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“A Ballroom é um arquivo de pessoas negras que viveram a epidemia de aids”: narrativas sobre o arquivo negro da prevenção

“The Ballroom is an archive of black people living an Aids epidemic”: narratives about the black archive of prevention

Resumo

O objetivo deste artigo é apresentar as narrativas da Comunidade Ballroom de São Paulo, para situar como as práticas de prevenção combinada ao HIV se dão em pessoas negras LGBTQIAPN+, identificando como as estratégias se conformam, com que elementos e influências, ausências e restrições. Trata-se de uma pesquisa qualitativa no campo da Saúde Coletiva que utiliza entrevistas semiestruturadas com lideranças dessa comunidade para reconstruir as narrativas sobre HIV, abrindo um arquivo negro sobre prevenção. Tal perspectiva, alinhado ao trabalho de Saidiya Hartman pela perspectiva do pensamento negro radical, debruça-se sobre as histórias que não foram e ainda serão contadas: uma forma de imaginar radicalmente o futuro da negridade. Enquanto força analítica, o arquivo negro da prevenção tem a função de reparação, ampliando narrativas pela ótica racial, ocluindo uma história única da epidemia de HIV/Aids.

Palavras-Chave:
Prevenção primária; HIV/Aids; Adulto jovem; Serviços de saúde; Pesquisa qualitativa

Abstract

This article aims to present the narratives of the Ballroom Community in São Paulo to situate how combined HIV prevention practices are carried out in these people, identifying how the strategies conform, with what elements and influences, absences and restrictions. This is a qualitative research in the field of Collective Health that uses semi-structured interviews with Ballroom leaders to reconstruct narratives about HIV, opening a black archive on prevention. Such a perspective, in line with Saidiya Hartman's work from the perspective of radical black thought, focuses on the stories that have not been and will still be told: a way of radically imagining the future of blackness. As an analytical force, the black archive has the function of reparation, expanding narratives from a racial perspective, occluding a unique history of the HIV/Aids epidemic.

Keywords:
Primary prevention; HIV/Aids; Young adult; Health services; Qualitative research

Comunidade Ballroom

Nós poderíamos começar esta apresentação com a frase “I don’t know why y’all gagging. She bring it to you every ball”, do documentário Paris is Burning (1990), que poderia ser traduzido para: “Eu não sei por que você está passada. Ela arrasa com você em toda ball”.

Essa é uma tradução normativa que diz pouco sobre a Ballroom e é também nessa perspectiva que não optamos em traduzir as palavras que seguem neste artigo em português para preservar a história e identidade dessa comunidade.

No documentário dirigido por Jennie Livingston,1 1 Paris is burning é o principal registro audiovisual sobre o nascimento da Comunidade Ballroom nos Estados Unidos. Nos estudos de classe, gênero e sexualidade, Judith Butler (2019) e Bell Hooks (2019) se ocuparam a discutir sobre as categorias cisgeneridade e negridade tendo como base o referido documentário. é retratado a imagem de uma cidade em chamas ocupada por pessoas negras, transexuais (trans), gays, vivendo com HIV na periferia de Nova York (EUA), tal como na série Pose2 (2019), quando Blanca Evangelista, uma mulher trans negra, interpretada por MJ Rodriguez, recebe o diagnóstico positivo da infecção.

Em 2020, pioneiros dessa comunidade na cidade de São Paulo participaram do Mix Talks “Brazil is burning!” O poder da cultura Ballroom” para refletir sobre o legado deste grupo em território brasileiro, propondo a necessidade de conhecer em profundidade as características e funcionamentos dessa organização para criar um dicionário comum sobre as vivências que se forjam nesse espaço.

Ballroom é cultura, um lugar de pertencimento para as pessoas negras, lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, queers, intersexo, assexuais, pansexuais, não binários e demais orientações e identidades expressadas pelo sinal de “+” (LGBTQIAPN+) positivas ou não para HIV, cuja criação foi impulsionada pela epidemia de Aids nos Estados Unidos na década de 1980, configurando também uma cena cultural dentro da epidemia de HIV/Aids.

Nessa comunidade, existem houses que participam da ball para conquistar posições de destaque. No documentário já citado, temos a House of LaBeija: uma forma de articulação, composição e organização de novos arranjos familiares sociais, para além da noção de família biológica. Em cada house existe a figura do father e mother, responsáveis pelo acolhimento das childrens, sons ou daughters, muitas vezes jovens negros LGBTQIAPN+ expulsos de casa por conta da orientação sexual e/ou identidade de gênero. Nas houses, as mothers normalmente são travestis e transexuais negras.

Como mencionado, a ball é um momento de competição, mas também de celebração onde integrantes caminham na runway para disputar títulos como pioneer, star, legendary. Esses títulos mostram a habilidade de cada integrante das houses nas categorias realness, beauty, fashion, vogue performance. Além da competição, voguing é uma dança periférica bastante comum na Ballroom, inspirada nas capas da revista Vogue, criado pelo dançarino Willi Ninja da House of Ninja, alcançando sucesso mundial com a música da Madonna (1990MADONNA. Vogue. 12 de março de 1990. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=GuJQSAiODqI&ab_channel=Madonna.
https://www.youtube.com/watch?v=GuJQSAiO...
), embora já ter sido utilizada pelas cantoras Queen Latifah em Come Into My House (1989QUEEN LATIFAH. Come into my house. 07 de novembro de 1989. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=QcP5Wwr3c-Y&ab_channel=TommyBoy.
https://www.youtube.com/watch?v=QcP5Wwr3...
) e Janet Jackson em Nasty (1986JACKSON, J. Nasty. 15 de abril de 1986. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=ujnq2v6R02U&ab_channel=JanetJacksonVEVO.
https://www.youtube.com/watch?v=ujnq2v6R...
).

E mais recentemente foi utilizado por FKA Twigs em Glass and Patron (2015FKA Twigs. Glass and Patron. 23 de março de 2015. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=cNbFc-fa-ww&ab_channel=FKAtwigs.
https://www.youtube.com/watch?v=cNbFc-fa...
), Pillar Point em Dove (2016PILLAR POINT. Dove. 09 de fevereiro de 2016. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=BU6dAAfg-qk&ab_channel=PolyvinylRecords.
https://www.youtube.com/watch?v=BU6dAAfg...
) com a participação de Kia LaBeija, ex-mother da House of Labeija e Danna Lisboa (2019DANNA LISBOA. Real. 22 de novembro de 2019. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=8jyIFzhi8ic&ab_channel=DannaLisboa.
https://www.youtube.com/watch?v=8jyIFzhi...
) da House of Besher.

