas e hospitais, conseguiu saber o que de fato era a síndrome. A autora identifica nas falas dessas mães que a proximidade com seus filhos era de extrema importância e traria conhecimento aos próprios profissionais de saúde que ainda pouco sabiam lidar com essa nova questão. Mas não bastava informar ou esclarecer; era preciso sentir, tocar e aceitar o corpo daquela criança diferente; não fazer isso era uma forma de estranhamento e de rejeição, como é percebido nas falas das mães, que de seus lugares como mulheres deixam, muitas vezes, de ter seu conhecimento valorizado ou reconhecido:

Na fisio, a médica falava e falava. Falava em grupo para todas nós, as mães de micro. Mas eu queria ação, queria que ela me ensinasse o que eu deveria fazer em casa. Eu dizia para ela, “Pegue meu filho, segure ele. Faça o exercício com ele, me mostre”. Eu não queria que ela só falasse, eu queria que ela sentisse como era o meu filho, como era o corpinho dele. “Veja como é o corpo dele”, eu dizia para ela (FLEISCHER, 2017, p. 100).

Assim, diante de um campo tão tensionado como o da epidemia de zika, na busca por estratégias para compreender melhor a situação que vivenciam, é relevante dar visibilidade ao processo pelo qual as mães começaram a se articular politicamente, tanto em organizações quanto em grupos de WhatsApp. Scott et al. (2017) apontam que as organizações como Aliança das Mães e Famílias Raras (AMAR) e União de Mães de Anjos (UMA), ambas em Recife, além se serem espaços que se constituem como suporte emocional e social a essas famílias, também são onde as mães afetadas pela epidemia passam a organizar suas vivências de maternidade, experimentadas como “mãe especial”, “mãe rara”, “mãe de anjo”2 2 “Mãe de anjo” também é uma categoria que identifica mulheres que tiveram perda gestacional. (SCOTT et al., 2017, p. 81).

A AMAR reúne mães de crianças com síndromes ou doença raras, como West e distrofia muscular espinhal, e também outras não consideradas raras, mas que acarretam grande peso social para as mães, como o autismo, síndrome de Down e paralisia cerebral. Já a UMA surge, especificamente, como uma associação de mães ligadas às questões relacionadas à SCZ. As categorias elencadas pelos autores, como “mãe especial”, “mãe rara” e “mãe de anjo”, são percebidas nos discursos das próprias mulheres para valorizar a identificação de mães cuidadoras de filhos com necessidades especiais (SCOTT et al., 2017).3 3 De acordo com Scott et al. (2016), no Recife, é observado um conflito entre “mães raras” e “mães micro”, pois as “mães raras” sentem que os problemas por elas experimentados durante anos tem sido negligenciados e não produziu a mesma reação que os das “mães micro”, em que houve uma prioridade em quase todos os serviços ofertados exclusivamente para as crianças acometidas pela SCZ. No entanto, há o reconhecimento de que seus problemas tiveram uma maior visibilidade com a experiência das “mães micro”. Tais categorias, também apontadas em outros estudos, conferem reconhecimento, legitimidade e positividade à experiência de maternidade, demarcando um lugar onde essas mães podem ressignificar suas experiências, assim como a própria deficiência de seus filhos (DINIZ, 2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48.; FLEISCHER, 2017; ALVES; FLEISCHER, 2018ALVES, R.; FLEISCHER, S. O que adianta conhecer muita gente e no fim das contas estar sempre só? Desabafos da maternidade em tempos de síndrome congênita do zika vírus. Revista Anthropológicas, Recife, v. 29, n. 2, p. 6-27, 2018.; HAMAD; SOUZA, 2019).

O termo “especial” é conotado ao sentido de pessoa com deficiência, que necessita de atenção e cuidado especiais (PINHEIRO, 2018), também entendido como um processo social e cultural que determina o que é passível de reparação ou reabilitação quando situada em relação aos padrões do que é ser normal impostos pela sociedade (MELLO; NUERNBERG, 2012). No entanto, de acordo com Diniz (2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48.), se criança especial é uma terminologia abolida pelos movimentos de pessoas com deficiência, “entre as mulheres rurais e nordestinas, a semântica é acalentadora para enfrentar a precarização da vida pela epidemia” (p. 2), dando sentido à vida de seus filhos e potencializando a oferta de bons cuidados maternos. É a partir dessa “ressignificação do especial” (DINIZ, 2016______. Não grite eugenia: ouça as mulheres. In: RODRIGUES, C.; BORGES, L.; RAMOS, T. R. (Orgs.). Problemas de gênero. Rio de Janeiro: Funarte, 2016. p. 39-48., p. 2) que essas mães se fortalecem e revelam a capacidade de se adaptar às novas experiências, tornando-as mais resilientes frente aos limites impostos pela própria síndrome de seus filhos, que pode ser vivida como uma experiência de transformação pessoal (HAMAD; SOUZA, 2019).

Por outro lado, ser mãe especial também coloca nos ombros dessas mulheres a responsabilidade de aceitação da deficiência de seus filhos, vista como uma escolha divina. A elas cabe ocupar esse lugar sagrado e se sentirem privilegiadas por terem recebido tal “missão” (PINHEIRO; LONGHI, 2017). Essa ideia faz com que elas realizem um trabalho de cuidado invisível, com pouco apoio e com remuneração ausente. Como bem explica Barbosa (2001BARBOSA, R. H. S. Mulheres, reprodução e Aids: as tramas da ideologia na assistência à saúde de gestantes HIV+. 314 f. Tese (Doutorado em Saúde Pública) - Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2001.), historicamente o cuidado centrado na criança desconsidera as mulheres, baseado na reprodução de uma política injusta e excludente onde a “mulher-reprodutora-mãe” (p. 3) precisa renunciar a si mesma em prol das demandas e necessidades da sociedade, do Estado e da família.

É importante entender que, com isso, a questão que deveria ser tratada em âmbito coletivo fica como responsabilidade das famílias especiais, mais especificamente das mães, que são vistas como lutadoras e guerreiras, e que fazem tudo pelos seus filhos, quando a realidade é que deveria existir uma sociedade que lutasse por elas e que defendesse políticas públicas e sociais de acessibilidade e inclusão. Neste mesmo sentido, Pinheiro e Longhi (2017) sugerem o conceito de "maternidade militante" (p. 120), na qual, além de um lugar político e compromisso como cidadãs, essas mães buscam sentido para estarem no lugar que estão, o que lhes permitirá crescer e melhorar como seres humanos:

Vitor foi um divisor de águas na minha vida, chorei tudo que tinha para chorar. Sentir tristeza e raiva é normal, mas a mãe precisa entender que é a protagonista da vida do seu filho. Enquanto eu tiver força e saúde, vou correr atrás dos direitos do Vitor. Quando temos um filho, independentemente da situação, o amor tem que vencer. Não adianta deixar de lutar ou abandonar, tem que amar (PINHEIRO; LONGHI, 2017, p. 119).

Os autores também chamam atenção para o fato de a rede familiar de apoio ser predominantemente feminina, geralmente composta por integrantes da família extensa, como mães, irmãs, sogras, primas e até vizinhas. Apesar de em alguns casos ainda haver a presença dos pais, fica claro que tal parceria não existe em sua maioria (PINHEIRO; LONGHI, 2017). Barros et al. (2017BARROS, S. M. M. et al. Fortalecendo a rede de apoio de mães no contexto da síndrome congênita do vírus zika: relatos de uma intervenção psicossocial e sistêmica. Nova Perspectiva Sistêmica, v. 26, n. 58, p. 38-59, 2017.) reconheceram no trabalho em grupo de apoio de mães que alguns pais exerciam apenas o provimento financeiro da casa, o que terminava por sobrecarregar as mulheres. Os autores sugerem que muitas mães têm a ideia de que os pais se distanciam por acreditarem que seus bebês são frágeis e por se sentirem incapazes de cuidar deles.