Dentro do voguing, há subdivisões da dança como catwalk, duckwalk, floor performance, hands performance e spin and dip. Catwalk é caminhar na runway, inspirado nos desfiles de moda de Thiery Mugler, Balenciaga, Commes des Garçons, produzindo uma “passarela contracultural” (ZION, 2020ZION, F. A Categoria Runway Figura Feminina na Ballroom, uma passarela contracultural. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal de Alagoas, Escola Técnica de Artes. Maceió, 2020.). Duckwalk é o movimento de agachar para desfilar. Floor performance é uma técnica realizada no chão. Hands performance, é uma variação da última, utilizando as mãos. E spin and dip, girar e cair, ficou conhecido como death drop no reality show RuPauls Drag Race, como apontam Silva e Dias (2021SILVA, I. R.; DIAS, L. O. Se chama dip e não death drop: Ballroom em performance(s). In: X Congresso Internacional de diversidade sexual, étnico-racial e de gênero, 2021. Diversidade sexual, étnico racial e de gênero: saberes plurais e resistências. Campina Grande: Realize Editora, 2021.).

Para Holloway et al. (2012HOLLOWAY et al. HIV prevention service utilization in the Los Angeles House and Ball communities: past experiences and recommendations for the future. Aids Educ Prev., 2012.), a Comunidade Ballroom é “uma população de importância para as atividades de prevenção do HIV, sendo que ainda há poucas informações sobre a integração bem-sucedida dos serviços de HIV nessa comunidade” (p. 2). Uma iniciativa intitulada de Posse Project buscou avançar nessas questões inserindo lideranças da Filadélfia e Chicago em um Comitê Técnico de Prevenção para construir abordagens e técnicas de pesquisas para ampliar o acesso de jovens negros LGBTQIAPN+ da Ballroom às estratégias de prevenção. Hosek (2019HOSEK et al. Comparison of two distinct house ball communities involved in an HIV prevention study: Baseline data from the POSSE project. J HIV Aids Soc Serv., 2019.), a partir dos estudos de Rowan (2014ROWAN et al. “We’re just targeted as the flock that has HIV”: health care experiences of members of the house/ball culture. Soc Work Health Care, 2014.) e Holloway (2014), afirma que as informações disponíveis na literatura científica sobre esta comunidade e os programas de prevenção são limitadas e inexistentes.

No cenário brasileiro, há carência de pesquisas científicas, contudo, Lorena (2022LORENA, A. G. Sem perreco: a prevenção do HIV em fluxos, festas e bailes funks. São Paulo: Editora Hucitec, 2022a.), Zion (2020ZION, F. A Categoria Runway Figura Feminina na Ballroom, uma passarela contracultural. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal de Alagoas, Escola Técnica de Artes. Maceió, 2020.) e Santos (2018SANTOS, H. C. A transnacionalização da cultura dos Ballrooms. Dissertação (mestrado). Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem, Campinas, SP. 2018. Disponível em: http://www.repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/331699. Acesso em 30 de novembro de 2022.) têm dado atenção para esse grupo populacional em relação às discussões sobre saúde e prevenção, moda e HIV, identidade cultural e política. Nesse sentido, interessa aqui abrir um arquivo sobre essas histórias, pessoas, experiências e vivências com uma epidemia que caminha para a quinta década com desafios importantes no que compete ao acesso e equidade de pessoas negras LGBTQIAPN+ aos serviços de saúde.3 3 Pesquisa desenvolvida sob o Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva na Faculdade de Medicina da USP em nível de mestrado com Bolsa Capes (número do processo: 88887.485987/2020-00).

O ponto de part/ida

Esse artigo é fruto de uma dissertação de mestrado cuja pesquisa começou a ser gestada no final de 2018 em reuniões com o Centro Cultural Grajaú (CCG), Centro Cultural Juventude (CCJ) na Brasilândia e Centro de Formação Cultural (CFC) da Cidade Tiradentes para fomentar o diálogo da prevenção combinada ao HIV junto a jovens negros LGBTQIAPN+ nesses espaços culturais periféricos, além de construir uma programação cultural para a semana do 1º dezembro (Dia Mundial de Combate à Aids) por meio de uma atuação profissional no Setor de Prevenção da Coordenadoria Municipal de IST/Aids da cidade de São Paulo, vinculado à Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo (SMS/SP).

Essa Coordenadoria é responsável pela coordenação técnica da Rede Municipal Especializada (RME) composta por 28 serviços, que incluem 10 Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA), sendo um itinerante chamado de CTA da cidade, 17 Serviços de Atenção Especializada (SAE) e a Estação Prevenção instalada dentro do Metrô República.

São serviços do SUS que trabalham diretamente com a prevenção, assistência e tratamento das IST/Aids. O Setor de Prevenção é responsável pelo monitoramento dos agentes e projetos de prevenção, além da assessoria técnica aos 28 serviços da RME para construir estratégias de prevenção focadas nas populações jovens, gays e homens que fazem sexo com homens (HsH), pessoas que usam álcool e outras drogas, travestis e transexuais, profissionais do sexo e mulheres em situação de vulnerabilidade por meio de projetos de prevenção, respectivamente, Plantão Jovem, Cidadania Arco Íris, PRD Sampa, Arrasa Mona, Tudo de Bom e Elas por Elas.

Especificamente, o destaque será no Plantão Jovem pelo trabalho de acompanhar de perto cada agente de prevenção, apoiando, construindo e formulando estratégias para barrar a cadeia de transmissão do HIV. Os agentes do Plantão Jovem possuem idade entre 18 e 29 anos composta por uma maioria negra LGBTQIAPN+ das periferias da cidade de São Paulo. Estes estão vinculados aos serviços da RME e são supervisionados por técnicas de prevenção para construir ações de prevenção no território.

Por exemplo, a entrega de camisinha e gel lubrificante é uma ação de prevenção que acontece na Praça da Gaiola na Cidade Tiradentes, extremo leste da cidade de São Paulo, onde há concentração de jovens nos finais de semana. Com idas semanais ao campo, os agentes do Plantão Jovem podem propor outras ações de prevenção como testagem rápida extramuro de HIV para possibilitar que jovens daquela região possam ter acesso a sua sorologia. Além da testagem, também pode ser oferecido a profilaxia pós exposição (PEP) e profilaxia pré exposição (PrEP) no momento do atendimento, e até mesmo o tratamento de HIV, dependendo do desfecho do resultado e da vontade daquele jovem no momento.