Outra importante experiência descrita nos artigos é em relação aos itinerários que as mães precisam percorrer na cidade até chegar aos serviços de saúde: ônibus cheios e de pouca qualidade em estradas longas e esburacadas, sofrendo estigma e preconceitos como se seu filho fosse um “monstro” ou “ET” (FLEISCHER, 2017, p. 103), assim como comentários desagradáveis percebidos por elas vindos de motoristas e passageiros do ônibus. Em relato feito para o estudo de Pinheiro e Longhi, a coordenadora da UMA conta que uma mãe do grupo foi constrangida ao tentar tirar a identidade do filho: “Quando ela chegou ao cartório, uma mulher colocou a mão na cabeça da criança e disse ‘Jesus, tira o demônio desse menino’” (PINHEIRO; LONGHI, 2017, p. 128).

Em tempos que tanto se discute sobre inclusão, a pessoa com deficiência ainda vivencia situações constrangedoras e excludentes, como as relatadas acima. Ao falarmos de uma criança com deficiência, também falamos de sua rede de apoio, rede que não deve ser vista como merecedora de caridade e assistencialismo, mas que necessita de políticas públicas de valorização da diversidade e envolvimento de toda a comunidade. Muitas vezes, na vida dessa criança, a única rede disponível é a mãe, que precisa ocupar todos os espaços no cuidado com seus filhos e ainda vivencia o estigma em relação ao seu filho, “situação do indivíduo que está inabilitado para aceitação social plena” (GOFFMAN, 2004, p. 4), que pode gerar uma carga de culpa relevante nessas mães.

É importante lembrar também a ausência de políticas públicas e legislação para tais cuidadoras, que ficam sem trabalhar para poder cuidar de seus filhos. O Benefício de Prestação Continuada (BPC) é um direito assistencial constitucional, com o valor de um salário-mínimo, garantido a idosos com 65 anos de idade ou mais e a pessoas com deficiência cuja renda familiar seja de até um quarto do salário-mínimo. Por se tratar de um benefício assistencial, não há contribuição para o INSS, pagamento de 13° salário ou pensão por morte (INSS, 2020). O benefício fica em nome de seu filho e impede que a cuidadora da criança tenha direito ao trabalho de carteira assinada para obedecer ao critério de baixa renda, assim como o impedimento de acúmulo com outros benefícios, como licença-maternidade e bolsa-família (MATOS; QUADROS; SILVA, 2019). Não há nada que as ampare nessa situação de cuidado familiar, e muitas vezes as mulheres deixam seus trabalhos e migram para o campo assistencial.

Além disso, o discurso de uma prioridade no BPC às famílias atingidas pela SCZ esbarrou nas contradições históricas deste benefício, demonstrando uma lógica excludente e contraditória, em que a deficiência tem sido relativizada em detrimento do critério de pobreza. Uma das grandes reivindicações das famílias é que o benefício seja uma política indenizatória do Estado, independentemente de renda familiar (MATOS; QUADROS; SILVA, 2019).

Em 4 de setembro de 2019, o governo federal sancionou a Medida Provisória n. 894 que designa uma pensão especial às crianças com microcefalia decorrente da zika, recebendo uma série de críticas por não ampliar o acesso às políticas sociais e ser ainda mais restritivo. A pensão substitui o BPC e não pode ser cumulativa com nenhum outro tipo de benefício. Além de excluir todas as famílias atingidas pela zika que não tiveram acesso ao BPC, a medida tem uma data limite de nascimento da criança até 2018, desconsiderando o surgimento de novos casos; trata a SCZ como microcefalia, não distinguindo a gama de alterações que caracteriza a síndrome; não reconhece o esgotamento físico e emocional que a epidemia causou nessas famílias, sendo necessária nova perícia médica, além daquela já realizada para a concessão do BPC; e deixa de fora mais uma vez as mulheres/mães/cuidadoras (BRASIL, 2019).

Diante dos marcos teóricos e dos cenários apresentados e discutidos até aqui, questiona-se até que ponto, justamente por serem as mulheres e crianças com deficiência os grupos mais vulneráveis com o advento da SCZ, existiria ou não aqui o que Papperman (2013 apud HIRATA, 2014, p. 67) chama de “círculo vicioso”: as mulheres, que já têm a tarefa do cuidado desvalorizada no âmbito da divisão sexual do trabalho, cuidam de crianças, idosos, doentes e outros desprotegidos e vulneráveis, ou seja, daqueles que no âmbito das relações sociais capitalistas são considerados cidadãos de segunda classe, sendo as mesmas, portanto, duplamente desvalorizadas em seu status de cuidadoras. Desvelar o quanto tal círculo vicioso se integra a um sistema de produção e reprodução de desigualdades sociais estruturais no âmbito da sociedade brasileira, que entrelaça a subordinação, a opressão e a exploração das diferentes mulheres, se revela assim uma luta de todos e todas, não só das “mães especiais”.