Essas ações mostram a importância da educação entre pares: quando jovens falam de prevenção com outros jovens em diversos pontos da cidade, isso faz com que “os serviços de IST/Aids assumam uma posição ativa no território, indo ao encontro de jovens adaptando diversas estratégias de prevenção” (LORENA et al., 2021LORENA, A. G. et al. Articuladores de prevenção: uma estratégia para ampliar o acesso da prevenção combinada ao HIV junto a coletivos culturais de periferias da cidade de São Paulo. Prefeitura de São Paulo [Internet]. 20 de junho de 2021. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/articuladores.pdf. Acesso em: 3 jan. 2022.
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
, p.1) como uma população prioritária para as ações de prevenção.

A prevalência de HIV em jovens de 18 a 24 anos é de 18,4/100 por mil habitantes, sendo que na população geral é de 0,4/100, de acordo com o Ministério da Saúde (2017). Na cidade de São Paulo, a epidemia está concentrada em jovens negros LGBQTIAPN+,4 4 Embora a discussão esteja indiretamente ligada ao debate da interseccionalidade (ver CRENSHAW, 1989; AKOTIRENE 2019), não é objetivo do artigo tal dimensão. A opção teórica, metodológica e analítica é discutir o arquivo negro da prevenção, apresentando narrativas outras sobre a epidemia de HIV/Aids pela ótica racial. Para estudos que dialogam com a relação HIV e interseccionalidade, ver: Oliveira (2022) e Santos (2015). segundo Boletim Epidemiológico de HIV/Aids (2022), apontando que os espaços de socialização desses jovens como as festas se afiguram como potenciais locais para redução da vulnerabilidade tendo as estratégias de prevenção combinada ao HIV como horizonte de cuidado. Tal estratégia “faz uso combinado de intervenções biomédicas, comportamentais e estruturais aplicadas no nível dos indivíduos, de suas relações e dos grupos sociais a que pertencem” (BRASIL, 2017BRASIL. Ministério da Saúde. Prevenção Combinada do HIV: bases conceituais para profissionais, trabalhadores e gestores de saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2017., p. 40).

Dentro das intervenções biomédicas, o foco é reduzir o risco de transmissão ou exposição ao HIV por meio dos métodos de barreira (preservativos); utilização de antirretrovirais (PrEP, PEP e tratamento); prevenção e tratamento das ISTs; imunização para hepatite A, B e HPV; prevenção da transmissão vertical.

No conjunto das intervenções comportamentais: aconselhamento com avaliação e gerenciamento de risco; orientações para a realização da testagem; incentivo à testagem rotineira e regular; redução de danos para usuários de álcool, outras drogas, silicone industrial e hormônios; comunicação e educação entre pares; campanhas de prevenção em IST, HIV e hepatites virais. Ainda, as intervenções estruturais podem ser classificadas como a revisão de leis e políticas, combate ao estigma e a discriminação; protagonismo comunitário e participação social, ações de enfrentamento ao estigma e discriminação como racismo, sexismo, machismo, homofobia, transfobia e outras formas de exclusão.

É aqui que a hipótese está inserida, ou seja, as festas se afiguram como um espaço de socialização e, eventualmente, de ampliação da vulnerabilidade de jovens à epidemia, em que pode estar presente ou não ações de prevenção de novas infecções. O início dessa experiência foi sintetizado no trabalho “Saúde e cultura: interfaces e parcerias com equipamentos e coletivos de cultura na oferta de testagem rápida para populações vulneráveis ao HIV na cidade de São Paulo” (LORENA et al., 2019LORENA. A. G. et al. Saúde e cultura: interfaces e parcerias com equipamentos e coletivos de cultura na oferta de testagem rápida para populações vulneráveis ao HIV na cidade de São Paulo. XII Congresso Brasileiro da Sociedade Brasileira de DST, Foz do Iguaçu, Brasil. 2019.).

Essas testagens foram acontecendo mais fortemente a partir de janeiro de 2019 na Fábrica de Cultura do Capão Redondo no “Circuito Vera Verão: a comunidade Ballroom em conexão” organizado pelo coletivo Amem, seguido de uma testagem extramuro de HIV no lançamento da Manifesta Feminilidades com a Coletiva Travas da Sul no Grajaú, partindo, para o Festival Periferia Preta na Fazenda da Juta, na zona leste de São Paulo. Coletivo Amem, Travas da Sul e Periferia Preta deixaram uma forte impressão de que jovens negros LGBTQIAPN+ frequentavam mais os espaços culturais do que os serviços de saúde, entrando em uma rede específica de jovens articulados em coletivos culturais do Grajaú a Sapopemba, da São Remo para a Vila Alba, de São Mateus até Brasilândia.

Era comum encontrar jovens de outras periferias da cidade em espaços culturais de “outras quebradas”, como gostam de definir. Esse movimento parte da necessidade desses jovens de fomentar atividades culturais onde vivem, mostrando que arte e cultura devem ser a primeira forma de acessar jovens, não pela perspectiva da saúde, mas de outros modos de produção de saúde. O diálogo com esses jovens nos momentos de acolhimento e entrega do resultado giravam em torno dessa necessidade de articulação da saúde com a cultura, sendo muito comum encontrar jovens que participaram da testagem nas Travas da Sul, por exemplo, mobilizando ações de saúde e cultura na periferia que vivem com apoio do serviço de IST do território.

Travas da Sul e Comunidade Ballroom começaram a mobilizar autonomamente ações de prevenção como dispensação de autoteste de HIV, distribuição de camisinhas internas/externas (nova nomenclatura para camisinha feminina/masculina) e rodas de conversa sobre gênero e sexualidade. As festas, articuladas ou não a atividades culturais, também eram muito diversas em relação a quantidade de público, cujo menor número foi de 200 jovens.

Nos fluxos e bailes funks, a dimensão foi de mil jovens. Até a chegada da pandemia de Covid-19, “foram realizadas 20 [ações de] testagens extramuros em parceria com equipamentos de cultura e coletivos de jovens, negros e LGBTQIA+ nas periferias [...] totalizando 1.077 testes de HIV realizados, sendo 1.063 negativos e 14 positivos” (SÃO PAULO, 2020, p. 24). Ainda, foram cadastrados agentes de prevenção do Plantão Jovem e articuladores de prevenção para identificar e mapear novos espaços de socialização e circulação de jovens, sobretudo, nas periferias (SÃO PAULO, 2020, p. 24).

Tal experiência foi reconhecida com o segundo lugar na categoria Políticas Públicas do PREMIA Sampa da Prefeitura de São Paulo com o projeto “a prevenção combinada ao HIV junto a equipamentos de cultura e coletivos de jovens, negros e LGBTs” sendo lançado como projeto Se Liga! e publicado como guia para que outras áreas e secretarias da Prefeitura de São Paulo possam se espelhar nessa experiência e adaptar para suas realidades.

A ida para as periferias e o contato com os coletivos culturais formaram um conjunto de experimentações que resultaram no campo da pesquisa que sedimenta este artigo. É nesse contexto e marcado por essas experiências que se colocam as grandes questões que norteiam a pesquisa, sobressaindo-se o seguinte questionamento: quais os limites e possibilidades da prevenção combinada ao HIV junto a jovens negros LGBTQIAPN+ em festas nas periferias de São Paulo?

O objetivo deste artigo é apresentar as narrativas da Comunidade Ballroom de São Paulo para situar como as práticas de prevenção combinada ao HIV se dão nessas pessoas, identificando como essas estratégias se conformam, com que elementos e influências, ausências e restrições.

Metodologia: modos de pensar, modos de fazer

Trata-se de uma pesquisa qualitativa no campo da Saúde Coletiva que se constitui a partir de uma observação participante, diário de campo e entrevistas semiestruturadas com lideranças de coletivos culturais que organizam fluxos, festas e bailes funks, além de jovens rolezeiros que frequentam esses espaços. O destaque conferido à Comunidade Ballroom de São Paulo se deve, em parte, às reivindicações feitas durante as entrevistas, por alguns de seus membros, de coautoria dos saberes produzidos na pesquisa. Outras lideranças de coletivos culturais e jovens rolezeiros entrevistados também levantaram essa questão, referindo um certo cansaço de pesquisadores cis estudando comunidades negras LGBTQIAPN+ cuja única preocupação é produzir conhecimento em cima dessas pessoas. Então, há de reconhecer uma proposição da Marilyn Strathern: “as etnografias são construções analíticas de acadêmicos; os povos que eles estudam não. Faz parte do exercício antropológico reconhecer que a criatividade desses povos é maior do que o que pode ser compreendido por qualquer análise singular” (STRATHERN, 2006, p. 26).

Tal análise é a própria relação do “nativo relativo” (VIVEIROS DE CASTRO, 2002VIVEIROS DE CASTRO, E. O nativo relativo. Mana, v. 8, n. 1, 2002.), dos tipos de conhecimentos que podemos fazer a partir de uma antropologia que seja relação social, transformação entre nativo e antropólogo, pesquisador e pesquisado, sanitaristas e usuários de serviços de saúde. Muitas vezes, essa relação implica em uma superioridade do discurso, o que implica em uma vantagem analítica e epistemológica que o pesquisador possui sobre o pesquisado, que o antropólogo tem sobre o nativo, que o sanitarista tem sobre o usuário. Não é negar as diferenças que existem, mas, realçar essas diferenças para potencializar tais diferenças, fortalecendo a diferença e propondo igualdade de direitos.

O que Marilyn Strathern e Eduardo Viveiros de Castros fazem e indicam para nós, do campo da Saúde Coletiva, é que os modos de produzir conhecimentos podem ser frutos de uma relação social. Então, como a prevenção do HIV pode se tornar reversa e inverter o mundo quando se adentra a Comunidade Ballroom de São Paulo? Essa indagação é importante para considerar duas formas de produzir conhecimento: a primeira é aquela quando partimos dos nossos próprios conceitos como saúde, doença, cuidado nos contextos e grupos estudados; a segunda é de não partir de conceitos prévios, mas, partir da investigação dos próprios conceitos, segundo Viveiros de Castro (2002VIVEIROS DE CASTRO, E. O nativo relativo. Mana, v. 8, n. 1, 2002.).

Ao invés de partir de conceitos existentes, perguntar: quais são os conceitos daquele grupo sobre saúde, doença e cuidado? Quais conceitos são mobilizados pela Ballroom sobre a prevenção do HIV? Pensar a metodologia com essas pessoas, abre a possibilidade de prestar atenção nos sinais que são emanados por uma “epistemologia periférica” (D’ANDREA, 2020D’ANDREA, T. Contribuições para a definição dos conceitos de periferia e sujeitas e sujeitos periféricos. Novos estudos CEBRAP, v. 39, n. 1, 2020.) para levar o pensamento de jovens negros LGBTQIAPN+ a sério, reconhecendo que essas pessoas também produzem conhecimento e epistemologia.

De acordo com Grada Kilomba (2021KILOMBA, G. Descolonizando o Conhecimento. Clinicaland, 2021. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=iLYGbXewyxs. Acesso em: 30 nov. 2022.
https://www.youtube.com/watch?v=iLYGbXew...
), epistemologia define não apenas como produzir conhecimento, mas também quem pode produzir conhecimento com quais questões, perspectivas e formatos. Para Vale (2019VALE, M. C. Desengano da vista é ver, escrita etnográfica em Cachoeira. Tessituras, v. 7, p. 30-47, 2019.), a visão ativista aguça o olhar e recusa uma suposta neutralidade epistemológica da metodologia de pesquisa. Não se trata de uma representação, interpretação de uma dada realidade, de encaixar a teoria nas pessoas, mas reencaixar a teoria e não as pessoas, “evitando assim a mera imposição de explicações acadêmicas genéricas sobre mundos contados, vividos, explicados de forma singular” (VALE, 2019VALE, M. C. Desengano da vista é ver, escrita etnográfica em Cachoeira. Tessituras, v. 7, p. 30-47, 2019., p. 34) porque não se trata de lançar uma análise alheia ao mundo das pessoas, mas comunicar com fidelidade como as pessoas vivem aquele mundo por meio das suas perspectivas analíticas e singulares no modo de fazer a pesquisa.