Considerações finais

O principal objetivo deste ensaio é apontar dados e caminhos para que possamos fazer uma análise criteriosa do contexto atual da SCZ em futuras pesquisas, através das reais necessidades da população diretamente afetada, tendo em vista as questões expostas aqui, e de pensar em possíveis lacunas a serem mais bem entendidas. Para além disso, nos preocupamos em levantar questionamentos acerca da implantação de políticas públicas, que considerem as vulnerabilidades e desigualdades expostas no desafio de articular uma rede integrada e intersetorial de atenção à essas crianças, e na oferta de apoio psicossocial a essas famílias, em especial as mulheres, para que tenham o direito de exercer suas diferentes experiências de maternidade de forma digna e respeitosa.

Os estudos revisados demonstram que tem sido abordada uma perspectiva crítica e interseccional para descrever as dificuldades das mulheres em sobrecarga de cuidados maternos, no contexto da SCZ, sobretudo em achados mais recentes, a partir de 2017. De um modo geral, é ratificado que os serviços públicos oferecidos a essa população, na área da saúde e em suas articulações com outros setores, ainda possuem grandes limitações para atender às demandas específicas dessas famílias, em especial às mulheres que vivenciam a falta de acolhimento por parte de alguns profissionais e experiências de violência institucional.

Os estudos também apontam a sobrecarga emocional e financeira, que dificultam o suporte familiar e podem gerar repercussões na saúde mental dessas mães, que deixam de ser mulheres, esposas e profissionais para se tornaram apenas cuidadoras de seus filhos. Ao mesmo tempo, percebemos que muitas mulheres se fortalecem como sujeitos políticos, abrindo-se para uma dimensão mais ampla e coletiva em relação à deficiência de seus filhos, transformando o cuidado de certo modo mais militante e menos associado ao mundo privado e familiar.

Através do discurso de serem mulheres guerreiras e mães especiais, as mulheres criam novas possibilidades para garantirem o cuidado de seus filhos, a partir de condições que reforçam suas vulnerabilidades, o que acaba isentando o papel do Estado e da sociedade em geral em detrimento da mulher que fica solitária neste papel. O discurso também traz um aspecto culpabilizante no sentido de isentar a participação do homem no processo.

Por outro lado, apesar de identificarmos algum avanço na discussão teórico-política de gênero sobre as masculinidades e paternidades, há de se reconhecer os limites programáticos dos serviços, bem como da formação das equipes para a inserção dos homens no sistema de saúde e, em consequência, para o desenvolvimento de estratégias que colaborem para o envolvimento dos pais na atenção ao pré-natal, parto e acompanhamento do crescimento de seus filhos, o que seria especialmente necessário no caso das famílias que vivem a experiência de terem filhos com a SCZ. Vale interrogarmos, portanto, o quanto ainda se faz necessário desconstruir percepções hegemônicas sobre o cuidado e reprodução atrelados ao papel de mulheres-mães, tanto junto aos processos formativos dos profissionais de saúde, quanto junto às próprias mulheres-mães, quem sabe, em atividades de educação em saúde inspiradas nos grupos de reflexão e/ou dentro de outros coletivos em que as mesmas já estejam inseridas.

Na discussão sobre os significados de cuidar e cuidado na perspectiva crítica aqui apontada, há muito ainda a se explorar para que a opressão e exploração das mulheres situadas no modo de produção capitalista seja mais evidenciada e discutida, tanto junto aos homens quanto junto às mulheres.

No que se refere às crianças vivendo com a SCZ, que além de todas as condições de vulnerabilidade discutidas aqui também estão fora dos padrões socialmente construídos de infância, notadas como crianças especiais, e de certa forma incapazes de falar por si e se organizar politicamente, levantamos alguns questionamentos: que possibilidades estão sendo construídas para essas crianças? Que tipo de infância é pensada a elas? As escolas e outros espaços públicos estão preparadas para a inclusão dessas crianças? A questão maior que fica é: como podemos pensar em infância e deficiência em um contexto que está se diversificando e expandindo com a SCZ?