A entrevista como abertura de um arquivo

Para participar dessa etapa foi estabelecido que as lideranças da Ballroom deveriam ter: 1) organizado ações de prevenção combinada ao HIV nas festas; 2) presença de jovens negros LGBTQIAPN+; 3) atuação nas periferias da cidade de São Paulo. Nesse sentido, o trabalho de José Machado Pais (2001PAIS, J. M. Jovens arrumadores de carros? a sobrevivência nas teias da toxicodependência. Análise Social, v. XXXVI, p. 373-398, 2001.) torna-se uma referência para a realização das entrevistas. Em sua pesquisa, o autor produz um estudo com jovens arrumadores de carros em Lisboa, utilizando entrevistas para compreender a realidade crescente de jovens que trabalham em parquímetros. As entrevistas tinham o objetivo de aprofundar o conhecimento sobre as realidades desses jovens que trabalham em estacionamentos para compreender como a dependência de substâncias ilícitas surgia nesse cenário

Por quatro anos, foi possível conhecer diversos Coletivos Culturais que produziam ações de prevenção ao HIV nas periferias que viviam, o que permitiu sempre estar em trabalho de campo. Uma simples ida ao Grajaú, era a possibilidade de estar atento sobre as realidades daqueles jovens. Foi assim que o roteiro de entrevista foi elaborado por meio de quatro eixos: 1) Trajetória pessoal; 2) Saúde e prevenção combinada; 3) Juventudes periféricas; 4) Festa e saúde. Cada eixo com sete questões norteadoras para compreender como se dão as práticas de prevenção combinada ao HIV para identificar essas estratégias, como se conformam, com que elementos e influências, ausências e restrições. As entrevistas foram conduzidas online devido à pandemia de Covid-19 pela plataforma Google Meet, gravadas e transcritas com assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em que todos/as concordaram em participar da entrevista com identificação de autoria. Não apenas concordaram com a identificação de autoria, mas reivindicaram, como já indicado anteriormente.

Em relação a este artigo, Félix Pimenta, Flip Couto e Luna Ákira passaram da condição de co-autores para porta-vozes de um saber constituído por esta comunidade, com suas práticas e vivências. Importante destacar que essas pessoas são pioneiras dessa comunidade na cidade, Estado de São Paulo e Brasil. Além disso, Félix Pimenta faz parte da House of Zion, Kiki House of Pimentas e Coletivo AMEM. Flip Couto também faz parte da House of Zion e Coletivo AMEM, e Luna Ákira da House of Avalanx, sendo pessoas negras LGBTQIAPN+. A questão da raça aparece fortemente na Comunidade Ballroom, então, não basta apenas analisar as entrevistas, mas escrever com elas, imaginar, mostrar essas outras histórias, abrindo um arquivo sobre outras perspectivas para a prevenção do HIV.

Arquivo negro da prevenção

Arquivo é um “conjunto de documentos sobre determinado assunto que, guardados numa instituição pública ou privada, é resultado de uma atividade ou trabalho com registro individual e organizados sob um formato específico, contém textos, tabelas, imagens, sons etc.” (HARTMAN, 1997). É um registro onde as histórias podem ou não ser contadas, além daquelas que estão para serem contadas cuja tarefa é desvendar “o perigo de uma história única”, segundo Adichie (2019ADICHIE, C. O Perigo da História Única. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.).

Esse tem sido o trabalho de Saidiya Hartman, ao revirar o arquivo da escravidão dos Estados Unidos. A autora tem ganhado bastante destaque no Brasil, após a publicação do ensaio “Vênus em dois atos” (HARTMAN, 2020HARTMAN, S. Vênus em dois atos. Revista ECO-Pós, v. 23, n. 3, p. 12-33. 2020.) sobre a história de uma menina morta em um navio negreiro. Hartman recusa os registros de Vênus que reside na intensa violência sobre o corpo cativo. Hartman recusa a narrativa sobre a morte de uma garota extremamente violentada, propondo uma escrita intercessora entre arquivo e fabulação.

No artigo “Tempo da escravidão” (2021), a pesquisadora procura lidar com a dor e o luto, tendo como perspectiva a reparação da violência. O que chama atenção nesses dois trabalhos é o método de pesquisa da fabulação crítica que consiste na combinação de arquivos, documentos, relatórios sobre a escravidão, imaginando a vida negra como algo a ser vivida ao invés de exterminada.

Em “Perder a mãe: uma jornada pela rota atlântica da escravidão” (HARTMAN, 2021aHARTMAN, S. A história da escravidão moldou a vida de todos nós. 2021. Disponível em: https://gamarevista.uol.com.br/formato/conversas/saidyia-hartman-a-historia-da-escravidao-moldou-a-vida-de-todos-nos/. Acesso em: 13 dez 2021.
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), ela aprofunda essas relações, utilizando pesquisa documental, literatura e poesia para pesquisar as cicatrizes da escravidão em sua família. Quando viaja para Gana, ela se depara com a dimensão do anonimato, de olhar para a masmorra e se deparar com nenhuma informação, as poucas linhas sobre a vida. Então, a autora mobiliza a dimensão afetiva do conhecimento, já trabalhado por Aline Motta em “A água é uma máquina do tempo” (2022MOTTA, A. A água é uma máquina do tempo. São Paulo: Círculo de Poemas, 2022.) quando a artista visual trabalha com as memórias da avó e do luto pela mãe.

Não à toa que o ensaio “Vênus em dois atos” é republicado na antologia “Pensamento negro radical” (2021b), refletindo sobre os significados de escravidão, sujeição, radicalismo no pensamento negro, arquivo racial, performatividade preta, e criando categorias como afropessimismo, antinegritude e necropolítica.

Em “O fim da supremacia branca” (2021c) e “Vidas rebeldes, belos experimentos: histórias íntimas de meninas negras desordeiras, mulheres encrenqueiras e queers radicais” (2022), Hartman amplia a fabulação crítica, partindo para a imaginação radical, onde ela começa a especular sobre os limites das histórias negras contadas por pessoas brancas. Segundo a autora, “as pessoas negras tinham sido autorizadas a morrer em grandes quantidades sem que uma crise jamais fosse declarada” (HARTMAN, 2021HARTMAN, S. O fim da supremacia branca. São Paulo: Editora Fósforo; 2021d., p. 58-59).

O trabalho com arquivos, documentos, relatórios, descrevendo essas vidas com desejos e sonhos é o mote da autora em reposicionar as narrativas sobre a vida negra no mundo. A sedução e o ventre do mundo (HARTMAN, 2022aHARTMAN, S. Vidas rebeldes, belos experimentos: histórias íntimas de meninas negras desordeiras, mulheres encrenqueiras e queers radicais. São Paulo: Editora Fósforo; 2022.) foram os últimos ensaios traduzidos sobre o trabalho reprodutivo das mulheres negras, escrevendo com a voz das escravizadas, ao invés de narrar o que os arquivos apontam sobre essas vidas. Hartman tem revirado os arquivos da escravidão para contar histórias outras. Quando a autora começa a abrir esses arquivos, ela se depara com situações que falam sobre prisão, prostituição, criminalização e subalternização. Como defende, é inviável a narrativa da escravidão escrita pelos mercadores e senhores de escravos.

Como falar da escravidão sem falar de violência? “Como posso usá-los para desafiar a hierarquia intelectual entre os ‘sujeitos do conhecimento’ e os que foram constituídos como ‘objetos do conhecimento’ naqueles documentos?” (HARTMAN, 2021HARTMAN, S. O fim da supremacia branca. São Paulo: Editora Fósforo; 2021d., p.2). Estamos propondo uma posição ética para construir realidades outras, abrir outros arquivos, pensar histórias e narrativas com outros tipos de documentos, fontes e referências, partindo da epidemia de HIV/Aids.

Então, como abrir arquivos de prevenção que não sejam os boletins epidemiológicos, protocolos clínicos sobre tratamento, leis e portarias sobre prevenção? Como revisitar a prevalência do HIV sem reproduzir a violência? Quais histórias os dados epidemiológicos poderiam contar se não contassem apenas números? Essas perguntas mobilizam um conjunto de perspectivas para ocluir uma narrativa única sobre prevenção do HIV. A fabulação crítica e a imaginação radical de ouvir as pessoas mortas no arquivo da escravidão, permite escutar quem vive a epidemia de HIV/Aids com o desafio ético de olhar a vida negra de outro lugar para remodelar o futuro nas práticas de prevenção.

O arquivo da Comunidade Ballroom de São Paulo

A partir de relatos e narrativas colhidas durante as entrevistas com Félix Pimenta, Flip Couto e Luna Ákira começamos a perceber a formulação de um arquivo negro da prevenção: o movimento de perceber como as histórias são constituídas, permitindo um olhar atento sobre as dinâmicas da vida negra.

Da nossa perspectiva, implica uma relação de composição, ou seja, uma passagem, travessia, arranjos para construir uma reflexão daquilo que Preciado intitula de “conhecimento situado” (PRECIADO, 2006PRECIADO, P. B. Saberes_vampiros@War Donna Haraway y las epistemologías cyborg y decoloniales. Texto extraído de Caosmosis [Internet]. 2006. Disponível em: https://programaddssrr.files.wordpress.com/2013/05/vsaberes_vampiroswarbeatriz-preciadosaberes_vampiroswar-beatriz-preciado.pdf. Acesso em: 2 abr. 2023.
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), ou seja, quando o conhecimento deve ser produzido por pessoas negras, trans, deficientes, usuários de drogas, prostitutas, por multidões que são vistas apenas como menores ou vulnerabilizadas, estigmatizadas, como uma forma inferior de vida.

Não à toa, as narrativas de Félix Pimenta, Flip Couto e Luna Ákira estão em itálico para delimitar o contexto de quem fala sobre o arquivo negro da prevenção, abrindo interstícios na história da epidemia de HIV/Aids já que “todo mundo tem uma história diferente para contar” (HARTMAN, 2022HARTMAN, S. A sedução + o ventre do mundo: dois ensaios. São Paulo: Crocodilo Edições; 2022a., p. 38). Para Félix Pimenta: a Comunidade Ballroom é um arquivo sobre as pessoas negras que viveram a epidemia de Aids. É uma comunidade composta por pessoas negras dissidentes sexuais ou de gênero e HIV positivas. Como defende, é uma movimentação artística das pessoas negras dentro do arquivo da intelectualidade preta.

Flip Couto lembra também que ball não é traduzido para o português porque as pessoas podem ter a ideia de um baile, de uma festa. Uma ball não é necessariamente uma festa. É um momento em que as pessoas se organizam por categorias para competir na Ballroom.

Segundo Flip, a Comunidade Ballroom começa a se fortalecer enquanto organização preta afrodiaspórica a partir da Latex Ball: idealizada por um coletivo de pessoas da Ballroom que se uniram e formaram a House of Latex e foram na porta da GMHC [Gay Men’s Health Crisis] exigir ações de prevenção para a Comunidade Ballroom que era muito afetada pela epidemia de Aids.

Félix salienta que em São Paulo, a primeira ball aconteceu em 7 de setembro de 2016, quando é convidado pela Plataforma Explode para participar de uma residência artística e assinar a direção artística da Ball Attack embora a Comunidade Ballroom tenha sido formada em 2015.

Para Michael Roberson (2019ROBERSON, M. The enduring legacy of Ballroom. 2019. Disponível em: https://www.ted.com/talks/michael_roberson_the_enduring_legacy_of_Ballroom #t-603478. Acesso em 30 nov. 2021.
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), muitos pesquisadores possuem a compreensão que a Comunidade Ballroom é um mero espaço de intervenção para a prevenção do HIV, no entanto, trata-se de articulações comunitárias e identidades culturais. Ele ressalta também que a prevenção do HIV sempre foi pensada por e para pessoas brancas soronegativas, diferente da Comunidade Ballroom formada majoritariamente por pessoas pretas positivas onde o racismo é preponderante nas políticas de saúde, segundo Flip. De acordo com Félix: a maioria das pessoas que falam sobre HIV/Aids são brancas e as discussões sobre representatividade não contemplam a pauta racial. Qual o lugar das pessoas pretas positivas falando sobre HIV? É sempre uma questão técnica trazidas por médicos, sanitaristas, sempre brancos, dificilmente por algum profissional negro.

Para Flip: foi a partir do micro que começamos a entender como seria falar de HIV dentro de uma festa, como seria cruzar HIV e negritude, como falar do HIV como um viés do genocídio da Aids na população negra. É aqui que Flip formula a noção de prevenção preta para falar de racismo e saúde com a visão da Ballroom: um espaço, uma zona autônoma de criação que retira a discussão do HIV/Aids do consultório médico e dos equipamentos de saúde para trazer ao nosso cotidiano. Ele segue: É importante falar sobre as questões da adesão ao tratamento para além do remédio, do “fique indetectável”. Nós falamos sobre tomar o remédio, sobre ser indetectável ou não, sobre usar o preservativo ou não, sobre gostar no pelo [sexo sem camisinha] ou não. Nós humanizamos essas questões sobre saúde sexual.

E ainda complementa sobre a questão da representatividade nas políticas de prevenção: nós estamos dando voz para as pessoas vivendo com HIV dentro da Ballroom. Elus estão entendendo que é um lugar seguro para nós. Podemos fazer uma roda de conversa, uma roda de acolhimento, uma ação de testagem. Eu posso bater na porta do serviço de saúde para pedir preservativo. Nós criamos ferramentas. A primeira ação de testagem que fizemos com o Programa Municipal de IST/Aids foi a Ball Vera Verão em 2019. Foi uma experiência transformadora porque eu estava discotecando e uma pessoa parou do meu lado para falar que queria algumas informações sobre HIV/Aids porque testou positivo ali, naquele ambiente de dança. No dia seguinte, ela estava em casa tomando café. Ter esse acompanhamento, essa possibilidade que a Ballroom proporciona do diagnóstico até o tratamento e o I=I é uma construção para voz a partir do acolhimento.