Dentre as lacunas na literatura sobre o tema, podemos apontar a questão da violência, em suas diversas faces, que não é um fenômeno totalmente explorado na experiência dessas mulheres, sinalizando para uma questão invisível, silenciada ou banalizada. Embora a violência institucional tenha sido apontada nos relatos das mulheres em diversos estudos, sob uma visão relacional-estrutural das violências é fundamental dar maior visibilidade à violência entre parceiros íntimos também no caso de casais com filhos com SCZ, uma vez que é um agravo comum na vida das mulheres, inclusive na gravidez, e que pode ter outros significados e/ou consequências em tais famílias, que além de todo o problema relacional também podem enfrentar a precarização da vida material, resultando no acirramento dos conflitos por ambas questões.

É importante ressaltar que, em sua grande maioria, os estudos expõem uma realidade de famílias da Região Nordeste, e com crianças vivendo com a microcefalia. Entendemos que a epidemia da zika teve como seu epicentro a Região Nordeste e reconhecemos a importância da ciência advinda da região na disseminação do conhecimento, mas sabe-se que a SCZ agrega um amplo espectro de alterações, não somente a microcefalia, implicando grande diversidade que ainda não é totalmente conhecida. Além disso, sinalizamos as desigualdades regionais presentes no Brasil que podem envolver diferenças entre as experiências das famílias de outras regiões, por exemplo, da Região Sudeste, mais especificamente no Rio de Janeiro, segundo estado fora da Região Nordeste com mais casos da SCZ no Brasil.

Reconhecemos, neste ensaio, a não problematização dos novos arranjos familiares e de novas formas de reconhecimento da parentalidade, ainda tratando maternidade dentro da família nuclear tradicional. De certo modo, a própria literatura sobre a temática do cuidado em tempos de zika também esteve mais circunscrita a tais tipos de famílias, o que aponta para novas questões de estudo no campo de gênero, famílias e cuidado.

No contexto de crise econômica, social e política em que se encontra o Brasil, é importante frisar o desafio que temos em considerar tais questões, frente ao desmonte de direitos e políticas sociais do atual governo, destacando, dentre outros, a extinção do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, pelo Decreto n. 9.579/2019, e as propostas da reforma da previdência que tentam reduzir a cobertura do BPC e desconsideram as famílias atingidas pela SCZ, assim como o desmantelamento dos serviços públicos de saúde.

A recente chegada da pandemia da Covid-19 também vem de encontro às narrativas e desigualdades sociais já exploradas aqui, como um fator agravante em relação às crianças com necessidades especiais em saúde. O distanciamento social, medida essencial no combate à pandemia, também vulnerabiliza as famílias com crianças com demanda de tratamento regular e contínuo, com impacto social e financeiro, especificamente aos novos casos de zika que silenciosamente continuam a acontecer. Novas pesquisas deverão responder ao entrelaçamento de ambas epidemias.4 4 F. M. Dias: concepção, pesquisa bibliográfica, redação e revisão do artigo. S. M. D. Berger: concepção e revisão do artigo. G. M. Lovisi: revisão do artigo.

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  • 1
    Este ensaio compõe a pesquisa de doutorado de Fernanda Monteiro Dias, no Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC/UFRJ), com bolsa de pesquisa CAPES, cujo apoio agradecemos.
  • 2
    “Mãe de anjo” também é uma categoria que identifica mulheres que tiveram perda gestacional.
  • 3
    De acordo com Scott et al. (2016), no Recife, é observado um conflito entre “mães raras” e “mães micro”, pois as “mães raras” sentem que os problemas por elas experimentados durante anos tem sido negligenciados e não produziu a mesma reação que os das “mães micro”, em que houve uma prioridade em quase todos os serviços ofertados exclusivamente para as crianças acometidas pela SCZ. No entanto, há o reconhecimento de que seus problemas tiveram uma maior visibilidade com a experiência das “mães micro”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2020
  • Aceito
    02 Set 2020
  • Revisado
    05 Out 2020
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