Luna Ákira afirma que a Ballroom é uma ponte entre a comunidade LGBT negra para falar sobre saúde, “essa experiência traz a possibilidade de repensar o próprio acesso, sob a égide do acolhimento e reconhecimento da legitimidade da demanda e da história de cada indivíduo que usa o sistema de saúde” (LORENA; THAMI, 2022LORENA, A. G.; THAMI, H. Populações vulneráveis e políticas para enfrentar a desigualdade: o caso da população LGBTQIA+. In: ROCHA, R.; LAGO, M.; GIAMBIAGIG, F. (Orgs.). A saúde do Brasil. 1ed. São Paulo: Lux, 2022, p. 174-187., p. 184). No contexto da Ballroom, o acolhimento é utilizado para estimular um espaço “pragmático do encontro, os domínios de ação (emoções, afetos) e de significação (linguagem, conhecimento) e as utilizações possíveis do próprio encontro” (TEIXEIRA, 2004, p.4) entre pessoas pretes LGBTQIA+ que não recebem atendimento adequado nos serviços de saúde, segundo Ákira. O acolhimento ofertado pela Ballroom leva em conta práticas contrassexuais5 5 Esse é um conceito trabalhado pelo filósofo homem trans Paul Preciado (2014). A contrassexualidade é um manifesto sobre o corpo, ampliando as noções já trabalhadas por Monique Wittig, Michel Foucault, Judith Butler e Donna Haraway como tecnologias sociopolíticas que se estabelecem no corpo. (PRECIADO, 2014PRECIADO, B. Manifesto Contrassexual. Políticas subversivas de identidade sexual. São Paulo: n-1 edições, 2014., p. 34) porque saúde não é falar de doença, mas, de relações afetivas saudáveis, construção da identidade, ao pertencimento de uma identidade, seja ela homoafetiva, trans, periférica, racial, defende Félix.

Para Flip, os profissionais têm que estar preparados para acolher a Comunidade Ballroom com uma perspectiva preta. Isso significa buscar uma participação mais próxima, mais íntima com essas pessoas, com essa comunidade. É a partir do território, diluindo esses muros entre pessoas e serviços. Eu falo de um pensamento intersetorial, que infelizmente, os setores da educação, da cultura, da saúde, do lazer, estão muito ilhados. Então é necessário diluir muros para dialogar. Como falar sobre saúde sexual, prevenção ao HIV na escola sem ser uma palestra com linguagem tecnicista? As pessoas estão fora da saúde e é no fora que a saúde tem que atuar. Essa aproximação é essencial, é um aprofundamento da relação, uma possibilidade de escuta, uma abertura de escuta, sem moralismo e principalmente sem fórmulas prontas. E esse pensamento é necessário para construirmos estratégias pretas de prevenção como é a Comunidade Ballroom.

De fato, é preciso diluir os muros entre pessoas e serviços para refletir como essas estruturas reproduzem desigualdade. Neste artigo, a linguagem neutra não é objeto de análise, mas merece algumas reflexões porque utilizar esse tipo de linguagem é um exercício de não reproduzir violências epistêmicas, identitárias que essas pessoas sofrem no cotidiano. Transmutar o uso das palavras em O e A para E ou com pronomes Elu/Delu é uma posição política, mas também acolhedora de incluir outras manifestações linguísticas que dão movimento à língua. É disso que se trata a Comunidade Ballroom: um movimento afrodiaspórico como salienta Félix que permite ampliar repertórios linguísticos para modificar a norma e a estrutura dos serviços. Uma exigência programática de sair dos muros institucionais para ir aonde a linguagem é produzida, nos arquivos não abertos sobre prevenção.

Considerações finais

O objetivo deste artigo foi apresentar as narrativas da Comunidade Ballroom de São Paulo para compreender como se dão as práticas de prevenção nessas pessoas, identificando como essas estratégias se conformam, com que elementos e influências. No entanto, a experiência de adentrar em mundos tão complexos e diversos permitiu ampliar a discussão em muitas direções. Uma delas é a prevenção, sobre os tipos de histórias que estamos contando sobre prevenção.

Não é à toa que a XIII Conferência Internacional de Aids aconteceu em Durban, na primeira década dos anos 2000, para chamar a atenção da epidemia no continente africano, bem como dos países subdesenvolvidos Na XIV Conferência realizada em Barcelona no ano de 2002, Nelson Mandela e Bill Clinton fazem o discurso de encerramento da Conferência para falar da Aids como um problema global de saúde pública: “muitas pessoas que não morrem da doença são mortas pelo estigma que cerca todos os portadores do vírus”.6 6 Nelson Mandela: “Aids é uma guerra contra a humanidade”. Disponível em: http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI27525-15223,00-NELSON+MANDELA+Aids+E+UMA+GUERRA+CONTRA+A+HUMANIDADE.html. Acesso em: 30 de novembro. 2022.

Mandela e Clinton incitam um movimento que posteriormente será chamado de President’s Emergency Plan for Aids Relief (PEPFAR)7 7 “President's Emergency Plan for Aids Relief. Trata-se de uma iniciativa governamental dos Estados Unidos para enfrentar a epidemia global de HIV-Aids. Disponível em: https://www.hiv.gov/federal-response/pepfar-global-aids/pepfar. Acesso em: 30 de novembro. 2022. no governo de George W. Bush, em 2003, para induzir respostas globais à Aids a partir de estratégias de prevenção, tratamento e ampliação do acesso.

Nos anos 1990, o tratamento tornou-se uma realidade para muitos países como uma política global para o controle da Aids. De 2000 a 2020, estratégias farmacológicas de prevenção como a PEP, a PrEP e a chamada “Indetectável = Intransmissível” (I=I) entram em cena para compor o cardápio da prevenção, somado às estratégias já existentes como camisinha e RD.

Pesquisas realizadas identificaram8 8 Principais estudos que embasam a declaração I=I. Disponível em: http://giv.org.br/boletimvacinas/32/03-i=i-principais-estudos-que-embasam-a-declar acao.php. Acesso em: 30 de novembro. 2022. risco zero de infecção de HIV nas relações sexuais em que um é positivo indetectável e outro soronegativo. Para Figueredo (2019FIGUEREDO, P. R. I=I (indetectável=intransmissível): novos sentidos da infecção para quem vive com HIV/aids, novos desafios para a resposta à epidemia. Dissertação. Universidade de São Paulo, Faculdade de Medicina. São Paulo, 2019.), o I=I tem permitido a construção de uma nova história sobre o HIV, retirando a narrativa da morte para uma narrativa da vida, de uma sexualidade saudável, da autonomia dos sujeitos em relação ao sexo.

Uma pessoa que vive com HIV indetectável pode escolher transar com camisinha ou não, e a parceria sexual utilizar a PrEP como método de prevenção, mas como Luna Ákira aponta na “Ballroom ainda há falta de informação sobre o que é essa prevenção combinada. Muitas meninas trans não tem acesso e se tornam positivas bem cedo devido ao trabalho na prostituição. A Ballroom acaba sendo um ponto de prevenção, mas ela não pode ser a única ponte. É dever do Estado ir atrás de nós e construir estratégias conosco. É um absurdo só pessoas brancas cis terem acesso a prevenção quando pessoas negras estão se infectando e morrendo”.

Quando adentramos no universo das histórias, abrimos um arquivo negro da prevenção para ocluir uma história única (branca, cis, gay) da Aids, confrontando diversas vezes a história canônica. Esse é um aprendizado valioso do arquivo negro de mostrar onde as teorias podem falhar, abrindo uma fissura para re-teorizar as discussões sobre saúde e prevenção onde a Ballroom reivindica suas próprias histórias. Como as ações de prevenção têm sido construídas nos espaços de socialização das pessoas negras? Quem são os profissionais que formulam a política de HIV para a população negra? Além de uma organização comunitária, essa comunidade representa uma cena cultural na epidemia de HIV/Aids onde há uma linguagem nesses espaços e as estratégias de prevenção devem passar por essa dimensão, não mais institucional sobre prevenção, mas a partir do discurso, da fala, da narrativa dessas pessoas.

A linguagem é o corpo e o território da Ballroom, então a prevenção combinada do HIV deve ser capaz de reconhecer todas as potencialidades dessa comunidade. São corpos negros que vivenciam a experiência do racismo, então, é necessária uma linguagem antirracista para criar estratégias de prevenção. São corpos negros que vivem em territórios que os serviços de saúde não chegam, então, é necessário sair dos muros dos serviços e ir ao encontro dessas pessoas nos territórios. São corpas trans que vivenciam a experiência da transfobia; então, é necessário ativar um novo tipo de linguagem para falar com pessoas trans.

Em um contexto em que a prevenção é combinada, precisamos primeiro combinar com as pessoas como elus querem se prevenir porque para combinar a prevenção precisamos lembrar da saúde como defesa da vida, das histórias que queremos contar sobre o futuro com mais equidade e menos desigualdade.

  • 1
    Paris is burning é o principal registro audiovisual sobre o nascimento da Comunidade Ballroom nos Estados Unidos. Nos estudos de classe, gênero e sexualidade, Judith Butler (2019BUTLER, J. Corpos que importam: os limites discursivos do “sexo”. São Paulo: N-1 edições, 2019.) e Bell Hooks (2019HOOKS, b. Olhares negros: raça e representação. São Paulo: Elefante; 2019.) se ocuparam a discutir sobre as categorias cisgeneridade e negridade tendo como base o referido documentário.
  • 2
    Pose é uma série da Netflix dirigida por Ryan Murphy que tem como base a Comunidade Ballroom de Nova York. Em Pose, é retratada as histórias de Blanca Evangelista e Elektra Abundance, respectivamente, House of Evangelista e House of Abundance. É possível notar também que essas casas são estruturas familiares para jovens negros LGBTQIAPN+ expulsos de casa por conta da sua orientação sexual e identidade de gênero, além de ser um espaço de acolhimento para as pessoas que vivem com HIV nessa comunidade.
  • 3
    Pesquisa desenvolvida sob o Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva na Faculdade de Medicina da USP em nível de mestrado com Bolsa Capes (número do processo: 88887.485987/2020-00).
  • 4
    Embora a discussão esteja indiretamente ligada ao debate da interseccionalidade (ver CRENSHAW, 1989CRENSHAW, K. Demarginalizing the intersection of race and sex: a black feminist critique of antidiscrimination doctrine, feminist theory and antiracist politics. Univ Chic Leg Forum, 1989.; AKOTIRENE 2019AKOTIRENE, C. Interseccionalidade. São Paulo: Pólen, 2019.), não é objetivo do artigo tal dimensão. A opção teórica, metodológica e analítica é discutir o arquivo negro da prevenção, apresentando narrativas outras sobre a epidemia de HIV/Aids pela ótica racial. Para estudos que dialogam com a relação HIV e interseccionalidade, ver: Oliveira (2022OLIVEIRA, P. B. G. “HIV NÃO É CRIME”: processos de subjetivação de pessoas vivendo com HIV/Aids, disputas políticas contemporâneas e estratégias de sobrevivência. Dissertação. Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. São Paulo, 2021.) e Santos (2015SANTOS, O. C. A invenção de uma epidemia: Aids, Direitos Humanos e os grupos mais atingidos. Dissertação. Universidade de São Paulo, Faculdade de Saúde Pública. São Paulo, 2015.).
  • 5
    Esse é um conceito trabalhado pelo filósofo homem trans Paul Preciado (2014). A contrassexualidade é um manifesto sobre o corpo, ampliando as noções já trabalhadas por Monique Wittig, Michel Foucault, Judith Butler e Donna Haraway como tecnologias sociopolíticas que se estabelecem no corpo.
  • 6
    Nelson Mandela: “Aids é uma guerra contra a humanidade”. Disponível em: http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI27525-15223,00-NELSON+MANDELA+Aids+E+UMA+GUERRA+CONTRA+A+HUMANIDADE.html. Acesso em: 30 de novembro. 2022.
  • 7
    “President's Emergency Plan for Aids Relief. Trata-se de uma iniciativa governamental dos Estados Unidos para enfrentar a epidemia global de HIV-Aids. Disponível em: https://www.hiv.gov/federal-response/pepfar-global-aids/pepfar. Acesso em: 30 de novembro. 2022.
  • 8
    Principais estudos que embasam a declaração I=I. Disponível em: http://giv.org.br/boletimvacinas/32/03-i=i-principais-estudos-que-embasam-a-declar acao.php. Acesso em: 30 de novembro. 2022.

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Editor responsável: Rogerio Azize

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Dez 2022
  • Aceito
    25 Abr 2023
  • Revisado
    15 Abr 2023
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